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PROCESSO Nº TST-RR-757/2004-071-15-40.

A C Ó R D Ã O
(Ac. 6ª Turma)
GMMGD/mjr/ef

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIFERENÇAS


SALARIAIS. JORNALISTA. REGISTRO DE
DIPLOMA DE CURSO DE NÍVEL SUPERIOR.
TEORIA ESPECIAL TRABALHISTA DE
NULIDADES. Demonstrado no agravo de
instrumento que o recurso de revista
preenchia os requisitos do art. 896
da CLT, quanto ao tema relativo às
diferenças salariais, ante a
constatação de divergência
jurisprudencial com o aresto
colacionado. Agravo de instrumento
provido.
RECURSO DE REVISTA. DIFERENÇAS
SALARIAIS. JORNALISTA. REGISTRO DE
DIPLOMA DE CURSO DE NÍVEL SUPERIOR.
TEORIA ESPECIAL TRABALHISTA DE
NULIDADES. No Direito do Trabalho,
distintamente do Direito Civil,
vigora, regra geral, uma teoria
especial trabalhista de nulidades -
excetuando-se a mitigação dada pela
construção jurisprudencial desta
Corte firmada na Súmula 363/TST,
assim como a sua total
inaplicabilidade no tocante ao
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“trabalho ilícito”, como, por


exemplo, a exploração do jogo do
bicho (OJ 199 da SDI-1) ou o
exercício ilegal de medicina (art.
282 do CP). A par dessas observações,
inúmeras são as situações bastante
comuns que ensejam a plena aplicação
da teoria justrabalhista de
nulidades, como o que ocorre em
relação ao efetivo exercício da
profissão de jornalista sem a
comprovação de prévio registro de
conclusão de curso superior em
jornalismo ou em comunicação social
(arts. 4º do Decreto 972/69 e 4º do
Decreto 83284/79). Há que se
reconhecer que, cumpridas as funções
efetivas de jornalista – e não sendo
ilícito o exercício irregular da
profissão -, cabe reconhecerem-se os
efeitos do contrato realidade, sendo
irrelevante, para tais efeitos, que à
época da prestação de serviços
inexistisse a comprovação de prévio
registro de conclusão de curso
superior em jornalismo ou em
comunicação social. Recurso de
revista provido.
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Vistos, relatados e discutidos estes autos de


Recurso de Revista n° TST-RR-757/2004-071-15-40.5, em que é
Recorrente VIVIAN CRISTIANE CARDOSO e Recorrido LC BENEDITO &
VICENZOTTI LTDA. E OUTRA.

A Presidência do TRT da 15ª Região denegou


seguimento ao recurso de revista da Reclamante com fundamento nas
Súmulas 23, 126, 221, II, ambas do TST (fl. 263).
Inconformada, a Reclamante interpõe o presente
agravo de instrumento, sustentando que seu recurso de revista reunia
condições de admissibilidade (fls. 2-23).
Não foram apresentadas contraminuta ao agravo de
instrumento ou contra-razões ao recurso de revista, sendo dispensada
a remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho, nos termos do
art. 83, § 2º, do RITST.
É o relatório.

V O T O

A) AGRAVO DE INSTRUMENTO

I) CONHECIMENTO

Atendidos todos os pressupostos recursais, CONHEÇO


do apelo.

II) MÉRITO
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DIFERENÇAS SALARIAIS. JORNALISTA. REGISTRO DE


DIPLOMA DE CURSO DE NÍVEL SUPERIOR. TEORIA ESPECIAL TRABALHISTA DE
NULIDADES

O Regional manteve a decisão originária que


indeferiu as diferenças postuladas pela inobservância do piso
salarial da categoria de jornalista, ao argumento de que não foram
cumpridos os requisitos legais para o exercício da referida
profissão.
No recurso de revista, a Reclamante sustenta que
desde o início do pacto laboral efetivamente desenvolvia as
atribuições de jornalista a despeito de em parte de seu contrato de
trabalho não possuir diploma de jornalismo. Exemplifica as
atividades desempenhadas: realização de reportagens, fotografias e
redação de matérias. Aponta violação dos arts. 5º, XIII, 7º, V, da
CF e 302, § 1º, da CLT. Colaciona julgados para o confronto de
teses.
A Reclamante logrou êxito em demonstrar
divergência jurisprudencial com o primeiro aresto de fl. 254, o qual
espelha tese da prescindibilidade da exibição de diploma de curso
superior de jornalismo para o exercício da profissão de jornalista.
Pelo exposto, DOU PROVIMENTO ao agravo de
instrumento para determinar o processamento do recurso de revista.

B) RECURSO DE REVISTA

I) CONHECIMENTO
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CONHEÇO do recurso por atendidos os pressupostos


gerais de admissibilidade.

1) PRELIMINAR DE NULIDADE POR NEGATIVA DE


PRESTAÇÃO JURISDICIONAL

Ante o conhecimento e provimento do recurso de


revista da Reclamante, no que concerne às diferenças salariais pelo
seu enquadramento como jornalista, são aplicáveis, à hipótese, os
arts. 794 da CLT e 249, § 2º, do CPC, rejeitando-se, portanto, a
preliminar.

