Você está na página 1de 12
Capitulo quatro O animal simbélico i As sondagens exploratérias em busca de algum conhecimento | s6lido 2 respeito do meu eu, da minha mente e/ou do meu corpo me trouxeram muito mais perplexidades do que certezas, Porém, pelo ‘menos minhas poucas certezas deixaram de ser ingémuas rotinas ir- refletidas, ao passo que minhas perplexidades so agora divides fi- ‘mais certo que sei a meu respeito & ue fala (consigo mesmo, para co- linguagem e que portanto deve ter inventei a linguagem que falo ~ ela me foi ensinada, inculcada — e porque to serve para objetivar e compar aberta & comp fe semelhanga. A ling ‘digo genético da humanidade s embalar, nfo queiramos sal ‘perguntas, mas tomadas uma Vamos experimentar outra res no da espécie humana. Ou, como afirmou o dramaturgo roma- feténcio, “sou humano ¢ nada do humano me ¢ alheio”. De acor- riamente, ¢ claro ~, mas entio 0 que significa ser hu- ‘Em que consiste esse “humano” com que me identifico? 65 ro) ny popip 9 ac sos O96 ong 2p “804 op opera ope op sued “OpSeI0] aap SHAUOY 2p OUD Z 28 0 opsop ‘aystx9 anh 0 opta ‘oitaFe KIOD “sopels9 Saas SYBUIDP SO ‘nb op sousue 08} S0ull2s op ore] OP wieA SOU OBSIPUOD WSSOU OP ‘peprusip & ‘ootg iutreaotey optmnBos “owusjuD ON “opUTE Op a1804 0 anb stow 0340 108 10d watoy 0 wxeteyfbUS * “oo 9 ‘SOATA saz2s steuiep SO JareuwqRs ap sozedao SOULOS op ‘SHC, ‘dp ebueqjouios 9 waBeam Y So1Tap SouNLAS op ‘[euOIoEL OBSPHOD tssou ap pyaosd sousumy Sop orz7ur o an WIBAKUENTE SOsOSOTEE so ‘opie qty ‘TeuBLI0 aquatEye0 9 odtg Op wISlA 9p crtod O astTeUMY OpeUESTALD 0 28-012} -21 esoytayiod apeproedeo anb y “exdns soiougSrfoqur senidgad sep ‘Sonse sop owoa soyuq SOP 9S fogt vfaaur v zeyiodsap ap zedva ‘osreatum op oyn{t09 ow a}z08 30d ‘2qnod oxy] anb ogSpuoD wns v 9 Tenb 2 ‘ogdetApe ap ‘ossy sod ‘ou “Bip syoUr o “osonp steUU OAIA 20s 0 9 wauoy| © anb sod opipusyue 29, fur-s0au2g,, ‘osoqua}iod og, 7 wawoy o enb sod oyzey wp 21ex wong av ¥ operTuoouo 23 EIpaIDE OWOD $9[90]9S 2P TISTA 2p citiod o BL “ayjuoo 98 oft ootg Se “ortouNoSeUEY Op BASTIEN OISAFTTTL 109 sun3ye anb 2 “BopUENTY eIlep Ot ONE om ‘ua 2 “epeacisop 9 wautoy op owsed ap opbipuod essa RAUL, soujno sov sun — jJBu no waq ~ souLzesquIosse sou 128 a0ored Sou puny sop ounsop jediouud Q “suouioy sou ureyadsap (eopaveut “auiso expatien oun op opdenran g apuodsazi00 orueui8ay 0 anb 9p ‘ibe on axasos O8 seuuede sv amb et sajp0sog sou soa op gue 9 9p Soeur op o¥ jy oot stews syvatuRRTApEIOn o SEWN "CSpEPIAGH v -Ufd8 NO “89}0 ‘ania ogSd0 ap apepiondes owed unsse ‘sosgderd no sagbe sou {aur 0 6 urag o sttBurjenp eaed ovsisodsip aquaureysard agdns anb 0) Sezansep Sey TUUL to Weg Jezy|NIN Dp apepTRony w opRARIqOS 2“ -issod wugyedeasa sours) 2 wxed ‘s3L0Un vp OE wIOGUIA) 5 | 99 {pone op opens cnx op st optznpe]"uPEAL 909220 SAPR9S PHP Sou oy yn oad wpenig}pour aasene| PNET BSS 2 “9"PEAL TL -axgop seygnur ap eino v ‘svjo enttoo oxpgurar opssonue op opueradaud ‘eedvomue sens 2 omuny op opstaoxd v ‘(sednor 9 sogdergey woo) SeonpU|a seIougute[oUE Sep seprend as vred oyUasUe o {(epepuTA fp wumujuen 9p ayuosaud ott09 BIO} Sp WOK SOT “gorunanoo os vxed sousumy sases soxdoxd sofad wpeisont 10) wo8 “any # abo aiisur soj90}9S) reuo}Der oyusurestad op 9 wtasiens “ay wp assod s(arejstsar sezgioeq 2 soigguoma ste on oUWsow!) anno Sop 19 ‘saxopeindl “ sspjdroqut suoBe1a