Você está na página 1de 12

1

Comissão da Verdade
ANO X- NÚMERO 64 – CURITIBA, OUT/NOV DE 2019

LEIA NESTA EDIÇÃO


Mundo conectado e imersivo: um museu de
lembranças no Instagram - Página 3
Transtorno de ansiedade atinge uma em cada
dez pessoas no país - Página 4

Cadeirantes e deficientes físicos sofrem com


falta de acessibilidade em Itiúba - Página 10

A ditadura
marchou no
Paraná
Engana-se quem acha que a ditadura ficou restrita ao
eixo Rio-São Paulo. O Paraná também foi palco de ações
Conteúdo militares e de operações que vitimaram e torturaram
exclusivo dezenas, e que e prenderam mais de quatro mil pessoas
durante o período de violência nos anos de chumbo.

Jornal Laboratório - Curso de jornalismo do Centro Uninter


2 Opinião MARCO ZERO N.º 64 – Out/Nov de 2019

Cláudia Freire
Ao Leitor
A memória é a união de um
povo, é a identificação, é um exer-
cício de cidadania e uma forma de
mobilizar socialmente as pessoas
para que elas revisitem suas do-
res, conquistas e valores. Lembrar
é um ato de resistência. E resistir
é preciso. O tema da matéria de

A outra face da
capa desta edição do jornal Mar-
co Zero desempenha este papel,
o de não deixar esquecer um mo-
mento de truculência, de cercea-

Igreja Católica
mento dos direitos e da liberdade,
de desespero e repressão no Bra-
sil. Trata-se da Ditadura Civil Mi-
litar, um período de medo e opres-
são que durou de 1964 a 1985 no
país. Engana-se quem acha que a
repressão da ditadura, que pren- Cláudia
deu milhares de pessoas e matou
outras centenas, não chegou ao
FREIRE
Paraná. A marcha de violência
ultrapassou os limites de Rio de
Janeiro e São Paulo, e desembar- A figura do papa Francisco abranda a imagem negativa da igreja nos últimos anos
cou na terra das araucárias para

O
produzir memórias e números as-
catolicismo é forte e ja, passaram a ecoar dentro dos Papa tem feito um trabalho árduo de combater a violência praticada
sustadores. Mais de 44 mil pesso- influente em nosso templos cristãos. de trazer à luz os erros cometi- contra menores e pessoas vulne-
as investigadas, cerca de quatro país desde a cena re- A figura do Papa Francisco se dos pela Igreja Católica, que por ráveis. Isso inclui o abuso sexual.
mil pessoas presas sem qualquer tratada no quadro Primeira Missa tornou extremamente importan- diversas vezes ocultou casos de Será a primeira vez que uma lei
motivos e muitas delas sem direito do Brasil, obra de Victor Mei- te, ao dar à igreja uma voz lúci- abuso. Em março de 2019, ele pu- unifica e detalha políticas da igre-
ao habeas corpus, cujo direito foi relles, até os dias atuais. da, que nem sempre ela teve. O blicou uma lei que tem o intuito ja para combater abusos.
derrubado temporariamente no A Igreja Católica sempre se

Cláudia Freire
país pelo AI-5, milhares de tor- fez presente na nossa história
turados e dezenas de mortos. A
como país, participando de mo-
matéria abre uma série de repor-
tagens que vai nos ajudar a revi-
mentos e decisões importantes,
sitar o Paraná, ora como cena da influenciando na cultura e na po-
ditadura, ora como protagonista lítica brasileira.
de atos de transgressão e de com- No país, 172,2 milhões de pes-
bate à repressão, como no caso soas se consideram católicas. É o
do movimento pela redemocra- que apontam os dados do Anuário
tização no país, conhecido como Pontifício 2017 e Anuário Estatís-
Diretas Já! Também nesta edição tico Eclesial 2015.
do Marco Zero você vai encontrar
Atualmente a instituição não
números alarmantes sobre saú-
de pública e saneamento básico.
tem a mesma soberania que tinha,
Uma reportagem produzida em por exemplo, na Idade Média.
base de dados destaca a relação Muitas coisas mudaram no meio
entre altas taxas de mortalidade, católico. Em destaque, a figura de
e a baixa abrangência de sanea- uma instituição intocável ou com
mento, água e esgoto tratados. imagem incólume, já que nos últi-
mos tempos escândalos de abusos
Boa leitura! sexuais contra crianças e freiras,
praticados por membros da igre- O Papa tem feito um trabalho árduo de pôr à luz os erros cometidos pela Igreja Católica
EXPEDIENTE

O jornal Marco Zero

Passo 1
é uma publicação
feita pelos alunos
do Curso de
Jornalismo do
Use o QR-Code ao lado para ser Centro Universitário
encaminhado à área do aplicativo Internacional Uninter
no Google Play Coordenador do Curso:
Guilherme Carvalho

Passo 2
Professor responsável:
Alexsandro Ribeiro

Diagramação:
Confira se o seu celular e a versão Equipe Marco Zero

J
á pensou em assistir a uma da Realidade Aumentada, uma tec-
entrevista nas páginas de um nologia que permite a interação entre do seu Android são compatíveis.
Projeto Gráfico:
jornal impresso, em vídeo? elementos reais e virtuais. Depois, clique em instalar. Equipe Marco Zero
Ou quem sabe conferir um mapa Para entrar nesta viagem, é fácil e

Passo 3
em terceira dimensão, ou ainda intera- rápido. Siga as instruções e participe Uninter - Campus Tiradentes
Rua Saldanha Marinho 131, CEP
gir com elementos gráficos que saem da experiência da notícia interativa. 80410-150 |Centro- Curitiba PR
das páginas? O que há poucos anos Nesta primeira versão, o recurso
seria um sonho, agora é possível e está pelo aplicativo do Marco Zero está E-mail - alexsandro.r@uninter.com
Com o APP aberto, aponte a câmera Telefones 2102-3336 e 98826-9033.
nas suas mãos. Isso mesmo! disponível apenas para aparelhos com
do seu celular para a página do MZ
Venha com o Marco Zero na onda sistema operacional Android.
quando tiver a imagem ao lado
N.º 64 – Out/Nov de 2019 MARCO ZERO Tendência 3

Renan Alex
Um museu de
lembranças do
Instagram
Atividade de imersão através
Renan o Instagram explorou o lado
ALEX
emocional dos usuários com
suas fotos na rede social