2) DIFERENÇAS SALARIAIS. JORNALISTA. REGISTRO DE


DIPLOMA DE CURSO DE NÍVEL SUPERIOR. TEORIA ESPECIAL TRABALHISTA DE
NULIDADES

Restou pontuado pelo Regional:

“DO RECURSO ORDINÁRIO DAS RECLAMADAS


(...)
Logo, o conjunto probatório revelou que a reclamante não era mera
colaboradora da reclamada, entendida esta colaboração como aquela
atividade executada na elaboração de matérias apenas quando solicitada,
firmando contratos de cessão de direitos autorais e de licença de
reprodução, sem pessoalidade e qualquer tipo de fiscalização pela empresa
jornalística, uma vez que desempenhava atividades jornalísticas de
forma subordinada à recorrida, já que se reunia com o editor em reuniões
de pauta semanais, recebia pagamento mensal pelos serviços prestados,
conforme inclusive consta no contrato de prestação de serviços que assinou
(fls. 17), situação esta que faz presumir que, se a empresa a remunerava de
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forma mensal, era porque dela esperava o fornecimento de matérias para


compor sua edição jornalística, que segundo a testemunha era da ordem de
‘oito a dez matérias por edição; as edições eram bissemanais’. Diga-se que
a vasta prova documental produzida nos autos (caixas de documentos
anexas) indica que a reclamante trabalhava continuamente para a
reclamada, dada à quantidade de matérias suas publicadas em todas as
edições da reclamada.
Por fim, como bem observou a origem, ‘não se pode conceber uma
empresa jornalística que não possua um jornalista sequer como
empregado, como no caso dos autos, porém possua um editor, que é o
responsável pela publicação do jornal. A autora estava plenamente
inserida na atividade fim das empresas, posto que foi contratada para
prestar serviços profissionais como JORNALISTA..., ou seja, para fornecer
material jornalístico que permitem a publicação do jornal pertencente ao
grupo de empresas...’ (fls. 131).
Destarte, mantém-se o entendimento de origem porque o conjunto
probatório é convincente no sentido de que entre as partes existiu, de fato,
prestação de serviços de natureza empregatícia, autorizando a condenação
imposta.
Nada a reformar.

DO RECURSO DA RECLAMANTE.

Pretende a reclamante o recebimento de diferenças salariais pela


observância do piso da categoria profissional dos jornalistas, reconhecendo
que era estudante de Jornalismo quando iniciou a prestação de serviços,
mas que concluiu o curso em 11.02.2004, quando seu diploma foi
registrado (cf. fls. 58 verso); alega que, mesmo sendo estudante, exercia de
fato a função de jornalista, o que autoriza o deferimento do pedido.
Nada a deferir.
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É que o exercício da profissão de jornalista requer prévio registro no


órgão regional do Ministério do Trabalho, mediante a apresentação de
prova de nacionalidade brasileiro (nato ou naturalizado), folha corrida,
carteira profissional e diploma de curso superior de jornalismo, oficial ou
reconhecido, registrado no Ministério da Educação ou em instituição por
ele credenciada, consoante dispõe o art. 4º, do Decreto n. 83.284, de 13 de
março de 1979, não bastando, para tanto, a conclusão de curso superior
específico e nem mesmo a prática rotineira desta atividade para conferir à
reclamante o status de Jornalista.
Logo, indevidas as diferenças salariais que postulou” (fl. 236, g.n.).

Interpostos embargos de declaração, o Regional


assim se pronunciou:

“Conheço dos embargos declaratórios, porque tempestivos.


Consoante se infere da fundamentação expendida às fls. 286, esta E.
Turma analisou todos os pontos articulados na peça de embargos
declaratórios, entendendo, por votação unânime , que ‘o exercício da
profissão de jornalista requer prévio registro no órgão regional do
Ministério do Trabalho, mediante a apresentação de prova de
nacionalidade brasileira (nato ou naturalizado), folha corrida, carteira
profissional e diploma de curso superior de jornalismo, oficial ou
reconhecido, registrado no Ministério da Educação ou em instituição por
ele credenciada, consoante dispõe o art. 4º, do Decreto n. 83.284, de 13 de
março de 1979, não bastando, para tanto, a conclusão de curso superior
específico e nem mesmo a prática rotineira desta atividade para conferir à
reclamante o status de Jornalista’, mantendo o entendimento de origem
que indeferiu as diferenças salariais postuladas.
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Logo, não houve mácula no julgado embargado a autorizar a oposição


dos presentes embargos, frisando-se que não foram violados os dispositivos
constitucionais invocados naquela peça” (fl. 242).

No recurso de revista, a Reclamante sustenta que


desde o início do pacto laboral efetivamente desenvolvia as
atribuições de jornalista a despeito de em parte de seu contrato de
trabalho não possuir diploma de jornalismo. Exemplifica as
atividades desempenhadas: realização de reportagens, fotografias e
redação de matérias. Aponta violação dos arts. 5º, XIII, 7º, V, da
CF e 302, § 1º, da CLT. Colaciona julgados para o confronto de
teses.
A Reclamante logrou êxito em demonstrar
divergência jurisprudencial com o primeiro aresto de fl. 254, o qual
espelha tese da prescindibilidade da exibição de diploma de curso
superior de jornalismo para o exercício da profissão de jornalista.
CONHEÇO do recurso.

