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Dissertação apresentada ao
Programa de Pós–Graduação em
Ciências da Coordenadoria de
Controle de Doenças da Secretaria
de Estado da Saúde de São Paulo,
para obtenção do título de Mestre
em Ciências
Área de concentração:
Infectologia em Saúde Pública
Orientador: Prof. Dr. Carlos Botazzo
São Paulo
2009
Dedicatória
Aos meus pais por terem me ensinado a importância do estudo, aos meus
irmãos que me fizeram acreditar na minha capacidade. Aos meus sobrinhos
que sempre me proporcionaram momentos de alegria.
Agradeço especialmente aos meus amigos João Guilherme e Paulo Góes pela
paciência e o entusiasmo que me passaram durante o período da Pós.
Agradeço a Sandra Maia pela amizade e pela parceria para finalizar a pós.
1. Introdução.....................................................................................................14
2. Caracterização do problema
2.1 Representação social da obesidade......................................................15
2.2 Implicações para os serviços de saúde ................................................19
2.3 Epidemiologia países desenvolvidos/países em desenvolvimento........20
2.4 Obesidade e a relação com as condições sociais.................................24
2.5 A imagem do Corpo...............................................................................25
3. Construção do problema.............................................................................26
4. Referencial teórico.......................................................................................32
5. Objetivos
5.1 Objetivo geral.........................................................................................39
5.2 Objetivos específicos.............................................................................39
6. Método
6.1 Escolha do método.................................................................................40
6.2 Efetivação do campo na cidade de Carapicuíba....................................43
6.3 Plano de Recrutamento e Seleção.........................................................45
6.4 Critérios de exclusão..............................................................................46
6.5 Desenvolvimento do trabalho.................................................................47
8. Considerações finais...................................................................................89
10. Anexos.......................................................................................................101
Resumo
Descritores:
The great increase of obesity cases in the last decades, in developed countries
as well as in developing countries, has turned this nutritional deviation as the
main public health problem in the XXI century. The increase of the prevalence of
obesity in Brazil has been relevant and more observed in low income families,
especially among women. Brazil, a country that still presents population groups
that live in risk of nutrition deficiency, faces an epidemiological moment of
nutritional transition with a greater increase of the nutrition deviations that
causes weight excess. This way, Brazil lives at this moment a paradoxal
nutrition situation and the reasons of this phenomenon needs to be better
explained, especially the greater increase of obesity among low income women.
So, the aim of this study was to research the causes that contribute to the
obesity. As main causes, we observe complaints of anxiety, nervousism,
frustrations and depression. It was observed that in this group needy female
group from Carapicuiba, the knowledge of the obesity of the body was achieved
by the health professional. Evidences shown a complexity in the history of these
women chased by pain, diseases, financial privations, sexual abuse, hunger,
misery, lack of information and overloaded with work. In face of this reality,
obesity became secondary, becoming a form of relief by alimentation. We
concluded that the work of psychotherapy concientization in the treatment of
obesity, making possible the interaction of these people with their own body, the
family and their affective and sexual life, can take to the comprehension of the
obesity problem as a symptom and this way contribute to a greater efficiency of
the hygienic and dietary treatment of obesity. It’s important that the specific
treatment for the obesity problem integrate the public health in Brazil,
emphasizing the importance of adopting strategies for that to happen in a
multidisciplinary way.
Key Words:
14
internações hospitalares, consultas médicas e medicamentos. Deste valor, 600
milhões são provenientes do governo via Sistema Único de Saúde, e
representam 12% do orçamento gasto com todas as outras doenças. (Anjos,
2006).
Para Monteiro (1995), a obesidade está distribuída em todos os estratos
socioeconômicos da nossa população, tendendo a ser mais prevalente entre a
população adulta com menor poder aquisitivo dos grandes centros urbanos.
Considerando esta conjuntura, o presente estudo tem por finalidade avaliar
algumas situações que podem estar contribuindo para esses elevados índices
de obesidade, em especial nas mulheres pertencentes aos grupos
populacionais desfavorecidos do ponto de vista socioeconômico, assim como
demonstrar que as ações de psicoterapias auxiliares podem ajudar no controle
de peso e da obesidade.
2. Caracterização do Problema
15
Além da função nutritiva, essencial à vida, o ato da alimentação pode
assumir ainda outros significados como o prazer, a diversão e a atividade
social. Isso é observado, inclusive, em algumas músicas populares, como:
16
nas representações artísticas como em quadros, gravuras e fotos, com figuras
de mulheres obesas. Uma das mais antigas representações da forma humana
com o nome de Vênus de Wilendorf é datada do período Paleolítico, cerca de
dois milhões de anos atrás, uma estátua de uma mulher obesa.
A interpretação da obesidade varia de época para época, refletindo os
seus valores culturais e científicos. Objetos datados da idade da pedra indicam,
provavelmente, a presença da obesidade em seres humanos. Algumas
estatuetas desta época apresentam mulheres com formas arredondadas,
grandes mamas e tecido adiposo abdominal avantajado. Também, mulheres
com formas arredondadas foram modelos de beleza na Renascença entre os
séculos XIV e XV (Bray GA., 1990).Demonstrado nos quadros do Michelangelo
e outros, a representação das mulheres mais arredondadas
Em contrapartida, a doença, sofrimentos, fome eram representados por
pessoas magras, como podemos observar nos quadros de Peter Paul Rubens.
Figura 1:Vênus de Wilendorf Figura 2: A Queda da Graça , 1508-1512 Figura 3: Roman Charity - 1612
Michelangelo Peter Paul Rubens
:
Fonte: Google Imagens Fonte: Google Imagens Fonte: Google Imagens
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1996, (Monteiro e Mondini 1997). Para os mesmos autores, a obesidade está
relacionada ao fato dos indivíduos morarem em áreas urbanas, e ao poder
aquisitivo familiar. Apesar de, tradicionalmente, se esperar que quanto maior a
renda, maior a prevalência de obesidade, a tendência atual revela que a
prevalência de obesidade é cada vez mais alta em mulheres de baixa renda,
apresentando uma tendência a se estabilizar ou até mesmo diminuir nas
classes de renda mais elevadas. Já a presença do excesso de peso na
população mais pobre pode ser explicada pela falta de orientação alimentar
adequada, atividade física regular reduzida e pelo consumo de alimentos
calóricos, como cereais, óleo e açúcar. Alimentos feitos com estes
componentes, sobretudo os dois últimos, são mais baratos e fazem parte de
hábitos alimentares tradicionalmente incorporados. O problema da obesidade
cresce menos entre a população mais privilegiada porque ela teria maior
acesso a informações sobre os prejuízos que a doença acarreta, ao valor
nutritivo dos alimentos e aos benefícios da prática de atividade física regular
(Batista Filho e Rissin, 2003). Além disto, dispõem de meios materiais para
sustentar os custos de novos “hábitos” ou novos “consumos”, preocupação
estética.
No Brasil, o estudo de Zaluar (1985) revelou que para as mulheres de
baixa renda, a obesidade chegava a ser valorizada como elemento de força.
Silva (1997) verificou em estudo, também com mulheres obesas pobres, que a
obesidade era um atributo sexual importante no grupo. O corpo erótico e
sensual era representado pelas formas arredondadas. Para Muraro (1983), as
mulheres pobres “não se vêem com seus próprios olhos: elas se vêem com os
olhos do homem [...]”.
Segundo Fellipe (2003), a análise do contexto sócio-histórico remete-
nos também à compreensão do cotidiano gerador de ansiedades, estresses e
doenças sociais; também é avaliado o papel da mídia e da indústria de
alimentos no consumo. Indústria e mídia que se confundem ao oferecerem
18
tanto produtos que engordam como produtos e serviços que levam à perda de
peso, ditando um padrão de beleza a ser seguido.
19
No Brasil, a obesidade como problema de Saúde Pública é recente. A
prevalência de obesidade nunca se apresentou em grau epidêmico como na
atualidade (WHO, 1998).