Projeto cria um mural com lembranças e uma série de fotos com base no histórico do usuário no Instagram
Conteúdo
exclusivo
T
odos os dias, conecta- um minuto, são enviados no mun- apresentação multimídia. “A vida precisa confiar ao projeto o seu
dos ou não, produzidos do 481 mil tweets, 38 milhões de passando diante dos meus olhos”. usuário público do Instagram. Por
uma infinidade de in- mensagens pela plataforma Wha- Talvez seria a melhor frase para outro lado, é um alerta de que te-
formações que alimenta milhares tsapp, 187 milhões de e-mail, 3,7 sintetizar essa experiência que mui- mos que ter responsabilidade nos
de bases de dados. Uma fruta que milhões de pesquisas no Google, tas pessoas têm ao participar do dados. Quando estamos no mun-
compramos e indicamos o CPF na 973 mil logins no Facebook, e por Museum of Me, projeto de imersão do virtual, tudo parece simples e
nota. Um café que passamos no aí vai. É tanto bites que não cabe desenvolvido pela empresa nova- irreal, quando na verdade, temos
débito. Um cadastro que fazemos em qualquer dispositivo criado an- -iorquina Cactus com base em fo- que ter responsabilidades com o
em uma loja. Quando essa intera- tes do começo deste século. tos do Instagram dos usuários. que passamos para frente.
ção é em rede, então, aí o volume Agora, imagine a sua participa- Dois terços da população do Enfim, digitado o usuário, per- telas, criando um tom de nostalgia.
de dados produzidos é imenso. ção nesta produção. Melhor ainda, Brasil têm acesso à Internet. São mite-se a entrada na cabine. E é aí Animadora e assustadora ao
Só para se ter uma ideia, em imagine você vendo isso em uma cerca de cento e quarenta milhões que a magia começa. Entramos em mesmo tempo, a experiência re-
de pessoas que, individualmente, um ambiente repleto de espelhos vela a quantidade de momentos
Renan Alex

em média, dedicam mais de nove para todos os lados, do chão ao que registramos, a vida marcada
horas diárias à rede. Metade desse teto, e vários telões à frente, onde pelo clique que reúne bons mo-
tempo é destinado ao uso de redes começam aparecer várias ima- mentos e que cria uma memória
sociais, compostas usualmente de gens, entre elas alguns memes de digital que devemos revisitar a
conteúdos criados pelos próprios personalidades conhecidas, algo todo momento. Por outro lado, nos
usuários, destaca a Cactus no site como introdução. coloca em questionamento sobre a
do projeto. Segundo eles, a alma da Depois disso, os telões come- exposição, sobre a quantidade de
internet é criada colaborativamente çam a mostrar uma pesquisa pelo informação que depositamos na
pelos usuários, com o compartilha- seu nome de usuário. Quando co- internet sobre nós, nossas rotinas,
mento de “ momentos, emoções, necta com sua conta, uma explo- sobre as nossas conexões. Enfim,
pensamentos, opiniões, que são ofe- são de fotos inunda as telas com a vida conectada.
recidos para serem amados, odia- uma série de imagens suas. De for- Para Marine Lima, 35 anos, a
dos, comentados e compartilhados”. ma mágica, os espelhos, em con- experiência foi deslumbrante, so-
O objetivo da empresa com o junto com as telas, criam a sensa- bretudo no jogo entre as telas e
projeto é levar essa tecnologia para ção de estarmos em um ambiente espelhos. “Visualizar todas as suas
proporcionar diversas sensações de imersão, de que estamos em um fotos do Instagram, as hashtags
aos seus participantes, usando as túnel infinito de fotos e imagens que você mais usa, foi um momen-
redes sociais como gatilho, geran- em um museu em que somos, de to incrível, que completa a alma,
do assim uma imersão através de fato, o principal personagem de to- algo muito lindo. A profundidade
fotos, sons, cores e textos. Uma das as pinturas da realidade. Além também, você se olhando em to-
das instalações foi em Curitiba, e a das fotos, as legendas e hashtags dos os ângulos com os espelhos,
reportagem do jornal Marco Zero mais usadas também aparecem nas foi muito legal”.
foi lá para vivenciar esse resgate

Site do
dos momentos digitais, e para con-
tar aqui como foi a experiência.

projeto
A primeira impressão que se
tem ao entrar no Museum of Me é
de que não se trata de um ambien-
te tão convidativo. É uma entrada Veja quais são as
escura e fechada. Não tem como propostas dos organizadores
saber muito como é lá dentro sem do projeto e assista um
entrar. E aí o próximo passo da ex- vídeo sobre como funciona
periência não colabora para que a o Museum Of Me
Entrada da mostra cria um ar de desafio e de desconfiança confiança aumente. Ou seja, você
4 Saúde MARCO ZERO N.º 64 – Out/Nov de 2019

Sabrina Fernandes
Ansiedade atinge
10% da população
Preocupações, impaciência,
Ivone tensão muscular, insônia, cansaço,
SOUZA
falta de concentração, são
sintomas típicos do transtorno

“Eu tinha a sensação de não conseguir controlar meus pensamentos”, afirma Mônica Conteúdo
exclusivo
O
Brasil tem uma das No segundo ano do ensino mé- o diagnóstico correto, ela começou rência de pensamentos compulsivos
maiores taxas de diag- dio, a administração da escola perce- o tratamento para os dois quadros e negativos, pode-se desenvolver a
nósticos de ansiedade beu as crises e encaminhou Mônica patológicos com medicamentos depressão”, diz Priscila.
do mundo. Dados da Organização para a terapia. No entanto, à época, distintos com acompanhamen- Para a psicóloga, a dinâmica dos
Mundial da Saúde (OMS), apontam não deram o diagnóstico de ansieda- dias atuais e as exigências do mun-
que 19 milhões de brasileiros so- de. “Só me mandaram por causa das Na minha visão de do moderno contribuem para o de-
frem de transtorno de ansiedade. As crises de pânico. Tive crise de choro senvolvimento de tais doenças. Tais
mulheres são as principais vítimas, no meio da prova”, lembra. leiga, não sabia que situações como crises financeiras e
e respondem por cerca de 80% dos É difícil diferenciar ansiedade de problemas de relacionamentos são as
diagnósticos. O efeito da doença en- medo, já que as reações fisiológicas podia ter ansiedade que mais aparecem nos consultórios. distúrbios associados à depressão em
globa fobias, transtorno do pânico,
obsessivo-compulsivo, de estresse
são praticamente as mesmas e, em
muitas ocasiões, as duas sensações
e depressão ao Os efeitos da ansiedade gene-
ralizada são difíceis de controlar e
combinação com o tratamento cogni-
tivo-comportamental.
pós-traumáticos e ainda fatores am- se sobrepõem. Diferente do medo, na mesmo tempo, interferem na atividade geral do indi- A psicóloga Priscila Biral co-
bientais, como o estilo de vida corri- ansiedade a manifestação é mais in- víduo. Priscila explica que todos te- menta que a Terapia Cognitivo Com-
do das grandes cidades. tensa e as causas do ataque nem sem- porque na minha mos ansiedade, mas em sua maioria portamental tem sido a abordagem
A ansiedade é uma emoção pre são conhecidas antecipadamente. em menor grau. Porém ela começa a
forte que se experimenta com si- Anos depois dos primeiros episó-
visão pareciam ficar patológica quando se torna fre-
mais assertiva para o tratamento da
ansiedade, através dela trabalha-se a
tuações intensas ou ameaçadoras. dios de crise no ensino médio, Maria coisas excludentes quente e começa a atrapalhar a vida mudança de pensamento que altera
Essa reação tem um valor adaptati- ainda estava sem saber exatamente o do indivíduo. A resposta da patolo- a forma de comportamento e senti-
vo, enquanto existe um perigo que que a acometia. O diagnóstico veio to de um ano. Hoje, Maria segue gia pode variar muito de uma pessoa mento, ajudando o paciente a saber
realmente constitui uma ameaça apenas depois da morte da mãe e do o acompanhamento psiquiátrico para outra e pode se manifestar de lidar com os conflitos. “Na terapia te-
real. Perfeccionista e com uma forte agravamento do seu quadro psicoló- com medicamento naturais. formas diferentes. mos a psicoeducação, onde o pacien-
cobrança para conseguir excelen- gico. “O baque foi muito forte, pois te aprende e entra em contato com as
tes resultados, Mônica dos Santos éramos muito ligadas, mas eu fiquei Causas da ansiedade va- Medicamento e técnicas técnicas de respiração diafragmática,
Seolim teve suas primeiras crises anestesiada”, diz. Depois disso, co- meditação entre outros. A atividade
quando estava no ensino médio. Se- meçou a ter crises novamente e ainda riam de questões genéti- de controle ajudam quem física, os medicamento e tratamentos
gundo ela, as piores situações eram maiores. “Eu tinha a sensação de não cas a comportamentais sofre de ansiedade naturais também auxiliam o paciente
em época de provas, quando tinha conseguir controlar meus pensamen- De acordo com a psicóloga Pris- O tratamento psicológico é reco- na melhora dos sintomas”, aponta.
ataques de pânico e chorava muito. tos, pensava em doenças, em morte, cila Biral, várias questões podem mendado para a redução e gerencia- A resposta da ansiedade pode va-
ficava imaginando a morte das pes- levar à ansiedade, como tendência mento da preocupação e a recupe- riar muito de pessoa para pessoa. O
TED Talks: soas próximas a mim”, comenta.
Nos momentos de crise, Maria
genética, eventos traumáticos e pro- ração da funcionalidade da pessoa. que as pessoas que têm transtorno de

