Você está na página 1de 50
O TRABALHO DUCE Tie ee 4 A carga de trabalho dos professores A ccola aio mudou o suficiente pora « crianga de hoje. Tem-se uma criangu nova numa escola vaha (um pro- fessor do secundério) Noé dois capitulos precedentes, foram analisadas as caracteristicas da orga- nizac&o escolar a fim de ver como elas mnarcavam o trabalho docente, Contudo, toda uma parte da'realidade foi deixada em suspense, a saber, as tarefas concre- tas que sao atribuidas aos professores. Com efeito, 0 que faz um professor, exatamelate? Quaid so as condigSes de sua carga de trabalho? Ecomo ele a vé? © objetivo desse capitulo é fornecer elementos de resposta a essas questies. Pode-se analisar a carga de trabalho dos professores de um ponto de vista “administrativo”, ou seja, definida em contetidos e duracio pela organizacio escolar em fungio das normas oficiais (decretos, leis, convengdes coletivas, etc.) emanadas geralmente do governo e negociadas com as associagdes € sindicatos de professores. Pode-se também analisi-la sob o angulo das exi- géncias reais do trabalho cotidiano. Esses dois pontos de vista tracam a distin ao, ja usual na ergonomia (DURAND, 1996), entre a tarefa prescrita, tal como ¢ definida pelos “patrées” e objeto de regras explicitas (normalmente escritas) ea tarefa real tal como se realiza no processo concreto do trabalho As andlises que seguem procuram considerar estas duas perspectivas comple- mentares, sobretudo registrando 0 ponto de vista dos professores sobre seu proprio trabalho. Além disso, o que chamamos as “condigdes de trabalho”, dos professo- res corresponde a variéveis que permitem caracterizar certas dimensdes quantitativas do ensino: o tempo de trabalho diario, semanal, anual, 0 nd- mero de horas de presenca obrigatéria em classe, o mimero de alunos por classe, 0 salério dos professores, etc. Essas varidveis servem habitualmente para definir 0 quadro legal no qual o ensino ¢ desenvolvido; elas so utiliza~ das pelos estados nacionais para contabilizar o trabalho docente, avalié-lo € remuneré-lo. Sao estas mesmas varidveis que organismos como a Ocde ou Unesco utilizam para fazer comparacdes entre os professores de diferentes 444 paises. Contudo, ¢ importante deixar claro que essas condicdes nio devem ser vistas unicamente como exigéncias que determinam unilateralmente a atividade docente; elas s4o, do mesmo modo, recursos utilizados pelos atores para chegar a seus fins. Nesse sentido, a andlise do trabalho docente nio pode limitar-se a descrever condicdes oficiais, mas deve também empenhar-se em demonstrar como os professores lidam com elas, se as assumem ¢ as transfor- mam em recursos em funcio de suas necessidades profissionais ¢ de seu con- texto cotidiano de trabalho com os alunos. Este capitulo compreende duas segdes. A primeira segio procura inicial- mente definir a carga de trabalho docente bem como seus componentes e suas condicdes, segundo um ponto de vista principalmente quantitativo. Esta andlise mostra que as relagdes dos professores com os alumos constitui amago de sua tarefa, tanto em termos de tempo quanto de investimento sub- jetivo. A segunda seco, portanto, estuda os pontos de vista dos professores sobre suas relacdes com os alunos. 