se souugjzequeosesoe ofoy 2 “eaTyn Tide e ‘opbeBaacu 2) oB:Ala8 OssOU e se-optEDo{09 “sre Se50j 0 ap woquogt apeproudeo v zeuewuny apsads9 Ep SEARRS!P Sseousfiayoure9 se sepoy 96-UUMU” OBSUOSAP 2349190 BSSON foq 0 ered Sesyno 2 [ou o wand EquIKAROUD ofo S9zOA Seu -yp sosinoat reyuaBua ered ezansap w ‘rourBeuar pod 2s an oF 20% acns opeprigey etm opumnssog‘sogsena stanyssod noxfB09 of O¥P pumas urequn ogu an sopepmuciayue act "Bagnedeosa yey OBE SHOW ep 98 “Sosintaes ap aquazeg EnIUoOTD 0 HIAIOG OP EEN, SOIUOULa}OUL sean Sep 60 9 S0[08 Sopnx Sop soprEp so no 0 Gos seainbse # Nap naude ‘sosanoos we opunogy‘Lagqnre) 2 ‘oqammested opeyt 0 2 WS “enduy 2 ouisoUl 1s B nouIStig “waBeAIes Omo? [eApSTEDEL o oWIOD ode sexe sons UH ‘9p soMTEgar SOR 2‘ 082] $0 1109 ‘moo e-Bx ode oue optre o 12 ‘ufoqass ayo “B19, jaapiejur 2 emopassoumt y sesTap sep wsosepod yeu! p 9 ‘opuesueae uraBinx anb sepu0 sv qos ‘Ins oMuan osonased “rio, op epnfe © woo ayreundsa sour op opel onto oF ap 28 Isl “auowoy 0 enb op osoxgtuosse sreut wpe ‘opto ‘0 WaIspx2 ss “too swum, ostanxo sod eptijo Jos aoazous yon v owBuuN 0 21408 100 op opxoYar Exum DUDT}yUY VIGO ENS UO HOU se]DO}OS OBIS offen apuusd 0 ‘oIstip snsaf ap seiue souD soywoqUIRD Str) oufursvur $2128 Sop eIUHOS #2 * jogdsa g ‘separ sens op canjo atéa pedra ~ passando pelas bestas mais ou menos despertas, as plantas, a Agua, 0 fogo, etc. -, tem seu lugar pré-fixado por Deus ta ordem do universo, que deve ocupar sempre, seja alto ou baixo, As coisas deste mundo s6 resta serem 0 que so, ou seja, 0 que Deus, que as fez, quis que fossem, Todas a5 coisas, todos os seres, estio assim fixados de antemio... menos o homem. ~ Quando dispés ordcnadamente todo 0 universo, o Supremo ‘Autor dirigiu-se ao primeiro homem e ~ segundo Pico della Miran- ola! ~ assim Ihe falou: “Nio te demos nenhum lugar fixo, nenhu- ima fisionomia propria, nenhum offcio peculiar, 6 Adio, para que ‘possas ter e possuir por tua propria decisdo e escotha o lugar, a ima- gem e 0s empregos que desejes para ti. Para os demais, uma natu- nitada dentro de certas leis que Ihes prescrevemos. Tk, ri50 submetido a nenhuma norma est Ia para ti conforme teu arbitrio, ao qual te entreguei. Coloquei-te no centro do mundo, para que mais comodamente olhasses a teu redor ¢ visses tudo 0 que existe, Nao te fizemos nem celeste nem terres ‘nem imortal, para que tu, como modelador e escultor de ti mesmo, ‘mas a teu gosto ¢ honra, forjes a forma que preferires para ti. Pode- ris degenerar para baixo, com os brutos; poderis algar-te para. jun- to das coisas divinas, por tua propria decisao.”” ‘De modo que, segundo Pico, o assombroso do homem & que se mantenha aberto e indeterminado era um wniverso no qual tudo tem seu lugar e deve responder sem excentticidades ao que marca sua natureza, Deus criou tudo 0 que existe mas deixou 0 assim dizer, eriado pela metade: concedeu-lhe a poss concluir em si mesmo # obra divina, autocriando-se. De ‘ohomem é também um pouco Dens, pois Ihe foi outorgada a facul- dade de eriar, pelo menos aplicada @ pode fazer mau uso dessa se até 0 vegetal ou o pétreo; ‘mas também pode se elevar até o angélico, até a propria imortali- dade, Nao hé divida de que Pico della Mirandola bem mais oti- mista do que Séfocles quanto as capacidades humanas! Mais adian- te (nos capitulos seis ¢ sete deste livro) teremos que