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A Superexploração Do Trabalho em Economias PDF
A Superexploração Do Trabalho em Economias PDF
ARTIGO
[...] a apropriação de mais valia de um capital por outro empresa (I) é a mais produtiva, dado que despende
não pode ser compensada pela produção de mais valia menos tempo que as outras para produzir uma mer-
mediante a geração endógena de tecnologia pelo ca- cadoria. Tendo sido calculado o valor de mercado
pital expropriado, estabelecendo-se, de maneira (VM) de uma mesma mercadoria (MA) em 6 horas
irrevogável, a necessidade da superexploração do tra- (correspondentes ao TTSN), é possível afirmar que
balho (MARTINS, 1999, p. 128). a empresa (I), portanto, se apropria de um valor su-
perior àquele que produziu. Ou seja, ela produz uma
A explicação para este fato passa fundamental- mercadoria no valor de 4 horas, vende esta merca-
mente pela análise da concorrência intrassetorial (den- doria pelo VM de 6 horas e, assim, apropria-se de um
tro de um mesmo setor produtivo) e a da concorrên- valor extra de 2 horas, sendo que estas últimas
cia intersetorial (entre setores distintos de produção) correspondem àquilo que Marx chamou de mais va-
e se articula necessariamente com a análise da ten- lia extraordinária, medida pelo valor de mercado sub-
dência à queda da taxa de lucro4 – que, embora não traído dele o valor da mercadoria quando sai da em-
seja tratada neste ensaio por absoluta falta de espa- presa. A mais valia extra se dá, portanto, quando uma
ço, merece ser aqui pelo menos apontada, pois é o empresa se apropria de um valor superior ao que pro-
eixo através do qual se desenvolvem os tipos de con- duziu. Seguindo a mesma ideia, a empresa (III) é a
corrência antes mencionados. menos produtiva, com um TTSN de 8 horas, de modo
Tratando primeiramente da concorrência que perde 2 horas em termos de valor, isto é, o valor
intrassetorial, ocorre que o aumento da produtivida- que produz é maior que o VM. A empresa (II) não
de em determinado setor propicia, do ponto de vista tem do que se apropriar de forma extraordinária, haja
de cada capitalista particular, a criação de mais pro- vista que o valor que produz é exatamente igual ao
dutos no mesmo espaço de tempo. Essa circuns- valor de mercado de A. Isso nos remete à primeira
tância permite a este capitalista reduzir o valor indi- lei geral do processo de produção da riqueza aponta-
vidual de suas mercadorias a um nível inferior ao da por Marx: por conta do processo de concorrência
valor de mercado e, portanto, apropriar-se de uma em busca da mais valia extra, as empresas procuram
mais valia extraordinária (ou superlucro), quando da incessantemente aumentar sua produtividade, expli-
realização destes produtos no mercado5. Conside- cando-se, assim, a queda no VM das mercadorias e,
rando que o mesmo ocorra com cada capitalista se- por conseguinte, a queda na taxa de lucro das em-
paradamente, o aumento de produtividade – esti- presas pertencentes ao setor em questão.
mulado pela possibilidade de apropriação de O ponto crucial deste esquema está na noção de
superlucro – generalizar-se-ia no ramo de ativida- redistribuição que ele nos aponta. É possível notar, a
de, determinado até o ponto em que houvesse ex- partir do que foi dito, que os capitais mais produtivos
cesso de mercadorias e que, por isto, as mesmas se apropriam de um valor superior ao que produzi-
tivessem seus preços rebaixados a um nível inferior ram, sendo o contrário verdadeiro para o caso dos
ao de seus valores individuais, de modo a haver ne- capitais menos produtivos. Ocorre que a apropria-
cessariamente uma queda na taxa de lucro para o ção se dá justamente como resultado de algo produ-
conjunto deste mesmo setor. zido anteriormente, ou seja, não é possível que um
Lançando mão de certa formalização para o en- capital se aproprie de um valor que não foi gerado.
