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16/04/2020 O elo entre desmatamento e epidemias investigado pela ciência | Novidades da ciência para melhorar a qualidade de vida | DW | 15.04.

2020

NOTÍCIAS / CIÊNCIA E SAÚDE

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ESPE C I A L AMAZÔN IA

O elo entre desmatamento e epidemias investigado pela


ciência
Cientistas alertam há décadas para o risco de novas doenças como consequência da destruição de florestas. Assim como a
Ásia, origem do novo coronavírus, a Amazônia é vista como possível polo de enfermidades.

"Se a Amazônia virar uma savana, não dá nem para imaginar o que pode sair de lá em termos de doenças", diz pesquisadora

Faz pelo menos duas décadas que cientistas repetem o alerta: à medida que populações avançam sobre as florestas, aumenta o risco de micro-
organismos – até então em equilíbrio – migrarem para o cotidiano humano e fazerem vítimas. Foi por isso que a notícia sobre a propagação
do novo coronavírus, detectado pela primeira vez na China em dezembro passado e que se espalhou pelo mundo, não pegou Ana Lúcia
Tourinho de surpresa. Doutora em Ecologia, ela estuda como o desequilíbrio ambiental faz com que a floresta e sociedade fiquem doentes.

"Quando um vírus que não fez parte da nossa história evolutiva sai do seu hospedeiro natural e entra no nosso corpo é o caos. Está aí o novo
coronavírus esfregando isso na nossa cara", argumenta Tourinho, pesquisadora da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT).

Veja o Especial da DW Brasil sobre a Amazônia

No caso do novo coronavírus, batizado de Sars-CoV-2, muito antes de infectar os primeiros humanos e viajar a partir da China, abrigado no
corpo de viajantes, para outras partes do mundo, ele habitava outros hospedeiros num ambiente selvagem – morcegos, provavelmente.

Isolados e em equilíbrio em seu habitat, como florestas fechadas, vírus como esse não ameaçariam os humanos. O problema é quando esse
reservatório natural começa a ser recortado, destruído e ocupado.

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16/04/2020 O elo entre desmatamento e epidemias investigado pela ciência | Novidades da ciência para melhorar a qualidade de vida | DW | 15.04.2020
Estudos científicos publicados anos antes da atual pandemia já mostravam a conexão entre perda florestal, proliferação de morcegos nas áreas
degradadas e coronavírus. Análises assinadas por Aneta Afelt, pesquisadora da Universidade de Varsóvia, na Polônia, descrevem como os
altos índices de destruição florestal nos últimos 40 anos na Ásia eram um indicativo de que a próxima doença infecciosa grave poderia sair
dali.

Para chegar a essa conclusão, Afelt seguiu o rastro de pandemias prévias provocadas por outros coronavírus, como a da Sars, em 2002 e 2003,
com taxa de mortalidade de 10%, e a Mers, em 2012, que matou 38% das vítimas infectadas.

"Por ser uma das regiões do mundo onde o crescimento populacional é mais intenso, onde as condições sanitárias permanecem ruins e onde a
taxa de desmatamento é mais alta, o Sudeste Asiático atende a todas as condições para se tornar o local de emergência ou reemergência de
doenças infecciosas", afirmou Afelt num artigo de 2018.

Tais condições não se aplicam apenas a essa parte do mundo. Na Amazônia, onde em 2019 o desmatamento bateu o recorde desta década,
com 9.762 km² destruídos, e os alertas de desmatamento aumentaram 51,4% entre janeiro e março de 2020 em relação ao período anterior, o
cenário é parecido.

A região com a maior floresta tropical do mundo também é considerada um provável polo de epidemias, como mostrou uma análise feita por
uma equipe liderada por Simon Anthony, da Universidade de Columbia, nos Estados Unidos. Só de coronavírus que circulam em morcegos
também no Brasil, o levantamento contabilizou pelo menos 3.204 tipos.

O risco que vem da Amazônia

Tourinho não gosta nem de pensar sobre o impacto na saúde pública se a destruição da Floresta Amazônica seguir o ritmo acelerado. "Se a
Amazônia virar uma grande savana, não dá nem para imaginar o que pode sair de lá em termos de doenças. É imprevisível", diz a
pesquisadora. "Além de ser importante para nós por causa do clima, da fauna, ela é importante para nossa saúde."

Estudos feitos no país já traçaram a relação direta entre o corte da Amazônia e o aumento de doenças. Em 2015, por exemplo, uma equipe do
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) constatou que, para cada 1% de floresta derrubada por ano, os casos de malária aumentavam
23%.

A pesquisa foi feita com dados de 773 cidades no Projeto de Monitoramento de Desmatamento da Amazônia, de 2004 a 2012. Além da
malária, a incidência de leishmaniose também se mostrou diretamente relacionada ao desmatamento.

"A floresta fechada é como um escudo para que comunidades externas entrem em contato com animais que são hospedeiros de micro-
organismos que causam doenças. E quando a gente fragmenta a floresta, começa a fazer vias de entrada no seu seio, isso é uma bomba-
relógio", conclui Tourinho, mencionando ainda o perigo trazido por grandes empreendimentos, como hidrelétricas na Amazônia.

O entra e sai da floresta fragmentada para tirar madeira, colocar gado, abrir garimpo também é apontado como um perigo para a saúde. "As
pessoas que entram nessas áreas podem ter contato com esses vírus e levar dentro delas o problema para centros urbanos", exemplifica
Tourinho.

Nesse cenário, indígenas conseguem ser mais resistentes devido ao convívio por séculos com a floresta intocada, pontua a pesquisadora.

"Quando esses vírus chegam às cidades, a disseminação é muito rápida, justamente por toda a facilidade de deslocamento nesses centros,
possibilidade de deslocamentos internacionais. As cidades repetem o mesmo estilo de confinamento que a gente faz com os animais e são
gatilhos para proliferação de doenças contagiosas", acrescenta a bióloga.

Uma dessas rotas pode explicar a origem da pandemia do Sars-Cov-2. A covid-19, doença respiratória provocada pelo coronavírus, infectou
mais de 2 milhões de pessoas e matou mais de 128 mil no mundo, segundo dados atualizados pela Universidade Johns Hopkins nesta quarta-
feira (15/04)

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habitats da vida selvagem está relacionado à propagação de doenças infecciosas. (14.04.2020)  

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Data 15.04.2020

Autoria Nádia Pontes

Assuntos relacionados Amazônia, Coronavírus, Especial Amazônia

Palavras-chave Especial Amazônia, Amazônia, covid-19, coronavírus, epidemia, pandemia

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