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O QUE FAZER NA BOLSA COM O DÓLAR ACIMA DE R$ 4,00?

Após quase romper os R$ 4,00 em 2002 durante as eleições presidenciais, o dólar finalmente
superou essa barreira em setembro de 2015, e pelo andar da carruagem esse valorização está
longe de seu pico. A notícia é péssima para o Brasil em geral, certo? Não para todo mundo.
No mundo do mercado financeiro, a moeda norte-americana afeta as empresas basicamente de
duas formas: no lado da receita e dos custos. E neste sentido é importante o investidor ficar
atento para o quanto a moeda tem interferência no resultado em cada um destes lados do
balanço.
Apenas neste ano, o dólar já registrou alta de 52% em relação ao real, a segunda maior entre as
principais divisas do mundo. No cenário externo, o mundo fica atento ao momento em que o
Federal Reserve deve elevar os juros nos Estados Unidos, que atualmente está entre 0% e 0,25%
ao ano. Quando isso acontecer, o consenso geral é que a gente presencie um forte fluxo de capital
para os EUA, afetando principalmente as economias emergentes mais frágeis – e o Brasil
atualmente tem uma cadeira cativa nesse rol. É fato que os juros subirão por lá, a grande dúvida
fica em relação ao timing – boa parte espera que isso ocorra neste ano, enquanto outros
acreditam em elevação apenas em 2016.
Se lá fora o cenário não ajuda a frear a alta do dólar, aqui dentro a crise econômica combinada
com a grande tensão política apenas funciona como gasolina no incêndio: o risco da perda de grau
de investimento do País e as dificuldades do governo em colocar a reforma fiscal em prática, além
das vozes cada vez mais fortes de pedidos de impeachment da presidente Dilma Rousseff, ajudam
a afastar o capital estrangeiro do Brasil. E quando há menos dólares por aqui, o valor da moeda
frente ao real aumenta – a famosa lei de oferta e demanda.
No mercado de ações, é comum associarmos a alta do dólar a quedas no Ibovespa, pelos motivos
citados acima. E não precisa ser um aspirante a Warren Buffett para concluir que: i) empresas
importadoras e com dívidas em dólar tendem a sofrer mais com isso; e ii) exportadoras com
custos em reais conseguem andar melhor por este caminho adverso da economia. Apesar do
raciocínio correto, uma análise mais profunda pode apresentar oportunidades “fora da caixa” e
que podem ser ainda melhores para quem procura uma boa ação para investir neste momento.
O​InfoMoney preparou um material bem didático mostrando quem são as grandes vencedoras e
perdedoras da Bovespa com o dólar acima de R$ 4,00, apresentando desde aqueles casos que
parecem “óbvios” até alguns que você talvez nunca imaginaria que seria uma boa opção em uma
carteira de ações “pró-dólar”.
O resultado deste estudo está nas próximas páginas. Que a leitura se converta em boas operações
na Bovespa.

0
Papel e Celulose
Duas das empresas mais afetadas com a movimentação cambial são a ​ Fibria e ​Suzano​,
principalmente pelo fato de que o preço da celulose é cotado em dólar. Diferente de outras
matérias-primas como petróleo e minério de ferro, que caíram mais de 50% desde agosto do ano
passado, a celulose conseguiu passar imune a isso tudo e mantém preços suficientemente
atrativos para engordar as margens dessas empresas.
E o resultado disso é visto na Bolsa: tanto ​
Fibria quanto ​
Suzano aparecem como as maiores altas
do Ibovespa em 2015, com ganhos na faixa de 70%.
No caso da ​
Fibria​
, mais de 90% de sua receita é em moeda norte-americana, enquanto apenas
20% de seus custos são em dólar. Isso ajuda a ofuscar o fato de que 75% da dívida da empresa é
denominada em dólar, um ponto importante para estar atento.
A​
Suzano também tem grande parte da receita lastreada em dólar e menos de 30% dos custos na
moeda. Porém, em seu caso, também há uma grande parte da dívida na divisa estrangeira.
Outra empresa do setor na Bolsa, a ​ Klabin possui uma parte menor da sua receita atrelada ao
dólar, o que explica porque ela tem se valorizado menos que Fibria e Suzano em 2015, como você
pode ver no gráfico abaixo:

1
Embraer
A​Embraer é outra das maiores beneficiadas pela alta do dólar, com aproximadamente 90% de sua
receita proveniente de exportações, enquanto a parte do custo em dólar é de cerca de 75%.
Porém, no caso da fabricante de aeronaves, boa parte da dívida em moeda estrangeira tem menor
impacto do câmbio por conta de operações de hedge, protegendo a empresa de efeitos mais
fortes de alta do dólar.

