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O QUE É O CASAMENTO?
What is marriage?
Revista de Direito Privado | vol. 101/2019 | p. 149 - 200 | Set - Out / 2019
DTR\2019\40745
Sherif Girgis
JD pela Yale Law School. Doutorando em Filosofia na Princeton University.
Robert P. George
Professor de Filosofia do Direito e Diretor da James Madison Program in American Ideals
and Institutions em Princeton. Professor visitante na Harvard Law School.
Ryan T. Anderson
Ph.D. em Ciências Políticas pela Notre Dame University. Pesquisador sênior da Heritage
Foundation.
Visão conjugal: casamento é a união de um homem e uma mulher que realizam entre si
um compromisso permanente e exclusivo, do tipo que é cumprido naturalmente
(inerentemente) com a geração e criação conjunta de filhos. Os cônjuges selam
(consumam) e renovam sua união através de atos conjugais – atos que constituem a
parte comportamental do processo de reprodução e, que, portanto, os unem numa
unidade reprodutiva. O casamento é valioso em si mesmo, mas sua inerente orientação
voltada para a geração e criação de filhos contribui para sua estrutura peculiar, que
inclui normas de monogamia e fidelidade. Essa ligação com o bem-estar dos filhos
também ajuda a explicar por que o casamento é importante para o bem comum e por
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que o estado deve reconhecê-lo e regulá-lo .
Visão revisionista: casamento é a união de duas pessoas (sejam elas do mesmo sexo ou
de sexos opostos) que se comprometem a amar romanticamente uma à outra, cuidar
uma da outra e compartilhar os fardos e benefícios de uma vida doméstica. Ele é
essencialmente uma união de corações e mentes, aprimorada por quaisquer formas de
intimidade sexual com a qual ambos os parceiros possam concordar. O Estado deve
reconhecer e regular o casamento porque tem um interesse em parcerias românticas
estáveis e nas necessidades concretas dos cônjuges e das crianças que estes porventura
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escolham criar.
Além do mais, segundo acreditam, os revisionistas dizem o que o casamento não é (por
exemplo, que ele não é inerentemente uma união entre sexos opostos), mas apenas
raramente (e vagamente) explicam o que eles acreditam o que seja o casamento.
Consequentemente, porque é mais fácil criticar uma visão apresentada do que construir
uma alternativa completa, os argumentos revisionistas possuem uma simplicidade
atraente. Mas esses argumentos são também vulneráveis a críticas poderosas que os
revisionistas não têm meios de responder. Este artigo, por contraste, toma uma posição
positiva, baseada em três princípios largamente aceitos, sobre o que constitui um
casamento.
Entretanto, muitos dos que aceitam (ou pelo menos consideram) nosso argumento
central podem ter questões pertinentes sobre a justiça ou as consequências de
implementá-lo. A Parte II cuida de todas as preocupações sérias que ainda não
houverem sido tratadas : as objeções do conservadorismo (por que não espalhar normas
tradicionais do casamento à comunidade homossexual?); do pragmatismo (o que fazer
com a necessidades concretas dos casais?); da equidade (a concepção conjugal não
sacrifica a realização de algumas pessoas em detrimento de outras?); da naturalidade
(mas isso não é simplesmente natural?); e da neutralidade (leis em favor do casamento
tradicional não impõem a todos uma perspectiva moral e religiosa controversa?).
Como este artigo deixa claro, o resultado desse debate importa profundamente para o
bem comum. E tudo depende de uma pergunta: o que é o casamento?
Sumário:
I. - II - Conclusão
I.
Fica mais óbvio que revisionistas passam hoje ao largo dessa pergunta central – que é o
casamento? – quando equiparam as leis de casamento tradicionais às leis que baniam o
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casamento inter-racial . Argumentam eles que as pessoas não podem controlar sua
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orientação sexual mais do que podem controlar a cor de sua pele. Em ambos os casos,
argumentam, não existe base racional para tratar relacionamentos de maneira diversa,
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porque a liberdade de casar com quem se ama é um direito fundamental. O Estado
discrimina os homossexuais ao interferir em seu direito básico, assim negando a eles
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igualdade perante a lei .
Mas essa analogia falha: a antimiscigenação era sobre com quem se era permitido casar,
e não sobre o que o casamento essencialmente era; e o sexo, ao contrário da raça, é
racionalmente relevante para essa última questão. Como toda lei traça distinções, não
há nada injustamente discriminatório no fato de leis matrimoniais recorrerem a
distinções genuinamente relevantes.
Em contraste, o debate atual discute precisamente se é possível que o tipo de união que
possui os atributos essenciais do casamento exista entre pessoas do mesmo sexo.
Revisionistas não propõem deixar intacta a definição histórica do casamento e
simplesmente expandir o conjunto de pessoas qualificadas para casar. Seu objetivo é
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abolir a concepção conjugal do casamento em nosso direito e substituí-la pela
concepção revisionista.
Muitos revisionistas apontam que existem diferenças importantes entre esses casos e as
uniões entre pessoas do mesmo sexo. Incesto, por exemplo, pode produzir crianças com
problemas de saúde e pode envolver abuso infantil. Mas então, assumindo por ora que o
interesse do Estado em evitar tais consequências ruins supera o que os revisionistas
tendem a descrever como sendo um direito fundamental, por que não permitir
casamentos incestuosos entre adultos inférteis ou do mesmo sexo? Revisionistas
poderiam responder que as pessoas devem ser livres para adentrar tais
relacionamentos, bem como todos ou alguns dos demais listados anteriormente, mas
que esses relacionamentos não merecem reconhecimento legal. Por quê? Porque –
revisionistas seriam forçados a admitir – o casamento tal como de fato é não pode tomar
essas formas, ou pode tomá-las apenas imoralmente. Reconhecê-las seria, em diversos
sentidos, caótico ou imoral.
Revisionistas que chegam a essa conclusão devem aceitar ao menos três princípios.
Primeiro, o casamento não é apenas uma construção legal com contornos totalmente
maleáveis – não é “apenas um contrato”. Caso contrário, como a lei poderia errar ou
acertar ao definir casamento? Ao invés disso, algumas relações sexuais são exemplos de
um tipo distinto de relação – que poderá ser chamado de casamentos genuínos – que
possui seu próprio valor e estrutura, quer o Estado reconheça-o ou não, e que não pode
ser mudada por leis baseadas numa falsa concepção dessa relação. Da mesma forma
que relações entre pais e seus filhos, ou entre partes num compromisso usual,
casamentos genuínos são realidades morais que criam privilégios morais e obrigações
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entre as pessoas, independentemente de imposição legal. -
Em terceiro lugar, não existe um direito geral de casar com a pessoa que se ama, se isto
significa um direito de ter reconhecido como casamento qualquer tipo de relacionamento
que se deseja. Existe apenas o direito presumido de não ser impedido de formar um
casamento genuíno sempre que este é possível. E, novamente, o Estado não pode
escolher ou mudar a essência do casamento genuíno; pois, ao reinventar radicalmente o
casamento civil, o Estado tornaria obscura uma realidade moral.
Há uma tensão aqui. Alguns revisionistas defendem que o casamento é apenas uma
construção legal e social; entretanto, os seus apelos à igualdade solapam essa
afirmação. O princípio da igualdade exige tratar igualmente os iguais. Portanto, o juízo
de que uniões de mesmo sexo e de sexo opostos são iguais no que diz respeito ao
casamento, e, portanto, devem ser tratadas da mesma forma pela lei matrimonial,
pressupõe uma entre duas alternativas: ou nenhuma dessas uniões é um casamento
genuíno no sentido anteriormente explicado, talvez porque semelhante coisa não exista,
sendo o casamento apenas uma ficção legal (em tal caso, por que não justificar
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aparentes injustiças através de considerações de utilidade social? ); ou ambas as
uniões são realmente genuínas, independentemente do que a lei diz sobre elas. A
segunda suposição envolve a crença, que muitos revisionistas aparentam compartilhar
com os defensores da visão conjugal, de que o casamento tem uma natureza
independente de convenções legais. Nesse sentido, a questão crucial – a única que pode
resolver esse debate – continua para ambos os lados: o que é o casamento?
1.União abrangente
habitam e utilizam corpos impessoais. Afinal, se alguém avaria o seu carro, o que ele
vandaliza é a sua propriedade; mas se este alguém amputa a sua perna, quem ele fere é
você. Porque o corpo é uma parte inerente da pessoa humana, há uma diferença de
espécie entre vandalismo e violação; entre destruição de propriedade e mutilação de
corpos.
Da mesma maneira, porque nossos corpos são aspectos reais de nós como pessoas,
qualquer união de duas pessoas que não envolva uma conjunção carnal orgânica não
seria abrangente – ela deixaria de fora uma parte importante do ser de cada pessoa.
Pelo fato de as pessoas serem compostos feitos de mente e corpo, uma conjunção carnal
estende a relação entre dois amigos para uma dimensão totalmente nova do ser de cada
um deles enquanto pessoa. Se duas pessoas desejam se unir da maneira abrangente
própria ao casamento, elas devem (entre outras coisas) unir-se organicamente – isto é,
na dimensão corporal de seus seres.
Essa necessidade de união carnal pode ser entendida mais claramente quando se
imaginam as alternativas. Suponha que Michel e Michele construam seu relacionamento
não sobre a exclusividade sexual, mas sobre a exclusividade no jogo de tênis. Eles se
comprometem a jogar tênis um com o outro, e apenas um com o outro, até que a morte
os separe. Assim sendo, estão eles casados? Não. Substitua as partidas de tênis por
qualquer outra atividade não sexual, e eles ainda não estarão casados: a exclusividade
sexual – exclusividade relacionada a uma forma específica de união corporal – é
necessária. Mas o que há na relação sexual que a torna capaz de formar uniões corporais
de forma única? Os corpos das pessoas podem se tocar e interagir de várias maneiras,
então por que apenas a união sexual é capaz de dar sentido à junção de corpos em
“uma só carne”?
Nossos órgãos – nosso coração e estômago, por exemplo – são partes de um corpo
porque eles estão coordenados, juntamente com outras partes, para um propósito
biológico comum do todo: nossa vida biológica. Segue-se disso que, para dois indivíduos
se unirem organicamente, e assim carnalmente, seus corpos devem estar coordenados
para algum propósito biológico do todo.