tendimento desta ideia, temos que três empresas dis- Sendo assim, se um capital se apropria de um valor
tintas (I, II e III) produzem uma mesma mercadoria superior ao que produz, de um valor maior que a sua
A (MA) – e se encontram, portanto, no mesmo setor contribuição quando da formação da massa total de
produtivo – com níveis distintos de produtividade, de valor gerada, significa que, de outro lado, há um ca-
modo que, para cada empresa, o tempo de trabalho pital gerando um valor sem se apropriar dele, há um
necessário para a produção de MA não é o mesmo. capital produzindo algo para que os outros capitais
Sendo assim, (I), (II) e (III) produzem valores (V) mais produtivos se apropriem.
diferentes, sendo que estes valores são medidos em Transpondo estes aspectos para o nível do co-
horas de trabalho, tal como segue: mércio internacional, devemos agora tratar as em-
presas (I), (II) e (III) como pertencentes a países
}
V(I) = 4 horas V(I) + V(II) + V(III) = 18 horas distintos. Deste modo, o capital (I), mais produtivo,
V(II) = 6 horas deve ser entendido como pertencente a um país do
V(III) = 8 horas TTSN = 6 horas centro do capitalismo mundial, o capital (III) precisa
ser tratado como inserido em um país periférico, exa-
O valor total produzido neste setor é de 18 horas tamente por ser o menos produtivo, e o capital (II)
e o tempo de trabalho socialmente necessário neutraliza-se diante das colocações que pretendemos
(TTSN)6 para a produção de uma mercadoria é de 6 realizar, porque produz valor idêntico ao valor de
horas – correspondente à média do tempo total gasto mercado de A, em nada contribuindo com o meca-
por todas as empresas dentro deste mesmo setor. A nismo de redistribuição ao qual nos referimos.
Assim sendo, e recorrendo ao esquema proposto, A empresa (I) se encontra, no caso, num setor
ocorre que os países periféricos são aqueles que produ- tecnologicamente mais avançado e, portanto, mais
zem mais valor (8 horas), tendo em vista que utilizam produtivo, dado que a massa de capital constante in-
relativamente mais trabalho vivo do que trabalho morto vestido (60 unidades) é superior à massa de capital
no processo produtivo – e é justamente o trabalho vivo o variável (40 unidades), ou, em outras palavras, o gasto
único capaz de produzir riqueza nova. Contrariamente, com MP é relativamente superior ao gasto com FT,
os países centrais (mais produtivos), por utilizarem me- de modo que a composição orgânica do capital (c/v)
nos força de trabalho frente ao que utilizam em meios de é mais elevada. Seguindo o mesmo raciocínio, a em-
produção – isto é, por terem alta composição orgânica do presa (III) se estabelece num setor de mais baixa
capital (c/v) –, geram menos valor (4 horas). Contradito- produtividade, tendo em vista que a massa de capital
riamente, quando se atinge o nível da apropriação da ri- constante (40 unidades) é inferior à massa de capital
queza gerada, o processo tendencial se dá de maneira variável (60 unidades), de tal forma que o dispêndio
inversa: os países periféricos, embora produzam mais valor, com FT supera em termos relativos o gasto com MP.
