Você está na página 1de 32

58

ARTIGO

Construindo
histórias: cadeia
operatória
e história
de vida dos
machados líticos
amazônicos
Tallyta Suenny Araujo da Silva1
1_Email: tallytasuenny@gmail.com. Trabalho desenvolvido com o apoio do Programa PIBIC/UFPA,
financiado pelo CNPq. Orientado pela Profª Drª Denise P. Schaan
59

Abstract
Resumo Archaeological research carried out ai-
A pesquisa arqueológica realizada teve med to describe and study the stages of the
como objetivo descrever e estudar as etapas production process of  lithic  axes  in the
do processo produtivo de machados líticos Amazon, their typology and spatial distri-
na Amazônia, sua tipologia e distribuição bution.  The choice of the  operational
espacial. A opção pela cadeia operatória chain  approach  to  the study  of technolo-
como abordagem no estudo de tecnologia gy aims to understand the life history of li-
visa compreender a história de vida dos ins- thic instruments intertwined with the his-
trumentos líticos entrelaçada com a história tory of societies that used them. The stone
das sociedades que os utilizaram. As lâmi- axes were obtained at various sites in areas
nas analisadas foram obtidas em vários sí- of current state of Para, in the north/south
tios de áreas no atual Estado do Pará, no direction, near the Tapajos, Curua and Ja-
sentido norte/sul, próximos ao rio Tapajós, manxim river; in the west/east direction,
Jamanxim e Curuá; no sentido oeste/ leste between the Tapajos an Tocantins river; in
entre os rios Tapajós e Tocantins; além de addition to artifacts of the archipelago of
artefatos do arquipélago do Marajó. Marajo.

Palavras-chave: cadeia operatória – Key-words: operational chain – stone


machados líticos - Amazônia axes – Amazon

REVISTA DE ARQUEOLOGIA Volume 25 - N.1: 58-87 - 2012


60

1. Introdução As atividades arqueológicas nessas áreas


A tecnologia, segundo Sinclair (2000: foram coordenadas pela arqueóloga Denise
196), é resultante de gestos técnicos e conhe- Pahl Schaan. As pesquisas nas áreas de estu-
cimentos aprendidos e expressados durante do iniciaram em 2007 e foram finalizadas
práticas sociais. No processo de ação tecno- em 2012.
lógica, os indivíduos negociam e definem
suas identidades, assim a agência tecnológi- 2. Metodologia
ca pode ser comparada com a agência social A proposta metodológica apresentada
(SINCLAIR 2000: 196). Na cultura material aqui se baseia em Bueno (2009) e visa discu-
é possível visualizar o resultado dessa agên- tir dois aspectos principais:
cia, seja na confecção, seja nas marcas de 1 – composição e distribuição dos con-
utilização. Segundo Miller (2007: 4), a análi- juntos de vestígios líticos entre os sítios tra-
se tecnológica deve abranger tanto a produ- balhados em relação à matéria-prima e
ção quanto a organização da produção, pa- principais categorias de vestígio.
drões de consumo, as práticas associadas 2 – o significado da variabilidade relacio-
com a produção e o consumo, o sistema cul- nada às lâminas de machado no que diz res-
tural do processo de produção e o contexto peito à sua forma, processo de produção e
histórico no qual os objetos foram fabrica- re-utilização.
dos e utilizados. Assim, durante o processo de análise, o
O estudo da sequência das etapas de pro- material foi classificado em conjuntos se-
dução dos objetos é denominado na literatu- gundo seu estado tecnológico: machado in-
ra especializada de cadeia operatória (chaîne teiro, reaproveitado, fragmentado, fragmen-
opératoire). Por meio dessa abordagem valo- to de machado e pré-forma. A pré-forma é
riza-se a sequência de etapas de produção de caracterizada como um artefato parcial-
um objeto, considerando-se não só a produ- mente trabalhado, mas com forma final ain-
ção, bem como a organização do processo da inacabada (Kipfer, 2007: p.40).
produtivo e a história de vida dos objetos Para operacionalizar essa análise quanti-
(MILLER 2007: 5). tativa foram formuladas planilhas no Excel
Nesse sentido esta pesquisa objetivou que, além do atributo tecnológico, caracteri-
compreender o processo produtivo das lâ- za as lâminas segundo sua morfologia (com-
minas de machado na Amazônia, sua tipo- primento, largura, espessura, peso, forma da
logia e distribuição espacial. A opção pela lâmina, faces, bordos, talão, bisel, fio do
cadeia operatória como abordagem no estu- gume, modificações para fixação no cabo,
do de tecnologia visa compreender a histó- estado de conservação)
ria de vida dos instrumentos líticos entrela- Em relação às fichas de análise do mate-
çada com a história das sociedades que os rial, a análise do material se baseou na termi-
utilizaram. A amostragem estudada está nologia utilizada por Leroi-Gourhan (1981)
acondicionada no laboratório de arqueolo- e Prous et al. (2002). As fichas de análise fo-
gia da UFPA, sendo proveniente de pesqui- ram feitas em folhas de papel A4, na qual o
sas arqueológicas realizadas no Estado do contorno do artefato lítico foi desenhado,
Pará nos últimos anos, principalmente rela- anotou-se o número de registro, compri-
cionadas com o empreendimento de pavi- mento, largura, espessura e peso de cada
mentação da BR-163 (Cuiabá-Santarém) e peça. No verso da folha as características
BR-230 (Transamazônica). morfo-tecnológicas foram descritas. A op-

Construindo histórias: cadeia operatória e história de vida dos machados líticos amazônicos Tallyta Suenny Araujo da Silva
61

ção por essa metodologia de ficha de análise mentação das rodovias supracitadas, como
visou obter dados sobre os tipos morfológi- parte dos Estudos Básicos Ambientais refe-
cos dos machados em pedra existentes na rentes ao processo de licenciamento do em-
Amazônia juntamente com informações so- preendimento, e em conformidade com o
bre o processo de produção desses artefatos. disposto na Portaria nº 230 do Instituto do
A partir dessas fi-
chas foi possível orga-
nizar os exemplares
em grupos e subgru-
pos, conforme suas
semelhanças morfo-
lógicas, para assim
compor os quadros 6
e 7. Nestes quadros,
uma das lâminas de
cada subgrupo foi se-
lecionada como re-
presentante de sua
categoria. Após este
procedimento, foi
possível analisar a
frequência de cada
tipo de lâmina. Ainda
com esses dados, nos
mapas 3 e 4, verifi-
cou-se a distribuição
espacial dos tipos re-
presentantes nos sí-
tios arqueológicos
sob análise.

3. Área de estudo
O Programa de
Arqueologia nas ro-
dovias BR-163 (Cuia-
bá-Santarém) e BR-
230 (Tansamazônica)
teve como objetivo
realizar um amplo es-
tudo do patrimônio
arqueológico nas áre-
as de influência direta
e indireta do empre-
Mapa 1 - Sítios e municípios BR-163. Tallyta Suenny
endimento de pavi-

REVISTA DE ARQUEOLOGIA Volume 25 - N.1: 58-87 - 2012


62

Patrimônio Histórico e Artístico Nacional este localizado no estado do Mato Grosso


– IPHAN. (Mapa 1). Majoritariamente esse material
As pesquisas foram financiadas pelo lítico foi obtido por meio de doações (ver
DNIT – Departamento Nacional de Infraes- Quadro 3)
trutura de Transportes, através de institui- Em relação à rodovia Transamazônica,
ções parceiras como o CENTRAN, e a BIO- as lâminas analisadas provêem de 51 locali-
RIO, além do o Consórcio Construtor dades (sítios e doações), localizadas nos atu-
BR-163, que contratou a equipe de arqueo- ais municípios de Itaituba, Rurópolis, Pla-
logia, através da Fadesp. cas, Uruará, Medicilândia, Altamira, Vitória
Prospecções e escavações foram realiza- do Xingu, Anapú e Pacajá (Mapa 2). A maior
das em diferentes etapas ao longo das rodo- parte desta coleção foi obtida por coleta de
vias pelo Núcleo de Pesquisa e Ensino em superfície e doações (ver Quadro 3)
Arqueologia da UFPA, sendo coordenadas
pela arqueóloga Denise Pahl Schaan (Scha- 4. Análise quantitativa
an 2012) A coleção estudada representa 344 lâmi-
Na rodovia Cuiabá-Santarém, em 24 lo- nas de machado (Gráfico 1) provenientes
calidades (sítios, ocorrências e doações) fo- dos municípios de Guarantã do Norte (MT),
ram identificados lâminas de machado poli- Castelo de Sonhos, Novo Progresso, Trairão,
das, a maioria em sítios localizados nos Itaituba, Santarém, Belterra, Aveiros, Ruró-
atuais municípios de Trairão, Novo Progres- polis, Placas, Uruará, Medicilândia, Altami-
so, Castelo de Sonhos e Guarantã do Norte, ra, Vitória do Xingu, Anapú, Itupiranga,

Mapa 2 - Sítios e municípios BR-230. Tallyta Suenny

Construindo histórias: cadeia operatória e história de vida dos machados líticos amazônicos Tallyta Suenny Araujo da Silva
63

Pacajá. Em Marajó, as coleções provêem de lâminas. O sítio com maior quantidade de


sítios dos municípios de Cachoeira do Arari, material foi o Boa Vista, com 17 lâminas de
Bagre e Portel. machado. As quatro lâminas analisadas na
O material lítico obtido durante as pes- área do município de Vitória do Xingu vie-
quisas na rodovia Cuiabá-Santarém é com- ram de um único sítio. Seis sítios com 22
posto 66 artefatos provenientes de 24 locali- artefatos analisados estão localizados em
dades diferentes (sítios, ocorrências e Anapú. E as cinco lâminas da área Pacajá fo-
doações). No município de Trairão foram ram coletadas em quatro sítios.
coletadas, ao total, quatro lâminas de três Para a análise desse material, as lâminas
sítios. O material proveniente de Novo Pro- foram classificadas por etapas tecnológicas
gresso soma 54 lâminas, provenientes de 14 da cadeia operatória, correspondendo a 25
localidades. Entre essas, a maior quantidade
foi obtida por doação do Sítio Colorido.
Apenas uma lâmina foi obtida de um sítio
na área do município de Castelo de Sonhos.
Três exemplares foram obtidos de dois sítios
localizados em Guarantã do Norte (MT).
Dois exemplares foram coletados no muni-
cípio de Santarém e de Belterra, sendo cada
lâmina de um sítio diferente.
Em relação ao material proveniente de
sítios na rodovia Transamazônica, foram
obtidas mais lâminas nos sítios localizados
no município de Itaituba. Dessa área, foram
analisados 110 artefatos de 12 sítios diferen-
Gráfico 1 - Total de lâminas por etapa tecnológica
tes. A maior ocorrência de material lítico
ocorreu nos sítios 9ºBEC (Qt.32), Nossa Se- pré-formas, 104 lâminas inteiras, 53 frag-
nhora do Perpétuo Socorro (Qt.19) e Km 30 mentadas, 109 fragmentos e 53 lâminas que
(Qt.17). Em Rurópolis foram identificados tiveram sua matéria-prima reaproveitada.
11 sítios com lâminas de machado, estas to- As lâminas também foram analisadas se-
talizando 62 exemplares. Deste município, o gundo seu comprimento (Gráfico 2), largu-
sítio Serrarias foi o que apresentou maior ra (Gráfico 3), espessura (Gráfico 4) e peso
quantidade de material, com 19 lâminas de (Gráfico 5). Os exemplares com menos de
machado. Em Placas e Uruará apenas en- cinco centímetros representam os fragmen-
controu-se um sítio com material lítico, do tos de lâminas. As lâminas inteiras estão
sítio localizado no primeiro município fo- concentradas no intervalo entre 5cm e
ram analisadas duas lâminas, enquanto o do 10cm. Neste, são observados exemplares
segundo município foi analisada uma lâmi- com todos os tipos de adaptação morfológi-
na. Três sítios com nove artefatos foram ca, não obstante a maioria das lâminas sim-
analisados na área do município de Medici- ples não pertence a este intervalo (Gráfico 6,
lândia, sendo que a maioria é proveniente 7 e 8). Entre os quatro exemplares no inter-
do sítio Horta do Km 89 (Qt.6). O número valo entre 20cm e 30cm, três são lâminas
de sítios e artefatos analisados foi maior no simples.
município de Altamira, com oito sítios e 37 Considerando-se a largura, observa-se