Enquanto agravo nutricional, a desnutrição era assumida como um
problema relevante para os países em desenvolvimento, e a obesidade seria
para países desenvolvidos. Atualmente, tanto os países desenvolvidos como os
países em desenvolvimento não se apresentam como unidades homogêneas,
quer para a prevalência da desnutrição, quer para a da obesidade (Mondini e
Monteiro, 1998; Francischi et.al., 2000).
É urgente que se concretizem os investimentos para educação em
saúde, visando propiciar a descoberta de novos prazeres através de um estilo
de vida mais saudável. A obesidade é uma doença crônica e, como a maioria
das doenças crônicas não transmissíveis (DCNT), de difícil tratamento; além
disso, a utilização de medicamentos cotidianos pode reverberar e auxiliar para
que o obeso não assuma responsabilidade compartilhada, entre os profissionais
de saúde e o Estado, de monitorar suas práticas de saúde e hábitos
alimentares (Pinheiros, Freitas e Corso, 2004).
20
de maior risco para o adoecimento neste grupo. A prevenção e o diagnóstico
precoce da obesidade são importantes aspectos para a promoção da saúde e
redução de morbimortalidade, não só por ser um fator de risco importante para
outras doenças, mas também por interferir na duração e qualidade de vida, e
ainda ter implicações diretas na aceitação social dos indivíduos quando
excluídos da estética difundida pela sociedade contemporânea (Brasil, 2006).
O número de crianças e adultos obesos é cada vez maior, tanto nos
países pobres como nos ricos, e até mesmo em países que se caracterizam por
uma população magra, como é o caso do Japão. A obesidade é um problema
de saúde pública em todas as regiões do Brasil, mas a situação é ainda mais
crítica no Sul. De acordo com dados da Pesquisa Nacional sobre Saúde e
Nutrição (PNSN), de 1989, a prevalência de obesidade em brasileiros com mais
de 18 anos de idade é de 28% entre os homens e 38% nas mulheres (Batista
Filho e Rissin, 2003). Nos Estados Unidos, a prevalência é de 34% nos homens
e 55% nas mulheres com idade entre 20 e 64 anos. Apesar das diferenças
econômicas, os países desenvolvidos, ou não, vivem o mesmo problema da
alta e crescente prevalência de excesso de peso.
Conforme Coutinho (1999), estimativas baseadas em levantamentos do
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 35% da população adulta
brasileira tem peso acima do desejável; 13% das mulheres, 7% dos homens e
15% das crianças. Esses índices encontram-se em ascendência contínua.
Comparando dados dos estudos do IBGE de 1974 com os do Programa
Nacional de Saúde e Nutrição (PNSN) de 1989, verifica-se expressivo aumento
da obesidade em adultos entre 25 e 64 anos de idade (Mokdad et.al., 1999).
Segundo a primeira Pesquisa de Padrão de Vida (PPV) do IBGE (1997),
existem 8,7% de nordestinos obesos e, na Região Sudeste, o índice é de
10,5%. No total das duas regiões, os obesos somam 9,8%, um crescimento
expressivo em relação à Pesquisa Nacional de Saúde e Nutrição (PNSN) de
1989, quando o índice encontrado foi de 8,2%.
21
O aumento da prevalência da obesidade no Brasil torna-se ainda mais
relevante, ao verificar-se que este aumento, apesar de estar distribuído em
todas as regiões do país e nos diferentes estratos socioeconômicos da
população, é proporcionalmente mais elevado entre as famílias de baixa renda
(Monteiro et. al., 1995 ).
No Brasil, a concentração de pobres nas áreas metropolitanas,
observada pelo fenômeno de metropolização da pobreza, tem imposto desafios
importantes para o setor público. Neste cenário, o fenômeno da obesidade
parece configurar-se como um desses desafios, à medida que se observa o
crescimento da obesidade no contexto da pobreza (Ferreira, 2003).
Nos Estados Unidos, a prevalência da obesidade aumentou de 12% em
1991 para 17,9% em 1998, em todo o país. O aumento de peso foi observado
em ambos os sexos, em todas as faixas etárias, raças e níveis educacionais
(Mokdad, 1999). Em 2001, a prevalência de obesidade atingiu 20,9% quando
eram registrados 19,8% no ano de 2000 (Mokdad, 2003).
Com relação à associação entre obesidade e pobreza, (Sawaya,1997)
discute algumas hipóteses. A primeira seria de que as populações em situações
de carência teriam uma propensão genética para o desenvolvimento da
obesidade, como fator protetor em escassez de alimentos. Desta forma, quando
em situações de abundância alimentar, tais "genes ligados à obesidade"
poderiam se tornar deletérios ou não protetores, levando ao ganho ponderal
excessivo. Uma segunda hipótese seria de que uma desnutrição energético-
protéica precoce poderia promover a obesidade no futuro. A terceira hipótese
levantada discute a possibilidade de que, independentemente de fatores
genéticos, a melhoria das condições de vida seria o fator preponderante para o
excesso de peso na população. Esta melhoria estaria associada a fatores como
alta ingestão calórica com redução do consumo de fibras, aumento do consumo
de gorduras e açúcares, além da redução da atividade física.
Ainda segundo Peña e Bacallao (2000), alimentos como frutas e
vegetais frescos não seriam tão acessíveis à população de baixa renda, visto
22
que tais indivíduos dariam preferência a alimentos com alta densidade
energética, por serem estes mais baratos, mais saborosos e conferirem maior
saciedade.
Para Pinheiros, Freitas e Corso, (2004) a criação de protocolos e
condutas relacionadas à prevenção e controle da obesidade é um grande
desafio aos profissionais e serviços de saúde no Brasil. A ênfase em práticas
clínicas integradas ao processo de educação nutricional é prioritária para
concretizar não só o acesso mas, principalmente, a incorporação de hábitos
saudáveis de vida e alimentação. Uma abordagem psicológica, que avalie e
monitore o comportamento alimentar inserido no processo de perda-ganho de
peso e sua manutenção, deve também ser considerada e incluída no
tratamento da obesidade (Ades et.al., 2002).
Como se pode observar, a obesidade está relacionada às maneiras de
viver e às condições efetivas de vida e saúde de sociedades, classes, grupos e
indivíduos, que são construções históricas e sociais. Entretanto, historicamente,
as abordagens de prevenção e controle deste agravo têm se concentrado
basicamente em estratégias educacionais, comportamentais e farmacológicas.
Ainda que essas estratégias possam ser importantes no âmbito individual, não
seriam suficientemente efetivas para a prevenção e o controle da obesidade em
âmbito populacional, se não estiverem associadas a medidas que contemplem
as diversas dimensões do ambiente (física, econômica, política e sociocultural)
de forma a torná-lo menos obesogênico (Lessa, 1998). Obesogênico diz
respeito à influência que oportunidades e condições ambientais tem nas
escolhas, por parte dos indivíduos, de hábitos de vida que promovam o
desenvolvimento da obesidade (Swinburg et al., 1999).
Assim, o desafio seria a promoção de escolhas mais saudáveis por
meio de mudanças ambientais, já que essas medidas possuiriam efeitos mais
duradouros na transformação comportamental dos indivíduos, uma vez que
essas escolhas se incorporariam nas estruturas, nos sistemas, nas políticas e
em normas sócio-culturais (Swinburg et al., 1999).
23
2.4. Obesidade e relação com as condições sociais
24
Entre os principais fatores de risco para as doenças crônicas não
transmissíveis responsáveis por mais da metade das mortes, como doenças
cárdio-vasculares, diabetes tipo 2, síndrome metabólica e obesidade, destaca-
se a inatividade física e maus hábitos alimentares. Na população mundial há
pelo menos 600 milhões de hipertensos. Calcula-se que a hipertensão cause a
morte de 7,1 milhões de pessoas, equivalente a 13% do total de óbitos. O alto
nível de colesterol no sangue causa 4,4 milhões de mortes ou 7,9% do total de
óbitos. O baixo consumo de frutas e verduras é responsável por 2,7 milhões de
óbitos (OPAS, 2008).