não se apropriam dele, pois são incapazes de produzir Como a produção de mais valor depende da utili-
mercadorias cujo valor esteja abaixo de seu valor de zação da força de trabalho no processo produtivo e,
mercado; são, portanto, incapazes de reduzir seu TTSN. mais do que isto, só pode se dar por intermédio desta
Inversamente, os países centrais, embora produzam me- utilização, fica notório que a empresa (I), mais pro-
nos valor, garantem sua apropriação baseados num TTSN dutiva, aquela que utiliza uma menor massa relativa
que se encontra abaixo da média do setor, estando, as- de trabalhadores no processo, é justamente a que
sim, abaixo do VM da mercadoria A. produz menos valor (60c + 40v + 40m = 140V). Con-
Assim, torna-se cabível afirmar que a apropria- trariamente, a empresa (III), menos produtiva, gera
ção empreendida por parte dos países centrais se dá mais valor (40c + 60v + 60m = 160V), tendo em vista
justamente às custas da ausência de apropriação por que a utilização de trabalho vivo é relativamente maior
parte dos periféricos. Se assim o é, parece-nos cor- que a de trabalho morto e que, portanto, a massa de
reto dizer que a periferia produz valor que não será mais valia (m) gerada é superior. Então, a produção
apropriado por ela internamente, mas transferido para de valor se dá de maneira mais eficaz nas empresas
os países do centro e por eles acumulado. menos produtivas, sendo o oposto igualmente verda-
O mesmo ocorre no nível da concorrência deiro. Esta é a conclusão parcial a que nos permite
intersetorial. Recorrendo ao esquema marxista da trans- chegar o esquema proposto; parcial porque se limita
formação dos valores em preços de produção, e utili- à análise do valor gerado ao final de cada processo
zando a fórmula c + v + m (onde c representa o capital produtivo, ainda sem nenhuma referência a respeito
constante, v representa o capital variável, c + v ex- de como se dá a apropriação deste excedente.
pressa, portanto, o capital total investido e m diz res- Partindo, então, para este nível de análise, temos
peito à mais valia resultante de um período produtivo), que a taxa de lucro (l’) é a própria mais valia, consi-
que nos mostra o valor (V) produzido ao final de cada derada em relação a todo o capital empregado (c +
estágio de produção, temos que três empresas distin- v), ou seja, em relação ao capital constante, somado
tas (I, II e III) produzem as mercadorias A (MA), B ao capital variável – e não mais apenas ao trabalho
(MB) e C (MC), respectivamente – e se encontram, vivo, como ocorria no caso da taxa de mais valia –,
portanto, em diferentes setores produtivos. Elas o fa- podendo ser expressa por l’ = m / c + v. Sendo assim,
zem com níveis distintos de produtividade, com uma como consideramos que todas as empresas em seus
mesma massa de capital total inicial de 100 unidades – respectivos ramos de atividade empregam um mes-
distribuídas entre capital constante e capital variável, mo capital total de 100 unidades, as variações na taxa
de maneira diversa para cada empresa individualmen- de lucro para cada empresa individualmente acom-
te, dado que, como já dito, seus níveis de produtividade panham as modificações ocorridas em termos da
são igualmente distintos, ou, melhor dizendo, são em- mais valia produzida por cada uma destas empresas,
presas que se encontram em setores de diferentes ní- de modo que aquelas mais produtivas têm taxa de
veis de produtividade, uns tecnologicamente mais avan- lucro mais baixa e vice-versa. Esta diferenciação em
çados, outros não – e com uma taxa de mais valia termos de l’ estimula a concorrência entre os seto-
(m’) de 100%7, da maneira que segue: res, de modo que capitais mais produtivos (capital I,
M c+v m’ (= m/v) m V l’ PP PP - V
(I) A 60c + 40v = 100 100% 40 140 40% 150 + 10
(II) B 50c + 50v = 100 100% 50 150 50% 150 0
(III) C 40c + 60v = 100 100% 60 160 60% 150 - 10
por exemplo) se transferem para ramos de maior l’ de transferência de valor em direção aos países cen-
(capital III, por exemplo). Ao fazê-lo, provocam a trais. Com isto, parece-nos irrevogável a visão de de-
queda na taxa de lucro das empresas pertencentes a pendência desenvolvida por Marini (2000), como um
este último ramo e a elevação de sua própria taxa de processo que responde à lógica de acumulação global
lucro. Este movimento, por sua vez, faz com que os através da produção de valores na periferia que são
capitais menos produtivos, agora com l’ mais baixa, apropriados no centro.