REVISTA DE ARQUEOLOGIA Volume 25 - N.1: 58-87 - 2012


64

que o primeiro intervalo é


formado majoritariamente
por fragmentos, entretan-
to também foram observa-
das 13 lâminas inteiras
neste intervalo. A com me-
nor largura deste conjunto
foi obtida em um sítio lo-
calizado no atual municí-
pio de Itaituba, a mesma
apresenta 6,1cm de com-
primento, 2,9cm de largu-
ra e 0,65cm de espessura, Gráfico 2 – Comprimento de todas as Gráfico 3 – Largura de todas as lâminas
suas faces são côncavo- lâminas

-convexa, tendo como


provável função de goiva.
Também no atributo
largura, a maioria das pe-
ças se concentra no segun-
do intervalo, entre 5cm e
9cm. Para os exemplares
da rodovia Cuiabá-Santa-
rém, neste intervalo estão
localizados majoritaria-
mente as lâminas inteiras,
enquanto no sítios da
Transamazônica, este in-
tervalo é composto predo- Gráfico 4 – Espessura de todas as Gráfico 5 – Peso de todas as lâminas
lâminas
minantemente por frag-
mentos de lâmina.
Igualmente com observado para o compri- mencionada e de fragmentos para a segun-
mento, neste segundo intervalo são obser- da, deve ser relativizada conforme a amos-
vados exemplares com todos os tipos de tragem analisada, visto que predomina as
adaptação morfológica. lâminas inteiras no conjunto analisado
Em relação à espessura, as lâminas mais para a Cuiabá-Santarém, enquanto na
espessas representam lâminas inteiras, Transamazônica destacam-se em quanti-
fragmentos e pré-formas. O intervalo de dade os fragmentos.
maior destaque é o entre 2cm e 3,5cm, Considerando-se o atributo peso, é pos-
onde se localizam, para os sítios da rodo- sível observar que a maioria das lâminas
via Cuiabá-Santarém, majoritariamente está no intervalo entre 100g e 350g, encon-
artefatos inteiros; e para a Transamazôni- tram-se exemplares em todas as etapas tec-
ca, a predominância de fragmentos de lâ- nológicas. A maioria das lâminas inteiras
minas. Entretanto esta frequência de arte- está inclusa nesse intervalo. Os exemplares
fatos inteiros para a primeira rodovia mais pesados são duas lâminas inteiras, uma

Construindo histórias: cadeia operatória e história de vida dos machados líticos amazônicos Tallyta Suenny Araujo da Silva
65

fragmentada no talão e uma pré-forma. cios de produção local de artefatos líticos e/


A lâmina com maior comprimento, lar- ou manutenção. No sítio Porto, em Santa-
gura e peso analisada foi uma grande placa rém, foi encontrado um grande bloco de
polida de superfície irregular, gume lascado matéria-prima fraturado em duas partes e
e função incerta (Figura 2). com marcas de uso em uma das laterais que
pode ter sido transportado de Monte Alegre.
5. Cadeia operatória dos macha- A rocha assemelha-se a um tipo de matéria-
dos líticos amazônicos -prima comum em Monte Alegre e utilizado
5.1 – Fabricação para a produção de utensílios líticos. O blo-
A obtenção de matéria-prima para a fa- co poderia ter sido transportado até o sítio
bricação dos utensílios líticos poderia acon- Porto pelo rio Tapajós (comunicação pesso-
tecer por meio da busca de afloramentos al Márcio Amaral, 2011) e com a rocha bru-
rochosos que apresentassem as característi- ta os artesãos poderiam produzir instru-
cas escolhidas pelos artesões indígenas, ou mentos conforme suas necessidades,
por meio de trocas com outros grupos. atribuindo as características e formas que
A análise da matéria-prima das lâminas preferissem.
de machado está sendo feita em parceria Durante a preparação dos instrumentos,
com o laboratório de geologia da UFPA. Por os ameríndios utilizavam os conhecimentos
isso, no momento, os dados ainda não estão tecnológicos socialmente aprendidos visan-
completos, mas pretende-se futuramente do, por meio de seus gestos, obterem a ferra-
publicar essas análises. menta que desejavam estando, não obstante,
Diferentes tipos de rochas aptas para a sujeitos a respostas imprevistas, necessitan-
produção de lâminas polidas, como grano- do reorganizar suas ações para obter o resul-
dioritos, metabasaltos e gnaisse, foram iden- tado desejado. Todos os artefatos da amos-
tificadas, por meio do mapa geológico do tragem analisados, com exceção das
Pará (CPRM, 2008) nas áreas próximas aos pré-formas, apresentam polimento em dife-
sítios da Transamazônica e Cuiabá-Santa- rentes graus. Assim, provavelmente, passa-
rém. ram pelas etapas de lascamento, picotea-
A única rocha encontrada em Marajó, mento e polimento. A escolha dos percutores
um arenito ferruginoso conhecido como para realizar o picoteamento da pré-forma
grés do Pará, é inadequada para o lascamen- poderia depender da dureza da matéria-pri-
to. Assim, é possível que as lâminas prove- ma que estava sendo trabalhada e precisava
nientes da ilha tenham sido importadas. En- ter uma massa compatível com a da pré for-
tre os 12 exemplares analisados neste con- ma (Souza, 2008: 32). O polimento das lâmi-
junto, foi possível observar em quatro nas ocorre ao friccionar-se o utensílio com
lâminas o tipo de adaptação morfológica outro suporte, que poder se fixo ou móvel,
para preensão ao cabo: três lâminas simples com o auxílio de água, areia ou argila. O po-
e uma com chanfraduras. A maioria dos ar- limento completo dos utensílios é conside-
tefatos provém de sítios localizados no mu- rado uma característica tecnológica das po-
nicípio de Bagre, próximos ao rio Jacundá pulações de agricultores-ceramistas (Costa,
que poderia ser utilizado como uma das vias 2009: 137). As lâminas de gume polido apre-
de transporte e comercialização dos instru- sentam maior resistência que as de gume
mentos líticos e outros tipos de produtos. lascado, em compensação são menos cor-
Em alguns sítios foram observados indí- tantes (Souza, 2008: 35).

REVISTA DE ARQUEOLOGIA Volume 25 - N.1: 58-87 - 2012


66

A presença de polidores e afiadores pró-


ximos dos sítios onde foram encontradas
lâminas de machado é um indício de sua
produção local, ou manutenção do artefato,
que poderia ser reformado depois de des-
gastado. Estes polidores não tiveram suas
formas classificadas e descritas. Objetivou-
-se apenas averiguar sua distribuição espa-
Quadro 1 – Classificação tecnológica por rodovias.
cial nas áreas analisadas.
Polidores e afiadores fixos foram encon-
trados nos municípios de Castelo de So- vez essa possa ser uma estratégia utilizada
nhos, Itaituba, Altamira e Uruará. Em Cas- por alguns grupos indígenas para polir os
telo de sonhos, no rio Curuá, há os sítios artefatos. Rostain & Wack (1987: 118) cogi-
Jazida J-6, Ocorrência 2 e 7 (Schaan 2007). tam sobre a possibilidade de o polimento ter
No município de Itaituba ocorrem os sítios nascido pela observação do polimento natu-
Santo Antônio, no rio homônimo; Ocor- ral de seixos nos rios. Desse modo, é possível
rência Polidor Cupari, no rio Cupari (Scha- que o polimento geral do instrumento lítico
an, 2008); Sítio Igarapé do Veado, no igara- tenha sido realizado por essa técnica, e um
pé homônimo; Sítio Afloramento rochoso; acabamento melhor fosse dado aos utensí-
no rio Tapajós os sítios Pedral Uruá, Pedral
1 da Capelinha, Pedral 2 da Capelinha, Pe-
dral 3 da Capelinha, Pedral do Cabano, Pe-
dral 1 da Ponta do Bahia, Pedral 2 da Ponta
do Bahia e Sítio do Francês (Schaan, Veiga
& Ferreira, 2009). No município de Medici-
lândia estão presentes os sítios PA-PO-15:
Cearense (Schaan, Martins & Santos, 2010)
e a Ocorrência Km 85 (Schaan et al. 2010), Quadro 2 – Classificação tecnológica nos outros
que ficam ao longo da Transamazônica. Em sítios analisados.

Altamira estão os sítios Praia do Pepino,


Santo Expedito e Fazenda Boa Sorte (Scha- lios utilizando os polidores fixos e móveis.
an 2010). No município de Uruará, sítio Ri- Nos sítios localizados ao longo da BR-
beirão Formoso (Schaan 2010). Além dos 163 foram encontradas 66 lâminas de ma-
polidores em afloramentos rochosos, ob- chado e nos sítios da BR-230 249 lâminas de
servou-se no sítio Fazenda DT (Schaan & machado (Quadro 1). Nos sítios da BR-163
Santos, 2009), em Novo Progresso, a exis- predominaram as lâminas inteiras, a maio-
tência de um bloco de rocha utilizado para ria proveniente de doação de moradores.
polimento, cuja forma pode ser classificada Nos sítios da BR-230 predominaram os
como polidor em cúpula (Rostain & Wack, fragmentos de lâmina.
1987; Rostain 1994). Juntamente às lâminas dos sítios relacio-
Nimuendajú (1952: 216) relata que uma nadas às rodovias, foram analisados conjun-
grande quantidade de pequenos blocos de tos líticos de sítios em Marajó e do sítio Pa-
pedra foi encontrada sobre lajes de cachoei- raná do Arauepá, localizado no município
ras no médio rio Xingú e no baixo Iriri. Tal- de Aveiros (Quadro 2).

Construindo histórias: cadeia operatória e história de vida dos machados líticos amazônicos Tallyta Suenny Araujo da Silva
67

5.2 – Design taram ao fabricar seus instrumentos e po-


A coleção analisada apresenta grande va- dem estar relacionadas a funções distintas, a
riabilidade morfológica (Quadro 4 e 5). Essa opções estéticas e a fatores sociais, políticos
variedade de formas exemplifica as diferen- e/ou culturais (Bueno, 2007a; Bueno,
tes escolhas que os artesãos ameríndios op- 2007b). Algumas formas são recorrentes em
áreas específicas, sendo encontrados
em sítios próximos (Mapa 1 e 2).
Observa-se que independente do
tipo de lâmina e da adaptação morfo-
lógica, o comprimento mínimo das
peças inteiras não é inferior a 5 cm e a
maior peça tem menos do que 30 cm
(Gráficos 6, 7 e 8). A predominância
de lâminas de dimensões parecidas
pode estar relacionada a tamanhos
adequados para a função para qual o
Gráfico 6 - Relação comprimento x largura lâminas da BR-
163. Adaptações morfológicas azul: reentrâncias; vermelho:
objeto era destinado.
simples; verde: ombros/orelhas. Nos sítios de Novo Progresso, fo-
ram observados quatro exemplares
entre 5 e 7 cm, sendo que os dois me-
nores (5,5 cm e 5,9 cm de compri-
mento), por apresentarem dissime-
tria na forma podem ter sido
fabricadas por crianças (Comunica-
ção pessoal de S. Rostain a Prous
1991: 468).
Em relação aos exemplares de sí-
tios na Transamazônica, as lâminas
com menos de cinco centímetro de
Gráfico 7 - Relação comprimento x largura lâminas de sítios
em Itaituba e Rurópolis. Adaptações morfológicas losango: largura e entre 6,6 e 7,6 de compri-
reentrâncias; triângulo: simples. mento estão, em sua maioria, classifi-
cadas no subgrupo Am (Quadro 5).
As lâminas com reentrâncias predo-
minam entre 7,0 e 13,95 cm de com-
primento e 4,6 e 7,75 cm de largura,
classificadas nos subgrupos Aa, Af,
Ah e Ai (Quadro 5).
As lâminas com ombros/orelhas
da Transamazônica estão concentra-
das entre 5,5 cm e 8,7 cm de compri-
mento e com largura variando entre
Gráfico 8 - Relação comprimento x largura lâminas de sítios 6,45 e 9,3 cm e são provenientes de
em Altamira, Vitória do Xingu, Anapú, Pacajá. Adaptações sítios diferentes: Altamira, Anapú,
morfológicas, quadrado: ombros/orelhas; triângulo: simples.
Placas, Pacajá e Vitória do Xingu.

