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Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ


Escola Politécnica
Programa de Engenharia Urbana

Patrícia Hespanhol da Silva Fernandes

PESQUISA QUALITATIVA COMO FERRAMENTA PARA ANÁLISE DE


SATISFAÇÃO E ENGAJAMENTO DE MORADORES COM A COLETA
SELETIVA NO BAIRRO DE SÃO FRANCISCO – NITERÓI: 34 anos de coleta
seletiva no Brasil.

Rio de Janeiro
2019
2

UFRJ

Patrícia Hespanhol da Silva Fernandes

PESQUISA QUALITATIVA COMO FERRAMENTA PARA ANÁLISE DE


SATISFAÇÃO E ENGAJAMENTO DE MORADORES COM A COLETA
SELETIVA NO BAIRRO DE SÃO FRANCISCO – NITERÓI: 34 anos de coleta
seletiva no Brasil.

Dissertação de Mestrado apresentada ao programa de Pós-


Graduação em Engenharia Urbana, Escola Politécnica da
Universidade Federal do Rio de Janeiro, como requisito
parcial para obtenção do título de Mestre em Engenharia
Urbana.

Orientador: DSc. Claudio Fernando Mahler

Rio de Janeiro
2019
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Fernandes, Patrícia Hespanhol da Silva.


Pesquisa Qualitativa como Ferramenta para
Análise De Satisfação e Engajamento de Moradores com a Coleta
Seletiva no Bairro de São Francisco – Niterói: 34 Anos de Coleta
Seletiva no Brasil / Patrícia Hespanhol da Silva Fernandes. –
2019.
100 fls.

Dissertação (Mestrado em Engenharia Urbana) –


Universidade Federal do Rio de Janeiro, Escola Politécnica,
Programa de Engenharia Urbana, Rio de Janeiro, Ano. 2019

Orientador: D. Sc Claudio Fernando Mahler

1. Coleta Seletiva. 2. Resíduos Urbanos. 3. Pesquisa


Qualitativa. 4. Reciclagem. I. Mahler, Claudio Fernando. II.
Universidade
Federal do Rio de Janeiro. Escola Politécnica. III. Título.
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UFRJ

PESQUISA QUALITATIVA COMO FERRAMENTA PARA ANÁLISE DE


SATISFAÇÃO E ENGAJAMENTO DE MORADORES COM A COLETA
SELETIVA NO BAIRRO DE SÃO FRANCISCO – NITERÓI: 34 anos de coleta
seletiva no Brasil.

Patrícia Hespanhol da Silva Fernandes

Orientador: DSc. Claudio Fernando Mahler

Dissertação de Mestrado apresentada ao programa de Pós-


Graduação em Engenharia Urbana, Escola Politécnica da
Universidade Federal do Rio de Janeiro, como requisito
parcial para obtenção do título de Mestre em Engenharia
Urbana.

Aprovada pela banca:

_____________________________________________
Presidente, Prof. Armando Carlos de Pina Filho, DSc., UFRJ

_____________________________________________
Prof. Claudio Fernando Mahler, DSc., UFRJ

_____________________________________________
Prof. Maria Carla Barreto Santos Martins, DSc., UFF

_____________________________________________
Prof. Marcelo Guimarães Araújo, DSc., FIOCRUZ
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Dedico esta dissertação àqueles que são os braços que me


levantaram para chegar até aqui: minha mãe Márcia, meu
irmão Alexandre, meu pai Jorge e meu marido Gabriel.
Dedico também aos meus ancestrais de quem herdo a
força e os saberes e que me acompanharam até aqui.
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AGRADECIMENTOS

O fim desta jornada é o começo de outra. Para chegar até aqui, enfrentei batalhas
talvez maiores de que alguns colegas meus. Sou a primeira pessoa da minha família a
fazer Mestrado. Sou a primeira a passar para uma universidade pública.
Barreiras foram quebradas e ultrapassadas. Mas isso só foi possível, pois não
estive sozinha. Agradeço primeiramente aos meus pais, por minha vida e por todo o
suor e força para que eu chegasse até aqui e possa ir além. Essa vitória é de vocês.
Agradeço ao meu irmão por ser do jeito que eu sonhei quando minha mãe engravidou,
por tanto nos ajudar e por ser meu companheiro leal. Agradeço ao meu marido Gabriel,
por ser companheiro em cada passo de minha caminhada, pelos tantos conselhos, pelo
suporte financeiro, emocional e estrutural à minha pesquisa e meus estudos, “eu sou, pq
vc é”.
Agradeço ao universo, a Deus e à Deusa, a São Miguel Arcanjo e a todos os
meus protetores por não me deixarem cair. Agradeço à rede de mulheres que me ampara
em todos os momentos, principalmente: Patricia Lopes (meu cristal de aterramento, na
saúde e na doença), Jéssica Nunes (meu amor puro e acolhedor), Adriana Maria
(irmandade ancestral e luz na escuridão), Marcela Oliveira (quem eu quero ser quando
crescer), Maria (amiga fiel e sábia), Gabriela Macedo (ombro amigo e inspiração),
Débora (meu respiro de fé e apoio), Jackeline Alves (a flor mais bela, amorosa e justa) e
Marília Santos (meu exemplo de força e amiga pronta pra tudo). Agradeço à minha
amiga e companheira de Mestrado Larissa Paredes pela companhia e luz nas horas mais
difíceis. Vencemos juntas! Agradeço ao meu amigo fiel Alex Brito, mesmo em outro
Estado, sempre esteve tão presente e disposto a me ajudar. Te admiro tanto! Agradeço à
minha psicóloga Edjane Rocha, um ser de luz enviado pelo universo que me ajudou a
chegar até aqui e que me segurou nas piores crises que tive durante este processo. Esse
título também é seu! Agradeço ao meu orientador Cláudio Mahler por ter me aceitado e
não desistir de mim e nem me deixar desistir em nenhuma hipótese. Sou muito grata à
você mestre! Só cheguei aqui pois acreditou em mim! Ao meu co-orientador extraoficial
Gabriel Mendez, agradeço por toda a ajuda, orientação, disponibilidade, gentileza e
ombro amigo em todos os momentos que precisei. A academia tem um futuro brilhante
e humanizado com professores como você! Agradeço à todos os moradores(as) de São
Francisco participantes de minha pesquisa que me receberam muitas vezes em seus
lares, sem me conhecer, apenas interessados em apoiar uma pesquisa sobre o bairro que
tanto lutam para preservar. Agradeço às minhas ancestrais e aos meus ancestrais, sei que
a energia de todos vocês me guiaram por esta caminhada e que esta conquista também é
libertação. Sou grata aos professores e colegas da UFRJ e também da UERJ, de onde
vim, que não compactuam com o projeto de desmonte da educação pública. A
profissional que sou é parte de cada um de vocês. Seremos Resistência!
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RESUMO

FERNANDES, Patrícia Hespanhol da Silva. Pesquisa Qualitativa como Ferramenta


para Análise de Satisfação e Engajamento de Moradores com a Coleta Seletiva no
Bairro de São Francisco – Niterói: 34 Anos de Coleta Seletiva no Brasil. Rio de
Janeiro, 2019. Dissertação (Mestrado Profissional em Engenharia Urbana) – Escola
Politécnica, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2019.

A coleta seletiva no Brasil ainda apresenta números bem tímidos e, de acordo


com a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), é de responsabilidade dos
municípios que podem realizar ações em parceria com a iniciativa privada (grandes
geradores) e organizações de Catadores. Porém, poucas iniciativas geridas por
municípios tem se mostrado eficientes. É bastante simbólico que a primeira iniciativa de
coleta seletiva no país tenha acontecido há 34 anos atrás no bairro de São Francisco em
Niterói, cidade da região metropolitana do Rio de Janeiro, por iniciativa e gestão
totalmente feita por moradores em formato de associação. O projeto durou 30 anos
sendo coordenado desta forma e teve bastante sucesso ao que se propôs. Atualmente, a
coleta seletiva no bairro foi assumida pela Companhia de Limpeza de Niterói (CLIN),
órgão da prefeitura da cidade, que gere o serviço há 4 anos. Esta pesquisa tem como
principal objetivo a utilização da metodologia de pesquisa qualitativa para se avaliar a
qualidade, engajamento de moradores e mudanças ocorridas na coleta seletiva
residencial no primeiro bairro do Brasil a ter este tipo de projeto. A pesquisa qualitativa
se baseia na análise do discurso e na observação do contexto para colher informações
com riquezas de detalhes que outros tipos de pesquisa geralmente não alcançam. A
partir da realização das entrevistas e análise de discurso, formam-se categorias de
sentido, onde se identificam nos relatos dos entrevistados, importantes pontos
abordados e, principalmente, que características em comum há nas falas que traduzam o
histórico de coleta seletiva naquele espaço urbano e que relações sociais justificam o
sucesso ou insucesso das ações. As análises finais, servem assim, como base de
exemplo para novas iniciativas e também a própria ferramenta e metodologia para
avaliações de outras ações de coleta seletiva no meio urbano.

Palavras-chave: Coleta seletiva municipal; gestão de resíduos; reciclagem; pesquisa


qualitativa; bairro São Francisco; Niterói.
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ABSTRACT

FERNANDES, Patrícia Hespanhol da Silva. Qualitative Research as a Tool for


Analysis of Satisfaction and Engagement of Residents with Selective Collection in
the São Francisco Neighborhood – Niterói: 34 years of selective collection in Brazil.
Rio de Janeiro, 2019. Dissertação (Mestrado Profissional em Engenharia Urbana) –
Escola Politécnica, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2019.

The selective collection in Brazil still presents very limited results and, according to the
National Solid Waste Policy (PNRS), it is the responsibility of the municipalities that
can carry out actions in partnership with the private initiative (large generators) and
organizations of Waste Pickers. However, few initiatives managed by municipalities
have been efficient. It is quite symbolic that the first selective collection initiative in the
country happened 34 years ago in the neighborhood of San Francisco in Niterói, a city
in the metropolitan region of Rio de Janeiro, when initiative and management were
made entirely by residents in association format. The project lasted 30 years being
coordinated in this way and was quite successful at what it was proposed. Currently, the
selective collection in the neighborhood was taken over by the Niterói Cleaning
Company (CLIN), an agency of the city's hall, which has managed the service for 4
years. This research has as main objective the use of the methodology of qualitative
research to evaluate the quality, the engagement of residents and changes occurred
within household waste management system in the first neighborhood of Brazil to have
this type of project. Qualitative research relies on discourse analysis and the observation
of context to gather information with richness of detail that other types of research
generally do not reach. From the interviews and discourse analysis, categories of
meaning are formed, where the interviewees' reports are identified, important points
addressed and, mainly, which common points were spoken between them that reflect
the history of selective collection in that urban space and which social relations justify
the success or failure of those actions. Being, the final analysis, thus used as a sample
basis for new initiatives, as well as the tool and methodology to rate other selective
collection actions in the urban area.

Palavras-chave: Selective Collection; Waste management; Recycling; Qualitative


research, São Francisco; Niterói.
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ÍNDICE DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 - Esquema resumido do fluxo de resíduos na coleta seletiva ........................................ 14


Figura 2 - Mapa de localização do bairro de São Francisco na cidade de Niterói (em vermelho)
..................................................................................................................................................... 34
Figura 3 - Imagem da capela de São Francisco Xavier (sem data precisa) ................................. 35
Figura 4 - Imagem atual da capela de São Francisco Xavier ...................................................... 35
Figura 5 - Rua Araibóia em janeiro de 2019. Uma das ruas do bairro, como exemplo da grande
arborização do mesmo ................................................................................................................. 36
Figura 6 - Vista de São Francisco a partir do Parque da cidade .................................................. 37
Figura 7 - Vista do bairro de São Francisco a partir da Estrada Fróes. A montanha cheia de
vegetação atrás das construções trata-se do famoso Parque da Cidade....................................... 37
Figura 8 - Micro-trator de coleta seletiva utilizado pelo projeto até 2013 .................................. 40
Figura 9 - Exemplar de uma das carretas de madeira utilizadas pelo projeto. Fotografia da
exposição que comemorou os 30 anos de coleta seletiva no Brasil e do projeto em 2015 no Solar
do Jambeiro em Niterói. .............................................................................................................. 41
Figura 10 - Área de triagem vista de cima ................................................................................. 41
Figura 11 - Área de triagem de resíduos ..................................................................................... 42
Figura 12 - Exemplo de folheto para orientações de moradores e que consta no site da Prefeitura
de Niterói..................................................................................................................................... 44
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LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

AMBEV – Companhia de Bebidas das Américas


CCMAD - Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento
CCSF – Centro Comunitário São Francisco
CIRS - Centro de Informação sobre Resíduos Sólidos
CLIN – Companhia de Limpeza de Niterói
CNPQ - Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
COMLURB - Companhia de Limpeza Urbana do Rio de Janeiro
CONAMA - Conselho Nacional do Meio Ambiente
FAPERJ - Fundação Carlos Chagas de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro
FEEMA - Fundação Estadual de Engenharia do Meio Ambiente
FINEP - Financiadora de Estudos e Projetos
GEE - Gases do efeito estufa
GTM - Genève Tiers‑Monde
GTZ - Agência Alemã de Cooperação Técnica
IBAMA - Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
INEA - Instituto Estadual do Ambiente
IPTU – Imposto Territorial Urbano
LCP - Lei de Consórcios Públicos
LDNSB - Lei de Diretrizes Nacionais para o Saneamento Básico
MNCR – Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis
ONG – Organização não-governamental
PEV – Ponto de Entrega Voluntária
PGRIS – Plano de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos
PMGIRS - Planos Municipais de Gestão Integrada de Resíduos
PNRS – Política/Plano Nacional de Resíduos Sólidos
SEMA - Secretaria Especial de Meio Ambiente
SISNAMA - Sistema Nacional de Meio Ambiente
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TCLE -Termo de Consentimento Livre e Esclarecido


UFF – Universidade Federal Fluminense
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SUMÁRIO

SUMÁRIO .................................................................................................................................. 12
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 13
1.1 OBJETIVO GERAL DA PESQUISA ......................................................................... 16
1.1.1 Objetivos Específicos......................................................................................... 16
1.2 JUSTIFICATIVA ........................................................................................................ 16
2 EMBASAMENTO TEÓRICO ............................................................................................ 19
2.1 DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL ................................................................ 19
2.2 LEI 12.305/2010 – A POLÍTICA NACIONAL DE RESÍDUOS SÓLIDOS (PNRS) 22
2.3 LOGÍSTICA REVERSA............................................................................................. 23
2.4 COLETA SELETIVA ................................................................................................. 24
2.5 O CAMINHO DO RESÍDUO NA COLETA SELETIVA SOLIDÁRIA MUNICIPAL
26
2.6 ORGANIZAÇÕES DE CATADORES DE MATERIAIS RECICLÁVEIS ............... 27
2.7 O MOVIMENTO NACIONAL DE CATADORES DE MATERIAIS RECICLÁVEIS
(MNCR) .................................................................................................................................. 28
2.8 PESQUISA QUALITATIVA ..................................................................................... 29
2.9 RECORTE GEOGRÁFICO ESCOLHIDO: O BAIRRO DE SÃO FRANCISCO EM
NITERÓI - RJ ......................................................................................................................... 33
2.10 O PROJETO COMUNITÁRIO DE COLETA SELETIVA NO BAIRRO DE SÃO
FRANCISCO .......................................................................................................................... 39
3 MATERIAIS E MÉTODOS ............................................................................................... 46
3.1 A PESQUISA QUALITATIVA .................................................................................. 46
3.2 PRIMEIROS PASSOS E PRODUÇÃO DO QUESTIONÁRIO ................................ 48
3.3 ATIVIDADES DE CAMPO E ENTREVISTAS ........................................................ 48
3.4 RETORNO DAS ENTREVISTAS, DESCRIÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS ....... 51
4 RESULTADOS ................................................................................................................... 53
4.1 ANÁLISE DAS CATEGORIAS DE SENTIDO ........................................................ 53
4.2.1 O engajamento dos entrevistados com a coleta seletiva e tema relacionados ..... 53
4.2.2 As insatisfações com a gestão atual da coleta seletiva e principais mudanças .... 56
4.2.3 Definições pessoais sobre coleta seletiva e sua importância ............................... 60
4.2 PEÇAS DE SENTIDO ................................................................................................ 61
5 CONCLUSÕES ................................................................................................................... 64
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................................. 67
7 PESQUISAS FUTURAS .................................................................................................... 68
8 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................ 69
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1 INTRODUÇÃO

O desenvolvimento urbano brasileiro possui características peculiares


comparáveis a outros países. Porém, dentro de suas cidades alguns aspectos se
assemelham principalmente quando abordadas as consequências do desenvolvimento
sem planejamento e a má distribuição de renda com forte expressão espacial. A gestão
do lixo é um dos graves problemas urbanos brasileiros e durante muitos anos foi feita de
forma não fiscalizada, não padronizada e com fortes impactos socioambientais
negativos.

Culturalmente, os brasileiros acostumaram-se a usar infinitamente os seus


recursos naturais para produção de bens de consumo que são automaticamente
descartados quando considerados ultrapassados, danificados ou sem utilização. Porém,
ao invés de se ter um ciclo de produção onde estes materiais descartados pudessem ser
totalmente ou parcialmente aproveitados para produção de novos bens de consumo,
estes são completamente dispensados e os recursos naturais são explorados
continuamente.

Aproveitar materiais já usados e que foram descartados para a produção de


novos materiais é chamado de reciclagem. Ou, como define a Política Nacional de
Resíduos Sólidos (lei 12.305 de 02/08/10),

“reciclagem é o processo de transformação dos resíduos sólidos que envolve


a alteração de suas propriedades físicas, físico-químicas ou biológicas, com
vistas à transformação em insumos ou novos produtos, observadas as
condições e os padrões estabelecidos pelos órgãos competentes.”

Com o aumento da preocupação com a escassez dos recursos naturais,


diminuição da qualidade de vida, aumento de doenças, entre outros, muito tem se falado
em desenvolvimento sustentável das cidades. Ou seja, crescer economicamente
diminuindo ou evitando os impactos à sociedade e ao meio ambiente. Reaproveitar
todos os materiais com potencial para reciclagem ao invés de extrair novos recursos da
natureza é, parte importante para que a sociedade alcance a tão buscada
sustentabilidade.

Para que as cidades possam reutilizar seus materiais recicláveis, é preciso que
seja implantada a coleta seletiva de resíduos. De acordo com a Política Nacional de
Resíduos Sólidos (PNRS), coleta seletiva é a coleta de resíduos sólidos previamente
segregados conforme sua constituição ou composição. Na coleta seletiva, os materiais
14

recicláveis são divididos por tipo de material, por exemplo, metal, plástico, papel, vidro,
entre outros e posteriormente divididos por sua composição (diferentes tipos de plástico,
diferentes tipos de papel, e etc.) para que sejam encaminhados para as indústrias de
transformação, onde serão transformados em novos bens de consumo.

A coleta seletiva é na verdade, uma fase de todo o processo de reciclagem, como


pode ser visto no esquema abaixo:

Figura 1 - Esquema resumido do fluxo de resíduos na coleta seletiva


Fonte: Autoria Própria

Como aumento do poder de consumo dos brasileiros, uma das principais


consequências negativas é o crescimento da produção de resíduos. Diariamente, cada
pessoa produz, em média, um quilo de resíduos sólidos que, geralmente, são
descartados de maneira inadequada (ABRELPE, 2017).

Em várias cidades brasileiras, a coleta seletiva não é realizada e em muitas, o


lixo produzido ainda é destinado aos aterros sanitários ou controlados e em alguns casos
a lixões. Mesmo em grandes cidades como Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte e
Porto Alegre, o percentual de área atendidas por coleta seletiva ainda é bem pequeno.
Na maioria das cidades brasileiras boa parte resíduos recicláveis destinados para a
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transformação vem do trabalho de Catadores. Alguns deste que catam nas ruas, outros
que ainda atuam em lixões e outros organizados em cooperativas e associações. Estes
retiram dos recicláveis seu sustento e são responsáveis muitas vezes pela coleta, triagem
dos resíduos, em alguns casos beneficiamento, como produção de plástico em flocos e
trituração do vidro, e venda para recicladoras ou atravessadores.

A Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) lançada em 2010 foi um marco


na gestão de resíduos brasileira e trouxe diretrizes importantes para serem incorporadas
pelas cidades. Entre elas, estão a proibição da criação de novos lixões e prazo para
encerramento dos existentes, criação de Planos Municipais de Gestão Integrada de
Resíduos Sólidos e a responsabilidade compartilhada pela destinação correta de
resíduos por pessoas físicas e jurídicas. Infelizmente, por diversas razões, muito poucas
ações que atendessem de fato de forma intensa as exigências da PNRS foram
implementadas, o que levou a uma prorrogação dos prazos. Com a crise político
econômica iniciada em 2015 a resposta das prefeituras no quesito coleta, tratamento e
destinação piorou ainda mais e ocorreu uma piora no atendimento das exigências da
PNRS.

Apesar disto, a realidade atual da reciclagem no país ainda é bem limitada. Uma
grande quantidade de municípios construiu planos que apenas existem no papel e tem
grande dificuldade para implantar as ações de gestão de resíduos, seja por má gestão,
poucos recursos financeiros, desvio de verba e de resíduos e falta de corpo técnico
capacidade ou interesse de gestores públicos. Muitos municípios maquiam seus dados
de coleta seletiva para estarem entre os mais sustentáveis do país ou para não perderem
verbas do governo federal como previsto na Política Nacional de Resíduos Sólidos
(PNRS).

As primeiras ações de coleta seletiva no país aconteceram por iniciativas


populares. Sejam de Catadores, pela igreja católica, como por associações de
moradores. A primeira vez que se teve notícia de uma ação organizada em um bairro,
foi no município de Niterói, região metropolitana do Rio de Janeiro. O projeto era
gerido por um professor da Universidade Federal Fluminense e pela associação de
moradores local e foi gerida desta forma por 30 anos, sendo depois passada a gestão
para a prefeitura da cidade.
16

1.1 OBJETIVO GERAL DA PESQUISA

Aplicar uma pesquisa qualitativa em São Francisco na cidade de Niterói com


intenção de analisar as mudanças, o nível de engajamento e satisfação dos moradores
com a coleta seletiva no bairro.

1.1.1 Objetivos Específicos

Esta pesquisa possui os seguintes objetivos específicos:


 Realizar pesquisa bibliográfica sobre a temática de resíduos e coleta
seletiva no Brasil e no bairro escolhido;
 Realizar pesquisa bibliográfica sobre a metodologia de aplicação de
pesquisa qualitativa;
 Aplicar a pesquisa qualitativa com 12 moradores do bairro;
 Analisar o material coletado nas entrevistas e dividir em categorias de
sentido.