4.1. A carga de trabalho dos professores Quais sio, hoje, as condi¢des de trabalho de um professor, sua carga de trabalho, suas tarefas concretas, suas diferentes duracdes, sua variedade? Res- ponder a essas questes néo nada simples. Com efeito’as condicées de traba- lho dos professores sio muito varidveis de um pais a outro, mesmo que nos li- mitemos a indicadores gerais como o ntimero de horas trabalhadas, ao tama- nho das classes e os salérios. Além disso, como vimos em diversas ocasides, 0 ensino é um trabalho burocratizado cuja execucio é regulamentada, mas que também repousa sobre a iniciativa dos atores e que requer de sua parte uma certa autonomia. Neste sentido, esse trabalho é definido por regras administra- tivas, mas depende igualmente, ou mais ainda, da atividade responsavel ¢ au- ténoma dos professores ¢ de seu envolvimento com a profissio. Como muitas ocupagdes desse género, semiprofissionais, relativamente autonomas, basea- das em relacdes humanas ¢ que exigem um envolvimento pessoal do trabalha- dor, principalmente no plano afetivo, a docéncia é um trabalho de limites im- precisos e variéveis de acordo com 0s individuos e as circunstancias, ¢ também segundo os estabelecimentos e os quarteirdes € localidades. Desse ponto de vista, a docéncia é um trabalho que podemos denominar parcialmente flexivel, do qual alguns limites quantitativos e qualitativos depen- dem de muitos fatores. Dissemos “parcialmente elasticos” (e no completa- mente), porque algumas tarefas tém uma duracdo legal bem determinada pela organizacdo escolar (as aulas, a vigilancia na hora das recreacées, etc.) 4. A carga de trabalho dos professores Ourras tarefas podem variar quanto a duragdo e a frequéncia (encontros com os pais, reunides, preparacio da aula, correcées, etc.), pois elas dependem da experiéncia do professor, de sua rela¢3o com o trabalho, etc. Note-se ainda que as tarefas flexiveis sio regidas por certas normas. Por exemplo, os direto- res de escola, quando dividem as tarefas entre os professores, parecem consi- derar um “tempo médio”, dedicado pelos professores experientes a algumas tarefas regulares como as correcGes, a preparacio, etc., em funcio do nivel de ensino, dos grupos de alunos, da matéria ensinada, etc. Enfim, outras ta- refas parecem mais residuais ¢ ndo tém limites precisos. Por exemplo, pensar em seus alunos de noite, ver um filme para adolescentes para assimilar a cul- tura “jovem”, etc De fato, como em qualquer outra profissio, alguns professores fazem exata € unicamente o que ¢ previsto pelas normas oficiais da organizacio es- colar, a0 passo que outros se engajam a findo num trabalho que chegaa to- mar um tempo considerdvel, até mesmo invadindo sua vida particular, as noites, os fins de semana, sem falar das atividades de duragio mais longa, como cursos de aperfeicoamento, de formacio especifica, atividades parae colares ou sindicais, das associages profissionais, dos clubes esportivos para jovens, etc. Para além, todavia, dessas variacées individuais que traduzem di- ferentes relacdes com trabalho, procuremos fixar-nos nas linhas gerais‘da carga do trabalho docente, Note-se, antes de tudo, que es: Porque remeie a diversos fenémenos ~dos quais varios nao sio quantificaveis — que se intercruzam sem cessar e cuja influéncia reciproca € dificil ou mesmo impossivel de separar completamente. Eis os principais fatores que devem ser considerados na determinagio da carga de trabalho dos professores: nogao “carga de trabalho” é complexa * Fatores materiais e ambientais, como a natureza dos lugares de trabalho € 0s recursos materiais dispontveis, Por exemplo, a insuficiéncia de ma- terial adequado, a falta de equipamento informitico, a pobreza das biblio- tecas, a dependéncia dos horérios de transporte (em regides distantes), a insuficiéncia de recursos financeiros so fatores muitas vezes descritos pelos docentes de todos os paises e, obviamente, no Brasil, pois eles tor- nam muito pesada ou dificil a carga de trabalho. * Fatores sociais, cofho a localizac&o da escola (em meio rural ou urbano, num quarteirao rico ou pobre, etc.), a situacdo socioeconémica dos alu- nos e de sua familia, a violéncia reinante no quarteirio, a venda de