voltar a refle- 3 Ibe, wd. esp. ligsiramente modifieada pelo autor (Traduzido a partie o text citado pelo autor) 68 io renascentista do huma- , tho decidida e até arrogantemente moderna, Mas por enquanto bbasta-nos aqui destacar a conttibuigao de Pico & colocacdo feita, em ssua época, pelo coro de A Segundo 0 trigico grego, o ad- ; uum termo que também se pode let como “estremeced I” -€oqueoho mem pode chegar a fazer com o mundo, seja por meio da técnica, da asticia ou da linguagem racional; mas o humanista florentine destaca sobretudo © que 0 homem pode fazer consigo mesmo, s- gundo a escotha divinamente livre de seu notemos de passagem que, para Pico, a dignidade do homem vem do fato de que ele é 0 ser mais “ditoso” ou fo... algo, sem divida, que Séfocles jamais se atreveria a afirmar! caso, parece que sempre se tentou definir © humano or contraposigio (¢ também por comparago) com o animal e com ¢ divino, E humano quem néo é nem animal nem deus. Em nossos dias, € bastante evidente que deuses nés no somes, em parte por nossas patentes deficiéncias e em parte também porque agora se cré nos deuses ou em Deus bem menos do que em outras épocas. Mas, por outro lado, hd sérias duividas quanto a néo sermos animais, € ‘mesmo animais to especiais ou diferentes dos outros como gosta- rlamos de supor. Que entre os animais e os seres humanos existem angas ¢ até uma certa forma de parentesco, isso & evidente, apenas pelo esbanjamento de elogiéncia que se fez atra- vés dos stculos para deixar claro que nao somos animais. Em com- lascivo de “porco”, o covarde de “galinhe” e os inimigos de “cachor- os” ou “ratazanas”” Essas comparagdes positivas ou negativas so uma forma de reconhecer similaridades reveladoras (embora em boa parte imaginérias!), ao mesmo tempo que expressain 0 temor ampre latente de sermos confundidos com os outros animais, ww ‘ OL [eine od squanaped "woming “a ope soos ‘soueumiy saias ‘cout anb op o¥ey Q “2fo ® znpas as no opuns as 0 anb op simi 9 opt axtautad 0 anb ‘soonuapt oBs soquat onb “rewutge 3 aque‘agip onus wsfoo eno aprodomyue un “ooxBoToIsty ‘ossoooud umn ~ oe oxmo op often no weaosd — 19s wn ‘apepioed 29 ust ~ of] onb so2%p 9 estoo vu “sou 2uts0jUO) “DOPE eI]2P rkq 106 opessaidya ‘urowoy op a1teIp ,o1qwIOsse, ‘nb sjeuouepury seSuaraytp sv — ompt ‘mooased oss} sod woU ‘omeuy o 2 yeuutue 0 anue epopmnu 29 paapyignpul v afoy sourartooe anb syeur rod ‘one ON, “39s somazanb ott anb 0 w09 ‘anb o wrara}qo red 20308 eo ‘pure weayynsnt © setode s0z0y vroug8yraqut vonod ap vxsow 9 amb cn — opeede guresyoaud op anbbrod no vrpugSroru ap ey 10% oro q ‘atoadse wns reznpordar 9 sopra suns zeA12suod ered sued -oqm serprenso warjoatosop 9 sogzex sexidord sens wer steurTTe so wipquea anb amopira 9 “opliuas aisang‘sowodosd sou anb sty $0 : steur soureoazed sou Zaa epwo :s00789]0m) sowaurepury opeosna WLS sebuvaye ered sazeotso Stour Sovour so stuoOU ap apeprosdeo & 9 bq] 96 fonb vexed 9 eanunsio sou anb apopyuorodzox9 op BINS ‘ogzar v onb ioSepioge exoumd owos souresig ,, strut 0 stout . -oeaea wane sousapuod sosto S98 SON "souop souros ogt sya) SOP sojuoqostoour sosynduat 10d opesstdsen ‘oyworedsuen wpe 9 oxayd eto ware no erourosuon wdoud wssou seULOYSHEN O8 KX ur 9 XIX 01N99S OP [eUly ow ‘Pras PUNMUBIS sod wprBTFEL -ovj 2349 w5uai2pIp ep SouLia wa OYze 8 OpUIULZaP SpEpIaA LU OL 30 sojosollj