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EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA 2ª VARA CRIMINAL DA

COMARCA DE RIBEIRÃO DAS NEVES ESTADO DE MINAS GERAIS

Processo n°: 0231.17.020.908-5

IGOR BARBOSA MOTA BRANT, já qualificado nos autos


da ação em epígrafe, devidamente representado pela ADVOGADA DATIVA
CAMILA ALVES FERREIRA, OAB/MG 179.074, vem, respeitosamente, nos
termos do art. 593, I, do Código de Processo Penal, apresentar

RAZÕES AO RECURSO DE APELAÇÃO

Já interposto, requerendo desde já sua remessa ao Egrégio Tribunal de Justiça


de Minas Gerais, com as cautelas de estilo.

Termos em que Pede e Espera deferimento.

Ribeirão das Neves, em 12 de fevereiro de 2019.

CAMILA ALVES FERREIRA


OAB/MG 179.074 – ADVOGADA DATIVA

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RECORRENTE: IGOR BARBOSA MOTA BRANT
RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS
Autos: 0231.17.020.908-5

RAZÕES DE RECURSO DE APELAÇÃO

EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE MINAS GERAIS,


COLENDA CÂMARA,
ÍNCLITOS JULGADORES.

1. DOS FATOS

O acusado foi denunciado pela pratica do delito previsto no


art. 16, da Lei nº 10.826/2003, alegando que no dia 08 de julho de 2007, por volta
das 02h22min, na Rodovia LMG 806, KM 05, Bairro Monte Verde, em Ribeirão
das Neves, o denunciado portava uma pistola calibre .40, marca Ruger, n° de
série 34297551; um carregador com capacidade para 15 (quinze) munições; um
carregador artesanal com capacidade para 30 (trinta) munições; e 30 munições
intactas do mesmo calibre, tudo sem autorização e em desacordo com
determinação legal.
A denúncia fora recebida em 23 de agosto de 2017 (fl.57).
Notificação do réu às fls.58/59, defesa preliminar
apresentada às fls. 61.
Foi realizada audiência de instrução e julgamento onde
foram ouvidas duas testemunhas em comum e colhido o interrogatório do
acusado (fl.70/71 e 75).

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Em alegações finais, o Ministério Público, requereu a
condenação do processado nos termos da denúncia e majoração da pena
elevada a culpabilidade, haja vista a grande quantidade de munição que o réu
portava.
A defesa, por sua vez, pugnou pela fixação da pena abaixo
do mínimo legal e em regime aberto; a substituição da pena corporal por PRD;
Seja concedido ao réu o direito de recorrer em liberdade. Ao final, pugnou pela
isenção das custas, tendo em vista a situação de hipossuficiência constatada.
O douto magistrado julgou procedente as acusações feitas
ao recorrente, momento em que lhe foi aplicada a pena de 03 (três) anos de
reclusão e 10 dias multa, que foi substituída por duas penas restritivas de direito.
Foi-lhe concedido o direito de recorrer em liberdade.

2. DA FUNDAMENTAÇÃO

2.1.DA DOSIMETRIA DA PENA


A Defesa postula que a pena-base seja fixada no abaixo do
mínimo-legal.
A pena base da recorrente foi fixada em 3 (três) anos de
reclusão e 10 (dias) de multa.
Analisando a decisão recorrida, percebemos que o douto
juízo, ao realizar a dosimetria da pena, após ter condenado o recorrente pelo
crime de artigo 16, caput, Lei 10.826/2003, reconheceu a inexistência de
circustancias judiciais, sendo todas favoráveis, fixando a pena-base privativa de
liberdade no seu mínimo legal de 3 (três) anos.
Na segunda etapa, inexistem circunstancias agravantes.
De outra parte, incide a atenuante da confissão.
Entretanto, considerando que a pena foi fixada no mínimo
legal, não possui amparo jurídico a negativa de aplicação da referida atenuante
quando a pena base foi fixada no mínimo legal.
É o que será demonstrado a seguir.