dro- gas entre criancas, etc. + Fatores ligados ao “objeto de trabalho”, tais como o tamanho das tur- mas, a diversidade das clientelas, a presenca de alunos com necessidades especiais ¢ com dificuldades de adaptacdo e de aprendizagem, a idade dos alunos, 0 sexo, o nivel de maturidade, etc. + Fenémenos resultantes da organizacio do trabalho: o tempo de traba- Iho, o numero de matérias a dar, o vinculo empregaticio (regular, precé- rio, por contrato, etc.), a diversidade das outras tarefas além do ensino (a recuperacao, astividades paradidaticas, a tutoria ou a disciplina, a super- visGo, etc.), as atividades a noite, nos fins de semana, nas férias, etc. + Exigéncias formais ou burocraticas a camprir: observancia dos horé- rios, avaliacio dos alunos, atendimento aos pais, reunides obrigatérias, tarefas administrativas, etc. * Enfim, ha ainda os modos como os professores lidam com esses fend- menos € as estratégias que eles elaboram para assumi-los ou evité-los. Aqui temos que levar em conta a idade ¢ 0 tempo de profissio dos pro- fessores, sua experiéncia, como eles enxergam seu papel ¢ sua missio, seu sexo; pois as mulheres, que sio a maioria do corpo docente, muitas vezes tém que encarar uma dupla tarefa, no trabalho e em casa, etc. Ora, esses fatores nao somam-se, simplesmente. Eles também atuam em siner- gia, para criar uma carga de trabalho complexa, variada ¢ portadora de tensies diversas. Além disso, constata-se que varios desses fatores remetem a tarefas invisiveis que demandam igualmente a afetividade e o pensamento dos professores. Por exemplo, o fato de trabalhar com criancas pequenas, com alunos com difi- culdades de aprendizagem, adolescentes delinquentes ou violentos provoca exigéncias especificas que afetam a carga de trabalho. Diante dessas realida- des com que os professores se defrontam, pode-se falar ainda de “carga men- tal” de trabalho, resultado de dois fatores complementares: a natureza das exigéncias objetivamente exercidas pela tarefa ¢ as estratégias adotadas pelos atores para adaptar-se a elas. Bssas estratégias podem gerar um esgotamento quando os professores nao controlam seu ambiente de trabalho e se véem submetidos, por exemplo, a mudancas repentinas no niimero de alunos, uma reducio dos recursos disponiveis, etc E impossivel, no quadro desse capitulo, tatar com profundidade todos esses fendmenos. De fato, apenas no fim desta obra é que poderemos ter realmente uma vi- sii de conjunto da carga real de trabalho dos professores. Para fazer isto, nesta primeira se- Go, analisamos a carga de trabalho em seus aspectos quantitativos e confor- me seus diversos componentes. 144 4. A carga de trabalho dos professores 4.1.1. O tempo de trabalho e o mimero de alunos Na maior parte dos paises industrializados, o trabalho docente adminis- trado segundo um quadro legal bastante preciso em convenges coletivas fir~ madas entre os sindicatos de professores (ou outras associacdes representati- vas) € as autoridades publicas. © estudo desse quadro nos permite ter uma pri- meira ideia da tarefa docente em funcio do tempo de trabalho, das tarefas prescritas pela convenco, do tamanho e da composigdo das turmas de alunos. Contudo, devemos lembrar que esses elementos so apenas parcialmente im- postos, uma vez que sio objeto de negociacdes tanto em nivel nacional (acor- do provincial entre os agrupamentos sindicais ¢ o governo, decretos, leis, poli- ticas educativas, alocagdes de recursos, cortes orcamentarios, etc.) quanto em Ambito local (negociagSes com a prefeitura, a diregio da escola, etc.) Embora a carga de trabalho de um professor varie dependendo de diver- sas varidveis (pais, regides, ordenamento do ensino, qualificacées, categoria, etc.), esse