2
Siderúrgicas
Entre as siderúrgicas listadas na Bovespa, a ​
Gerdau é a que está melhor posicionada para captar o
movimento de alta do dólar, já que 70% da sua receita e 50% do seu Ebitda (lucro antes de juros,
impostos, depreciação e amortização) estão atrelados à moeda americana. Isto porque a
companhia tem forte atuação dentro do mercado dos EUA, de onde vem grande parte de seu
negócio. Mesmo assim, o péssimo momento da indústria brasileira e dos segmentos de construção
civil e infraestrutura (onde ela tem maior exposição) fazem com que a empresa acumula uma
perda de mais de 30% de valor de mercado em 2015.
As outras siderúrgicas não são muito beneficiadas. Tanto ​
CSN quanto ​
Usiminas possuem parte da
receita atrelada ao dólar por conta da exposição ao mercado de minério de ferro, mas com uma
grande dívida em moeda estrangeira, o saldo final acaba sendo negativo.
No caso da ​
CSN​
, a dívida bruta era de R$ 32 bilhões em junho deste ano, sendo 50% em dólar,
com saldo em caixa de R$ 11 bilhões. Mesma situação da ​ Usiminas​, cujo endividamento na
mesma época era de R$ 7,6 bilhões, sendo 44% atrelado ao dólar. Além disso, uma parte muito
pequena do negócio da empresa é voltada para exportação.

3
Vale
A​Vale está entre as empresas que mais se beneficiam com o movimento de alta do dólar, já que
tem quase 100% de sua receita denominada em dólar, enquanto apenas 45% do custo dos seus
produtos vendidos estão em moeda estrangeira.
Apesar disso, o principal produto da empresa, o preço do minério de ferro, vem sofrendo bruscas
quedas desde agosto do ano passado, saindo da faixa de US$ 80 para os atuais US$ 40,
principalmente por causa do processo de desaceleração do crescimento chinês que deve perdurar
até o final desta década. Para muitos, o preço atual do minério é um “fundo”, o que abre uma boa
oportunidade de comprar Vale com foco no longo prazo; para outros, a commodity ainda pode
demorar para se recuperar, afetando os resultados da empresa.
A saber: a ​Vale atualmente tem um custo de produção de US$ 17 por tonelada para produzir
minério, e ela possui planos para diminuir esse custo para US$ 13 a tonelada. Ou seja, mesmo com
as quedas atuais, ela ainda consegue extrair boas margens operacionais. Lembrando ainda que ela
vem passando por um forte processo de corte de custos para conseguir se tornar mais rentável,
tendo inclusive suspendido o pagamento de dividendos aos seus acionistas neste ano para focar
em melhorias internas.

4
Frigoríficos
Outro setor bastante favorecido é o de frigoríficos, com a JBS, Minerva e Marfrig. A primeira
possui 80% de suas vendas denominadas em dólar, mas grande parte da dívida também. Enquanto
isso, a Marfrig também tem grande exposição de suas vendas (cerca de 60%), assim como alta
dívida em dólar (75%). Apesar da alta dívida, ambas acabam tendo saldo positivo com a
valorização do dólar.

5
BRF
Dentre as do setor de alimentos, a melhor posicionada é a BRF, ao possuir uma exposição menor
da dívida em dólar, cerca de 35%, dos quais 95% dela está “hedgeada”. Além disso, 40% de suas
vendas ocorrem na moeda norte-americana.

6
Autopeças
Apesar de estar inserida no caótico setor automotivo, a fabricante de autopeças ​
Iochpe-Maxion
tem cerca de 70% de suas receitas vindas do exterior, o que tem compensado as dificuldades da
indústria.
Há também uma nova dívida em dólar (a Iochpe anunciou recentemente que está buscando
levantar fundos internacionalmente), que poderia ser muito favorável para a empresa, já que ela
ficaria mais barata do que aquela lastreada no benchmark brasileiro (atualmente a empresa tem
três debêntures vinculadas ao CDI que somam R$ 1,2 bilhão, com custo, em média, de 16,8% ao
ano). O custo da dívida em dólar seria de cerca de 8,5%.
Já a fabricante de motores ​
Weg também tem muita exposição lá fora, em mercados como Estados
Unidos e Europa. A empresa tem 50% de sua receita com origem no exterior.
Enquanto isso, a ​
Marcopolo poderia ser mais beneficiada, se não fosse a atual crise do setor
automobilístico no Brasil. A companhia tem exposição de suas receitas no exterior, mas que não
deve ser tão beneficiada assim porque seus negócios no Brasil não estão bem.