Esse tipo de união é impossível em relação a funções como a digestão e a circulação, nas
quais o indivíduo humano é por natureza autossuficiente. Mas indivíduos adultos são
naturalmente incompletos em relação a uma função biológica: a reprodução biológica.
No coito, mas não em outras formas de contato sexual, os corpos do homem e da
mulher se coordenam através de seus órgãos sexuais para o propósito biológico comum
de reprodução. Eles desempenham o primeiro passo do complexo processo reprodutivo.
Assim, no coito (e apenas no coito) seus corpos se tornam, em sentido forte do termo,
um só – eles são unidos biologicamente, e não meramente esfregados um contra o outro
–, de forma similar à maneira que o coração, o pulmão, e os outros órgãos de uma
pessoa formam uma unidade: coordenando-se para o bem biológico do todo. Nesse
caso, o todo é composto por um homem e uma mulher como casal, e o bem biológico do
todo é sua reprodução.
Há outra maneira de olhar para isso. Uma união em qualquer plano – corporal, mental,
ou qualquer que seja – envolve uma mútua coordenação naquele plano, dirigida a um
bem também naquele plano. Quando Einstein e Bohr discutiam algum problema da
física, eles se coordenavam intelectualmente para um bem intelectual: a verdade. E a
união intelectual que desfrutavam era real, independentemente de que seu objetivo final
(nesse caso, uma solução teórica) fosse ou não atingido – assumindo, como podemos
seguramente assumir, que ambos, Einstein e Bohr, estavam honestamente buscando a
verdade e não meramente fingindo enquanto empenhavam-se em enganar ou realizar
outros atos que fariam da sua aparente união intelectual apenas uma ilusão.
Por extensão, uma união carnal envolve uma coordenação mútua em direção a um bem
corporal – que é realizado apenas através do coito. E essa união ocorre mesmo quando a
concepção, o bem corporal em direção ao qual a relação sexual é orientada, não ocorre.
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O que é o casamento?
Em outras palavras, uma união carnal orgânica é alcançada quando um homem e uma
mulher coordenam-se para realizar um ato do tipo que causa a concepção. Esse ato é
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tradicionalmente chamado de ato generativo ; se (e apenas se) é uma expressão livre e
amorosa do compromisso permanente e exclusivo dos cônjuges, então é também um ato
matrimonial.
Como relações interpessoais são valiosas por si mesmas, e não meramente como meio
para outros fins, a união de corpos amorosa entre um marido e uma mulher no coito e o
tipo especial de relação em que ela é essencial são valiosos quer a concepção ocorra ou
não e mesmo quando ela não é sequer buscada. Mas dois homens ou duas mulheres não
podem alcançar uma conjunção carnal orgânica já que não há bem ou função corporal
em direção à qual seus corpos podem se coordenar, restando a reprodução como única
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candidata. Esse é um claro sentido no qual sua união não pode ser matrimonial, se
matrimonial significa abrangente e se abrangente significa, entre outras coisas, carnal.
A maioria das pessoas aceita que o casamento é também profundamente – e com efeito,
num importante sentido, unicamente – orientado para geração e criação de filhos. Isto é,
é o tipo de relacionamento que por sua natureza é orientado e enriquecido pela geração
e criação de filhos. Mas, como isso pode ser verdade e o que isso nos revela a respeito
da estrutura do casamento?
É algo claro que apenas se comprometer a criar filhos conjuntamente, ou mesmo fazê-lo
de fato, não é suficiente para fazer de um relacionamento um casamento – torná-lo o
tipo de relacionamento que é por natureza orientado para geração e criação de filhos. Se
três monges concordassem em tomar conta de um órfão, ou se dois irmãos já com idade
começassem a cuidar do filho da irmã falecida, eles não se tornariam assim cônjuges. É
também claro que ter crianças não é necessário para estar casado; recém-casados não
se tornam cônjuges apenas quando têm seu primeiro filho. A tradição legal
anglo-americana por séculos tem considerado o coito, e não a concepção ou o
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nascimento de um filho, como o evento que consuma o casamento. Além do mais,
essa tradição nunca negou que casamentos sem filhos fossem casamentos genuínos.
Como, então, devemos entender a ligação especial entre casamento e filhos? Nós
aprendemos algo sobre uma relação a partir da forma com que ela é selada ou com que
se expressa em certas atividades. De modo mais genérico, amizades comuns são
centradas numa união de mentes e vontades, pela qual cada pessoa conhece e procura o
bem da outra; assim, amizades são seladas por conversas e buscas em comum. De
forma similar, relações acadêmicas são seladas ou se expressam através de
investigação, indagação, descoberta e disseminação de conhecimento conjuntas; já as
comunidades esportivas, através de treinos e jogos.
Se há uma relação conceptual entre filhos e casamento, portanto, podemos esperar uma
relação correlata entre filhos e a forma pela qual casamentos são selados. Estando
correta a visão conjugal do casamento, essa relação é óbvia. O casamento é a união
abrangente de duas pessoas com sexo complementares que selam (consumam ou
completam) seu relacionamento através do ato generativo – através do tipo de atividade
que é, por natureza, plenamente realizada pela concepção de uma criança. Então o
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casamento mesmo é orientado e plenamente realizado pela geração, criação e
educação de filhos. Um ato procriativo é nitidamente o que sela ou completa uma união
procriativa.
Novamente, dizer isso não é dizer que casamentos de casais inférteis não são
casamentos genuínos. Considere a seguinte analogia: um time de baseball tem sua
estrutura característica principalmente por causa de sua orientação voltada a ganhar
jogos; ela envolve o desenvolvimento e o compartilhamento das habilidades atléticas
dos jogadores da maneira mais apropriada a vencer honradamente (entre outras coisas,
com treinamento assíduo e bom espírito esportivo). Mas esse desenvolvimento e
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O que é o casamento?
Da mesma forma, o casamento tem sua estrutura característica em larga medida devida
à sua orientação voltada à procriação; ele envolve o desenvolvimento e o
compartilhamento do corpo e de todo o ser do cônjuge da maneira mais apropriada a
uma boa paternidade – entre outras coisas, da maneira permanente e exclusiva. Mas tal
desenvolvimento e compartilhamento, incluindo a conjunção carnal do ato generativo,
são possíveis e inerentemente valiosos para os cônjuges mesmo quando eles não
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concebem filhos.
Portanto, pessoas que podem se unir carnalmente podem ser cônjuges sem filhos, da
mesma forma que pessoas que praticam o baseball podem ser colegas de time sem
vitórias no campo. Apesar de o casamento ser uma prática social que tem sua estrutura
básica por natureza, enquanto o baseball é totalmente convencional, a analogia ressalta
um ponto crucial: tanto casais inférteis como times de baseball sem vitórias satisfazem
os requisitos básicos para participarem da prática (união conjugal; treinamentos e jogos
de baseball) e manter sua orientação básica para a realização completa daquela prática
(criação e educação de filhos; vencer jogos), mesmo quando tal realização nunca é
alcançada.
Por outro lado, relações entre pessoas do mesmo sexo, qualquer que seja seu status
moral, não podem ser casamentos porque lhes faltam a mínima orientação essencial
para filhos: elas não podem ser seladas através do ato generativo. De fato, na tradição
da common law, apenas o coito (e não o sexo anal ou oral, mesmo entre cônjuges
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legalmente casados) é reconhecido como a consumação de um casamento.
Dada a natural orientação para os filhos da relação matrimonial, não surpreende que, de
acordo com a melhor evidência sociológica disponível, crianças se saem melhor
virtualmente em todos os indicadores de bem-estar quando criados pelos pais biológicos
e casados. Estudos que levam em consideração outros fatores relevantes, incluindo
pobreza e mesmo a genética, sugerem que crianças criadas em lares intactos se saem
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melhor nos seguintes índices:
Note que, além do mais, para uma relação ser orientada aos filhos, tanto no plano
principiológico quanto no empírico, a orientação sexual de cada um dos pais, em si
mesma, em nada desqualifica a relação. A união entre marido e mulher carrega essa
conexão com os filhos mesmo que, digamos, o marido sinta também atração por
homens. O que é necessário a esse respeito é, antes, a complementariedade sexual.
Dois homens, mesmo que atraídos exclusivamente por mulheres, não podem exibir esse
tipo de complementariedade biológica. Nesse sentido, não são propriamente os
indivíduos, enquanto tais, os discriminados, como sendo menos capazes de exercer uma
paternidade afetuosa e responsável ou qualquer coisa do tipo. Em vez disso, o que são
favorecidas sistematicamente, como portadoras de um vínculo especial e valioso com a
criação de filhos, são certos tipos de arranjos, combinações, e os atos que os encarnam
e completam – para os quais, é claro, certos indivíduos têm maior ou menor inclinação.
3.Normas matrimoniais
Por fim, uniões consumadas pelo ato procriativo, e que são, dessa forma, orientadas a
ter e criar filhos, podem apreender melhor o sentido das outras normas que dão forma
ao casamento tal como o conhecemos.
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Se a união carnal é essencial ao casamento, - podemos entender por que este
permanece incompleto e pode ser dissolvido enquanto não for consumado, e por que
deveria – tal qual a união de órgãos em um todo saudável – ser total e durar pelo
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restante da vida dos cônjuges (“até que a morte nos separe” ). Isto é, a abrangência
da união, que se estende por todas as dimensões da existência de cada um dos
cônjuges, exige também abrangência temporal: através do tempo (permanência,
portanto) e a cada instante do tempo (exclusividade, portanto). Isso também fica claro a
partir do fato de que o tipo de união carnal indispensável ao casamento encontra seu
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fundamento no vínculo, especial e essencial, com a procriação, à luz do que não
surpreende, pois, que as normas matrimoniais devam criar condições apropriadas para
os filhos: condições estáveis e harmônicas, que a sociologia e o senso comum
concordam serem comprometidas pelo divórcio – que priva os filhos de uma família
biológica intacta – e pela infidelidade, ato com que uma pessoa trai e divide,
frequentemente com filhos biológicos de outro casal, as atenções e responsabilidades
devidas por ela a seu cônjuge e filhos.
1.Enfraquecimento do casamento
Ninguém age ou delibera no vazio. Nós todos tomamos indicações (inclusive indicações a
respeito do que o casamento é e exige de nós) de normas culturais, que são, em parte,
moldadas pelo Direito. Com efeito, os próprios revisionistas concedem implicitamente
esse ponto. Por que mais estariam insatisfeitos com o instituto das uniões civis para
casais do mesmo sexo? Como nós, eles entendem que a concepção de casamento
favorecida pelo Estado importa porque afeta o entendimento que a sociedade tem acerca
da instituição.
