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Exposição a céu aberto pelo governo dos temas aziagos da economia mais

confunde que esclarece

Sem convicção, resumida no planejamento dos negócios pela taxa de inflação, o


investimento nasce torto, quando nasce. A economia clama por certezas

17/2/2013 - 03:47 - Antonio Machado

O noticiário bate-estaca operado pelo primeiro escalão do governo sobre temas aziagos,
como o mau desempenho da Petrobras, o momento difícil da inflação, como enfrentá-la,
se com aumento dos juros ou a depreciação do preço do dólar, as idas e vindas da
licitação dos serviços de infraestrutura, tudo isso exposto a céu aberto, sugere
desorientação, ainda que estejam todos convencidos do acerto.

A trajetória da economia não tem sido tranquila, embora pareça que esteja tudo bem vista
pela ótica do emprego e dos salários. O que a impacta no médio prazo, porém, são o
comportamento da inflação, o nível dos investimentos e a competitividade da produção
comparada à concorrência internacional. Nenhum desses três itens está ok.

Mas é exagero dizer que estejam perdidos, embora quase uma década de câmbio
apreciado para compensar desajustes fiscais e aliviar um pouco a pressão da taxa básica
de juro tenha criado outro padrão de manufatura, sobretudo na área de bens duráveis -
mais integrada ao circuito global, focada no mercado interno e menos suscetível a se
voltar para a exportação, em prazo curto, se a moeda se depreciar.

Se há várias goteiras no telhado da economia, cabe ao governo não assegurar que não
faltarão baldes, mas começar tapando o que mais incomoda. Não é certo que a
macroeconomia, entendida como a gestão dos juros, do orçamento e do câmbio, por
exemplo, resolva por si os problemas. Na microeconomia também há grandes gargalos,
conforme o próprio governo admite ao lançar um vigoroso programa de reforma e
ampliação dos ativos de infraestrutura pelo setor privado.

É com tais licitações que o investimento pode ou não decolar. Elas incluem, além do setor
de transportes, três leilões de áreas para a exploração de petróleo – dois pelo regime de
concessão e o primeiro no pré-sal sob o novo modelo de partilha, marcado para
novembro.
Depende do governo o sucesso desses eventos, entre a modelagem de editais sem
espaço para dúvidas e compreensão sobre o determinante para o capital privado: a
margem de lucro. Se houver tal segurança, o investimento em infraestrutura vai fluir,
desobstruindo também os da indústria. Não bem pela expectativa de maior eficiência e
menor custo de infraestrutura, mas ao desfazer percepções de grande parte do
empresariado sobre um suposto viés estatizante do governo.

Dilma está ouvindo mais

O problema do crescimento frouxo no Brasil tem causas objetivas – a elevada carga


tributária, o custo da infraestrutura, a burocracia infernal, fatores em desalinho com outras
economias que disputam a preferência dos investimentos e não sofrem de atraso cambial
– e razões sutis.

O distanciamento entre os planos do governo e os das empresas, depois de 2010, criou


desconforto. O questionamento das margens de lucro, associado ao furor das agencias
regulatórias e da Receita na aplicação de multas, enfim, turvou o ambiente.

Aconselhada ou não por terceiros preocupados com o meio de campo entre o governo e o
capital, o fato é que presidente Dilma Rousseff voltou do recesso de fim ano abrindo sua
agenda para conversas com empresários e mandou melhorar as taxas de retorno das
concessões.

Ou faz ou sai da frente

É a prática dessas atitudes que deve influenciar o investimento. E um bom pedaço dele
nem depende disso, mas só da capacidade do setor público de planejá-lo e encomendar a
execução, já que custeado pelo dinheiro do orçamento fiscal.

É mais o caso de gastá-lo, o que só foi feito parcialmente nos últimos anos, que gastá-lo
bem, assunto complexo, que deixamos para outra ocasião. Entre a União, estados e as
empresas estatais, tal investimento pode chegar a 4,4% do PIB.

Se o governo tem confiança de que fará o que está sob sua guarda, não há porque temer
outro ano de crescimento insosso, considerando que o investimento privado tem sido,
regularmente, de 16% do PIB. A expectativa do ministro Guido Mantega de crescimento
de 3%, 4% este ano é factível. E não é grande coisa: se avançar 3,5%, significará para os
três anos de governo Dilma um crescimento médio de 2,4%.

Principal e secundário

É ai que voltam ao contexto as grandes variáveis da macroeconomia: juros, câmbio e


inflação. Sem convicção de estabilidade, resumida no planejamento dos negócios pela
taxa de inflação, o investimento nasce torto, quando nasce.

Não basta a taxa de inflação ficar abaixo do teto da margem de variação (6,5%), é preciso
confiar num número, 4,5%, 5,5%, 6%, por anos a fio. A sua grandeza é a segunda
derivada do problema.

No planejamento de médio/longo prazo, importa a estabilidade. Sem ela, só o


investimento empresarial de voo curto tem vez. A economia clama por essa certeza. Se
ela virá com aumento de juros, com dólar depreciado, discute-se depois. A prioridade é
retomar a confiança.

Subsídio dublê de lucro

Parte dos problemas seria evitada com maior clareza dos processos e das intenções. O
intento do governo é alçar o crescimento, com o investimento como abre-alas. Ele perde
pique pelo aumento gradual e constante do custo de produção e pelas incertezas
regulatórias.

Não é o risco de faltar demanda que o trava, não com a ancoragem dos programas de
transferência de renda, mas o retorno menor que em outros países ou em ativos
financeiros. Essa é a sequela de elevar a Selic, cujo alvo, ao contrário do senso comum,
não é encarecer o crédito ao consumo, mas reter a “poupança” de empresas e pessoas.

O PIB perde ritmo tanto quanto se o crédito fosse dificultado, mas com menor risco de
desemprego. E menos investimento, contrariando a sua prioridade. Essas são algumas
contradições que o governo supõe mitigar com o funding barato da banca estatal
complementando margem de lucro operacional. O resultado não tem sido animador.

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