REVISTA DE ARQUEOLOGIA Volume 25 - N.1: 58-87 - 2012


68

Em relação aos sítios da BR-163 (Quadro de, com dois sulcos em um dos bordos e
4), observa-se que a amostragem do muni- apenas um sulco no outro (Figura 1).
O material de
Guarantã do Norte é
composto por três lâ-
minas: (I) uma lâmina
de forma trapezoidal,
com faces planas, bor-
dos de eixos divergen-
tes e sinuosos (tipo
Ba); (II) uma orelhas
pouco proeminentes,
comprida, faces pla-
no-convexa e talão
truncado (subgrupo
Cc); (III) e uma lâmi-
na comprida, faces
planas, talão trunca-
Figura 1 - Lâminas com sulcos duplos (1) Doação Sítio Colorido, Novo Progresso;
(2) Água azul, Rurópolis. Desenho Rui Coelho & Joanna Troufflard do, com 22,4cm de
comprimento e 6,4cm
cípio de Novo Progresso apresenta grande de largura, provavelmente utilizada como pi-
variabilidade de formas. As lâminas com careta do tipo Da.
chanfraduras predominam, variando em No município de Trairão há duas lâmi-
comprimento, largura, posição e dimensões nas com chanfraduras: (I) uma do tipo Ad;
da adaptação morfológica (todos os tipos formado por exemplares compridos com
A). Há também lâminas simples (tipo Da, forma elipsoidal ou trapezoidal e talão trun-
Db, Dd, De, Df), lâminas com orelhas (tipo cado (II) e uma do subgrupo Ag, caracteri-
Ca, Cb) e lâminas com uma forma diferente zado por lâminas compridas, mas largas,
que parece associar garganta com ombros predominantemente com faces plano-con-
(tipo Bc) e chanfraduras com ombros (tipo vexa e talão arredondado. Neste município
Bb). Esse último exemplar, entretanto apre- também há dois fragmentos de lâmina que
senta assimetria no talão e nas faces com não foi possível classificar em um dos tipos
diferenças de espessura, podendo ter sido morfológicos.
fabricado por crianças. Outra lâmina tam- No município de Castelo de Sonhos, só
bém assimétrica é a tipo Ah, que apresenta foi analisada uma lâmina de machado, sem
polimento desgastado e várias marcas em adaptações morfológicas, faces plano-con-
suas faces. vexa, e gume estreito (tipo Dc). Entretanto,
Em alguns fragmentos e lâminas frag- a coleção particular do Banco Santos apre-
mentadas de Novo Progresso foi possível senta grande variedade de lâminas de ma-
verificar o tipo de adaptação morfológica: chado. Uma dessas lâminas apresenta três
quatro fragmentos apresentam chanfradu- chanfraduras, semelhante ao fragmento de
ras e uma lâmina fragmentada foi incluída lâmina de Novo Progresso da figura 1.
no tipo Bc. Um desses fragmentos com Lâminas com essas características tam-
chanfraduras apresenta uma particularida- bém foram observadas em Belterra (Labora-

Construindo histórias: cadeia operatória e história de vida dos machados líticos amazônicos Tallyta Suenny Araujo da Silva
69

tório Curt Nimuendajú, Santarém), no rio Mataroni, Guiana Francesa (Rostain &
Mataroni, Guiana Francesa (Rostain & Wack, 1987).
Wack, 1987) e no rio Maroni, Suriname A partir da análise de lâminas líticas pro-
(Boomert, 1979). No sítio Água azul (Figura venientes de sítios localizados ao longo da
1), há um fragmento de lâmina com apenas rodovia Transamazônica foi observada a
um dos bordos com a presença de dois sul- distribuição espacial da forma das lâminas e
cos, não sendo possível saber se o outro bor- a predominância de tipos com as mesmas
do tinha uma ou duas reentrâncias. adaptações morfológicas em sítios próxi-
Devido a morfologia particular desse mos, além da ocorrência de sítios com a pre-
tipo de lâmina foram levantadas hipóteses sença de diferentes tipos de adaptações.
para a sua distribuição que poderiam ser de- Na área entre os municípios de Itaituba e
corrência de circulação comercial, cultural Rurópolis predominaram as lâminas com re-
de indivíduos e/ou idéias. Comércios, e con- entrâncias (grupo A), mas com ocorrência
tatos entre grupos localizados a longas dis- de exemplares com orelhas (grupo B). As lâ-
tâncias já foram relatados na região Amazô- minas com orelhas somente são encontradas
nica, a exemplo dos muiraquitãs (Boomert, em sítios localizados do atual município de
1987). Assim as sociedades localizadas nes- Rurópolis (sítio Serra Anapuru e Panorama).
sas áreas com presença de machados com O sítio Panorama localiza-se mais distante
chanfraduras poderiam tanto estar direta- dos outros sítios identificados neste municí-
mente interligadas quanto indiretamente, pio nos quais há a predominância de lâminas
em caso a semelhança da forma ser decor- com reentrâncias. Enquanto o sítio Serra
rente da réplica de um objeto visto. Entre- Anapuru é o primeiro na sequência dos sí-
tanto ainda são necessários mais estudos, a tios identificados em Rurópolis, estando pró-
fim de melhor caracterizar conjuntamente ximo dos outros com afiliação morfológica
todas as informações sobre os grupos cultu- predominante das lâminas do grupo A.
rais que se localizavam nas áreas de distri- Entre as lâminas com reentrâncias, ob-
buição desse tipo de lâmina de machado. servou-se nos sítios de Itaituba os seguintes
Nessa coleção também havia um macha- subgrupos: (I) sete artefatos do subgrupo
do com talão de forma semelhante a um Aa, que se caracteriza por lâminas pequenas
rabo de peixe, e uma lâmina fragmentada de forma retangular larga ou elipsoidal, com
comprida, tipo observado também em Novo as faces predominante convexas e talão arre-
Progresso e Guarantã do Norte, classificado dondado ou truncado, o comprimento va-
na bibliografia arqueológica como “picareta” riando entre 7cm e 9cm; (II) uma lâmina de
(Prous et al., 2002: 191). Outra forma inte- forma retangular, faces covexas, gume es-
ressante observada nessa coleção é um ma- treito e talão com suportes (tipo Ac); (III)
chado de gume estendido e forma meso- uma retangular comprida e estreita, com
-proximal trapezoidal. Um exemplar faces plano-convexa e talão truncado (tipo
relativamente parecido, mas de dimensões Ad); (IV) uma retangular comprida e estrei-
menores, foi observado no município de ta, com chanfraduras dupla e faces convexas
Guarantã do Norte (tipo Ba, Quadro 4), e no (tipo Ae); (V) cinco do subgrupo Af, que se
rio Cuiuni, Guiana (Boomert, 1979). Há caracteriza por lâminas retangulares com
ainda exemplares de gume estendido, mas largura aproximada ao comprimento, com
com a região meso-proximal retangular em faces predominantemente convexas e talão
Novo Progresso (tipo Aa, Quadro 4) e no rio arredondado; (VI) três do subgrupo Ag,

REVISTA DE ARQUEOLOGIA Volume 25 - N.1: 58-87 - 2012


70

composto por lâminas pequenas de forma pela forma retangular, largura aproximada
elipsoidal, talão arredondado, faces e bordos ao comprimento, não obstante com com-
convexos; (VII) cinco do subgrupo Ah, for- primento maior, as faces são planas, ou
mado por exemplares de morfologia retan- plano-convexa, bordos de eixos paralelos,
gular, de comprimento superior a largura, retilíneos ou convexos (IV) uma do tipo
com faces predominantemente convexas e Ch, que é formado por lâminas compridas,
talão em sua maioria convexos, alguns assi- elipsoidais, talão arredondado e bordos de
métricos, comprimento variando entre eixos paralelos e convexos. Os fragmentos e
9,1cm e 11,5cm; (VIII) uma do subgrupo Ai, lâminas fragmentadas também apresentam
que é formado predominantemente por lâ- a predominância das chanfraduras, totali-
minas elipsoidais, com comprimento maior zando 31.
que largura, prevalecendo as faces convexas Em Rurópolis, para as lâminas com reen-
e talão arredondado, com comprimento mí- trâncias ocorre: (I) uma lâminas do tipo Aa,
nimo de 11,9cm e máximo de 13,95cm; (IX) formado por lâminas pequenas de forma
uma do subgrupo Aj, formado por lâminas retangular larga ou elipsoidal, com as faces
retangulares, compridas, de bordos comu- predominante convexas e talão arredonda-
mente de eixos levemente divergentes, faces do ou truncado, com comprimento mínimo
convexas e talão truncado; (X) uma de for- de 7cm e máximo de 9cm; (II) três do sub-
ma retangular, bordos de eixos paralelos e grupo Ab, abrangendo exemplares de mor-
convexos, faces côncavo-convexa e talão fologia elipsoidal, bordos de eixos convexos,
truncado (subgrupo Al); (XI) uma do sub- paralelos ou convergentes e talão arredon-
grupo Am, caracterizado por lâminas pe- dado; (III) quatro do tipo Af, caracterizado
quenas com largura aproximada do compri- por lâminas retangulares com largura apro-
mento, as faces são convexas, talão ximada ao comprimento, faces predomi-
arredondado ou truncado e bordos de eixos nantemente convexas e talão arredondado;
convexos; (XII) duas do subgrupo An, for- (IV) uma do subgrupo Ah, formado por
mado também por lâminas pequenas, não exemplares de morfologia retangular, de
obstante, mais compridas que largas, bordos comprimento superior a largura, com faces
de eixos paralelos, retilíneos ou convexos, predominantemente convexas e talão em
predominando o talão e as faces convexas; sua maioria convexos, alguns assimétricos,
(XIII) uma do subgrupo Ap, representado comprimento mínimo de 9,1cm e máximo
por lâminas grandes de bordos de eixos con- de 11,5cm; (V) sete do subgrupo Ai, com-
vexos, paralelos ou convergentes no sentido posto predominantemente por lâminas elip-
do talão, as faces convexas e talão arredon- soidais, com comprimento maior que largu-
dado ou truncado. ra, prevalecendo as faces convexas e talão
As lâminas simples são: (I) uma do sub- arredondado, o comprimento varia entre
grupo Cb, que possui predominante morfo- 11,9cm e 13,95cm; (VI) uma do tipo Aj,
logia elipsoidal, com bordos de eixos conve- apresentando lâminas de morfologia retan-
xos, paralelos ou convergentes, prevalecendo gular, compridas, de bordos comumente de
faces convexas e o talão arredondado; (II) eixos levemente divergentes, faces convexas
uma do tipo Cc, com lâminas retangulares e talão truncado; (VII) uma lâmina grande
largas, com bordos de eixos convexos e pa- retangular com 15,5cm de comprimento e
ralelos, talão arredondado e faces convexas 11,2 cm de largura, bordos paralelos e con-
(III) duas do subgrupo Cf, caracterizado vexos, talão arredondado e faces convexas