trabalho comporta em toda parte a mesma estrutura bésica, Em todo lugar, duas varidveis—o tempo de ensino eo tamanho das turmnas— sio objeto de discuss6es, negociacdes e regulamentacées, pois, com os salérios Pagos ao pessoal da educacio, elas constituem os parimetros basicos a partir dos quais se estimam os custos da educagao e se avalia a carga de trabalho.dos professores. Estima-se também que elas tém efeitos sobre a educagio dada as criancas, efeitos que nem sempre sao simples, diretos e lineares, Para representarmos ¢ avaliarmos o trabalho docente—em termos quan- titativos — a comparacio entre os docentes de diversos paises pode ser util. Evidentemente, como diz o adagio, toda comparagio é malleita, ¢ isto ainda mais verdadeiro quando se comparam dados brutos, tirados de pesquisas macro- estatisticas, sem considerar o ambiente de trabalho, variacées, muitas vezes, importantes ¢ imdmeros fatores que influenciam o servico do pessoal escolar Sem contar os problemas de homogeneizagio dos dados que nem sempre re- metem a categorias idénticas ¢ que nao foram elaborados necessariamente segundo os mesmos procedimentos. E importante também constatar que es- ses dados sio, na maioria dos paises, negociados ou, no minimo, discutidos; determina-los é algo que se insere, portanto, num conjunto mais amplo que, as vezes, da uma certa coloracao ao valor atribuido as caracteristicas do traba- lho docente. Desse mado, por exemplo, em alguns casos, aceita-se turmas maiores de alunos se for prevista uma compensacio financeira. Ademais, 0 ensino ocupa relativamente poucas horas, mas é para turmas proporcional- mente mais volumosas; em outros casos, a carga de trabalho é globalmente pesada, mas os saldrios so mais elevados, etc. Portanto, émuito provével que haja um equilibrio geral das condicoes de trabalho e de emprego que dao sentido ao valor das variveis rela~ YU waoaino docente tadas aqui. Nao € nosso propésito explicitar aqui esse equilibrio, geralmente fruto do que os anglo-saxaos chamam de “trade-offs”; basta~nos lembrar que ele existe, ou, pelo menos, que é estudado pelos professores € sas asso- ciac6es sindicais e profissionais Apesar disso, os dados que pudemos levantar sio interessantes, pois per- mite situar melhor a carga de trabalho dos professores de diversos paises uns em relacdo aos outros. E importante assinalar que eles considerarn apenas normas que definerti o trabalho prescrito (em oposicio ao trabalho real) « ave se trata em todo caso de médias nacionais, podendo variar, quem sabe consideravelmente, de uma regio a outra num mesmo pats. Fora isso, os da- dos estatisticos a nossa disposicio limitam-se a alguns indicadores gerais: ta~ manho das turmas, a razo aluno/ professor, o tempo de ensino, a duracdo da Semana ¢ do ano escolar. Eles no permitem, portanto, obter uma ideia pre- isa ¢ refinada do conjunto dos componentes da carga de trabalho real dos professores. Interessa-nos aqui o tempo de ensino e o tamanho das turmas, duas dimensdes fundamentais da carga do trabalho docente. © tempo dedicado ao ensino com os alunos O tempo dedicado ao ensino propriamente dito, ou seja, a0 trabalho em aula com os alunos (independentemente da forma pedagogica utilizada), constitu o amago da tarefa docente. No quadro 7 reunimos as informacdes ‘mais recentes fornecidas pela Ocde a esse respeito. © quadro 8, por sua vez, apresenta a organizacio do tempo de trabalho docente segundo diversas du. ra¢des: dias, semanas, etc. © quadro 7 indica que, no ano 2000, conta-se entre os paises represen- tados nessa amostragem em média 792 horas de curso por ano para o ensi- no primério (802 horas em 1996), 720 horas por ano para 0 1” ciclo do se- cundério (728 horas em 1996) e 648 horas