1.2 JUSTIFICATIVA

A Política Nacional de Resíduos Sólidos é um marco histórico da gestão


ambiental no Brasil. A lei que estabeleceu a política lançou uma visão diferenciada
sobre um dos problemas mais graves do impacto do desenvolvimento urbano,
econômico e industrial: limpeza pública e o lixo urbano. Tendo como princípio a
responsabilidade compartilhada entre governo, empresas e população, a nova legislação
teve o intuito de impulsionar o retorno dos produtos às indústrias após o consumo e
passava a obrigar o poder público a realizar planos e ações para o gerenciamento do
lixo. A lei consagrava o viés social da reciclagem citando pela primeira vez junto da
temática de resíduos a participação formal dos catadores organizados em cooperativas e
associações.
De acordo com a política, as prefeituras deveriam implantar a coleta seletiva de
resíduo reciclável nas residências, além de sistemas de compostagem para resíduos
orgânicos como restos de alimentos, o que reduz a quantidade levada para os aterros,
com benefícios ambientais e econômicos.
17

As providências a serem tomadas pelos municípios fazem parte do conceito de


gerenciamento integrado do lixo, envolvendo diferentes soluções como a reciclagem e a
disposição dos rejeitos em aterros que seguem critérios ambientais. Pela lei, os governos
municipais e estaduais tinham um prazo inicial até o final de 2012, que foi
posteriormente prorrogado, para elaborar um plano integrado de resíduos sólidos com o
diagnóstico da situação do lixo e metas para redução e reciclagem, além de fechamento
de lixões, destinando seus resíduos para aterros sanitários locais ou busca de soluções
consorciadas com outros municípios. As autoridades municipais deviam também,
identificar os principais geradores de resíduos e calcular melhor os custos, criando
indicadores para medir o desempenho do serviço público nesse campo, itens estes ainda
ineficientes, após 7 anos da lei.
A existência desse plano de gestão integrada de resíduos (PGIRS), que é
simplificado nas cidades com menos de vinte mil habitantes, passou a ser condição para
o acesso a recursos da União. Além disto, a lei prevê a prioridade às fontes financeiras
do governo federal, os municípios que implantarem coleta seletiva com participação de
organizações de Catadores.
A lei da Política Nacional de Resíduos Sólidos reforçou o viés social da
reciclagem sugerindo a participação dos Catadores, organizados em cooperativas ou
associações, modelo que chegou a ser exportado pelo Brasil para outros países em
desenvolvimento. A parceria com estes profissionais e suas organizações poderia se dar
pelos municípios sem licitação pública. Na teoria, a lei tinha a intenção de dar aos
Catadores a real importância que merecem, gerando trabalho e renda para milhares de
pessoas e diminuindo os impactos ambientais.
As ações de inclusão de Catadores pelos municípios devem focar seus esforços
em mobiliza-los, já que em muitas cidades estes trabalham de forma avulsa1 e sem local
fixo de atuação, capacita-los e estruturar as cooperativas e associações para exercer a
atividade de coleta e triagem de resíduos. Ao fazer a separação dos resíduos, seguindo
as especificações dos diferentes materiais e prensando-os para montar fardos, as

1
São chamados popularmente de Catadores avulsos aqueles que não atuam em organizações como
Cooperativas e Associações e que não possuem nenhum tipo de registro da atividade. Muitos deles catam
em ruas ou até mesmo em lixões clandestinos sozinhos e fazem a comercialização também por conta
própria.
18

cooperativas funcionam como fontes de matéria prima para as indústrias de reciclagem.


São elementos-chave para viabilizar, em parceria com as empresas, o retorno de
embalagens e outros materiais à produção industrial após o consumo pela população,
seguindo também a lei de logística reversa também citada na PNRS.
Porém, grande parte dos municípios tem aplicado as diretrizes da PNRS de
maneira incorreta ou ineficiente. Em muitos municípios é possível verificar a existência
de lixões com Catadores, por exemplo. Gestores municipais alegam que tem dificuldade
em realizar uma ação integrada de coleta seletiva em parceria com organizações de
Catadores ou até mesmo, de reunir estes profissionais em grupos. Além disto, poucos
municípios nos últimos 7 anos conseguiram implantar a coleta seletiva de maneira
eficiente. Dentre os principais problemas está a dificuldade na adequação dos
municípios aos projetos e, em alguns casos, a falta de pessoal capacitado para implantá-
los ou verba para terceirização do serviço.
Em 1985 quando houve o primeiro registro de coleta seletiva no Brasil,
localizado no bairro de São Francisco em Niterói, as ações de coleta seletiva existentes
no país eram esparsas. Não havia além do bairro da cidade de Niterói nenhuma ação
organizada. Só depois de muito tempo, as prefeituras começaram a considerar a coleta
seletiva um serviço que deveria ser realizado em conjunto com a coleta de lixo
convencional. Mas isso só se tornou oficial, quando a PNRS definiu as obrigações de
cada ator dentro da gestão integrada de resíduos municipais. A ação no bairro começou
a partir da ideia de alguns moradores que haviam tido a oportunidade de viver fora do
país, onde a coleta seletiva já era hábito e parte da cultura. Assim, decidiram por meio
da associação realizar um projeto.
Mesmo depois de 2010, quando foi lançada a Política Nacional de Resíduos
Sólidos até os dias de hoje, são poucos locais no Brasil onde existe um programa de
coleta seletiva eficiente e muitas são as questões que inviabilizam os projetos. No caso
de São Francisco, após 30 anos de gestão comunitária, a prefeitura assumiu a gestão do
projeto que se tornou então serviço público. Assim, 34 anos depois da primeira
iniciativa de coleta seletiva no Brasil, busca-se saber como funciona a coleta de
recicláveis no bairro hoje e como anda a conscientização, engajamento e satisfação dos
moradores que vivem ali.
O projeto iniciado e realizado em São Francisco serve de modelo para diferentes
iniciativas a serem realizadas no país. Seus erros, acertos e transformações, parceria
com organizações privadas, organizações internacionais e com a própria prefeitura e que
19

posteriormente assumiu sua gestão, podem ser enriquecedores para novos projetos.
Além de ser um interessante caso de comparação entre a gestão popular de um projeto
de coleta seletiva urbano e a gestão municipal como serviço.

2 EMBASAMENTO TEÓRICO

2.1 DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

A Política Nacional de Resíduos Sólidos, lei 12.305/2010, principal base legal


para esta dissertação, possui como referência em sua criação conceitos que se
relacionam com as diretrizes do desenvolvimento sustentável, seja ele relacionado ao
crescimento de cidades, como com padrões mais sustentáveis de produção e consumo.
Para isto, é importante entender como estes conceitos avançaram durante o tempo até os
dias de hoje e influenciaram o surgimento da lei.

A década de 70 foi importante no que diz respeito aos debates sobre riscos de
degradação ambiental e, por consequência, enfatizou as premissas básicas do que vem a
ser o desenvolvimento sustentável. Dois grandes fatos marcaram a consolidação dos
debates que já vinham ocorrendo nesta década: a publicação do estudo “Limites do
Crescimento” pelo grupo de Roma e a conferência de Estocolmo sobre ambiente
humano.

Embora as bases conceituais já viessem sendo estabelecidas, foi o Relatório de


Brundtland, como é conhecido o documento “Nosso Futuro Comum”, elaborado em
1987 pela Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento - CMMAD,
que tentou consolidar o conceito: de Desenvolvimento Sustentável como sendo "o
desenvolvimento que satisfaz as necessidades do presente sem comprometer a
capacidade das futuras gerações satisfazerem as suas próprias necessidades” (CMMAD,
1991). Além de conceituar, este trabalho traça um perfil da situação ambiental mundial
e coloca o estado como o principal articulador e responsável desta política. Nele,
também, aparece um conjunto de propostas para serem adotadas na política ambiental.

Neste contexto, pode-se constatar que a proposta de desenvolvimento


sustentável não se resume em uma integração harmoniosa entre políticas de
desenvolvimento e a sustentabilidade dos ambientes naturais, como pressupõe o
20

conceito. Ela propõe também que seja um mecanismo do estado para a regulamentação
do uso do território, o que fica muito evidenciado no relatório Brundtland, onde consta:
“este é um mecanismo para persuadir ou fazer as pessoas agirem no interesse comum”
(CCMAD,1991), configurando-se, portanto, como um instrumento político-
administrativo do estado.

No Brasil, após a conferência de Estocolmo, ampliou-se o debate sobre o meio


ambiente, cumprindo ao estado estabelecer as principais diretrizes da política ambiental
através da criação de órgãos e leis para sua regulamentação. Entre os principais órgãos
destacam-se:

• A criação da Secretaria Especial de Meio Ambiente - SEMA, pelo decreto


73.030 de 30 de outubro de 1973, tendo como objetivos: examinar as
implicações do desenvolvimento nacional e do progresso sobre o meio ambiente,
assessorar outras entidades envolvidas na conservação ambiental, e elaborar e
velar por normas e padrões de preservação do ambiente;

• A criação do Sistema Nacional de Meio Ambiente - SISNAMA, integrado pelo


Conselho Nacional do Meio Ambiente - CONAMA e por órgãos executivos
federais e estaduais, através da Lei 6.938 em 1981, tendo por finalidade
assessorar, estudar e propor diretrizes de políticas governamentais para a gestão
ambiental;

• A criação do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais


Renováveis - IBAMA, que incorporou a SEMA e outras agências federais, tendo
amplas responsabilidades na condução da política ambiental, sobretudo na
questão do desmatamento.

Entre 3 e 14 de junho de 1992, representantes de 172 países, incluindo 108


chefes de Estado, se reuniram no Rio de Janeiro para discutir novos modelos de
desenvolvimento baseados na interação entre as dimensões social, ambiental e
econômica. A Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e
Desenvolvimento, encontro que ficou conhecido como Rio 92 ou Eco 92, fortaleceu a
ideia de desenvolvimento sustentável, segundo a qual o crescimento econômico poderia
ser compatível com a proteção ambiental e com inclusão social.
21

A Rio92 adotou documentos que até hoje são referência para o debate
internacional sobre desenvolvimento sustentável e, consagrou princípios (os chamados
Princípios do Rio) que também orientaram os debates em torno da Rio+20 que
aconteceu em 2012 na mesma cidade.

Entre os documentos, destaca-se como um dos mais importantes, o princípio das


responsabilidades comuns, mas diferenciadas, que reconhece que todos os países devem
se comprometer com a proteção do meio ambiente. Ainda de acordo com esse princípio,
os países desenvolvidos, em função das suas contribuições históricas para a degradação
ambiental, e em face de sua disponibilidade de recursos financeiros e tecnológicos,
possuem responsabilidades diferentes, inclusive de apoiar os países em
desenvolvimento para que avancem na direção do desenvolvimento sustentável.

Os resultados da Rio 92 se materializaram em forma de acordos, dos quais a


Agenda 21 foi um dos mais importantes. O documento pontuou a necessidade do
comprometimento de cada país em cooperar com soluções para estabelecer um novo
padrão de desenvolvimento no planeta. Trata-se de um instrumento de planejamento
para a construção de sociedades sustentáveis, que concilia métodos de proteção
ambiental, justiça social e eficiência econômica.

A Agenda 21 Global foi dividida em 40 capítulos, distribuídos em seções como:


Dimensões Sociais e Econômicas, Conservação e Gerenciamento de Recursos para o
Desenvolvimento, Fortalecimento do Papel dos Maiores Grupos e Meios de
Implantação.

A Convenção das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima, também adotada


durante a Rio-92,foi resultado da constatação, já naquela época, da necessidade de
estabilização da concentração de gases do efeito estufa (GEE) na atmosfera para o
equilíbrio do clima do planeta. A maior parte da comunidade científica reconhecia os
riscos da emissão continuada de gases no ritmo em que se verificava à época.

Hoje, a Convenção sobre Mudança do Clima constitui um dos mais complexos


processos internacionais em curso, especialmente em face das dificuldades de divisão de
responsabilidades entre países desenvolvidos e em desenvolvimento, particularmente os
emergentes.
22

Também na Rio 92, foi assinada a Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e
Desenvolvimento. Com base em 27 princípios, o compromisso propôs uma parceria
global a partir da colaboração entre Estados e integrantes da sociedade em que fossem
respeitados os interesses de todos e a integridade do meio ambiente.

Com o avanço dos debates em relação às temáticas ambientais e após a ECO 92,
a reciclagem passou a integrar de forma definitiva a agenda do gerenciamento de
resíduos sólidos urbanos como o terceiro dos “3R’s”.

2.2 LEI 12.305/2010 – A POLÍTICA NACIONAL DE RESÍDUOS SÓLIDOS


(PNRS)

A lei 12.305 de 2010, a Política Nacional de Resíduos Sólidos, foi um


importante passo na gestão de resíduos do país, e forma a tríade legal do saneamento
básico junto com a Lei de Diretrizes Nacionais para o Saneamento Básico (LDNSB) e a
Lei de Consórcios Públicos (LCP). Antes dela, não havia nenhuma grande lei que
delimitasse as regras e metodologias de gestão de resíduos de uma forma integrada,
trazendo o conceito de responsabilidade compartilhada e determinando as funções e
obrigações dos atores dentro das políticas de gestão.
De forma resumida, a lei inova ao trazer além do conceito de responsabilidade
compartilhada onde determina as obrigações e responsabilidades dos municípios,
indústrias, importadores, empresas, varejo, sociedade civil e organizações de Catadores,
lança também a política de logística reversa, impõe o fechamentos dos lixões, aborda a
coleta seletiva solidária com inclusão social de Catadores de materiais recicláveis e dá
diretrizes para que os municípios montem seus planos municipais de gestão integrada de
resíduos. Além disto, prevê também a produção do Plano Nacional, Planos Estaduais e
Regionais. Neste trabalho, a PNRS é a principal base legal para produção da ferramenta
e das diretrizes de diagnóstico, sendo também base de conceitos2 e definições técnicas e
metodológicas, junto do que foi estipulado pelo governo federal para a construção dos
Planos Municipais de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos (PMGIRS).

2
Vide anexo 4: Principais conceitos definidos na lei 12.305/2010 que institui a Política Nacional de
Resíduos Sólidos.
23

De acordo com a PNRS, os Planos Municipais de Gestão Integrada de Resíduos


Sólidos (PGIRS), deverão ter conteúdo mínimo3 (anexo 5) que incluem um diagnóstico
da situação dos resíduos na cidade, que deve conter desde as formas de coleta,
tratamento e disposição, formação de indicadores de qualidade dos serviços públicos de
limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos, programas de educação ambiental,
ações para participação de grupos de Catadores, identificação de passivos ambientais
relacionais aos resíduos sólidos, fiscalização da destinação de resíduos por instituições
privadas, entre outras.

2.3 LOGÍSTICA REVERSA

A lei de logística reversa prevê que os fabricantes de embalagens assumam a


responsabilidade pelo retorno das embalagens pós-consumo para serem usadas como
matéria prima ou serem corretamente descartadas. A definição do volume de resíduos a
serem retornados estão sendo decididos e negociados entre as associações de fabricantes
e importadores e o Ministério do Meio Ambiente, que convidou também representantes
do Movimento Nacional de Catadores de Materiais Recicláveis (MNCR), representados
em formato de associação pela ANCAT no caso de embalagens em geral pós consumo.
Estes acordos entre diferentes esferas são conhecidos como acordos setoriais,
pois foram divididos por setores de produção. Alguns já foram fechados, como o caso
do acordo setorial de embalagens, assinado em 2015 com uma meta em sua primeira
fase de 20% de embalagens retornadas. Estas ações se dão por meio de investimentos
em ações de gestão, coleta e destinação de resíduos, seja por meio de investimento em
organizações de Catadores, implantação de Pontos de Entrega Voluntária (PEVs) como
prevê a PNRS em unidades de varejo, ações de educação ambiental, entre outras.
A primeira fase do acordo setorial de embalagens possuía a meta de dar
destinação ambientalmente adequada à 3.815,081 toneladas de embalagens por dia.
Suas ações se concentraram nas cidades e regiões metropolitanas de Belo Horizonte,
Cuiabá, Curitiba, Distrito Federal, Fortaleza, Manaus, Natal, Porto Alegre, Recife, Rio
de Janeiro, Salvador e São Paulo.

3
No anexo 5 deste trabalho poderão ser encontrados de forma detalhada os itens mínimos a serem
incorporados aos PGIRS municipais.
24

A fase de implementação do sistema de logística reversa previsto no acordo


duraria 24 meses, prazo vencido no último mês de novembro de 2017. Por conta disto,
há uma expectativa entre ambientalistas, Catadores e sociedade civil, na renovação do
acordo, aguadando metas mais ambiciosas e maiores valores de investimento, além de
formas mais eficazes de controle e fiscalização. Até o momento não foram divulgados
os relatórios finais da primeira fase.

2.4 COLETA SELETIVA

De acordo com a PNRS, entende-se como coleta seletiva a coleta de resíduos


sólidos separados de acordo com sua composição ou constituição. Ela é parte do ciclo
da reciclagem e começa na separação dos resíduos no gerador4. Após a coleta, pode ser
realizada uma nova triagem, se necessário, de forma mais minuciosa para que sejam
destinados para o processo industrial.

De acordo com registros, as primeiras iniciativas organizadas de coleta seletiva


no Brasil tiveram início em 1985, mais precisamente no Bairro de São Francisco em
Niterói, cidade da região metropolitana do Rio de Janeiro e recorte escolhido para esta
pesquisa. Esta iniciativa tinha característica popular, já que partiu da associação de
moradores, que até hoje é muito atuante no bairro, liderada pelo professor da
Universidade Federal Fluminense na época e também morador do bairro, Emilio Maciel
Eigenheer.

Porém, é a partir da década de 90 que se destacam iniciativas onde os municípios


passaram a estabelecer algumas parcerias com grupos de Catadores que se organizavam
em cooperativas e associações para a gestão e execução dos programas. Este tipo de
parceria reduzia o custo das ações e veio a se tornar um modelo de política pública de
resíduos sólidos, com inclusão social e geração de renda apoiada por entidades da
sociedade civil.

4
Vide anexo 4: Principais conceitos da Política Nacional de Resíduos Sólidos – Lei 12.305/2010
aplicados à esta dissertação.
25

As parcerias entre Cooperativas e Associações de Catadores com prefeituras se


davam, em sua maioria, a partir da cessão de terrenos ou galpões para a operação de
triagem dos materiais e armazenamento, doação/empréstimo de equipamentos e
veículos para a coleta e em alguns casos em políticas de conscientização e divulgação
do trabalho. Antes da PNRS a participação da população se dava de maneira voluntária,
hoje, tanto pessoas físicas quanto jurídicas tem responsabilidade prevista em lei, sobre
seus resíduos gerados e a destinação correta destes, sendo passíveis de penalidades.

Na grande maioria das cidades, os programas de coleta seletiva são


implementados com recursos provenientes da taxa de limpeza pública ou de taxa
arrecadada junto do Imposto Territorial Urbano (IPTU). A realização de coleta seletiva
reduz custos da gestão de resíduos, já que antes todo o resíduos era destinado para
aterros que em sua maioria, possuem altos custos de destinação e operação. Ainda
assim, muitos municípios alegam não estarem totalmente enquadrados à PNRS por
conta de custo.

Mais dificilmente, tem sido a promoção de ações de coleta seletiva realizadas em


parceria com organizações de Catadores, como previsto em lei. Como descrito no trecho
abaixo por BESEN et al. (2014):

Diversos estudos e pesquisas, tanto em âmbito acadêmico (BESEN et al.


2007; RIBEIRO et al., 2009; DIAS, 2009; JACOBI e BESEN, 2011;
CAMPOS, 2013) quanto técnico (DAMASIO, 2010; IPEA, 2012), têm
apontado as dificuldades que prefeituras e organizações de catadores
enfrentam para prestar o serviço de coleta seletiva aos municípios com a justa
remuneração pelos serviços prestados. Destacam, dentre outras questões: a
prevalência de relações informais entre o poder público e as organizações de
catadores, ausência de cobrança por parte dos municípios do serviço prestado
aos munícipes, ausência de remuneração das organizações de catadores pelos
serviços de coleta seletiva e, ainda, a ausência de cobrança do município do
serviço de logística reversa prestado na coleta seletiva aos fabricantes e
importadores de produtos e embalagens (JACOBI e BESEN, 2011;
ABRAMOVAY, 2013).

As ações de coleta seletiva em municípios que atuem em parceria com


organizações de Catadores podem ser conhecidas de diferentes formas no país, como
coleta seletiva solidária, coleta seletiva com inclusão social, coleta seletiva sustentável,
entre outras (BESEN et al. 2014) a realização de coleta seletiva com grupos organizados
rompe com a lógica de privatização tradicional dos serviços, já que aos poucos
26

incorpora um perfil de inclusão social e geração de renda para os setores mais carentes e
excluídos do acesso aos mercados formais de trabalho (RODRIGUEZ, 2005).

2.5 O CAMINHO DO RESÍDUO NA COLETA SELETIVA SOLIDÁRIA


MUNICIPAL

As atividades de organizações de Catadores em parceria com prefeituras variam


de modelo e inclusive são previstas na PNRS. Em algumas prefeituras, os Catadores são
responsáveis pela coleta e triagem dos resíduos, além de posterior destinação para s
indústrias recicladoras, em outros municípios, a coleta é realizada pelo órgão
responsável da prefeitura e as organizações de Catadores assumem o restante do
processo.

Após a chegada dos resíduos recicláveis nas cooperativas e associações, é


realizado o processo de triagem dos resíduos. Quanto maior detalhamento nesta
separação e maior qualidade5 do material, maior valor agregado terá. A separação do
papel, plástico, vidro e metal passa a ser mais minuciosa, podendo se desdobrar em
dezenas de tipos de recicláveis como: plástico filme (sacolas), “plástico duro”
(embalagens), papel jornal, papel revista, papel branco, papelão, PVC, PET (verde, azul,
branca e óleo), limalha de ferro, sucata, latas de alumínio, entre outros.

Depois de triados, os materiais recicláveis vão para a prensa, onde são formados
os fardos de resíduos que serão comercializados. Alguns materiais como vidro e sucatas
metálicas, por exemplo, geralmente são vendidos soltos em grande caçambas. Os fardos
e caçambas lotadas de resíduos são vendidos para os chamados atravessadores6,
empresas que compram de diferentes fontes e revendem às empresas recicladoras (em
alguns casos também realizam a limpeza e beneficiamento dos resíduos) ou, em alguns
casos, vendidos já diretamente para as indústrias em ações de logística reversa. O valor
de venda dos materiais varia de acordo com a região do país, qualidade do material,

5
Quando fala-se de qualidade do material, entende-se que os resíduos estão mais limpos, ou seja, menos
contaminados com resíduos orgânicos ou itens não recicláveis.
6
Conhecidos também como sucateiros, papeleiros, aparistas, entre outros. Os nomes podem variar entre
as cidades e estados do Brasil.
27

quantidade e frequência7 de venda. As indústrias recicladoras transformam os materiais


recicláveis em matéria prima para a produção de novas embalagens ou produtos que
chegarão novamente ao varejo e às mãos dos consumidores.

2.6 ORGANIZAÇÕES DE CATADORES DE MATERIAIS RECICLÁVEIS

Há relatos desde a década de 50 do trabalho de catação de resíduos recicláveis


no Brasil para garantir sustento próprio e de suas famílias. Porém, é em 1985 que se tem
o primeiro relato de organização destas pessoas. Neste ano, surgiu a Associação de
Carroceiros do Município de Canoas no Rio Grande do Sul e em 1986 a fundação da
Associação de Catadores de Materiais Recicláveis de Porto Alegre. Concomitantemente
surgia em São Paulo a Organização dos Sofredores de Rua em 1986, que veio a se
tornar a Cooperativa de Catadores Autônomos de Papel, Aparas e Materiais
Reaproveitáveis – Coopamare em 1989 e existente até os dias de hoje. Pouco tempo
depois, veio o surgimento da associação de Catadores de Papel, Papelão e Material
Reaproveitável – ASMARE em Belo Horizonte no ano de 1990 (MARTINS, 2004).