Construindo histórias: cadeia operatória e história de vida dos machados líticos amazônicos Tallyta Suenny Araujo da Silva
71

(subgrupo Ak); (VIII) quatro do tipo Ao, com orelhas não muito proeminentes, talão
subgrupo formado predominantemente por truncado ou arredondado e faces predomi-
lâminas elipsoidais, com comprimento su- nantemente convexas; (II) e um fragmento
perior a largura, talão truncado ou arredon- de machado proximal que não foi possível
dado e bordos convexos; (IX) duas do Ap, identificar o tipo de adaptação morfológica.
composto por lâminas grandes de bordos de Em Uruará, somente uma lâmina fragmen-
eixos convexos, paralelos ou convergentes tada foi analisada, sendo classificada no tipo
no sentido do talão, as faces convexas e talão Bf, que é formado por lâminas grandes, de
arredondado ou truncado. talão truncado e faces convexas, os dois
Os exemplares com orelhas são: (I) uma exemplares que formam este subgrupo estão
lâmina fragmentada no gume, com talão fragmentados no gume.
truncado, forma trapezoidal e faces conve- No município de Medicilândia, as sete
xas (subgrupo Bb), obtida por doação no lâminas inteiras e fragmentadas analisadas
sítio Serra Anapuru; (II) e um fragmento de são todas simples. Entre estas: (I) uma é do
lâmina não possível de classificar em um tipo Ca, caracterizado por lâminas peque-
subgrupo, encontrado em superfície, no sí- nas, largas, trapezoidais, talão arredondado,
tio Panorama. Apenas uma lâmina inteira quase todas com faces convexas; (II) uma do
simples de morfologia elipsoidal, faces con- subgrupo Cb, composto predominante por
vexas e talão arredondado (tipo Ci) foi iden- exemplares de morfologia elipsoidal, com
tificada no sítio Piquizeiro. Entre os frag- bordos de eixos convexos, paralelos ou con-
mentos e lâminas fragmentadas foram vergentes, prevalecendo faces convexas e o
observados 16 exemplares com chanfradu- talão arredondado; (III) e três do tipo Cd,
ras e um fragmento apresenta garganta. formado por lâminas compridas, elipsoi-
No sítio Paraná do Arauepá, em Aveiros, dais, de bordos convergentes e convexos e
foram analisadas apenas lâminas com adap- talão arredondado.
tações morfológicas do tipo chanfraduras: Na área entre os municípios de Altamira
(I) duas do subgrupo Aa, composto por lâ- e Pacajá predominam as lâminas com om-
minas pequenas de forma retangular larga bros/orelhas, e a ocorrência de fragmentos
ou elipsoidal, com as faces predominante com reentrâncias.
convexas e talão arredondado ou truncado, Em Altamira, foram observadas lâminas
com comprimento mínimo de 7cm e máxi- simples (grupo C) e com ombros/orelhas
mo de 9cm; (II) e uma do tipo Af, , que apre- (grupo B), com predominância na última
senta lâminas retangulares com largura categoria: (I) três lâminas foram classifica-
aproximada ao comprimento, faces predo- das no tipo Ba, composto por exemplares
minantemente convexas e talão arredonda- com orelhas não muito proeminentes, talão
do. Uma lâmina fragmentada no gume, de truncado ou arredondado e faces predomi-
forma elipsoidal com faces convexas, bordos nantemente convexas; (II) uma no subgrupo
convergentes e convexos e talão arredonda- Bb, formado por exemplares com orelhas
do (tipo Ah) apresenta garganta. mais proeminentes, forma trapezoidal, faces
Os exemplares em sítios entre Placas e convexas e talão truncado; (III) uma lâmina
Uruará têm como adaptações orelhas/om- com talão arredondado, orelhas não muito
bros. No município de Placas foram analisa- proeminentes, faces côncavo-convexa (tipo
dos dois artefatos: (I) uma lâmina com ore- Bc); (IV) uma com faces planas, talão trun-
lhas do tipo Ba, caracterizado por exemplares cado e orelhas pouco proeminentes (sub-

REVISTA DE ARQUEOLOGIA Volume 25 - N.1: 58-87 - 2012


72

grupo Bd); (V) e uma no Bg,


formado por lâminas peque-
nas, largas, faces predomi-
nantemente convexas e talão
truncado.
Entre os machados sim-
ples: (I) um é do subgrupo
Ca, formado por lâminas pe-
quenas, largas, trapezoidais,
talão arredondado, quase to-
das com faces convexas; (II)
dois do Cb, constituído pre-
dominante por exemplares de
morfologia elipsoidal, com
bordos de eixos convexos, pa-
ralelos ou convergentes, pre-
valecendo faces convexas e o
talão arredondado; (III) um
do Cc, com lâminas retangu-
lares largas, com bordos de
eixos convexos e paralelos,
talão arredondado e faces
convexas; (IV) e uma lâmina
Cf, caracterizado por exem-
plares de forma retangular,
largura aproximada ao com-
primento, não obstante com
comprimento maior, as faces
são planas, ou plano-convexa,
bordos de eixos paralelos, re-
tilíneos ou convexos.
No município de Vitória Mapa 3 - Categoria de artefato e design de lâminas em sítios de Trairão, Novo
do Xingu, uma lâmina inteira Progresso, Castelo de Sonhos e Guarantã do Norte. Tallyta Suenny

e uma fragmentada foram


classificadas no tipo Bg, for- caracterizado por lâminas pequenas, largas,
mado por lâminas pequenas, largas, com faces predominantemente convexas e talão
faces predominantemente convexas e talão truncado; e uma lâmina simples, comprida,
truncado. Não foi possível classificar dois talão arredondado, bordos paralelos e con-
fragmentos de machado nos grupos de vexos, faces plano-convexa (tipo Cj). Há
adaptações morfológicas. seis fragmentos que apresentam orelhas, um
Em Anapú, há uma lâmina pequena com simples, um com chanfradura e um com
4cm de comprimento e 4,5 de largura, fratu- garganta.
rada no gume, com faces convexas e talão No município de Pacajá há uma lâmina
truncado (tipo Be); duas do subgrupo Bg, pequena, com orelhas pouco proeminen-

Construindo histórias: cadeia operatória e história de vida dos machados líticos amazônicos Tallyta Suenny Araujo da Silva
73

Mapa 4 – Categoria de artefato e design de lâminas na BR-230 . Tallyta Suenny

tes, faces planas, talão truncado, medindo primeiro agrupamento refere-se aos sítios
4,5cm de comprimento e 3,1cm de largura localizados entre os municípios de Itaituba e
(tipo Be); um exemplar do subgrupo Bf, ca- Rurópolis, nos quais predominam as lâmi-
racterizado por lâminas grandes, de talão nas com reentrâncias; o segundo diz respei-
truncado e faces convexas; uma lâminado to aos sítios localizados entre Altamira e
Bg, formado por lâminas pequenas, largas, Pacajá, onde há mais exemplares com om-
faces predominantemente convexas e talão bros/orelhas.
trunca; e uma lâmina grande de forma elip- 3.3 – Encabamento:
soidal, com faces convexas, talão arredon- A equipe do Núcleo de Arqueologia da
dado, bordos de eixos paralelos e convexos Universidade Federal do Pará não encon-
(tipo Ck). trou durante a pesquisa machados líticos
No Marajó foram identificadas três lâmi- encabados, entretanto encontram-se refe-
nas simples e uma com chanfraduras. rências na bibliografia acadêmica sobre
Resumidamente, para os sítios localiza- achados amazônicos de cabos associados
dos ao longo da rodovia Transamazônica às lâminas (Rostain & Wack, 1987; Ros-
foram observadas duas concentrações de tain, 1986-1990; Rostain, 1991; Rostain,
tipos de adaptação morfológica, que podem 1994; Versteeg & Rostain, 1999) além de
ser consequência de afiliação cultural, visto relatos históricos de viajantes e pesquisa-
que igualmente o material cerâmico presen- dores que percorreram pela Amazônia
te nesses sítios também apresentam seme- (Coudreau, 1897; Nimuendajú, 1948; Stra-
lhanças entre si (MARTINS, 2010; 2012). O delli, 1929).

REVISTA DE ARQUEOLOGIA Volume 25 - N.1: 58-87 - 2012


74

As diferentes formas de preensão dos utilizar os diferentes tipos de encabamento


machados ao cabo também foram analisa- citados para fizarem suas lâminas.
das por vários autores (Souza, 2008; Prous et As lâminas simples e com garganta por
al., 2002; Rostain & Wack, 1987; Rostain, encabamento embutido. Poucos foram os
1986-1990; Rostain, 1991; Rostain, 1994; exemplares analisados com adaptação mor-
Versteeg & Rostain, 1999). Observou-se que fológica do tipo garganta. Nos sítios Paraná
o tipo de encabamento também está relacio- do Arauepá (Aveiros), Nossa Senhora do
nado com a função do utensílio lítico (Sou- Perpétuo Socorro (Itaituba), Serra Anapuru
za, 2008; Prous et al., 2002). (Rurópolis) e Fazenda Canadá (Anapú) fo-
Os exemplares analisados evidenciaram ram encontrados apenas um exemplar.
formas variadas e diferentes adaptações Como afirmado anteriormente e demons-
morfológicas nas regiões mesial ou proxi- trado no Mapa 4, a presença de lâminas com
mal das lâminas que podem estar relaciona- reentrâncias (chanfraduras e garganta) é ex-
das com distintas maneiras de fixação da ceção nos sítios entre Altamira e Pacajás,
lâmina. Foram considerados na classificação somente aparecendo em sítios de Anapú
as lâminas inteiras, fragmentadas e frag- (além do Fazenda Canadá, o sítio Tabocão),
mentos. Entretanto, há fragmentos de lâmi- todos sendo fragmentos meso-proximais.
nas que não foi possível classificar em uma Enquanto as lâminas simples aparecem em
dessas categorias devido à ausência da parte menor quantidade em sítios dos dois con-
mesial ou proximal. juntos observados. A presença deste tipo de
As características da lâmina (tratamento lâmina somente é predominante nos sítios
de superfície alisado ou picoteado, faces, de Medicilândia.
adaptação morfológica, forma do talão) po-
dem influenciar em graus diferentes a forma 3.4 – Utilização:
de encabamento. A combinação desses atri- As lâminas de machado poderiam ser
butos pode indicar o tipo de preensão das empregadas em diferentes tarefas relaciona-
lâminas. das com a agricultura, marcenaria, colheita
As lâminas com ombros, orelhas ou de mel, retirada de palmito, etc. Além das
com a parte proximal larga seriam fixadas funções práticas também poderiam ter sig-
por encabamento cimentado. Consideran- nificados simbólicos e cerimoniais (Phili-
do a distribuição espacial das lâminas ana- pps, 1979; Rostain, 1994; Versteeg & Ros-
lisadas, este tipo de encabamento deveria tain, 1999; Souza, 2008). A maior parte da
ser mais utilizado nos sítios localizados amostragem analisada apresenta algum tipo
entre os rios Xingu e Tocantins (do atual de desgaste nos bordos, faces, gume e talão,
município de Altamira ao município de que pode estar relacionado ao uso do uten-
Pacajá) sílio. As lâminas podem ter sido utilizadas
As lâminas com sulcos e entalhes por en- para o corte de árvores de diferentes portes,
cabamento justaposto, cimentado, ou embu- confecção de instrumentos em madeira,
tido com auxílio de ligaduras e/ou matérias construção de canoas, abertura de troncos
adesivas. Assim, considerando que as lâmi- caídos para coleta de larvas de insetos, reti-
nas com sulcos e entalhes estão concentra- rada de palmito e coleta de mel (Philipps,
das em sítios entre os atuais municípios de 1979; Rostain, 1994; Versteeg & Rostain,
Itatituba e Rurópolis, infere-se as popula- 1999; Souza, 2008). As diferenças de dimen-
ções que habitaram essa região poderiam sões e pesos podem significar usos distintos.