para o 2° ciclo do secundério (674 horas em 1996). O tempo legal de ensino, portanto, diminui em toda Parte na medida em que se passa das “pequenas” classes do primario is do 2" ciclo do secundério: 792. horas a 648 horas. Essas médias confirmam uma diferenca importante entre o ensino primério e 0 ensino secundétio. Com efeito, no primeiro caso, o ensino é geralmente em classe, em intera. S40 com os alunos, enquanto no secundario o trabalho em classe é mais in termitente ¢ globalmente menos volumoso no que diz respeito ao ensino formal propriamente dito. A partir da leitura do quadro 7, constata-se também que o tempo legal de ensino em presenca dos alunos (0 que se chama as aulas) varia consideravel- mente de um pais a outro. f verdade que 0 que constitui primario e 0 se- cundario — em termos de anos e de idade dos ahmos ~ varia de um pais a ou- 116 Quadro 7 - Niimero de horas de ensino por ano (1996 ¢ 2000)* Primario Primeito ciclo do secundirio * |Segundo ciclo do secundério , fileira geral indice de indice de indice de variagio variagio variacio 2000 1996 1996-2000 }2000 1996 1996-2000 [2000 __199 1996-2000 Suécia ya oom fa 576m a 528 m México 800 800 1182 1182 on m m m Islandia 29 om om 29° mom 464m m Japio 685 om om 57 mom 478m m Turquia 89° om om a a m sof om m Noruega 713° 713m 633611 4% 50s 505 a Portugal BIS 783 4% 595 614-8 sis 574 10% Finlindia 656 mom 570 mom 327m m Coreia 829 mom 565 mom 545m m Espanha 880 © 900 -2% 564m m 548" 630 -13% Hungria 583 S51 6% 555473 17% 555473 17% Dinamarca 640640 640 640 560560 » Franga 907 900__1% 639947 -1% 6m m * Tempo de contato liquido expresso em nfimero de horas por ano nos estabelecimentos piiblicos, por nivel de ensino ¢ indice de variagio entre 1996 e 2000, Primario Primeiro ciclo do secundério __| Segundo ciclo do secundario fileira geral indice de indice de variagao variagio 2000 1996 1996-2000 | 2000 1996 2000 1996 1996-2000 Ktdlia 748 748 n 612 612 n 612 61 a n Rep. Tcheca 650 635 2% 650 607 7% 621 580 7% Austria 68 684 an 658» 658 on 623 623 n Grécia 780 780 a 629 629 n 629 629 n Média dos paises 792 802__Na no 728 _Na 648674 a Bélgica (fr.) 804 808 6% 728 734 1% 668 677 1% Bélgica (fl.) 831 841 1% 716 4 -1% 671 679 1% Suiga 884 871 1% 859 850 1% 674 669 1% Alemanha 783 772 1% 732 71S 2% 690 el 3% - Irlanda 91S 91S n 735 738 n 735 735 n Australia 882 m n Bil m m 803 m m Holanda 930 930 a 867 867 n 867 867 a Escécia 950 975 -3% 893 m m 893 O17 3% Nova Zelandia 985 985 n 968 968 n 950 950 n Estados Unidos _1 139 958 19% 1127 964 17% 1121 942 19% Fonte: OCDE. Ver as nota, fontes © metodologias no ancxo 3 (www oecd org /els/education /eag2002) 4. A carga de trabalho dos professores tro, exatamente como a base de dados a partir da qual os pesquisadores da Ocde fizeram seus célculos, mas é preciso reconhecer uma grande variacdo entre os paises arrolados. Assim, se a Hungria exige 583 horas de ensino de seus professores do primario, os Estados Unidos, conforme a Ocde, exigem 1.139, 0 que vai do simples ao dobro. No primirio, os paises se situam entre extremos: um grupo de paises (Franca, Irlanda, Holanda, Escécia, Nova Ze- lindia ¢ Estados Unidos) exige um tempo de trabalho em presenca dos alu- nos de mais de 900 horas por ano dos seus professores, enquanto outro gru- po esta abaixo de 700 horas para a mesma atividade (Hungria, Islandia, Ja- pao, Turquia, Dinamarca, Republica Tcheca, Finlandia e Austria). Temos sen- sivelmente os mesmos grupos, com alguma variago, no primeiro e no se- gundo ciclo do ensino secundario. & preciso, provavelmente, ser muito pru- dente na interpretacdo desses dados € no referir-se as diversas situacSes na- cionais a fim de compreender bem 0 que esses ntimeros nos revelam sobre a