As primeiras organizações de Catadores eram apoiadas por grupos da igreja


católica, que tinham como finalidade incluir estas pessoas socialmente, tendo uma vida
melhor e condições dignas de trabalho. A venda dos recicláveis, até então desprezados
pela maioria da população, garantia renda aos grupos e consequentemente às suas
famílias. Posteriormente, alguns ambientalistas e organizações não governamentais,
iniciaram o apoio aos grupos, e depois, alguns técnicos de prefeitura ligados à área
ambiental também começaram a incluí-los em iniciativas municipais, já que perceberam
ali, uma atividade que beneficiava a população e o papel de gestão de resíduos
municipais das prefeituras.

Têm-se registro da primeira parceria oficial entre prefeitura e organização de


Catadores para realização de coleta seletiva municipal no ano de 1989 em São Paulo,
quando a prefeitura tornou-se parceira da Cooperativa COOPAMARE, que na época,
era composta por um grupo de 20 Catadores. Esta parceria se deu por meio da cessão de

7
Para os compradores (grandes recicladores) é interessante ter um fornecedor que garanta qualidade e
também frequência de venda de materiais, assim, muitos deles costumam negociar melhor preço de
compra ou facilidades para aquelas organizações que se encaixarem neste requisito.
28

um espaço sob um viaduto para que os mesmos pudessem realizar seu trabalho de
triagem e armazenar os materiais coletados e demais equipamentos. Neste mesmo ano, a
Prefeitura de São Paulo promulgou um decreto onde reconhecia o trabalho profissional
do Catador (BESEN; RIBEIRO, 2007).

Seguindo o exemplo da cidade de São Paulo, as cidades de Santos (SP) e Porto


Alegre (RS) em 1990 e Belo Horizonte (MG) em 1993 também implantaram ações de
coleta seletiva em seus municípios fazendo parceria com cooperativas e associações de
Catadores, reconhecendo a profissão de Catador e suas atividades como importante
prestação de serviço ambiental para a sociedade.

2.7 O MOVIMENTO NACIONAL DE CATADORES DE MATERIAIS


RECICLÁVEIS (MNCR)

Apesar dos registros de Catadores existirem no país desde a década de 50, como
já abordado anteriormente, estes só passaram a se organizar politicamente e de
amplitude nacional em meados de 1999 quando aconteceu o 1º Encontro Nacional dos
Catadores(as) de Papel. No ano de 2001, fundaram o Movimento Nacional de
Catadores(as) de Materiais Recicláveis (MNCR) durante o 1º Congresso Nacional de
Catadores(as) de Materiais Recicláveis também em Brasília. Este último, reuniu mais de
1700 Catadores e Catadoras, onde lançaram a Carta de Brasília , “Pelo fim dos lixões:
reciclagem feita pelos catadores: já!”, um documento que possui as principais diretrizes
e reivindicações do MNCR.

O documento possuía três principais eixos de reivindicação: propostas de ações


do MNCR em relação ao Poder Executivo, à cadeia produtiva da reciclagem e à
cidadania dos moradores de rua, detalhados por SILVA (2006):

Do Poder Executivo exigiu-se a garantia, por meio de convênios, de


que fossem repassados aos catadores recursos e subsídios que
visassem a inclusão social por meio do trabalho, e a qualificação para
este, a inclusão de seus militantes no Plano Nacional de Qualificação
Profissional do Governo Federal, adoção de políticas e medidas que
possibilitassem o aperfeiçoamento tecnológico, bem como a
erradicação dos lixões no país. Quanto à cadeia produtiva da
reciclagem a exigência foi no sentido de serem criados dispositivos
institucionais que assegurassem que a reciclagem fosse realizada
prioritariamente por empresas sociais de catadores de materiais
recicláveis. Em relação à cidadania da população que vive nas ruas,
um dos principais pontos foi a exigência do reconhecimento da
população de rua, por meio de sua inclusão no censo demográfico
29

nacional realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística


(IBGE).

De acordo com SILVA (2006), com a realização do primeiro encontro, os


Catadores passaram a se reunir com maior frequência e realizar encontros nacionais
anualmente. Uma das grandes vitórias dos Catadores foi conquistada no ano de 2002,
quando se instituiu a portaria 397 que tornou a ocupação de Catador de material
reciclável parte do Código Brasileiro de Ocupações (CBO) sob o número 5192 8·. Um
ano depois, em 2003, ocorreu o 1º Congresso Latino-americano de Catadores na cidade
de Caxias do Sul no Estado do Rio Grande do Sul. Este foi organizado em parceria com
representantes dos movimentos da Argentina e Uruguai. Neste congresso foi
confeccionada a Carta de Caxias, difundindo a realidade dos Catadores da América
Latina

2.8 PESQUISA QUALITATIVA

Para que se identifique a satisfação e engajamento dos moradores do bairro de


São Francisco com a Coleta Seletiva municipal, foi utilizada como ferramenta
metodológica a pesquisa qualitativa. Com base em estudos bibliográficos sobre o tema,
produziu-se um questionário e realizaram-se entrevistas com moradores locais.

Em seu capítulo RAMIRES e PESSOA (2013, p23), afirmam que a pesquisa


qualitativa possui mais de um século de existência e que teve sua consolidação ao ser
utilizada como uma ferramenta alternativa por pesquisadores das ciências sociais e
humanas que, inicialmente, seguiam as diretrizes de uso da ferramenta das ciências
naturais. A partir do uso da pesquisa qualitativa pelas ciências sociais e humanas, outras
áreas começaram a incorporá-las em seus trabalhos, como a educação, a saúde, a
administração de empresas e etc.

8
Descrição de acordo com o Código Brasileiro de Ocupações: “Os trabalhadores da coleta e seleção de
material reciclável são responsáveis por coletar material reciclável e reaproveitável, vender material
coletado, selecionar material coletado, preparar o material para expedição, realizar manutenção do
ambiente e equipamentos de trabalho, divulgar o trabalho de reciclagem, administrar o trabalho e
trabalhar com segurança.” Disponível em: www.mtecbo.gov.br
30

Com o uso da pesquisa qualitativa em diferentes áreas das ciências sociais e


humanas, como sociologia, psicologia, antropologia, história e etc, há uma dificuldade
em se ter uma definição única sobre ela. Para MINAYO (1994, p.24):

podem se definir como pesquisas qualitativas aquelas que são capazes de


incorporar o significado e a intencionalidade como inerentes aos atos, as
relações e as estruturas sociais, sendo estas últimas tomadas tanto em seu
advento quanto em sua transformação como construções humanas
significativas.

Em “Técnicas que fazem o uso da palavra, do olhar e da empatia – Pesquisa


qualitativa em ação”, MINAYO e COSTA (2019, p.10) afirmam que as pesquisa
qualitativas tem como matéria prima um conjunto de substantivos cujos sentidos se
complementam: “experiência, vivência, senso comum e ação. E o movimento que
informa qualquer abordagem, se baseia em três verbos: compreender, interpretar e
dialetizar”. De forma prática, definem que a pesquisa qualitativa se divide basicamente
em três etapas de trabalho: a primeira fase, exploratória, a segunda fase, o trabalho de
campo e a terceira fase que seria a análise do material coletado de forma empírica e
documental.

Dentre os pesquisadores, é comum se comparar as pesquisas qualitativas e


quantitativas de uma maneira competitiva, como se a utilização de uma fosse superior à
outra, ou que uma contribuísse menos ou mais para as pesquisas e estudos ou uma
mostrasse mais a realidade do que outra. Porém, em MINAYO e COSTA (2019, p.25)
lê-se que:

a dicotomia entre quantitativo qualitativo não é real, e pode se, no máximo,


priorizar uma ou outra, por qualquer motivo, mas nunca insinuar que uma se
faria as expensas da outra, ou contra outra. Todo fenômeno qualitativo, pelo
fato de ser histórico, existe um contexto também material, temporal, espacial.
E todo fenômeno histórico quantitativo, se envolver o ser humano, também
contém a dimensão qualitativa. Assim, o reino da pura quantidade ou da pura
qualidade é ficção conceitual.

Porém, RAMIRES e PESSOA (2009, p.521) enfatizam que os pesquisadores


qualitativos, possuem uma maior preocupação com o processo, ao invés de apenas com
os resultados, tendo o ambiente natural como uma fonte direta de dados e sendo também
dada grande importância à interpretação das ações sociais. Para a pesquisa qualitativa,
todo o contexto de vida, ambiente e questões que norteiam a vida do entrevistado são
levados em conta e enriquecem a produção da pesquisa. E precisam ser conhecidos
tanto pelo pesquisador como por aquele que consulta o estudo.
31

MINAYO e COSTA (2019, p.10) em seu recente trabalho, trazem uma visão
extremamente importante sobre a pesquisa qualitativa onde enfatizam que a sua
principal função é compreender. Onde um ser humano exerce a capacidade de se
colocar no lugar do outro. MINAYO e COSTA (apud GADAMER, 2019, p.10), afirma
que para compreender o outro, tem que se levar em conta sua singularidade, já que sua
subjetividade demonstra a sua forma de interpretar o mundo, a vida, suas relações e
marca suas ações. MINAYO (2017a) cita William Thomas, um dos fundadores da
pesquisa qualitativa na Escola de Chicago usando uma de suas expressões: “Quando
alguém considera uma situação como real, ela é real em suas consequências”.

Porém, é importante ressaltar que a história de uma pessoa vai além de suas
experiências e vivências, sendo também resultado de influências externas, fazendo parte
de uma história coletiva, comunitária e institucional e está diretamente ligada à cultura
do grupo social em que aquela pessoa está inserida. É por conta disso que a pesquisa
qualitativa precisa estar munida não apenas de questões e dúvidas respondidas, mas de
um olhar sistêmico e também local das condições e características de vida daquela
pessoa, comunidade ou recorte escolhido. Compreender a realidade humana precisa ser
sempre guiada por um olhar ao individual e também ao social. A fala, por meio das
entrevistas, passa então a revelar condições de vida, de sistemas de crenças e transforma
o entrevistado em um porta voz do que pensam outras pessoas dentro da mesma
conjuntura social, econômica e cultural.

A partir da compreensão daquela realidade ou indivíduo gera-se a interpretação.


E, de acordo com MINAYO e COSTA (2019, p.11), por melhores técnicas de análise
que um pesquisador possa ter, o que é expresso e observado poderá gerar diferentes
formas de interpretação. Se aproximando assim do que Bachelard citado por MINAYO
e COSTA (2019, p.11) chama de “conhecimento aproximado” e se distanciando
completamente de qualquer tipo de verdade absoluta. Assim, pesquisadores devem
sempre ter como objetivo o uso de métodos que façam sua pesquisa ser o mais
compreensível e válida, mas sem ter qualquer pretensão de ter alcançado a completa
verdade, mas sim de ter se aproximado o máximo possível dela.

E neste caminho de aproximação da verdade, MINAYO e COSTA (2019, p.12)


afirmam que durante a etapa de campo, o pesquisador poderia utilizar diferentes
32

técnicas, inclusive, alguma criada por ele mesmo com o uso da palavra, da observação
e, se necessário, da imagem. Se adequando ao ambiente e ao público de sua pesquisa.

É no campo, que o pesquisador utiliza duas ferramentas importantes da


investigação qualitativa: a entrevista e a observação. A entrevista, utilizando ou não
questionário, é guiada pelas hipóteses trazidas pelo pesquisador em seus estudos
primários em relação ao tema escolhido. MINAYO (2012, p.263) cita Lévy-Strauss que
em seu trabalho afirmou que “o trabalho de campo é mãe e nutriz de toda dúvida (...)
antropológica que consiste em se saber que nada se sabe, mas, também em expor o que
se pensava saber, às pessoas que [no campo] podem contradizer [nossas verdades mais
caras]”.

MINAYO (2015) considera a entrevista como “uma conversa com finalidade”,


onde se pode caminhar de três formas diferentes: entrevista estruturada, onde há um
questionário totalmente estruturado e fechado onde a escolha dos entrevistados está
diretamente influenciada pelas perguntas contidas na ferramenta; entrevista
semiestruturada, onde há a combinação de um roteiro com perguntas formuladas
previamente e perguntas abertas, onde há maior liberdade do pesquisador em absorver
informações anteriormente não previstas e também ao entrevistado uma reflexão mais
livre espontânea sobre a temática; e a entrevista aberta, onde o pesquisador apenas
apresenta o tema de sua pesquisa, o objetivo e o rumo que deseja e o entrevista pode
falar livremente sobre o tema, podendo ser questionado pelo pesquisador em alguns
momentos, visando aprofundar os pontos mais importantes daquela narrativa. Nesta
pesquisa, utilizou-se o modelo de entrevistas semiestruturadas.

A observação em campo também pode ser categorizada como a entrevista.


MINAYO e COSTA (2019, p.20) citam GOLD (1958) que descreveu os diferentes tipo
de observação como: participante-total, onde um investigador se insere no grupo de tal
forma como um nativo, correndo o risco de perder a perspectiva crítica e o
estranhamento; o participante-como-observador, onde o pesquisador claramente
apresenta ao entrevistados que sua participação naquele ambiente tem um objetivo com
tempo definido, mas ainda assim, compartilha do cotidiano daqueles entrevistados,
participando de eventos e adotando hábitos locais; o observador-como-participante, que
está focado mais na entrevista e utiliza a observação concomitantemente à pesquisa,
num menor espaço de tempo; e o observador-total, que não se comunica nem se envolve
33

com o ambiente e os entrevistados, sendo este último método, menos utilizado em


pesquisas qualitativas por estar mais distante da empatia que se espera neste tipo de
pesquisa. Adotou-se nesta pesquisa a postura de observador-como-participante.

Com o fim da fase de campo, é preciso realizar a análise dos dados coletados.
Estes podem estar em forma de escrita, áudio e imagens. MINAYO e COSTA (2019)
apontam passos importantes da fase de análise: ordenação e organização do material,
onde se reúne os materiais de entrevista e observação, além de se revisar o conteúdo
teórico e de referência; a categorização, que MINAYO (2012) chama de “busca de
unidades de sentido”, onde se classificam as falas por semelhança e automaticamente
por temas; contextualização dos temas destacados, apresentando os principais pontos
levantados pelos entrevistados que MINAYO (2012) chama de “lógica interna” daquele
grupo estudado e que prende agora o pesquisador ao sentido e não mais às falas; e a
interpretação de segunda ordem, uma problematização das unidades de sentido
individualmente.

Porém, MINAYO e COSTA (2019, p.27) mais uma vez enfatizam que por
melhor que seja a técnica e habilidade do pesquisador na interpretação do objeto
estudado, ela nunca representará a única possibilidade,

pois o sentido de uma mensagem ou de uma realidade está sempre aberto em


várias direções. No entanto, quando bem conduzida, uma análise deve ser fiel
ao campo, de tal maneira que caso os entrevistados estivessem presentes,
compartilhariam os resultados.

MENDES E PESSÔA (apud LUNA, 2009, p.525) citam LUNA que diz que não
devemos esperar que o pesquisador prove a veracidade de suas constatações, mas sim a
relevância da produção do conhecimento. Para ela, “a evolução do pensamento
epistemológico assinala a substituição da busca da verdade pela tentativa de aumentar o
poder explicativo das teorias”.

2.9 RECORTE GEOGRÁFICO ESCOLHIDO: O BAIRRO DE SÃO


FRANCISCO EM NITERÓI - RJ

O bairro de São Francisco está situado (figura 2) em uma área nobre da cidade
de Niterói, região metropolitana do Estado do Rio de Janeiro. São Francisco localiza-se
na região das praias da Baía da cidade e de acordo com o CENSO 2010, possui 9.712
habitantes residindo em 3.914 domicílios, tendo uma média de 2,9 moradores por
domicílio, já que 14,6% dos domicílios do bairro encontram-se desocupados. A sua
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população tem uma alta taxa de envelhecimento, também demonstrado no Censo, onde
a taxa de jovens é de 12.8% e de idosos 17,8%, o que foi identificado também durante
as atividades de campo da pesquisadora.

Figura 2 - Mapa de localização do bairro de São Francisco na cidade de Niterói (em vermelho)

Fonte: Por Marcos Ceia - Obra do próprio, CC BY-SA 3.0,


https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=23274566

Os primeiros relatos sobre o bairro datam do século XVII, em textos que falam
da capela de São Francisco Xavier (figura 3 e 4), construída pelos jesuítas no que antes
era uma fazenda e existente até os dias de hoje. Diz-se que José de Anchieta teria
participado de da fundação da primeira capela (antes da atual que permanece no bairro)
em 1572. Com a expulsão dos Jesuítas, as terras foram desmembradas entre algumas
famílias importantes da época. Uma delas, a família Fróes, que construiu a Estrada
Fróes que possibilitou a ligação de São Francisco à Icaraí, margeando o Morro do
Cavalão. Pois, anteriormente, a maior parte dos acessos feito ao local eram por via
marítima. Diz-se em relatos históricos que até a década de 40 o bairro ainda era pouco
ocupado, com uma vegetação de restinga e mata abundante em suas encostas. Por suas
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belezas naturais, era destino de passeios e temporada para pessoas vinda do Rio de
Janeiro.

Figura 3 - Imagem da capela de São Francisco Xavier (sem data precisa)

Fonte: https://biblioteca.ibge.gov.br/biblioteca-catalogo.html?view=detalhes&id=443110

Figura 4 - Imagem atual da capela de São Francisco Xavier

Disponível em: https://www.culturaniteroi.com.br/blog/?id=526&equ=depac

São Francisco está localizado em uma área de alto padrão da cidade de Niterói.
Em boa parte do bairro, é possível encontrar apenas ruas residenciais muito arborizadas
(figura 5), sendo compostas em maioria por casas grandes com características
arquitetônicas da década de 70 e 80 em atual bom estado de conservação. Há alguns
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comércios como supermercados, farmácias, pequenas lojas de roupas, entre outros e


serviços de apoio como escolas, academias e clínicas médicas que encontram-se em sua
maioria ao longo da Avenida Rui Barbosa, que termina na Estrada da Cachoeira, ligação
do bairro com a região das praias oceânicas de Niterói.

Figura 5 - Rua Araibóia em janeiro de 2019. Uma das ruas do bairro, como exemplo da grande
arborização do mesmo

Disponível em:
https://www.facebook.com/photo.php?fbid=10218150289816575&set=pcb.2528396130523109&type=3
&theater

O bairro possui uma praia, banhada por águas da Baía de Guanabara, chamada
praia de São Francisco (figura 6). Que possui uma bela vista para o Rio de Janeiro e
outros bairros da cidade. De frente para ela está a Avenida Quintino Bocaiúva, onde
encontra-se um polo gastronômico da cidade e alguns prédios residenciais. São
Francisco possui muitas áreas verdes em suas encostas e é nele que está localizado o
conhecido Parque da Cidade, reserva florestal e uma das áreas de preservação geridas
pela Prefeitura de Niterói, dentro do PARNIT (figura 7). Essa proximidade com a
natureza apareceu como justificativa, durante as conversas da pesquisadora com os
moradores do bairro, para a conscientização e envolvimento com questões ambientais
pelos mesmos.
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Figura 6 - Vista de São Francisco a partir do Parque da cidade

Disponível em: https://olhares.sapo.pt/parque-da-cidade-niteroi-brasil-foto6458707.html

Figura 7 - Vista do bairro de São Francisco a partir da Estrada Fróes. A montanha cheia de
vegetação atrás das construções trata-se do famoso Parque da Cidade
Fonte: Autoria própria

Com o passar dos anos e com a pressão da especulação imobiliária, vários


bairros de Niterói que tinham características residenciais, com a presença de muitas
casas de rua ou vilas, tiveram estas demolidas para construção de grandes prédios. Isto
mudou um pouco as características visuais da cidade e em bairros como Icaraí e
Charitas, que fazem divisa com São Francisco, hoje são raras as casas encontradas.
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Porém, São Francisco conseguiu manter em boa parte do bairro, ruas apenas com casas.
Isso se deve à atuação da Associação de Moradores (CCSF) que incansavelmente luta
para que seja respeitada a legislação que não permite a construção de grandes prédios no
bairro e afastar a pressão da especulação imobiliária.
Não só pela experiência da pesquisadora que vive no bairro, mas também em
conversas com os moradores durante as entrevistas e em observação aos grupos de
moradores do facebook, obteve-se a informação de que ainda há uma grande pressão da
especulação imobiliária para que casas do bairro sejam demolidas e deem lugar a
prédios. Os moradores questionam a construção de prédios por diferentes motivos.
Justificam que o bairro não tem ruas ou infraestrutura para receber tantos moradores.
Pois, de onde retira-se uma ou duas casas, habitadas por uma família de em média 4
pessoas, constrói-se um prédio com vários andares, vários apartamentos e vários
automóveis, e isto traria um grande impacto social e ambiental para o bairro. Além
disso, reclamam também da questão da ventilação natural vinda da praia e também do
sol, já que a construção de grandes empreendimentos poderia influenciar nestes
aspectos. Apesar disto, hoje o bairro já possui alguns prédios construídos,
principalmente na Avenida que beira a Praia, porém com limite de altura.
Outra questão muito falada pelos moradores nos grupos de facebook, em relação
aos impactos ambientais do bairro, são as os corte das árvores. O bairro possui muitas
árvores, como já citado aqui, que além de trazer beleza local, promovem sombra,
auxiliam que o bairro tenha uma temperatura mais fresca e um ar mais puro. Porém,
muitos moradores tem relatado cortes indevidos realizados pela prefeitura municipal e
demonstram extrema insatisfação. Essas, como outras preocupações verificadas,
mostram que os moradores antigos do bairro, possuem um envolvimento, interesse e
preocupação com as questões ambientais relacionadas ao local onde vivem.

Historicamente, a associação de moradores local (CCSF) sempre teve muita


força. Porém, de acordo com alguns relatos de conversa com moradores, hoje ela está
mais enfraquecida, já que novos moradores, principalmente os mais jovens, não tem
interesse em se dedicar. Outra justificativa para o enfraquecimento das ações locais pela
Associação de Moradores seria o envelhecimento da população do bairro, já citado aqui.
O bairro, em sua maioria, era composto por residências onde moravam pai, mãe e seus
filhos e em alguns casos, avós.
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Com o passar do tempo, boa parte destes filhos se mudaram do bairro e não
retornaram. Isso pode ser verificado na própria pesquisa realizada com os moradores e
nas conversas que foram mantidas. A maioria hoje vive sozinha com o seu parceiro ou
parceira e os filhos vivem em outras cidades, estados ou até países. Não é comum que
os jovens e adultos de hoje tenham interesse em morar nas casas do bairro, seja pelo alto
custo tanto de compra, como de conservação e manutenção, além da preocupação com a
segurança. Já que a maioria das casas estão em “beira de rua”. Hoje muitos dos novos
moradores do bairro, optam por morar em prédios ou condomínios fechados, onde tem
acesso à segurança privada e à manutenção dos espaços. Como justificou um dos
entrevistados, o bairro se tornou envelhecido, e assim, há uma menor disponibilidade ou
possibilidade de dedicação de alguns moradores às questões locais.

