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Era uma vez um casal de camponeses que vivia em uma cidade pequena, a mulher estava

grávida e com muita vontade de comer rabanetes. Sua vizinha, uma mulher que vivia
sozinha, tinha em seu quintal uma plantação de rabanetes, os mais lindos que a camponesa
já tinha visto. Porém, ela e sua vizinha não eram amigas, o que dificultava para ela obter os
vegetais. Em uma certa noite, a camponesa pediu para que seu marido fosse buscar os
belos rabanetes porque estava com muita vontade de comê-los. Seu marido não resistiu ao
pedido e foi até a horta da vizinha para apanhá-los. No dia seguinte, a mulher pediu
novamente para que seu marido fosse buscá-los, voltando de lá avistou sua vizinha dar um
belo grito:
- Aonde pensa que vai com meus rabanetes?
O homem assustado tentou se explicar:
- É para a minha esposa, ela está grávida e com muita vontade de comê-los.
A vizinha respondeu com um sorriso sarcástico:
- Pois bem, pode levá-los... Mas terá um preço, quando seu bebê completar 6 meses de
vida, vocês irão ter que me dá-la.
O camponês triste com a proposta da vizinha abaixou a cabeça e saiu acenando, como se
estivesse concordando com o ocorrido. Assim, se passaram 7 meses e a jovem bebê
nasceu e se tornou uma criança linda e forte. A criança viveu com seus pais até seus 6
meses, quando sua vizinha apareceu para pegar a criança seus pais ficaram devastados,
mas mesmo assim entregaram. Ao pegá-lo, foi direto para uma torre isolada do mundo
esterior. Anos se passaram e a jovem se tornou ainda mais linda e forte, porém com alguns
problemas psicológicos.