ansiedade
blemas hormonais. A ansiedade pode Tratamentos psicofarmacêuticos, ansiedade têm em comum é que elas
começou a perceber um desânimo desencadear a depressão, um grande especialmente antidepressivos regu- apresentam uma série de pensamen-
enorme, que se contrastava com a vilão do mundo moderno e uma das ladores da serotonina, podem ser uti- tos, emoções, sintomas e comporta-
Use o Qr-code para assistir hiperatividade que sentia mental- principais causas do suicídio. “Em al- lizados dependendo da gravidade dos mentos físicos que interferem signifi-
à palestra da psiquiatra Ana mente, e sentia um forte abatimento. guns casos de ansiedade, com a ocor- sintomas ou da presença de outros cativamente na vida do sofredor.
Beatriz sobre medo e ansiedade. “Na minha visão de leiga, não sabia
que podia ter ansiedade e depressão Transtorno de Estresse ou à vida de outras pessoas. com qualquer tipo de con-
ao mesmo tempo, porque na minha
Tipos de
Pós-traumático – definido tato social novo.
visão pareciam coisas excludentes”, como distúrbio de ansie- Fobia Social – Conhecido
revela. Ela lembra que na época tra- dade qualificado por um também como transtor- Transtorno de Ansieda-
balhava em uma agência, na qual ti- transtornos conjunto de indícios e sin- no da ansiedade social. É
qualificada por um intenso
de Generalizada (TAG)
– acontece quando a ansie-
tomas emocionais, físicos e
e distúrbios
nha grande demanda de trabalho, no
psíquicos. Geralmente, esse desconforto e pavor com dade permanece por tempo
entanto, ficava o dia todo na frente do
problema acontece quando circunstâncias normais e indeterminado e acaba pre-
computador sem fazer nada porque
não sentia capaz. associados à a pessoa é ou foi vítima ou
testemunha de práticas vio-
sociais como ambientes
novos, encontros sociais,
judicando as atividades di-
árias do indivíduo. Excesso
Foi então que decidiu procurar
ajuda e o psiquiatra a diagnosticou ansiedade lentas ou de situações trau-
máticas que simbolizaram
falar em público e contato
com pessoas estranhas. O
de preocupação ou expecta-
tiva apreensiva é o principal
com depressão e ansiedade. Com ameaça à sua própria vida portador fica intimidado sintoma desse distúrbio.
Cidades
N.º 64 – Out/Nov de 2019 MARCO ZERO Cultura 5

Clarence Davis - Daily News / Divulgação gratuita - por Gettyimages


JUSTIÇA SELETIVA:
com quais olhos
nos condenam?
Amanda Crítica da minissérie que conta
ZANLUCA a história de jovens vítimas do
racismo e do preconceito

A pressão psicológica, as agressões e a fome fizeram com que os jovens fossem acusando uns aos outros, sem nem mesmo se conhecerem

