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História Evolutiva da Humanidade: De Frente Para Trás

José Hidasi Neto

Matrícula: 2019215941

Curso de Graduação em Estatística

RESUMO: É de se espantar que o conhecimento sobre as origens da humanidade não seja


tão bem divulgado como deveria. Discussões em locais não acadêmicos, como em redes
sociais, normalmente demonstram que as pessoas não possuem esse tipo de
conhecimento, não entendendo qual é a sua relação com sua espécie prima viva e mais
próxima, o chimpanzé. Este artigo usa como base uma técnica de analisar a evolução de
frente para trás, desde nós até o ancestral comum com o chimpanzé, também conhecido
como “elo perdido”. Veremos como nossos pais tiveram pais, que por sua vez tiveram
seus pais, e muito tempo antes, tiveram avós de muitos graus que foram avós também de
outras espécies. Durante toda essa trajetória, veremos quando utilizamos nossas primeiras
ferramentas, quando nos tornamos bípedes restritivamente terrestres, quando dominamos
o fogo, quando nossa espécie surgiu e como ela coexistiu com outras espécies até que só
sobrasse ela própria dentro do grupo dos hominínios. Veremos o quanto a evolução
biológica é fascinante ao gerar espécies tão extraordinárias quanto a nossa.

Palavras-chave: Homo sapiens; evolução; biologia; arqueologia; paleontologia.

Introdução
A história da evolução humana é um assunto recente na literatura científica. Ela
começou basicamente no final do século XIX ou início do século XX, quando a evolução
biológica darwiniana começou a se tornar mais popular. Desde então, aprendemos muito
e desenvolvemos técnicas de ensino que ajudam a divulgar as suas informações. Durante
o texto, vou fazer uso de informações de livros como o “Assim caminhou a humanidade”
(NEVES, 2015), além de utilizar uma árvore filogenética como base para localizarmos
nossos parentes e a nós mesmos (Figura 1). Notem que vou utilizar uma tática de ensinar
a evolução de frente para trás indo de nós Homo sapiens até o nosso ancestral comum
com o chimpanzé. Essa técnica também é utilizada em livros como “A grande história da
evolução” (DAWKINS, 2009a) e “O maior espetáculo da Terra” (DAWKINS, 2009b).
Vamos ir de nós até nossos ancestrais comuns com outras espécies. Vamos
começar por você. Você possui ancestrais, começando pelos seus pais, seus avós, depois
bisavós. Notem que, ao mesmo tempo, você também possui primos de primeiro grau,
segundo grau, e assim por diante. Você não é igual aos seus avós, nem aos seus primos.
Aliás, quanto mais distantes de você, eles são mais diferentes de você. Isso explica muito
sobre a evolução.

Figura 1. Caminho evolutivo dos hominínios. A seta indica descendência. Figura


modificada de LIEBERMAN (2009).

1. A História da Humanidade
Existem diferenças que são bem perceptíveis entre certas populações humanas.
Quando essas populações humanas com diferentes características biológicas se
divergiram? Há uns 30-50 mil anos atrás, quando houve a migração do Homo sapiens
para fora da África. O Homo sapiens não era a única espécie humana nesse passado
recente. Havia várias espécies humanas coexistindo no mundo, incluindo os neandertais.
Acontece que não só os Homo sapiens saíram da África nesse período, mas cruzaram com
outras raças e espécies de humanos. Sim, você teve tatata...taravós que fizeram isso.
Assim, foram surgindo, com esses cruzamentos e por pressão do ambiente, as "raças"
humanas que vemos hoje em dia. Todos nós possuímos um ancestral comum, e inclusive
somos primos (próximos ou distantes).
Há aproximadamente 40-50 mil anos atrás, ocorreu algo que pode ser chamado de
"explosão criativa do paleolítico superior". Foi aqui que nossa espécie realmente se
definiu como a conhecemos hoje, pois surgiu um aumento da nossa capacidade de criar
símbolos. Com isso, surgiram as primeiras pinturas em cavernas, colares e até religiões.
As religiões animistas e xamanistas se expandiram, e apareceram esculturas religiosas,
como a de Vênus de Willendorf, há 30000 anos e o homem-leão, há 35000 anos. Voltando
um pouco mais no tempo, podemos ver algo que pode ter servido como uma pressão
seletiva para humanos, pois há uns 70000 anos houve um gargalo populacional humano.
Ou seja, alguma coisa aconteceu que quase levou as espécies humanas à extinção. Pode
ter sido a erupção do supervulcão de Toba, na Indonésia. Vamos voltar ainda mais no
tempo, quando você tinha um avô já um pouco diferente de você, há 200.000 anos.
Finalmente, chegamos aos nossos tatata...taravós, ancestrais comuns das pessoas da
Terra, o Homo heidelbergensis.