Parece existir evidência de que as alterações nos hábitos alimentares e
no ritmo de atividade física podem produzir mudanças nas doenças crônicas
não transmissíveis, no enfarto agudo do miocárdio e nas doenças vasculares
cerebrais, que são responsáveis por mais de um quarto das mortes ( Prentice
RL, Willett WC, Greenwald P, et al., 2004.)
25
“é dócil um corpo que pode ser submetido, que pode
ser utilizado, que pode ser transformado ou
aperfeiçoado” (Foucault, 1987, p.118).
3. Construção do Problema
26
Nos últimos anos, a população de obesos começou a crescer em ritmo
preocupante. Hoje a obesidade é apontada como epidemia mundial, tornando-
se atualmente um dos mais graves problemas de saúde pública do mundo. O
problema aflige países ricos e pobres. Mesmo nos países mais pobres, como os
da América Latina e África, e que ainda lutam contra a fome, o número de
obesos parece estar aumentando, inclusive nas comunidades de baixa renda
(Capelli, Koifman, 2001).
Existem dois tipos principais de obesidade, a ginecóide, onde o
acúmulo de gordura se concentra nas coxas e nádegas, também chamada de
piriforme, comuns entre as mulheres, e a do tipo andróide, cuja obesidade é
localizada predominantemente no abdome, comuns nos homens.
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A obesidade pode ser identificada e classificada pelo Índice de Massa
Corporal (IMC), calculado pela divisão do peso pela estatura elevada ao
quadrado (Kg/m2). São considerados como obesos aqueles indivíduos com IMC
igual ou superior a 30, com forme mostrado no quadro 1 p. 46.
Hábitos sedentários e consumo alimentar com elevado teor calórico
também são fortes componentes para o sobrepeso (Halpern, 1994). Segundo o
mesmo autor, menos de 5% dos obesos têm causa glandular clássica, ou seja,
mau funcionamento da tireóide, das supra-renais, dos ovários, da hipófise ou do
pâncreas.
Com freqüência, a obesidade está relacionada à alimentação. Observa-
se nos supermercados o crescimento no número de ofertas de novos produtos
alimentícios não essenciais. Em 1990, no Brasil, com o incentivo às
importações, proliferaram as grandes marcas multinacionais, no campo
alimentício, colaborando para a transformação dos hábitos alimentares. As
facilidades da alimentação do tipo fast-food vêm agradando a população,
principalmente pelo fato da praticidade, cardápio variado e custo mais
accessível. Ao mesmo tempo, aumentou o consumo de massa na alimentação,
não contemplando as necessidades nutricionais de cada individuo, nem uma
alimentação equilibrada (Santos, 2003). Para o mesmo autor, o fator comida
está sempre presente na vida das pessoas; a relação com a alimentação vem
servindo como uma forma de prazer, frente a tantos 'desprazeres' do dia-a-dia.
Para Fischler (1995), a gordura tornou-se símbolo de descontrole e de
“preguiça”, além disso, os obesos eram percebidos como tendo baixa auto-
estima, limitações intelectuais, mau funcionamento mental tais como excesso
de ansiedade e “covardia” (por utilizarem a gordura para se esconder), e
“egoístas” por comerem mais do que os outros indivíduos, acrescenta Segal
(2006). Nos estudos o autor aponta os preconceitos associados à obesidade
comumente encontrado. Segal acredita que de todos os fatores envolvidos na
obesidade, os psicológicos e psiquiátricos possuem maior relevância, não tanto
pelo seu papel etiológico e de prognóstico, mas sim por seu papel histórico. Nas
28
primeiras seis décadas do século XX a obesidade era entendida como
resultante de déficits morais e/ou problemas psíquicos.
Além dos aspectos relacionados à saúde física como as DCNT
podemos elencar os distúrbios psicológicos e sociais como: depressão, baixa
auto estima e impactos dos preconceitos. Portanto o acompanhamento
psicológico do obeso é muito importante. Cada caso deve ser investigado
cuidadosamente, para obter uma evolução saudável no tratamento.
Acredita-se que as pessoas com sobrepeso submetem-se a sofrimentos
para emagrecer e na maioria das vezes o peso volta. Embora exista uma
grande quantidade de artigos em revistas, livros, programas de televisão,
receitas ou dietas novas que alertam sobre o problema da obesidade, cada ano
aumenta o número deles, e cada vez cresce a discriminação dos obesos
(Glenny-1997).
Devido à sua etiologia multifatorial é difícil mensurar a força de cada
uma das variáveis envolvidas no processo do ganho excessivo de peso. Entre
elas, destaca-se a influência dos fatores socioculturais que impõem um padrão
de beleza esbelto em que as mulheres, especialmente, vivem de acordo com a
tirania da moda, contrariando suas necessidades nutricionais. Controlar a
ingestão alimentar por meio de dietas restritivas e tornar crônico esse
comportamento devido à pressão sociocultural, que impõe padrões corporais
cada vez mais magros, são atitudes possivelmente desencadeadoras de
transtornos alimentares (Quandt, 1999). É interessante destacar que também
há o contraponto desse padrão de beleza em alguns países denominados pré-
industrializados, com pouca disponibilidade de alimentos, em que ser gordo é
um símbolo de status até hoje (Wang, 1999).
Há evidências de que grande parte dos indivíduos obesos come para
resolver ou compensar problemas dos quais, às vezes, não têm consciência.
Esses mesmos indivíduos podem apresentar dificuldades em obter prazer nas
relações sociais, por se sentirem rejeitados ou discriminados, o que os leva ao
isolamento. Por outro lado, esses sentimentos contribuem para que os obesos
29
enxerguem a comida como importante fonte de prazer, o que, devido ao
preconceito, conseqüentemente, restringe e empobrece ainda mais suas
relações afetivas e sociais. Esse processo alimenta o ciclo vicioso em que, de
um lado, há o ganho progressivo de peso e, do outro, uma solidão cada vez
maior (Campos, 1998).
A influência dos aspectos socioculturais é marcante. Considerando a
pressão social da busca pela magreza e todos os esforços envolvidos em
submeter-se a um tratamento, trava-se uma guerra entre corpo e mente.
Estudos mostram que estresse, restrição, rejeição e outros estados emocionais
negativos, levam à interrupção de autocontrole, conduzindo, assim, a escolhas
alimentares inapropriadas, as quais, de certa forma, aliviam as tensões vigentes
(Goodrick e Foreyt, 1991).
Paine (1998) alega que o obeso sofre mais preconceito social até
mesmo que os deficientes físicos, isto porque ele é considerado culpado pela
sua condição, ou seja, é visto como indisciplinado, irresponsável e preguiçoso.
Além do mal causado pelo preconceito social existe uma “perda” da
identidade, pois na maioria das vezes sua identidade passa a ser seu tamanho
e não o seu nome - "lá vem a gordinha". Este desconforto pode levar as
pessoas a passarem fome, sofrerem cirurgias, correrem risco de vida e
desenvolverem outros tipos de problemas.
Além disso, o estilo de vida atual favorece o aumento de peso, pois
existem amplas ofertas de alimentos calóricos, empregos tipicamente
sedentários e poucas oportunidades para a prática de exercício físico. Não
surpreende, portanto, o crescimento acentuado do problema nos últimos anos.
O aumento da prevalência da obesidade no Brasil torna-se ainda mais
relevante, ao se verificar que este aumento, apesar de estar distribuído em
todas as regiões do país e nos diferentes extratos socioeconômicos da
população, é proporcionalmente mais elevado entre as famílias de baixa renda
(Monteiro e Conde, 1999).
30
A urbanização induziu uma mudança nos padrões de vida e
comportamentos alimentares das populações. Em países em desenvolvimento,
o tipo de alimento consumido na zona rural apresenta-se diferente daqueles
consumidos na zona urbana, numa relação diretamente proporcional ao poder
aquisitivo ou ao nível socioeconômico. Estudos demonstram que a população
urbana de baixa renda apresenta uma ingestão calórica inferior, se comparada
à população rural, apesar de a primeira consumir proporcionalmente mais
proteína e gordura animal do que a segunda. A população urbana consome
maior quantidade de alimentos processados, em relação à população rural,
onde a ingestão de cereais, raízes e tubérculos é mais elevada (Pinheiro,
Freitas e Corso, 2004).