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Assim como nos demais ramos, no Direito Penal vige o
princípio da legalidade (art. 5°, II, CR/88) que, dentre algumas implicações,
impossibilita a utilização da interpretação extensiva e analógica em prejuízo do
recorrente.
Os artigos 65 e 68, ambos do Código Penal não vedam a
incidência das atenuantes quando a pena base for fixada no mínimo legal, não
cabendo ao interprete adotar interpretação em prejuízo do recorrente, sob pena
de afronta ao princípio da legalidade.
Se assim o fosse o correto, também não se poderia aplicar
as causas de diminuição de pena, pois a pena também ficaria abaixo daquela
fixada como mínima pelo legislador.
Por outro lado, a negativa de aplicação das atenuantes,
além de violar o princípio da legalidade, afronta, de maneira direta, o princípio
constitucional da individualização das penas, tanto no seu aspecto legislativo
quanto judicial.
Oportuno mencionar, na oportunidade, as lições de
Rogério Greco:

“Dissemos que tal interpretação é contraria á lei porque o


art. 65 não excepciona a sua aplicação nos casos em que
a pena base tenha sido fixada acima do mínimo legal. Pelo
contrário. O mencionado artigo afirma categoricamente
que são circunstâncias que sempre atenuem a pena. Por
que razão utilizaria o legislador o advérbio sempre se fosse
sua intenção deixar de aplicar a redução, em virtude da
existência de uma circunstância atenuante, quando a pena
base fosse fixada em seu grau mínimo? (...) O argumento
de que o juiz estaria legislando se reduzisse a pena aquém
do mínimo ou a aumentasse além do máximo não nos
convence. Isso porque o art. 59 do Código Penal, que
cuida da fixação da pena-base, é claro em dizer que o juiz
deverá estabelecer a quantidade de pena aplicável nos
limites previstos. O juiz jamais poderá fugir aos limites
determinados pela lei na fixação da pena-base. Contudo,
tal proibição não se estende às demais etapas previstas
pelo art. 68 do Código Penal.”(Curso de Direito Penal,
Parte Geral: Niterói: Editora Impetus, 6ª ed., 2006, p.
599/600).

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Cezar Roberto Bitencourt explica a origem do
entendimento, demonstrando, atualmente, a sua ausência de amparo na
legislação em vigor para se negar aplicação das atenuantes quando a pena base
for fixada no mínimo legal. Senão vejamos:

“Na verdade, o entendimento contrário partia de uma


interpretação equivocada, que a dicção do atual art. 65 do
Código Penal não autoriza. Com efeito, esse dispositivo
determina que as circunstâncias atenuantes “sempre
atenuam a pena” independente de já se encontrar no
mínimo cominado. É irretocável a afirmação de Carlos
Roberto Canibal quando destaca que “se trata de norma
cogente por dispor o Código Penal que ‘são circunstâncias
que sempre atenuam a pena’... e – prossegue Canibal –
norma cogente em direito penal é norma de ordem pública,
máxime quando se trata de individualização constitucional
de pena”. A previsão legal, definitivamente, não deixa
qualquer dúvida sobre a obrigatoriedade, e eventual
interpretação diversa viola não apenas o princípio da
individualização da pena (tanto no plano legislativo quanto
judicial) como também o princípio da legalidade estrita.

O equivocado entendimento de que “circunstância


atenuante” não pode levar a pena para aquém do mínimo
cominado ao delito partiu de interpretação analógica
desautorizada, baseada na proibição que constava no
texto original do parágrafo único do art. 48 do Código Penal
de 1940, não repetido, destaque-se, na Reforma Penal de
1984 (Lei n. 7.209/94). Ademais, esse dispositivo
disciplinava uma causa especial de diminuição de pena –
quando o agente quis participar de crime menos grave –
mais impedia que ficasse aquém do mínimo cominado. De
notar que nem mesmo esse diploma revogado (parte
geral) estendia tal previsão às circunstâncias atenuantes,
ao contrário do que entendeu a interpretação posterior à
sua revogação. Lúcido, também nesse sentido, o
magistério de Canibal quando afirma: “É que estes esses
posicionamentos respeitáveis estão, todos, embasados na
orientação doutrinária e jurisprudencial anterior à reforma
penal de 1984 que suprimiu o único dispositivo que a
vedava, por extensão – e só por extensão – engendrada
por orientação hermenêutica, que a atuação da pena por
incidência de atenuante não pudesse vir para aquém do
mínimo. Isto é, se está raciocinando com base em direito
não positivo.”