7
Sabesp
A Sabesp é uma das empresas com maior exposição da dívida em dólar dentre aquelas que fazem
utilities ​
parte do setor de ​ (empresas de saneamento básico e energia). A companhia não possui
faturamento em dólar e cerca de 26% da sua dívida está indexada à moeda norte-americana,
encarecendo suas despesas com juros e amortizações.

8
Gol
A​Gol tem sido a ação que mais sofre na Bolsa com este cenário. Apesar de contar com uma
pequena parcela de sua receita em dólar, mais de 50% dos custos da empresa também são
denominadas em moeda norte-americana, oriundo da compra de combustível (insumo essencial
do negócio da companhia). Além disso, cerca de metade de seu endividamento está exposto a
variações cambiais (considerando que uma parcela adicional está hedgeada).
Para piorar, o barril do petróleo, que caiu muito forte nos últimos 12 meses e poderia amenizar
essa alta do dólar, vem dando sinais de recuperação; por fim, o próprio cenário de recessão da
economia brasileira faz com que as pessoas deixem de viajar, diminuindo sua demanda por vôos
turísticos.

9
Smiles e Multiplus
A alta do dólar acirrou a disputa de Multiplus e Smiles pelos pontos acumulados nos cartões de
crédito dos bancos. Como as regras de acúmulo são atreladas à moeda americana, os
consumidores tendem a conseguir menos pontos para os mesmos gastos em real, afetando o
volume de pontos que mandam para os programas de milhagem no médio e longo prazo. A briga
das empresas agora é pelo chamado ponto de estoque, aquele que o cliente já acumulou no seu
cartão de crédito e ainda não utilizou.
As instituições financeiras pagam para os programas de milhagem cada vez que o cliente troca
seus pontos do cartão por milhas. No curto prazo, a alta do dólar tornou essa dinâmica mais cara
para os bancos. Os emissores de cartão já estão gastando mais este ano para dar prêmios ao
cliente que acumulou pontos nos últimos anos, quando o dólar valia menos. Para completar, a
disparada da moeda diminui o número de viagens, ou seja, menos troca de pontos.

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Petrobras
Apesar de teoricamente se beneficiar de um real mais fraco, devido às exportações de uma
commodity precificada em dólar, no caso da Petrobras é preciso ponderar outros fatores. Para
começar, hoje a estatal é a companhia mais endividada do mundo, cerca de R$ 522 bilhões. Para
se ter uma ideia, a cada R$ 0,10 de alta do dólar, a dívida da companhia aumenta em R$ 10
bilhões.
Além disso, aproximadamente 40% de sua receita é proveniente da venda de derivados, gasolina e
diesel, que por sua vez ocorrem em moeda local e os preços não são ajustados automaticamente à
variação do dólar. Assim, o gap dos preços aumenta e as perdas no segmento de refino se
expandem, dado a necessidade de continuar importando derivados para abastecer o mercado
interno.

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Varejo
Algumas empresas do setor podem sofrer com a desvalorização do real, considerando que
importam alguns dos produtos de suas linhas de venda. Uma das mais prejudicadas seria a
fabricante de relógios ​
Technos​
, que possui mais de 60% de seus custos denominados em dólar.
De maneira mais suave, ​
Hering​e​Lojas Americanas​ podem sofrer com a apreciação do dólar, caso
não consigam repassar a elevação de custos para o preço.

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General Shopping e BR Malls
A​General Shopping tem tido um grande problema por conta da desvalorização do real. Com
receitas em reais, a empresa está sendo pressionada diante do perfil de seu endividamento, que é
60% atrelado ao dólar. Vale destacar que a General Shopping deixou de pagar o cupom dos US$
150 milhões em bonds perpétuos subordinados em 20 de setembro. A companhia, porém, disse
que o adiamento não constituía default.
Já a ​
BR Malls tem bônus perpétuo em dólar. A companhia afirma ter hedge nesta operação, mas
custa caro e é esta "proteção" é apenas temporária. De acordo com o balanço do segundo
trimestre de 2015, a empresa registrou um prejuízo de R$ 46,18 milhões por conta destes bônus,
um aumento de 61,6% sobre o mesmo período do ano passado.

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