Construindo histórias: cadeia operatória e história de vida dos machados líticos amazônicos Tallyta Suenny Araujo da Silva
75

As lâminas menores e mais leves podem ter Uma grande placa lítica polida do sítio
sido utilizadas para carpintaria de madeiras Vale do Aruri pode ter sido utilizada como
mais leves, para retirada do palmito, en- uma pá (Figura 2). Uma lâmina do Marajó
quanto as madeiras mais duras exigiriam apresenta desgaste no talão e no gume, pro-
lâminas mais pesadas e resistentes. vavelmente utilizada como cunha (comuni-
Na amostragem analisada observaram-se cação pessoal Ângelo Lima). Este exemplar
exemplares que devido a sua forma peculiar também foi reaproveitado para outra fun-
ou marcas de desgaste tiveram funções dis- ção, talvez como um quebra-coquinho, de-
tintas dos machados. Para a maioria das lâ- vido às depressões esféricas nas laterais da
minas não foi possível inferir exatamente a face superior e na face inferior.
função para a qual foram utilizadas. Os cri- Nos relatos antigos observam-se men-
térios utilizados para a classificação se base- ções às técnicas utilizadas pelos indígenas
aram em Prous et al. (2002) na derrubada das árvores antes da introdu-
Observando o perfil do gume das lâmi- ção dos machados de ferro pelos europeus.
nas é provável que algumas delas tenham João Daniel (2004), padre da Companhia de
sido utilizadas como enxó, os mesmos tam- Jesus, compara as técnicas de derrubada das
bém apresentam grande desgaste no talão, o árvores utilizadas por índios “do mato” e ín-
que pode indicar o seu uso em atividades de dios “domésticos”. Estes cortavam a madei-
percussão indireta, como na criação ou lim- ra, punham fogo e como nem todos os tron-
peza de cavidades estreitas. cos queimavam reuniam a madeira e
Duas lâminas compridas encontradas queimavam novamente. Os índios não alde-
no município de Novo Progresso e Guarantã ados limpavam a vegetação rasteira, utiliza-
do Norte podem ter sido utilizadas como vam os machados líticos para ferir a árvore
picaretas (Prous et al., 2002). Estes exempla- em seu diâmetro a fim de impedir a circula-
res são compridos e estreitos, sendo descri- ção de seiva – segundo o religioso o macha-
tos como o tipo Da, no Quadro 4 do de pedra mais amassava a madeira do
Em Altamira e Itaituba duas lâminas de que cortava. Assim, após algum tempo a ár-
faces côncavo-convexas podem ter sido uti- vore secava parcialmente e depois se utiliza-
lizadas como goivas. Além da semelhança va fogo para queimá-la. Para o jesuíta a téc-
em relação a concavidade das faces, ambas nica dos índios “do mato” era mais eficiente,
apresentam desgaste similar na face côncava pois exigia menos esforço, a limpeza da área
em forma de ranhuras longitudinais. acontecia mais rápida, visto que só era ne-
cessário limpar a vegetação rasteira, necessi-
tando assim de menor mão-de-obra. Daniel
afirma que uma única pessoa em um dia
poderia realizar a limpeza de um espaço e
que em poucos dias muita mata poderia ser
limpa. Afirma que se os brancos e índios do-
mesticados utilizassem o mesmo método
fariam o processo ainda mais rápido visto
que os índios “do mato” utilizavam como
instrumentos os machados de pedra para
Figura 2 - Lâmina de função incerta. Foto Tallyta Suenny
esmagar a casca da árvore e de paus para
quebrar a golpes os arbustos (2004: 155, v.2).

REVISTA DE ARQUEOLOGIA Volume 25 - N.1: 58-87 - 2012


76

Apesar dos possíveis exageros, observa-se Como matéria-prima para a fabricação


que a técnica empregada por esses grupos de instrumentos, há ainda relatos de que os
indígenas aparentemente era eficiente. machados também poderiam ser fabricados
Outra observação nos é dada por Erma- a partir dos cascos de tartaruga (Acuña,
no Stradelli (1929), que relata sua experiên- 1641; Daniel, 2004), material que também
cia no alto Uaupés, onde presenciou a der- poderia ser utilizado para produzir enxós
rubada de árvores. Também por meio da (Acuña, 1641). Outros materiais utilizados
associação do machado de pedra e do fogo, para produzir instrumentos foram os ossos,
a derrubada das árvores era realizada da se- a exemplo de goivas (Soares & Ferrão, 2005:
guinte forma: utilizava-se o machado lítico 164).
para machucar a casca da árvore em todo o
seu diâmetro. Após alguns dias essa ferida 3.5 – Reciclagem:
ressecava e reunindo-se o mato seco ao re- Andrefsky (2009) ressalta o aspecto di-
dor da árvore punha-se fogo. Quando este nâmico dos instrumentos líticos que sofrem
apagava a madeira carbonizada era retirada diferentes modificações morfológicas ao
com o machado e o processo era repetido longo de sua história de vida conforme as
até a árvore ser derrubada. Aparentemente a necessidades dos indivíduos que manipu-
técnica presenciada por Stradelli é diferente lam os objetos. Os instrumentos podem ter
da vista por João Daniel, visto que este não seu gume reavivado para prolongar a utili-
relata sobre esse processo de queima, corta e zação até que suas dimensões reduzam a
queima, que derrubava a árvore aos poucos. ponto de torná-lo inutilizável. Ademais, ain-
Entretanto, Souza (2008: 22) acredita que da que o utensílio quebre a sua matéria-pri-
essa técnica deveria ser utilizada para derru- ma pode ser reaproveitada para a confecção
bar árvores de grandes dimensões, enquan- de outros objetos.
to as menores deveriam ser derrubadas so- Nos sítios da Cuiabá-Santarém foram
mente com a utilização dos machados. A observados dois exemplares que aparente-
utilização de métodos distintos para a der- mente sofreram reaproveitamento: um em
rubada da floresta também é citada na bi- Novo Progresso e outro em Santarém. Am-
bliografia arqueológica (Rostain & Wack, bos são “lâminas-núcleo”: fragmentos me-
1987; Rostain, 1986-1990; Rostain, 1994). so-proximais polidos com marcas de retira-
Emílio Goeldi relata a mesma técnica da. O exemplar de Novo Progresso
vista por Stradelli. Os indígenas do alto apresenta ombros, enquanto o de Santarém
Amazonas retiravam a casca e córtice, até a era uma lâmina simples. Há ainda uma lâ-
entrecasca da árvore com o machado lítico, mina com orelhas que pode ter sido reutili-
esperava-se a área secar e colocava-se fogo zada como martelo ou ter sido confecciona-
auxiliado com uma semente de palmeira da para ser um martelo (comunicação
como combustível. O processo era realizado pessoal Ângelo Lima).
no período em que as árvores estavam com Nos sítios da Transamazônica foram ob-
bastante seiva e a altura do anel localizava-se servados 46 exemplares que aparentemente
pouco acima do solo. Segundo Goeldi, a tiveram sua matéria-prima reaproveitada:
operação durava alguns dias até a árvore ser um em Altamira, dois em Anapú, 27 em
derrubada. A partir desta constatação, Goel- Itaituba, um em Medicilândia e 15 em Ruró-
di afirma que os machados líticos funciona- polis. Os sítios Alvorada (Itaituba), 9º BEC
vam mais para esmagar do que para cortar. (Itaituba) e Serrarias (Rurópolis) foram os

Construindo histórias: cadeia operatória e história de vida dos machados líticos amazônicos Tallyta Suenny Araujo da Silva
77

que mais apresentaram exemplares com in- que a maioria das lâminas inteiras é prove-
dícios de reciclagem. niente de doações.
No sítio Alvorada foram identificados No sítio Nossa Senhora do Perpétuo So-
oito fragmentos com uma ou ambas as faces corro foi encontrado uma lâmina de macha-
polidas provenientes do mesmo nível, um do associada a uma possível urna podendo,
deles aparenta ter sido retocado; outro frag- assim, ser uma oferenda funerária. Próximo a
mento está completamente lascado, conser- está urna estava outro vasilhame grande, tam-
vando apenas uma chanfradura polida; um bém inferido como possível urna, e um vasi-
fragmento apresenta ambas as faces polidas, lhame pequeno, que poderia ser um acompa-
apenas um bordo e marcas de retiradas; e nhamento funerário. Neste sítio foram
um fragmento apresenta apenas uma das fa- encontradas várias vasilhas associadas, em
ces polidas junto com pequena parte das la- algumas delas foi possível observar a presença
terais, a outra face está lascada. de material ósseo durante as escavações.
No sítio 9º BEC foram identificadas qua- O acervo proveniente de sítios da BR-163
tro lascas polidas; dois fragmentos com ape- foi em sua maioria obtido por doação, en-
nas uma face polida que aparentam terem quanto o material da BR-230 apresenta mais
sido retocados formando um gume; dois exemplares coletados em superfície, mas
fragmentos com ambas as faces polidas, sen- também com grande quantidade de lâminas
do que um apresenta pequena parte de uma doadas (Quadro 3).
das faces, com várias marcas de lascamento
na mesma; e um fragmento polido com am-
bas as faces com retiradas. Em três fragmen-
tos foi possível observar chanfraduras.
No sítio Serrarias ocorrem duas lascas
polidas em uma das faces; dois fragmentos
pequenos com ambas as faces polidas e com
marcas de retiradas; e quatro fragmentos Quadro 3 – Proveniência das lâminas por
maiores com faces polidas com vários nega- rodovias.

tivos de retiradas.
Em Marajó, no sítio Pedreira, uma lâmi- Na BR-163, das 54 lâminas provenientes
na que pode ter sido utilizada como cunha de doação 31 estão inteiras, 11 estão frag-
foi reaproveitada provavelmente como “que- mentadas, oito são fragmentos e quatro são
bra-coquinho”. Também foram observados pré-formas (três inteiras e um fragmento).
no sítio Castanhal Grande duas lascas poli- Entre as coletadas em superfície, três estão
das e uma lâmina com negativos de retirada; inteiras, três são fragmentos, uma é frag-
e no sítio Prainha uma lasca polida. mento de pré-forma e uma apresenta indí-
cios de reaproveitamento da matéria-prima.
3.6 – Descarte: Na BR-230 das 95 lâminas provenientes
O descarte das lâminas pode ocorrer por de doação 45 estão inteiras, 20 estão frag-
motivos diversos. As lâminas fragmentadas e mentadas, 19 são fragmentos, quatro são
os fragmentos podem ter sido abandonados pré-formas (inteiras e fragmentos), e sete
devido à quebra e inutilização do utensílio. tiveram sua matéria-prima reaproveitada.
Em relação ao contexto no qual foram obti- Entre as coletadas em superfície, 15 estão
dos os machados analisados, constatou-se inteiras, 16 estão fragmentadas, 57 são frag-