2.10 O PROJETO COMUNITÁRIO DE COLETA SELETIVA NO BAIRRO


DE SÃO FRANCISCO

Apesar de diferentes relatos sobre reciclagem e coleta seletiva no Brasil desde a


década de 40, foi apenas em 1985 que se criou o primeiro projeto de coleta seletiva de
forma organizada e documentada. São Francisco foi o primeiro bairro do Brasil a ter um
programa de coleta seletiva, resultado do trabalho da associação de moradores local
(Centro Comunitário São Francisco – CCSF) e liderada pelo professor da Universidade
Federal Fluminense (UFF) Emilio Maciel Eigenheer.

O projeto contou inicialmente com o apoio da Prefeitura da cidade de Niterói, a


Companhia de Limpeza Urbana do Rio de Janeiro (COMLURB) e da extinta Fundação
Estadual de Engenharia do Meio Ambiente (FEEMA) atualmente INEA (Instituto
Estadual do Ambiente). Alguns anos depois, em 1991, criou-se na UFF, universidade
cujos campus localizam-se em Niterói, um Centro de Informação sobre Resíduos
Sólidos (CIRS) para que pudessem ali serem produzidas pesquisas e trabalhos dentro da
temática.

Para que o projeto fosse iniciado, foi recebido um apoio financeiro da Agência
Alemã de Cooperação Técnica (GTZ), que tornou possível a construção de uma
pequena área de triagem, compra de um micro trator (figura 8) e duas caçambas.
Durante os anos seguintes de projeto, o mesmo teve apoio de outras instituições como
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Fundação Vitae, ONGs Genève Tiers‑Monde (GTM) da Suíça e Doen da Holanda, a


Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), o Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico (CNPq), a Fundação CarlosChagas de Amparo à Pesquisa do
Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ), a Universidade de Tübingen/Alemanha, Ministério
de Educação e AMBEV.

Figura 8 - Micro-trator de coleta seletiva utilizado pelo projeto até 2013


Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/esa/v20n4/1413-4152-esa-20-04-00677.pdf

O projeto chegou a alcançar 1200 domicílios e em seu início, contou com o


trabalho de estudantes da UFF que visitaram residências informando os moradores e
tirando possíveis dúvidas. Vale ressaltar que a participação dos moradores era
voluntária. Nos últimos anos em que esteve sob a gestão do grupo de moradores,
contava com três micro-tratores para a coleta, cinco carretas de madeira (figura 9) e uma
prensa hidráulica para produção dos fardos. A partir de 2013, resultado de uma parceria
com a CLIN, houve o fornecimento de um caminhão de carroceria aberta com
motorista, parando assim de se utilizar os micro-tratores e carretas e diminuindo o custo
do projeto.
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Figura 9 - Exemplar de uma das carretas de madeira utilizadas pelo projeto. Fotografia da
exposição que comemorou os 30 anos de coleta seletiva no Brasil e do projeto em 2015 no Solar do
Jambeiro em Niterói.
Disponível em: http://culturaniteroi.com.br/blog/?id=1759

Em 2012, registrou-se a média de destinação para a reciclagem de 20 toneladas


ao mês de resíduos coletados no bairro. O projeto contava com 4 funcionários, dois
deles pela manhã, realizam a coleta nos domicílios (incluindo casas e edifícios) e depois
se juntavam aos outros na parte da tarde para realizarem a triagem dos resíduos (figura
10). Em algumas épocas de maior geração de resíduos, contratavam mão de obra extra.
O espaço de realização de triagem e apoio (figura 11) era de 600m² com uma parte
coberta e algumas caçambas para resíduos. Itens como roupas, livros, revistas e alguns
utensílios domésticos eram coletados separadamente e destinados à doação.

Figura 10 - Área de triagem vista de cima


Fonte: http://www.scielo.br/pdf/esa/v20n4/1413-4152-esa-20-04-00677.pdf
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Figura 11 - Área de triagem de resíduos


Fonte: http://www.scielo.br/pdf/esa/v20n4/1413-4152-esa-20-04-00677.pdf

Como lições aprendidas do projeto, EIGENHEER e FERREIRA (2015)


concluíram que a área destinada à triagem se mostrou inadequada. Principalmente por
conta de não possuir cobertura e a organização possível dentro dela não ser a ideal e ter
provavelmente influenciado na produtividade. Para eles, a existência de um galpão
traria muitos avanços ao projeto. Ainda assim, afirmam que consideraram a
produtividade alcançada de 5 toneladas/mês por funcionário satisfatória, principalmente
se comparada a outros casos de coleta seletiva pelo país.
Os funcionários que atuavam no projeto eram contratados pelo CCSF via CLT, o
que gerava um custo maior do que se fossem cooperados como acontece em muitos
projetos e organizações que atuam na área de coleta seletiva de resíduos recicláveis. Isto
fez com que o custo do projeto começasse a inviabilizá-lo, já que a venda dos
recicláveis não era suficiente para sua manutenção.
O projeto que em 30 anos teve gestão e operação comunitária, feita pelos
moradores e membros da associação, nunca recebeu nenhuma quantia ou aporte
financeiro da prefeitura de Niterói, mesmo que aquele serviço que ali faziam fosse de
total interesse para a mesma já que reduziam seus custos operacionais. Em outras
cidades, como São Paulo, por exemplo, todas as organizações que realizam coleta
seletiva em domicílios, que de acordo com a PNRS é papel da prefeitura, fecham
parceria com a prefeitura e recebem por serviços ambientais prestados. Porém, estas
organizações se caracterizam como cooperativa, o que não era o caso de São Francisco,
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que segundo EIGENHEER e FERREIRA (2015) possa ter sido um entrave para que
recebessem mais apoio.
EIGENHEER e FERREIRA (2015) também relatam como lição, as maneiras de
engajar e fidelizar os moradores participantes com o projeto. Afirmam que é preciso dar
atenção a pontos como a regularidade do serviço, coletando sempre no mesmo dia,
mesmo que este seja feriado e a cordialidade e paciência no atendimento aos moradores
no momento de coleta, inclusive com conversas rápidas que auxiliam na criação do
vínculo entre os mesmos. Um ponto negativo da relação com os moradores era o fato de
alguns colocarem junto aos resíduos itens não recicláveis. Os gestores do projeto
consideravam que comunicar isso à população poderia trazer consequências negativas, o
que fez com que continuassem coletando estes itens e tivessem um percentual de 5% de
rejeito dentre os materiais coletados.
A grande maioria de casos onde o projeto perdeu participantes foi quando os
moradores mudavam de residência ou faleciam. EIGENHEER e FERREIRA (2015),
relatam também um fato comum de filhos de moradores que se mudavam de bairro mas
mantinham o hábito de levar seus recicláveis para a casa dos pais, para que assim
fossem destinados à coleta seletiva. Esta informação se confirmou durante as entrevistas
realizadas nesta pesquisa.
Na primeira gestão do atual prefeito da cidade de Niterói Rodrigo Neves, a
Companhia de Limpeza de Niterói (CLIN) assumiu definitivamente a coleta seletiva no
bairro de São Francisco, após 30 anos de gestão comunitária. De acordo com relatos
coletados durante as entrevistas desta pesquisa e também em artigos do professor
idealizador, os custos da operação inviabilizaram a continuidade da gestão pelo CCSF.
A coleta seletiva passou também a acontecer em diferentes pontos da cidade.
Seja pela coleta porta a porta, como também pela instalação de 17 Pontos de Entrega
Voluntária (PEVs) espalhados pelo município. Diferentemente de outras prefeituras,
que realizam o serviço de coleta seletiva de forma regular, a CLIN optou por atuar com
coleta por cadastramento. Ou seja, moradores interessados em participar da coleta
seletiva, entram em contato com a companhia de limpeza e solicitam a coleta. Para que
assim, sejam incluídos na rota dos caminhões e recebam as devidas orientações (figura
12). Porém, a prefeitura informa em seu site que Niterói é 100% assistida pela coleta
seletiva.
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Figura 12 - Exemplo de folheto para orientações de moradores e que consta no site da Prefeitura de
Niterói
Disponível em: http://www.clin.rj.gov.br/?a=coletaseletiva

O site da Prefeitura de Niterói informa que hoje de 3% a 5% dos resíduos


coletados na cidade são reciclados. E que, todos os resíduos recicláveis coletados são
doados para organizações de Catadores locais. Porém, uma das cooperativas citadas no
site já não está mais em funcionamento e a outra, sabe-se que se encontra em condições
precárias. Um outro porém, foi um edital lançado pela mesma prefeitura há alguns anos,
onde abriam concorrência para empresas compradoras de recicláveis, ou seja, com foco
em vender os recicláveis coletados pelo município, o que segue caminho totalmente
oposto ao que se indica na PNRS, onde resíduos recicláveis deveriam ser destinados às
organizações de Catadores locais e indo também de encontro à leis que limitam o poder
da prefeitura em realizar vendas.
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Sem sucesso, tentou-se nesta pesquisa entrevistar representantes da CLIN,


porém, a pesquisadora não foi recebida. Consequentemente, são se obteve dados
precisos com o número atual de resíduos recicláveis coletados no bairro de São
Francisco e nem o número de residências atendidas. Já que, durante suas idas à campo, a
pesquisadora identificou ruas que participavam do projeto comunitário e hoje não estão
recebendo o serviço de coleta seletiva municipal. É curioso também ressaltar, que dados
e informações sobre o número de PEVs, percentual de recicláveis e de resíduos
coletados no município (cerca de 565 toneladas de resíduos domiciliares e 200 toneladas
de resíduos públicos diários), são encontrados da mesma forma em diferentes sites com
entrevistas, artigos e outros produzidos pela prefeitura ou com participação de seus
responsáveis, mesmo com grande diferença de anos (exemplo: entrevista dada por
funcionária da CLIN em 2015 contendo mesmos dados de site atualizado da prefeitura
em 2019).
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3 MATERIAIS E MÉTODOS

3.1 A PESQUISA QUALITATIVA

Historicamente, São Francisco foi o primeiro bairro do Brasil a ter uma


iniciativa de coleta seletiva. Como já dito, a ação começou como um projeto dos
moradores em 1985 e nos últimos anos foi assumido pela Companhia de Limpeza de
Niterói (CLIN), de responsabilidade da Prefeitura da cidade de Niterói. As entrevistas
tiveram o objetivo de entender, com base na experiência de cada um dos moradores,
como está a qualidade da prestação de serviço de coleta seletiva municipal e o quão
engajados estes permanecem, já que muitos fizeram parte da criação do projeto. Em seu
artigo, MINAYO (2012) enfatiza a importância de em uma pesquisa qualitativa não
apenas buscar compreender o entrevistado ou o assunto a ser pesquisado mas também
exercitar o entendimento das contradições existentes entre eles: “o ser que compreende,
compreende na ação e na linguagem e ambas têm como características serem
conflituosas e contraditórias pelos efeitos do poder, das relações sociais de produção,
das desigualdades sociais e dos interesses ”.

O questionário utilizado (anexo 2) foi criado considerando que todos os


entrevistados participam ou já participaram da coleta seletiva no bairro e se baseia em
definições e conceitos contidos e definidos na PNRS, que funciona como marco teórico
para a pesquisa. Além disto, as perguntas se baseiam em hipóteses reunidas pela
pesquisadora em sua experiência profissional e pesquisa, como sugere MINAYO
(2012),

“feita a análise das fontes de pesquisa, o investigador deve escolher o marco


teórico que vai adotar, detalhando os conceitos, as categorias e as noções que
fazem sentido para sua pesquisa. Este é o momento também de colocar de
forma mais fundamentada as hipóteses ou os pressupostos que já existiam
como intuição nas indagações iniciais.”.

As principais hipóteses reunidas para a construção do questionário envolvem as


contradições existentes entre a Política Nacional de Resíduos Sólidos e a efetividade de
aplicação de suas diretrizes; a falta de interesse e em alguns casos infraestrutura de
prefeituras para adequação à mesma; a temática de resíduos ser de alto interesse e uso
para ações ilícitas de corrupção em prefeituras, a possível ineficiência e fragilidade do
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acordo setorial de embalagens9 assinado em 2015 e baixo número de casos de sucesso


de implantação de programas de coleta seletiva municipal. Também como indagação
inicial, tem-se a questão da eficiência de um programa de coleta seletiva resultado de
uma ação popular dos próprios moradores comparado ao programa implantado pela
Prefeitura, o comparativo histórico entre o engajamento de moradores há 30 anos atrás e
agora, quando o poder de consumo do Brasileiro aumentou e consequentemente a
produção de resíduos.

A pesquisa baseou-se também nas recomendações de Mendes e Pessôa (2009, pg


523), que disseram que as questões para a entrevista devem ser claras, concisas e estar
centradas no objetivo da pesquisa e ainda considerar as especificidades de cada
colaborador. Ao definir o público da entrevista, preocupou-se que todos os
entrevistados fossem participantes da coleta seletiva no bairro e não tivessem
proximidade ou vínculo com a pesquisadora, que também é moradora do bairro e atua
na área de resíduos há anos. A intenção era manter o máximo de neutralidade, mesmo
que a imparcialidade total fosse impossível, já que a pesquisa qualitativa precisa de um
ambiente mais humanizado e descontraído, como também afirma Taquette (2016,
p.526): “Nos estudos qualitativos a postura é diferente, pois não se concebe que existam
pesquisas com neutralidade absoluta por se tratar de seres humanos”. E que se soma ao
que diz Cruz (2018, p.63): “Na compreensão da situação dada numa pesquisa qualitativa
, a empatia é uma relação com a diferença do outro.”

A partir disto, os entrevistados foram indicados por pessoas próximas ou de


forma voluntária por meio de um post em um grupo de moradores nas redes sociais feito
pela pesquisadora e, posteriormente, indicados por outros participantes da pesquisa.

9
Acordo Setorial para Implantação do Sistema de Logística Reversa de Embalagens em Geral previsto na
lei 12.305/2010 seguindo as diretrizes de logística reversa. Assinado em 25 de novembro de 2015.
Disponível para consulta em
http://www.sinir.gov.br/documents/10180/93155/Acordo_embalagens.pdf/58e2cc53-3e38-420a-97fd-
dba2ccae4cd3
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3.2 PRIMEIROS PASSOS E PRODUÇÃO DO QUESTIONÁRIO

Após a realização do estudo bibliográfico e uma prévia conversa com moradores


do bairro e seu entorno, considerou-se que o questionário a ser aplicado seria focado
apenas em moradores que já participaram ou participassem atualmente da coleta
seletiva. Essa definição foi importante, para que se pudesse definir os tipos de perguntas
a serem feitas. Como dito na revisão bibliográfica, optou-se por utilizar o modelo de
questionário qualitativo semiestruturado, onde há perguntas previamente definidas, e
outras perguntas que são feitas de acordo com o decorrer da conversa e que podem
surgir de forma diferente de acordo com cada perfil de morador. Este modelo de
entrevista e questionário (anexo 2), deixa também o entrevistado mais livre para
dialogar da forma como preferir, ao questionamento feito. A pesquisadora desde o início
desejava que suas entrevistas tivessem sempre um tom de conversa.

O roteiro/questionário de perguntas utilizado teve o intuito de perceber o atual


engajamento dos moradores com a coleta seletiva, se continuava semelhante ao início
do projeto, o quanto eles estão satisfeitos com a coleta realizada agora pela CLIN e
identificar o perfil de alguns destes moradores e o quão vinculados se sentem a esta
ação.

3.3 ATIVIDADES DE CAMPO E ENTREVISTAS

De acordo com Minayo e Costa (2019, pg 12), a entrevista é a interlocução entre


duas ou mais pessoas, realizada por iniciativa do entrevistador e destinada a construir
informações pertinentes a determinado objeto de investigação. Ao definir a metodologia
de entrevistas, é importante também definir em que nível a pesquisadora irá trabalhar
sua observação, parte importante da pesquisa qualitativa. Neste estudo, a categoria de
observação definida, como conta no capítulo de embasamento teórico, é o observador-
como-participante. Onde a pesquisadora está mais focada nas perguntas, mas utiliza ao
mesmo tempo a observação, porém num espaço de tempo menor do que, por exemplo,
um pesquisador que se coloca como participante-total.

De acordo com Minayo e Campos (2019, pg. 13),

a entrevista pode aportar informações de duas naturezas: sobre fatos cujos


dados o investigador poderia conseguir por meio de outras fontes, geralmente
de cunho quantitativo; e sobre o que se refere diretamente ao indivíduo em
relação à realidade que vivencia e sobre sua própria situação.
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A pesquisadora é residente do bairro há alguns anos, porém, vive em uma rua


que está mais próxima do bairro de Icaraí, que faz divisa com São Francisco. O que de
certa forma a manteve distante das ruas onde o projeto aconteceu. Assim, adotando a
categoria de observador-como-participante, antes mesmo de iniciar às idas à campo,
concluiu que seria mais interessante entrevistar os moradores em suas casas, pois assim,
poderia entender melhor o contexto de vida de cada um deles, identificar características
que talvez não sejam apresentadas pela fala e estar mais próxima da realidade dos
mesmos. Minayo e Campos (2019, pg 14) afirmam que as entrevistam expressam de
forma diferenciada a luz e as sombras da realidade e pelo fato de provocar a fala sobre
determinado tema, precisam ser analisadas incorporando o contexto de sua produção e
ser acompanhada de informações que sejam provenientes da observação do cenário de
estudo. Os mesmos autores afirmam que:

Desta forma, além da expressão verbal, seu material primordial, o


investigador terá em suas mãos, elementos de relações, atitudes, práticas,
cumplicidades, omissões e outros aspectos da vida social que marcam o
cotidiano.

O planejamento inicial era que fossem entrevistados de 10 a 15 moradores. Para


Mendes e Pessôa (2009, pg 520), o processo de selecionar pessoas para a pesquisa
quantitativa seria mais fácil que o da pesquisa qualitativa, pois enquanto a primeira
exige um volume e diversidade de informações menores, na segunda a escolha das
unidades é mais complexa, já que este tipo de pesquisa tem como base as categorias de
análise. Para Luna (2005, p. 73), o aspecto generalista das pesquisas quantitativas, põe
em questão a validade de pesquisas mais tradicionalmente utilizadas já que muitas vezes
as formas de análise não permitem interação entre os dados obtidos.

Como citado anteriormente, a pesquisa qualitativa não se foca em quantidade,


como a quantitativa, o foco é o discurso, o conteúdo das entrevistas, o quanto aquela
pessoa, dentro daquele contexto de vida, representa e apresenta características de um
grupo maior. Como afirma Minayo (2013, p.21) sobre este tipo de pesquisa,

(...) ela trabalha com o universo dos significados, dos motivos, das
aspirações, das crenças, dos valores e das atitudes. Esse conjunto de
fenômenos humanos é entendido aqui como parte da realidade social, pois o
ser humano se distingue não só por agir, mas por pensar sobre o que faz e por
interpretar suas ações dentro e a partir da realidade vivida e partilhada com
seus semelhantes. O universo da produção humana que pode ser resumido no
mundo das relações, das representações e da intencionalidade e é objeto da
pesquisa qualitativa dificilmente pode ser traduzido em números e
indicadores quantitativos.
50

A pesquisadora teve grande dificuldade para conseguir entrevistados


participantes da coleta seletiva, entrevistando assim, 11 pessoas. Utilizou-se o aplicativo
whatsapp como principal ferramenta para agendamento dos encontros. Na primeira
mensagem se apresentava novamente, explicava rapidamente a pesquisa e quanto tempo
máximo demoraria. No aplicativo as pessoas poderiam ver sua foto e se sentirem um
pouco mais seguras. Enfatizando que todos os entrevistados foram indicados por
pessoas próximas à pesquisadora ou se voluntariaram por meio de um post feito em um
grupo de moradores do bairro nas redes sociais.

A maior dificuldade nesta etapa era se adequar à agenda dos entrevistados. Pela
característica socioeconômica dos moradores do bairro, que possui casas de alto padrão,
foi perceptível que a disponibilidade era mais restrita. Após o agendamento, a
pesquisadora ia até o local marcado munida do questionário, dois gravadores (nenhuma
resposta foi escrita, para agilizar o trabalho e trazer mais leveza ao diálogo) e o Termo
de Consentimento Livre e Espontâneo (TCLE), que é praticamente uma ferramenta
obrigatória para que a pesquisa tenha credibilidade. Neste termo, é explicado o que é a
pesquisa, quem é a pesquisadora, a que universidade e programa de Mestrado está
vinculada, contatos do seu responsável direto (orientador), como as informações serão
usadas, entre outros (anexo 3).

A grande parte dos entrevistados optou por receber a pesquisadora em seu


domicílio. Com exceção de 3 entrevistadas que a encontraram em uma sorveteria e um
café do bairro. Todos os entrevistados assinaram o TCLE sem nenhum questionamento
e estes encontram-se arquivados com a pesquisadora para caso haja necessidade de
consulta. Nesta pesquisa os entrevistados não serão identificados, como previamente
informado no TCLE.

Em boa parte das entrevistas, o questionário foi aplicado em média em 15


minutos. Porém, muitos dos entrevistados se sentiam à vontade para falar de outros
pontos relacionados ao assunto, o que fez com que a pesquisadora trouxesse perguntas
customizadas ao momento e ao morador. Todos recepcionaram a pesquisadora de forma
muito amigável e pareciam ter orgulho em falar daquela temática.

Inicialmente, havia se definido entrevistar uma pessoa por vez, onde essas
pessoas deveriam morar no bairro e participar do programa de coleta seletiva. Porém,
como dito anteriormente, os entrevistados não foram escolhidos pela pesquisadora, e
51

sim, indicados por pessoas próximas ou se voluntariaram pelo post do Facebook, na


tentativa de maior neutralidade. Porém, aconteceram alguns imprevistos e surpresas
durante as idas à campo. Por exemplo, a primeira entrevistada pela pesquisadora, que
foi indicada, participava da coleta seletiva, era proprietária de imóvel no bairro, mas,
este imóvel não era utilizado como residência. Na verdade, a entrevistada tinha um
atelier de moda sustentável que ocupava um dos cômodos do casarão que também
pertence a ela. Os outros cômodos eram ocupados por outras pessoas e empresas para
quem ela alugava. Como um co-working. Ela é moradora da cidade, porém de um dos
bairros da Região Oceânica. Acabou-se decidindo por mantê-la entre as entrevistas, já
que foi verificado engajamento da mesma com a coleta seletiva local. Foi necessário
apenas adaptar o formato de algumas perguntas.

Outro imprevisto ocorrido foi o caso de casais que se sentavam juntos para
responder ao questionário. Apesar de não ser o ideal da pesquisa, a pesquisadora
percebeu que ambos poderiam contribuir para a mesma, respondendo de forma
colaborativa, o que não interferiu na pesquisa. Percebeu-se que estes por fazerem a
gestão do lixo juntos, acharam que deveriam responder às perguntas também juntos.
Nestes momentos, a empatia tão defendida em metodologias de pesquisa qualitativa
facilita a adaptação ao que não foi planejado. Na prática, a pesquisa não entrevistou
apenas 11 pessoas e sim 13 pessoas, já que duas dessas entrevistas foram com casais
respondendo juntos. Houve também, entrevistadas que estavam com suas filhas
crianças, e que em alguns momentos também quiserem falar durante a entrevista. Estas
falas também foram reproduzidas nas transcrições.