so ‘oBzes ap sous ta STeUNTUD @ suaUHOY 41309 SOHAL “app sv auijap wopuaqaxd ojuenbu> ‘anb sua8ns ap ood e weLeA ‘aquoUI9pUEIS LHELIEA apEpHEUoTOET ep 9 ONZE: ep soQSTULJp se, “UO. ogSeupzuuny exToosay Y “sopigdounue soxagrurour ap wonatio® “niog sao su ofosoy 0 nonsour weg onus aUI0jUOD OER ‘eBuoy eum ap svensto sagSeut sod soutoraosd seu “eSueyL -ae ap wap sopjnjoxa unonbry opu stouuue so anb ered ajdure ayuout -tuas 2 unit ons @ snioglwaquaU sod aaueiexEp sopEts9 SOwOE -aqupyorgns exroueur op “(stop ojmajdeo out oonod um opeiuay soureyur foo ou eum stews 9 a1ogdso vssou on quis) oyzes 10d Souapuarua anb o seqautaye EMO ap arULy ‘ap nansuoutop ULAleC “XTX N 'SOPO} op oqATiTayU stew oYoIG o “Blas no *,DUOIODL om nazz090 epunsé Lop ozo} wo aa118 & 1d as ered wpurdayia ‘orewuny 298 op opupes as-uray sqaUTTeUOK id apeprpiqou esojsofeur ens napiod @ oszaastin op amt Op EPtO {stewyue sop orsar op ouwtuny pewzus aL & snapTeN 2 sojdey{ “oors9do) sein anny wufourd y “Sosord Som siow anb o ‘steunte ooo ayuomsaydusts gt 98 ogres seyundiad se wio3e anb opout aq, -ayo anb o soqjaur xapuzerduroo ~ [eu no tog ~ exed seu ‘opessed op Teuorodaoxa epeptionadns epeoisiuep wss0u ap sodupod wsse ‘ yj UpeU eLDS OBL LI0g sot 9 apopuraip @ejnoura sou opsstuqns sop roueio 9 apupprany ep 2 sebuaio sup euorwUr vu au seyesu09 osouNa — “AUSKIE uo wsse atuimsse & useBau a5 ‘sbsorSiyeu segznr sod ‘ond b 6 om ureUTULIP anb apadust opt yui09 “o[0s Op souumjaug seu “99 sou ‘Teuutue vpla ap SeuLIOy sezTnO ap aned WiewIOY Op oF ‘op vuoa} ens zayjgnd nowior tinseq anb epsep ‘owes ON, necessitatn; em contrapartida, nos humanos serve para descobrir- ‘mos necessidades novas. O homem é umn animal insatisfeizo, inca- paz de satisfazer algumas necessidades sem que veje outras s rem no horizonte de sua vida. Em outras palavras: a razdo animal ‘busca 0s melhores meios para alcangar certos fins estiveis e deter- rminados, ao passo que a razo humana busca meios para aleangar eterminados fins e 1ambém novos fins, ainda ineertos ¢ indetermi- nados. Talvez seja esta a caracteristice para a qual apontava Pico della Mirandola em sua descrigao da dignidade humana. Nos animais a inteligencia parece estar exclusivamente a ser- vvigo de seus , que os dirigem para suas necessidades ou fins vitais bésicos. Ou seja, sua conduta s6 responde 2 umn quadro de situagdes que voltam sempre de novo — necessidade de alimen- to, de acasalamento, de defesa, etc. — cuja importineia prove da vvida da espécie e nfo da escolha de cada um dos Aine tligéncia a servigo dos instintos funciona com nunca inventa nade de novo. Sem diivida, alguns desco- brem truques engenhosos para conseguir comida ou se proteger do jnimigo e até chegam a difundi-los por seu grupo. Mas a base de seus desejos se atém invar elementar. (Os humanos, em contrapart a diversidade gastronémica, do acasalamento chegamos a0 er 108 na guerra, ete. Nos a espécie, a experit _geneticamente acumulada da espécie,e mito pouco ou nada 0s ob- jetivos particulares do individno ou sua experiéncia privada. Os ‘animais parecem nascer sabendo jd muito mais do que aprenderio fem sa Vida; quanto a nés, humanos, dir-se-ia que aprendemos qua se tudo e no snbemos quase nada no momento em que nascemos. ara marar esa dferece, alguns fam em cond” animal (xe inde- <), cembora provavelmente essas distingBes termino- Jégicas