A
madrugada de 19 de rapina e uma sociedade encapuzada nenhum momento foi associado pela mas estruturais estadunidense. Brasi- nais pedindo a pena de morte.
abril de 1989 marcou de de preconceito resolveram seguir a polícia ao crime que aconteceu com leiro também! Nos primeiros minu- A atuação é primorosa e todos
forma violenta a vida de dança conforme a música do sistema a corredora. O motivo para o culpado tos, somos apresentados à realidade os atores estão surpreendentes em
cinco adolescentes negros morado- judiciário. É sob um circo midiático confessar foi um encontro casual que que aqueles garotos pertenciam. Pro- seus papéis. Destaque para o ator
res do East Harlem, bairro pobre às e pressão da classe dominante que os teve com Wise na prisão. messas e futuros. Sonhos de quem se Jharrel Jerome, que interpreta Ko-
margens de um dos principais pontos jovens, indefesos e sem direito a uma Além da confissão do verdadei- vê fora de um bairro pobre, e que ja- rey Wise. Sua expressividade des-
turísticos da cidade de Nova York, o verdadeira justiça, são condenados. ro criminoso, um exame de DNA mais imaginaria ter sua vida tolhida loca qualquer espectador do eixo ao
Central Park. Com idades entre 13 e Com penas que duraram de sete a ajudou elucidar o caso. No entanto, por um crime que não cometeu. denunciar o grande problema que
16 anos, os jovens Kevin Richard- mesmo com todas as evidências, o reverbera na sociedade. Com cenas
son, Yusef Salaam, Raymond San- A minissérie estado americano sequer deu um pe- Ela cutuca a de violência psicológica e física,
tana, Antron McCray e Korey Wise dido público de desculpas. O rótulo discriminações e muita supremacia
ficaram conhecidos por anos como
retrata uma de ex-presidiários jogou por terra ferida ao nos policial, Ava consegue desmascarar
“os cinco do Central Park”. Quando, história cruel toda a juventude dos cinco. indagar sobre a hipocrisia de uma sociedade que
junto com outros negros e latinos da A trama poderia ser parte de mais diz não ser racista.
região, foram detidos pela polícia e real. Talvez uma daquelas histórias inacreditáveis qual seria o nosso É uma série necessária que nos
por promoverem “arruaça” no local, que escutamos e desconfiamos, ou de abre os olhos para o funcionamento
não imaginavam que aquela noite
seja por isso que um drama que nos faz refletir sobre posicionamento do sistema judicial, mas que tam-
deixaria feridas profundas causadas incomode e seja como a vida é cruel em algum lugar
se tivéssemos bém nos deixa desconcertados ao
pelo preconceito e por uma justiça longe daqui. Não. É o reflexo do que evidenciar um problema que aconte-
influenciável pelo colonialismo e um grande choque presenciamos todos os dias. A histó- acompanhado de ce todos os dias, e que muitas vezes
racismo. No mesmo parque em que ria é uma síntese de uma tortura so- viramos o rosto para não perceber.
foram presos, uma mulher branca, de para quem assiste. cial, um dos casos mais emblemáti- perto o caso Qual seria nossa reação naquela
28 anos, foi espancada e violentada. cos dos Estados Unidos, e foi enredo situação? O último levantamen-
Não demorou muito para que a treze anos, quatro dos jovens cumpri- da série “Olhos que condenam”, sob O retrato da série é de 1980, to do Departamento Penitenciário
mesma polícia ventilasse uma cone- ram a sentença em um reformatório. a tutela da diretora Ava Duvernay. mas consegue ser tão atual e realis- Nacional (Depen), em 2016, apon-
xão entre os casos, mesmo não ha- Korey Wise, que à época tinha 16 Quatro episódios densos e chocantes ta quase quatro décadas depois. Em tou que a maior parte da população
vendo outras acusações aos jovens anos, recebeu pena de adulto, e foi retratam uma história cruel, mas real. um dos episódios a diretora da série presidiaria é composta por negros e
do que a importunação no parque. preso em um presídio. Mais de uma Talvez seja por isso que a série seja evidencia isso de forma muito clara, pardos (65%). Quantos estão presos
Os dois casos, da mesma noite e no década depois, o verdadeiro culpado um grande choque para quem assiste. mostrando uma declaração do então injustamente? E se são inocentes, ao
mesmo parque, ganharam uma nova confessou o crime. Um presidiário A atuação do elenco, os cortes de apenas empresário de sucesso, Do- nos depararmos com a história deles
narrativa baseada em mentiras. Sem que havia cometido uma série de cenas e o jogo de câmeras são recur- nald Trump. Na época ele fez duras qual será o nosso posicionamento?
provas, os cinco foram submetidos a agressões, estupros e assassinatos sos primorosamente usados por Ava críticas aos jovens, e chegou a gastar Em que versão acreditaremos? Com
uma maratona de cerca de 30 horas no final dos anos 1980, mas que em para nos transportar a um dos proble- U$ 80 milhões em anúncios de jor- quais olhos condenaremos?
de interrogatório, separadamente,
Michael Norcia / Divulgação gratuita - por Gettyimages

sem direito a comer, dormir, beber ou


serem acompanhados por advogados
ou familiares. Roteiro ou vida real?
A pressão psicológica, as agres-
sões e a fome fizeram com que os jo-
vens fossem acusando uns aos outros,
sem nem mesmo se conhecerem. A
confissão pelo crime que não come-
teram foi arrancada violentamente. É
com um enredo forjado que uma jus-
tiça fraca e racista decidiu se basear
em depoimentos manipulados para
dar o seu veredito. Uma imprensa de Com idades entre 13 e 16 anos, os Cinco do Central Park foram julgados sem provas concretas
6 Especial MARCO ZERO N.º 64 – Out/Nov de 2019

Comissão da Verdade / Divulgação gratuita


SÉRIE: Da repressão à democracia

Marcas da
ditadura militar
no Paraná Estado foi um dos palcos de operações
Patrícia
LOURENÇO militares nos anos de chumbo no país.
Um deles foi o Massacre de Medianeira,
em 1974, que vitimou seis pessoas.

“Subversão do meio universitário” marca a ficha do jovem Vitório Sorotiuk, uma das vítimas da ditadura no Brasil.

D
izem que a verdadeira pelas forças armadas brasileiras con- são pouco conhecidos. Mas existe com uma tira de pano envolta ao pes-
história de um país é es- tra o então presidente João Goulart. um quadro quantitativo da violência. coço, a uma altura não maior do que Conteúdo
crita pelo seu povo. Para Com concentração de poder nas mão Segundo a Comissão Nacional da 1,70 metros do chão. Suicídio, era o exclusivo
pensarmos em nosso futuro, no en- dos militares e com a instituição da Verdade, colegiado instituído pelo que apontava a laudo emitido pela
tanto, é preciso entender nosso pas- política de fechamento do congresso governo brasileiro em 2011 para in- polícia técnica à época. Um novo
sado. Há 35 anos, quando o grito por e cerceamento das instituições demo- vestigar as violações de direitos hu- lauda seria emitido pelo governo
“Diretas já!” ecoou em todas as prin- cráticas, cinco generais assumiram manos ocorridos entre 1964 e 1985, a quatro décadas depois, em 2013. O
cipais cidades do Brasil, milhões de com mãos de ferro a liderança do ditadura deixou 434 mortos e desapa- termo “asfixia mecânica por enfor-
brasileiros deixavam claro e em bom país. O que se prosseguiu foram 21 recidos e torturou 1,8 mil pessoas no camento” foi substituído por “lesões
som que a democracia deveria preva- anos de governo por atos institucio- Brasil. No entanto, apenas 33 corpos e maus tratos”. Herzog foi torturado
lecer acima de tudo, e que não existia nais de repressão aos opositores do foram localizados. e assassinado no mesmo dia, em 25
mais espaço no país para brutalidade regime e limitação da liberdades. Um deles é do jornalista Vladimir de outubro. assassinados.
em nome de uma batalha fictícia. Lu- Herzog, que em 1975 foi chamado De acordo com o professor do Ao menos 44 mil pessoas foram
tava-se pelo fim de um pesadelo que para prestar depoimentos na sede do departamento de história da Univer- investigadas pela ditadura no estado,
durou mais de duas décadas, e que vi-
Um rastro de mortes, Destacamento de Operações de In- sidade Federal do Paraná (UFPR), segundo dados do Departamento de
timou centenas de pessoas e torturou prisões e torturas formação - Centro de Operações de Antonio Cesar de Almeida Santos, o Ordem Política e Social (Dops), um
outras milhares. As marcas da ditadura foram Defesa Interna (Doi-Codi), órgão de jornalista foi morto por se contrapor dos principais braços de investigação
Afirmando ameaças comunistas, profundas e são sentidas ainda hoje inteligência do movimento de repres- à ditadura. “Herzog foi morto por ex- e repressão do movimento militar.
o Marechal Castello Branco assu- nas memórias e nos rumos políticos são militar. Não saiu de lá vivo. Na pressar opiniões contrárias ao regime No Paraná, o escritório funcionava
miu o poder no país em 15 de abril do país. Mais de meio século após a foto, que se tornou um marco da luta militar, não era um militante filiado a no Centro da cidade, na Rua João
de 1964 após um golpe civil militar data que marcou o início da repres- contra a repressão, Vlado, como era alguma organização armada. Ele foi Negrão, e servia como base de ope-
perpetrado pelo poderio econômico e são, os números da brutalidade ainda conhecido no meio jornalístico, jazia morto por ter ideias diferentes daque- rações para coibir as manifestações
les que haviam tomado o poder. Isto contrárias à ditadura.
Comissão da Verdade