1.1. O Gênero Homo


Há uma discussão se nosso ancestral comum mais próximo seria mesmo o Homo
heidelbergensis ou o Homo erectus (o qual conheceremos mais para frente). Entretanto,
alguns fatores indicam que são os Homo heldebergensis. Por exemplo, não há indícios de
que o H. erectus tenha ido para a Europa, ao contrário do H. heidelbergensis, que a
colonizou. Além disso, o Homo heidelbergensis tem um volume cerebral bem maior e
mais próximo do nosso. Seu nome é bem estranho, não é mesmo. Isso é porque foi
encontrado e registrado na Alemanha a partir de 1908, quando um trabalhador achou uma
mandíbula em ótimo estado de conservação dessa espécie. Os machos mediam em torno
de 1,7m e pesavam 62kg, enquanto as fêmeas mediam 1,6m e pesavam 51 kg. Assim
como outras espécies humana, eles usavam ferramentas bem sofisticadas.
É importante notar que esses nossos avós também tiveram seus próprios avós
(Figura 1). Voltando mais no tempo encontramos um outro ancestral comum nosso, o
Homo erectus, que esteve presente no planeta desde aproximadamente 2 milhões a 143
mil anos atrás. Esta espécie foi não só nossa ancestral, mas também gerou muito
provavelmente um primo nosso que foi logo extinto, chamado Homo floresiensis. A
história desse nosso ancestral, o Homo erectus, começou quando, ao final do século XIX
e início do século XX, fósseis dele começaram a ser encontrados em Java e na China. Ele
podia chegar a ser bem grande, em comparação com seus ancestrais (como por exemplo,
o Homo habilis).
Já está no nome uma característica muito importante do H. erectus. Ele era mais
terrestre (ou menos arborícola) do que seus ancestrais. Portanto, ele possuía braços curtos
e pernas longas, caracterizando uma boa bipedia estritamente terrestre. Ele também
utilizava ferramentas, assim como outros humanos, mostrando que tinha certa habilidade
manual. O H. erectus também caracterizou um grande aumento cerebral em relação ao
seu ancestral. Mais interessante do que o uso de ferramentas foi a sua capacidade de
manipular o fogo. Essa é talvez a evidência mais interessante desse nosso ancestral. Sítios
arqueológicos no Sul da África e em Israel apontam o uso do fogo, como a confecção de
fogueiras, há 1 milhão de anos atrás pelos nossos ancestrais. Ainda, o H. erectus foi o
primeiro ancestral nosso a sair da África, colonizando o Cáucaso e a parte leste da Ásia.
Todas essas evidências mostram como foi importante essa espécie humana.
Já sabemos que um tatata-taravô em comum nosso (de todos os indivíduos de
Homo sapiens) foi da espécie H. erectus. Mas, como era o avô em comum de todos os
indivíduos de H. erectus? Ele foi o Homo habilis (Figura 1), espécie que viveu entre 2,4
milhões a 1,4 milhão de anos atrás. Ele é considerado o estreante do gênero Homo, por
alguns motivos. Um deles foi o grande aumento da sua capacidade cerebral em relação
ao seu ancestral, Australopithecus (sobre o qual falaremos no próximo episódio).
Enquanto o Australopithecus tinha 450cm³ de cérebro, o Homo habilis tinha 650cm³.
Outro fator é que ele é um ancestral muito antigo nosso que usava ferramentas de pedra
lascada. Entretanto, hoje já se sabe que até mesmo ancestrais Australopithecus
conseguiam tal façanha (há 3,3 milhões de anos).