REVISTA DE ARQUEOLOGIA Volume 25 - N.1: 58-87 - 2012


78

mentos, 13 são pré-formas (inteiras e frag- desenvolvida pelo Núcleo de Arqueologia


mentos) e 23 tiveram sua matéria-prima da UFPA, foram encontrados no município
reaproveitada. Os exemplares provenientes de Novo Progresso materiais líticos prove-
de escavação representam cinco lâminas in- nientes de sítios arqueológicos e doações da
teiras, duas fragmentadas, nove fragmentos, população local (Doação Km 1002, Doação
três fragmentos de pré-forma e 16 lâminas Manfroi, Doação Sítio Colorido, Fazenda
reaproveitadas. São José), que, segundo as informações ob-
tidas, foram encontrados próximos ao rio
4. Análise de alguns sítios Jamanxim. Neste rio, foram identificados
Ao material de alguns sítios optou-se ainda afiadores e polidores no sítio Fazenda
por atribuir maior ênfase neste trabalho, Jacarandá durante a realização de um diag-
apresentando os contextos em que foram nóstico para o projeto Tocantinzinho
encontrados e hipóteses inferidas a partir (SCHAAN, VEIGA & FERREIRA 2009).
desses contextos. Todos esses materiais es- Escavações não foram realizadas nesses
tão inclusos na análise geral das lâminas sítios, por isso não há datações para identi-
descritas anteriormente. O primeiro con- ficar o contexto cronológico desta ocupação.
junto refere-se a um grupo de lâminas en- A cerâmica encontrada nos sítios desta área
contradas em quatro localidades diferentes, também não foi sistematicamente estudada,
mas aparentemente todas próximas ao rio logo se desconhece seus atributos tecnotipo-
Jamanxim, afluente do Tapajós. Estas lâmi- lógicos e sua afiliação em uma das fases e
nas são representativas pela variedade de tradições cerâmicas.
formas, o que, assumindo a pressuposição A coleção lítica desse local se constitui de
de que cada forma poderia estar relaciona- 24 lâminas e seis percutores. Entre as lâminas,
da a uma afiliação cultural, poderia repre- há duas pré-formas e um fragmento de pré-
sentar o comércio/contato entre diferentes -forma, nove machados inteiros, cinco frag-
grupos étnicos, ou, esses mesmos grupos mentados e sete fragmentos de machados.
frequentando esses espaços em períodos di- A ocorrência de afiadores e polidores,
ferentes. O segundo conjunto refere-se as juntamente com a presença das duas pré for-
lâminas encontradas no sítio Nossa Senho- mas, do fragmento de pré-forma e dos per-
ra do Perpétuo Socorro (Itaituba). Neste cutores na área sugerem a produção local
sítio, durante as atividade de campo foi dessas lâminas líticas. Em relação aos artefa-
identificada a ocorrência de uma oficina lí- tos provenientes do Jamanxim, todos os
tica (Schaan, Martins, Bezerra & Santos, fragmentos de lâmina, as pré-formas e bate-
2010). Uma das lâminas deste grupo foi en- dores são provenientes da Doação Sítio Co-
contrada associada a uma urna funerária, a lorido. Registrou-se ainda a presença de uma
mesma apresenta desgaste por uso, sugerin- pré-forma no sítio Serra Negra e de percuto-
do assim uma possível prática funerária de res nos sítios Santa Luzia e Canta Galo.
enterrar os entes falecidos junto com os As menores peças são os fragmentos de
pertences que utilizaram em vida. machados. A lâmina inteira de menor com-
primento mede 7,65 cm, enquanto a maior
4.1 – Cadeia operatória no rio Jamanxim tem 19,5 cm. A lâmina mais larga (mede
Durante a realização de pesquisa arque- 10,05 cm, possui forma retangular curta
ológica relacionada ao empreendimento de com 10 cm de comprimento, enquanto a de
pavimentação da BR-163: Cuiabá-Santarém, menor largura é um fragmento com 4 cm,

Construindo histórias: cadeia operatória e história de vida dos machados líticos amazônicos Tallyta Suenny Araujo da Silva
79

Figura 3 - Lâminas e batedores localizados próximos ao rio Jamanxim. Foto Tallyta Suenny

mas também há uma lâmina inteira com 5 também está relacionada com a função do
cm de largura. A espessura mínima é de utensílio, que também poderia ser utilizado
uma lâmina fragmentada e uma inteira com para diferentes tarefas, mudando assim a
2,5 cm e a maior espessura é a de um frag- forma de preensão. O tipo de cabo e a forma
mento com 4,8 cm. Em relação ao peso, de preensão também deveriam variar con-
existe um exemplar inteiro com massa pró- forme a forma e função do machado, e tal-
xima à de um quebrado (162 g e 143 g res- vez ainda com a afiliação cultural.
pectivamente), tanto em relação aos meno- Alguns instrumentos poderiam ser usa-
res pesos quanto aos maiores (fragmento de dos sem cabo dependendo do tipo de ativi-
1047 g e inteiro 1206 g). dade no qual seriam utilizados. Um dos ar-
A morfologia das peças é variada (Qua- tefatos apresenta a parte meso-proximal,
dro 4): lâminas simples, com chanfraduras mas não apresenta gume com bisel, sua par-
(proximal e mesial), garganta e orelhas. Em te distal é arredondada e picoteada. É possí-
algumas lâminas com chanfraduras, os sul- vel que o instrumento tenha sido fabricado
cos estão em alturas distintas; uma delas para servir como um martelo (comunicação
apresenta dois sulcos de um lado e apenas pessoal Ângelo Lima), assim a presença das
um no outro; há ainda uma lâmina frag- orelhas auxiliariam na preensão manual; ou,
mentada que tem sulcos de larguras diferen- talvez, o gume tenha quebrado durante a
tes. Essas adaptações morfológicas nos ma- utilização e o objeto tenha sido reutilizado
chados são indícios para a forma como os em atividades de percussão.
utensílios foram encabados. As lâminas A utilização dos instrumentos deixa mi-
com orelhas podem ter sido fixadas por cro e macro-traços de desgaste na peça. Na
meio do encabamento cimentado, as com amostragem analisada observaram-se lâmi-
sulcos pode ter sido utilizado os encaba- nas com gume assimétrico, serrilhado, frag-
mentos justapostos (SOUZA 2008). mentado arredondado, com micro-fraturas.
Não obstante a forma de encabamento As faces apresentam-se com polimento des-

REVISTA DE ARQUEOLOGIA Volume 25 - N.1: 58-87 - 2012


80

gastado e estigmas de diferentes dimensões. Índios Chipayas e Curuaia acompanharam


Há lâminas com bordos desgastados e uma Snethlage na sua viagem. Sobre os Curuaia,
delas não tem seu bordo esquerdo na área afirma que seu idioma parece com o dos
meso-proximal. Os talões apresentam poli- Mundurucus, tradição observada no Jaman-
mento desgastado, superfície rugosa, partes xim, e que até a época de sua viagem, os
fragmentadas. Curuaia continuavam a fazer excursões ao
Entre os fragmentos, 4/7 quebraram na Jamanxim. Também ouviu comentários de
área proximal e os demais na região meso- que antigas malocas abandonadas neste rio
distal. As lâminas fragmentadas apresentam teriam sido habitadas no passado por esses
fraturas na região do gume (3/5) e tanto no indígenas. Assim, Snethlage acredita que os
gume quanto no talão (2/5). Nessas lâminas Curuaia podem ser descendentes dos indí-
fragmentadas duas têm estigmas nas faces, genas do Jamanxim ou remanescentes desse
uma nas faces e bordos, uma apresentam grupo.
desgaste no gume e uma lâmina tem uma Marlinda Patrício (2000) realizou entre-
das faces quebrada devido à perda de parte vistas com os Curuaia em 1999 e estes em
do gume. suas lembranças afirmam que eram parte
Desconhece-se qual grupo indígena ocu- dos Mundurucus, e que se dividiram, mu-
pou essa área. Analisando os relatos poste- dando seu nome quando atravessaram o Ja-
riores a colonização, observa-se a referência manxim e se instalaram no rio Curuá.
de diferentes grupos indígenas presentes Curt Nimuendajú (1948) acredita que os
nesta região em épocas distintas, que pode- chamados Parintintins que atacavam os mo-
riam ou não ser descendentes das popula- radores do rio Jamanxim eram provavel-
ções que aí habitaram antes da vinda dos mente grupos de Curuaia. Nimuendajú rela-
europeus. ta que os Curuaia foram mencionados pela
Henri Coudreau (1897) informa sobre a primeira vez por Gonçalves Paes de Araujo,
importância do rio Jamanxim, considerado entre 1682 e 1685. Aparentemente no século
o segundo afluente do Tapajós mais impor- XVII eles habitavam entre o Xingu e o Tapa-
tante, e relata sobre os índios Parintintins jós. Em relação às afinidades lingüísticas,
que tiveram sua mobilidade pelo território Nimuendajú associa a língua dos Curuaia
dificultada devido a ataques dos colonizado- com a dos Mundurucus. A presença de ín-
res. Aparentemente, os índios pertenceriam dios Mundurucus locomovendo-se em dire-
à bacia do Tapajós e teriam idioma parecido ção ao norte pelo rio Tapajós é datada em
com o dos Mundurucus. Esse grupo vivia 1769, neste percurso, os Mundurucus con-
em guerra constantemente com os Carajás e frontaram-se com os índios Jaguain (Ja-
os Mundurucus. Em sua viagem pelo Xingu, vaim) que ocupavam o médio Tapajós (Bae-
Coudreau relata que os índios Curuaia po- na, 1885 apud Horton, 1948). Nimuendajú
deriam ter obtido “objetos de proveniência (1952) relata ainda, no século XX, a presen-
civilizada” (1897, p. 34) com os Araras ou ça de três bandos de Gorotire e outros gru-
com os Mundurucus, que os obteriam de ci- pos de Kaiapó que percorriam pelos afluen-
vilizados do Jamanxim. tes da margem direita do Tapajós e do
Emília Snethlage (2002) realizou em Jamanxim (apud Verswijver 1978). Verswi-
1909 a travessia entre o Xingu e o Tapajós. jver narra sobre os Mekrãgnoti, grupo Kaia-
Partindo do Xingu, Snethlage percorreu pó, que realizou ataques as populações do
pelo Iriri, Curuá, Jamanxim até o Tapajós. Iriri e Jamanxim. Outro grupo Kaiapó que

Construindo histórias: cadeia operatória e história de vida dos machados líticos amazônicos Tallyta Suenny Araujo da Silva
81

se estabeleceu no Jamanxim foi os Me no 4.2 – Vivendo com os mortos


Kane, ocupando a margem direita do curso No município de Itaituba foram realiza-
superior deste rio, posteriormente, entre o das escavações em um provável sítio habita-
alto Jamanxim e o rio Teles Pires e depois ção-cemitério, denominado Nossa Senhora
continuaram migrando pela região. do Perpétuo Socorro, localizado na margem
As pesquisas arqueológicas também evi- esquerda do Tapajós (Schaan, Martins, Be-
denciaram que em 14 dos 25 sítios arqueo- zerra & Santos, 2010). A presença de urnas
lógicos identificados pelo Núcleo de Arque- funerárias, fragmentos cerâmicos de vasi-
ologia da UFPA no município de Novo lhas utilitárias, lascas, núcleos e manchas de
Progresso foram encontrados solos escuros terra escurecidas, semelhantes a buracos de
antropogênico. No sítio Fazenda Jacarandá esteio, são indícios que o local era utilizado
também se identificou terra preta no bar- tanto para a moradia quanto para os sepul-
ranco próximo ao rio Jamanxim e fragmen- tamentos. Devido a atividades antrópicas o
tos cerâmicos. Ademais, os moradores de sítio encontra-se bastante alterado. Na área
Jardim do Ouro possuíam acervos com ma- da residência foram identificadas bordas de
terial arqueológico (lâminas, vasos cerâmi- vasilhas cerâmicas aflorando em superfície
cos, artefatos em madeira) proveniente do que ao serem escavadas apresentaram-se
rio Jamanxim. Há relatos ainda de terra mu- como possíveis urnas.
lata nos terraços ao longo do Jamanxim, A paisagem do sítio caracteriza-se por
próximo a Novo Progresso (Kern et al., terreno plano, na parte mais elevada do sí-
2004, comunicação pessoal de Sombroek). tio, onde se localiza a residência do caseiro

Figura 4 - Lâminas do sítio Nossa Senhora do Perpétuo Socorro. Foto Tallyta Suenny