Para Mendonça (2005), vários são os fatores associados à dieta que
contribuem para o aumento de sobrepeso e obesidade dos brasileiros, por
acarretarem mudanças importantes nos padrões alimentares: 1) migração
interna; 2) alimentação fora de casa; 3) crescimento na oferta de refeições
rápidas; 4) ampliação do uso de alimentos industrializados e processados.
Estes aspectos vinculam-se diretamente à renda das famílias e às
possibilidades de gasto com alimentação, em particular, associado ao valor
sociocultural que os alimentos representam em cada grupo social. Agrava-se o
problema quando a mídia mostra que emagrecer é relativamente fácil. Existe
um bombardeio de fórmulas "milagrosas" e dietas instantâneas, o que faz os
obesos correrem freneticamente atrás deste resultado. O que se tem
comprovado é que lidar com a obesidade é mais difícil do que pode parecer.
Uma grande parte dos pacientes que se submete a um tratamento para perder
peso o recupera após o relaxamento do tratamento (Andrade et al., 2004).
31
4. Referencial Teórico
32
Freud (1905/1997) acreditava, ainda, que o bebê deveria finalizar cada
fase de maneira bem sucedida. Para ele, o desmame ou o tirar as fraldas
poderia deixar uma influência permanente no desenvolvimento da
personalidade.
Quando a criança é frustrada, ela fica com sentimentos de
necessidades não preenchidas, característica dessa fase. Se for mimada
demais poderá relutar em mudar para próxima fase. Em ambos os casos, o
resultado é a fixação em determinada fase. A pessoa continua a buscar prazer
por meio de comportamento semelhante àquele associado com determinada
fase psicossexual.
A sexualidade oral no adulto tem raízes na infância. As atividades de
sugar e chupar evidenciam a pulsão sexual que, de início, para se satisfazer, é
apoiada numa função vital, a alimentação. Depois, torna-se independente e se
satisfaz de forma auto-erótica.
Freud insistiu no fato de que o passado infantil do sujeito permanece
sempre vivo, dizendo: “As etapas primitivas sempre podem ser restabelecidas.
A mente primitiva é, no sentido, mais pleno desse tempo imperecível” (Freud,
1915/1974, p. 323). O ressurgimento do passado no presente é ainda marcado
pela noção de compulsão à repetição.
Nos três ensaios sobre a sexualidade, este autor ainda chamou de pré-
genitais as organizações da vida sexual em que as zonas genitais ainda não
assumiram seu papel predominante. A primeira delas, que já foi citada
anteriormente, é a oral ou organização pré-genital canibal. Ele ressalta:
33
desempenhar mais tarde um importante papel
psicológico” (Freud, 1905/1997, pág.204).
34
O período da dentição causa vários transtornos à criança sejam
somáticos ou psíquicos. O desenvolvimento psicossexual da criança nos ajuda
a compreender o significado da dentição, bem como os transtornos que o
acompanham (“fase do sadismo máximo”, como denomina Klein, 1997).
Nesta etapa, as tendências destrutivas da criança, suas fantasias, são
de devorar, triturar e aniquilar os objetos. Estas fantasias destrutivas têm
instrumentos executores que são os dentes para o sadismo oral, os músculos
para o sadismo anal e a urina para o sadismo uretral.
Para Aberastury (1984), poder-se-ia compreender que as etapas
precoces do desenvolvimento deixam marcas no significado inconsciente que a
boca mantém durante toda a vida. É através da boca que obtemos prazer, com
a comida, com aquilo que mordemos, mais tarde a boca terá, mesmo para o
adulto, funções para obtenção do prazer sexual. A boca possui determinadas
características inconscientes, em cada etapa do desenvolvimento e o mesmo
acontece com os dentes. Todos esses significados mantém-se latentes na vida
adulta, mas ficam recalcados ou deformados (Aberastury, 1984.).
Acrescenta Botazzo (2006) sobre bucalidade:
35
“A erótica é parte relevante das expressões bucais
nas sociedades humanas, antigas ou
contemporâneas, e não apenas como realização
sexual mas também afetiva, emocional e amorosa.
Não é difícil perceber o quanto essas três dimensões
se acham ligadas à cultura e ao psiquismo. São, ao
mesmo tempo, produtos sociais e, por isso, dotados
de historicidade, quer dizer, a boca humana é
__
socialmente produzida e seus produtos
__
manducação, erótica e linguagem são igualmente
produtos sociais. Por isso, se pode dizer que a boca
não é órgão mas território, e assim o suporte mais
evidente de todo o corpo do homem na realização da
sua vida” (Botazzo, 2008, p. 84).
36
“...a passagem da boca cheia de seio à boca cheia
de palavra se efetua por meio de experiência de
boca vazia. Aprender a preencher com palavras o
vazio da boca é um primeiro paradigma da
introjeção” (p. 439)
37
Wallon (1963), por outro lado, chama a atenção à importância dos
fatores emocionais implícitos à construção de imagem do corpo, enquanto
Lacan (1996), em sua teoria, torna evidentes as dimensões figurativas e
simbólicas do corpo, mostrando este como um fator estrutural do Eu.
No entanto, Boltanski (2004) também fornece subsídios teóricos e
empíricos esclarecedores para este estudo. Segundo este autor, na medida em
que se passa das classes sociais “inferiores” às “superiores”, na escala social,
diminui a valorização da força física em favor do enaltecimento da beleza da
forma física.
Para ele, as classes populares não prestam atenção no seu corpo, usa
o corpo principalmente como um instrumento. A doença é vista na maioria das
vezes como imprevisível e súbita. Já as classes abastadas prestam outro tipo
de atenção ao corpo e têm percepção aguçada de suas mensagens.
A variedade de conceitos estruturados sobre o corpo vai desde a libido,
circulando pela imagem psicológica e chegando a um corpo biológico, usado
como instrumento.
A mitologia grega nos leva a refletir as dualidades estabelecidas e
referendadas no processo de adoecer, como a separação entre saúde e
doença, corpo e alma. A questão da obesidade, a sua compreensão como
problema de saúde, remete ao indivíduo com alma e corpo. Desta forma, a
obesidade não seria uma simples conseqüência de fartura de alimentos, mas
do uso do alimento, de corpos que precisam ser alimentados e almas que
encontram no alimento o prazer, a satisfação alimentar que pode levar ao
adoecimento ou ao sentimento de completude.
Como complementa Aristófanes, o tema aqui é o da fusão amorosa no
mito, narrado por ele no Banquete de Platão, quando toma a palavra para falar
do amor. Aristófanes retrata a existência de um período onde os seres, por
serem duplos, viviam os êxtases da completude. Esta completude leva-os a
pensar serem mais poderosos que o próprio Zeus, rei de todos os seres e
deuses da antiguidade. Zeus, nada satisfeito, resolve enfraquecê-los cortando-
38
os em dois (Platão 1966). E assim começa a eterna busca pela outra metade,
às vezes acreditando que é outra pessoa e às vezes, talvez aumentando o seu
tamanho (obesos), para se sentir mais completo.
Na exposição “O Preço da Sedução, do Espartilho ao Silicone”
realizada em São Paulo no Instituto Itaú Cultural de março a maio de 2004, a
curadora, Denise Mattar, mostrou a transformação do ideal de beleza feminina,
da segunda metade do século XIX até os dias atuais: corrigir aos poucos a
postura, colocar silicone nos lábios para torná-los mais carnudos e sedutores,
silicone nos seios para dar um ar de exuberância e feminilidade, piercing,
tatuagem, dietas para um modelo magro, tornando-as um exército de mulheres
esteticamente todas iguais.
Não é a primeira vez, entretanto, que o corpo é objeto de investimento.
E, devemos perguntar: se trataria de um cuidado com a saúde? Pois nunca, na
história da humanidade, o homem foi tão cortado em nome de um padrão de
beleza.
5. Objetivos
39
5.2.2. Estimar se os encontros do grupo levam a maior compreensão do
esquema corporal e estilo de vida, contribua para redução de peso.