3.4 RETORNO DAS ENTREVISTAS, DESCRIÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS

Logo depois de finalizar a entrevista e ao retornar para a produção da pesquisa,


antes mesmo de realizar a descrição dos áudios, fez-se um relatório de observação de
cada entrevistado. Neste relatório, a pesquisadora descrevia em texto corrido, as
observações principais que fez do entrevistado e do local de entrevista (caso fosse sua
moradia), com foco e intuito de identificar ali, características que auxiliassem o
entendimento de posicionamentos, hábitos, privilégios e etc, além de outras falas
trazidas pelo entrevistado antes e após a entrevista. Esta foi uma ferramenta importante
para que posteriormente facilitasse a lembrança de cada um dos entrevistados, já que
52

não foram utilizadas fotografias e que somaram às avaliações. Funcionando como uma
espécie de relatório de campo.

Posteriormente, passou-se a ouvir os áudios diversas vezes e transcrevê-los


integralmente, para que pudessem ser feitas as análises pertinentes. Na etapa seguinte,
criou-se resumos das entrevistas, contidos nos anexos desta pesquisa. Após esta etapa,
são criados tópicos encontrados em todas as falas, como temáticas mais respondidas e
temas mais levantados, para que resultem nos tópicos principais. Esses tópicos podem
ser chamados de categorias empíricas ou unidades de sentido como define MINAYO
(2012). De acordo com Minayo e Campos (2019, pg 28), é preciso descobrir e
identificar a lógica interna do grupo entrevistado, ressaltando seus consensos,
controvérsias e contradições. E complementam que:

A partir do momento em que compreender o sentido do que lhe foi relatado e


do que observou em campo, o pesquisador não necessitará mais ficar colado
às falas: seu aprisionamento a elas é uma das maiores fraquezas de quem faz
análise qualitativa, pois significa que o investigador não foi capaz de
ultrapassar o nível descritivo do seu material empírico (...)

Foram definidas três categorias de sentido dentro da pesquisa: engajamento dos


entrevistados com a coleta seletiva e tema relacionados, insatisfações com a gestão atual
da coleta seletiva e definições pessoais do que é coleta seletiva e sua importância. A
partir destas, reuniu-se trechos das falas que mais representassem cada uma das
categorias e mais uma vez fez-se uma análise deste discurso.

Além das categorias de sentido, a pesquisadora reuniu o que chamou de peças de


sentido, pequenos pontos em comum nas falas dos moradores e na observação feita
durante a entrevista que talvez possam ter tido influência tanto no sucesso do projeto
anterior como no atual. Durante toda a análise do conteúdo das entrevistas, a
pesquisadora também realizou um levantamento de pontos que poderiam ser
melhorados em sua metodologia e principalmente na ferramenta física que é o
questionário. Seja por perguntas que não alcançaram o objetivo esperado ou outras que
poderiam ser incluídas e naturalmente apareceram durante as conversas.
53

4 RESULTADOS

4.1 ANÁLISE DAS CATEGORIAS DE SENTIDO

4.2.1 O engajamento dos entrevistados com a coleta seletiva e tema relacionados

Durante o período de entrevistas10 e como já citado anteriormente neste trabalho,


a metodologia utilizada envolvia uma preocupação com a observação, além da abertura
para perguntas e falas não contidas no questionário principal. Unindo-se respostas ao
questionário, observação e falas aleatórias às perguntas percebeu-se uma característica
comum a praticamente todos os participantes, estes eram bastante engajados com o tema
de coleta seletiva e temas relacionados, como a preservação dos mares, rios, florestas e
natureza no geral.

Sobre este engajamento, E3 justificou que além do fato de ter feito uma pós-
graduação dentro da área de ecologia e desenvolvimento sustentável, acredita que este
tipo de consciência com o lixo está dentro de todos, que não precisa aprender, que é
cultural. Para ela, “todo mundo sabe o que é certo ou errado no que se fazer com o
lixo”. O marido de E3 acrescentou que em sua fazenda, ele reuni todo o lixo e leva para
a cidade e tudo que podem reaproveitam.

E5 fez questão de falar de todo o seu engajamento voluntário com a causa


ambiental. E5 fundou um grupo de moradores que atua em defesa das árvores da cidade
e também atua em outras questões relacionadas à preservação ambiental. Costuma falar
diretamente com políticos e funcionários da atual gestão da prefeitura, em busca de
soluções e melhorias para as questões que defende e diz que se incomoda muito aos ver
os resíduos sendo coletados juntos (sem separação) na praia e em outras áreas da cidade.

E6, a mais jovem dos entrevistados e que estava com a filha pequena, ainda em
idade escolar, relatou a importância da coleta seletiva em sua casa como ferramenta de
educação: “realizar coleta seletiva em casa é uma importante forma de educação
ambiental e de exemplo para as crianças. Minhas filhas cresceram me vendo separando

10
Os resumos anônimos das descrições das entrevistas poderão ser acessados no anexo 1 desta
dissertação
54

o lixo e isso também é educar”. Já E10 finalizou sua entrevista dizendo que
antigamente, na empresa em que trabalhava, comentava com colegas de trabalho que em
São Francisco havia coleta seletiva e que as pessoas ficavam surpresas, pois era o único
bairro que tinha no Estado do Rio de Janeiro.

E10 diz que ela e sua família pensam sempre para onde vai o resíduo que estão
gerando. E se questiona: “qual o tamanho de minha pegada?” Ou “quantos prédios de
lixo teria em cima de mim com tudo que gerei?”. A moradora diz que pensa muito
antes de gerar lixo e sempre tem cuidado em reutilizar itens. Relatou também que

“acabo sendo um pouco “neurótica”. Quando vou em casas onde não tem
coleta seletiva, me sinto um pouco incomodada de ter que jogar os recicláveis
no lixo comum. (...) Percebo a diferença entre eu e meu marido, que não foi
criado em um local com coleta seletiva e até hoje comete erros na hora de
separar ou tem preguiça. (...) Eu também guardo meus resíduos recicláveis
produzidos na rua na minha bolsa e levo para casa para poder destinar
corretamente e também costumo falar com colegas do trabalho sobre a
melhor forma de fazer a destinação correta dos resíduos”.

E10 também relatou que por morar em casa, cuidar pessoalmente dos seus
resíduos e acumulá-los por uma semana até a coleta, faz com que suas filhas vejam o
grande volume de lixo que é produzido. Mas para ela,

“quem mora em prédio não se tem essa dimensão, pois o lixo é jogado em um
buraco onde o morador se quer saber para onde vai. E depois o lixo vai para
um lixão onde provavelmente o morador também nunca foi e nem sabe o que
é. Se eu pudesse faria algo em praça pública, sabe? Ia juntando o lixo para as
pessoas terem a noção de quanto cresce a montanha de cada tipo de resíduo.”

Um ponto curioso que surgiu durante alguns relatos, foi a justificativa de alguns
moradores em participar da coleta seletiva por motivo de serem “vindos do interior” e
que estes hábitos de se reaproveitar ou se destinar corretamente o lixo eram já muito
praticados por lá por conta das limitações das áreas rurais, como pode ser visto na fala
de E1 e E3:

E1: “A Coleta seletiva já faz parte da minha educação. Tá? É… Porque no


interior, o movimento, na época que eu morei, é diferente da cidade grande.
Por exemplo, tinham pessoas que compravam jornal, então você separava o
jornal, que sabia que você tava separando jornal pra comprar; garrafa, era a
mesma coisa… Então, eu fui criada com isso. Com compradores de porta que
iam comprar o material que você tinha guardado, que eles sabiam que você ia
guardar pra eles.”

E3: “Pra gente a coleta seletiva é uma coisa instintiva. Nós viemos da roça,
do interior né? Lá não se pode jogar lixo em qualquer lugar.”

Também houveram relatos semelhantes quando falado sobre o hábito da coleta


seletiva com justificativas de vivências no exterior (seja por moradia, como por viagens)
55

e também sobre a descendência de pais e avós europeus. E11 por exemplo, que viaja
frequentemente para a Alemanha para visitar sua filha, trouxe em sua entrevista um
relato comparativo de como funciona a coleta seletiva por lá e como é deficiente no
Brasil. Essas características falam também sobre um nível maior de acesso à informação
e um provável maior poder aquisitivo das famílias da região. Que, consequentemente,
também promoveu um maior acesso destes moradores à educação de qualidade e em
níveis mais elevados (superior e pós-graduação), gerando um maior pensamento crítico
sobre questões que anteriormente não eram tão popularmente debatidas.

Além disso, percebeu-se que estes moradores possuíam um vínculo muito forte
com o bairro, o que faziam se preocupar muito com tudo que se relacionada ao cuidado
com o local. Muitos moradores entrevistados viviam no bairro há muitos anos. E,
relatavam uma época onde as ruas eram tranquilas, mais arborizadas, portões ficavam
abertos e as crianças brincavam nas calçadas.

E8 contou que quando era criança e morava no bairro, as crianças vendiam


garrafas para um garrafeiro que passava na casas e ali já tinham um dinheiro para
comprar balas e coisas do tipo. Depois, com o projeto do professor Emílio, e uma
parceria com a Nadir Figueiredo, começaram a recolher as garrafas e poder triturar com
os equipamentos que haviam ganhado da empresa.

Naquela época, no surgimento da associação de moradores, muitos residentes


eram ativos e participantes de suas reuniões e ações. Vários deles se conhecem desta
época. Aparentemente nas entrevistas, foi percebido que a união destes moradores por
motivo da associação, gerou um sentimento forte de pertencimento ao local e
identificação entre os vizinhos. Além disso, o fato da associação ter realizado muitas
ações e conseguido muitas conquistas, pareceu ter criado um sentimento local de
empoderamento, uma espécie de cidadania ativa. Onde o poder da união entre os
cidadãos trazia benefícios para todos e os colocava numa posição de ativos nas políticas
públicas e decisões locais. E10 relatou saudosa que o projeto gerido pelo professor
Emílio “tinha tudo para crescer e não era uma gestão feita pelo lucro e sim pelo bem-
estar do bairro”.

Sobre este sentimento de pertencimento e cuidado com o bairro, podemos ver


evidências em diferentes falas, que também retratam um certo saudosismo. E2, relatou
em sua entrevista que:
56

“há muitos anos, por volta de 40 anos atrás, quando éramos jovens e íamos
muito à praia, não tinha nenhuma campanha de conscientização sobre o lixo,
mas mesmo assim, sempre levávamos saquinhos para colocar tudo que
consumíamos na praia e trazíamos para casa. Fico revoltada em hoje
caminhar pela praia e encontrar todos os tipos de lixo”.

Já a esposa de E11, que participou junto dele na entrevista, lamentou muitas


vezes e disse que: “fico triste que hoje no bairro poucas pessoas participem da coleta
seletiva. Hoje nem sei quais vizinhos participam”. Para ela, a coleta seletiva deveria ser
obrigatória, comparando com a Alemanha. Isso se soma à fala de E1, sobre fazer a
coleta seletiva: “eu acho, que é a nossa obrigação. É a única coisa que a gente pode
deixar de herança pra geração futura, é a qualidade do planeta”.

E8 lembrou em seu relato que o projeto começou em uma escola pública do


bairro onde a filha da empregada de sua família estudava:

“Eles pediam para as crianças levarem os resíduos recicláveis limpos para


trocar por itens de papelaria. Aí nós começamos a fazer a separação em casa
para que a menina pudesse levar para a escola. E depois o projeto se
expandiu e começou a ter coleta porta a porta com um pequeno caminhão. E
nós começamos a participar. Tinha um dia da semana e um turno para a
coleta. Depois que me casei, mudei para Icaraí e como aquilo já fazia parte de
minha rotina, mesmo morando em um bairro sem coleta seletiva, eu fazia a
separação em casa e aos finais de semana levava para a casa da minha mãe
em São Francisco para ser coletado pelo projeto. Hoje morando lá no prédio
(em São Francisco), como não tem coleta, continuo levando os recicláveis
para a casa da minha mãe e os orgânicos para a composteira na casa da minha
irmã”.

4.2.2 As insatisfações com a gestão atual da coleta seletiva e principais mudanças

A pesquisa qualitativa nasce de dúvidas e suposições. E é no campo, durante


as entrevistas, que se tem confirmações ou surpresas sobre a temática pesquisada.
Por isso, em alguns casos, é importante após as primeiras idas à campo, fazer a
revisão das perguntas e inclusive do embasamento teórico utilizado. Diante das
experiências existentes em outras cidades do país, somado à longa experiência da
pesquisadora na temática de projetos de coleta seletiva e o fato de ser moradora da
cidade de Niterói, era esperado que provavelmente o nível de satisfação dos
moradores locais com a atual coleta da prefeitura pudesse não ser tão positivo.

Ainda assim, o questionário produzido tinha o objetivo de ir além de entender o


nível de satisfação dos moradores com a coleta atual, mas analisar o nível de
57

engajamento dos residentes, que fatores influenciavam este engajamento (o crescimento


e queda), as mudanças ocorridas durante mais de 30 anos de coleta seletiva em um
projeto de iniciativa popular, como se deu a transição e principalmente, que
aprendizados poderiam ser dali retirados para novas políticas públicas de coleta seletiva.

A partir do momento que a coleta seletiva passou da gestão pela associação de


moradores local para a prefeitura, há uma mudança considerável nas ações. Primeiro, o
projeto era gerido em um porte pequeno, realizado por uma equipe enxuta,
operacionalizado de uma maneira simples, com uma logística menos complexa
composta por uma rota com curtas distâncias e um ponto de destinação próximo. Sendo
as ações geridas por membros da associação, tudo estava muito próximo de todos os
moradores. Além disso, o professor Emílio produzia relatórios sobre as coletas e que
eram facilmente acessíveis por seus vizinhos. As ações do projeto estavam ao alcance
de todos.

Quando a prefeitura assume a coleta, o bairro passa a fazer parte de um


planejamento logístico municipal, feito por uma companhia de limpeza que coleta em
todos os bairros da cidade. Não há uma gestão local, por uma subprefeitura por
exemplo. A CLIN possui um serviço setorizado, com unidades em diferentes bairros,
porém, isso se destina a serviços como varrição, podas e conservação.

Na maioria das entrevistas, houve o relato de coleta semanal realizada pela


prefeitura para resíduos recicláveis. Variando apenas de dia de acordo com o local do
bairro. Por conta da maioria dos entrevistados morar em casa, conseguem ter um espaço
viável para armazenamento dos resíduos por uma semana. Porém, alguns relataram
insatisfação com a ausência do serviço. E4, por exemplo, disse que com a prefeitura
assumindo o serviço de coleta seletiva, tiveram muitos problemas com a frequência.
Relatou que era comum ficarem muito tempo sem aparecer. O que gerou muitas
reclamações dos moradores, inclusive no grupo de facebook da associação.

E5, que é muito engajada com ações ambientais locais, criticou bastante a
prefeitura em relação às ações e projetos de coleta seletiva inclusiva (com Catadores).
Uma crítica muito comum aos moradores que se engajam no tema e que a mesma
repetiu, é o fato de parecer que os assuntos relacionados à esta temática dentro da
prefeitura “não andam”. Relatou que naquela semana havia conversado com o rapaz de
uma cooperativa de coleta de óleo de cozinha local. E que ele gostaria muito de
58

legalizar a cooperativa e estruturar melhor seu projeto, porém, os papéis para


legalização já estão há mais ou menos 4 anos parados na prefeitura e o processo “não
evolui”.

E9 era participante do projeto de coleta da sua associação no passado e hoje,


afirmou que a CLIN não tem passado mais em sua rua para fazer coleta seletiva e não
sabe o motivo. Porém, ele mantém o hábito de deixar os sacos de recicláveis na porta,
pois disse que Catadores passam para coletar. Quando acumula muitos resíduos, leva
até o ecoponto da ENEL, concessionária de energia local que possui um projeto onde
troca resíduos por descontos na conta de luz.

A E10 também reclamou das constantes faltas da coleta seletiva realizada pela
prefeitura. Afirmou que até quatro anos atrás, quando o professor Emílio fazia a gestão
do projeto de coleta seletiva comunitária, a coleta acontecia sempre nos mesmos dias e
horários. Depois que a CLIN assumiu a gestão da coleta, completa:

“fica semanas sem o caminhão passar, ou passa no horário errado, ou passa a


coleta orgânica no horário e dia da coleta seletiva e acaba levando os resíduos
de coleta seletiva que separamos junto do lixo comum. Fico muito triste por
um projeto que funcionou por tantos anos gerido pelo professor Emílio e que
cresci acompanhando e dentro daquela cultura, estar desta forma, onde não
funciona direito. Como pode uma prefeitura ter menos estrutura do que um
homem só?”.

E10 relata que quando acontece da coleta comum acontecer no horário da coleta
seletiva, levando os resíduos recicláveis junto com resíduos comuns, causa um
desânimo e desmotivação dos moradores para participarem. E que, “o que se construiu
por anos como cultura no bairro está sendo abandonado muito rápido pelas pessoas”.
E7 discorda. Para ela, houve melhoria na coleta seletiva depois que a prefeitura
assumiu esta gestão. Ela disse, que nas antigas gestões, não havia uma preocupação com
questões ambientais da cidade, incluindo a gestão de resíduos. A coleta seletiva
municipal, por exemplo, só teria sido oficialmente implantada na gestão do atual
prefeito, que segue em segundo mandato.

A grande parte dos entrevistados disse não ter recebido nenhuma orientação de
como realizar a coleta seletiva, materiais coletados ou outras informações sobre, por
parte da prefeitura. Porém, muitos também relataram não se lembrar de ações de
educação ambiental para realização da coleta na época do projeto da associação. Porém,
alguns participantes das entrevistas, disseram ter recebido em suas casas, na época do
59

início do projeto, alunos da UFF, que orientavam moradores de como aconteceria o


projeto e como separar seus resíduos.

A moradora E10 disse que sente muita falta de mais informações provenientes
da prefeitura sobre a coleta seletiva. Relata que tem muitas dúvidas ao separar e não
sabe exatamente o que eles podem ou não receber. Na maior parte das vezes ela
pesquisa por conta própria e que por via das dúvidas, manda tudo que é limpo e seco na
coleta seletiva. Disse que na época do projeto do professor Emílio, lembra que tiveram
algumas ações, mesmo que poucas, de conscientização. Que ela ainda estava na escola
quando o projeto começou e lembra de ter recebido alguns folhetos. Mas afirma que
fazer a divulgação de material de conscientização para todo o bairro provavelmente
seria muito caro para o projeto comunitário. O que explicaria o fato de alguns
moradores não se lembrarem de terem sido abordados no início do projeto comunitário.

E11 considera também que a quantidade de pessoas que participam da coleta


seletiva é muito pequena. Que não há nenhuma campanha incentivando e
conscientizando os moradores. E3 e seu marido, por exemplo, disseram que tem dúvida
se devem ou não lavar os resíduos. E que quando não tem tempo de lavar os resíduos,
ficam na dúvida se devem jogar as embalagens no lixo comum ou se podem ser
destinadas junto dos recicláveis.

Outro ponto também frequente nas entrevistas foi a diferença identificada pelos
moradores quando questionados sobre se sabiam para onde seu resíduos eram
destinados. Muitos deles afirmaram que quando acontecia o projeto comunitário,
sabiam que havia uma sede no bairro, onde havia um espaço de triagem e que depois os
resíduos eram vendidos para a reciclagem. Inclusive, alguns citaram que na época, os
dados de vendas de resíduos e coletas vinham descritos em um informe distribuído pela
associação de moradores. Como disse E3 e seu marido:

“Depois que a prefeitura começou a fazer a coleta, não sabemos mais para
onde vai o lixo reciclável. Antes, quando era um projeto comunitário,
sabíamos pelo menos para onde ia, pois conhecíamos o galpão de triagem.”

Atualmente, muitos moradores não sabiam responder o que era feito com seus
resíduos depois de coletados e enfatizaram que nunca receberam esta informação da
prefeitura. Apenas E7, E8 e E1 fizeram relatos sobre esta pergunta. E8, ao ser
questionada sobre saber para onde vai o resíduo, disse que sabe que os resíduos vão
para um galpão na Grota, mas por ser um local muito perigoso, desistiu de tentar visitar.
60

Mas que acredita que os resíduos coletados vão para um local correto. E1 relatou já ter
tido interesse em saber para onde os resíduos eram destinados:

“Olha, tem uma amiga minha que é a Ana Paula, do O Fluminense. Uma vez
O Fluminense seguiu o carro do reciclado, pra saber se realmente ia para o
lixão, ou se eles davam um destino correto. E eu fiquei feliz de saber que eles
tinham um destino pra dar. Lógico, caminhão e recepção. Agora, o que
acontece depois eu não tenho a mínima ideia. Mas pelo menos já é um
começo.”

4.2.3 Definições pessoais sobre coleta seletiva e sua importância

Um dos objetivos do questionário utilizado nesta pesquisa qualitativa era


analisar as diferentes visões e definições pessoais sobre a importância de participar da
coleta seletiva entre os moradores do Bairro de São Francisco, onde há tantos anos
possuem o serviço de destinação de seus recicláveis. Durante os encontros e em cada
uma das falas, pode ser percebido que nem todos tem uma definição exata do que é a
coleta seletiva, mas de sua forma, entendem o processo e reconhecem sua importância.

Para E2, coleta seletiva é “uma coleta de coisas que podem ser reaproveitadas”.
Para a moradora, a importância de participar da coleta seletiva é “aproveitar os resíduos
para evitar que tenhamos mais lixo. Fico muito irritada com campanhas como a do fim
dos canudinhos como justificativa para que tenhamos menos resíduos nos mares. Qual o
motivo desse lixo estar lá? O lixo nem deveria chegar no mar”.

Para E1, não há justificativa para que as pessoas não façam a coleta seletiva:

“Olha, é questão de... ambiental pra mim. Eu acho que como eu fui criada na
roça, num ambiente rural, eu não consigo com o nosso planeta não caber
mais, não ter pra onde colocar mais lixo. Porque eu trabalho com moda
sustentável, Porque é a segunda indústria que mais polui o planeta, a indústria
da moda. Primeiro é a petrolífera, depois é a petroquímica e depois a
indústria de moda. Pelo uso exagerado, pelo consumo exagerado e pelo
grande resíduo que sobra. Então pra mim é mais uma questão planetária
(risos). Eu assim, eu acho, que é a nossa obrigação. É a única coisa que a
gente pode deixar de herança pra geração futura, é a qualidade do planeta.”

A moradora E5, muito envolvida com as questões ambientais locais, considera


participar da coleta seletiva importante para o meio ambiente. Já que, de acordo com a
mesma, a natureza não conseguiria absorver naturalmente o lixo que se produz e que as
pessoas precisam ter consciência ao descartar seu lixo. Também acha importante que se
realize o reaproveitamento do lixo. E6, que é mais de duas meninas em idade escolar,
considera que realizar a coleta seletiva em sua casa é uma forma de educar suas
crianças.
61

E8 considera que a sociedade “andou para trás”. Pois, antigamente, relata a


moradora,

“o leite vinha engarrafado e o leiteiro quando passava, recolhia a garrafa


antiga e nos dava uma nova com o leite, refrigerante e cerveja também
funcionavam da mesma forma. Hoje eu vejo lá no clube onde sou sócia, os
responsáveis do bar jogando garrafas de vidro long neck no lixo comum e
isso me deixa bastante preocupada. Considero importante participar da coleta
seletiva, pois está ajudando o meio ambiente. E vou continuar fazendo
enquanto tiver para onde destinar meu lixo.”