II) MÉRITO

DIFERENÇAS SALARIAIS. JORNALISTA. REGISTRO DE


DIPLOMA DE CURSO DE NÍVEL SUPERIOR. TEORIA ESPECIAL TRABALHISTA DE
NULIDADES

No Direito do Trabalho, distintamente do Direito


Civil, vigora, regra geral, uma teoria própria de nulidades, a qual
condensa basicamente três aspectos fundamentais: 1) a circunstância
de que se torna inviável, faticamente, após concretizada a prestação
efetiva do trabalho, o reposicionamento pleno das partes à situação
anterior ao contrato nulo; 2) o fato de que a transferência e
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apropriação do trabalho em benefício do tomador cria uma situação


econômica consumada de franco desequilíbrio entre as partes, que
apenas pode ser corrigida – mesmo que parcialmente – com o
reconhecimento dos direitos trabalhistas ; 3) a convicção de existir
uma prevalência incontestável conferida pela ordem jurídica em seu
conjunto ao valor-trabalho e aos direitos trabalhistas, o que
resulta na repercussão de efeitos justrabalhistas ao trabalho
efetivamente cumprido.
É importante o registro de que a teoria
justrabalhista especial nem sempre é passível de plena aplicação,
tendo esta Corte a mitigado na hipótese de reconhecimento de
nulidade de contratação por ausência de certame público (art. 37, II
e §2º, CF), considerando como efeitos da relação jurídica apenas
aqueles fixados nos termos expressos da Súmula 363/TST (este Relator
tem ressalvado seu entendimento por entender que se aplicaria mais
amplamente a teoria especial trabalhista de nulidade).
Noutro norte, também há que se considerar
inaplicável a referida teoria especial trabalhista de nulidades ao
denominado “trabalho ilícito”, como, por exemplo, no tocante ao
exercício ilegal de medicina, capitulado como crime (art. 282 do
CP).
Nesse mesmo sentido, esta Corte, ao examinar os
efeitos trabalhistas em relação aos vícios e defeitos do contrato de
trabalho - além da já referida aplicação atenuada da Súmula 363 -,
tem-se pautado na distinção existente entre o trabalho ilícito e o
trabalho proibido.
Sob essa perspectiva, em se tratando de trabalho
ilícito não se tem reconhecido qualquer efeito trabalhista, como se
depreende da OJ 199 da SDI-1, acerca da prestação de serviços
relacionados à exploração do jogo do bicho, em que se firmou o
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entendimento de que, em face da ilicitude do objeto do referido


contrato, não se confere nenhum efeito trabalhista à avença.
Por outro lado, em se tratando de trabalho
proibido – aquele que não se reveste de ilicitude -, em face do
princípio da primazia da realidade e pelo fato de que o beneficiário
da mão de obra não pode se locupletar com sua própria torpeza,
opondo a vedação legal a fim de se eximir do cumprimento de
obrigações trabalhistas, por certo que poderia e pode produzir todos
os efeitos legais.
Nessa perspectiva, cita-se a Súmula 386/TST, que
reconhece a relação de emprego entre policial militar e empresa
privada – trabalho lícito -, apesar de proibida pelo Estatuto do
Policial Militar.
A par dessas observações, inúmeras são as
situações bastante comuns que ensejam a plena aplicação da teoria
justrabalhista de nulidades, como o que ocorre em relação ao efetivo
exercício da profissão de jornalista sem a comprovação de prévio
registro de conclusão de curso superior em jornalismo ou em
comunicação social (arts. 4º do Decreto 972/69 e 4º do Decreto
83284/79).
Há que se reconhecer que, cumpridas as funções
efetivas de jornalista – e não sendo ilícito o exercício irregular
da profissão -, cabe reconhecerem-se os efeitos do contrato
realidade.
Na hipótese, portanto, são devidas as diferenças
salariais pela observância do piso referente à efetiva função de
jornalista desempenhada pela Reclamante, sendo irrelevante, para tal
efeito, que à época da prestação de serviços inexistisse a
comprovação de prévio registro de conclusão de curso superior em
jornalismo ou em comunicação social.
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PROCESSO Nº TST-RR-757/2004-071-15-40.5

Pelo exposto, DOU PROVIMENTO ao recurso para


condenar a Reclamada no pagamento de diferenças salariais pela
observância do piso da categoria profissional dos jornalistas.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Sexta Turma do Tribunal


Superior do Trabalho, por unanimidade, I - dar provimento ao agravo
de instrumento, para determinar o processamento do recurso de
revista; II – conhecer do recurso de revista, por divergência
jurisprudencial quanto às diferenças salariais e, no mérito, dar-lhe
provimento para condenar a Reclamada no pagamento de diferenças
salariais pela observância do piso da categoria profissional dos
jornalistas.
Brasília, 21 de outubro de 2009.

MAURICIO GODINHO DELGADO


Ministro Relator

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