6. Método
40
a partir do ponto de vista das pessoas que estão
sendo estudadas.” (1992.p.232)
41
tarefa de casa a atenção nas refeições e que tentassem desenvolver uma
programação alimentar mais saudável (pois todas as participantes já tinham
noção do que seria melhor para sua saúde). No encontro seguinte foi avaliada a
programação desenvolvida durante a semana de cada integrante do grupo,
verificando facilidades e dificuldades. A solicitação da tarefa de casa para a
semana consistia em identificar os momentos de fome, verificando que tipos de
erro poderiam estar cometendo ao escolher o alimento, quantidade e estarem
atentas se de fato estavam com fome por necessidade orgânica ou não.
Nas sessões seguintes o grupo iniciou o processo de confronto das
situações quanto sociais, quanto familiares e começaram a surgir os relatos de
suas vidas, dificuldades, ansiedades e desconfortos.
As exposições evocam pensamentos, quando cada participante está
realizando a exposição, pensamentos vem à tona, o psicólogo ajuda neste
processo, como: questionando o que o individuo esta pensando no momento.
As tarefas de casa são solicitadas para permitir os participantes desenvolverem
hábitos e estarem atentos para si.
Algumas técnicas foram utilizaram para facilitar os discursos das
mulheres entre elas, o desenho da própria silhueta para que pudessem
visualizar o seu esquema corporal, em seguida com o uso de revistas, cola,
lápis e tinta, colocaram na silhueta imagens de como ficaria seu corpo com
alimentação gordurosa e pesada, em um segundo momento como ficaria seu
corpo com saladas e frutas. ... foi comum aparecer pregos e batidas de carro e
coisas não identificadas na primeira etapa do trabalho no segundo momento,
flores, nuvem, penas e mulheres bonitas.
Ao solicitar a automonitoração, planejamento das refeições, controle dos
estímulos e solução de problemas. Tentamos com as mulheres reconstruir o
curso de sua própria história e os possíveis significados que engordar e
emagrecer lhe confere.
42
A coleta de dados foi realizada durante os encontros e subscrita na
finalização dos mesmos. A análise dos resultados foi realizada segundo a
proposta de Análise de Conteúdo, considerando:
Após a coleta dos dados, ou seja, a “fala” das mulheres, foi realizado a
organização do material e selecionadas as falas mais significantes para o
trabalho. A última etapa da análise de conteúdo compreende o tratamento do
resultado que propõe a interpretação do conteúdo do discurso. Entretanto para
tal análise utilizamos referencial teórico que permitisse o esclarecimento.
43
Paulista (Fepasa), distante 25 km da Capital e pelo asfalto da Rodovia Marechal
Rondon (a velha estrada de Itu), que atravessa o centro da cidade.
44
Saindo de São Paulo pela Rodovia Castelo Branco, logo podemos
avistar, do lado esquerdo, prédios coloridos e de alturas irregulares. À medida
que se aproxima Rodoanel “Mario Covas” pode perceber que a idéia inicial vai
se distorcendo: o que antes pareciam construções coloridas vão se
transformando em prédios populares desgastados pelo tempo, de tamanhos
irregulares, destacando-se em virtude da topografia da cidade. Os prédios são
todos uniformes seguindo o projeto dos conjuntos habitacionais populares, as
casas são aglomeradas, as edificações realizadas umas por cima das outras,
de alvenaria, madeira e até papelão e sacos plásticos.
Diante daquelas ruas estreitas e enladeiradas, sobem e descem
moradores com semblante sofrido, com sua pobreza aparente, parecendo
demonstrar um certo alheamento em relação ao que é vida, saúde e boa
alimentação.
45
com duração de 2 horas, respeitando o “processo grupal” e o ritmo da dinâmica
do trabalho.
Foram utilizados jogos pedagógicos e a escuta terapêutica que
favorecesse a emergência dos fatores ligados à provável compulsão ou práticas
compulsivas.
Para Bezerra Jr. (1994) colocado entre pares, o paciente poderá
exprimir os sentimentos e cotejar sua experiência com um conjunto de pessoas
que compartilham com ele do mesmo universo sócio-cultural. A palavra do
parceiro do grupo, talvez contenha maior plausibilidade, isto é, talvez possa
veicular modelos de identificação mais próximos, mais apreensíveis, do que o
oferecido pelo terapeuta.
46
peso/altura foram realizadas no início da pesquisa e comparada no decorrer
do trabalho. O peso e a estatura, utilizados para o cálculo do Índice de Massa
Corpórea (IMC = peso/estatura), seriam aferidos seguindo normatização da
OMS, utilizando balança disponível na unidade.
47
pensou na possibilidade de estender o grupo até um ano, mas devido à
dificuldade de freqüência teria que mudar a estratégia.
Como o grupo era realizado em horário comercial, alguns dos
participantes faltavam por causa do emprego que arranjavam, outros por causa
da passagem de ônibus, cujo preço era bastante significativo na sua renda.
As atividades com grupos foram realizadas em uma sala cedida pela
direção da Unidade Básica de Saúde (UBS) COHAB V. A UBS está localizada
ao lado da Secretaria de Saúde de Carapicuíba. A localização é de fácil acesso
para a população local. Possui serviços e atendimento de especialidades como:
Clínica médica, Pediatria, Equipe de Enfermagem, Ginecologia, Cardiologia,
Mastologia, Endocrinologia, Urologia, Pequenas Cirurgias, Ultra–sonografia,
Odontologia, Saúde da Mulher, Fisioterapia, farmácia popular e de alto custo,
sala de vacina, sala de curativo e Ouvidoria. Ainda fazendo parte desta
unidade, o Núcleo de Atendimento de Carapicuíba (NAC), referência para o
atendimento de infectologia.
O local para o desenvolvimento do trabalho era um local limpo e
arejado, no qual o grupo podia trabalhar sem ruídos ou interferências de
terceiros. Todos os encontros foram posteriormente transcritos e
complementados com as anotações feitas pela pesquisadora durante os
mesmos. Estas informações constituíram a base empírica da pesquisa para
posterior análise.
As reuniões enfatizaram a qualidade e a "quantidade" de vida, ajudando
a elevar a auto-estima e a percepção do "espaço corpóreo", das emoções e
comportamentos diante da vida, tentando alterar o padrão repetitivo das
práticas alimentares compulsivas.
O vínculo estabelecido com as mulheres foi o que impulsionou o
seguimento dos atendimentos.
Nos encontros realizados tentamos estabelecer um vínculo de
confiança para facilitar aos participantes, fortalecimento da auto-estima, maior
48
conscientização da imagem corporal, recondicionamento físico e alimentar, bem
como, promover contato social.
Os temas e questões que emergiram no grupo foram conduzidos de
forma que a troca de informações favorecesse o processo de aprendizagem, ou
seja, que o grupo refletisse a partir das suas experiências, sempre estimulado a
refletir e a verbalizar através de jogos que possibilitassem o resgate da auto-
estima, a visão crítica sobre alimentação, sobre a mídia, a propaganda de
alimentos e o incentivo à atividade física.
Alguns temas foram dados para o grupo discutir como: alimentação
(comer com pressa, comer vendo televisão, comer sozinho, comer porque está
acompanhando alguém, substituir refeição por lanche), "comida com gosto de
infância": o que comiam, quem fazia a comida, como fazia, em que ocasiões
faziam. Com recortes de revistas, foi solicitado ao grupo montagens sobre sua
própria aparência a partir das perguntas "Como sou?" e "Como gostaria de
ser?" em seguida foram discutidos os padrões de beleza criados pela
sociedade e a saúde.
O grupo sempre foi realizado no mesmo dia da semana e horário. Em
cada encontro sempre era lembrado o contrato do sigilo e, também, que fossem
evitados julgamentos sobre o comportamento dos participantes que pudessem
inibir futuros relatos.
Tornou-se relevante avaliar a vontade, a capacidade de fazer
mudanças, tanto quanto analisar as fantasias à respeito do emagrecimento
pois, normalmente, pacientes se mostram capazes e comprometidos com o
tratamento mas nem sempre cumprem.
