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MAT0206/MAP0216 - Análise Real - IME - 2007

Prof. Gláucio Terra

5a Lista de Exercı́cios - Resolução dos Exercı́cios

2-) Seja f : I → R contı́nua no intervalo I ⊂ R. Se, para cada x ∈ I (exceto, possivelmente, na extremidade
superior de I, caso a mesma esteja em I), existir f+0 (x) e for > 0, então f é estritamente crescente.

Demonstração: Suponha que f não seja estritamente crescente, ou seja, suponha que existam x, y ∈ I
tais que x < y e f (x) > f (y). Para todo a ∈ [x, y[, f é derivável à direita em a e f+0 (a) > 0, logo existe
δ > 0 tal que a + δ ∈ [x, y] e f (a + δ) > f (a), donde a não é ponto de máximo de f |[x,y] . Como
f (y) 6 f (x), segue-se que y também não é ponto de máximo de f |[x,y] . Então a função contı́nua f |[x,y]
não tem ponto de máximo, o que contraria o teorema de Weierstrass. ¤

4-) Seja f : I ⊂ R → R derivável no intervalo I. Dado a ∈ I, são equivalentes:


(a) f 0 é contı́nua em a; ¡ ¢
(b) ∀ (xn )n∈N , (yn )n∈N seqüências em I tais que ∀ n ∈ N xn 6= yn , xn → a e yn → a, tem-se
f (yn ) − f (xn )
→ f 0 (a).
yn − xn

¡Demonstraç ¢ ão: Suponha f 0 contı́nua em a. Sejam (xn )n∈N , (yn )n∈N seqüências em I tais que
∀ n ∈ N xn 6= yn , xn → a e yn → a. Para todo n ∈ N, o teorema do valor médio garante a existência
de um θn no intervalo aberto com extremos xn e yn tal que f (yn ) − f (xn ) = f 0 (θn )(yn − xn ), donde
f (yn )−f (xn )
yn −xn = f 0 (θn ). Como as seqüências (xn )n∈N e (yn )n∈N convergem para a, segue-se do teorema do
confronto que a seqüência (θn )n∈N também converge para a, e da continuidade de f 0 em a segue-se que
f 0 (θn ) → a, donde f (yynn)−f (xn )
−xn → a.
¡ ¢
Reciprocamente, suponha que ∀ (xn )n∈N , (yn )n∈N seqüências em I tais que ∀ n ∈ N xn 6= yn ,
xn → a e yn → a, tem-se f (yynn)−f −xn
(xn )
→ f 0 (a). Provemos que f 0 é contı́nua em a. Seja (xn )n∈N
uma seqüência em I tal que xn → a. Para cada n ∈ N, pela definição de derivada podemos tomar
yn ∈ (xn − 1/n, xn + 1/n) ∩ I \ {xn } tal que | f (yynn)−f (xn )
−xn − f 0 (xn )| < 1/n. Como xn → a e 1/n → 0, o
f (yn )−f (xn )
teorema do confronto garante que yn → 0. Assim, por hipótese segue-se que yn −xn → f 0 (a), e uma
nova aplicação do teorema do confronto garante que f 0 (xn ) → f 0 (a).
¤

12-) Seja¡ f : I →
¢ R derivável no intervalo fechado I ⊂ R (limitado ou não). Dado c ∈ [0, 1), suponha
que ∀ x ∈ I |f 0 (x)| 6 c, e que f (I) ⊂ I. Mostre que f tem um único ponto fixo a em I (i.e. existe
um
¡ único¢ a ∈ I tal que f (a) = a) e que, para todo x1 ∈ I, a seqüência definida indutivamente por
∀ n ∈ N xn+1 = f (xn ) é tal que xn → a.

Demonstração: (i) f é lipschitziana, com constante de Lipschitz c: ∀ x, y ∈ I com x < y, pelo


teorema do valor médio existe θ ∈]x, y[ tal que f (y) − f (x) = f 0 (θ)(y − x), donde |f (y) − f (x)| 6 c|y − x|.