nio sejam muito esclarevedoras. ee ee verdade & que os animals acerdam com grande freqiénia n0 ‘que fazem sempre que nio thes apresente grandes novidades, 20 2 ‘Passo que os humanos hesitam e se enganam muito mé to sabem responder melhor a mudangas radicais das cit Se um determinado animal obtém maus resultados com de sua espécie, dificilmente consegue substitu‘lo por algo que ele ‘mesmo tenha aprendido ou inventado. Isso é exemplificado com Braga pelo humorista galego Julio Camba, que fala da pesca iguarudo”, um marisco parecido com a navalha. O linguaru- do vive enterrado na arcia das praias, deixando um buraquinho como safda de seu esconderijo. Quando a maré sobe, cle sai da areia para se alimentar, Para pescé-lo, pde-se um gro de sal no bu- aco no qual ele estd & espera, fazendo-o acreditar que ja esti co- berto pela dgua do mar e provocando sua saida, Conta Julio Cam- ‘ba: “Bu cheguei a desconcertar de tal modo um pobre linguarudo que, quando a maré subia, o infeliz achava que eu Ihe tinha coloca- do um grio de sal, e, quando eu colocava um grao de sal, achava «que a maré tinka subido. Perdida a confianga em seu instinto, aque- le pobre linguarudo tinha se transformado quase num ser pensante i deiras & parte, a verdade é e néo acertava que ~ diante do inguarudo, para quem Cam- no entan- tancias. dado um jeito de mudar de hibitos e de dieta alimentar. qui estamos comparando animais e humanos do ponto de vista antropocéntrico, Mas 0 que dizem os que consideram uns e outros de uma perspectiva zoolégica? Embora sempre tenhamos gostado de nos auto-elogiar, chamando nossa espécie primeiro de Homo habilis © depois de Homo sapiens, o certo é que nem nossas, habilidades técnicas nem nossa sabedoria sio adotadas como crité- ncial por aqueles que nos tém estudado como mais uma vatiedade de mamiforos superiores. Afinal de contas, compartilha- ‘mos com os chimpanzés novente ¢ tantos por cento de nossa dota- 40 cromossémica! Em 1991, uma equipe de primatélogos (ou seja, estudiosos dos primatas) estabelecen uma série de caractetisticas que distinguem os grupos humanos dos nossos mais préximos pa- 5.La casa 4.5. Camb, col. Austral, Madr, [Traduzido a partic do textocitado plo autor} ‘copeapnopmguoder TURD ap apuog ‘eyeH0M SouoHsaN wD OPIN “L 2 Woo ‘sooo sp ‘oquaUZO[aA opuboA ‘sousUME soUIOs onb ‘no no pOTIOIOT ‘umm ra ‘wag stog “oBSe UO semmERToUS sooo10u $0 wArasqO Uopod somTEIETA $0 “opous assaqy ‘Ws1oA-901A 9 ayot 9 opurend vip 9 anb ume soyorq so on opou ap ‘war duo o as-nanrantt “zn, ap soBo! ap oraut sod “2 wpia ap segSipuoo sens sepetiaox unBi0} SopeLOIOKPLIOD UOMETEIO SOUpLIag Ug “syfoU ® eyaEANp apeprAL ws wasjoawesop onb fos anb aoared ogu anb ossed of ‘jeax opumur op sanerpaisiur ouroo zanalgo ovdypuoa tudoad essou @ svuiseut 1s We puns op ses -10o se reprysa sowpod ‘soureuny ‘SON ;SOUUSuE Sou ap eFOUEISIP sou ap o1ttod 0 are “efos no ~-atogdsa wssow ap sear@gjong sei0ug3 jon oqvo “eprredenuoo wo ‘ouuuny optinur ou trenjodzod os exed aroqtiso # anb 0 entioo no JoaKy # 9 pny ‘oxInau epeu Fy ORE fat ON (olmsdeo ounxoud ou steut rednoo sou sourareiuan qenb op) soueumny so asta anb we opunue op sreumus so wrRaLqety fanb ura ofau 0 wonunsip (owso9 ou wawoy op 403K C Oxall 3 streuoduur nas wis ‘Sosino axiua “rojayag Ey) scougioduo}u0D SO no sopepissaau Sess0U w Wazayex eprrenb seudoid sens woo