REVISTA DE ARQUEOLOGIA Volume 25 - N.1: 58-87 - 2012


82

da chácara. Em direção ao rio, o terreno pessura; a de menor largura é a segunda me-


apresenta leve declividade a sul e sudeste. A nor lâmina inteira com 1,1 cm de espessura
concentração de urnas foi encontrada em e forma retangular estreita, sendo também o
toda a área próxima à residência, onde exemplar de menor espessura e peso com 46
também, na superfície, foram encontrados g. O exemplar mais espesso está fragmenta-
líticos e fragmentos cerâmicos dispersos por do e tem 3,5 cm de espessura, 9,8 cm de com-
uma extensa área. O material cerâmico des- primento, 4,4 cm de largura e forma retangu-
ta área está inserido na tradição inciso-pon- lar estreita. O artefato mais pesado está
teado, tradição essa presente em outros sí- fragmentado e tem 276 g, enquanto o segun-
tios localizados no município de Itaituba do mais pesado é um fragmento com 255 g.
(MARTINS, 2010; 2012). Em relação ao design das lâminas (Qua-
Foram escavados onze vasilhames cerâ- dro 5): (I) cinco são do tipo Aa, composto
micos que podem ser urnas – uma destas por lâminas pequenas de forma retangular
com hipótese comprovada devido ao desco- larga ou elipsoidal, com as faces predomi-
lamento do fundo da vasilha e observação nante convexas e talão arredondado ou
de ossos – três vasilhas menores, fragmentos truncado; (II) uma do subgrupo Ae, carac-
de uma vasilha possivelmente utilizada terizado por apresentar forma retangular
como tampa, fragmentos cerâmicos e con- comprida e estreita, com chanfraduras du-
juntos líticos lascados e polidos, sendo que pla e faces convexas; (III) uma do subgrupo
próximo ao porto foi identificado uma con- Af, formado por lâminas retangulares com
centração de lascas e núcleos, caracterizan- largura aproximada ao comprimento, com
do-se como provável oficina lítica. faces predominantemente convexas e talão
Entre o material lítico, 18 representam arredondado; (IV) duas do Ag, caracteriza-
machados, sendo seis inteiros, nove frag- do por lâminas pequenas de forma elipsoi-
mentados e três fragmentos. As lâminas são dal, talão arredondado, faces e bordos con-
provenientes de doações, coletas de superfí- vexos; (V) uma do tipo Aj, formado por
cie e escavação. Entre as lâminas doadas três lâminas retangulares, compridas, de bordos
estão inteiras e três fragmentadas. Em super- comumente de eixos levemente divergentes,
fície foram encontradas, uma lâmina inteira, faces convexas e talão truncado; (VI) duas
três lâminas fragmentadas, três fragmentos, do Am, que apresenta lâminas pequenas
e uma lâmina fragmentada que aparente- com largura aproximada do comprimento,
mente teve sua matéria-prima reaproveitada. as faces são convexas, talão arredondado ou
Nas escavações foram encontradas duas lâ- truncado e bordos de eixos convexos; (VII)
minas inteiras e duas fragmentadas. uma do subgrupo An, composto também
O menor artefato é uma lâmina inteira por lâminas pequenas, não obstante, mais
com 5,25 cm de comprimento e 4,3 cm de compridas que largas, bordos de eixos para-
largura, enquanto o maior é uma lâmina lelos, retilíneos ou convexos, predominando
fragmentada com 10,9 cm e 4,9 cm de largu- o talão e as faces convexas (VIII) duas do
ra. A segunda menor lâmina inteira tem 6,6 tipo Cf, que apresenta exemplares de pela
cm de comprimento e 3,6 cm de largura en- forma retangular, largura aproximada ao
quanto a maior inteira tem 9 cm de compri- comprimento, não obstante com compri-
mento e 5,9 cm de largura. A lâmina mais mento maior, as faces são planas, ou plano-
larga (mede 7,3 cm, tem forma elipsoidal -convexa, bordos de eixos paralelos, retilí-
com comprimento de 8,1 cm e 2,8 cm de es- neos ou convexos; (IX) e uma do Cg,

Construindo histórias: cadeia operatória e história de vida dos machados líticos amazônicos Tallyta Suenny Araujo da Silva
83

formado por lâminas retangulares ou elip- pulverizados nos vasilhames. Nos relatos et-
soidais, com comprimento maior que a lar- nohistóricos, Heriarte (1874) comenta a prá-
gura, faces predominantemente convexas e tica de enterrar os mortos em redes junto
bordos de eixos paralelos. com seus pertences e após descarne ocorria o
As lâminas classificadas representam tan- consumo dos ossos triturados junto com be-
to as inteiras quanto as fragmentadas. Com bidas. Bettendorf (1698) relata o culto a mú-
relação aos fragmentos que não foi possível mias indígenas escondidas em casas na mata.
classificar em um dos tipos, dois apresentam A região do Tapajós foi testemunha de
chanfraduras e em um fragmento não foi grande dinâmica indígena de etnias diferen-
possível identificar o tipo de adaptação mor- tes com sua cultura e práticas mortuárias es-
fológica. pecíficas. Coudreau (1896) relata entre os
Parte do lítico lascado foi analisado pelo Mundurucus do Tapajós a prática de sepulta-
arqueólogo Lucas Bueno, em 2009. Nessa mentos realizada com a deposição do cadáver
amostra foram identificados seis fragmentos enrolado na sua rede e enterrado de cócoras
de lascamento, três artefatos, 20 lascas frag- em uma cova em forma de poço. Peter Hil-
mentadas, doze artefatos informais, sete frag- bert (1958) afirma também que entre os
mentos térmicos e 15 lascas. Um dos macha- Mundurucus a prática de enterros em urnas
dos provenientes de escavação foi encontrado somente era utilizada para as pessoas de po-
próximo a uma urna, podendo ser uma ofe- sição mais alta e que nas urnas eram deposi-
renda funerária. Essa lâmina apresenta mar- tadas as cinzas e não o esqueleto. Hilbert in-
cas de uso, sendo possível que tenha sido um forma a descoberta de urnas funerárias na
utensílio utilizado pelo indígena falecido e área da Missão São Francisco do Cururú.
sepultado com ele, para que pudesse utilizar Todas as urnas encontradas eram de enterra-
seu instrumento no outro plano cosmológi- mento secundário sem a presença de oferen-
co. Como possíveis acompanhamentos fune- das. A presença de outros vestígios, como
rários também há vasilhas menores. cacos cerâmicos tipo “cuscuseiro” foi inter-
Existem e existiram diferentes formas de pretada como possível evidência que o local
lidar com a morte e os mortos conforme as- foi utilizado tanto para moradia como para
pectos individuais, culturais, sociais e tempo- os sepultamentos.
rais (Gennep, 2004). Mumificação, decom-
posição, cremação, endocanibalismo podem 5. Conclusão:
ser práticas funerárias utilizadas no trata- As sociedades do passado nos deixaram
mento dos corpos falecidos quando ocorre o registros de sua agência e relações na sua
sepultamento secundário, enquanto outras cultura material. Da escolha da matéria-pri-
sociedades têm como prática o sepultamento ma até o descarte do objeto, as populações
simples (Hertz, 2004; Conklin, 2004). Diver- expressaram suas escolhas individuais, so-
sos ritos e tabus estão associados a essas prá- ciais e culturais. A pesquisa realizada pro-
ticas estando relacionados à cosmologia de porcionou observar a presença nos sítios de
cada grupo vestígios em diferentes etapas da cadeia ope-
Pesquisas arqueológicas evidenciaram na ratória, e dos demais artefatos relacionados
região do rio Tapajós diferentes práticas mor- com o processo de produção das lâminas de
tuárias (Martins et al., 2010). Registrou-se a machado.
ocorrência de sepultamentos primários e se- Observando-se a geologia e recursos
cundários, presença de ossos calcinados e naturais no Estado do Pará é possível veri-

REVISTA DE ARQUEOLOGIA Volume 25 - N.1: 58-87 - 2012


84

ficar diferentes fontes de matéria-prima quanto a ocorrência de formas semelhan-


apta para produção de artefatos polidos tes em alguns sítios. Esta recorrência no
nas áreas onde estão localizados os sítios. design sugere algum tipo de relação entre
Igualmente na Amazônia há vários rios e os grupos que habitavam a área, podendo
igarapés com afloramentos rochosos que ser cultural, comercial, etc. Por isso acredi-
poderiam ter sido utilizados para polir os ta-se que os sítios que compõem o conjun-
instrumentos, além de também ser possível to localizado entre os municípios de Itaitu-
a utilização de polidores móveis. A indús- ba e Rurópolis poderiam de alguma forma
tria lítica nesta parte da Amazônia teve estar relacionados, assim como os sítios
condições favoráveis para se desenvolver. que fazem parte do conjunto entre os mu-
Na Amazônia, onde as pesquisas reali- nicípios de Altamira à Anapú. Da mesma
zadas dão mais ênfase ao material cerâmi- forma, a variedade de forma nos sítios de
co, este trabalho visou apresentar a expres- Novo Progresso, me leva a pensar em con-
sividade e variedade da tecnologia lítica. E tatos de grupos diferentes ou estes grupos
como esses podem igualmente ser utiliza- diversos se locomovendo em épocas dis-
dos para inferir as atividades realizadas pe- tintas por esse espaço.
los grupos que habitaram os sítios arqueo- Desta forma, a análise da coleção lítica
lógicos, assim como possíveis afiliações baseada na cadeia operatória dos artefatos
culturais ou relações comerciais. Assim possibilitou obter algumas informações so-
como para o material cerâmico já foram bre a história de vida desses artefatos, as
levantadas hipóteses para o contato entre escolhas, estilos, conhecimentos técnicos e
sítios localizados em uma ampla área a atividades realizadas pelo ser humano,
partir das semelhanças na decoração, anti- possibilitando, assim, conhecer um pouco
plástico, e formas das vasilhas, a autora mais sobre as sociedades do passado.
acredita que o mesmo possa ser pensado
para o material lítico, apesar de atualmente Agradecimentos
não haver datações para comprovar tais hi- Gostaria de agradecer ao CNPq e ao
póteses. programa PIBIC/UFPA, pela bolsa de pes-
Enquanto não se dispõe da localização quisa; a minha orientadora Profª Drª Deni-
temporal desses sítios para relacioná-los se Schaan por todo o apoio desde meu iní-
espacialmente, em verdade seria preciso cio na arqueologia em 2009; a toda equipe
inventaria conjuntamente o material cerâ- do Núcleo de Arqueologia da UFPA. Agra-
mico, lítico, padrões de assentamento e ou- deço ainda pelas referências para a termi-
tros elementos presentes no registro arque- nologia dos machados sugerida Profª Drª
ológico, a fim de observar as semelhanças Maria Jacqueline Rodet; e aos ensinamentos
entre diferentes sítios.Não obstante, este e sugestões do meu “professor de líticos”
trabalho apenas apresentou pequenas ob- Ângelo Lima. Os Programas de Arqueolo-
servações sobre as similaridades entre o gia nas rodovias BR-230 e BR-163, no âmbi-
material cerâmico e lítico. O foco da pes- to dos quais foram coletadas as amostras
quisa foram as lâminas de machado. analisadas nesse artigo foram patrocinados
A partir da observação das diferentes pelo DNIT-Departamento Nacional de In-
formas das lâminas de machado e sua dis- fraestrutura de Transportes.
tribuição espacial, foi possível perceber
tanto a variedade estilística dos artefatos

Construindo histórias: cadeia operatória e história de vida dos machados líticos amazônicos Tallyta Suenny Araujo da Silva
85

REVISTA DE ARQUEOLOGIA
Quadro 4 – Design lâminas dos municípios de Trairão, Novo Progresso, Castelo de Sonhos e Guarantã