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(ii) De (i), segue-se que, dado x1 ∈ I a seqüência (xn )n∈N
¡ definida¢ indutivamente conforme o enunciado
é de variação limitada (portanto, convergente), pois ∀ n ∈ N |xn+2 − xn+1 | = |f (xn+1 ) − f (xn )| 6
c|xn+1 − xn |. Seja a o limite da referida seqüência; então a ∈ I, pelo fato de ser I fechado. Afirmo
que a é um ponto fixo de f . Com efeito, a continuidade de f implica que xn+1 = f (xn ) → f (a); como
(xn+1 )n∈N é uma subseqüência de (xn )n∈N , também temos xn+1 → a, e a unicidade do limite garante
que a = f (a).
(iii) O ponto fixo de f é único. De fato, dados a, b ∈ I pontos fixos de f , tem-se: |a − b| = |f (a) − f (b)| 6
c|a − b|, donde (1 − c)|a − b| 6 0, donde |a − b| = 0, i.e. a = b. ¤

13-) Sejam p ∈ N e c ∈ [0, 1). Dada f : I → R derivável no intervalo fechado I ⊂ R, suponha que f (I) ⊂ I
. . p fatores ¡ ¢
e que g = f p = f ◦ f ◦ · · · ◦f satisfaça ∀ x ∈ I |g 0 (x)| 6 c. Prove que f tem um único ponto fixo
a ∈ I e que, para todo x ∈ I, limn→∞ f n (x) = a.

Demonstração:
(i) Pela questão anterior, g tem um único ponto fixo a ∈ I e, para todo x ∈ I, tem-se limn→∞ g n (x) = a.
. .
(ii) Afirmo que, para todo x ∈ I, limn→∞ f n (x) = a. Como efeito, dado x ∈ I, tome x0 = x, x1 =
. p−1
f (x), . . . , xp−1 = f (x). Por (i), para cada k ∈ {0, . . . , p − 1}, tem-se limn→∞ g n (xk ) = a, i.e.
np .
lim
¡ n→∞ f (xk ) = a. ¢ Noutras palavras, definindo-se¡F :¢ Z+ → R por F (n) = f n (x), e tomando-se
.
∀ k ∈ {0, . . . , p − 1} Nk = {k + np | n ∈ Z+ }, tem-se ∀ k limn→∞ F |Nk (n) = a. Como ∪06k6p−1 Nk =
Z+ , segue-se limn→∞ F (n) = a.
(iii) Segue-se de (ii) que a é ponto fixo de f (pelo mesmo argumento usado na questão anterior). Além
disso, se b ∈ I também for ponto fixo de f , a seqüência {f n (b)}n∈N é constante e igual a b, e por (ii)
deve convergir para a, donde b = a. ¤

21-) Sejam f e g analı́ticas num intervalo aberto I ⊂ R.


¡ Se existe
¢ a ∈ I tal que f e g coincidem, juntamente
com todas as suas derivadas, no ponto a, então ∀ x ∈ I f (x) = g(x). Mostre que isto seria falso se
supuséssemos apenas f e g de classe C∞ .

Demonstração: ¡ ¢
. .
(i) Sejam A = {x ∈ I | ∀ n ∈ Z+ f (n) (x) = g (n) (x)} e B = I \ A. Assim, A ∩ B = ∅ e A ∪ B = I. Como
¡ ¢ (n) ¡ ¢ .
∀ n ∈ Z+ f e g (n) são contı́nuas, segue-se que ∀ n An = {x ∈ I | f (n) (x) = g (n) (x)} é fechado em
I; e, como a intersecção de uma famı́lia arbitrária de fechados em I é um conjunto fechado em I, segue-se
que A = ∩n∈Z+ An é fechado em I, i.e. B = I \ A é aberto em I (portanto aberto em R, uma vez que I é
aberto, por hipótese). Afirmo que A também é aberto. Com efeito, dado x0 ∈ A, ¡a analiticidade ¢ de f e
.
g garante a existência de um δ > 0 tal que Bx0 (δ) = (x0 − δ, x0 + δ) ⊂ I e tal que ∀ x ∈ Bx0 (δ) f (x) =
P∞ f (n) (x0 ) P∞ g(n) (x0 ) ¡ ¢
n=0 n! (x − x0 )n e g(x) = n=0 n! (x − x0 )n ; como ∀ n ∈ Z+ f (n) (x0 ) = g (n) (x0 ) (pois
x0 ∈ A), segue-se que f e g coincidem no intervalo aberto Bx0 (δ), donde Bx0 (δ) ⊂ A, o que mostra que
x0 é ponto interior de A. Portanto, como x0 ∈ A foi tomado arbitrariamente, segue-se que A é aberto,
como afirmado.
(ii) De (i) segue-se que {A, B} é uma cisão do intervalo I. Ora, já foi demonstrado em aula que todo
intervalo de R é conexo, portanto {A, B} deve ser a cisão trivial. Por hipótese, existe a ∈ A, logo A 6= ∅;
então A = I e B = ∅, portanto f e g coincidem em A.
(iii) O seguinte exemplo mostra que o enunciado seria falso se supuséssemos f e g apenas de classe C∞ :
tome I = R, a qualquer real menor ou igual a zero, f a função identicamente nula, g : R → R dada por
g(x) = 0 se x 6 0 e g(x) = exp(−1/x) se x > 0.
¤