É claro que são várias as formas de que o instituo do casamento pode correr – e já está
correndo – muito mal. Muitos dos opositores atuais à visão revisionista do casamento –
por exemplo, Maggie Gallaher, David Blankenhorn, os bispos da Igreja Católica nos
Estados Unidos – também se opuseram a outras mudanças legais prejudiciais à
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concepção conjugal do casamento. Nós nos concentramos aqui no problema das uniões
entre pessoas do mesmo sexo, não porque ele importa por si mesmo, mas porque é este
o foco de um vivo debate cujos resultados têm vastas implicações para reformas que
objetivam fortalecer a nossa cultura do casamento. Sim, o desenvolvimento social e
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O que é o casamento?
jurídico já afrouxou os laços que vinculam os cônjuges a algo além deles mesmos e, por
isso, mais seguro para cada um. Mas dar reconhecimento às uniões entre pessoas do
mesmo sexo significaria cortar os últimos fios desses laços. Afinal, subjacente à adesão
das pessoas às regras matrimoniais, já em declínio, estão as profundas (ainda que
implícitas) conexões que há em sua mente entre casamento, união carnal e filhos.
Consagrar a visão revisionista do casamento iria não apenas corroer, mas sim destruir
esses fundamentos, e, com eles, qualquer base para se reverter outras tendências
recentes de mesmo sentido e para se restaurar os muitos benefícios sociais de uma
cultura do casamento sadia.
Tais benefícios revertem-se em favor dos filhos, mas dos cônjuges também. Como os
filhos criados pelos dois pais biológicos casados um com o outro saem-se melhor na
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maioria dos indicadores de saúde e bem-estar, a contínua erosão das normas
matrimoniais afetaria negativamente as crianças, forçando o Estado a ter um papel mais
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amplo em sua saúde, educação e formação de um modo geral. Quanto aos adultos,
aqueles que se encontram nos setores mais pobres e vulneráveis da sociedade seriam
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atingidos mais duramente. Mas todos os adultos em geral seriam prejudicados, na
medida em que enfraquecer as expectativas sociais que dão suporte ao casamento
tornaria mais difícil para eles cumprir as regras matrimoniais.
Como a neutralidade axiológica do Estado nessa questão (acerca dos contornos e regras
próprios ao casamento) é impossível enquanto o casamento for assunto de lei, abolir a
visão conjugal do casamento implicaria que as relações românticas e compromissadas
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O que é o casamento?
Nós já temos visto leis antidiscriminação sendo utilizadas como armas contra aqueles
que, de boa consciência, não podem aceitar o entendimento revisionista da sexualidade
e do casamento. Em Massachusetts, a instituição Caridades Católicas (Catholic Charities)
foi forçada a abandonar seus serviços de adoção para não ter de, contrariando seus
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princípios, colocar crianças sob a guarda de casais do mesmo sexo. Na Califórnia, uma
Corte Distrital Federal decidiu que o discurso religioso de um aluno contra práticas
homossexuais poderia ser banido por sua escola como comentários injuriosos que “são
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invasivos ao trabalho das escolas ou aos direitos de outros alunos”. E novamente em
Massachusets, uma Corte de Apelação determinou que “uma escola pública pode ensinar
as crianças que relações homossexuais são moralmente boas, apesar das objeções de
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pais que discordam”.
A afirmação de que apoiar a concepção conjugal do casamento não passa de uma forma
de sectarismo tem se tornado tão profundamente arraigada entre os revisionistas que
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uma reportagem-perfil do Washington Post sofreu denúncias e reclamações de
enviesamento jornalístico pelo simples fato de sugerir que um defensor da visão
conjugal do matrimônio era “são” e “ponderado”. Leitores indignados compararam o
perfil traçado pela reportagem a uma hipotética reportagem panegírica sobre um
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membro da Ku Klux Klan. Um colunista do New York Times chamou os proponentes do
casamento conjugal de “sectários”, até mesmo referindo-se diretamente a um dos
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autores deste artigo. Enquanto isso, organizações advogando pela redefinição legal do
casamento rotulam a si próprias como defensoras dos “direitos humanos” e contrárias ao
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“ódio” . As implicações são claras: se o casamento for redefinido legalmente, acreditar
naquilo que todas as sociedades humanas acreditam e acreditaram sobre o casamento –
ou seja, que é uma união entre homem e mulher – será considerado cada vez mais
como evidência de insanidade moral, malícia, preconceito, injustiça e ódio.
Esses pontos não são apresentados aqui como argumentos em favor da aceitação da
visão conjugal do casamento. Se nosso ponto de vista estivesse errado, então poderia
ser por vezes justificado ao Estado requerer a terceiros o mesmo tratamento a uniões
românticas de mesmo sexo e a uniões românticas de sexos opostos, e os cidadãos
comuns poderiam estar algumas vezes justificados em marginalizar a visão adversária
como perniciosa. Mas em vez disso, dados os nossos argumentos sobre o que o
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casamento realmente é, esses são avisos importantes acerca das consequências de se
consagrar uma concepção de casamento gravemente inconsistente. Tais considerações
deveriam motivar pessoas que aceitam a visão conjugal, mas têm dificuldade em
enxergar os efeitos de aboli-la do Direito.
Em síntese, o casamento deveria dominar nossa atenção e energia mais do que qualquer
outra causa moral, pois são várias as dimensões do bem comum prejudicadas se a
verdade moral a respeito do casamento torna-se obscura. Pela mesma razão, passar
reto ao presente debate por meio da proposta de abolir completamente o casamento de
matéria de lei seria imprudente ao extremo. Entre todas as sociedades que nos legaram
vestígios de sua existência, quase nenhuma conseguiu se manter sem alguma regulação
dos relacionamentos sexuais. Como mostramos no item I.E.1 (e como sugerem os
números citados no item I.B.2), o bem-estar dos filhos nos confere poderosas razões de
prudência para reconhecer e proteger legalmente o casamento.
D.Se os casais de mesmo sexo não podem casar, por que casais inférteis podem?
1.Casamentos verdadeiros
Qualquer ato de união carnal orgânica pode consumar um casamento, resulte ou não em
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concepção. A natureza da ação dos cônjuges em um dado momento não pode
depender de um fato que aconteça horas depois, independente a seu controle, isto é, do
fato de um espermatozoide efetivamente penetrar um óvulo. E porque a união em
questão é uma união carnal orgânica, não pode depender, para ser real, de fatores
psicológicos. Não importa, pois, que os cônjuges não tencionem ter filhos ou creiam não
poder concebê-los. Quaisquer sejam seus pensamentos ou objetivos, um casal alcançar
a conjunção carnal ou não depende apenas de fatos que digam respeito ao que acontece
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entre os seus corpos.
É algo claro que os corpos de um casal infértil podem se unir organicamente através do
coito. Considere a digestão, o processo de nutrição corporal de um indivíduo. Partes
diversas desse processo – salivação, mastigação, deglutição, ação estomacal, absorção
intestinal dos nutrientes – estão cada uma à sua maneira orientadas ao objetivo mais
amplo da nutrição do organismo. Mas nossa salivação, mastigação, deglutição e ação
estomacal permanecem orientadas para esse objetivo (e continuam a ser atos
digestivos) mesmo que em algumas ocasiões nossos intestinos não absorvam
finalmente, ou não possam absorver, os nutrientes, e mesmo que saibamos disso antes
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de comer.
A amizade verdadeira entre dois homens e duas mulheres, é claro, também é valiosa em
si mesma. Mas por lhes faltar a capacidade para a união orgânica carnal, não pode ser
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valiosa especificamente como casamento: não pode ser aquela união abrangente , da
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qual dependem a aptidão para a procriação e as normas especificamente matrimoniais.
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Essa é a razão pela qual apenas um homem e uma mulher podem formar um
casamento, uma união cujas regras e obrigações são moldadas decisivamente por sua
dinâmica essencial voltada para os filhos. Pois essa dinâmica vem não da existência ou
expectativa de existência de filhos, que alguns parceiros de mesmo sexo ou mesmo
irmãos que vivem junto poderiam ter, e que alguns casais de sexo oposto poderiam não
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O que é o casamento?
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ter, mas do modo que o casamento é selado ou consumado: pelo coito, que é união
carnal orgânica.
2.Interesse público
Em termos práticos, vários casais teoricamente inférteis acabam tendo filhos, que se
beneficiariam do casamento saudável de seus pais; e, em qualquer caso, o esforço de
determinar a fertilidade ou não do casal demandaria injusta invasão de privacidade. Essa
é uma preocupação presumidamente compartilhada por revisionistas, que não exigiriam,
por exemplo, entrevistas para averiguar o nível de afeição entre parceiros antes de lhes
conferir a certidão de casamento.
De modo mais geral, mesmo um casal obviamente infértil pode, tanto quanto os casais
recém-casados ainda sem filhos ou quanto aqueles cujos filhos já são crescidos, viver as
características e as regras do casamento genuíno e, portanto, contribuir para uma
saudável cultura do casamento. Eles podem estabelecer bons exemplos para os outros e
ajudar a ensinar à próxima geração o que o casamento é e o que o casamento não é. E,
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como temos argumentado e vamos ainda argumentar , todo mundo se beneficia de
uma cultura matrimonial saudável.
E mais, qualquer que seja a lei do casamento, ela comunica alguma mensagem sobre o
que o casamento é enquanto realidade moral. O Estado tem a obrigação de captar e
transmitir corretamente essa mensagem, pelo bem das pessoas que venham a adentrar
a instituição, de seus filhos e da comunidade como um todo. Reconhecer apenas
casamentos férteis é sugerir que o casamento é mero meio para a procriação e a criação
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de filhos – em vez daquilo que realmente é, ou seja, um bem em si mesmo. E pode
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também violar o princípio da igualdade, ao qual revisionistas apelam, uma vez que
tanto casais férteis quanto inférteis podem formar uniões de um mesmo tipo básico:
casamentos genuínos. Na falta de razões fortes o suficiente, esse tipo de tratamento
diferenciado seria injusto.