18 anos depois…

Rapunzel
Corro até a janela quando escuto seus gritos, a mamãe finalmente chegou e precisa dos
meus cabelos para subir.Jogo minhas longas tranças loiras pela única janela da alta torre, a
qual vem sendo meu lar desde que consigo me lembrar, enquanto vejo a mamãe subindo
por elas repito mentalmente o que precisava pedir.Imagino que não será fácil conseguir mas
hoje é meu aniversário de 18 anos e se ela não permitir terei que executar meu plano B, de
qualquer maneira conseguirei o que quero e não me importo com o que preciso fazer.
- Rapunzel? Filha, a terra está chamando.
Sua voz me tira de meus devaneios e eu observo sua expressão aparentemente tranquila,
ela sorri verdadeiramente e com felicidade em seus olhos escuros, em certos pontos do seu
rosto algumas rugas já são detectadas mas ainda assim mamãe continua com um ar jovial.
- Bom dia mamãe, desculpa, estou sonhando acordada acho, está um dia tão lindo
para meu aniversário de 18 não acha?
- Claro filha, que dia seria mais feliz e lindo do que o dia em que minha princesa faz
18 anos?
Enquanto ela está de costas buscando algo, provavelmente um presente, os meus
pensamentos vão ficando mais agitados.Teria que dar certo, quer dizer, eu preciso fazer dar
certo afinal não aguento mais uma noite nessa maldita torre e me sinto sufocar por dentro e
por fora. Assim que mamãe olha para mim eu sorrio de novo, era fácil sorrir e fingir estar
feliz, controlo aos poucos minha respiração e solto as mãos que tinha fechado em punho,
não posso perder o controle.Ela me olha com carinho e me surpreende falando:
- Eu pensei em te trazer um presente mas então escolhi algo melhor ainda, quero que
saiba o quanto te amo e como você mudou a minha vida, então, vou te deixar
escolher o que quer hoje.
Bem, não achei que teria uma oportunidade tão boa de colocar minhas ideias em prática,
mas não irei desperdiçar, coloco no rosto o meu melhor sorriso de doçura e bondade
quando finalmente conto o que quero:
- Mamãe, hoje eu quero conhecer os meus pais.
Mamãe
Ao escutar o desejo da minha menina, agora já uma mulher, é impossível fingir que não
esperava por isso.Suspiro com pesar, meu coração aperta um pouco por ouvir ela
chamando eles de pais mas eu entendo que seja verdade e que sequestrei ela de sua mãe
biológica, infelizmente criei com tanto amor por ela que fica impossível não me sentir
magoada.Tento sorrir mas sei que não chega aos olhos, contra minha vontade e morrendo
de medo de perde-la decido aceitar seu pedido.
- Se isso é o que você quer, assim vai ser.
Ela sorri e pula de felicidade enquanto me agradece, quando me abraça eu paro um pouco
para sentir minha filha em meus braços, porque pra mim é o que sempre será, minha filha,
lembro da primeira vez que a tive comigo, tão pequena e frágil, senti que precisava proteger
aquele lindo bebê de toda a maldade desse mundo e mesmo sabendo que fazia algo
horrível ao tira-la de sua família não pude deixar de me sentir mais completa por ela estar
comigo.
- Vamos logo para voltar antes de anoitecer.
E assim, com minha mágica, ajudo nós duas a chegar até o pequeno casebre no qual
Rapunzel nasceu.
Respiro fundo e com Rapunzel do lado bato na porta, de dentro da casa escuto algum tipo
de discussão mas não consigo ouvir o assunto.Depois da segunda batida na porta
finalmente abrem a mesma, a mulher claro que tinha que gritar e sair correndo pra dentro
de casa, nem viu a filha, eu decido falar algo logo:
- Vim trazer a minha filha para conhecer vocês.
O homem então é quem aparece, ao olhar para Rapunzel começa a chorar e cai de joelhos,
seres humanos são tão patéticos as vezes, não entendo como minha filha saiu de pessoas
assim.
- Sua filha? É o NOSSO bebê, você ROUBOU ela.
A mulher grita comigo enquanto abraça Rapunzel, estranhamente minha menina não teve
reação nenhuma até agora, como ela deve estar? Será que tem raiva de mim também? Eu
espero que não, isso me destruiria.Entro na casa e sento a mesa, sou obrigada a esperar
essa maldita visita acabar então observo o lugar enquanto deixo Rapunzel falar com
eles.Esse barraco consegue ser pior do que eu lembrava, aparentemente depois da minha
visita o casal ficou meio paranóico, as janelas tem madeiras pregadas e a única porta está
cheia de correntes, como se isso fosse me impedir caso quisesse entrar aqui.Paro de ver a
casa quando percebo que a conversa parou, levanto na hora e procuro minha filha com
receio ando até o outro cômodo no qual estavam conversando antes mas me assusto com a
cena, o casal estava desmaiado na cama.Antes de ter tempo para pensar em algo sinto
uma pancada na cabeça, sinto a força deixando meu corpo e meus olhos se fechando,
antes de desmaiar completamente tive a impressão de ver cabelos loiros se mexendo pela
casa e então só escuridão.
- VOCÊ VAI COMER, EU NÃO PERGUNTEI O QUE QUER, NÃO ERA ISSO QUE
DESEJAVA? AGORA COMA.
Acordo com gritos e uma risada maligna, essa voz é tão familiar será que estou
enlouquecendo? Não é possível que seja quem estou pensando.Abro meus olhos com
cuidado, ao tentar me mexer percebo como minhas mãos estão presas e como minha
cabeça ainda gira e dói por causa da pancada não estou conseguindo usar minha
magia.Apesar de tudo o que mais me preocupou foi ver o que se passava na minha frente,
a dona dos gritos e risadas era Rapunzel, junto com ela estava seus pais biológicos presos
a duas cadeiras como eu e minha menina sempre tão gentil forçava a mulher comer o que
parecia ser rabanetes.