sorafqo ‘ooo Sel-2A 2 Seyap anTourEaIBoqOI 47j09sap SOU ap “SUSLOD SUP TEI -ueysip Sou 2p apeptoedvo & 1 soursoared ‘soreumy ‘sou “epieden, 3209 Wy“, J2UT Op Odum ap sesto9,, OS FEU OP OSIano uM ap opunut wa ,oSoU ap sest09,, gS SOUIENUOOUD vaso BUM ap OPER OU anb eizip TPN WOA SouRTEIOT oFoTOTG C “atogds0 uns op sorsdgud 7 | { | | i vb [asm ojad opens via op sms optenpest] 950 presmy ssag Susann prea sro waeOH 24 te sed wy 204 SOP are anaung 0 Wen] HEYIUEAN "ROSPOR 9p “ROjOdaUUyHH=LIRD 21'S sotssue sop opoqsop ‘axiourpanafao wpe 16h wapod oye cosets fo anbrod aia8og anb ap olyabe moo ansnjout“uazonb 2 wre}ss9021 fb 0 toa ontupuGa TM tuonynstOS) “afagso ens ap S>PEPI Sep aused zu anb op w24 tp]apor so anb sop zozounixp 26 ep sazod wt ots opyy siznparcer 2s 9 oaaargos ered seosng teyeso0u an ‘mas ndo tiveram problema na hora de voltar @ reconhecé-los entre os outros. A linguagem ~ toda linguagem, qualquer idioma ~ nos permite ter un mundo, mas uma vez adquirido esse mundo ela néo f fecha as contribuigSes de nossos sentidos e muito menos & vonta- de de compreender e nos comunicar com nossos semelhantes. Por isso o que ha de mais humano em um idioma é que o essencial de seus contetidos pode ser traduzido para qualquer outto: no ha que- rer dizer sem querer entender e fazer-se entender. ‘Sem diivida a Linguagem humana também é cercada de enig~ ras... como tudo 0 que nos interessa de verdade! O primeiro deles Ga propria origem da linguagem, Se o que distingue os seres huma- nos é a palavra, como chegamos a obté-la? A linguagem foi inven tada pelos primeiros humanos? Ou entio jé eram humanos desde antes de t8-la, mas humanos sem linguagem, 0 que contradiz tudo ‘0 que sabemnos hoje sobre nossa espécie. Foram primatas pré-huma- nos os inventores da fala? Mas como poderiam esses animais de- senvolver um mundo simbélico 18 tal, faganha que parece requerer 2 gue supomos brotar justamente do in Se € a linguagem que nos fez humanos, os humanos no podem ter jnventado a linguagem... mas é mais incrivel ainda que ela tenha sido inventada por outros animais, ow que nos tenha sido ensinada por extraterrestres chegados ha milénios (como esses extraterres- tes teriam comegado a falar?) ou deuses com gosto pela graméti- ca! O mais sensato ~ embora tanubém no seja muito esclarecedor — 6 supor que tenha ocorrido uma interagio entre comego da lingua- gem e comego da humanidade: alguns gritos semi-animais foram se frensformando em palavras e ao mesmo tempo certos primatas su- ‘periores foram se humanizando cada vez. mais. Uma coisa infhui sobre a outta ¢ vice-versa, No final do séoulo XIX, o grande lin- que houve foram , musicals, (Ue ex agiista Otto Jespersen supés que, no pri cexclamagées emotivas ou talvez. frases Dressavam sentimentos ou anseios coletivos (Jean-lecques Rous- fseau, no século XVIII, jé havia insinuado algo parecido): © passo decisive, segundo Jespersen, foi quando “a comunicaco prevale- ‘cou sobre a exclamagio”. Caberia perguntar: “E como isso aconte~ eu? Pois & justamente isso que gostariamos de saber.” 