Por fim, a despeito de que uma estrutura legal que honrou a concepção conjugal do
casamento – como nosso Direito tem feito há longo tempo – jamais restringiria os
efeitos do casamento aos cônjuges que coincidam de ter filhos, seu sucesso tenderia a
limitar o nascimento de filhos às famílias encabeçadas por cônjuges legalmente casados.
Afinal, quanto mais efetivamente a lei ensinar a verdade sobre o casamento, mais
provável será que as pessoas o adentrem e comportem-se conforme suas normas. E
quanto mais as pessoas formarem casamentos e respeitarem as normas matrimoniais,
mais provável será que os filhos sejam criados por seus pais biológicos casados um com
o outro. Morte e outras tragédias tornam impossível cobrir completamente a lacuna
entre o ideal e a realidade, mas uma cultura do casamento mais saudável faria essa
lacuna diminuir. Assim, consagrar na lei a verdade moral do casamento é crucial para
assegurar os grandes benefícios sociais proporcionados pelo casamento genuíno.
Embora a visão conjugal, a despeito de seus críticos, seja não apenas inferível de certas
características largamente aceitas como próprias do casamento e uma coisa boa para a
sociedade, mas tenha também coerência interna, nenhuma das versões da visão
revisionista explica algumas de suas próprias crenças sobre o casamento:
especificamente, a de que é do interesse do Estado regular alguns relacionamentos, mas
apenas os relacionamentos românticos – presumivelmente sexuais – e monogâmicos.
Embora tenham sido feitas algumas tentativas insatisfatórias, revisionistas não fazem
73
ideia de como oferecer razões principiológicas para essas posições. A não ser que algo
Página 14
O que é o casamento?
Por que o Estado não dita os termos para nossas amizades comuns? Por que não cria
ações de direito civil contra a negligência ou até mesmo traição entre amigos? Por que
não existem cerimônias civis para formar amizades ou entraves legais para encerrá-las?
A resposta é que amizades comuns simplesmente não afetam de maneira estruturada o
bem comum, em âmbito político, de modo a justificar ou autorizar regulação legal.
Casamentos são, todavia, como atesta o histórico de quase todas as culturas, matéria de
74
interesse público urgente, merecedora de reconhecimento e regulação legal.
Sociedades confiam às famílias, construídas sobre casamentos fortes, para produzir o
que precisam mas não podem formar elas mesmas: pessoas íntegras e decentes, que se
tornarão cidadãos minimamente conscienciosos e cumpridores da lei. Enquanto vão
amadurecendo, crianças beneficiam-se do amor e cuidado de ambos os pais, e do amor,
75
compromissado e exclusivo, de um pelo outro.
76
Embora alguns libertários proponham “privatizar” o casamento, tratando casamentos
do mesmo modo que nós tratamos batismos e bar mitzvahs, os defensores do governo
limitado deveriam reconhecer que a privatização do casamento seria uma catástrofe
77
para o governo limitado. Na falta de uma cultura do casamento próspera, famílias
frequentemente fracassam em formar, ou alcançar e manter, a estabilidade. Enquanto
pais ausentes e filhos nascidos fora do casamento se tornam coisas comuns, uma
78
torrente de patologias sociais vem a seguir . Naturalmente, cresce a demanda por
políticas públicas e serviços sociais do governo. De acordo com estudo do Instituto
Brookings (Brookings Institute), 229 bilhões de dólares em gastos com bem-estar social
entre 1970 e 1996 podem ser atribuídos ao colapso da cultura do casamento e à
consequente exacerbação das patologias sociais: gravidez na adolescência, pobreza,
79
criminalidade, abuso de drogas e problemas de saúde. Os sociólogos David Popenoe e
Alan Wolfe conduziram uma pesquisa nos países escandinavos que sustenta a conclusão
de que conforme a cultura do casamento declina, os gastos governamentais aumentam.
80
Esse é o motivo pelo qual o interesse do Estado nos casamentos é mais profundo do que
qualquer interesse que poderia ter em amizades comuns: casamentos possuem uma
81
conexão de princípios e efeitos práticos em relação aos filhos. Fortalecer a cultura do
casamento aumenta as chances das crianças se tornarem membros íntegros e
produtivos da sociedade. Em outras palavras, nossas razões para consagrar uma
concepção de casamento em primeiro lugar e nossas razões para acreditar que o
entendimento conjugal do casamento é o correto, são apenas uma e a mesma para
ambas as posições: a ligação profunda entre casamento e filhos. Rompida essa conexão,
torna-se muito mais difícil mostrar por que o Estado deveria ter qualquer interesse no
casamento. E, no entanto, qualquer proposta política deve ser capaz de justificar por que
o Estado deveria estabelecê-la.
Há quem argumente simplesmente que o Estado deveria garantir aos indivíduos certos
benefícios legais se eles proverem um ao outro apoio e cuidados domésticos. Mas tal
arranjo não seria um casamento, nem poderia fazer sentido e se harmonizar junto a
outros aspectos do Direito Matrimonial.
Considere o exemplo hipotético de José e Tiago. Eles vivem juntos, dão apoio um ao
outro, dividem responsabilidades doméstica, e não têm dependentes. Como José
conhece e confia em Tiago mais do que em qualquer outra pessoa, ele gostaria que
Tiago fosse a pessoa autorizada a visitá-lo no hospital caso ele adoecesse, a dar as
Página 15
O que é o casamento?
diretivas em seu benefício se ele estiver inconsciente, herdar seus bens caso ele morra
primeiro, e assim por diante. O mesmo vale para José.
Até esse momento, você pode estar assumindo que José e Tiago têm um relacionamento
sexual. Mas isso importa? E se eles forem irmãos solteiros? E se eles forem melhores
amigos, que continuaram a morar juntos após a faculdade ou que se reuniram após cada
um enviuvar? Existe alguma razão para que os benefícios que recebam devessem
depender de sua relação ser, ou mesmo poder ser, uma relação romântica? Na verdade,
não seria patentemente injusto se o Estado os privasse de benefícios sob a única
alegação de que eles não fazem sexo um com o outro?
Alguém poderia objetar que todo mundo simplesmente sabe que o casamento tem
alguma conexão com romance. Isso nem requer explicação. Mas tal objeção configura
uma petição de princípio em desfavor de João e José, que querem seus benefícios. E
encerra prematuramente a busca por uma resposta para a pergunta de por que
tendemos a associar casamento com romance. A explicação nos conduz de volta ao
nosso ponto central: romance é o tipo de desejo que visa à união carnal, e o casamento
tem muito a ver com isso.
Uma vez que esse ponto é admitido, retornamos à questão daquilo que conta como
união carnal orgânica. Abraço conta? A maioria pensa que não. Mas então, por que o
sexo é tão importante? E se alguém encontrasse maior prazer ou sentisse intimidade a
partir de algum outro comportamento (tênis, talvez, como em nosso exemplo lá atrás)?
Devemos, enfim, retornar ao fato de que o coito, o ato generativo, une de modo único
82
dois seres humanos, tal qual explicado anteriormente. Mas esse fato apoia a visão
conjugal. A razão pela qual o casamento tipicamente envolve romance é que envolve,
necessariamente, união carnal, e romance é o tipo de desejo que busca a união carnal.
Mas união carnal orgânica é possível apenas entre um homem e uma mulher.
Retorne agora ao exemplo de José e Tiago, e adicione um terceiro homem: João. Para
abstrair o segundo ponto deste exemplo, assuma que os três homens são um trisal
romântico. Isso muda alguma coisa? Se um deles morre, os outros dois são coerdeiros.
Se um ficar doente, qualquer dos outros pode visitá-lo ou dar as diretivas. Se José e
Tiago podem ter seu relacionamento romântico reconhecido, por que não poderiam o
mesmo José, Tiago e João?
Novamente, alguém poderia objetar que todo mundo simplesmente sabe que o
casamento se dá entre duas pessoas. Isso sequer exige explicação. Mas tal objeção
configura novamente uma petição de princípio em desfavor de José, Tiago e João, que
querem seus benefícios compartilhados e o reconhecimento legal da relação. Afinal, não
é que cada um deles queira benefícios enquanto indivíduo; casamento é uma união. Eles
querem o reconhecimento de seu relacionamento poliamoroso e os benefícios
compartilhados que vêm com esse reconhecimento.
Mas se a concepção conjugal do casamento for correta, fica claro por que o casamento é
possível apenas entre duas pessoas. Casamento é uma união interpessoal abrangente
83
que se consuma e renova por atos de conjunção carnal orgânica e é orientada à
84
geração e criação de filhos. Tal união pode ser atingida por duas e somente duas
pessoas porque não existe ato singular que seja capaz de unir organicamente três ou
mais pessoas no plano carnal ou, portanto, consumar a união abrangente de três ou
mais vidas nos outros planos da vida. De fato, a própria abrangência da união requer o
compromisso matrimonial de ser não dividida – compromisso esse feito para exatamente
uma única outra pessoa; mas tal abrangência, e a exclusividade que demanda sua
85
orientação para os filhos, faz sentido apenas na visão conjugal. Crianças, do mesmo
modo, podem ter apenas dois pais – uma mãe biológica e um pai biológico. Existem dois
sexos, sendo necessário para a reprodução um de cada exemplar. Então o casamento,
espécie de comunidade reprodutiva, requer dois indivíduos – um de cada sexo.
Página 16
O que é o casamento?
Alguns poderiam objetar que isso é cortina de fumaça, que ninguém está clamando por
reconhecimento de uniões poliamorosas. Não estaríamos aqui, então, apelando ao
86
argumento alarmista da bola de neve?
Cabe notar, para início de assunto, que não há nada de intrinsecamente errado em
argumentar contra uma determinada política baseando-se em predições razoáveis de
consequências indesejáveis que ela trará. Tais predições, nesse caso, parecem bastante
razoáveis, dado que figuras proeminentes como Gloria Steinem, Barbara Ehrenreich e
Cornel West já reivindicaram reconhecimento legal de relacionamentos sexuais entre
87
múltiplos parceiros. E tais formas de relacionamentos não são desconhecidas: a revista
88
Newsweek noticiou que há mais de 500.000 delas apenas nos Estados Unidos.