tarefa dos professores. A esse respeito, note-se que o tempo de contato com os alunos (que é 0 indicador basico do quadro 7) nao corresponde ao mimero de horas dispen- sadas pelos professores porque em diversos paises a duracio das aulas inclui a preparacdo e acompanhamento das ligdes (sobretudo a correcio de trabalhos dos alunos). Além disso, também o mimero de matérias ensinadas e o mime- ro de ands durante os quais os mesmos professores se ocupam com os mes- mos altos so fatores importantes a se considerar na avaliacio da carga de trabalho dos professores. Por exemplo, um professor que muda de turmas de alunos a cada ano precisa necessariamente tomar um tempo suplementar para conhecé-los melhor. © mesmo acontece com o professor (geralmente 0s mais jovens) que tenham que preparar varias matérias a0 longo de uma semana normal de trabalho. Ademais, © quadro 7 nos permite ver que o tempo de trabalho em pre- senca de alunos nao passou por nenhuma evolucdo entre 1996 e 2000 exceto na Hungria (+6% para 0 primario e +17% para os dois ciclos do secund’- rio), a Republica Tcheca (+7% para todo © secundario), a Espanha (-13% para 0 segundo ciclo do secundario) e Portugal (-8% e -10% para o primeiro € 0 segundo ciclo do secundario) Quanto ao Brasil, infelizmente, nao nos foi possivel encontrar dados se- guros sobre 0 tempa passado pelos professores em presenga dos alunos. O Unico dado confidvel reportado pela Ocde diz respeito a0 tempo de ensino previsto para os alunos (0 que, com certeza, é diferente do mimero de horas que os alunos passam com seus professores), ou seja, 800 horas por ano no Brasil, enquanto a média dos paises da Ocde éde 829 horas. Sabemos, contu- do, que a situagio dos professores brasileiros é muito mais contrastante, pois 119 a maioria deles nao tem contrato de horério integral como os professores dos paises da Ocde (que trabalham de 35 a 40 horas semanais com contrato ex- chusivo), mas dois ou até trés contratos de 16 a 20 horas semanais cada um. Além disso, por causa desses contratos de meio periodo, diversos professores brasileiros precisam ensinar ao menos em dois estabelecimentos escolares para obter um salario minimamente decente. Isto significa, portanto, que precisam adaptar-se com varios grupos e tipos de alunos, com diversos esta- belecimentos e grupos de colegas, sem falar das diferentes matérias a prepa- rar. Em suma, podemos supor, embora sem dispo¥ de dados comparativos, que a carga de trabalho dos professores brasileiros é mais pesada que a de seus colegas da maforia dos paises da Ocde. O quadro 8 apresenta, por sua vez, dados anuais sobre o numero de se- manas, de dias e de horas de ensino, sobre o tempo de trabalho na escola em horas € 0 tempo de trabalho legal em horas. Este quadro 8 revela que a organizacao do tempo de trabalho dos profes- sores é mais uma vez muito varidvel conforme os paises, pois ele depende da legislagao em vigor em cada pais: alguns nao estabelecem qual o tempo obri- gatoriamente passado em classe, ao passo que outros definem também o tempo passado na escola; outros paises definem a divisio do tempo entre as demais atividades (correcées, planejamento, reunides, etc.) € as aulas em pre- senca dos alunos. Em varios paises (por exemplo o Japio, a Coreia, etc.) os professores sio considerados como funciondrios e seu tempo de trabalho cor- responde ao dos demais empregados do setor piblico sem maior precisio a respeito da duracdo de suas varias atividades. Em diversos outros paises, o tem- po de trabalho é regulamentado em ambito infranacional e comporta inti- meras variacGes entre as regides, estados ou provincias, como no Canada e no Brasil. Notam-se, igualmente, variacGes por estabelecimento e pelas tra- dicdes