Volume 25 - N.1: 58-87 - 2012


86

Quadro 5 – Design lâminas sítios BR-230, Santarém, Belterra, Marajó e Aveiros

Construindo histórias: cadeia operatória e história de vida dos machados líticos amazônicos Tallyta Suenny Araujo da Silva
87

referências bibliográficas
ACUÑA, C. 1641 Nuevo descubrimiento del gran rio de las G. M. (Ed.) Death, Mourning and Burial: a cross-cultural reader.
Amazonas. En Madrid: En la Imprenta del Reyno. [6], 46 p.; 20 Blackwell Publishing Ltd, pp. 213-223.
cm. GOELDI, E. A. 2009 Sobre o uso dos machados de pedra de
ANDREFSKY, JR., W. 2009 The analysis of stone tool procu- índios sul-americanos, especialmente amazônicos, atualmente
rement, production, and maintenance. In: Journal of Archaeolo- existentes. In: Bol. Mus. Para. Emílio Goeldi. Ciênc. Hum.  Be-
gical Research 17, pp. 65-103. lém, v. 4, n. 1, Abril.
BETTENDORF, J. F. 1698. 1909 Crônica da missão dos padres HERIARTE, M. 1874 Descripção do estado do Maranhão,
da companhia de Jesus no estado do Maranhão [1625 – 1698]. In: Pará, Corupá e Rio das Amazonas. Vienna d’Austria: Imprensa
Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Ja- do filho de C. Gerold.
neiro, Vol. 119. HERTZ, R. 2004 A Contribution to the Study of Collective
BOOMERT, A. 1987. Gifts of the Amazons: ‘’green stone’’ pen- Representation of Death. In: ROBBEN, A. C. G. M. (Ed.) Death,
dants and beads as items of ceremonial exchange in Amazonia Mourning and Burial: a cross-cultural reader. Blackwell Pu-
and the Caribbean. In: Antropologica, nº67, p.33-54. blishing Ltd, 197-212.
BOOMERT, A. 1979 The prehistoric stone axes of the Guia- HILBERT, P. P. 1958 Urnas funerárias do Rio Cururú, Alto
nas: a typological classification. In: Journal of the Walter Roth Tapajós. In: Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Nova
Museum of Archaeology and Anthropology. Volume 2, nº 2, pp. Série Antropológica, n.6, pp. 1-13.
99-124, Georgetown. HORTON, D. 1948 The Mundurucu. In: STEWARD, J. H.
BUENO, L. 2009. Programa de Identificação e Salvamento do (Ed.) Handbook of South American Indians. Vol.3. Washington
Patrimônio Arqueológico BR-163 (Guarantã do norte/Entronca- DC, pp. 271-283.
mento BR-230) e BR-230 (Miritituba/Rurópolis). KERN, D. C. et al. 2004 Distribution of Amazonian Dark Ear-
BUENO, L. 2007a Variabilidade tecnológica nos sítios da re- th in the Brazilian Amazon. In: KERN, D. C.; GLASTER, B. &
gião do Lajeado, médio rio Tocantins. In: Revista do Museu de WOODS, W. I. (Eds.) Amazonian Dark Earths: Origin, Proper-
Arqueologia e Etnologia/USP, Suplemento 4, pp. 49-63. ties, Management. Johannes Lehmann. Dordetch, The Nether-
BUENO, L. 2007b Organização Tecnológica e Teoria do De- lands: Kluwer Academic Publisher.
sign: entre estratégias e características de performance. In: BUE- KIPFER, B. A. 2007. Dictionary of artifacts. Malden, MA and
NO, L & ISNARDIS, A. (Org.). Das pedras aos homens: tecnolo- Oxford: Blackwell Publishing.
gia lítica na arqueologia brasileira. Belo Horizonte, MG: LEROI-GOURHAN, A. 1981. Pré-História. São Paulo: Pionei-
Argvmentvm: FAPEMIG; Brasília, DF: CAPES, pp. 67-94. ra, editora da Universidade de são Paulo. Tradução de Josefa
CONKLIN, B. A. 2004 “Thus are our bodies, thus was our Uratsuka e Caio Del Rio Garcia.
custom”: mortuary cannibalism in an Amazonian society. In: MARTINS, C. M. P. 2012. Arqueologia do Baixo Rio Tapajós:
ROBBEN, A. C. G. M. (E.) Death, Mourning and Burial: a cross- ocupação humana na periferia do domínio tapajônico. Disserta-
-cultural reader. Blackwell Publishing Ltd, pp. 238-262. ção de Mestrado em Arqueologia. Programa de Pós-Graduação
COSTA, F. W. S. 2009 Arqueologia das Campiranas do Baixo em Arqueologia. Belém. UFPA.
Rio Negro: em busca dos pré-ceramistas nos areais da Amazônia MARTINS, C. M. P. 2010. Ocupações humanas pré-coloniais
Central. Tese de Doutorado, FFLCH/MAE, USP. na bacia do médio rio Tapajós, Amazônia Brasileira. Especializa-
COUDREAU, H. 1897 Voyage au Tapajoz. 28 Juillet 1895 – 7 ção em Arqueologia. UFPA
Janvier 1896. Ouvrage illustré de 68 vignettes et d’une fleuve “Le MARTINS et al. 2010 Padrões de sepultamento na periferia do
Tapajoz”. Paris, A. Lahure. domínio Tapajó. In: Amazônica: revista de antropologia. Vol. 2,
COUDREAU, H. 1897 Voyage au Xingú. 30 mai 1896 – 23 n.1, pp. 137-139.
octobre 1896. Ouvrage illustré de 68 vignettes et d’une carte de la MILLER, H. M. 2007 Archaeological Approaches to Techno-
rivière “Le Xingú”. Paris, A. Lahure. logy. Amsterdam: Academic Press.
CPRM. 2008. Geologia e Recursos Naturais do Estado do NIMUENDAJÚ, C. 1948 Tribes of the Lower and Middle Xin-
Pará. Escala 1:1.000.000 gu River. In: STEWARD, J. H. (Ed) Handbook of South American
DANIEL, J. 1722 – 1776. 2004 Tesouro descoberto no máximo Indians. Vol.3. Washington DC, pp. 213 – 243.
Rio Amazonas, v.1. Rio de Janeiro: Contraponto. PATRÍCIO, M. M. 2000 “Índios de verdade?”. O caso dos Xi-
DANIEL, João, 1722 – 1776. 2004 Tesouro descoberto no má- paia e Curuaia em Altamira – Pará. Dissertação de Mestrado em
ximo Rio Amazonas, v.2. Rio de Janeiro: Contraponto. Antropologia Social, UFPA.
GENNEP, A. v. 2004 The rites of passage. . In: ROBBEN, A. C. PHILLIPS, P. 1979 Stone axes in ethnographic situations:

REVISTA DE ARQUEOLOGIA Volume 25 - N.1: 58-87 - 2012


88

some examples from New Guinea and the Solomon Islands. In: SINCLAIR, A. 2000 Constellations of knowledge: human
CLOUGH, T. H. McK & CUMMINS, W. A. (Eds.) Stone axe stu- agency and material affordance in lithic technology. In: DO-
dies, CBA Research Report, nº 23, pp. 108-112. BRES, M. & ROBB, J. E. (Eds) Agency in Archaeology. Routled-
PROUS, A. et al. 2002 Os machados pré-históricos no Brasil. ge, pp. 196-212.
Descrição de coleções brasileiras e trabalhos experimentais: fa- SNETHLAGE, E. 2002 A travessia entre o Xingu e o Tapajós.
bricação de lâminas, cabos, encabamento e utilização. In: Canin- Manaus: Governo do Estado do Amazonas; SEC, 72 p. (Docu-
dé, Xingó, nº 2, pp. 161-236. mentos da Amazônia, 98).
ROSTAIN, S. 1986/1990 Étude d’une chaîne opératoire: les SOARES, J. P. M & FERRÂO, C. 2005 Coleção etnográfica. In:
haches en pierre polie d’Amazonie. In: Arquivos do Museu de Viagem ao Brasil de Alexandre Rodrigues Ferreira. Kapa Edito-
História Natural, Belo Horizonte. V.11, pp. 115-169. rial, Vol. 3.
ROSTAIN, S. 1991 Approche pour une compréhension de SOUZA, G. N. 2008 O material lítico polido de Minas Gerais
l’hemmanchement des haches d’Amazonie. In : Compte rendu du e São Paulo: entre a matéria e a cultura. 2008. 151 f. Dissertação
XIIIème Congrés de l’Association Internationale d’Archéologie (Mestrado em Arqueologia) – Museu de Arqueologia e Etnolo-
des Caribes 9, pp. 167-186. gia, Universidade de São Paulo, São Paulo.
ROSTAIN, S. 1994 L’occupation amérindienne ancienne du STRADELLI, E. 1929 Vocabulário da língua geral portugue-
littoral de Guyane. PhD dissertation, Université de Paris I – Pan- sa-nhêengatu e nhêengatu-português. In: Revista do IHGB.
theon/Sorbonne, Editions de l’ORSTROM, Paris. Tomo 104. Rio de Janeiro.
ROSTAIN, S. & WACK, Y. 1987 Haches et herminettes en VERSTEEG, A. H. & ROSTAIN, S. 1999 A hafted Amerindian
pierre de Guyane française. Journal de la Société des Américanis- Stone axe recovered from the Suriname River. In: Mededelingen
tes. Tome 73, pp. 107-138. Surinaams Museum 55 (in press).
SCHAAN, D. P. 2012. Programa de Identificação e Salvamen- VERSWIJVER, G. 1978 Séparations et migrations des Mêk-
to do Patrimônio Arqueológico na BR-163 (Guarantã do Norte/ rãgnotí, groupe Kayapó du Brésil central. In: Bulletin de la Soci-
Entroncamento BR-230) e BR-230 (Miritituba/Rurópolis). Rela- été Suisse des Américanistes, 42, pp. 47-59.
tório Final.
SHAAN, D. P. 2010. Programa de Arqueologia & Educação
Patrimonial. BR-163: Santarém-Rurópolis; BR-230/PA: Divisa
TO/PA à Rurópolis (Excluindo trecho Altamira-Medicilândia);
BR-422: Trecho: Novo Repartimento – Tucuruí. 1º Relatório Par-
cial: Programa de Prospecções BR-230.
SCHAAN, D. P. 2008. Programa de Arqueologia Preventiva
BR-163. Relatório semestral Período Julho-Dez. de 2008.
SCHAAN, D. P. 2007. Prospecção Arqueológica na BR-163
(Trecho: Divisa MT/PA - km 173.2/PA). Relatório de pesquisa.
SCHAAN, D. P. & SANTOS, A. 2009. Programa de Arqueolo-
gia Preventiva BR-163.
SCHAAN, D. P.; VEIGA, W. F. S. & FERREIRA, M. S. 2009.
Diagnóstico arqueológico na área de Influência do projeto To-
cantinzinho (Itaituba, Pará). Relatório Técnico. (não publicado).
SCHAAN, et al. 2010. Programa de Arqueologia. BR-230
Transamazônica: Trecho Altamira – Medicilândia. 1º Relatório
Semestral – Ano 2009.
SCHAAN, D. P.; MARTINS, C. M. P & SANTOS, A. 2010.
Programa de Arqueologia. BR-230 Transamazônica: Trecho Al-
tamira – Medicilândia. 1º Relatório Semestral – Ano 2010. 1º
Semestre.
SCHAAN, D. P.; MARTINS, C. M. P.; BEZERRA, I. A. & SAN-
TOS, A. 2010 Projeto de Identificação e Salvamento do Patrimô-
nio Arqueológico na BR-163 (Guarantã do Norte/ Entroncamen-
to BR-230) e BR-230 (Mirirituba/ Rurópolis). Relatório Semestral
(Jan – Jun 2010).

Construindo histórias: cadeia operatória e história de vida dos machados líticos amazônicos Tallyta Suenny Araujo da Silva
89

REVISTA DE ARQUEOLOGIA Volume 25 - N.1: 58-87 - 2012

Você também pode gostar