80 Em todo caso, fica evidente que tinha razio Emst Cassirer ~ ‘outro pensador contemporinneo dos mais notéveis — ao afirmar que “o homem & wm animal simbélico”*. O que é um simbolo? E um signo que representa uma idéia, uma emoso, um desejo, uma for- ma social. E é um signo convencional, combinado por membros da sociedade humana, nao um sinal natural que indica a existéncia de otra coisa, como a fumaga indica onde ha fogo ou as pegadas de ‘uma fera indicam a feta que passou por ali, Nos simbolos os ho- ‘mens entram em acordo para referit-se a alguma coisa ou comuni- car algo, por isso devem ser aprendidos e por isso, também, mudam de um lugar para outro (0 que no acontece com sinais, como a fr ‘maga ou as pegadas). As palavras ou os mimeros so os exemy ta como as outras e, além disso, 0 simbolo dos direitos do povo bas co} a luz verde © a luz vermelha de um seméforo represeatam a au- torizagio pam atravessar a rua ou a ordem de esperar; a falecida Lady Di transformon-se, para muitos, mum simbolo de diversas vir- tudes, etc. Qualquer coisa natural ou artificial poderd ser um sim- bolo se quisermos que o seja, mesmo que néo haja nenhuma co aparente nem semelhanga direta entre o que simboliza material- mente € 0 que é simbolizado: o fato de uma flecha indicar 0 cami- ‘ho a seguir talvez: pudesse ser deduzido por qu esse como as flechas voarn, mas ninguém seré capaz de adivinhar por si sé que o preto & a cor do braneo) ou que “cio”, pécie animal. Os simbolos referem-se apenas indiretamente a reali- dade fisica e, no entanto, apontam diretamente para uma realidade mental, pensada, imaginada, feita de significados ¢ de sentidos, na qual 05 humanos habitamn exclusivamente como humanos ¢ no como primatas mais dotados ou menos dotados. Os mitos, as reli- sides, a ciéncia, a arte, a politica, ahistéria, por certo também a fi- losofia... tudo sio sistemas simbdlicas, baseados no sistema simbé- 8 nope ofc, eB. Cass Trdg paid to cid pelo au: etopologia loi, Fondo de Cat Bown, Meco} 81 88 uasaud S05,09 NO S2408 BY 9510 ‘oSao1oui wm 49s las anb op Digpt 40} soup, Opt, | 010, tun 19 40;QoY a4uD “Zounueny ,,opuaumaodwod,, @ fous pinpuon, aaa vSuacalip pp {souaige anb 0 woo sexo enb op 301 “afinns stow somonsgy 250[0 anb op sz -puny 0 ‘apuaaiduos nnd vysoq wiB0}O72 ¥ ossou woasuowap and soruowundun so 09s st ‘wwpunyuos sow anb souauey ‘sounuuny ‘soy (soase sauas souyno 50 woo opSmundiuoo wa sous ap wa} anb ofad no stow ap way arb ojad apund 9 uawoy Q ZrjopuNApy DIFaP dai ap owstuDuNy Op apopryoutSiuo 0 9 pond} ZootSpa af “$9 08 9s wowoy 0 nyo0 2004 ZU SiOu 0 7 wowoy 0 anb Zp sepOfos optas anB ws goucwny ajoad ~s0 9 oSuaried anb souufo ov dazip auanb onb o caistea anb oyups ued sas ooqup 0 nos ov anb ap vacud v 9 waSenSuy v onb 0g ~-avsuad onb 0 9 opunat o 9 onb o “yinbe sou 3c] SruatuvarToquns souoata anb tt opunue oidord asso 10d os ~rojundiod ostoasd efos samme zaaqen sey “(eOBe OpuD| 3s au 3p ‘rey op oznpap nb o “na outioa oueuanY waqute Bias 01D] 'gOOA 08 -29) somaouiazied afsadse expresso vito v oor{gquaTs reunrue asso 0d sepooojoo sagisanl se apouTUsua:xa Stet SITEIpE SOWIE OA OpEUIanyt No aIaNIAp 0 9 OSUES © 2 $9 19g JENUN|ap WO STOg 108 -nano] outdo twos qe 9p seindyed susso “yonqyRIg ansouTEAIUCD (Lee ND soionaye op ses, UAFUDS;ONES Wy op sowsuas soprano so Rie ,"2isfxo onb vsio0 vorun v 9 ee anb os 7 su ap aap BAIHOOUS as an ‘opased ajozeyoeo 0 utur emg opased vp sgavure ORE 9s OMT ‘oustorstad 0 apod owog jese9s¥ut wp spans aiadjo8 onl san wowoy 0 ag “went : ‘ens vjofoud onb ‘ojreutnorser wioqise “opioatuoasep 08) 4 ‘OATA og ou “ostlows}oaquONe opon We seat ‘ogfoded op seavosyUT nb op stedt