locais (prefeituras, conselhos escolares, distritos, etc.). Apesar destas variagGes, o quadro 8 fornece informacées titeis para estimar o tempo de trabalho docente de diversos paises e para analisar a situacio do pro- fessorado brasileiro quanto a isso. Pode-se extrair as seguintes informagoes: + Em média, o numero de semanas de ensino no primario e no secunda- tio é de 38 por ano, o que situa 0 Brasil acima da média com 40 semanas anuais; apenas o México e a Dinamarca 0 ultrapassam nesse ponto. + No que tange o mimero de dias de ensino por ano, a média no primério é de 189 dias e de 187 dias no secundirio. Contudo, alguns paises como a Dinamarca e 0 México estio com mais de 200 dias por ano, e a Coreia atinge até 220 dias de wabalho anual. Mesmo assim, verifica-se que a Co- 120 Quadro 8 ~ Organizagio do tempo de trabalho dos professores (2000) Niimero de | Nuimerode | Nimero liquido de horas | Tempo de trabalho na | Tempo de trabalho le- semanas de | dias de ensi- deensino escola em horas gal em horas ensino no | Priv Se- |Pri- Se- |Pri- Primei- Segundo |Pri- Pri Se-[Pri-Pri- Se 7 mi cun- {ma cun- |ma- rociclo ciclodo |mé- meio gundo|ma-—meiro_ gundo tio dirio |riodatio [rio dose- secun-_ |rio ciclo ciclo [rio ciclo ciclo cunda- diario, dose- dose- dose- dose- rio progra- cun- can cun-— cun- mma geral dirio _dirio | ___dario _dario Australia 40 40 | 196 196 | 882 81 803 a a a | 1310" 1.310" 1.310" Austria 3838 | 187187 | 684 «658623 | m= mom | a a Bélgica (f.) 37-37: | 178 «179 | 831716 671 oom om a a a Bélgica (ff.) 38 38 | 182 182 | 804 728 673 | 871) 734° 673° | a a a Rep.Tcheca 40 40 | 197 197 | 650 650 621 | 650° 650° 621 | 1.700 1.700 1.700 Dinamarca 42 42: | 200 200 | 640 640 560 a a a’ | 1.680' 1.680: 1.680! Inglaterra 38° «38 | 190 190} a a a a a a | 1.265? 1.265? 1.265? india «38-38 | 190 190 | 656 485-656 428-627] 964' 905 901" | a aoa Franga 35° 35 | mm } 907 639 611 | 907° 639° el | a a a Alemanha 39-39 | 188188] 783732690 | a ak | _ 1760" Nimero de | Niimerode | Nimero liquido de horas | Tempo de trabalho na Tempo de trabalho le- semanas de | dias de ensi- de ensino escola em horas gal em horas censino no _ Pri Primei- Segundo |Pri- Pri- Se- [Pri Pri Se- mi- rociclo ‘ciclodo |ma- meiro gundo|ma- — meiro._gundo rio dose- secun- |rio ciclo ciclo |rio ciclo ciclo cundé- diario, dose- do se- dose- dose- rio progra- cun-—can- cun-cun- ‘ma geral diario _dirio dirio _dirio Grécia 4038 | 195 185 | 780 629-629 | 1000’ 798° 798° | 1.s00' 1.425! 1.425' Hungria = 37,37] gs 185 | 777 555555 | a a | 1.664! 1.664! 1.668" Islandia 3838 | 170 170 | 629 629464 a a a | 1.800! 1.800' 1,800 Irlanda 3733 J iss 67 | 91s 735735 | a 73s! 738! to36! aa lia 3434 | mM | 748 612612 | mmm | kkk Japio 353s | 193 isa | 63s 55778 | a a a Vivg0" 1.940" 1.5408 Coreia 37 a7 | 220 220 | 829 56s 545 | a ak | 16" 1.613" 1.613" México 4242 | 200 200 | 800 1182 M | a a m | 900" 1.680’ m Holanda 40° 40 | 195 195-| 930 867 867 a a a | 1659" 1.659" 1.659" Nova Zelindia = «3939 | 197192 | 985 968 950. | 985? 96a 950°] 2a Nomegs 3838 | 90190 | 713,633,598 | ak zt! zie! aie! Portugal 34-34 | 163 163 | B15 595 SiS | 815" 595’ 515° | 1.596' 1.596! 1.596! Foedcia 3838 | 190 190 | 950 893 893" |1.075" 1.075" 1.075*} 1.153' 1.153! 1.153" Hspanha «37-36 | 176171 | 880 S6# 548 | 110 1.080 1.050] Lats" 1448" L418" Suécia aoafai ala a a |1.360" 1.360" 1.360'| 1.767! 1.767! 