transfiram-se para ramos mais produtivos, que con- Adicionalmente, vale acrescentar que, quando se
quistaram uma elevação em sua taxa de lucro. E esta atinge o nível da concorrência intersetorial, é
oscilação segue continuamente até que os setores introduzida a ideia de progresso técnico, inserido e
que competem entre si tenham sua l’ igualada8, ces- liderado por um capital individual pertencente ou vin-
sando o estímulo que faz com que um capitalista vá culado de forma direta ou indireta ao setor produtor
de um setor para o outro. de bens de consumo de luxo. Este dinamismo se jus-
Forma-se assim o lucro médio9 (lm), que é justa- tifica pelo fato de que o setor produtor de bens-salá-
mente resultado da média simples das taxas de lucro rio não tem capacidade de sustentar o progresso téc-
de cada empresa – considerando, ainda, que capitais nico incorporado, haja vista que induz a ganhos de
de mesmo montante recebem o mesmo lucro médio. produtividade e à intensificação do trabalho, que aca-
Como, no caso, a taxa de lucro média é de 50%, o lm bam por produzir, ao mesmo tempo, uma queda no
é, portanto, igual a 50. A partir disto são formados os capital variável (ou na quantidade de força de traba-
preços de produção (PP) e, assim, nos aproximamos lho) empregado no processo produtivo em relação
mais da questão sobre a forma como se dá a apropri- ao que se investe em capital constante (ou em meios
ação do valor gerado. O preço de produção reflete o de produção) e um excedente de mercadorias para o
preço contido na mercadoria quando ela sai da fábri- qual, consequentemente, não há demanda, tornando-
ca10 e pode ser expresso por: se de difícil realização no mercado. Ou seja, trata-se
de um processo contraditório, que amplia a massa de
PP = c + v + lm mercadorias produzida ao mesmo tempo em que re-
ou, alternativamente, PP = V + lm - m duz a possibilidade de realização dessas mercadorias
mediante a diminuição relativa de força de trabalho
Daí, percebe-se que, como o capital total investido na estrutura produtiva.
(c + v) e o lucro médio lm são os mesmos para cada Ao contrário, o setor produtor de bens luxuosos
empresa de cada setor, seus preços de produção (PP) encontra a capacidade de sustentação do progresso
são exatamente iguais em 150 unidades. A partir disto técnico na própria perda de participação do capital
podemos chegar à noção das diferenças em termos variável no processo de produção. É justamente a
de apropriação da riqueza gerada, bastando, para tal, força de trabalho empregada que constitui a deman-
subtrair dos PP das mercadorias seus valores (V). O da para produtos suntuários, de modo que o aumento
resultado desta matemática simples é o de que “uma de produtividade tem limites muito mais restritos de
parte das mercadorias se vende acima do valor na interferência na incorporação de progresso técnico
mesma medida em que a outra é vendida abaixo” por parte do setor produtor de bens de luxo do que
(MARX, 1974, p. 179). Há, portanto, valor sendo pro- por parte do setor produtor de bens-salário.