não pode ser esquecido, pois mostra


o que foi a ditadura militar no Brasil.
Igual ao Herzog, muitos outros per-
deram a vida, ou foram presos e tor- SÉRIE: Da
turados, pelos mesmos motivos: por
pensar de maneira contrária aos que
repressão à
detinham o poder”, afirma. democracia
Muito além do eixo Esta é a primeira reportagem de
Rio-São Paulo uma série que busca evidenciar a
A repressão não ficou restrita brutalidade da repressão nos anos
aos estados de São Paulo e Rio de de ditadura no país, bem como, por
outro lado, narrar e debater os atos
Janeiro. No Paraná aconteceram di-
e movimentos de resistência que
versas operações militares, entre elas lutaram pela liberdade dos brasilei-
o conhecido Massacre de Medianei- ros, resultando na redemocratização
ra, em julho de 1974, onde seis mi- a partir do Diretas Já!.
O Pau de Arara era uma das torturas usadas pela repressão contra os presos políticos litantes contrários ao governo foram
N.º 64 – Out/Nov de 2019 MARCO ZERO Especial 7
de repressão realizavam prisões em
O julgamento

Comissão da Verdade / Divulgação gratuita


Os demais foram interrogados e
plena luz do dia. As torturas eram di- liberados naquele momento. Foram

de estudantes
versas e aconteciam por vários dias, apreendidos junto aos congressistas
muitas vezes, em trânsito, de um uma caixa de fogos de artifício, faca
em Curitiba
local a outro, como estratégia para de cozinha e textos que os órgãos de
desnortear as pessoas. “Fizeram in- segurança e a imprensa chamaram
terrogatório, mostraram fotografias de “subversivos”.
e queriam saber até onde eu parti- Quatro dias depois da ditadura
cipava, para identificar as pessoas. decretar o AI-5, carta branca à
Mas não sabia os nomes. Fiquei um violência e repressão, integrantes
dia todo no Dops, depois me levaram da União Nacional dos Estudantes
para o quartel na Rui Barbosa. Três (UNE) realizaram no bairro do
dias depois fomos para Foz do Igua- Boqueirão, em Curitiba, um
çu. Era sempre igual a tortura, levava congresso regional na “Chácara do
choque, arma na cabeça com xinga- Alemão”. O esquema de segurança,
mentos, me amarravam, e o pior era o no entanto, não funcionou, e a
pau de arara com os cabelos no balde polícia militar prendeu 42 pessoas.
de água e choque ao mesmo tempo”, Destas, 15 foram condenados
relembra. à prisão, 13 rapazes e 2 moças.
O período da ditadura represen-
tou um período de duas décadas sem
eleição direta e sem participação po-
pular. Mesmo em plena democracia,
Ana Beatriz afirma que se preocupa
com as novas gerações, sobretudo
diante de um cenário de revisitação e
negação da história ou dos fatos. “É
Sorotiuk: preso por “subversão no meio universitário”
importante resgatarmos essa história Conteúdo
pois há muitas pessoas que não tem exclusivo
A violência do movimento mili- Uma destas estudantes que foram muita noção. É preciso dar visibili-
tar se acentuou no Paraná e no resto perseguidas foi Ana Beatriz Fortes, dade. Estamos vivendo um momento
do país após a instituição do Ato Ins- presa com 18 anos de idade em Curi- de polarização política, com discur-
titucional número 5 (AI-5), em 1968. tiba. “Estava indo trabalhar quando sos de ódio. É preciso relembrar his-
O instrumento deu carta branca para fui surpreendida. Tinha recentemente tórias difíceis como a minha”.
que o presidente e os governo biôni- entrado no trabalho, os homens do Então estudante universitário,
cos, que eram os governadores no- Dops vieram e me levaram. Eles fo- Vitório Sorotiuk também foi um dos
meados pelo regime, atuassem como ram em casa e eu não estava. Então, presos políticos durante a ditadura
legisladores e executivos. Ou seja, quando eu cheguei no meu trabalho
eles já estavam lá. Levaram-me di-
militar no Paraná. Segundo ele, Curi-
tiba era um dos poucos espaços com Na conta no país gerou um grande alvoroço
junto às autoridades da capital do

do Geisel
faziam as leis e as operavam ao mes- Paraná. O medo de que o estado
mo tempo. Além disso, o AI-5 foi a reto, sem explicação. Me seguiam estrutura para estudo no período. “A
cidade era uma das poucas que tinha fosse palco de um atentado ao então
principal ferramenta da ditadura para sempre quando ia estudar sociologia Em 1974, o ditador general
qualidade no ensino superior. Curiti- presidente incomodou a liderança
caçar jornais e jornalistas, censurar com o grupo de estudos, achavam Ernesto Geisel visitou Curitiba.
ba tinha o centro cercado de pensões, militar local. O resultado foi uma
músicas, calar e brutalmente torturar que estávamos tramando algo contra A vinda do presidente de um dos
repúblicas e restaurantes universitá- ação de exposição de nomes,
quem se opunha ao regime ou ainda o governo. Estávamos estudando”. momentos mais brutais da repressão
rios por todos os lados”, comenta. inclusive de servidores público.
quem se enquadrava em algum tipo Mais de quatro mil pessoas fo-
de estereótipo combatido pelos mi- ram presas pelo regime no Paraná. Sorotiuk era estudante de direito
litares, como estudantes de história, Mesmo com grande visibilidade na da UFPR, filho de político, cresceu
filosofia e sociologia. capital, o Dops e os demais aparelhos com olhar voltado para a democra-
cia. Relata que a proibição da União
Nacional dos Estudantes (UNE),
Patrícia Lourenço

partidos políticos, proibição de mani-


festações públicas e a censura contra-
riavam a busca pela liberdade. A re-
sistência buscava justamente retomar
estes espaços de participação e contra
retrocessos de liberdade. “Acredito
que um dos confrontos marcantes
que tivemos foi a ocupação da Rei-
toria da UFPR em 1968. O governo
queria introduzir o ensino pago nas