Sobre a importância de participar da coleta seletiva, a esposa de E11 enfatiza a


preocupação com a preservação da natureza. Relata o quanto de resíduos jogado nas
ruas contribui para a ocorrência de enchentes e que ela sempre conversa sobre isso com
o marido, pois compara muito com a Alemanha por ir pra lá com frequência. Na opinião
dela o problema não é dinheiro e sim a educação, e que são coisas que só mudariam
com educação.

Já E3 e seu marido concordam que a importância de se participar da coleta


seletiva é a preservação do planeta e colaborar com a natureza. Para E3, é uma questão
de consciência. Diz que se incomoda quando vai na casa das filhas e vê que todo
resíduo tem que ser jogado junto na lixeira do prédio. Que já trouxe resíduos da casa
delas para casa, para que pudesse destinar para a coleta seletiva.

4.2 PEÇAS DE SENTIDO

Baseada no conceito de categorias, a pesquisadora decidiu somar aos resultados


da pesquisa o que ela nomeou de peças de sentido. Seriam pontos em comum também
vistos em algumas falas ou observados em campo que não estavam diretamente
previstos nas perguntas do questionário, mas que trazem sentido às análises da
satisfação e eficiência do projeto comunitário de coleta seletiva e o serviço atual
realizado pela prefeitura.

Dentre as 13 pessoas entrevistadas, foram identificados alguns pontos em


comum que contribuíram para as conclusões desta pesquisa e análise do cenário.
Seguem a seguir estes tópicos.

A) Coleta seletiva desde muito novos

Vários entrevistados relataram que realizam a separação de seus resíduos


recicláveis desde que eram crianças ou adolescentes. Muitos enfatizaram que naquela
62

época não haviam muita informação sobre e tudo era feito de maneira instintiva ou
aprendida em vivências pessoais;

B) Lavar os resíduos recicláveis

Em diferentes falas, os moradores relataram que costumam lavar seus recicláveis


antes de levar para a coleta seletiva. Alguns, disseram ter dúvida se deviam ou não fazer
isso e que sentem falta de um esclarecimento sobre proveniente da prefeitura. E2, por
exemplo, falou do cuidado que tem com os resíduos recicláveis ao lavar, não deixa
partes cortantes de metal expostas e embala vidros, para que as pessoas que irão
manusear os recicláveis não se machuquem. E4 também fez questão de dizer que lava
todos os recicláveis, principalmente em respeito aos profissionais que trabalham com os
resíduos.

E10 citou que consegue manter seus recicláveis armazenados por uma semana
para a coleta, pois costuma lavá-los, evitando assim vetores em sua casa. Já E3 e seu
marido disseram que tem dúvida se devem ou não lavar os resíduos. E que quando não
tem tempo de lavar os resíduos, ficam na dúvida se devem jogar as embalagens no lixo
comum ou podem ir com os recicláveis.

C) Viagens ou vivências em países do exterior

Como anteriormente citado, muitos dos entrevistados possuíam vivências no


exterior, inclusive o professor Emílio, idealizador do projeto. Alguns chegaram a citar
que nestas vivências é que conheceram e aprenderam mais sobre coleta seletiva e se
motivaram a realizar também em suas casas.

D) Maioria das participantes mulheres

A maioria das pessoas que aceitaram participar das entrevistas foram mulheres.
Mesmo nas casas onde fui recebida por casais, as mulheres pareciam estar mais
engajadas na gestão dos resíduos e interessadas em temáticas ambientais. Também foi
identificado, que apesar de todas as famílias aparentarem ter alto poder aquisitivo, as
mulheres tinham nível de escolaridade mais alto que seus companheiros.

E) Filhos mais jovens desinteressados


63

Um fato curioso percebido nas conversas com entrevistados que eram pais, era o
fato de seus filhos, em sua maioria hoje moradores de outras localidades, não
demonstravam tanto interesse no assunto de coleta seletiva. Alguns pais justificavam
com a “falta de tempo”. Os entrevistados chegaram a dizer que quando iam nas casas de
seus filhos, organizavam a coleta seletiva para eles ou destinavam seus resíduos de
forma correta. Isto levanta hipóteses de que estarem morando em locais onde não há
coleta seletiva, pode influenciar na desmotivação de a realizarem.

F) Estratégias para evitar resíduos

Muitos entrevistados também abordaram ações pessoais que realizam para evitar
a geração de resíduos. E2 disse que ao comprar ovos, por exemplo, dá preferência às
embalagens que não são de isopor e sim de papel prensado, pois sabe que pode ser
reciclável. A E3 disse que gostaria que a coleta levasse isopor, mas que geram pouco.
Disse que quando vai ao mercado e compra produtos como queijo, pede para que não
usem a bandeja de isopor. Também possui o hábito de usar sua própria sacola de pano
para compras e evita receber sacolas plásticas quando não acha necessário, pois é mais
uma coisa que teria que jogar fora. Em eventos no seu atelier no bairro, E1 diz que:

“Quando eu faço a seleta aqui, acontece mais quando tem evento. Então,
quando tem evento, eu tenho muito lixo reciclado. Que aí entra… Se bem que
eu tô tentando acabar com copo descartável, acabar com isso tudo, né? Por
exemplo, no “arte entre mãos” a gente vende um copinho de acrílico, mais
resistente, que a gente chama, que a pessoa depois só faz o refil, pra enxugar
essa quantidade de lixo.”

Houveram também outros pontos muito citados que já foram sinalizados nos
resultados como: moradores nascidos no interior/zona rural; relato de que poucos
vizinhos participam da coleta seletiva nos dias de hoje; realizam coleta seletiva sem ter
recebido orientação e a grande parte chama o projeto de coleta seletiva da associação de
moradores de “projeto do professor Emílio”. Outro ponto em comum foi que na
pergunta sobre o que entendiam sobre coleta seletiva, muitos não respondiam ou
respondiam coisas que não tinham exatamente a ver com o objetivo da pergunta. O que
pode ser resultado do fato de muitos realizarem coleta seletiva sem uma ação de
educação ambiental prévia, onde haveria clareza teórica sobre o que está fazendo e o
motivo.
64

5 CONCLUSÕES

O primeiro registro de coleta seletiva em uma área urbana tem apenas 34 anos.
Comparando a outros países, o Brasil está bem atrasado. Porém, mesmo com 34 anos de
coleta seletiva, os passos dados de lá para cá foram de extrema lentidão. Apenas em
2010 foi criada a primeira lei nacional sobre gestão de resíduos e pela primeira vez,
prefeituras, população, indústrias, importadores e varejistas foram classificados como
65

responsáveis pela destinação correta de resíduos, ocupando cada um, uma função dentro
da chamada gestão compartilhada.

Apesar de muitos municípios do país terem produzidos seus planos de gestão


integrada de resíduos como previa a PNRS, a realidade é que pouquíssimos são os casos
de sucesso e inclusive de real aplicação das ações. Niterói, local onde a primeira
iniciativa urbana de coleta seletiva aconteceu, permanece com uma política de gestão de
resíduos recicláveis tímida, ineficiente e que parece não querer evoluir. Muito se tem de
discurso e propaganda, mas na realidade, a cidade ainda destina a maior parte dos seus
resíduos recicláveis junto do resíduo comum; falha na inclusão socioeconômica e
parcerias com organizações de Catadores locais, que estão fechando as portas por falta
de resíduos que deveriam ser destinados a eles pela prefeitura; faltam campanhas e
ações de educação ambiental para a população; tem uma fiscalização sobre destinação
de resíduos também falha, sendo possível ver grandes empresas destinando seus
resíduos para a coleta pública (o que é ilegal pela lei) e clubes e casas de alto padrão à
beira-mar despejando diretamente seus resíduos líquidos na Baía de Guanabara; apenas
algumas ruas da cidade possuem coleta seletiva e a companhia de limpeza insiste em
manter o serviço apenas por solicitação e cadastramento (sem divulga-lo).

Esta pesquisa se propôs a ouvir a população de forma mais próxima e


humanizada. O que, de certa forma, parece ser um dos erros da prefeitura local. Muitos
estudos dentro da temática de resíduos e coleta seletiva costumam se apoiar em dados
de pesquisas quantitativas. E como já dito anteriormente, a ideia não é definir qual tipo
de pesquisa é melhor, mas trazer clareza sobre a que cada uma se propõe e enfatizar
suas diferenças.

A pesquisa qualitativa tem um diferente olhar e foco. Não há necessidade de


centenas de pessoas entrevistadas, por exemplo. Ela dá importância ao discurso e à
observação. Mostra o que aquela pessoa tem a dizer sobre o tema e o que ela também
não diz, mas que o contexto onde vive, sua cultura, hábitos e valores observados, por
exemplo, falam sobre ela e sobre o tema estudado. Assim, o principal objetivo desta
pesquisa veio como uma nova proposta de ferramenta para se utilizar em pesquisas na
área de resíduos urbanos e, principalmente, como ouvir a população de forma
qualitativa, onde pessoas não são apenas números e suas falas são livres, pode trazer um
66

conteúdo enriquecedor para avaliações de serviços urbanos e planejamento de políticas


públicas.

Os resultados permitiram, a partir das visitas à campo, entrevistas realizadas e


posterior análise de discursos e relatórios, que apesar de ter atuado em uma escala
menor, o projeto de coleta seletiva comunitária iniciada no bairro de São Francisco há
34 anos atrás pelas associação de moradores e pelo professor Emílio, aparentou ter tido
mais eficiência do que a coleta atual realizada pela prefeitura, tanto do ponto de vista de
moradores como do ponto de vista técnico da gestão de resíduos. Haviam mais pessoas
participando, a população se sentia mais engajada, a coleta era realizada na frequência
ideal e sem ausências, os resíduos eram levados para uma central de triagem próxima e
posteriormente comercializados para recicladores. Garantindo assim, o real objetivo da
coleta seletiva.

Ao analisar as entrevistas, pode se perceber que o engajamento da população


local com o projeto teve dois principais motivos. Primeiro, as semelhantes condições
socioeconômicas entre eles. Grande parte possui de médio a alto poder aquisitivo, o que
os permitiu ter acesso à educação de qualidade e vivências em países estrangeiros, e que
aflorou temáticas de responsabilidade ambiental ainda pouco populares no Brasil
naquela época. Segundo, a relação de afeto àquele espaço urbano. O bairro era
composto basicamente de casas e muitos moradores, mesmo os já idosos, foram morar
ali com seus pais e depois criaram seus filhos. O local é próximo à praia, arborizado,
com ruas largas, onde crianças brincavam e a interação com vizinhos aconteciam
frequentemente. Todos se conheciam. Assim, foi percebido que os moradores mais
antigos tem uma grande relação de carinho pelo local e que naturalmente fez com que
criassem a associação e se preocupassem tanto com os cuidados com o bairro. Realizar
a coleta seletiva para eles era ao mesmo tempo conservar o local onde vivem e suas
belezas naturais, como colaborar com seus vizinhos.

Os dois pontos acima trazem uma reflexão importante: o quanto a participação


ativa e proximidade da população com as ações relacionadas à sua cidade podem
interferir diretamente no sucesso de um projeto. Por isso, é tão importante que as
prefeituras invistam em ações de comunicação e educação. Seja para comunicar a
importância e o motivo do cidadão realizar aquela ação, tirando o caráter de obrigação e
o conscientizando do seu papel, como também ampliar o conceito de que uma cidade
67

deve ser resultado de ações integradas e colaborativas que envolvam a população e os


demais atores.

Porém, apesar de todos os fatores citados, o projeto de coleta seletiva criado não
conseguiu se manter após os 34 anos, o que levou a passagem da gestão para a
prefeitura. Muitos foram os motivos, entre os principais, o alto custo de infraestrutura e
a sobrecarga da gestão em poucas pessoas que trabalhavam como voluntárias, incluindo
seu fundador. Se o projeto tivesse mais financiadores e suporte da prefeitura, a situação
poderia ter sido diferente. Vale ressaltar, que pela lei, a gestão de resíduos é
responsabilidade da gestão municipal e o projeto acabava fazendo, de certa forma, o
trabalho da prefeitura. Já a parte dos financiadores, poderia se basear na PNRS e buscar
as empresas que assinaram o acordo setorial e que obrigatoriamente precisam investir
em projetos do tipo.

Outros fatores além da falta de comunicação ou ineficiência da prefeitura com o


serviço de coleta também afetaram o engajamento dos moradores do bairro. Como pode
ser observado nas idas à campo, o bairro tem um alto índice de envelhecimento. Os
filhos jovens dos moradores se mudaram, e a maioria das grandes casas hoje é ocupada
por casais já idosos ou entrando nesta fase. Algumas casas estão vazias ou à venda.
Muitos chegaram a relatar na entrevista este envelhecimento populacional como um
ponto importante para o fato da associação de moradores ter perdido força e não ter
evitado as várias mudanças urbanísticas, como a permissão da construção de prédios.

Esta mudança, também tem influenciado a gestão de resíduos, já que como


relatou uma das entrevistadas, os novos moradores que vivem nos edifícios, não tem a
mesma relação com o lixo como tem as pessoas que vivem em casas e muitas vezes se
quer sabem o que o condomínio faz com seus resíduos. O problema se agrava quando se
compara a quantidade de lixo produzido em edifícios que ocuparam o lugar de uma ou
duas casas com poucas pessoas. Muito relatado também, foi a identificação que os
novos moradores não costumam participar da coleta seletiva, seja por não saberem ou
por não se importarem.

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir da realização desta pesquisa pretendeu-se também gerar uma reflexão


sobre como políticas públicas para as cidades vem sido pensadas. Transformar um
68

projeto de coleta seletiva simples, que vinha tendo sucesso e era gerido por moradores
em um modelo com maior estrutura financeira e técnica porém totalmente ineficaz é
algo inconcebível. A gestão pública deve estar sempre associada à inovação, às boas
práticas e às políticas que tenham o único foco de uma cidade que seja melhor para as
pessoas.

Tanto no caso do projeto de coleta de recicláveis feito pela associação de


moradores de São Francisco, a coleta seletiva há décadas realizada por cooperativas de
Catadores em diferentes lugares, como alguns outros casos de boas práticas em gestão
de resíduos existentes no país e no mundo, tem-se diferentes modelos que poderiam ser
replicados, aprimorados e adaptados à realidade das cidades brasileiras.

Porém, a realidade brasileira são lixões que nunca se encerram, recicláveis indo
para aterros junto de resíduos comuns, insistência na criação de aterros quando
diferentes países não “enterram” mais seus resíduos, compostagem de resíduos
orgânicos quase nula nas cidades, resíduos perigosos depositados em locais clandestinos
por grandes empresas, fiscalização ineficiente, entre outros, que fazem com que a gestão
de resíduos no país nunca avance. Fica claro que há uma grande falta de interesse e
vontade de governantes e demais envolvidos e que faz com que esta pesquisa
qualitativa, apesar de trazer respostas, permaneça ainda com uma pergunta: a quem
interessa que o Brasil não avance na gestão de resíduos?

7 PESQUISAS FUTURAS

A partir desta dissertação, pretende-se avançar na utilização da ferramenta de pesquisa


qualitativa na avaliação e diagnóstico de projetos, serviços e políticas públicas urbanas. A
ferramenta hoje ainda é pouco utilizada em áreas técnicas para projetos urbanos e se reafirma
como uma importante aliada para a produção de cidades mais sustentáveis e que atendam e
tragam qualidade de vidas àqueles que ali habitam.

A pesquisadora pretende avançar com o uso da ferramenta em uma futura pesquisa de


doutorado e outras pesquisas tanto no seu ramo acadêmico como profissional. Pretende-se
utilizá-la para avaliar projetos urbanos colaborativos, como o do bairro de São Francisco, que
passaram, ou não, à gestão pública, como também, ampliar esta mesma pesquisa na área de
gestão de resíduos e coleta seletiva para outros espaços urbanos.
69

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74

ANEXOS

ANEXO 1 – SÍNTESE DAS ENTREVISTAS


75

Entrevistada 1 (E1)

A entrevistada 1 (E1) não vive no bairro de São Francisco. Viveu alguns anos
em Icaraí, bairro vizinho, mas se mudou com a família para a região das praias
oceânicas de Niterói, vivendo hoje em Piratininga. Apesar disso, comprou uma casa no
bairro de São Francisco há 9 anos atrás, que transformou em seu atelier de moda
sustentável e que utiliza com frequência. Os outros cômodos da casa, foram
transformados em uma espécie de coworking, onde ela aluga salas para outros
profissionais e o espaço externo para eventos. O atelier, está localizado em uma das
principais avenidas do bairro, a Avenida Quintino Bocaiúva, onde encontram-se
basicamente grandes casas e mansões da década de 70, 80 e 90 e alguns comércios. E1 é
nascida no interior do Rio e veio para Niterói cursar odontologia, profissão que se
dedica até hoje. É branca, aparenta uma boa condição financeira e possui
aproximadamente 64 anos. É casada e tem dois filhos.

Como dito anteriormente, paralelamente à profissão de dentista, resolveu se


dedicar à moda e montou um atelier focado em moda sustentável, onde reaproveita e
recicla itens transformando-os em novas peças. Por conta disto, se sente próxima e
familiarizada aos temas de reciclagem e coleta seletiva. Antes e depois da entrevista,
apresentou seu trabalho à pesquisadora e demonstrou muita preocupação com temas
relacionados à preservação ambiental.

Como não vive no bairro, nem sempre ela está no atelier no dia da coleta
seletiva, que é quinta-feira em sua rua. Porém, faz coleta seletiva em sua casa, e no
atelier, faz sempre quando realiza eventos, onde também promove práticas de redução
de resíduos. E1 disse que ao alugar os espaços do casarão para outras pessoas, sempre
informa aos mesmos a existência da coleta seletiva. Mantém dentro da casa, dois
recipientes para armazenamento de lixo, um para recicláveis e outro para lixo comum.
Porém, considera pouco apenas um dia de coleta seletiva na semana, já que tem pouco
espaço para armazenamento de resíduos e alguns recicláveis costumam ocupar espaço.

Sobre como aprendeu a fazer coleta seletiva, enfatizou que a coleta seletiva já
faz parte de sua educação e que é do interior, e lá onde vivia, desde pequena era comum
compradores de jornal, garrafas e alguns outros, passarem periodicamente batendo de
porta em porta. Todos os moradores já estavam então acostumados a isso e já tinham o
hábito de separar vários recicláveis. E os compradores também já sabiam que os
76

moradores guardariam para eles. Ao ir morar no condomínio que vive até hoje em
Piratininga, onde há coleta seletiva, manteve o hábito junto de sua família de separar os
recicláveis.

Informou também que o único item que a coleta seletiva não leva e ela gostaria
que fosse coletado é o isopor, deu ênfase à grande quantidade de bandejinhas de isopor
utilizadas por mercados e que quando seus filhos eram pequenos, conseguia enviar para
a escola onde estudavam e eles utilizavam para trabalhos, porém, agora não tem para
onde enviar e também não coloca mais junto da coleta seletiva. Outro detalhe
importante é que a mesma não demonstrou conhecer detalhes sobre a história do projeto
de coleta seletiva comunitário do bairro, já que não fez nenhum comentário sobre. Isso
provavelmente se deve ao fato de não viver no bairro e talvez não ter tantos laços com
outros moradores.

Sobre a importância em participar da coleta seletiva, fala sobre ter sido criada na
roça e por trabalhar com moda sustentável, se preocupa muito com o meio ambiente.
Considera que fazer coleta seletiva é obrigação e diz que a única herança que pode
deixar para gerações futuras é a qualidade do planeta.

Entrevistada 2 - E2

E2 é uma senhora de 66 anos, branca, aparenta ser solteira ou viúva, mora com o
irmão que parece ser solteiro também, já que vivem na mesma casa para onde se
mudaram com os pais na década de 90. Ela é formada em secretariado (curso técnico) e
ele possui curso superior. Acredito que estejam aposentados. A casa é antiga mas muito
bem cuidada, com decoração sem luxos e com características de casas de pessoas mais
velhas. Há muitas plantas no quintal.

Na casa, quase sempre é seu irmão quem cuida gestão dos resíduos e de colocar
o lixo para a coleta. Possuem o hábito de lavar os recicláveis e participam da coleta
seletiva desde que se mudaram para o bairro. A coleta sem sua casa acontece à quintas-
feiras, porém, alega que eles não passam toda semana, gerando acúmulo de resíduos. Já
aconteceu de ficarem duas semanas sem coleta seletiva e tiveram que destinar alguns
recicláveis para o lixo comum. Apesar disso, consideram a frequência de uma vez por
semana suficiente, já que geram pouco lixo.
77

Disse que na época, receberam visitas que explicaram como se dava a coleta
seletiva, mas que a mãe dela quem ficava mais em casa e cuidava disso. Também disse
que aprendeu bastante sobre coleta seletiva lendo jornais e coisas do tipo. Disse que não
separa os recicláveis por tipo, pois verificou que eles juntam tudo no caminhão e
também por não terem tanto espaço para isso. Também disse desconhecer para onde vão
seus resíduos.

Sua principal dúvida e insatisfação é o fato da coleta seletiva não levar o isopor.
E disse que ao comprar ovos, por exemplo, dá preferência às embalagens que não são de
isopor e sim de papel prensado, pois sabe que pode ser reciclável.

Sobre a importância de participar da coleta seletiva, relatou a importância de


aproveitar os resíduos para evitar que tenhamos mais lixo. Disse que fica muito irritada
com campanhas como o fim dos canudinhos como justificativa para que tenhamos
menos resíduos nos mares. Para ela, nenhum resíduo deveria nem chegar ao mar.
Relatou que há muitos anos, por volta de 40 anos atrás, quando eram jovens e iam muito
à praia, não tinha nenhuma campanha de conscientização sobre o lixo, mas mesmo
assim, sempre levaram seus saquinhos para colocar tudo que consumiam na praia e
traziam para casa. Fica revoltada em hoje caminhar pela praia e encontrar todos os tipos
de lixo.

Falou muito sobre a falta da consciência das pessoas sobre o lixo. Disse que em
frente à sua casa, é comum pessoas pararem o carro para fazerem lanche (pois há um
MC Donalds perto) e deixarem o lixo nas calçadas ou canteiros de plantas. E enfatiza
que são carros bonitos, ou seja, de pessoas com alto poder aquisitivo. E, que o problema
é quase que diário. E fala que depois as pessoas querem reclamar que a cidade está suja,
que os bueiros estão entupidos e que há enchentes.