duzido em (III) que não é acumulado dentro deste se- Introduzida esta ideia, ocorre que a concentração
tor (que produz um valor de 160 unidades e só conse- da produtividade (ampliação da composição orgâni-
gue realizar 150 unidades dadas pelo PP). Por outro ca do capital, c/v) no setor produtor de bens de luxo
lado, o setor (I) gera 140 unidades de valor e realiza (e seus fornecedores de bens de capital) traz à tona
150 unidades dadas pelo PP. Então, recorrendo mais a necessidade de se ampliar a escala de produção, a
uma vez ao fato de que não é possível que um capital difusão tecnológica, o consumo de matérias-primas
se aproprie de um valor que não foi gerado, as 10 uni- por parte deste setor e, na esteira deste processo,
dades acumuladas em (I) só podem ser as mesmas 10 também o consumo de força de trabalho, ao mesmo
unidades expropriadas em (III). Esta ideia, novamen- tempo em que é limitada a capacidade de forneci-
te transposta para o nível do comércio internacional, mento de mercadorias por parte do setor produtor de
leva-nos a afirmar, objetivamente, que a periferia (re- bens-salário – mercadorias estas indispensáveis para
presentada pelo setor III menos produtivo) produz va- a reprodução da força de trabalho, inclusive a utiliza-
lor que será apropriado nos países do centro (repre- da na produção de bens luxuosos –, dados os dife-
sentados pelo setor I mais produtivo). Objetivamente, renciais de produtividade existentes entre ambos os
o que ocorre é que as economias dependentes aca- setores. Ou seja, como a produtividade no setor pro-
bam se especializando na produção de mercadorias dutor de bens-salário é inferior àquela relativa ao setor
com menor avanço tecnológico (dependência produtor de bens de luxo, tendo em vista que a capa-
tecnológica) e, portanto, estão sujeitas, dada a lei cidade de incorporação tecnológica por parte daque-
tendencial de igualação das taxas de lucro, a esse tipo le setor é bastante inferior à deste último, o primeiro
[...] o fato de que são negadas ao trabalhador as há trabalhadores desempregados (ou subempregados),
condições necessárias para repor o desgaste de vivendo em condições de pobreza inferiores às dos as-
sua força de trabalho: nos dois primeiros casos, salariados. Tudo isto cria, evidentemente, um ambiente
porque ele é obrigado a um dispêndio de força de de competição entre os próprios trabalhadores, cada qual
trabalho superior ao que deveria proporcionar nor- na tentativa de se ver empregado, seja através de ma-
malmente, provocando-se assim seu esgotamento nutenção ou de ingresso no mercado de trabalho.
prematuro; no último, porque se retira dele inclusi- Com isso, fica clara a funcionalidade do EIR para
ve a possibilidade de consumir o estritamente in- a acumulação capitalista, que se sustenta justamente
dispensável para conservar sua força de trabalho baseada na superexploração, tanto através de ampli-
em estado normal (MARINI, 2000, p. 126). ação da mais valia absoluta quanto da mais valia re-
lativa. Mais do que isto, esta é a tendência mesma do
Significa dizer, de maneira geral, que o trabalho sistema capitalista: ampliar a composição do capital,
se remunera abaixo de seu valor e isto, por si só, engrossar a massa de trabalhadores que compõem o
deixa patente a existência de superexploração. EIR para, com isso, ter as portas abertas à amplia-
Recuperados estes mecanismos, torna-se relevan- ção da superexploração baseada nos quatro meca-
te, por fim, relacioná-los mais diretamente com a nismos de extração citados e, consequentemente, para
existência do exército industrial de reserva – abor- o fortalecimento da acumulação.
dado por Marx e brevemente reproduzido em nota
anterior. Essa relação tem o intuito de completar os
apontamentos feitos anteriormente, quando iniciamos Considerações finais
o tratamento da superexploração em si e o de
revitalizar a ideia de que a teoria marxista é indispen- Diante do que foi exposto, temos que a
sável ao tratamento da real dinâmica de funciona- superexploração da força de trabalho é a caracterís-
mento do sistema capitalista de produção e, tica estrutural que demarca a condição dependente
consequentemente, da explicação dos fenômenos que de um país. Sua ocorrência se dá em função da exis-
configuram e caracterizam a condição dependente. tência de mecanismos de transferência de valor en-
Relacionar o EIR com a superexploração significa tre as economias periférica e central, levando a que
mostrar sua ação no sentido de exacerbar as formas a mais valia produzida na periferia seja apropriada e
ou os mecanismos de extra- acumulada no centro. Isto
ção de mais valia antes apon- configura uma espécie de
tados. Sua atuação mais ge- ... a superexploração da força “capitalismo incompleto” na
ral é a de fortalecer a ocor- periferia, por conta da inter-
rência da superexploração do de trabalho é a característica rupção de sua acumulação
trabalho e, sendo assim, pro- estrutural que demarca a interna de capital, que só pode
voca impactos simultâneos ser completada com a gera-
sobre os mecanismos de ex- condição dependente de um ção de mais excedente no
tensão da jornada de traba- próprio plano da produção,
lho, de intensificação do tra- país. Sua ocorrência se dá em justamente através da
balho e de queda salarial. superexploração do trabalho.