Ainda assim, este artigo não pretende prever as consequências legais ou sociais da visão
revisionista do casamento. O objetivo de examinar os critérios de romance e monogamia
(item I.E.2) é fixar um ponto simples, mas crucial: qualquer princípio que justificaria o
reconhecimento legal das relações entre pessoas do mesmo sexo, justificaria também o
reconhecimento legal tanto de relacionamentos não sexuais, como de relações
poliamorosas. Se, como a maioria das pessoas acredita – inclusive muitos revisionistas
–, o casamento verdadeiro é essencialmente uma união sexual entre exatamente duas
pessoas, então a concepção revisionista do casamento tem de ser inconsistente.
Qualquer revisionista que concorde que é justificado ao Estado reconhecer apenas
89
casamentos genuínos , deve ou rejeitar as normas tradicionais da monogamia e da
consumação sexual ou adotar a visão conjugal, que exclui uniões entre pessoas do
mesmo sexo.
F.O casamento não é qualquer coisa que nós dissermos que ele é?
Essa visão é falseada pela distinção principiológica que há entre todo o espectro de
amizades comuns de um lado, e, de outro, aqueles relacionamentos inerentemente
valiosos que, em primeiro lugar, estendem, de modo orgânico, a união de duas pessoas
por toda a dimensão carnal de suas existências; em segundo lugar, carregam uma
intrínseca orientação para a geração e criação de filhos; e em terceiro lugar, requerem
um compromisso permanente e exclusivo. A realidade independente do casamento é
confirmada pelo fato de que culturas que nos são conhecidas, de todos os tempos e
lugares, julgaram adequado regular os relacionamentos de pais – de fato ou potenciais –
entre si, e entre eles e quaisquer filhos que tivessem.
II
Deixando de lado princípios abstratos, redefinir o casamento não teria o efeito positivo
de reforçar suas normas tradicionais aumentando o número de uniões sexuais fiéis,
estáveis e monogâmicas ao incluir sob a regência delas muito mais casais de pessoas do
mesmo sexo? Há boas razões para pensar que não.
Primeiro, embora os princípios delineados anteriormente sejam abstratos, nem por isso
eles estão desconectados da realidade. Pessoas tanto menos tenderão a se comportar
estritamente de acordo a uma norma, quanto menos sentido essa norma fizer. E se o
casamento for entendido como os revisionistas o entendem – isto é, essencialmente
como uma união emocional sem nenhuma conexão de princípio com união carnal e
geração e criação de filhos –, então as normas matrimoniais, especialmente as sobre
permanência, monogamia, e fidelidade, farão menos sentido. Em outras palavras, os que
levantam essa objeção estão certos ao supor que redefinir o casamento produziria uma
espécie de convergência, mas seria uma convergência na direção exatamente errada.
Em vez de impor as normas tradicionais sobre as relações homossexuais, abolir a
concepção conjugal do casamento tenderia a erodir a base para essas normas em todas
e quaisquer relações. Instituições públicas moldam as nossas ideias e ideias têm
consequências; então remover a base racional de certa norma irá erodir a adesão a essa
norma – se não imediatamente, então conforme o passar do tempo.
Essa não é uma questão puramente abstrata. Se nossa concepção de casamento for
correta, quais seriam de se esperar as consequências sociológicas das uniões românticas
entre pessoas de mesmo sexo? Na falta de razões fortes para se seguir as regras
matrimoniais em relacionamentos radicalmente dessemelhantes ao matrimônio, o
esperado seria vermos menos consideração a essas regras, tanto na prática quanto na
teoria. E, tanto na prática quanto na teoria, isso de fato aconteceria.
considerado por seus colegas acadêmicos como uma figura extravagante, expressou sua
esperança de que o triunfo da visão revisionista daria ao casamento “contornos variados,
criativos e adaptativos... [levando alguns a] questionar a limitação dualística do
97
casamento ocidental e buscar...casamentos entre pequenos grupos.” Em declaração
intitulada “Além do Casamento Homossexual” (“Beyond Same-Sex Marriage”), mais de
300 acadêmicos e militantes LGBT ou aliados à causa, incluindo proeminentes
professores das mais tradicionais universidades americanas, reivindicaram o
98
reconhecimento legal de relacionamentos sexuais envolvendo mais de dois parceiros. A
professora Elizabeth Brake pensa ser um imperativo de justiça utilizar esse
reconhecimento para “desnormalizar a monogamia heterossexual como modo de vida”
para o bem da “retificação de discriminações passadas contra homossexuais, bissexuais,
99
polígamos e relações de cuidado e assistência”.
E quanto à conexão com filhos? Andrew Sullivan diz que o casamento se tornou
“primeiramente um modo pelo qual dois adultos afirmam seu compromisso emocional
100
um para com o outro.” E. J. Graff celebra o fato de que reconhecer uniões entre
pessoas de mesmo sexo faria o casamento “como nunca antes, apoiar escolhas sexuais,
101
por cortar o vínculo entre sexo e fraldas.”
Página 19
O que é o casamento?
Então não há nenhuma razão para acreditar, e razões abundantes para duvidar, que
redefinir o casamento tornaria as pessoas mais propensas a cumprir as suas normas. Ao
contrário, redefinir o casamento iria, em primeiro lugar, comprometer a apreensão dos
fundamentos inteligíveis dessas regras. Nada mais do que uma última linha de defesa,
feita de sentimentos, frágil e inútil, sobraria para sustentar a crença na fidelidade sexual
e conter a mudança de atitudes e costumes que uma onda crescente de revisionistas
espera, com sua aprovação, que o casamento entre pessoas do mesmo sexo venha a
produzir.
“Também me parece importante perguntar a George o que ele propõe que devesse estar
disponível para casais gays. Ele acredita que nós poderíamos legar nossas propriedades
um ao outro sem que outros membros da família nos excluíssem? Que nos deveria ser
permitido visitar um ao outro no hospital? Que poderíamos ser tratados como o ‘parente
mais próximo’ em complicações médicas, legais, de custódia ou de propriedade? Que
teríamos a mesma situação fiscal de casais heterossexuais casados? Esses detalhes
importam para pessoas reais que vivem vidas reais, pessoas em que o Partido
Página 20
O que é o casamento?
115
Republicano parece não ter interesse em abordar.”
Em primeiro lugar, os benefícios anteriormente citados não têm nada a ver com se o
casamento é ou poderia legalmente ser romântico ou sexual. Mas seria injusto tratar
casos essencialmente semelhantes como se fossem radicalmente diferentes. Assim, se
fosse para esses benefícios estarem disponíveis a um tipo de coabitação, deveriam estar
116
disponíveis a todos os demais. Se a lei os garante a dois homens que vivem juntos
em um relacionamento sexual, certamente deveria garanti-los a, digamos, dois irmãos
interdependentes que também dividam responsabilidades domésticas e tenham
necessidades comuns. O relacionamento entre os dois irmãos seria diferente de muitas
formas do dos parceiros sexuais, mas não de forma a afetar a questão de se faz sentido
conceder-lhes benefícios domésticos.
Mas um projeto que concedesse benefícios legais a quaisquer dois adultos a pedido deles
– por exemplo: parceiros românticos, irmãs viúvas ou monges celibatários vivendo
juntos – não seria um projeto relativo a casamento. Ele não concederia benefícios legais
a partir da presunção de que o relacionamento beneficiado é sexual. Portanto, a princípio
não temos objeções a essa política. Em si mesma ela não obscureceria a natureza e as
normas do casamento.
O valor dessa política – pelo menos para indivíduos que dividem as responsabilidades da
convivência mútua – reside aparentemente nos benefícios que traria para os próprios
indivíduos, como visitas hospitalares e direitos de herança. Mas isso poderia ser
igualmente assegurado por arranjos legais distintos (como o mandato), os quais
julgamos que todos deveriam ser livres para fazer com quem quiser. Para que criar um
conjunto especial de efeitos legais para parcerias genéricas? É possível que haja uma
razão para isso em algumas jurisdições em que, por exemplo, as pessoas não tenham
educação ou recursos para fazer seus próprios arranjos legais. Mas se tais projetos não
estão sujeitos às poderosas (e, a nosso ver, decisivas) objeções que se aplicam à
redefinição legal de casamento, é porque eles absolutamente não são redefinição do
casamento.
Alguns podem permanecer impassíveis aos nossos argumentos porque, da maneira como
veem, nós tratamos pessoas de orientação homossexual como se fossem invisíveis, não
lhes deixando nenhuma oportunidade real de realização. Afinal de contas, poderiam
dizer, seres humanos precisam de companhia que tenha significado, o que envolve sexo
e o reconhecimento público. Essa objeção está baseada em uma compreensão
equivocada, não apenas acerca da natureza do casamento, como também do valor da
amizade profunda.
Nossa visão sobre o casamento, assim como as visões da maioria das pessoas sobre
qualquer questão política ou moral, é motivada precisamente pela nossa preocupação
com o bem de todos os indivíduos e comunidades – ou seja, com o bem comum. Nós já
oferecemos razões para julgar que esse bem é favorecido, e não prejudicado, pelas leis
tradicionais do casamento; e que é prejudicado, e não favorecido, pela abolição dessas
Página 21
O que é o casamento?
Mas para enxergar alguns problemas com essa objeção, consideremos algumas de suas
premissas latentes:
Quarta: A orientação sexual é uma identidade humana básica, de tal tipo que qualquer
Estado que não se devote a acomodá-la necessariamente prejudica ou despreza uma
classe de seres humanos.
Algumas dessas premissas são radicalmente novas na história das ideias, e elas mesmas
dependem de outras premissas importantes, muitas vezes aceitas acriticamente. E, mais
importante, todas as quatro são ou dúbias ou irrelevantes para este debate.
Uma vez que os corpos são partes essenciais da realidade pessoal dos seres humanos,
117
somente o coito pode verdadeiramente unir pessoas organicamente e, portanto,
118
maritalmente. Portanto, embora o Estado possa conceder a membros de quaisquer
domicílio certos benefícios legais, e não deva impedir ninguém de fazer arranjos legais
119
particulares, ele não pode conferir às uniões entre pessoas do mesmo sexo o que o
casamento tem de verdadeiramente distintivo, isto é, não pode torná-las
verdadeiramente abrangentes, orientadas a filhos, ou obrigadas pelas normas morais
120
específicas ao casamento. O Estado pode no máximo chamar essas uniões de
matrimoniais, mas isso não as tornaria – porque, como verdade moral, não podem ser –
realmente uniões matrimoniais; e isso iria, em detrimento da sociedade, obscurecer o
entendimento das pessoas sobre o que verdadeiras uniões matrimoniais de fato
envolvem. Nesse sentido, não é o Estado, mas sim suas próprias circunstâncias que,
infelizmente, impedem certas pessoas de se casar (ou pelo menos tornam o casamento
muito mais difícil para elas). E isso é assim não só para aqueles que sentem atração
exclusivamente homossexual, mas também para pessoas que não podem se casar
devido a, por exemplo, pressões prévias de obrigações familiares incompatíveis com a
abrangência do casamento e com a sua orientação para filhos, incapacidade de
encontrar um parceiro ou qualquer outra causa. Aqueles que enfrentam tais dificuldades
não devem de forma alguma ser marginalizados ou destratados de qualquer outra
forma, e eles merecem nosso apoio por ter de suportar fardos por vezes consideráveis.