49
7. Resultados e discussão
50
assim todas elas pertenceriam à esfera "psicossomática" e não somente
aquelas que se manifestam predominantemente no corpo.
A mesma autora acrescenta a vivência de situações que identifica como
episódios de "exploração corporal", ou seja, experiências que inscrevem no
corpo "marcas" a partir de uma história de exploração e alienação social:
doenças ocupacionais, acidentes de trabalho, fome, espancamento, violência
sexual e outros.
No decorrer dos encontros, todavia, o grupo criou ramificações da
proposta inicial, que seria avaliar as causas da obesidade e compulsão bucal. A
dor emocional e psíquica apresentada pelas mulheres, suas condições de vida
precárias, apareceram como problemas sobrepostos à obesidade,
possivelmente indicando outras causas.
O grupo teve início com 12 participantes e, como tudo que se inicia
voluntariamente sofre uma depuração, finalizamos os encontros com 6 (seis)
mulheres. Das 12 mulheres participantes apenas 9 foram pesadas no terceiro
encontro onde teríamos o peso inicial, o qual seria comparado a cada três
meses. Os resultados desta primeira aferição se encontram no quadro abaixo.
51
Quadro 2: Peso inicial
M. 42 88 1,52 38.0
52
Como sugerido por Busse (2004), a interação da mãe com o bebê e,
posteriormente, a interação da família com a alimentação da criança, podem
constituir fator fundamental no surgimento de alguns casos de obesidade.
53
de alimentação e casamento podem ter uma interação importante. É sempre
oportuno lembrar que o excesso de peso não deve ser encarado isoladamente,
mas dentro de um contexto, que tem a ver com o estilo de vida da pessoa, onde
se incluem sua auto-estima, os sentimentos sexuais e a satisfação conjugal.
54
O marido também boicota o regime da mulher quando obtém benefícios
secundários da obesidade desta. Os motivos são vários, desde o medo da
infidelidade dela (caso fique magra) levando a ciúmes, suspeitas, temores e
ataques, passando pela falta de interesse sexual ou até impotência (em que a
gordura é "culpada") e chegando até à própria obesidade masculina, pois é
possível que ele se sinta desmoralizado e menos atraente sexualmente se
apenas ela emagrecesse (Kaufman, 2000).
55
As explicações para o processo de ganho de peso também surgem
vinculadas a outras causas, como novos produtos no mercado ou acompanhar
a família nas três refeições.
Aos pouco constatamos que é fundamental investigar qual o sentido da
manifestação do sintoma da obesidade, dentro do marco histórico de cada
participante.
56
O grupo tinha como principal característica a disponibilidade para o
__ __
outro mulheres cuidadoras , elas não têm tempo nem olhos para se ver ou
cuidar de si. Surge a consciência do corpo com sobrepeso quando ouve o alerta
do profissional da saúde.
Duran (1997) relata que a população que freqüenta as U.B.S.s
frequentemente se calam diante do médico, ou pouco falam, não se sentindo
suficientemente livres para se exporem sobre as manifestações de seu corpo.
Costumam limitar-se àquilo que lhes é perguntado pelo "doutor", até porque "o
tempo é curto". Nas entrelinhas de seu silêncio, entretanto revelam sofrimentos
que são observados, mas na maioria das vezes, não devidamente acolhidos
pelo médico.
No entanto a importância do emagrecimento caberia mais como uma
exigência do médico do que propriamente a um desejo forte das mulheres.
57
“Estou com dor nas costas” (FC., 62, anos);
58
procedimentos comuns para a redução do peso geralmente impõem uma série
de regras consideradas invasivas porque causam quebra da rotina. Além disso,
esses procedimentos são aplicados uniformemente e ignoram as diferenças
individuais, bem como a variação dos hábitos de cada indivíduo. Podem
desencorajar a manutenção da mudança comportamental.
A responsabilidade do profissional de saúde com relação às mudanças
nos hábitos de vida não deve se restringir a um processo de normatização e
muito menos de culpabilização do indivíduo, pois o que está em jogo não se
restringe apenas à mudança do consumo de alimentos ou de atividade física,
mas tem influência sobre "toda a constelação de significados ligados ao comer,
ao corpo, ao viver" (Garcia, 1992; Rito, 2004).
7.3. A alimentação
59
prazer é muito próxima. Assim, ao construir uma rotina alimentar, o profissional
interfere em vários aspectos da vida de indivíduos ou grupos.
De fato, pareceu-nos, inclusive, que o medo da fome não é libertado
com facilidade da vida destas mulheres assim como a importância da
quantidade de comida no prato e a valorização da “barriga cheia” como
sensação prazerosa. A falta de comida é associada à fome, à miséria, à
doença, à morte. Algumas mulheres manifestavam preocupação constante com
a possível falta ou abundância de alimento em casa, pela qual é avaliada sua
condição econômica.
60
Na alimentação destas mulheres raramente aparecem frutas e
verduras, tendo como base arroz, feijão, macarrão e “mistura”, como chamam
as carnes:
61
A administração da alimentação da casa são elas que fazem. Têm o
hábito de prepararem a refeição logo cedo e deixar no fogão, de forma que vai
sendo requentada à medida que cada pessoa vai se servindo. Elas alegam a
ausência de frutas e verduras por conta do preço e por serem perecíveis,
enquanto os grãos duram mais.
62
7.4. Lazer
63
Almeida et al. (2002) em um estudo sobre os anúncios televisivos,
detectaram que a categoria alimentos foi a mais veiculada, representando
27,47% de todas as propagandas, e do total dos anúncios alimentícios quase
60% eram representados por gorduras, óleos, açúcares e doces com a
completa ausência de frutas e vegetais.
O grupo sugere que ir ao supermercado exerce o mesmo fascínio que
os shopping centers têm sobre as classes média e alta. São lugares de compra
e lazer.
64
7.5 . Frustração
“Não tem jeito, a gente vai tirar a única coisa boa que
tem na vida?” (F., 43 anos).
65
Surge o sentimento de desvalia, o sentimento de se sentir incapaz de
se relacionar socialmente, e a evitação de contatos sociais. Aparece nestas
falas a descrença, o sentimento de incapacidade acerca de passados
fracassos.
66
Schick (1947), considera a obesidade como um sintoma significativo da
personalidade total, considerando o corpo como expressão das atitudes
instintivas do indivíduo. Este autor entende a hiperfagia como um hábito nocivo
e equipara a ingestão excessiva de comida à adição ao álcool ou a drogas
ilícitas. Ele fala da subjacente psicopatologia da adição no desejo inconsciente
de experimentar novamente a satisfação que o bebê obtém da ingestão de
comida.
67
compulsão para comer é atribuída ao medo de morrer de fome, mas isto é um
assunto pouco estudado. O sintoma de vômitos é conhecido por nós como uma
defesa histérica contra o comer. A recusa de comer devido à angústia é
concomitante de estados psicóticos (delírios de ser envenenado).
Podemos observar que a ameaça de privação apresentou
características comuns em todos os relatos. O controle alimentar remete à
privação de alimentos na infância:
68
7.8. Vaidade
69
considerado ideal. Sobre a questão da beleza, Freud (1930/1996) faz
referencia, que na vida a felicidade é predominantemente buscada na fruição da
beleza, onde quer que esta se apresente a nossos sentidos e a nosso
julgamento, para o mesmo autor a atitude estética em relação ao objetivo da
vida oferece muito pouca proteção contra a ameaça do sofrimento, embora
possa compensá-lo bastante. A fruição da beleza dispõe de uma qualidade
peculiar de sentimento, tenuemente intoxicante. A beleza não conta com um
emprego evidente; tampouco existe claramente qualquer necessidade cultural
sua. Apesar disso, a civilização não pode dispensá-la.
A vivência do ser humano numa cultura de narcisismo implica num
constante fracasso do indivíduo e na estetização de sua existência. As
mulheres do grupo iam aos poucos mudando de atitudes, ficando mais
barulhentas, discutindo receitas de embelezamento, mudando seus objetivos,
fazendo planos para si.
70
Inicia um novo processo em suas vidas, um processo de permissão
para o seu bem estar, do direito de cuidar também de si.