Logo, implica em elevação da função da existência de Vimos ainda que o funcio-
taxa de mais valia (m/v) e namento do sistema capitalis-
consequente elevação da taxa mecanismos de transferência ta tem como lei geral uma pro-
de lucro (l’). Isto ocorre por- dutividade crescente, ou, dito
que, como já dito, a existên- de valor entre as economias de outra maneira, este siste-
cia de uma massa de traba- periférica e central, levando a ma demonstra uma tendência
lhadores, que se encontra ex- ao incremento da composição
cluída, às margens do merca- que a mais valia produzida na orgânica do capital, de modo
do de trabalho (massa de de- que aumenta a massa de ca-
sempregados), exerce uma periferia seja apropriada e pital constante, relativamente
pressão sobre aqueles traba- à massa de capital variável. O
lhadores que se encontram acumulada no centro. impacto imediato deste movi-
efetivamente empregados, mento da acumulação capita-
forçando a que se submetam lista é a formação de um exér-
a todas as formas de superexploração existentes, sob cito industrial de reserva (EIR) que traz consigo a
pena de se verem substituídos e desempregados por possibilidade crescente de exploração capitalista
“trabalhadores da reserva” num momento futuro. Ou dos assalariados, seja em termos de extensão da
seja, a oferta de trabalho é muito maior que a demanda, jornada de trabalho, seja pela intensificação do tra-
OSORIO, J. Crítica de la economía vulgar – Reproducción 3 Embora a existência do intercâmbio desigual se constitua, de
del capital y dependencia. México: Grupo Editorial Miguel fato, numa forma de exacerbar e fortalecer “a sede de
Angel Porrúa, jul. 2004. acumulação” e a exploração do trabalho, que daí deriva,
MARINI (2000, p. 124) nos mostra que “não é, a rigor,
necessário que exista o intercâmbio desigual para que
comecem a funcionar os mecanismos de extração de mais expressa numa proporção dele. O que ocorre é que parte da
valia [...]; o simples fato da vinculação ao mercado mundial e jornada de trabalho do trabalhador é voltada para a sua própria
a consequente conversão da produção de valores de uso à reprodução, produzindo um valor equivalente ao da FT e a
produção de valores de troca que implica, têm como resultado outra parte, o trabalho excedente, destina-se ao capitalista, à
imediato desatar um elã de lucro que se torna tanto mais produção de mais valia. Sendo assim, a mais valia é a parte
desenfreado quanto mais atrasado é o modo de produção excedente do trabalho vivo (ou do capital variável) da qual
existente.” se apropriam os capitalistas e a taxa de mais valia (m’) expressa
exatamente a relação entre a mais valia e o capital variável (m/
4 À medida que se desenvolve o modo de produção capitalista, v). Quando consideramos que a taxa de mais valia é de 100%,
percebe-se – e isto já foi mencionado em nota anterior – que significa que, numa jornada de trabalho de 8 horas, 4 horas
a classe capitalista tende a ampliar sua produtividade como correspondem ao tempo de trabalho socialmente necessário
forma de ampliar também a acumulação de capital, de modo a para que a força de trabalho se reproduza e as outras 4 horas
produzir mais mercadorias num mesmo espaço de tempo. restantes dizem respeito ao trabalho excedente (através do
Este aumento de produtividade se configura, em primeira qual o trabalhador gera mais valia) do qual se apropria o
instância, numa ampliação da relação entre meios de produção capitalista. Deste modo, o valor da mais valia produzida é,
e força de trabalho (MP/FT), utilizados no processo neste caso, exatamente igual ao valor da força de trabalho ou
produtivo. Isto significa dizer que a composição orgânica do ao tempo que a mesma despende para fazer face às suas
capital, ou a relação entre capital constante (c) e capital necessidades de autorreprodução.