Mas nada disso legitima a primeira premissa equivocada, de que a satisfação é
impossível sem canais regulares de liberação sexual – uma ideia que desvaloriza o modo
de vida de muitas pessoas. O que nós desejamos para pessoas incapazes de se casar
devido à falta de qualquer atração pelo sexo oposto é o mesmo que desejamos para as
pessoas que não podem se casar por qualquer outra razão: vidas ricas e satisfatórias. No
esplendor da variedade humana, elas podem tomar formas infinitas. Em qualquer uma
delas, a energia que de outra forma seria dedicada ao casamento pode ser canalizada
para outras empreitadas enobrecedoras: devoção mais profunda à família ou à nação, ao
trabalho, à aventura, à arte ou a milhares de outras coisas.
Mas de forma mais relevante, essa energia pode ser aproveitada para amizades
121
profundas. A crença na segunda premissa, de que é impossível atingir intimidade
verdadeira sem o sexo, pode empobrecer as amizades em que as pessoas podem
encontrar realização, ao fazer com que a intimidade psicológica, de emoções e de
inclinações comuns pareça inapropriada em amizades não sexuais. Nós não devemos
confundir a profundidade da amizade com a presença do sexo. Fazer isso pode impedir a
conexão entre amigos que sentem que devem se distanciar da possibilidade ou
122
aparência de um relacionamento sexual quando nenhum dos dois é desejado. Ao
encorajar o mito de que não pode haver intimidade sem romance, nós negamos às
Página 22
O que é o casamento?
A quarta premissa traça uma distinção arbitrária entre o desejo homossexual e outros
desejos sexuais que não exigem atenção específica e sanção do Estado. Muitas vezes,
leva as pessoas a supor que a moralidade tradicional discrimina injustamente pessoas
que sentem atração homossexual. Longe disso. Em todos, a moralidade tradicional vê
acima de tudo uma pessoa com dignidade cujo bem-estar faz exigências a todas as
outras que possam ouvi-la e respondê-la. Em todos, ela vê alguns desejos que não
podem ser integrados à união abrangente do casamento. Em todos, ela vê a liberdade
radical de fazer escolhas que transcendam aquelas inclinações, hereditariedade e
hormônios; possibilitando a homens e mulheres tornarem-se artífices de seu próprio
caráter.
Nós não imaginamos saber a origem da atração homossexual, mas nós a consideramos,
em última análise, irrelevante para este debate. Nesse aspecto, concordamos com o
Professor John Corvino, defensor do casamento entre pessoas do mesmo sexo:
E.As leis tradicionais do casamento não impõem para todas as pessoas visões morais e
religiosas controversas?
Essa objeção vem ao fim por uma razão: até agora, este artigo, conforme antecipado na
introdução, apresentou uma defesa da preservação da visão conjugal do casamento, e
abordou muitas objeções teóricas e práticas a ela, sem apelar a revelações ou
autoridades religiosas de qualquer tipo. Isso demonstra uma diferença crucial entre o
casamento e questões relativas puramente a crenças e práticas religiosas, como as
doutrinas da Trindade e da Encarnação, a Iluminação de Buda, batismos, bar mitzvah, e
regras sobre rituais de purificação, jejuns e orações. Diferentemente dessas questões, o
benefício humano do casamento, e suas implicações para o bem comum das
comunidades humanas, pode ser entendido, analisado e discutido sem entrar em
problemas e debates especificamente teológicos.
Mesmo assim, alguns poderiam dizer, consagrar a visão conjugal do casamento implica
privilegiar uma moral controversa. Mais uma vez, isso também excluiria a visão
revisionista. Ambas envolvem alegações acerca dos tipos de relacionamento que
devemos honrar e encorajar publicamente – e, consequentemente, quais não devemos.
A visão revisionista, pelo menos como a descrevemos anteriormente, iria honrar e
privilegiar uniões monogâmicas entre pessoas do mesmo sexo, mas não, por exemplo,
126
as poliamorosas. Como nós já destacamos, nossa lei vai ensinar uma lição ou outra
sobre quais tipos de relacionamento devem ser encorajados, a não ser que o casamento
127
seja abolido da lei, algo que nós temos sérias razões para não fazer. Nesse sentido,
não existe uma política verdadeiramente neutra quanto ao casamento.
Conclusão
Uma suposição pode cristalizar nosso argumento central. Quase todas as culturas em
todas as épocas e lugares tinham ou têm alguma instituição que se assemelha ao que
nós conhecemos por casamento. Mas imagine que os seres humanos se reproduzissem
assexuadamente e que a descendência humana fosse autossuficiente. Nesse caso,
alguma cultura teria desenvolvido uma instituição que se parecesse de alguma forma
com o que nós conhecemos por casamento? Parece claro que a resposta é não.
interpessoal abrangente – seria impossível; nenhum tipo de união teria uma relação
especial destinada à geração e criação de filhos, e as normas que essas duas realidades
regem seriam, no máximo, traços opcionais de qualquer relacionamento. Assim, as
características essenciais do casamento não estariam presentes; não haveria nenhuma
necessidade humana que somente o casamento pudesse preencher.
A percepção de que laços duais fazem pouco sentido e que não respondem de maneira
única a nenhuma necessidade humana, excetuando-se a união que visa à reprodução,
meramente enfatiza as conclusões em favor das quais argumentamos: o casamento é o
tipo de união moldada por sua abrangência e cumprida pela procriação e criação de
filhos. Somente isso pode explicar suas características essenciais, que fazem menos
sentido em outros relacionamentos. Uma vez que o casamento cumpre de forma única
necessidades essenciais de uma maneira tão estruturada, ele deve ser regulado para o
bem comum, que pode ser compreendido fora de uma concepção religiosa. E as
necessidades daqueles que não podem se casar de forma prudente e dos que não se
casam (mesmo devido a fatores naturais), e cujos relacionamento são, portanto,
justificadamente considerados relacionamentos de um tipo diferente, podem ser
satisfeitas de outras formas.
Portanto, a opinião exposta nesse artigo não é simplesmente a solução mais favorável
ou menos prejudicial para o dilema entre o bem de alguns adultos, numa mão, e o bem
de crianças e outros adultos, na outra. Tampouco existem “meros argumentos” de um
lado ameaçando as “necessidades concretas” do outro. Nós rejeitamos essas duas
dicotomias. O casamento entendido como a união conjugal entre marido e mulher
realmente atende ao bem das crianças, dos cônjuges e ao bem comum da sociedade. E
o fato de que os argumentos contrários a essa visão fracassam, os favoráveis triunfam e
os contrários à sua alternativa são decisivos, nós tomamos como evidência de que ela
serve ao bem comum. Pois a razão não é apenas a ferramenta do debatedor na
atividade trivial de fragmentar argumentos em suas premissas, mas também a lente
para colocar em foco os atributos da prosperidade humana.
O texto mostra como o “casamento gay” se converte numa séria e real ameaça à família
tradicional, que é chamada por Cícero de “seminarium rei publicae” e “principium urbis”,
a pedra angular da sociedade. O casamento sempre foi regulado nas mais diversas
épocas e sociedades, tendo em vista sua principal finalidade: a procriação e educação da
prole. Tais objetivos tutelam o interesse público, e o casamento (com a consequente
procriação) sempre foi tido como dever do cidadão para com a sua civitas. A sexualidade
das partes nunca foi importante para o casamento, tanto que era relativamente comum
no mundo greco-romano a prática homossexual, principalmente no fim do império. No
entanto, nunca se cogitou de um casamento gay. Ou seja, o homossexualismo sempre
existiu e sempre existirá, a novidade é a tentativa (já realizada em grande parte) de se
legalizar e legitimar com status familie uma relação homossexual. No Brasil, desde o
Código Criminal do Império, a homossexualidade não é crime e os homossexuais têm
plena liberdade sexual.
O debate, portanto, não tem NADA A VER com a homossexualidade e sua prática, mas
sim sobre o casamento em si: que é o casamento?
Esse é o tópico do artigo, no qual se mostra o porquê do casamento gay ser uma
discussão que diz respeito ao conceito de casamento em si. O casamento gay impõe
uma visão totalmente oposta e revolucionária (chamada pelos autores de “visão
revisionista”) à visão do casamento tradicional, chamada no artigo de “visão conjugal”.
Enquanto o conceito tradicional está atrelado ao compromisso entre os esposos e à
procriação, o conceito revisionista está atrelado ao afeto. Pela visão revisionista, toda
relação em que exista afeto e “amor” deve ser reconhecida e legitimada legalmente
como família. É o “amor livre”, que, como já vem acontecendo no Brasil, pode ser
aplicado a qualquer relação, inclusive envolvendo mais de duas pessoas, como no caso
do “poliamor”.
Página 26
O que é o casamento?