As memórias
universidades federais. Conseguimos
mais de 90% dos estudantes nas ruas,
saímos vitoriosos, até hoje o ensino
nas universidades federais é gratuito, das lutas
por enquanto”, afirma. Livro produzido pela Comissão
O então universitário relembra de Anistia reúne 326 depoimentos
também de outro episódio que mar- que marcam a resistência à
cou com violência a memória da ditadura militar no Paraná.
resistência e organização estudantil
no estado, que foi a prisão de 42 estu-
dantes durante o Congresso Regional
da UNE, na Chácara do Alemão, no
Boqueirão, em 1968. Presidente da
união dos estudantes, Sorotiuk foi
um dos detidos. “Cumpri 2 anos e 10
de meses de prisão. A maior parte da
reclusão foi no Presídio do Ahú, e de-
pois no Presídio Tiradentes, em São
Santos: Hezog foi morto por se opor ao regime Paulo”, relembra.
8 Especial MARCO ZERO N.º 64 – Out/Nov de 2019

Hemeroteca BNB
SÉRIE: Da repressão à democracia

Curitiba foi sede da


ditadura por três dias
A cidade paranaense foi capital do país
Nicole
BEK em 1969, durante uma das fases mais
repressoras do movimento militar

Visita à Curitiba teve dupla finalidade: levar o governo para dentro do país e reforçar a legitimidade do regime militar

H
á cinco décadas, Curi- tários de cada uma das regiões do Iguaçu, Costa e Silva declarara à implementar um ato simbólico de pou de forma positiva a vinda do
tiba foi o centro das território nacional”, destaca o mi- época à imprensa que tinha vindo presença do governo federal e con- governo à Curitiba, ressaltando os
atenções do país. Não nistro Beltrão no documento sobre para trabalhar, e não para fazer seguir o apoio da sociedade curiti- benefícios da passagem do exe-
pelos títulos de cidade modelo as visitas. Curitiba era a sétima ci- política. A capa do jornal Diário bana ao governo militar. Uma ação cutivo em outras cidades. Jornais
em planejamento urbano. Mas ao dade que foi transformada capital do Paraná exibia a seguinte frase: que não necessitou de muitos es- como o extinto Diário do Paraná,
abrigar o governo ditatorial por momentaneamente durante o go- “Não viemos por diletantismo pró- forços, já que tanto o governador que pertencia à rede de jornais
três dias. A cidade figurou como prio daqueles que gostam de fazer do Paraná da época, Paulo Pimen- Diários Associados, de proprie-
capital do Brasil entre os dias 24 Mais que “mostrar demagogia, nem para exibições tel, quanto o prefeito Omar Sabbag dade de Assis Chateaubriand em
e 27 de março de 1969, durante baratas, mas sim para trabalhar”. simpatizavam com a política mili- parcerias com a família Stresser,
o governo do então presidente serviço”, a visita A função de aproximação do tar, afirma Regina. e do jornal Gazeta do Povo, anun-
Artur da Costa e Silva, o segundo governo com algumas cidades Soma-se a este acesso político ciavam de forma estrondosa o de-
após a instauração do regime mi-
do governo às consideradas estratégicas é ressal- o reforço da imprensa, que estam- sembarque do governo.
litar em 1964. capitais, como em tado no documento do ministro do

Hemeroteca BNB
Tratava-se de uma tática do go- planejamento, mostrando a efetivi-
verno para mostrar seu poderio e Curitiba, integrava dade das visitas. Um balanço feito
dar a sensação de que estava em em parceria entre o Ministério do
todos os lugares. Conforme des- a estratégia para planejamento e o governo de Mi-
taca o documento sobre o projeto
de governo, assinado pelo então
que a ditadura nas Gerais, apontava que 90% dos
problemas identificados pelo go-
ministro do planejamento, Hélio ganhasse força e verno na visita a Belo Horizonte já
Beltrão, além de da perfomance estava com medidas de resolução
do poder do movimento ditatorial, legitimidade para em prática.
a passagem pelas capitais dos es- Para a socióloga Regina Rei-
tados também servia para que o
além de São Paulo nert, mais que “mostrar serviço”, a
governo conhecesse a realidade e Rio de Janeiro visita do governo às capitais, como
daquela região, para identificar os em Curitiba, integrava a estratégia
problemas e adotar resultados. verno de Costa e Silva na ditadura. para que a ditadura ganhasse força
“No exame das soluções mais Despachando na sede do go- e legitimidade. “Trabalhava a ima-
adequadas dos problemas priori- verno paranaense, no Palácio do gem da ditadura, tentando criar
nas capitais em que se estabelecia,
Hemeroteca BNB

a sensação de segurança e cuidado


para com o povo”, afirma.
Segundo a socióloga, o gover-
no Costa e Silva foi um dos mais
violentos da Ditadura Militar. O
decreto do ato institucional AI-
5, em dezembro de 1968, meses
antes de desembarcar na capital
paranaense, resumia-se em ações
arbitrárias. “Entre outras medidas,
autorizava o fechamento do Con-
gresso, a suspensão do habeas cor-
pus, das garantias individuais, e a
censura prévia nas áreas culturais
e de imprensa”.
A verdadeira intenção do go-
Jornais locais exaltaram a visita do governo à capital paranaense verno, destaca a socióloga, era Diário do Paraná foi um dos principais apoiadores do governo
N.º 64 – Out/Nov de 2019 MARCO ZERO EaD: um Marco Zero em cada canto 9

Mônica Oliveira
acesso. A verdade é que a população A falta de
também não colabora”. Companhei-
ra de caminhadas, sua filha, Marcia acessibilidade
Souza, critica a falta de sensibilidade
das pessoas. “Quem pode andar sem prejudica qualquer
Falta acesso
dificuldades tem que lembrar dos
outros que não têm esse privilégio,
pessoa com
necessidades
à cidade
pensar no próximo. A falta de aces-
sibilidade prejudica qualquer pessoa
com necessidades especiais, sejam especiais, sejam
Calçadas irregulares e falta de permanentes ou temporárias. É um
rampas travam a vida de quem problema de todos. Pena que não é permanentes ou
tem dificuldade de locomoção pensado dessa forma”. temporárias. É um
em Itiúba, na Bahia O direito ao acesso à cidade
passa não apenas pela adequação problema de todos
Mônica de espaços públicos, mas também Márcia Souza

OLIVEIRA da conscientização da iniciativa


privada em planejar seus espaços a sua cadeira de rodas. Sem aces-
de convívio. Em grandes centro ur- so, foi atendida no corredor “Fiquei
Reportagem de Itiúba (BA) banos, a fiscalização de autarquias indignada. Tive que comprar uma
como Conselho de Engenharia ou cadeira mais estreita, não dá para
A falta de acessibilidade restringe a locomoção também de quem é da terceira idade de Arquitetura cobrando a aplica- passar na maioria das portas com
ção de normas técnicas de acessibi- uma cadeira comum”.