2
Observação: no último exemplo assume-se a função exponencial já conhecida de um curso de Cálculo,
mas ainda a definiremos formalmente e estudaremos sua diferenciabilidade mais adiante.

22-) (Princı́pio do Prolongamento Analı́tico) Dadas f e ¡g analı́ticas ¢ no intervalo aberto I, seja X ⊂ I


um conjunto que possui um ponto de acumulação em I. Se ∀ x ∈ X f (x) = g(x), então f coincide com
g em I. Em particular, se f se anula em X, então f se anula em I.

Demonstração:
Inicialmente, demonstremos o seguinte:
Lema: Sejam I ⊂ R um intervalo, p ∈ Z+ e f : I → R uma função p vezes derivável em a ∈ I (para
p = 0 isto significa que
¡ f é contı́nua
¢ em a). Suponha
¡ que exista uma ¢ seqüência (xn )n∈N em I \ {a} tal
que xn → a e tal que ∀ n ∈ N f (xn ) = 0. Então ∀ n ∈ {0, . . . , p} f (n) (a) = 0.
Sugestão: Tente demonstrar o lema como exercı́cio, antes de ler o argumento que segue.
Demonstração do lema:
Será feita por indução sobre p.
(i) Para p = 0, a tese segue imediatamente da continuidade de f em a.
(ii) Suponha que a tese seja verdadeira para um dado p ∈ Z+ ; provemos
¡ que também
¢ (n)será verdadeira
para p + 1. Com efeito, pela hipótese de indução segue-se que ∀ n ∈ {0, . . . , p} f (a) = 0; resta
demonstrar que f (p+1) (a) = 0. Pela fórmula de Taylor com resto infinitesimal, podemos escrever, para
todo x ∈ I:
h f (p+1) (a) i
f (x) = + r(x) (x − a)p+1 , (1)
(p + 1)!
onde r : I → R é contı́nua em a e r(a) = 0. Seja (xn )n∈N em I \ {a} tal que xn → a e tal que
¡ ¢ ¡ ¢ (p+1)
∀ n ∈ N f (xn ) = 0. Segue-se de (1) que ∀ n ∈ N 0 = [ f (p+1)!(a) + r(xn )](xn − a)p+1 ; e, como
¡ ¢ ¡ ¢ (p+1)
∀ n ∈ N xn 6= a, tem-se ∀ n ∈ N f (p+1)!(a) +r(xn ) = 0. Finalmente, como r(xn ) → 0 (pela continuidade
de r em a), segue-se que f (p+1) (a) = 0, o que conclui a demonstração do lema. ¤

Seja x0 ∈ I ∩ X 0 . Seja (xn )n∈N uma seqüência em X \ {x0 } tal que xn → x0 . Como f e g coincidem
.
em X, segue-se que a função analı́tica F = f − g se anula em xn , para todo n ∈ N; então, pelo lema, F
e todas as suas derivadas se anulam em x0 . Finalmente, segue-se da questão anterior que F deve ser a
função identicamente nula em I, i.e. f e g coincidem em I. ¤

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