Por último, relatou também que apesar de muitos vizinhos saberem da existência
da coleta seletiva no bairro, são poucos os que participam. E também fala do cuidado
que tem com os resíduos recicláveis ao lavar, não deixar partes cortantes de metal
expostas e embalar vidros, para que as pessoas que irão manusear os recicláveis não se
machuquem.
78

Entrevistados 3 – E3

A E3 é Arquiteta, aparenta ter acima de 60 anos, vive com seu marido há 36


anos em uma casa grande em uma área alta do bairro, onde também já viveram com
seus 4 filhos. Seu marido é apicultor e possuem uma fazenda na cidade de Valença,
onde é feita a produção de mel. Fazem ali na casa, parte do envase do mel que é
comercializado. Relataram inclusive, que quando o projeto ainda era gerido pelo
professor Emílio, ele separava os vidros de palmito coletados em restaurante e
forneciam para que eles fizessem a limpeza necessária e colocassem o mel dentro para
comercializar. Depois, como a venda aumentou muito, começaram a precisar de mais
vidros, e a limpeza também passou a tomar muito tempo, assim começaram comprar da
fábrica. Disseram que hoje um outro apicultor com menor produção, faz o mesmo.
Reutilizando vidros coletados. Ambos aparentam boa condição financeira, mas possuem
fala simples e muito interesse no tema.

Apesar da entrevista ter sido agendada com a E3, o marido dela também sentou-
se à mesa e acabou participando. A pesquisadora vendo que ele também poderia
acrescentar e que teriam respostas muito semelhantes ( o que não seria interessante para
uma entrevista em separado), continuou desta forma. Os dois e a empregada cuidam da
gestão do lixo na casa. Tem o hábito de usar parte do lixo orgânico para adubar o
jardim. Entendem que coleta seletiva é importante pois beneficia a natureza e a
população. Participam da coleta seletiva desde que o projeto começou e ficaram
sabendo ao ver o carrinho passando por sua rua (que fazia um barulho e já sabiam que a
coleta seletiva estava chegando).

A coleta em sua rua passa uma vez por semana, às segundas e consideram a
frequência suficiente para uma família, porém, no caso deles, por terem também uma
atividade comercial local, acabam gerando muito papel e outros resíduos em grande
volume. Mas eles conseguem juntar e aguardar a coleta. O marido da E3 acha que não
deveriam quebrar os vidros na coleta, já que mais pessoas poderiam reaproveitá-los. O
casal disse que reutiliza muitas embalagens em casa para reduzir a geração do lixo.

Disseram que não receberam nenhuma orientação sobre a coleta seletiva. E3


disse que é praticamente uma coisa instintiva. Que são da roça, do interior, e que lá não
se pode jogar lixo em qualquer lugar. Para E3, além do fato de ter feito uma pós-
graduação dentro da área de ecologia e desenvolvimento sustentável, acredita que este
79

tipo de consciência com o lixo está dentro de todos, não precisa aprender, que é cultural.
Todo mundo sabe o que é certo ou errado no que se fazer com o lixo. O marido de E3
disse que em sua fazenda, ele reuni todo o lixo e leva para a cidade e tudo que podem
reaproveitam.

Afirmaram ter dúvida se devem ou não lavar os resíduos. E que quando não tem
tempo de lavar os resíduos, ficam na dúvida se devem jogar as embalagens no lixo
comum ou podem ir com os recicláveis. A E3 disse que gostaria que a coleta levasse
isopor, mas que geram pouco do resíduos, Disse que quando vai ao mercado e compra
produtos como queijo, pede para que não usem a bandeja de isopor. Também possui o
hábito de usar sua própria sacola de pano para compras e evita receber sacolas plásticas
quando não acha necessário, pois é mais uma coisa que teria que jogar fora.

Relataram que com a prefeitura fazendo a coleta seletiva, deixaram de saber para
onde vão os seus resíduos. Já que antes com o projeto comunitário, conheciam o
destino, pelo menos da triagem. Para eles, a importância de se participar da coleta
seletiva é a preservação do planeta e colaborar com a natureza. Para E3, é uma questão
de consciência. Diz que se incomoda quando vai na casa das filhas e vê que todo
resíduo tem que ser jogado junto na lixeira do prédio. Que já trouxe resíduos da casa
delas para casa, para que pudesse destinar para a coleta seletiva.

Entrevistada 4 – E4

A E4 é uma senhora branca de 61 anos, possui Doutorado e mora em uma casa


confortável e com decoração de alto padrão em uma das principais avenidas do bairro
de São Francisco. Relatou que quando morou a primeira vez na casa, havia se mudado
com os pais. Com a morte deles e já casada, voltou a morar na casa, agora com o
marido, que possui também curso superior. Mora na casa há aproximadamente 36 anos.
Não relatou em nenhum momento a existência de filhos.

Os dois possuem a responsabilidade de gestão dos resíduos na casa. A coleta


sem sua casa passa às quartas. Diz-se impressionada com o fato das pessoas terem
preguiça de fazer a coleta seletiva. Que na época do projeto, além do trabalho trazer
impacto positivo ao meio ambiente, dava emprego para as pessoas. Participa da coleta
seletiva desde, aproximadamente, o ano de 1994. Não lembra exatamente como que
80

ficou sabendo do projeto, mas acha que foi por conta da associação, já que eram
associados.

E4 disse que com a prefeitura assumindo o serviço de coleta seletiva, tiveram


muitos problemas com a frequência. Relatou que era comum ficarem muito tempo sem
aparecer. O que gerou muitas reclamações dos moradores, inclusive no grupo de
facebook da associação. Depois de um tempo, que ela acredita que houve alguma
intervenção, a coleta voltou a acontecer. Ela disse que considera a frequência de uma
vez por semana suficiente, já que hoje eles tem menos resíduos por não comprarem
mais jornal impresso.

Fez questão de dizer que lava todos os resíduos, principalmente em respeito aos
profissionais que trabalham com os resíduos. Diz que gostaria que a coleta levasse
tecidos e isopor. Para ela, fazer coleta seletiva é algo simples, que tão pouco, o
professor Emílio conseguiu fazer a coleta seletiva em vários locais do bairro e, que na
época, as pessoas que não quiseram participar foi unicamente por achar que dava
trabalho e tinham preguiça de separar. Disse que a moça que trabalha em sua casa
também faz questão de ter muito cuidado com os resíduos.

E4 também relatou que não sabe para onde vão os resíduos hoje. Para ela, a
importância de participarem da coleta seletiva é reduzir os impactos ao meio ambiente,
que quanto menos sujarmos, melhor.

Entrevistada 5 – E5

E5 foi a primeira das entrevistadas a não me encontrar na sua casa e sim em uma
antiga e clássica sorveteria do bairro, localizada em frente à Praia de São Francisco. E5
tem 62 anos, é branca, vive há 18 anos no bairro e muito engajada em questões do
bairro, principalmente em temáticas ligadas à área ambiental, mais precisamente à
conservação das árvores e parques públicos. Fundou um grupo de moradores dedicados
à fiscalização e preservação das árvores e parques da cidade. Atuam por meio de
pressão dos órgãos e representantes públicos, fazem abaixo-assinado, entre outras ações.
Tem costume em falar diretamente com alguns atores públicos, tem interesse em coleta
seletiva e chegou a participar de reuniões do grupo de economia solidária local, onde
estavam inseridos os projetos da área e a atuação das organizações de Catadores locais.
81

Por ter participado ativamente do grupo de economia solidária, criticou bastante


a prefeitura em relação às ações e projetos de coleta seletiva inclusiva (com Catadores).
Uma crítica muito comum à moradores que se engajam no tema e que a mesma repetiu,
é o fato de parecer que os assuntos relacionados à esta temática dentro da prefeitura
“não andam”. Relatou que naquela semana havia conversado com o rapaz de uma
cooperativa de coleta de óleo de cozinha local. E que ele gostaria muito de legalizar a
cooperativa e estruturar melhor seu projeto, porém, os papéis para legalização já estão
há mais ou menos 4 anos parados na prefeitura e o processo não evolui. Ela disse ter
ligado para algumas pessoas de dentro da prefeitura para tentar ajudá-lo.

Em sua casa hoje vivem 3 pessoas, mas recebe visita frequente dos 3 filhos que
moram distante. O nível de escolaridade de todos os moradores atuais é superior. Na
casa, todos participam da gestão do lixo e destinam para a coleta seletiva que passa duas
vezes na semana na rua em que vive (terças e quintas) que considera frequência
suficiente. E5 diz-se bastante incomodada quando vê que os resíduos em espaços
públicos como praias, são coletados juntos, sem separação. Participa da coleta seletiva
há dois anos. Antes já fazia mas ia tudo junto da coleta pública. Ficou sabendo pelos
vizinhos da existência da coleta. Conhecia a coleta seletiva comunitária, mas não
chegou a participar. Propôs para a atual gestão da associação dos moradores, promover
uma campanha de conscientização no bairro, com faixas e folhetos e outras ações,
visando o melhor descarte dos resíduos e maior limpeza das ruas. Porém, disse que o
grupo de moradores não se interessou muito em investir na ideia.

Separa praticamente todos os resíduos recicláveis que gera para coleta seletiva,
cascas de legumes, verduras e frutas separa para compostagem que depois é usada em
uma horta que possui em casa e restos de comida geralmente dá aos 3 cachorros que tem
em casa. Afirma não ter recebido nenhuma orientação da prefeitura. Disse que sabe que
seus recicláveis são destinados para um galpão localizado na Grota onde é realizada a
separação, mas não sabe qual destinos estes resíduos tem posteriormente.

Para E5, considera participar da coleta seletiva importante para o meio ambiente.
Já que a natureza não conseguiria absorver naturalmente o lixo que se produz e que as
pessoas precisam ter consciência ao descartar seu lixo. Também acha importante que se
realize o reaproveitamento do lixo.
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Entrevistada 6 – E6

A E6 também me encontrou na mesma sorveteria da entrevistada anterior.


Assim, não tive acesso à casa dela. Tem 47 anos e foi a mais jovem das entrevistadas
até o momento. Nasceu no bairro, se mudou por um tempo, mas vive há
aproximadamente 40 anos em São Francisco. Chegou de bicicleta elétrica com sua filha
pequena, que deve ter em torno de 7 ou 8 anos. E5 é branca, aparenta também ter uma
boa condição financeira e interesse e esclarecimento sobre temas relacionados à
consciência ambiental. O que também foi muito demonstrado pela filha, que em alguns
momentos também intervinha nas respostas.

Em sua casa vivem 4 pessoas, ela e seu marido com curso superior e seus filhos,
duas crianças em idade escolar. Em casa, ela cuida da gestão do lixo. Para ela, coleta
seletiva é fazer a separação do lixo produzido em sua residência de modo a dar destinos
corretos para cada um deles. Sendo alguns reciclados ou não. Participa da coleta seletiva
desde 2000 em outros bairros de Niterói onde morou e há 5 anos participa da coleta
seletiva em São Francisco. Ficou sabendo da coleta seletiva no bairro quando viu o
caminhão da coleta pública. Mas hoje disse que não sabe o dia de coleta, já que é o
prédio onde mora que faz a destinação do resíduos seletivos no dia correto. Em seu
prédio, os moradores destinam os resíduos orgânicos pela tubulação de lixo e deixam os
recicláveis ao lado da tubulação para que o funcionário colete.

Diz que por ter crianças, produzem uma alta quantidade de papel. E que papel e
plástico são os resíduos que mais geram. Não sabe ao certo se chegou a receber alguma
orientação pela prefeitura sobre coleta seletiva, acredita que também chegou a pesquisar
por conta própria. Explica que em um dos lugares que morou, o próprio morador
deveria abrir seu lixo e jogar os itens recicláveis nas lixeiras corretas (plástico, papel,
metal e vidro) e que assim, as pessoas aprendiam “na marra”. Mas enfatizou, que suas
filhas aprendem sobre coleta seletiva na escola, diferente de como foi na época dela.
Disse que sempre tem dúvidas sobre se um resíduo é reciclável ou não e que gostaria
que óleo de cozinha e resíduos como baterias também fossem coletados. Falou que após
a pergunta da pesquisadora sobre saber o destino dos recicláveis, parou para pensar que
realmente nunca procurou saber e ficou curiosa em buscar.
83

Para E6 realizar coleta seletiva em sua casa é uma importante forma de educação
ambiental e de exemplo para as crianças. Disse que suas filhas cresceram vendo ela
separando o lixo e que isso também é educar.

Entrevistada 7 – E7

E7 tem quase 60 anos, é filha de alemães é esposa de um ambientalista e político


que está ocupando um cargo na prefeitura de Niterói pelo segundo mandato. Além disto,
é parte de uma família conhecida nacionalmente na área esportiva. E7 é gestora de uma
organização não governamental criada por esta família que atende centenas de crianças
e jovens carentes da região com oficinas e cursos na área náutica. É branca, sem filhos e
muito engajada com a temática ambiental. A pesquisadora foi recebida na sede do
projeto e teve a oportunidade de ser apresentada a alguns funcionários e conhecer as
instalações.

E7 vive no bairro desde criança. Foi criada pelos pais no local e desde aquela
época, já realizava coleta seletiva. Por ter tido uma criação alemã, a coleta seletiva já era
algo natural pra ela. Hoje ela vive com seu marido em uma casa do bairro. Não possuem
filhos e ambos possuem curso superior. Em sua casa, tanto ela quanto o marido são
responsáveis pela destinação do lixo, como também sua funcionária. Possuem em sua
residência uma composteira, para onde destinam os resíduos orgânicos.

Para E7, coleta seletiva é realizar a separação dos resíduos por tipos e destiná-los
para reciclagem. O conceito é bem claro para ela, já que atua há anos diretamente com
projetos relacionados ao meio ambiente e seu marido é um ambientalista e político da
área bem conhecido.

A coleta seletiva em sua casa acontece uma vez por semana e é realizada pela
prefeitura. Como são apenas duas pessoas em casa, para ela a frequência é suficiente e
se sente satisfeita. Em casa, separa todos os tipos de resíduos coletados e os mais
gerados são plástico, papel e metal. Não possui nenhuma dúvida sobre a realização da
coleta seletiva e diz que sabe fazê-la desde muito cedo, de uma maneira natural, por
conta de sua criação. Sabe a destinação dos seus resíduos e considera essencial a
participação na coleta seletiva para diminuir os impactos dos resíduos no meio
ambiente.
84

E7 também implantou a coleta seletiva na ONG em que é gestora e ela e sua


equipe, incentivam as crianças a realizar a destinação correta de seus resíduos. Na sede
da ONG, é possível ver coletores coloridos, separados por tipos de materiais. Foi
interessante ver uma estratégia inteligente utilizado por eles, onde em cada lixeira, a
equipe escreveu que tipos de resíduos deveriam ser destinados ali, porém, citando
exatamente os resíduos que são normalmente gerados pelas crianças, exemplo: Caixinha
de suco e pacote de biscoito (que ganham no lanche). O que facilita bastante o
aprendizado e o hábito.

E7 citou também que durante as aulas de vela dos alunos, é comum encontrarem
muito lixo na Baía de Guanabara e, isto já faz com que as crianças tenham uma maior
preocupação com a questão. Informou que possuem um barco com equipamento que
realiza a retirada dos resíduos sólidos da água e esses resíduos são depois destinados
pela CLIN.

Entrevistada 8 – E8

E8 é irmã da entrevistada E7 e me recebeu também na sede do projeto da


família. Ela é filha de alemães e é nascida e criada em São Francisco. Tem 58 anos e
chegou a morar alguns anos no bairro vizinho, em Icaraí. Mesmo morando em locais
onde não havia coleta seletiva, sempre separou os resíduos e permaneceu levando para a
casa da sua mãe ou irmã em São Francisco. Possui curso superior e atualmente vive
sozinha. É responsável pela gestão do lixo em sua casa, não tendo empregada.

Para ela a coleta seletiva começou nos anos 80 com o projeto do Professor
Emílio. Na época, ela morava com a mãe, irmã e avó. Disse que o projeto começou em
uma escola e a filha da empregada da família estudava nessa escola. Eles pediam para as
crianças levarem os resíduos recicláveis limpos para trocar por itens de papelaria.
Assim, começaram a fazer a separação em casa para que a menina pudesse levar para a
escola. E depois o projeto se expandiu e começou a ter coleta porta a porta com um
pequeno caminhão. E assim, passaram a participar. Tinha um dia da semana e um turno
para a coleta. Após se casar, mudou para outro bairro e relatou que aquilo já fazia tanto
parte de sua rotina, que mesmo morando em um bairro sem coleta seletiva, fazia a
separação em casa e aos finais de semana levava para a casa da sua mãe, para que o
projeto coletasse. Hoje também mora em um prédio em São Francisco onde não tem
coleta seletiva e então leva seus resíduos recicláveis produzidos para a casa da irmã.
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Informou que a coleta seletiva passou a ser feita pela prefeitura a partir da gestão
do atual prefeito e que na rua de sua irmã a coleta é feita uma vez por semana e
considera suficiente. Disse que lava todos os recicláveis antes de destinar. Lembrou que
quando era criança, vendiam garrafas para um garrafeiro que passava na casas. Depois,
com o projeto do professor Emílio, e uma parceria com a Nadir Figueiredo, começaram
a recolher as garrafas e poder triturar com os equipamentos que haviam ganhado da
empresa.

Para E8, quando se começa a separar o lixo é que tem-se a proporção de quanto
lixo reciclável uma pessoa pode gerar, e que é uma grande quantidade. Disse que separa
todos os tipos de recicláveis e também separa cascas e restos de frutas, legumes e
verduras na geladeira para poder levar para a composteira na casa da irmã. Disse que
não lembra de ter recebido orientação sobre a coleta seletiva, mas que no início da sua
participação, durante o projeto de coleta seletiva comunitária, eles coletavam itens
específicos ou seja, pediam apenas alguns itens recicláveis e depois foram ampliando. E
que hoje, se fala muito sobre coleta seletiva então não costuma mais ter tantas dúvidas,
além do fato de ter se acostumado e fazer automaticamente.

E8 fica muito incomodada com locais onde há lixeiras de coleta seletiva mas os
resíduos no final acabam sendo todos destinados para a coleta comum. Disse ter visto
isso, por exemplo, no Detran. Acha que hoje em dia é difícil não se ter consciência do
problema do lixo, já que circulam por aí tantas informações e imagens, por exemplo, de
animais marinhos que morrem por ingestão ou estar presos em itens plásticos.

Relatou sobre o fato da coleta seletiva não levar o isopor que é um item que
infelizmente se usa muito. Ao ser questionada sobre saber para onde vai o resíduo, disse
que sabe que os resíduos vão para um galpão na Grota, mas por ser um local muito
perigoso, desistiu de tentar visitar. Mas que acredita que os resíduos coletados vão para
um local correto. Disse que viu em alguns lugares informações sobre o custo alto de se
fazer coleta seletiva e isso a preocupa se todos que dizem que fazem, façam realmente.
Para ela, a sociedade “andou para trás”. Pois, antigamente, por exemplo, o leite vinha
engarrafado e o leiteiro quando passava, recolhia a garrafa antiga e lhe dava uma nova
com o leite, refrigerante e cerveja também funcionavam da mesma forma. Hoje, ela vê,
até no clube mesmo que frequenta (um tradicional clube da cidade), os responsáveis do
bar jogando garrafas de vidro long neck no lixo comum e isso a deixa bastante
86

preocupada. E8 considera importante participar da coleta seletiva pois está ajudando o


meio ambiente. E que irá continuar fazendo enquanto tiver para onde destinar seu lixo.

Entrevistado 9 – E9

E9 foi o primeiro homem a se dispor a participar da entrevista. Se voluntariou


por meio do post no grupo de facebook de moradores do bairro feito pela pesquisadora.
E9 é branco, acredita-se que possui um pouco mais de 60 anos e acabou de se aposentar.
Mora com a esposa em uma casa confortável com piscina. Possui Mestrado pela
Coppe/UFRJ e trabalhou por anos na área de Engenharia, já tendo realizado projetos de
gestão integrada e por isso conhece tecnicamente sobre gestão de resíduos. Disse ter
sido um dos pioneiros a participar do projeto de coleta seletiva comunitária do bairro,
onde mora há 30 anos (enfatizou que naquele exato dia fazia o aniversário de 30 anos
que morava ali).

E9 já morou com os filhos e esposa, mas hoje a casa é ocupada apenas pelo
casal. E9 tem Mestrado e sua esposa curso superior. A esposa de E9 geralmente era a
responsável pela gestão do lixo pois geralmente estava mais em casa. Agora que se
aposentou, ele também está cuidando dos resíduos. E9 relatou que já trabalhou em
várias empresas que faziam coleta seletiva e inclusive já foi responsável por sistemas
de gestão integrada. Então faziam a destinação de recicláveis, inclusive lâmpadas e
cartuchos de impressora.

O morador não lembra exatamente como ficou sabendo do projeto de coleta


seletiva. Afirmou que já fazia coleta seletiva em sua casa independente do início da
coleta local. Disse que antigamente, havia um paciente do hospital psiquiátrico de
Jurujuba que passava pelas casas coletando latinhas de alumínio e eles já separavam
para ele. Com isso, ele começou a criar o hábito de separar o lixo comum dos
recicláveis. Quando começou o projeto da associação de moradores, E9 afirmou que a
coleta acontecia às quartas.

E9 afirmou que a CLIN não tem passado mais em sua rua. Porém, ele mantém o
hábito de deixar os sacos de recicláveis na porta pois disse que Catadores passam para
coletar. Pelo diálogo de E9, teve-se a impressão que ele não percebeu o momento em
que o projeto comunitário se encerrou e a coleta passou a ser realizado pela CLIN. A
pesquisadora crê que pelo fato do mesmo até pouco tempo trabalhar durante o horário
87

comercial, provavelmente não acompanhou bem todo o processo e nem como está
funcionando o serviço. Informou que quando acumula grande quantidade de resíduos,
leva até o Ecoponto da empresa ENEL (concessionária de energia da cidade) que recebe
recicláveis e troca por desconto na conta de luz.

O entrevistado afirma que não recebeu nenhuma orientação sobre como realizar
a coleta seletiva no bairro, porém, por na época já trabalhar em empresa onde havia
coleta seletiva, ele já conhecia o funcionamento na prática. Por isso também relata não
ter dúvidas na hora de realizar a separação. E como não tem uma coleta fixa, não sabe
exatamente para onde vão seus resíduos.

Para E9 realizar a coleta seletiva é importante pois considera uma perda muito
grande descartar os resíduos sem poder reutilizá-los, já que tem tantas coisas que
poderiam ser feitas. Citou que hoje as pessoas usam PET para fazer tecido, entre outras
coisas, inclusive alguns usam para fazer móveis, como bancos. E acha, que deveria
haver mais pesquisa para que se encontrassem novas formas de transformar recicláveis.
Contou que a filha dele mora nos EUA e foi passar o natal na casa de uma amiga em
Dubai. Que a amiga da filha dele é riquíssima em Dubai e que o marido da mesma é
muito rico e o negócio dele é lixo reciclável. E que a filha dele nunca imaginou que
alguém poderia ficar rico trabalhando com lixo. E9 não sabe se aqui no Brasil se
chegará ao nível de levar o lixo tão a sério.

E9 finalizou dizendo que antigamente, na empresa que trabalhava, comentava


com colegas de trabalho que em São Francisco havia coleta seletiva e que as pessoas
ficavam surpresas, pois era o único bairro que tinha no Estado do Rio de Janeiro.