A
s belas ruas de paralele- técnicas que buscam ampliar o aces- subir sozinho, aí as vezes as pessoas lidade pode ajudar quem precisa de O outro lado – Segundo a Secre-
pídeos e as altas calça- so das pessoas com deficiência física ajudam”. uma cidade planejada, mas quando taria de Infraestrutura de Itiúba, no-
das da cidade baiana de e pessoas idosas à cidade. A falta de acessibilidade restringe se trata de pequenas cidades no in- vos projetos urbanos já são pensados
Itiúba tem se tornado um pesadelo Este é o caso de Edilson Olivei- a locomoção também de quem é da terior do Brasil, aí falta o rigor da de forma a atender as demandas e
para quem precisa de acessibilidade ra, 45 anos. Paraplégico desde os terceira idade, como Juarez de Sou- lei e o compromisso. Tetraplégica normas referentes à acessibilidade,
para se locomover. Ausência de ram- dois anos de idade, Oliveira encontra za, de 78 anos, que se sente inseguro há dez anos, Franciane Corrêia, 35 como calçadas estruturadas, corri-
pas e inúmeros degraus espalhados diariamente a dificuldade de circular de sair de casa sozinho. “Eu tropeço anos, relata uma cena de descaso mão e rampas. Exemplo disso são os
pelas regiões centrais do município, pela cidade por conta da irregularida- nas pedras e não consigo subir as que marca sua memória. Ela foi novos prédios públicos e as pavimen-
localizado a 318 km de Salvador, de das calçadas. “A gente tem que fi- calçadas. Às vezes tem rampa, mas a uma clínica para uma consulta tações recentes em várias ruas da ci-
agravam a situação e ferem das mais car procurando uma rampa e quando chega um carro ou uma moto e esta- e não pôde entrar no consultório, dade, já com toda estrutura física para
variadas formas as cartilhas e normas encontra, é muito alta. Não dá para ciona bem em frente, atrapalhando o pois a porta era muito estreita para atender às demandas dessas pessoas.

Marcelo Carlos
Á
rea de convívio
da juventude de
Valparaíso de Goiás,
a praça Central da Etapa A tem
se tornado o principal motivo de
preocupação da população do
município da região metropolitana
do Distrito Federal. Isso porque o
espaço público tem sido palco do
crescente aumento da criminalidade
e violência na cidade, motivado
principalmente pelo tráfico de
drogas. A praça, que já foi o reduto

Uma praça tomada


de jovens, virou um dos pontos
preferidos dos traficantes para a
comercialização de narcóticos.
O aumento do policiamento no
local e a retomada da segurança
e tranquilidade são algumas das
reivindicações dos moradores do
pelas drogas
bairro Valparaíso I, um dos mais
conhecidos da cidade goiana de
Moradores convivem com o Marcelo
200 mil habitantes. A praça, que problema social e pedem o CARLOS
há poucos anos era tomada pela
população que frequentava as reforço da segurança no local

Moro há 30 anos
nesta cidade, e Reportagem de Valparaíso de Goiás (GO)

neste momento População pede aumento de policiamento na praça


precisamos da agências bancárias, o comércio, ao local. “Muitos jovens deixam são constantes no ponto. Mas tão criminalidade.
a pista de skate e a escola, é de assistir uma aula para ficar ali logo finalizam as operações ou “Moro há mais de 30 anos
ajuda de todos para paulatinamente tomada pelo usando drogas. Este é um problema as rondas, os traficantes voltam nesta cidade, e neste momento
vencer essa guerra tráfico, em plena luz do dia. social que precisa da atenção das a circular e a tomar a praça precisamos da ajuda de todos
Uma professora, que pediu autoridades. Nós temos que salvar novamente. Para Antônio Braga, para vencer essa guerra contra
contra as drogas. para não ser identificada, reclama os nossos jovens e assegurar que 66 anos, seriam necessárias leis as drogas. A nossa Praça Central
que o espaço deveria voltar a eles tenham um futuro próspero mais rígidas para punir o tráfico, merece ser revitalizada pelo
A nossa Praça ser utilizado como um ponto de longe do uso dessas substâncias”, e ações permanentes. Segundo governo municipal, para atrair
Central merece ser diversão e entretenimento para ressaltou a educadora. o morador da Etapa A, próxima gente de bem com eventos,
os cidadãos. A escola onde ela Ações da Guarda Municipal, à praça, falta compromisso dos práticas culturais e esportivas”,
revitalizada leciona fica localizada em frente Polícia Civil e da Polícia Militar órgãos públicos no combate à critica Braga.
10 EaD: um Marco Zero em cada canto MARCO ZERO N.º 64 – Out/Nov de 2019

árvores.

Marcelo Assis
Para a engenheira florestal Daia- O espaço, que
ne Andrade, o tombamento do Horto
Florestal em Parque ajudará na cap-
chegou a ocupar
tação de verbas e na promoção do tu- o equivalente a 29
rismo ecológico com uma política a
longo prazo. A ação é contiuidade de campos de futebol,
Horto de Ibatiba uma série de atividades que buscam
garantir a revitalização e melhorias
hoje está reduzido a
perde 30% da 19 hectares
no horto, como acessibilidade ao
parque através de trilhas ecológicas.

reserva florestal
A medida ajuda a consolidar o a importância de aproximá-las, de
projeto de criação de uma estrada forma consciente, do parque.
que dará acesso a um núcleo cultural, O primeiro passo para isso já foi
Área considerada a segunda maior Marcelo
dentro da reserva, onde serão realiza- dado, com a criação de um conselho
floresta urbana heterogênica do ASSIS
dos trabalhos de conscientização so- formado por técnicos da área, que
bre a importância ambiental do par- em parceria com a prefeitura realiza-
país luta para sobreviver no estado que. Nesse núcleo, o visitante poderá rá estudo para sustentar o projeto de
do Espirito Santo conhecer a biodiversidade de vida revitalização do parque. Depois desta
animal existente. Segundo a enge- etapa, o projeto é apresentado às em-
nheira, pelo estado que hoje o parque presas que precisam fazer compen-
Reportagem de Ibatiba (ES) se encontra, muitas pessoas desacre- sação ambiental, conseguindo assim
ditam que ali possa existir vida. Daí uma parceria para a recuperação.
Municipalização e parcerias com iniciativa privada podem ser as soluções para a área

C Horto
riado há trinta anos para a ocupar o equivalente a 29 campos da área, Dias afirma que a medida
conter a erosão do solo de futebol, hoje está reduzido a 19 permite parcerias para ampliação do

turístico
nas encostas dos morros hectares. O prejuízo ambiental afeta espaço de árvores nativas e frutíferas,
na cidade de Ibatiba, no Espirito San- também as mais de 108 espécies de como as presentes em formações de
to, o horto florestal perdeu cerca de aves e mamíferos da região. mata atlântica, e retomar inclusive a
um terço da sua área devido a quei- A municipalização do horto é fauna no local. Para Dias, uma maior Use o Qr-code para ler um
madas e moradias irregulares na re- vista como uma das soluções para interação da fauna com a flora pro- pouco mais sobre a história do
gião. O espaço, montado com doação a situação, conforme destaca o bió- move uma reconstituição natural do horto e como ele foi planejado
de mais de 110 mil mudas de árvo- logo Leandro Dias. Integrante do horto, pois ao se alimentarem, os para combater as áreas
res nativas e exóticas, e que chegou grupo responsável pela revitalização animais espalham as sementes das ambientais degradadas na região