ogs ogu “watioy ‘Sioatsta sojetqo so sopay,, :2ptiod “sai quay ‘[euojoer OnE sop OHas yeuNUE Lun ap souade seyEN as op _usode [ep op opbemte0a ¥ Assos aIso a5 OTHOD ODtEIG MOTEYORD O runBasiad sod quyyy ogndes o apuoczdas ogburndin wns ap axquou fopueab “oipaloW WeMORY OP igo 8 YI gop WA squanysia soulapod gs anb o1fna0 opeorgtuBis wun v WiaLaja1 95 SES mab seuparoe & sopeiKa} ais 9 spupyar jediourrd essoU otwOD so] “9094 ‘opiooe uiNytaH 9puO se SojOqLEIS 154 -oasep SouMeuparoe S9Z9Ak Se ap oMtod w ‘opns JOA ap BULLO] ESSOU euruniarep eorjoquas opSourdeum wp ojuoutajoauesep © sy ~"son “opuaide sp souextop wounu anbod ‘seSuetio pues 8 ‘OpOur 01309 Acq “BIOUEISIX® ap opoL ossou sourentiguoo seinBtguoo opt slodap on soyoquips so sopor se0ayu09 wed odurey Conur op sourestoaid anfuod “epeauoqoad stew ouput wioo seeur ud so souzefas osst Jod zonqey,“Saruvyouies sossou ‘soueuy Som, “no sod sopeursu 128 anb way Sou sojoquuis so set — wyjou way ‘vanb “eanronb offs 0 anb ‘oyduraxa sod ~ sowsaui sou sod sepuaide sourapod arth sest vp aseg e uugquIE 9 opSvonpa ep etouyodut sU9SS9 OBDIPUOD BSEON Senay ogs souresiea sven fosst od :soorigqums arose souade ogs ogu ‘soraxto} ovum an “aux ‘owuyy onb ‘epia uudgsd y ‘Wodendurt v9 onb ‘wougy9ox> 40d oy véveis, as impossiveis? Em que a linguagem humana se diferencia das linguagens animais? Uma eas outras so “linguagens” no mes- ‘mo sentido da palavra? Por que 0 que os humanos “querem di mais importante do que o que eles dizer? O que caracteriza a apren- ddizagem da linguagem pelas criancas? Por que somos “animais sim bélicos"? Os simbolos sio.naturais ou convencionais? “palavra” sio a mesma coisa? A linguagem serve para nos expres- sarmos ou para nos comunicarmos? Cada linguagem tent eu rnu~ do préprio, incompreensivel para os outros? Podemos achar que talver todas as realidades que existem no mundo sejam simbolos: Capitulo cinco O universo e seus arredores ‘Ao homem no basta fazer parte da realidade: ele precisa tam- bém saber que esté em um mundo e se pengunta imediatamente como seré esse mundo em que nio sé habita mas do qual também faz parte. Pois em certo sentido esse mundo me pertence (8 mew mundo) mas também eu the pertengo, a espécie humana inteira lhe pertence e brotou dele como qualquer outro de seus componentes. 0 que & um “mundo” Um entomo de sentido, um contexto dentro do qual tudo mantém uma certa relagio e é relevante de modo ex- plicével. Para comesar, a idéia de “mundo” tem varios niveis, des- ‘de o mais préximo e aparentemente trivial até o mais opressivo ¢ cbsmico, No degrau mais baixo esté o que cada um de nés costuma ou seja, 0 Ambito da familia, o grupo de amigos, os lugares de tra- balho e os de diversio, os rinedes que nos so mais usuais ou mais quetidos, o lar. Um degrau acima esté meu ambiente social ¢ cultu- ral, os que sio “como eu”, embora eu mal os conhega ou no os co- nega absolutamente, Continuo subindo ¢ passo @ meu pais, a co- ‘munidade nacional & qual pertengo, a érea internacional na qual mi- gra, inclusive a humanidade cuja condigao © mundo do hamano. Depois ja saio do "0, especificamente humanista e passo & escala planetiria: meu “mundo” é esta Terra na qual nascemos € ‘morremos, o planeta azul de mares e florestas no qual convivemos om tantos outros seres vivos ow inanimados, o que o bom E. T. te- 85

Você também pode gostar