12 | PORTUGAL | PÚBLICO, QUI 5 ABR 2012
Portugueses têm mais
doutorados e mais filhos
fora do casamento
do que os espanhóis
Estatísticas
Natália Faria
Os espanhóis vivem mais
tempo. Navegam mais
na Internet. Lá, como
cá, o abandono escolar
ultrapassa os 28%
As teses iberistas que defendem a fu-
são de Portugal e Espanha num úni-
co Estado parecem ter desaparecido
com o seu principal defensor, José
Saramago, mas as comparações per-
duram. Os organismos estatísticos
dos dois países confrontaram indi-
cadores e concluíram, por exemplo,
que por cada português há quatro
espanhóis. E que, a confirmarem-
se as previsões, o desequilíbrio irá
aumentar. Os portugueses deverão
ver diminuída a sua população, en-
quanto os espanhóis deverão somar
mais seis milhões em 2060.
A Península Ibérica compõe-se
de 56.626.729 habitantes, dos quais
10,6 milhões são portugueses e 46
milhões são espanhóis. Dentro de 50
anos, os portugueses deverão ficar-
se pelos 10,3 milhões e os espanhóis
deverão ultrapassar os 52 milhões.
Do outro lado da fronteira vive-
se mais tempo: a esperança de vi-
da, à nascença, é de 78,7 anos para
os espanhóis e de 83,2 anos para as
espanholas; entre os portugueses
a expectativa de vida baixa para os
76,1 anos (homens) e para os 81,2
anos (mulheres). A esperança de vi-
da saudável aos 65 anos também é
maior em Espanha: 9,2 anos para os
Portugal e Espanha em números
Península Ibérica
milhões habitantes
52,3
Espanha
45,9
Portugal
10,6
10,3
56,626 Projecções
para 2060
Fonte: Institutos nacionais de estatística português e espanhol
homens e 8,4 para as mulheres. Em
Portugal, essa expectativa reduz-se
para os 6,6 e para os 5,4 anos. Quan-
to às causas de morte, são as mes-
mas para os dois países: tumores e
doenças dos aparelhos circulatório
e respiratório.
Dado curioso é que em Portugal
há mais crianças nascidas fora do
casamento. Em 2009 — ano em que
foi possível encontrar referências co-
muns aos dois países —, mais de 38%
das crianças portuguesas nasceram
fora do casamento, enquanto em Es-
panha essa taxa é de 34%.
Abandono escolar
Relativamente às qualificações
académicas, os portugueses saem
a ganhar: somam 41 doutorados por
100 mil habitantes contra os 17 espa-
nhóis. Por cá, dois em cada três dou-
torados são mulheres. A distribuição
por género está mais equilibrada em
Espanha: 51,2% são homens e 48,8%
mulheres.
Quanto ao abandono escolar, ne-
nhum dos países fica bem no retrato:
28,7% portugueses, entre os 18 e os
24 anos, abandonam precocemente
a escola; o mesmo se passando com
28,4% dos espanhóis — o dobro do
verificado na média da União Eu-
ropeia (UE). De recordar que, em
2000, o abandono escolar precoce
em Portugal atingia os 44,2% e os
29,7% entre os espanhóis.
Na comparação com a média da
UE (70%), quer portugueses quer
espanhóis acedem muito menos à
Internet a partir de casa. Navega-se
em 54% das casas portuguesas e 59%
das espanholas.
Densidade populacional
habitantes por km2
Portugal 115
Espanha 91
População com 65 e mais anos
Portugal 18,2%
Espanha 17,1%
Nascimentos 38,1% 34,4%
fora do
casamento
Portugal Espanha
Mãe põe em causa aplicação do
acordo ortográfico nas escolas
em carta dirigida a Crato
Educação
Clara Viana
O Ministério da Educação
recebeu cerca de uma
dezena de reclamações e
pedidos de esclarecimento
a respeito do acordo
Em Setembro passado, a filha de
sete anos de Madalena Cardoso,
médica, começou a aprender a es-
crever segundo as normas do Acor-
do Ortográfico (AO), implementado
este ano lectivo nas escolas do ensi-
no básico e secundário. No final de
Março, sete meses depois do início
da experiência, Madalena Cardoso
escreveu uma carta ao ministro da
Educação e Ciência, Nuno Crato,
comunicando-lhe que não pode
“de forma alguma autorizar” que
a sua filha continue a ser ensinada
“de modo não conforme à ortografia
actualmente em vigor”.