O
tombamento de 22

Rogério Lemos
prédios e monumentos
públicos pelo Instituto
do Patrimônio Histórico e Artísti-
co Nacional (Iphan) coloca Goiâ-
nia como a segunda cidade com
maior acervo de arquitetura Art
Déco do mundo. O estilo nasceu
na França e ganhou força em 1925
após a Exposição Internacional

Goiânia tem o
de Artes Decorativas e Industriais
Modernas.
O Art Déco, ou Arts Décorati-

maior acervo Art


fs, foi um movimento artístico que
influenciou a arquitetura, design,
mobiliário, moda e decoração.

Déco nas Américas


Representava os ideais de mo-
dernidade e progresso, com pre-
dominância de linhas verticais, e
influências do construtivismo, fu-
turismo e cubismo. O mundo todo Rogério Número de obras arquitetônicas
se encantou pelo estilo Art Déco
nos anos 30, mesma década em
LEMOS do estilo coloca a cidade
que foi fundada a capital do esta- brasileira atrás apenas de Miami
do de Goiás. Isso explica porque
os Art Déco foi o estilo escolhido
para compor as construções da
nova cidade planejada brasileira. Reportagem de Goiânia (GO)
O responsável pela opção foi o pri-
meiro urbanista brasileiro a se for- Ao menos 22 obras e instalações públicas foram tombadas como pertencentes ao estilo
mar em Paris, Atílio Corrêa Lima. panhados por ele, podem contem- de abandono ou vitimadas pelo Você sabia que o Cristo
O acervo Art Déco, da capital plar as belas construções no estilo vandalismo. Um alívio vem com
O mundo todo se goiana, é pouco conhecido pela e desfrutar de uma aula de histó- ações como a restauração da anti-
Redentor, no Rio de Janeiro,
também é um monumento Art
encantou pelo estilo maioria dos brasileiros, inclusive ria e arquitetura dos anos 30. Le- ga Estação Ferroviária de Goiânia, Déco? Temos outros exemplos
pelos próprios goianienses. O tra- mes dedica-se à divulgação desse marco simbólico da cidade e de de construções Art Déco espa-
Art Déco nos anos balho para reverter este desconhe- patrimônio desde 2004, quando seu acervo Art Déco. lhadas pelo Brasil, tais como: o
cimento é paulatino. O artista plás- montou a sua primeira exposição
30, mesma década Elevador Lacerda em Salvador,

Você
tico e guia turístico Gutto Lemes de desenhos dos prédios ícones do o Teatro Carlos Gomes no Rio
em que foi fundada é um dos atores neste processo.
Ele criou um roteiro turístico que
Art Déco na cidade.
Não é apenas o desconheci-
de Janeiro, a Biblioteca Muni-
cipal Félix Araújo em Campina
a capital do estado
de Goiás.
contempla os principais prédios e
monumentos da época da inaugu-
ração da cidade. Os grupos, acom-
mento que prejudica o acervo
arquitetônico. Algumas das cons-
truções se encontram em estado
Sabia? Grande e o Estádio do Pacaem-
bu em São Paulo.
N.º 64 – Out/Nov de 2019 MARCO ZERO Tecnologia 11

@TÁ NA WEB
Amanda
ZANLUCA

Especial
Vídeo-aulas

Foi-se o tempo em que al- Aprendendo Confira os vídeos


usando o Qr-Code
no Youtube
guém poderia dizer que estudar
na internet não é possível frente
ao excesso de entretenimento e de
informação. Isso mesmo, para os forma leve e divertida, os assun-
estudantes “reclamões” de plan- tos são agrupados por área de in-
tão, o Youtube tem a solução! teresse em vídeos que variam de
Um deles é o canal Descomplica. poucos minutos a horas de aulas.
Nele você encontra gratuitamente Um dos quadros mais interativos
vídeo-aulas de filosofia, sociolo- do canal é o “Quer que desenhe”,
gia, matemática, dicas de estudo, em que os assuntos são literal-
revisão de Enem, gramática e mente desenhados, facilitando, e
muito mais. Abordados de uma muito, o aprendizado.

Acesse pelo Qr-Code


o canal Nostalgia
Entender o para explicar a história mundial
e brasileira. Mesclando pequenos
passado episódios com produções espe-
ciais com vários minutos, como
nas séries sobre Ditadura Militar
no Brasil e a Primeira e Segun-
Que tal aprender história em da guerra mundial, o youtuber e
pequenos vídeos? Este é o pro- fundador do canal, Felipe Cas-
pósito de algumas aulas do ca- tanhari, tem conseguido atrair a
nal Nostalgia, um dos maiores atenção do público jovem, que
do país, com mais 12 milhões de busca por entender de maneira
inscritos. O pessoal do canal tem mais fácil os contextos históricos
empenhado parte do conteúdo da humanidade.

Use o QR-Code para


Para aqueles que querem ul-
trapassar a barreira da língua e en-
Poliglota conferir o canal
contrar o mundo a partir da cultu-
ra e da imensidão da informação
na rede
em língua estrangeira na internet,
a rede tem oferecido uma série de O canal “Inglês Winner”, do pro-
soluções. A internet tem sido re- fessor Paulo Barros, é um destes
almente uma mãe para quem não espaços gratuitos de aprendizado
tem tempo para ir em escolas de de língua estrangeira. No canal
línguas. E tem oportunidade para você encontra vários vídeos para
todos os gostos e bolsos. Aplica- aprender gramática, pronúncia e
tivos, newsletter, podcast e vários outras curiosidades sobre a lín-
outros canais e meios vem dando gua inglesa. Os vídeos dão conta
conta de tornar a galera bilíngue. de necessidade dos alunos do ini-
ciante até o avançado.
12 Ensaio fotográfico MARCO ZERO N.º 64 – Out/Nov de 2019

Traduzir-se
Poesia de
Ferreira Gullar Uma parte de mim
almoça e janta:
Ensaio de outra parte
Sabrina se espanta.
FERNANDES
Uma parte de mim
Uma parte de mim é permanente:
é todo mundo: outra parte
outra parte é ninguém: se sabe de repente.
fundo sem fundo.
Uma parte de mim
Uma parte de mim é só vertigem:
é multidão: outra parte,
outra parte estranheza linguagem.
e solidão.
Traduzir-se uma parte
Uma parte de mim na outra parte
pesa, pondera: - que é uma questão
outra parte de vida ou morte -
delira. será arte?

Você também pode gostar