O casamento gay não é exatamente o causador dessa visão revisionista, mas se tornou
seu principal efeito e é sua consagração. A visão revisionista, que enxerga no afeto a
base do casamento, tem como seu principal pilar o divórcio sem culpa e direto. É nele
que reside o embasamento lógico do casamento gay e da visão revisionista. Se os
cônjuges podem se divorciar e contrair novas núpcias simplesmente porque um deles
assim quer, sem que sequer tenha havido quebra de deveres conjugais, não existe mais
um compromisso verdadeiro entre as partes. As partes passam a viver num estado de
sujeição à vontade do outro, que pode a qualquer momento desfazer o vínculo
matrimonial. Daí vem a ideia de que o casamento seria baseado nos sentimentos das
partes: se uma não “ama” mais a outra, está aberto o caminho para o divórcio e para as
partes amarem outras pessoas e fundarem novas famílias. Com isso colocou-se o
interesse individual acima do interesse social e do interesse maior da família institucional
(nesse sentido: “Assim sendo, a família, embora tenha ampliado, com a Carta de 1988,
o seu prestígio constitucional, deixa de ter valor intrínseco, como instituição capaz de
merecer tutela jurídica pelo simples fato de existir, passando a ser valorada de maneira
instrumental, tutelada na medida em que – e somente na exata medida em que – se
constitua em um núcleo intermediário de desenvolvimento da personalidade dos filhos e
de promoção da dignidade dos seus integrantes”(cf. TEPEDINO, Gustavo. A disciplina
civil-constitucional das relações familiares. Disponível em:
[www2.uerj.br/~direito/publicacoes/publicacoes/diversos/tepedino_3.html]), tudo
baseado na “dignidade da pessoa humana”. Isto é, a família passou a ser vista de forma
utilitária e instrumental para “promoção da dignidade de seus membros”, i.e., para
busca dos interesses individuais de cada um.
Tais obviedades, no entanto, têm sido olvidadas no debate público, no qual se discute
apenas supostos direitos: direito de casar quantas vezes quiser, com quem quiser, com
Página 27
O que é o casamento?
homem, mulher, ou com ambos juntos, direito de adotar filho e direito de pedir que o
Estado pague por tudo isso e por todos os estragos e prejuízos sociais que esses direitos
criam. Mas o casamento é constituído, antes de tudo, por deveres! Deveres esses que
estão na penumbra do debate e que formam a essência do matrimônio e da vida
familiar. Desse modo, em complementação ao nosso artigo A ditadura do afeto
(CABELEIRA, Caio Martins. A ditadura do afeto: uma crítica à introdução do sentimento
como valor jurídico. Revista da Associação de Direito de Família e Sucessões – RDFAS,
São Paulo, v. 1., 2014) buscamos com a tradução deste artigo de eruditos professores
americanos trazer a discussão de volta ao que interessa: O que é o casamento?
2 Cf. John M. Finnis, Law, Morality, and “Sexual Orientation”, 69 Notre Dame L. Rev.
1049, 1066 (1994); John Finnis, Marriage: A basic and exigent good, The Monist, p.
388-406, july-oct. 2008. Cf., ainda, Patrick Lee; Robert P. George, Body self dualism in
contemporary ethics and politics, 176-97 (2008).
3 Cf. Stephen Macedo, Homosexuality and the conservative mind, 84 GEO. L. J. 261,
279 (1995).
6 Cf. William N. Eskridge, Jr., A history of same-sex marriage, 79 VA. L. Rev. 1419,
1424 (1993).
10 Id.
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O que é o casamento?
14 Para uma breve defesa dessa ideia e das implicações que negá-la tem para nosso
argumento, cf. infra Parte I.F.
17 Esse ponto requer maior elaboração: alguns revisionistas poderiam negar que exista
um “casamento genuíno” do qual qualquer relacionamento pode se afastar, e afirmar, ao
invés disso, que o casamento é puramente convencional. Os que pensam que o
casamento é uma ficção inútil ou injustificável não têm nenhuma razão para apoiar lei
nenhuma a respeito do casamento qualquer que seja, enquanto que os que pensam ser
uma ficção útil ou legítima devem explicar por que o Estado deveria manter mesmo as
restrições ao casamento que eles apoiam. Neste segundo ponto, ver infra Parte II.B.
Sobre as implicações de considerar o casamento como pura construção, ver infra Parte
I.F.
18 Entre revisionistas, ver, por exemplo, Jonathan Rauch, For better or worse? The case
for Gay (and Straight) Marriage, The New Republic, May 6, 1996, p. 18. Disponível em:
[www.jonathanrauch.com/jrauch_articles/gay_marriage_1_the_case_for_marriage];
Ralph Wedgwood, The fundamental argument for same�sex marriage, 7 J. POL. PHIL.
225, 229 (1999); Jonathan Rauch, Not so fast, Mr. George, Indep. Gay F. (Aug. 2,
2006). Dsponível em: [http://igfculturewatch.com/2006/08/02/not�so�fast�mr
george]. Entre apoiadores da visão conjugal, ver, por exemplo, ST. Thomas Aquinas,
Summa Theologica Supp., Q. 44, Art. 1.
19 C.f, e.g., Thomas Walter Laqueur, Making sex, body and gender from the greeks to
Freud 48 (1990).
20 O prazer não pode desempenhar esse papel por várias razões. O bem em questão
deve ser verdadeiramente comum, para o casal como um todo, e o prazer (como, na
verdade, qualquer bem psicológico) é de foro privado e beneficia os parceiros – se de
fato beneficiar – apenas individualmente. O bem deve ser corporal, mas o prazer é
apenas um aspecto da experiência. O bem deve ser intrinsicamente valioso, mas o
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O que é o casamento?
prazer não é um bem valioso em si mesmo – tome, por exemplo, os prazeres sádicos.
Para mais a respeito desse ponto filosófico, c.f. Lee; George, nota n. 3 supra, 95-115,
176-97.
24 Para mais a respeito da diferença entre casais inférteis e casais de mesmo sexo, c.f.
infra Parte I.D.
25 Para conhecer os estudos relevantes, c.f. Ten Principles on Marriage and the Public
Good, de autoria de aproximadamente 70 acadêmicos, que corrobora o argumento
filosófico em favor do casamento com extensas evidências, extraídas das ciências
sociais, sobre o bem-estar de crianças e adultos. The Witherspoon Institute, Marriage
and the Public Good: ten principles 9-19 (2008). Disponível em:
[www.winst.org/family_marriage_and_democracy/WI_Marriage.pdf].
26 Kristin Anderson Moore et al., Marriage from a child’s perspective: how does family
structure affect children, and what can we do about it?, Child Trends Research Brief,
june 2002, p. 1-2, 6. Disponível em: [www.childtrends.org/files/MarriagesRB602.pdf].
28 C.f. Sara McLanahan, Elisabeth Donahue; Ron Haskins, Introducing the issue, 15 The
Future of Child. 3 (2005); Mary Parke, Are married parents really better for children?,
Clasp Policy Brief, may 2003; W. Bradford Wilcox et al.
30 NC – Por mais que o direito civil brasileiro não tenha elencado a consumação como
requisito para o casamento, fato é que a doutrina e a jurisprudência reconhecem a figura
do débito conjugal (MONTEIRO, Washington de Barros, Curso de direito civil: direito de
família. 40. ed. atual. por Regina Beatriz Tavares da Silva. Saraiva: São Paulo, 2010. v.
II. p. 215-216; PEREIRA, Caio Mario da Silva, Instituições de direito civil: direito de
família. 25. ed. atual. por Tania da Silva Pereira. Rio de Janeiro: Forense, 2016. v. V. p.
198-199) apesar dos questionamentos da doutrina progressista. Desse modo, o
casamento não consumado para o nosso direito civil é casamento pleno, mas se uma das
partes não está de acordo com a abstinência, estaria configurada quebra de deveres
conjugais, especialmente o previsto no art. 1566, II, do Código Civil. De forma alguma
isso autoriza ao marido ou a esposa a exigir do outro, de maneira forçada, a relação
sexual, não se trata de um débito em sentido técnico, de uma obrigação no sentido
jurídico do termo. Trata-se de um dever, inerente ao instituto do casamento e que se
volta, também, ao interesse da sociedade. O seu não cumprimento, pelo nosso direito
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O que é o casamento?
civil, autoriza a separação judicial culposa e divórcio do casal, por quebra de dever
conjugal. No caso de o casamento ter sido realizado perante a Igreja, pode-se obter a
nulidade do matrimônio pela dispensa super rato, devendo-se pedir o reconhecimento da
sentença eclesiástica no STJ, como prevê o Tratado Brasil-Santa Sé de 2008 (Decreto
7.107/2010, art. 12).
34 Cf., e.g., Editorial, A Vermont Court Speaks, Boston Globe, Dec. 22, 1999, p. A22 (“O
casamento gay compromete o casamento tradicional tanto quanto velejar compromete a
natação”).
40 Stanley Kurtz, The end of marriage in Scandinavia, The WeeklyStandard, Jan. 23,
2004, p. 26. Disponível em:
[www.weeklystandar.com/Content/Public/Articles/000/000/003/660zypwj.asp].
41 Elizabeth Brake, Minimal marriage: what political liberalism implies for marriage law,
120 Ethics 302, 332 (2010) (destaques nossos).
42 Richard Doerflinger, Family Policy in the United States (1980). Disponível em:
[www.usccb.org/prolife/tdocs/FaithfulForLife.pdf].
Maggie Gallagher, The abolition of marriage: how we destroy lasting love (1996);
Promises to keep: decline and renewal of marriage in America (David Popenoe et al.
eds., 1996); The book of marriage: the wisest answers to the toughest questions (Dana
Mack; David Blankenhorn eds. 2001); The fatherhood movement: a call to action (Wade
F. Horn et al. eds., 1999); United States conference of catholic bishops, marriage and
family life (1975). Disponível em:
[www.usccb.org/prolife/programs/rlp/Marriage&FamilyLife75.pdf]; Maggie Gallagher;
Barbara Dafoe Whitehead, End no-fault divorce?, 75 First Things 24 (1997).
45 Eles claramente são as primeiras vítimas da erosão que já está ocorrendo. Cf. The
evolution of divorce, 1 Nat’l Affairs 81, 88-93 (2009).
48 NC – Os autores não entram nesse quesito, mas deve-se considerar o antigo objetivo
revolucionário de que as crianças fossem educadas e criadas essencialmente pelo
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O que é o casamento?
50 Marc D. Stern, Same�sex marriage and the churches, Same�sex marriage and
religious liberty: emerging conflicts 1, 11-14 (Douglas Laycock et al. eds., 2008). Essa
coletânea de artigos inclui a visão de estudiosos nos dois lados da questão do casamento
entre pessoas do mesmo sexo, que concluem que conflitos com a liberdade religiosa são
inevitáveis onde o casamento é estendido a casais de pessoas do mesmo sexo.
51 Maggie Gallagher, Banned in Boston: the coming conflict between same-sex marriage
and religious liberty, The Weekly Standard, May 5, 2006, p. 20. Disponível em:
[www.weeklystandard.com/Content/Public/ Articles/000/000/012/191kgwgh.asp].