Para Varela (2006), o corpo obeso é um corpo marcado pelo excesso
de comida e pelo vazio afetivo, inchado no prazer e no desprazer, e movido
pela fome. Aqui, a fome é uma necessidade humana de regular o balanço
energético e garantir seu desenvolvimento. Entretanto, mesmo depois de
supridas as carências nutritivas, o ser humano obeso continua comendo, como
se houvesse uma falha entre o sinal corporal de se sentir repleto de comida e o
sinal psíquico correspondente. Para a autora, essa falha está diretamente
ligada à falta de simbolização de um sofrimento que encontrou como válvula de
escape satisfação no comer.
71
A maneira como o indivíduo lida, sente e percebe o seu corpo reflete
sua realidade, constituída de sentidos, imagens e significados dentro de um
universo simbólico,
Mais uma vez aparece nas falas a culpa e começa a surgir o sofrimento
no qual estas mulheres foram criadas.
72
“Tem muita vontade dentro de mim que minha mãe
não tinha. Meu pai bebia muito e tudo da casa era
por conta da minha mãe, ficávamos assustados todo
final do dia sem saber se ele chegaria bêbado ou
não... Tinha que comer o que tinha em casa, às
vezes minha mãe não tinha o que dar para comer
aos filhos. E hoje tenho que fazer dieta! Você se
pega pensando: passei tanta vontade e agora posso
e tenho que controlar. Se eu estou viva muita coisa
eu posso realizar. Estou ainda me sentindo pesada,
mais vou conseguir meu objetivo.” (T.56 anos)
73
“Sempre soube que minha obesidade estava ligada
ao estresse, querer mudar o mundo, querer mudar a
Igreja. O dogma da Igreja Católica é muito pesado.
Meu marido trabalhou para a Igreja anos e anos, e
porque resolveu casar perdeu tudo, não tem direito a
nada... Continuamos como católicos. Ele é
estrangeiro e só tem a mim aqui no Brasil” (FC., 62
anos).
74
“A gente, quando não vem, sente falta da doutora e
das meninas...” (F., 43 anos)
São mulheres que lutam pela sobrevivência, são pessoas que têm seus
corpos marcados pela exploração no trabalho e pela violência doméstica,
qualquer atenção é um alento para sua dor.
Mais uma vez aparece nas histórias o pai que maltratava muito a mãe e
batia muito nos filhos:
“Eu tinha medo, tentava fazer tudo certinho, mas
mesmo assim apanhava” (E., 50 anos).
“Meu pai era louco, não bebia nem usava droga, mas
às vezes por nada resolvia bater na gente, tirava a
roupa de todos, amarrava em uma árvore e ‘metia o
chicote’... depois dava banho de sal, era uma dor
terrível, fazia sempre quando a mãe não estava em
casa.”
75
“Um irmão foi espancado até a morte, em outra
ocasião distraiu o pai para que o outro irmão fugisse,
mas mesmo assim ainda rachou a cabeça pelo meio.
Ficou escondido na casa da tia por muito tempo. O
outro irmão morreu no córrego que passava por trás
de casa e em uma noite de muita chuva foi
atravessar por uma ponte que o pai construiu, caiu e
um pedaço de madeira atravessou seu corpo, foi
encontrado morto no dia seguinte” (F., 43 anos).
T., 56 anos, cuida do pai com 90 anos e do irmão que foi acidentado e
não consegue fazer uma cirurgia que é necessária para poder andar:
76
Foi relatado por MJ, 54 anos, que os filhos não se dão muito bem com o
pai; ela fica dividida, tem um filho alcoólatra que dá muito trabalho e vive com
uma mulher muito mais velha do que ele que também é alcoólatra.
Também surgiu na fala das mulheres o papel do alimento como um
alívio para os dilemas diários, as tensões, a falta de dinheiro, a violência, a
responsabilidade com a casa e a família.
E continua:
“... o cartão de credito do meu marido veio com
compras que ele não fez e a operadora disse que ele
tem que pagar e que as compras foram feitas com
sua autorização. Vamos quebrar o cartão... é muita
coisa, e ainda tem que não comer!” (MJ., 54 anos).
77
“Agora arranjei um bico, não posso mais vir” (F., 43
anos).
78
depósitos de espermatozóides e cozinheiras, eternamente ao seu dispor?
Instiga-nos ainda a considerar sobre o que seria o medo da separação. O que
as mantém casadas ou com o quê estão casadas?
79
obesas como forma de neutralizar sua identidade sexual perante as outras
pessoas; para estas, o peso constitui-se uma proteção, por trás da qual se
escondem.
80
empurradas para muitos outros caminhos. O resultado pode se aproximar de
uma vida sexual normal (restrita, na maioria das vezes), ou complementada
pela doença psiconeurótica.
A obesidade pode ser um mecanismo de defesa utilizado pela obesa
para negar sua sexualidade, para proteger-se do assédio dos homens. É como
se seu objetivo fosse construir um muro de carne entre ela própria e os outros.
As mulheres engordam como uma forma de neutralizar sua identidade sexual.
Muitas mulheres mostram um claro temor de parecerem sexualmente atraentes
(Kaufman 2000).
F., 43 anos, disse que não possui tanto apetite sexual, acha que é a
gordura. Outra acrescentou que só veio conhecer o que é o prazer de uma
relação sexual depois do nascimento do terceiro filho.
Barros (1996), assinala que na obesidade há a pobreza da vida sexual
do indivíduo. “A necessidade de amor é confundida com a necessidade de
comida”. O que pode nos remeter ao período da amamentação onde amor e
alimentação talvez fossem a mesma coisa.
Para Bychowski (1950) e Schick (1947), o alimento pode representar
uma gratificação simultânea da sexualidade e da auto-estima. Campos (1998),
afirma que o alimento significa um substituto do amor e do prazer sexual e que
certos indivíduos têm convicção de que o prazer sexual é uma coisa má e
proibida, buscando, assim, um substituto para este. Nesta situação, a
obesidade serve como uma barreira, dificultando as relações sexuais e o prazer
oral, da alimentação, substituindo o prazer genital.
Podemos observar nos depoimentos que a busca do alimento aparece
quando se sentem rejeitadas, sem dinheiro e sem perspectivas, então usufruem
daquele momento como um alento, muito embora logo depois venha a culpa.
81
Logo, essa culpa aparece em busca de coisas para preencher a falta, o
vazio.
O que elas sentem é um desejo muito forte, muitas vezes até
incontrolável. É quase uma ordem, uma necessidade de comer, à qual não
resistem mesmo, comem irracionalmente porque na hora sentem prazer. É um
alívio muito grande. Quando acaba vem uma tristeza, um remorso. É um prazer
efêmero.
Nos encontros tentou-se conduzir as participantes a enxergar o quê as
fazem buscar na comida o preenchimento do vazio e por quê o alimento
aparece como um alívio.
Todos nós temos necessidade de amor. Como, muitas vezes, é
complicado amar as pessoas porque elas decepcionam, alguns passam a amar
coisas ou em alguns casos a comida.
O grupo concluiu que os encontros realizados ajudaram muito,
auxiliaram a disciplinar a alimentação, criar um espaço em suas vidas dedicado
a si mesmo, segundo elas, enxergar coisas que antes não observavam, como
por exemplo, o momento em que estão nervosas ou estão com fome.
Essas mulheres, todavia, não buscavam a beleza física, mas, as
condições mínimas de sobrevivência, um desejo comum a todas elas:
82
familiares para cuidar de crianças (netos, sobrinhos), enquanto os pais
trabalham.
7.11. Retorno
Foi dado o endereço onde seria o local do encontro - Rua Rio Branco,
36 COHAB II – Carapicuíba, um espaço cedido por uma ONG CK São Paulo
Apóstolo.
Foi confirmado o comparecimento. Entramos em contato com a
segunda mulher.
“Não sei se vai dá, estou cuidando de uma netinha”
(T., 56 anos).
Elas continuam com o mesmo estilo de vida, não têm tempo para elas.
A dor permanece na vida das mulheres com condições de vida bastante
adversas, em que as dificuldades limitam quase que totalmente a busca daquilo
que é necessário e traz felicidade só para elas.