1.2. Antes do gênero Homo


Homo habilis é com certeza bem interessante, mas vamos deixá-lo agora para
conhecermos seus ancestrais, que também são nossos ancestrais. Vamos conhecer o
Australopithecus afarensis (Figura 1), que viveram de 3,85 a 2,95 milhões de anos atrás.
Na década de1970, fósseis de A. afarensis foram encontrados na África (locais como
Tanzânia e Etiópia). Dentre esses fósseis está a famosa "Lucy", nomeada em homenagem
à música “Lucy in the Sky With Diamonds” (Beatles). Esses fósseis foram muito
importantes, pois tornaram evidentes que a evolução humana tinha demorado muito mais
do que era pensado antigamente. Os Australopithecus eram baixos em relação a nós.
Machos tinham em torno de 1,5m, pesando 42kg, enquanto fêmeas tinham 1m, pesando
29kg. Eles também possuíam um bipedalismo bem parecido com o nosso, mesmo que
fosse facultativo. Além disso, o A. afarensis possuía mais cérebro (450cm³) do que seu
ancestral Ardipithecus ramidus (350cm³). Isso faria com que o Australopithecus, na época
de sua existência, tivesse o mesmo volume cerebral do que o de um chimpanzé atual.
É bem notável que em 1976, na Tanzânia, foram encontradas pegadas, muito
provavelmente de Australopithecus afarensis, em cinzas vulcânicas antes que elas
endurecessem. Essas pegadas datam em torno de 3,7 milhões de anos atrás. Elas ajudam
a definir a espécie como sendo bípede facultativo, tendo uma curvatura nas costas, pois
há marcas de falanges dos pés e das mãos. Os tatata...taravós de Australopithecus eram
de uma espécie chamada Ardipithecus ramidus, que por sua vez era descendente
possivelmente da espécie Ardipithecus kadabba, as quais viveram há aproximadamente
4,4 milhões de anos e 5,2 a 5,8 milhões de anos atrás. Pesquisadores inferiram através da
dentição do Ardipithecus ramidus que, ao contrário dos chimpanzés, ele não brigava
muito com seus companheiros (entre machos e entre populações da espécie). Por meio de
análises craniais, foi visto que o Ardipithecus poderia ter uma capacidade vocal
considerável. Foram ainda encontrados indícios que, apesar de ele ser bípede, tinha
características também de animais arborícolas.
O Ardipithecus ramidus foi muito importante por mostrar que a bipedia
estritamente terrestre não surgiu do nada, mas com passos graduais. Ainda, vendo seu
crânio ao lado do de um indivíduo mais distante (um primo de vários graus), chamado
Sahelanthropus tchadensis, vemos que o crânio não é muito maior do que o dele. Mas, o
Ardipithecus provavelmente teve um ancestral que, assim como ele, também habitava
florestas ou savanas. Ele se chama Ardipithecus kadabba.
Percebemos que essas espécies são muito importantes para conhecermos o
passado mais longínquo da nossa ancestralidade. Surge então a figura do Sahelanthropus
tchadensis (Figura 1). Essa espécie muito provavelmente não era uma ancestral direta da
humanidade, mas pode ser uma prima mais próxima possível do que chamamos de elo
perdido. Esse elo perdido é o ancestral comum mais próximo entre tanto o homem e o
chimpanzé. O S. tchadensis viveu por volta de 7 milhões de anos atrás.
A descoberta do S. tchadensis foi feita no início dos anos 2000. Sua descoberta
foi muito importante por alguns motivos. Por exemplo ele mostrou que nossas espécies
relativas muito antigas conseguiam andar de forma ereta (mesmo que facultativamente).
Além disso, como o Sahelanthropus foi encontrado distante do leste da África, percebeu-
se que a distribuição dessas espécies antigas poderia ser maior ou mais variável do que se
pensava. No início dos achados da espécie, o autor da espécie pensava que ela poderia ser
um ancestral comum entre nós e o chimpanzé. Ou seja, seria um tatata...taravô tanto nosso
quanto do chimpanzé. Se fosse, ele seria considerado o "elo perdido" entre as espécies.
Entretanto, mais tarde, pesquisadores refutaram essa teoria, e até hoje não sabemos quem
seria o nosso elo perdido com os chimpanzés. Hoje, sabemos que esse elo perdido poderia
ter existido há aproximadamente 7,5 milhões de anos.

Conclusão
Percebemos que o Sahelanthropus é de extrema importância para termos uma
ideia de como seria o nosso elo com os chimpanzés, que são os nossos parentes vivos
mais próximos. Bom, é aqui que chegamos no elo perdido, o ancestral comum mais
próximo entre os humanos e os chimpanzés. Nós ainda não sabemos como era esse nosso
avô, mas com certeza ele revelaria muito sobre a nossa bipedia, nossos habitats, nossas
formas de vida. Enfim, revelaria muito sobre a história evolutiva da humanidade. Tema
que será alvo de muitos estudos durante este século, e que precisa cada vez mais de bons
pesquisadores. A arqueologia e a paleontologia agora estão fazendo bom uso de métodos
estatísticos recentes, além de técnicas de datação modernas. Como resultado os estudos
estão ficando mais completos, revelando informações que eram muito debatidas antes de
existirem tais métodos de análise. Não obstante, programas e simulações de computador
estão abrindo caminho para uma metodologia mais detalhada, identificando padrões
históricos, genéticos ou espaciais das formas de vida hominínias.

Referências
DAWKINS, R. A grande história da Evolução. Companhia das Letras, 2009a.
DAWKINS, R. O maior espetáculo da Terra. Companhia das Letras, 2009b.
LIEBERMAN, D. E. Homo floresiensis from head to toe. Nature, v. 459, p. 41–42,
2009.
NEVES, W. Assim caminhou a humanidade. Palas Athena, 2015.

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