52 Harper v. Poway Unified Sch. Dist., 345 F. Supp. 2d 1096, 1122 (S.D. Cal. 2004).
54 Monica Hesse, Opposing gay unions with sanity & a smile, Wash. Post, Aug. 28, 2009,
p. C01.
55 Andrew Alexander, ‘Sanity & a smile’ and an outpouring of rage, Wash. Post, Sept. 6,
2009, p. A17.
56 Frank Rich, Op�Ed., The Bigots’ Last Hurrah, N.Y. Times, Apr. 19, 2009 (Week in
Review), p. 10.
57 Cf., e.g., Human Rights Campaign. Disponível em: [www.hrc.org]. Acesso em:
08.11.2010 (autoidentificando a organização como uma entidade não lucrativa de
assistência social “trabalhando em prol de igualdade de direitos para lésbicas, gays,
bissexuais e transgêneros”); Annie Stockwell, Stop the hate: vote no on 8,
Advocate.com (Aug. 20, 2008), Disponivel em:
[www.advocate.com/Arts_and_Entertainment/People/Stop_the_Hate] (enquadrando a
oposição à Proposta n. 8 de Emenda à Constituição da Califórnia, que estabelece que
“apenas o casamento entre homem e mulher é válido ou reconhecido na Califórnia”,
como combate ao ódio).
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O que é o casamento?
62 O Professor Andrew Koppelman argumenta que “as genitálias de uma pessoa estéril
são tão apropriadas para conceber quanto uma arma descarregada é apropriada para
atirar. Se alguém aponta uma arma para mim e puxa o gatilho, exibe o comportamento
que, enquanto tal, é apropriado para atirar, mas se a arma está ou não carregada, e se
ele sabe ou não disso, continua a ser bastante importante.” Andrew Koppelman, The gay
rights question in contemporary American law 87-88 (2002). A objeção do Professor
Koppelman é equivocada e deixa escapar um ponto importante. Órgãos naturais e
processos orgânicos são diferentes de objetos fabricados pelo homem e de processos
artificiais, que mantém sua dinâmica voltada para certos fins apenas enquanto nós os
utilizamos para esses fins – o que, por sua vez, pressupõe nós pensarmos neles como
capazes de realmente atingir esses fins. Isto é, a função de objetos e processos criados
pelo homem é imposta sobre eles pelos seres humanos que os utilizam. Assim, um
pedaço de metal se torna uma faca – um artefato cuja função é cortar – apenas quando
nós tencionamos utilizá-lo para cortar. Quando ele não é mais capaz de cortar e nós não
mais tencionamos utilizá-lo para cortar, já não é mais realmente uma faca. Contudo, o
mesmo não se aplica entre os corpos humanos de um homem e uma mulher, pois
órgãos naturais são o que são (e têm, portanto, sua dinâmica natural voltada a certas
funções) independentemente daquilo para que nós tencionemos utilizá-los e a despeito
até mesmo de se as funções que desempenham poder ser completada. Assim, em nosso
exemplo, um estômago continua um estômago – um órgão cuja função natural é exercer
um papel na digestão – independentemente de ser nossa intenção utilizá-lo dessa forma
e mesmo de que a digestão venha ou não a ser completada com sucesso. Raciocínio
análogo é também verdadeiro para órgãos sexuais em relação à reprodução.
65 Cf. id.
73 Note que apenas argumentos sólidos baseados em princípios verdadeiros podem ser
necessariamente decisivos.
74 Cf. Maggie Gallagher, (How) Will gay marriage weaken marriage as a social
institution: a reply to Andrew Koppelman, 2 U. ST. Thomas L. J. 33, 51-52 (2004).
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O que é o casamento?
76 Cf., e.g., David Boaz, Privatize marriage: a simple solution to the gay�marriage
debate, Slate (Apr. 25, 1997). Disponível em: [http://slate.com/id/2440].
79 Isabel V. Sawhill, Families at risk, Setting national priorities: the 2000 election and
beyond 97, 108 (Henry J. Aaron; Robert D. Reischauer eds., 1999); cf. também The
Witherspoon Institute, supra nota 26, p. 15.
80 David Popenoe, Disturbing the nest: family change and decline in modern societies,
p. xiv�xv (1988); Alan Wolfe, Whose keeper? Social science and moral obligation
132-42 (1989).
86 NC – O leitor brasileiro bem sabe que não se trata de alarmismo, pois o “poliamor”
vem sido defendido por ilustres membros da advocacia, da magistratura, do ministério
público e da academia. Foi, inclusive, tema de destaque do congresso do IBDFAM de
2018
(www.ibdfam.org.br/noticias/6710/Fam%C3%ADlias+simult%C3%A2neas+e+o+poliamor%3A+um+do
Acesso em: 09.01.2018), instituição que tem apoiado o reconhecimento legal da
poliafetividade e das relações paralelas (de concubinato impuro). Nesse quesito, vale
destacar a decisão do CNJ, em pedido de providência das ADFAS – Associação de Direito
de Família e Sucessões, que proibiu as serventias extrajudiciais de lavrar escrituras de
união estável poliafetivas (pedido de providência 1459-08.2016.2.00.0000).
87 Beyond same�sex marriage: a new strategic vision for all our families &
relationships, Beyondmarriage.org (July 26, 2006). Disponível em:
[http://beyondmarriage.org/ full_statement.html].
88 Jessica Bennett, Only you. and you. and you: polyamory – relationships with
multiple, mutually consenting partners – has a coming-out party, Newsweek (July
29,2009), Disponível em:
[www.newsweek.com/2009/07/28/only�you�and�you�and�you.html].
91 Cf., e.g., Eskridge, supra nota 7, p. 1421-22 (“Uma história social construtivista dá
ênfase às formas com que o casamento é construído ao longo do tempo, sendo a
instituição enxergada como um reflexo de relações sociais de poder mais amplas”).
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O que é o casamento?
92 Cf., id., p. 1434 (“Casamento não é uma instituição criada naturalmente, com certos
elementos essenciais. Em vez disso, é uma construção que se liga a outras instituições
culturais e sociais, de modo que fronteiras antiquadas entre o público e o privado ficam
dissolvidas”).
93 Cf. Hernandez v. Robles, 805 N.Y.S.2d 354, 377 (N.Y. App. Div. 2005) (Saxe, J., voto
vencido) (“O casamento civil é uma instituição criada pelo Estado”); Andersen v. King
Cnty., 138 P.3d 963, 1018 (Wash. 2006) (Fairhurst, J., voto vencido) (“O casamento
deriva sua força da própria natureza do contrato civil de casamento e do reconhecimento
desse contrato pelo Estado”).
100 Andrew Sullivan, Introduction, In: Same�sex marriage: pro and con: a reader, p.
xvii e xix (Andrew Sullivan ed., 1st ed. 1997).
101 E. J. GRAFF, Retying the knot, In: Same�sex marriage: pro and con, nota 101,
supra, p. 134 e 136.
103 Victoria A. Brownworth, Something borrowed, something blue: is marriage right for
queers?, em I do/i don’t: queers on marriage 53, 58-59 (Greg Wharton & Ian Philips
eds., 2004).
105 Ellen Willis, Can marriage be saved? A Forum, The Nation, July 5, 2004, p. 16.
107 Id.
108 Cf. em geral Jonathan Rauch, Gay marriage: why it is good for gays, good for
straights, and good for America (2005).
109 David P. Mcwhirter; Andrew M. Mattison, The male couple: how relationships
develop 252-53 (1984).
110 Id. p. 3.
111 C. H. Mercer et al., Behaviourally bisexual men as a bridge population for HIV and
sexually transmitted infections? Evidence from a national probability survey, 20 INT’L J.
STD & AIDS 87, 88 (2009).
112 Edward O. Laumann et al., The social organization of sexuality: sexual practices in
the United States 314-16 (1994).
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O que é o casamento?
114 Scott James, Many successful gay marriages share an open secret, N.Y. Times, Jan.
29, 2010, p. A17. Disponível em:
[www.nytimes.com/2010/01/29/us/29sfmetro.html?ref=us].
115 Andrew Sullivan, Only the right kind of symbolic sex, The Daily Dish (Aug. 4, 2009,
11:11 am). Disponível em:
[http://andrewsullivan.theatlantic.com/theatlantic.com/the_daily_dish/20/09/08/only-the-right-kind-of-
118 Mais uma vez, nós não julgamos que todos os atos de coito, mesmo dentro do
casamento, são matrimoniais. Coito feito pelos cônjuges sem amor, especialmente
quando baseado em coerção ou manipulação, não é verdadeiramente matrimonial –
falta-lhe encarnar e expressar verdadeira (abrangente) comunhão conjugal.
121 Muitas pessoas atraídas por pessoas do mesmo sexo que não apoiam o
reconhecimento legal de uniões entre pessoas do mesmo sexo têm explorado o valor
especial que possui para elas as amizades profundas. Cf., e.g., John Heard, Dreadtalk:
‘Holy Sex & Christian Friendship’ John Heard�Life Week 2009 At The University of
Sydney�Remarks, Dreadnoughts (May 4, 2009, 3:33 PM). Disponível em:
[http://johnheard.blogspot.
com/2009/02/dreadtalk�holy�sex�christianfriendship.html].
122 Para saber mais a respeito dos efeitos que uma cultura sexualizada tem sobre a
amizade, cf. Anthony Esolen, A requiem for friendship: why boys will not be boys & other
consequences of the sexual revolution, 18 Touchstone Magazine, Sept. 2005, p. 21
Disponível em: [www.touchstonemag.com/archives/ article.php?id=18�07�021�f].
123 Cf. Aristotle, Nicomachean Ethics 260 (Terrence Irwin trans., Hackett Pub. Co.
1985).
124 Phyllis Zagano, Nature vs. Nurture, National Catholic Reporter (Sept. 30, 2010).
Disponível em: [http://ncron.org/blogs/just�catholic/nature�vs�nurture].
125 John Corvino, Nature? Nurture? It doesn’t matter, Independent Gay Forum (Aug.
12, 2004). Disponível em:
[http://igfculturewatch.com/2004/08/12/nature�nurture�itdoesnt�matter]. O artigo
do Professor Corvino trata especificamente com a moralidade das relações entre pessoas
do mesmo sexo, que não é o nosso assunto aqui. Mas o mesmo raciocínio se aplica.
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