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Ademais, naquela orientação, a nosso juízo superada,
utilizava-se de uma espécie sui generis de interpretação
analógica entre o que dispunha o art. 48, parágrafo único,
do Código Penal (parte geral revogada), que disciplinava
uma causa especial de diminuição, insista-se, e o atual art.
65, que elenca as circunstâncias atenuantes, todas estas
de aplicação obrigatória. Contudo, a não-aplicação do art.
65 do Código Penal, para evitar que a pena fiquem aquém
do mínimo cominado, não configura, como se imagina,
interpretação analógica, mas verdadeira analogia –
vedada em direito penal – para suprimir um direito público
subjetivo, qual seja a obrigatória (circunstância quem
sempre atenua a pena) atenuação de pena. No entanto, a
analogia não se confunde com interpretação analógica. A
analogia, convém registrar, não é propriamente forma de
interpretação, mas de aplicação da norma legal. A função
da analogia não é, por conseguinte, interpretativa, mas
integrativa de norma jurídica. Com a analogia procura-se
aplicar determinado preceito ou mesmo os próprios
princípios gerais do direito a uma hipótese não
contemplada no texto legal, isto é, como ela busca-se
colmatar uma lacuna da lei. Na verdade, a analogia não é
um meio de interpretação, mas de integração do sistema
jurídico. Nessa hipótese, não há um texto de lei obscuro
ou incerto cujo sentido exato se procure esclarecer. Há,
com efeito, ausência de lei que discipline especificamente
essa situação. Na hipótese em exame, equiparam-se
coisas distintas, dispositivos legais diferentes, ou seja,
artigo revogado (art. 48, parágrafo único) e artigo em vigor
(art. 65); aquele referia-se a causa de diminuição
específica; este a circunstância atenuantes genéricas, que
são coisas absolutamente inconfundíveis; impossível,
conseqüentemente, aplicar-lhes qualquer dos dois
institutos, tanto a analogia quanto a interpretação
analógica. A finalidade da interpretação é encontrar a
vontade da lei, ao passo que o objetivo da analogia,
contrariamente, é suprir essa vontade, o que,
convenhamos, só pode ocorrer em circunstâncias carentes
de tal vontade.

Concluindo, o paralelo que poderia ser traçado limitar-se-


ia ao que dispunha o art. 48, parágrafo único, na redação
original do CP de 1940, com o art. 29, §2º, da redação
atual, pois ambos disciplinavam a mesma situação: se o
agente quis participar de crime menos grave – com a
seguinte diferença: o dispositivo revogado adotava a
responsabilidade objetiva, e o atual tratamento
diferenciado ao desvio subjetivo de condutas; aquele
proibia que a redução trouxesse pena para aquém mínimo

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cominado, ao passo que o atual determina expressamente
que o agente responde pelo crime menos grave que quis
cometer. Logo, tanto a analogia quanto a interpretação
analógica são igualmente inaplicáveis.

Enfim, deixar de aplicar atenuante para não trazer a pena


para aquém do mínimo cominado nega vigência ao
disposto no art. 65 do CP, que não condiciona a sua
incidência a esse limite, violando o direito público subjetivo
do condenado à pena justa, legal e individualizada. Essa
ilegalidade, deixando de aplicar norma de ordem pública,
caracteriza inconstitucionalidade manifesta. Em síntese,
não há lei proibindo que, em decorrência do
reconhecimento de circunstância atenuante, possa ficar
aquém do mínimo cominado. Pelo contrário, há lei que
determina (art. 65), peremptoriamente, a atenuação da
pena em razão de uma atenuante, sem condicionar seu
reconhecimento a nenhum limite; e, por outro lado,
reconhecê-la na decisão condenatória (sentença ou
acordão), mas deixar de efetuar sua atenuação, é uma
farsa, para não dizer fraude, que viola o princípio da
reserva legal.

Por fim, e a conclusão é inarredável, a Súmula 231 do


Superior Tribunal de Justiça carece de adequado
fundamento jurídico, afrontando, inclusive, os princípios da
individualização da pena e da legalidade estrita.

Outro grande fundamento para admitir que as atenuantes


possam trazer a pena para aquém do mínimo legal é
principalmente a sua posição topográfica: são valoradas
antes das causas de aumento e de diminuição; em outros
termos, após o exame das atenuantes/agravantes, resta a
operação valorativa das causas de aumento que podem
elevar consideravelmente a pena-base ou provisória.
Ademais, o texto atual do Código Penal (Lei n. 7.209/84)
não apresenta qualquer empecilho que impossibilite o
reconhecimento de qualquer atenuante, ainda que isso
possa significar uma pena (base, provisória ou definitiva)
inferior ao mínimo cominado no tipo penal.”(Tratado de
Direito Penal: Parte Geral, São Paulo, Editora Saraiva, 11ª
ed., 2008, p. 589)

Na jurisprudência encontramos algumas decisões nesse


sentido:

“No processo trifásico de individualização da pena é


possível a sua fixação definitiva abaixo do mínimo legal na

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hipótese em que a pena-base é fixada no mínimo e se
reconhece a presença de circunstância atenuante, em face
da regra imperativa do art. 65 do Código Penal, que se
expressa no comando literal de que tais circunstâncias
sempre atenuam a pena” (STJ – 6.ª T. – HC 9.719 – Rel.
Vicente Leal – j. 30.06.99 – DJU 25.10.99, p. 130).