Entrevistada 10 – E10

E10 é uma mulher branca, com traços de mistura racial (a pesquisadora


considerou importante relatar isto, já que a grande parte dos entrevistados parecia de
descendência européia direta) e possui 49 anos. Agendou o encontro em uma cafeteria
da Avenida Rui Barbosa onde estava com uma das filhas, que aparentava ter entre 10 e
11 anos. Aparenta ter boas condições financeiras e demonstrava um engajamento,
preocupação e sensibilidade maior com questões sociais e ambientais em relação a
maioria dos entrevistados. Pediu inclusive ajuda à pesquisadora para conseguirem
melhorar a qualidade da coleta seletiva no bairro.
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E10 viveu a vida inteira no bairro. Na casa onde mora, vivem 7 pessoas mais
duas empregadas que passam o dia por lá: ela (pós-graduada), seu marido (segundo
grau), seu pai curso superior), sua mãe (segundo grau/normal), seu irmão (curso
superior) e suas filhas (em idade escolar). Na sua casa, o descarte dos resíduos é feito
pelas empregadas pela manhã, porém, a separação dos resíduos em recicláveis e não
recicláveis é responsabilidade de todos.

A entrevistada, sabendo que a coleta seletiva não coletava por tipo de material,
resolveu separar seus resíduos em casa por secos e molhados. Os secos, seriam todos os
recicláveis. Ela lamenta que não possa separar por tipo de material (vidro, papel, metal,
plástico). A E10 também reclamou das constantes faltas da coleta seletiva. Afirmou que
até 4 anos atrás, quando o prof Emílio fazia a gestão do projeto de coleta seletiva
comunitária, a coleta acontecia sempre nos mesmos dias e horários. Depois que a CLIN
assumiu a gestão da coleta, há semanas que o caminhão não passa, ou passa no horário
errado, passando a coleta orgânica no horário e dia da coleta seletiva e acaba levando os
resíduos de coleta seletiva que separaram. Diz que fica muito triste por um projeto que
funcionou por tantos anos gerido pelo professor Emílio e que ela cresceu
acompanhando e dentro daquela cultura, estar desta forma, onde não funciona direito.
Argumentou: “como pode uma prefeitura ter menos estrutura do que um homem só?”.
Afirma que o professor Emílio já estava cansado e por isso entregou o projeto para a
prefeitura. Completa ainda que o projeto tinha tudo para crescer e que não era uma
gestão feita pelo lucro e sim pelo bem-estar do bairro. Porém, tudo acaba ficando muito
em cima de uma pessoa só, enquanto considera que por ser um benefício coletivo, todos
deveriam participar.

A E10 não lembra quando começou a participar da coleta seletiva. Disse que não
lembra de algum momento onde não teve coleta seletiva na casa dela. Diz que em sua
casa o volume de lixo orgânico, no caso de restos de comida, é bem baixo. Considera
que a frequência de uma coleta semanal é suficiente já que fazem uma organização em
casa para armazená-lo, incluindo lavar as embalagens. O problema é quando eles não
tem a certeza se haverá a coleta na semana. E relata que quando acontece de passar a
coleta comum no horário da coleta seletiva, levando os resíduos recicláveis junto com
resíduos comum, causa um desânimo nos moradores para participarem da coleta. E que
o que se construiu por anos como cultura no bairro está sendo abandonado muito rápido
pelas pessoas.
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E10 disse que se impressiona com a quantidade de plástico e papel que


produzem como lixo. Ela diz que na casa dela, as filhas veem aquele volume e
conseguem ter uma maior noção de quanto lixo é produzido. Mas na opinião dela, para
quem mora em prédio não se tem essa dimensão, já que o lixo é jogado em um “buraco”
onde o morador se quer saber para onde vai. E depois o lixo vai para um lixão onde
provavelmente o morador também nunca foi e nem sabe o que é. Ela diz que se pudesse
faria algo em praça pública para as pessoas terem a noção de quanto cresce a montanha
de cada tipo de resíduo.

A moradora sente muita falta de mais informações provenientes da prefeitura


sobre a coleta seletiva. Disse que tem muitas dúvidas ao separar e não sabe exatamente
o que eles podem ou não receber. Na maior parte das vezes ela pesquisa por conta
própria e que por via das dúvidas, manda tudo que é limpo e seco na coleta seletiva.
Disse que na época do projeto do professor Emílio, lembra que tiveram algumas ações,
mesmo que poucas, de conscientização. Que ela ainda estava na escola quando o projeto
começou e lembra de ter recebido alguns folhetos. Mas afirma que fazer a divulgação de
material de conscientização para todo o bairro provavelmente seria muito caro para o
projeto comunitário.

Afirmou que hoje não recebe nenhum retorno da prefeitura sobre para onde são
destinados os resíduos recicláveis. Que na época do projeto de coleta seletiva
comunitária, o professor Emílio revertia o valor da venda para a gestão do projeto,
pagamento de funcionários, entre outros referentes ao mesmo. Mas que mesmo assim, o
dinheiro não era suficiente e acabam tendo que reverter algumas verbas da associação
para o projeto. E que provavelmente este foi um dos motivos de desgaste.

E10 diz que ela e sua família pensam sempre para onde vai o resíduo que estão
gerando. E qual o tamanho de sua pegada? Quantos “prédios de lixo” ela teria em cima
dela com tudo que ela gerou? Que pensa muito antes de gerar lixo e sempre tem cuidado
em reutilizar itens. Diz que acaba sendo um pouco “neurótica”. E que em outras casas
onde não há coleta seletiva, ela se sente um pouco incomodada de ter que jogar itens
recicláveis em lixo comum. Percebe a diferença entre ela e seu marido, que não foi
criado em um local com coleta seletiva e até hoje comete erros na hora de separar ou
tem preguiça. Guarda seus resíduos recicláveis produzidos na rua na bolsa e leva para
90

casa para poder destinar corretamente e inclusive aborda colegas de trabalho em relação
ao tema.

Entrevistado 11 – E11

E11 nos recebeu em sua casa ao lado de sua esposa, e responderam a entrevista
juntos. E11 e sua esposa são brancos, com características européias. A casa é grande e
possui um jardim com piscina. E11 é bem engajado em ações da associação de
moradores e foi indicado por uma outra entrevistada também bastante engajada. Fez
questão de falar que São Francisco foi o primeiro bairro do Brasil a ter coleta seletiva.
Moram no bairro desde 1974, onde criaram seus três filhos, que hoje já não moram mais
com eles. Na casa hoje são apenas os dois, um com curso superior e outro com nível
médio e ambos se dedicam aos cuidados com a separação e destinação do lixo
reciclável.

E11 diz que pra ele coleta seletiva é algo importantíssimo, pois com a
destinação correta de resíduos evitaria toda a degradação do meio ambiente, já que
itens, por exemplo, como o plástico, precisam de uma quantidade enorme de tempo para
decomposição. A esposa de E11 afirmou que eles já fazem coleta seletiva há muitos
anos e que possuem uma filha que mora na Alemanha e que lá se leva isso muito a
sério. Que possuem calendários anuais com as datas de coleta e que o vidro é coletado
separado. Ela relatou que no Brasil não se compara, pois o país ainda está engatinhando,
mas mesmo assim, já mantinham este hábito há anos em casa. Mas que sentiu pena ao
comparar com a Alemanha e ver como está a coleta seletiva no Brasil. E11 enfatizou
que na Alemanha coleta seletiva é obrigatória, enquanto aqui é voluntária. A esposa de
E11 relata também que no Brasil a separação por tipo de material não é feita, como é
feita por lá. E11 disse que dentro de casa mesmo as pessoas tem várias lixeiras seletivas
diferentes para cada tipo de material e que utilizam sacos coloridos para identificar o
que é cada coisa ( papel, metal, plástico e vidro). E cada tipo de material é coletado em
dias diferentes da semana. A esposa de E11 mais uma vez diz se sentir triste ao ver, que
por exemplo, hoje no bairro, poucas pessoas participam da coleta seletiva. Que hoje
nem sabe quais vizinhos participam.

E11 informou que participam da coleta seletiva desde a criação do projeto e que
em sua rua hoje a coleta é feita pela CLIN acontecendo toda quarta-feira. A esposa de
E11 lembrou que o projeto começou com a coleta sendo feita por um pequeno trator e
91

E11 somou dizendo que o trator era da própria associação de moradores e passou
muitos anos sendo assim o recolhimento. E se mantinham com o dinheiro da coleta e da
associação. A esposa de E11 disse que antigamente, o bairro tinha uma associação
muito forte. Que havia um senhor conhecido como Tarquínio (já falecido e muito citado
em todas as entrevistas), que era bastante dedicado ao bairro e cuidava muito bem da
associação. Depois o próprio professor Emílio também se dedicou à cuidar da
associação além do projeto.

E11 e sua esposa consideram a frequência de coleta seletiva uma vez por semana
suficiente e geram basicamente, plástico, papel e vidro. Disseram na época não ter
recebido orientação de como fazer coleta seletiva, nem atualmente, Foram fazendo a
separação por conta própria. E11 relatou que dentre os materiais não coletados
atualmente mas que gostaria que coletasse pois é reciclável seria o ferro. E que hoje não
tem nenhum feedback do que a CLIN faz com os resíduos coletados, então
desconhecem para onde são levados seus resíduos e o que é feito com eles.

Sobre a importância de participar da coleta seletiva, a esposa de E11 enfatiza a


preocupação com a preservação da natureza. Relata o quanto de resíduos jogado nas
ruas contribui para a ocorrência de enchentes e que ela sempre conversa sobre isso com
o marido, pois compara muito com a Alemanha por ir pra lá com frequência. Que na
opinião dela o problema não é dinheiro e sim a educação, que são coisas que só
mudariam com educação. Que na Alemanha não é só questão de ser um país rico e sim
uma questão de educação. E11 considera também que a quantidade de pessoas que
participam da coleta seletiva é muito pequena. Que não há nenhuma campanha
incentivando e conscientizando os moradores. A esposa de E11 vê poucos vizinhos
participando da coleta seletiva. E11 acha que a reciclagem deveria ser obrigatória, mas
que antes disso deveria acontecer uma campanha explicando para as pessoas a
importância. A esposa de E11 acredita que muitas pessoas nem se quer sabem que há
coleta seletiva no bairro. Principalmente nos prédios novos do bairro e entre os novos
moradores, que chegaram após o projeto.

E11 falou após a entrevista que não acha viável que o projeto retorne a ser
gerido pelos moradores como antes (como desejado por uma das entrevistadas),
principalmente pelo alto custo e por não ver tantas pessoas com interesse em se dedicar
a isso. A esposa de E11 disse ter ficado feliz a o ver uma pessoa jovem como a
92

pesquisadora e moradora do bairro, trazendo o assunto sobre a coleta seletiva


novamente à tona e interessada por ele.
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ANEXO 2 – ROTEIRO DE ENTREVISTA

Questionário qualitativo para pesquisa de dissertação de Mestrado em Engenharia


Urbana

Objetivo Geral da pesquisa qualitativa: Analisar a percepção dos moradores do bairro de


São Francisco em Niterói sobre a coleta seletiva local.

Objetivos específicos:

 Identificar a interação dos moradores locais com ações de coleta seletiva;


 Verificar a satisfação dos moradores com os serviços locais de coleta seletiva;
 Verificar a relevância do tema no bairro segundo a opinião dos moradores sobre
o mesmo.

Perguntas (moldáveis):

1. Há quanto tempo vive no bairro?

2. Quantas pessoas vivem em sua casa?

3. Qual o nível de escolaridade das pessoas que vivem em sua casa?

4. Quem costuma ser responsável pela gestão e destinação do lixo em sua casa?

5. O que você entende sobre coleta seletiva?

6. Você participa da coleta seletiva? Desde quando? Como ficou sabendo?

7. A coleta seletiva que você participa é feita por quem? É porta a porta ou você
leva até algum local?

8. Qual a frequência da coleta seletiva em seu bairro? Considera suficiente?

9. Como e que tipos de resíduos você costuma separar?

10. Como aprendeu a realizar esta separação? Recebeu alguma orientação de


alguém?

11. Você tem dúvidas ao realizar a separação?

12. Que resíduos a coleta seletiva não leva, mas você gostaria de separar do seu lixo
comum?

13. Você sabe para onde é levado seu resíduo?

14. Para você, qual a importância em participar da coleta seletiva?


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ANEXO 3 – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESPONTÂNEO (TCLE)

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO (TCLE)

Prezado(a) senhor(a),
Você está sendo convidado(a) a participar da pesquisa: Pesquisa Qualitativa
para Análise da Percepção de Moradores do Bairro de São Francisco sobre a Coleta
Seletiva em Niterói.
A sua participação na pesquisa se dará por meio de respostas às perguntas feitas
pela pesquisadora sobre a temática da pesquisa e terá duração de aproximadamente 30
minutos. É padrão que pesquisas qualitativas sejam gravadas pelos pesquisadores,
facilitando assim, posteriormente, a transcrição das respostas. Esta gravação será de uso
único e exclusivamente da pesquisadora e seu orientador.
Esta pesquisa está sendo realizada por Patrícia Hespanhol S. Fernandes dentro do
programa de Mestrado em Engenharia Urbana da Escola Politécnica da Universidade
Federal do Rio de Janeiro cuja pesquisadora está vinculada. A pesquisadora tem seu
trabalho monitorado e orientado pelo Professor Doutor Cláudio Fernando Mahler,
vinculado à mesma universidade. Caso haja qualquer dúvida, ele poderá ser localizado
no e-mail cfmahler@poli.ufrj.br, no telefone (21) 99567-0431 ou no Laboratório de
Geotecnia da COPPE/UFRJ na Av. Pedro Calmon, 596 - Cidade Universitária, Rio de
Janeiro – RJ.
Sua privacidade será respeitada. Seu nome ou qualquer outro dado ou elemento que
possa, de qualquer forma, te identificar, será mantido em sigilo durante toda a pesquisa.
Sendo apenas utilizadas de forma escrita suas respostas. O(a) senhor(a) tem a liberdade
de não participar da pesquisa ou retirar seu consentimento a qualquer momento, mesmo
após o início da entrevista/coleta de dados, sem qualquer prejuízo. O(a) senhor(a) não
terá nenhuma despesa e não há compensação financeira relacionada à sua participação
na pesquisa.
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Sua participação é importante e voluntária e vai gerar informações que serão úteis
para fazermos uma análise da percepção e participação dos moradores na coleta seletiva
em São Francisco. Cujo local, é historicamente considerado o primeiro bairro do Brasil
a ter este tipo de coleta de resíduos recicláveis.

Acredito ter sido suficientemente informado(a) a respeito do que li ou foi lido


para mim, sobre a pesquisa: “Pesquisa Qualitativa para Análise da Percepção de
Moradores do Bairro de São Francisco sobre a Coleta Seletiva em Niterói”. Ficaram
claros para mim os propósitos do estudo, os procedimentos, garantias de sigilo, de
esclarecimentos permanentes e isenção de despesas. Concordo voluntariamente em
participar deste estudo.

______________________________________________________ ____/____/____
Assinatura do(a) entrevistado(a)

Declaro que obtive de forma apropriada e voluntária o Termo de Consentimento


Livre e Esclarecido deste(a) entrevistado(a).

__________________________________________________________ __/____/____
Assinatura da pesquisadora
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ANEXO 4 - PRINCIPAIS CONCEITOS DA POLÍTICA NACIONAL DE


RESÍDUOS SÓLIDOS – LEI 12.305/2010 APLICADOS À ESTA
DISSERTAÇÃO.

Acordo setorial: ato de natureza contratual firmado entre o poder público e fabricantes,
importadores, distribuidores ou comerciantes, tendo em vista a implantação da
responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida do produto;

Ciclo de vida do produto: série de etapas que envolvem o desenvolvimento do produto,


a obtenção de matérias-primas e insumos, o processo produtivo, o consumo e a
disposição final;

Coleta seletiva: coleta de resíduos sólidos previamente segregados conforme sua


constituição ou composição;

Controle social: conjunto de mecanismos e procedimentos que garantam à sociedade


informações e participação nos processos de formulação, implementação e avaliação
das políticas públicas relacionadas aos resíduos sólidos;

Destinação final ambientalmente adequada: destinação de resíduos que inclui a


reutilização, a reciclagem, a compostagem, a recuperação e o aproveitamento energético
ou outras destinações admitidas pelos órgãos competentes do Sisnama, do SNVS e do
Suasa, entre elas a disposição final, observando normas operacionais específicas de
modo a evitar danos ou riscos à saúde pública e à segurança e a minimizar os impactos
ambientais adversos;

Disposição final ambientalmente adequada: distribuição ordenada de rejeitos em aterros,


observando normas operacionais específicas de modo a evitar danos ou riscos à saúde
pública e à segurança e a minimizar os impactos ambientais adversos;

Geradores de resíduos sólidos: pessoas físicas ou jurídicas, de direito público ou


privado, que geram resíduos sólidos por meio de suas atividades, nelas incluído o
consumo;

Gerenciamento de resíduos sólidos: conjunto de ações exercidas, direta ou


indiretamente, nas etapas de coleta, transporte, transbordo, tratamento e destinação final
ambientalmente adequada dos resíduos sólidos e disposição final ambientalmente
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adequada dos rejeitos, de acordo com plano municipal de gestão integrada de resíduos
sólidos ou com plano de gerenciamento de resíduos sólidos, exigidos na forma desta
Lei;

Gestão integrada de resíduos sólidos: conjunto de ações voltadas para a busca de


soluções para os resíduos sólidos, de forma a considerar as dimensões política,
econômica, ambiental, cultural e social, com controle social e sob a premissa do
desenvolvimento sustentável;

Logística reversa: instrumento de desenvolvimento econômico e social caracterizado


por um conjunto de ações, procedimentos e meios destinados a viabilizar a coleta e a
restituição dos resíduos sólidos ao setor empresarial, para reaproveitamento, em seu
ciclo ou em outros ciclos produtivos, ou outra destinação final ambientalmente
adequada;

Padrões sustentáveis de produção e consumo: produção e consumo de bens e serviços


de forma a atender as necessidades das atuais gerações e permitir melhores condições de
vida, sem comprometer a qualidade ambiental e o atendimento das necessidades das
gerações futuras;

Reciclagem: processo de transformação dos resíduos sólidos que envolve a alteração de


suas propriedades físicas, físico-químicas ou biológicas, com vistas à transformação em
insumos ou novos produtos, observadas as condições e os padrões estabelecidos pelos
órgãos competentes do Sisnama e, se couber, do SNVS e do Suasa;

Rejeitos: resíduos sólidos que, depois de esgotadas todas as possibilidades de


tratamento e recuperação por processos tecnológicos disponíveis e economicamente
viáveis, não apresentem outra possibilidade que não a disposição final ambientalmente
adequada;

Resíduos sólidos: material, substância, objeto ou bem descartado resultante de


atividades humanas em sociedade, a cuja destinação final se procede, se propõe
proceder ou se está obrigado a proceder, nos estados sólido ou semissólido, bem como
gases contidos em recipientes e líquidos cujas particularidades tornem inviável o seu
lançamento na rede pública de esgotos ou em corpos d’água, ou exijam para isso
soluções técnica ou economicamente inviáveis em face da melhor tecnologia disponível;
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Responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos: conjunto de


atribuições individualizadas e encadeadas dos fabricantes, importadores, distribuidores e
comerciantes, dos consumidores e dos titulares dos serviços públicos de limpeza urbana
e de manejo dos resíduos sólidos, para minimizar o volume de resíduos sólidos e
rejeitos gerados, bem como para reduzir os impactos causados à saúde humana e à
qualidade ambiental decorrentes do ciclo de vida dos produtos, nos termos desta Lei;

Reutilização: processo de aproveitamento dos resíduos sólidos sem sua transformação


biológica, física ou físico-química, observadas as condições e os padrões estabelecidos
pelos órgãos competentes do Sisnama e, se couber, do SNVS e do Suasa;

Serviço público de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos: conjunto de


atividades previstas no art. 7º da Lei nº 11.445, de 2007.
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ANEXO 5 - CONTEÚDO MÍNIMO DOS PLANOS MUNICIPAIS DE GESTÃO


INTEGRADA DE RESÍDUOS SÓLIDOS PREVISTO NA LEI 12.305/2010 -
POLÍTICA NACIONAL DE RESÍDUOS SÓLIDOS

I - diagnóstico da situação dos resíduos sólidos gerados no respectivo território,


contendo a origem, o volume, a caracterização dos resíduos e as formas de destinação e
disposição final adotadas;

II - identificação de áreas favoráveis para disposição final ambientalmente adequada de


rejeitos, observado o plano diretor de que trata o § 1o do art. 182 da Constituição
Federal e o zoneamento ambiental, se houver;

III - identificação das possibilidades de implantação de soluções consorciadas ou


compartilhadas com outros Municípios, considerando, nos critérios de economia de
escala, a proximidade dos locais estabelecidos e as formas de prevenção dos riscos
ambientais;

IV - identificação dos resíduos sólidos e dos geradores sujeitos a plano de


gerenciamento específico nos termos do art. 20 ou a sistema de logística reversa na
forma do art. 33, observadas as disposições desta Lei e de seu regulamento, bem como
as normas estabelecidas pelos órgãos do Sisnama e do SNVS;

V - procedimentos operacionais e especificações mínimas a serem adotados nos


serviços públicos de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos, incluída a
disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos e observada a Lei nº 11.445, de
2007;

VI - indicadores de desempenho operacional e ambiental dos serviços públicos de


limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos;

VII - regras para o transporte e outras etapas do gerenciamento de resíduos sólidos de


que trata o art. 20, observadas as normas estabelecidas pelos órgãos do Sisnama e do
SNVS e demais disposições pertinentes da legislação federal e estadual;

VIII - definição das responsabilidades quanto à sua implementação e operacionalização,


incluídas as etapas do plano de gerenciamento de resíduos sólidos a que se refere o art.
20 a cargo do poder público;

IX - programas e ações de capacitação técnica voltados para sua implementação e


operacionalização;

X - programas e ações de educação ambiental que promovam a não geração, a redução,


a reutilização e a reciclagem de resíduos sólidos;
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XI - programas e ações para a participação dos grupos interessados, em especial das


cooperativas ou outras formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e
recicláveis formadas por pessoas físicas de baixa renda, se houver;

XII - mecanismos para a criação de fontes de negócios, emprego e renda, mediante a


valorização dos resíduos sólidos;

XIII - sistema de cálculo dos custos da prestação dos serviços públicos de limpeza
urbana e de manejo de resíduos sólidos, bem como a forma de cobrança desses serviços,
observada a Lei nº 11.445, de 2007;

XIV - metas de redução, reutilização, coleta seletiva e reciclagem, entre outras, com
vistas a reduzir a quantidade de rejeitos encaminhados para disposição final
ambientalmente adequada;

XV - descrição das formas e dos limites da participação do poder público local na coleta
seletiva e na logística reversa, respeitado o disposto no art. 33, e de outras ações
relativas à responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos;

XVI - meios a serem utilizados para o controle e a fiscalização, no âmbito local, da


implementação e operacionalização dos planos de gerenciamento de resíduos sólidos de
que trata o art. 20 e dos sistemas de logística reversa previstos no art. 33;

XVII - ações preventivas e corretivas a serem praticadas, incluindo programa de


monitoramento;

XVIII - identificação dos passivos ambientais relacionados aos resíduos sólidos,


incluindo áreas contaminadas, e respectivas medidas saneadoras;

XIX - periodicidade de sua revisão, observado prioritariamente o período de vigência do


plano plurianual municipal.

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