Em resposta a questões do PÚ-
BLICO, o gabinete de imprensa do
ministério indicou que, desde Se-
tembro passado, foi recebida cerca
de uma dezena de reclamações e
pedidos de esclarecimento a pro-
pósito do AO. A carta de Madale-
na Cardoso “está a ser analisada”,
acrescentou.
Nesta carta, a signatária lembra
que a ortografia pré-acordo foi pro-
mulgada por dois decretos-lei (um
de 1945 e outro de 1973), que até
agora não foram revogados e que
continuam, portanto, em vigor. So-
licitar a observância desta ortografia
no presente ano lectivo e seguintes
é, para Madalena Cardoso, uma for-
ma de “exercer o poder parental”.
Objectivo: “Suprir a incapacidade
que a filha menor tem de assegu-
rar que sejam respeitados os seus
direitos, liberdades e garantias de
cidadã, previstos na Constituição da
República”, entre eles, o seu “direito
à identidade cultural e à língua”.
Na Provedoria de Justiça há já
uma queixa contra o AO feita por
outro encarregado de educação. É
uma das três contra o acordo que
foram apresentadas nos últimos três
anos, esclareceu a assessora de im-
prensa.
Para lembrar a sua carta e obter
uma resposta directa, Madalena Car-
doso esteve ontem num almoço do
American Club, em Lisboa, que ti-
nha Nuno Crato como orador. Con-
ta que interpelou o ministro, que
remeteu para uma declaração de
Paulo Portas, segundo a qual o AO
Acordo começou a ser introduzido nas escolas este ano lectivo
já não é uma questão de opinião,
mas de facto.
Constrangimentos
Madalena Cardoso discorda e con-
sidera mesmo que o ministro Nuno
Crato tinha agora oportunidade pa-
ra “fazer história”, suspendendo o
acordo, que foi ratificado por seis
dos oito países de língua oficial por-
Outra queixa
Decisão de Graça
Moura contestada
provedor de Justiça
O recebeu, “muito
recentemente”,
uma queixa contra o
presidente do Centro Cultural
de Belém, Vasco Graça
Moura, por este ter decidido,
em Fevereiro, suspender
a aplicação do Acordo
Ortográfico (AO) no CCB, disse
ao PÚBLICO a assessora de
imprensa de Alfredo de Sousa.
Foi uma das primeiras decisões
do escritor, à frente do centro.
O AO foi assinado pelos oito
países onde o Português
é a língua oficial, mas nos
documentos oficiais da
organização que os congrega
(CPLP) continua a não ser
aplicado. O mesmo se passa
com a Academia de Ciências, a
Faculdade de Letras de Lisboa,
a Fundação de Serralves ou
a Casa da Música. Também
um juiz do Tribunal de Viana
proibiu a sua utilização. C.V.
NELSON GARRIDO
tuguesa. Faltam Angola e Moçam-
bique.
No final de Março, os ministros
da Educação da Comunidade dos
Países de Língua Portuguesa (CPLP),
entre os quais Crato, assinaram uma
declaração onde se prevê um futuro
ajustamento do AO em função do
diagnóstico que irá ser feito sobre
os “constrangimentos e estrangu-
lamentos” na sua aplicação. Para
Madalena, esta revisão anunciada
deveria ser suficiente para a suspen-
são imediata do AO, evitando-se que
crianças como a sua filha sejam uti-
lizadas como “cobaias” de normas
“assumidamente provisórias”.
Recentemente, também o secretá-
rio de Estado da Cultura, Francisco
José Viegas, admitiu que, até 2015,
altura em que termina o prazo pa-
ra a transição definitiva para a nova
ortografia, poderão ser feitos ajus-
tamentos no AO. Em declarações
à RTP em Luanda, no final da reu-
nião dos ministros da CPLP, Nuno
Crato indicou que “cada país tem
as suas dificuldades”, mas que os
oito Estados-membros declararam
“o empenho em levar para a frente
o processo do acordo ortográfico”.
Na sua carta, Madalena Cardoso,
que é também uma das signatárias
da Iniciativa Legislativa de Cidadãos
contra o AO, considera que este
acordo põe em causa “a transmissão
do património linguístico às gera-
ções futuras” e que tal é feito através
de “uma prepotência do Estado”,
contra a qual se deve exercer o di-
reito de desobediência previsto na
Constituição. O que poderá passar,
acrescenta, por os pais exigirem aos
professores e às escolas que ensi-
nem a “ortografia em vigor” aos seus
filhos. Para este efeito vai ser criada
uma página no Facebook.