“A pena-base foi fixada no mínimo legal. Reconhecida,


ainda, a atenuante da confissão espontânea (CP, art. 65,
III, d). Todavia, desconsiderada porque não poderá ser
reduzida. Essa conclusão significaria desprezar a
circunstância. Em outros termos, não repercutir na sanção
aplicada. Ofensa ao princípio e ao disposto no art. 59, CP,
que determina ponderar todas as circunstâncias do crime”
(STJ – 6.ª T. – REsp. 151.837 – Rel. Luiz Vicente
Cernicchiaro – DJU 22.06.98, p. 193).

“As circunstâncias agravantes e ATENUANTES previstas


nos arts. 61, 62 e 65, todos do CP, sempre incidirão sobre
as penas básicas, por força do disposto no art. 68 do
mesmo diploma legal, ainda quando essas se encontrem
já nos limites mínimo e máximo da cominação em abstrato”
(TJSP – AC – Rel. Luiz Pantaleão – TJT 150/290 e RT
702/329).

“A diminuição da pena pelo reconhecimento da


menoridade é obrigatória. Não existe norma legal vedando
a fixação da pena provisória aquém do mínimo.
Redimensionamento da pena. Apelo parcialmente provido”
(TJRS – Ap. 70003061744 – Rel. Aymoré Nereu José
Giacomolli – j. 08.05.2002 – RJTJRGS 228/66).

“‘Confissão e menoridade podem levar a pena aquém do


mínimo. As circunstâncias judiciais da conduta social e
personalidade, previstas no art. 59 do CP, só devem ser
consideradas para beneficiar o acusado, e não para lhe
agravar mais a pena. A punição deve levar em conta
somente as circunstâncias e conseqüências do crime. E
excepcionalmente minorando-a face à boa conduta e/ou à
boa personalidade do agente. Tal posição decorre da
garantia constitucional da liberdade, prevista no art. 5.º da
CF. Por outro lado, é possível a fixação da pena em
patamar abaixo do mínimo legal, estabelecido na lei penal.
Se as circunstâncias judiciais do art. 59 do CP determinam
uma punição no mínimo e se reconhece, em favor do
acusado, ATENUANTES do art. 65 do mesmo diploma
legal. Este posicionamento encontra guarida nos citados
arts. 59 (não faz nenhuma menção a limites) e 65
(expressamente, declara que aquelas circunstâncias

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sempre atenuam a pena). Se o interesse do legislador
fosse o de estabelecer limites para essa atenuação, teria
colocado a expressão sempre na companhia de outras do
tipo dentro dos limites da lei, etc. Penas reclusivas
reduzidas. (...)’ (AP 70005198940, 6.ª Câm. Crim., ReI.
Des. Sylvio Baptista Neto, j. 05.12.2002)” (TJRS – Ap.
70005999362 – Rel. Marco Antônio Bandeira Scapini – j.
21.08.2002 – RJTJRGS 231/102).

Assim, pugna a Defesa pela reforma da r. sentença, com a


aplicação e consideração da atenuante da confissão, ainda que implique em
redução abaixo do mínimo legal.

3. DOS PEDIDOS

Ante o exposto, a Defesa requer:

1) Seja reformada a sentença, com a consequente


consideração da atenuante da confissão, ainda que implique na redução abaixo
do mínimo legal.
2) Pugna pela isenção das custas processuais, haja vista
que o processado está tendo sua defesa patrocinada por defensor dativo, o que
demonstra a ausência de condições de arcar com as despesas processuais e
arbitramento de honorários da defesa Dativa.
Termos em que Pede e Espera deferimento.

Ribeirão das Neves, em 12 de fevereiro de 2019.

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CAMILA ALVES FERREIRA
OAB/MG 179.074 – ADVOGADA DATIVA

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