O terceiro contato:
83
marido agora está com câncer no esôfago...
Obrigada por ter ligado” (E., 50 anos).
O quarto contato:
84
Os possíveis empecilhos que dificultam a participação dos encontros
são: o trabalho, o dinheiro para passagem e outras dificuldades decorrentes do
modo como vivem essas mulheres.
85
“Só começar a ficar nervosa às vezes já identifico,
não deixo mais minha geladeira cheia... hoje como
de 3 em 3 horas, eu distingo o que é fome e me
controlo quando vou a uma festa, já estou
consciente... Sei que engordei por causa do
nervosismo, da doença do meu marido” (FC., 62
anos).
86
parado” [expressão usada para quem não está
trabalhando]. (E., 50 anos).
87
O que podemos observar é que estas mulheres, após 1 (um) ano e 8
(oito) meses, voltaram ao peso inicial. O que fica em questão é: se o grupo
tivesse continuidade, o peso que seria mantido não seria o obtido com o
emagrecimento?
FC., 62 anos, e E., 50 anos, foram orientadas para procurar manter as
orientações que receberam no decorrer dos encontros e voltar ao
endocrinologista do posto, pois desconheço algum apoio à pessoa obesa em
algum serviço público de saúde em Carapicuíba.
Apesar dos encontros realizados, acreditando ainda que estariam mais
acessíveis a diversas oportunidades de informações sobre obesidade, estas
mulheres não conseguiram eliminar o foco que provoca a ansiedade e angústia
que são supridas com a comida.
Neste sentido, compreendemos que é necessário mais tempo de
encontros, ser criadas condições econômicas (transporte, inclusive) para que
possam assim freqüentar os encontros e que possam alavancar suas vidas.
Surge aí o desafio da cura da obesidade “sem medicamento”. Além da
crença da população a respeito do remédio que resolve tudo, os laboratórios
farmacêuticos reforçam a magia dos remédios, fragilizando cada vez mais o
poder dos pacientes, seja em obter uma disciplina alimentar ou praticar
atividades físicas. Precisa ser visto que a saúde não se esgota somente na
forma clínica, existe uma enorme extensão no emocional.
Talvez não possamos falar da obesidade desarticulada não só da dor
física causada pelo excesso de peso, nem da dor do ser obeso, disforme,
discriminado, limitado na posse de roupas e espaços em que caiba, mas da dor
moral, da dor causada pela vida.
Para estas pessoas o supermercado é o principal lugar de lazer. Talvez
pela dificuldade financeira, seja para eles a paisagem mais bonita, “a comida”,
coisa que não estão acostumados a ver em abundância em suas casas.
Por sua vez, os supermercados instigam a compra de guloseimas,
sendo isto um fator importante para a obesidade e, como se ainda não
88
bastasse, confundem os consumidores sobre o que é diet, light e o que é
saudável.
O que acontece com esta boca que não sabe parar? Está sempre
querendo mais, desloca a função da nutrição e passa a ser uma área
unicamente de prazer bucal. Como fazer para desmistificar o alimento como a
boa fonte de prazer?
8. Considerações Finais
89
análise realizada no presente estudo reinvidica, como um dos fatores
importantes para a compreensão da obesidade sofrida por este grupo de
mulheres, um olhar sobre Carapicuíba, a cidade carente, sem perspectiva de
futuro, de produção afetiva e social para sua população; que compromete o
prazer e tira a alegria daqueles que nela residem.
Do ponto de vista psico-social, a obesidade tem sua causa e
conseqüência diretamente e/ou intrinsecamente ligada aos fatores emocionais;
seja pela ansiedade; angustia; nervosismo e frustrações que são fatores
predisponentes ao quadro da obesidade; ou pelo impacto que a mesma possui;
na auto-estima do individuo; diretamente relacionada com sua vaidade;
relações interpessoais incluindo ainda as relações conjugais se transformando
em ameaça (quando impossibilitado da atividade sexual rotineira) ou a
segurança (quando fornece a estabilidade do parceiro) se transformando ao
mesmo tempo em mecanismo de defesa e ameaça, fazendo com que as
mesmas, muitas vezes, sequer se reconheçam como obesas.
Nesta perspectiva, a relação dor-prazer pode ser compensada pela
ingestão de alimento em excesso, estando a boca no centro deste binômio. A
qual se constitui na primeira ligação entre corpo e o meio externo, sendo
associado ao prazer, como relatado por Freud (1905/1997) ou com o uso da
categoria “bucalidade”, termo usado por Botazzo (2006), que estabelece as
relações da cavidade bucal e sua articulação com a vida das pessoas que não
fica só nas funções atribuídas à boca e aos seus órgãos, mais também à
linguagem, ao prazer e à mastigação. São, em ambos os casos, funções
intimamente ligadas à cultura e ao psiquismo. É desta forma que o alivio da dor
também pode propiciar o consumo excessivo de alimento.
Por último, o presente trabalho traz a perspectiva da utilização das
técnicas psicoterápicas no tratamento da obesidade. Relata também limites e
possibilidades da utilização deste método na abordagem do problema. As
possibilidades estão na amplitude do seu arcabouço teórico- metodológico. O
trabalho de conscientização psicoterápico traz a possibilidade de fazer com que
90
as pessoas pesquisem sua relação com o próprio corpo, com a família, com a
vida afetiva e sexual, enfim, com um universo que parecia sem perspectiva. A
partir do uso deste método, pessoas obesas talvez possam compreender seu
estado como um sintoma, buscando o tratamento dietético aliado ao tratamento
psicoterapêutico, e assim encontrar um caminho para a compreensão de si.
Concluímos que, apesar dos resultados positivos e conseqüente bem-
estar adquirido pelos participantes dos grupos realizados, podemos sugerir um
modelo de atendimento em longo prazo, em que seja criado um espaço de
escuta dos relatos de vida dos pacientes, para reflexão destes sobre si próprios,
suas condições, limitações e, sobretudo, suas possibilidades e, paralelamente,
orientação de atividades físicas e novas práticas dietéticas, auxiliando esse
tratamento e ampliando sua eficácia para o nível local. No entanto, pela
complexidade do problema da obesidade; o qual pode ser uma manifestação de
conflitos e vivências sofridas, deve ser através de uma ação multiprofissional. É
importante que os profissionais estejam atentos as recomendações viáveis para
a realidade da população e as instituições mobilizarem melhor atendimento
para que possibilite o resultado.
Por outro lado, é necessário que protocolos específicos voltados para o
problema da obesidade sejam adotados na saúde pública no Brasil,
ressaltando-se a importância de implantar estratégias para que isto ocorra
efetivamente, envolvendo equipes multidisciplinares compostas, dentre outros,
de médicos, psicólogos, nutricionistas e educadores físicos.
91
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ANEXOS
Anexo I
100
Questionário Utilizado
Nome: __________________________________________________________
Endereço: _______________________________________________________
Data de nascimento.____________idade:______Sexo:______Cor___________
Peso ______________ Altura _________________ IMC __________________
Casada __________Solteira______________Filhos______________________
Número de pessoas no domicílio: _________ Escolaridade:________________
Renda familiar ____________ Emprego: _______________________________
Religião _________________________________________________________
Horas gastas por dia assistindo TV: __________________________________
Come assistindo TV? ______________________________________________
Qual o seu lugar na família? _________________________________________
Tem algum obeso na família?________________________________________
Quando se percebeu gorda?_________________________________________
Porque quer emagrecer?____________________________________________
Em que a gordura te incomoda?______________________________________
Na infância ou adolescência tinha alguma mania?________________________
Roe unha?______Lápis?_____ Usou chupeta?______Até que idade?________
Outros? _________________________________________________________
Acorda a noite para comer? _________________________________________
Come escondido? _________________________________________________
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Anexo II
____________________________________
Assinatura
Endereço: Instituto de Saúde. Rua Santo Antônio, 590, Bela Vista, Centro,
São Paulo. Telefones: 3293-2226 (trabalho), e 9947-2234 (Vera Lúcia)
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