Rapunzel
Finalmente eu posso completar minha vingança, dou risada enquanto forço os rabanetes
para aqueles dois comerem, cada parte do meu corpo gritava de felicidade e pedia por mais
e mais, meu corpo inteiro estava queimando de necessidade, eu precisava do grito dos
dois, das lágrimas, queria ver eles sofrerem como EU sofri anos presa porque ELES
deixaram a mamãe me levar por causa de MALDITOS RABANETES.Sinto as palavras
lutando para sair e agora eu podia, podia parar de sorrir e fingir, podia perder o controle, as
possibilidades eram tantas que tinha pequenas descargas elétricas no meu corpo e tremia
de felicidade, começo a cantar alegremente quando a voz da mamãe me tira do meu estado
de alegria total.
- Rapunzel, o que você está fazendo? Essa não é você por favor solte eles, vamos
voltar pra casa e vai ficar tudo bem, você é uma pessoa doce e bondosa.
As vozes na minha cabeça gritam tão alto que preciso parar para respirar fundo e me
concentrar.Começo a gargalhar, uma risada sem humor nenhum, e enquanto buscava outra
panela de rabanetes começo a falar com ela:
- Aí ai mamãe, essa sou exatamente eu, o que você achava? Que eu ficaria 18 ANOS
presa e seria uma menina boazinha? Te enganar foi tão fácil, você sempre tão
desesperada pelo meu amor não me viu planejando esse momento, não viu toda a
minha doçura se transformar em veneno e agora eu sou tão doce quanto ácido.
Viro para ela e vejo em seus olhos o que ela via, meu cabelos antes compridos decidi cortar
e estavam todos irregulares caindo em meu rosto, segurava uma panela gigante de
rabanetes e sorria friamente.
- Você acha que eu estou louca mamãe? Bem, não foi eu que sequestrei um bebê por
ser CARENTE E SOLITÁRIA, VOCÊ PODERIA TER ADOTADO GATOS COMO
ALGUÉM LOUCA SOZINHA FAZ MAS NÃO, DECIDIU DESTRUIR A MINHA VIDA
IGUAL ESSES DOIS AQUI.
Minha respiração vai ficando ofegante enquanto eu grito, a raiva me consome e eu jogo a
panela com força na parede, as vozes na minha cabeça vão ficando mais altas enquanto
minha voz vai subindo, seguro meus cabelos com as duas mãos tentando aliviar a agonia
no meu corpo, toda aquele ódio preso exigia sair.Parei, respirei, e olhei para o casal preso,
eu iria deixar todo aquele ódio sair neles e então trancaria a todos na torre.
Mamãe
Ver a minha filha arrancando os próprios cabelos e gritando sozinha machucou meu
coração, ela tremia e sorria enquanto parecia discutir com si mesma, suas mãos abriam e
fechavam em punhos quando do nada parou, parou de gritar e tremer e soltou seus cabelos
agora pequenos.O olhar que lançou para a mulher e o homem antes seus pais me fez gelar,
ela estava certa, não existia a Rapunzel que eu conhecia mais, se algum dia existiu agora
ela se perdeu em ódio e sufocava nele, não existia mais volta.Enquanto ela ia buscar a
panela que tinha jogado e os rabanetes eu sentia minha magia voltar aos poucos, lágrimas
escorriam pelo meu rosto enquanto percebia o que teria que fazer para impedir ela de
torturar os dois.
- Era uma vez, uma menininha, com longos cabelos loiros ela ouvia a gritar, o dia todo
alguém estava a chamar, jogue seus cabelos a tal voz dizia, e correndo a menina ia
escutar.
Enquanto Rapunzel cantava sua própria história e ria juntando os rabanetes consegui soltar
minhas mãos, meu peito apertava e as lágrimas embaçavam minha visão, respirei com
dificuldade e falei, provavelmente pela última vez:
- Eu te amo meu pedacinho de céu, me perdoa por te deixar assim, por não perceber
como você estava mal, eu deveria ter prestado mais atenção e te ajudado, errei
tanto com você meu anjo mas não posso deixar que você machuque mais aqueles
dois.
Ela olha pra mim e por alguns segundos vejo a menina que criei, mas logo seus olhos
verdes transbordam raiva novamente quando responde:
- Por que você se importa? Você sequestrou um bebê e agora quer me dizer para não
machucar alguém? Que moral tem?
- Eu sei que não fui um exemplo de bondade Rapunzel, mas não quero você
cometendo atrocidades como eu, quero que você seja melhor e não posso deixar
que destrua ainda mais sua alma.
Com alguns movimentos de mão coloco ela para dormir cuidadosamente a encosto no
chão.Solto os dois e enquanto eles se abraçam e choram pego minha menina no colo, saio
daquele barraco e a levo comigo sabendo o que preciso fazer.

Dia seguinte…

Mamãe
Observo a carruagem da prisão levar Rapunzel, ela acorda e olha pelas grades do lugar,
me vê e grita para que eu a salve:
- Mamãe, mamãe, por favor me ajuda, eles estão me levando para longe de você
mamãe, por favor eu te amo tanto, sou eu, sua doce menininha.
Ver ela chorando e gritando por mim era como ter meu coração arrancado, mas logo que
percebe como não iria funcionar e que eu não sairia do lugar começou a bater nas grades e
falar:
- ME TIRA DAQUI, ME TIRA DAQUI SUA MALDITA, EU NÃO VOU FICAR
TRANCADA DE NOVO, EU VOU TRANCAR VOCÊ E VOU FAZER AQUELES DOIS
ENGASGAREM EM RABANETES, SIM EU VOU FAZER ISSO VOCÊ ESTÁ…
Não consigo ouvir o resto depois que a carruagem se afasta, suspiro ao voltar para a torre,
todos as pinturas de Rapunzel estavam espalhados por lá, sentia como se a qualquer
momento ela apareceria correndo me abraçar como quando criança.Agora eu sei que esses
18 anos foram meu final feliz e apesar da minha filha ter amargado, as lembranças com ela
nunca serão estragadas.

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