variável (v) investidos, também se amplia, mesmo que seja
em proporção menor que aquela outra. Em outras palavras, o 8 O processo de igualação das taxas de lucro entre distintos
que se percebe é uma maior participação de c em relação ao setores também é uma lei tendencial de funcionamento da
capital global – e, portanto, numa participação reduzida dos economia capitalista, sujeita, portanto, a todos os movimentos
salários em relação a este último. E, como “a taxa de lucro é de contratendência que lhe são correlatos, como o processo
uma função da taxa de mais valia e da composição orgânica de concentração/centralização do capital, por exemplo.
do capital, ‘pressupondo uma taxa de mais valia constante’,
o crescimento da composição orgânica do capital leva 9 Vale ressaltar que o lucro médio deve ser entendido como
necessariamente à queda da taxa de lucro. Esta é a lei da tendência, porque é fruto (ou resultado) de uma outra
queda tendencial da taxa de lucro” (CARCANHOLO, 1996, tendência, que é a de que capitais com menor taxa de lucro se
p. 15, destaque dos autores). Isto posto, vale lançar a ideia de transfiram para ramos de atividade que apresentem uma l’
que a ampliação da superpopulação relativa contribui para maior e que, como tendência, pode não se confirmar, pode
que haja elevação da taxa de lucro – contrariando sua ser barrada por fatores contrariantes que evitem ou
tendência à queda –, de modo que este objetivo final justifica, posterguem sua concretização.
do ponto de vista capitalista, os próprios mecanismos de
superexploração fortalecedores do EIR, considerando que a 10 Notemos que está excluída do PP a mais valia produzida,
possibilidade de auferir maiores lucros forma uma relação justamente porque esta corresponde à fatia da qual se apropria
direta com a possibilidade de engrossar o exército de reserva o capitalista. Ela apenas se inclui de maneira indireta na
e reforçar a expropriação do trabalho. Esta tendência à queda formação do referido preço, pois está embutida no lm auferido
da taxa de lucro foi brilhantemente percebida por Marx e por esse capitalista. Além disto, vale acrescentar que o PP
tratada em toda a Parte Terceira do Livro III de O Capital, sob não é correspondente ao preço de venda ou preço de
a denominação de Lei da Queda Tendencial da Taxa de Lucro mercado (PM), pois, se ambos fossem iguais, implicaria
(LQTTL). Os fatores contrariantes a esta lei de tendência igualdade entre oferta e demanda, fato meramente casual na
estão referidos no Capítulo XIV deste mesmo livro. dinâmica capitalista. Então, as mercadorias não são vendidas
pelos seus valores, embora estes expliquem seus preços de
5 O valor individual refere-se à quantidade de trabalho necessário produção. Se assim fosse, estaria anulada toda a ideia de
para a produção de uma mercadoria numa empresa específica; Marx a respeito da realização de um valor superior àquele
o valor de mercado é a média de todos os valores individuais que se tem quando do ingresso no processo produtivo. Os
de todas as empresas conjuntamente (é o trabalho socialmente valores simplesmente regulam as oscilações dos preços de
necessário); e a mais valia extraordinária é a diferença entre mercado, que, por sua vez, flutuam em torno dos valores.
estes dois valores, quando de sua realização no mercado.
11 E é justamente isto (a maior parte do aumento da
6 O TTSN diz respeito ao tempo que a sociedade gasta para produtividade num país ou região sendo explicada pela
produzir uma mercadoria e corresponde, portanto, ao valor incorporação tecnológica produzida em outro país ou região)
(V) da mesma. que “fundamenta o desenvolvimento dependente de uma
região” (Ibidem, p. 126).
7 Aqui convém lembrar que a mais valia é derivada do capital
variável, do trabalho vivo empregado na produção de 12 A efetiva queda no valor da força de trabalho e, portanto, a
mercadorias, e apenas deste trabalho (ou deste capital), sendo efetiva “violação” da troca de equivalentes, só pode se dar
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