1.767! Suiga 3838 | mm | 884 859674 | 884” 859° 674 | om mm Turqua «-38-—a_—'| 180180 | 639639 S04 | 639° 639" so | ak Estados ‘Unidos’ 36°36 | 180) 180 [1.139 1.027 V.t2E [1353 1.371 1.3717] 1.353" 1.371" 1.371" Argentina 3838 | mom | os 8500755 | mom om fom mom Brasil 4040 | mm | 800 800800 | m om om] mm jo imegral tabalham um mineto de horas determinado por semana par receber seu silirio completo, Sea tempo eas outs aividades (a prepracio das alas, a5 provs, a reuse as tarefasainsratvs) ralzads na Os professores com pe de trballio compreende o ens escola ¢ fora dela 2. Os professores com perfodo integral sio obrigados a estar presentes na escola duiante um nimero determinado dle horas por semana par receber seu salirio completo. Seu tempo de trabalho compreende o ensino e as ovtras avidades (a preparac3o das aula, as provas, as reumibes eas tarefa administativas). Udy nimercide horas determinado deve ser passado na escola, 3. Os professores com periodo integral sio obrigadas a estar presentes nos estabelecimentos apenas durante um niimero determinado de horas (as horas de ensino © of intervalos entre as aula). Nio estio submetidos a nenhuma exigéncia relacionada 20 tempo que dedicam is outas atividades além do ensino, 44.0 tempo de trabalho dos profestores € determinado em nivel individual, em nivel local ou. ‘ensing eas outasatlvidades, 5. Tempo de trabalho legal dos trabalhadores do setor piblico. Na Coreia 0 tempo de trabalho €calculado untcamente por ano escolar 66 O miimero de semanas de ensino fot estimado.com base na média do PISA, O tempo de tabalho escolar é ealculado com base na declaraco dos professores quanto ao mimero de horas nas quals sua presenga na escola era obrigatia, Feat: Ocde, Ver as Fontes © metodologias no anexo 3 (www'.oved.org/els/education/eag2002). reia esté abaixo da média no nimero de semanas, que é 37. De fato, os professores coreanos trabalham no verio, mas no seu ritmo. + Por numero liquido de horas de ensino anual, sobe a 802 no primirio, a 729 horas para o primeiro ciclo do secundario e a 748 horas para o segun- do ciclo do secundirio. Trata-se, aqui, do tempo passado em contato com os alunos. © Brasil, com 800 horas em todos os niveis, situa-se acima da média nos dois ciclos do ensino secundirio. Como no quadro 7, observam-se ainda aqui varia¢Ses inaportantes, principalmente com os Estados Unidos, que im- poem 1.100 horas a seus professores no primarid e no secundario. + Faltam, infelizmente, dados de diversos paises para avaliar corretamen- te o tempo de trabalho escolar em horas numa base anual. A partir dos dados disponiveis, as médias sio de 936 horas no segundo ciclo do se- cundério. Trata-se aqui de horas de presenca obrigatéria na escola. Obser- va-se que alguns paises (Estados Unidos, Escécia, Grécia, etc.) exigem de seus professores um niimero obrigatério de horas de presenca na escola depois das aulas, enquanto outros paises (Dinamarca, Franca, Portugal, etc.) no impGem exigéncias desse tipo: os professores podem deixar seu estabelecimento apés o término das aulas com os alunos. Isto signifi- ca que eles tém a liberdade de terminar suas outras tarefas (correcées, projetos pedagégicos, etc.) em casa. + Finalmente, os iiltimos dados concementes ao tempo de trabalho legal em horas anuais, que é de 1.541 no primério e no primeiro ciclo do se- cundario e de 1.526 horas no segundo ciclo do secundario. Se dividir- mos estas horas pelo mimero de semanas anuais, obteremos uma média de trabalho de 40,5 horas semanais para 0 conjunto dos paises. Com estes dados sobre o tempo de trabalho, abordaremos 0 outro grande fator que influencia diretamente a carga de trabalho dos professores, a saber, 0 tamanho de suas turmas € o nimero de alunos aos quais eles precisam ensinar. O tamanho das turmas de alunos Os dados que obtivemos do relatério mais recente da Ocde (2002) sio apresentados no quadro 9 e no quadro 10. De maneira geral, analisando os relatorios da Ocde sobre esse indicador (o tamanho das turmas), observamos que a média diminuiu desde uns 20 anos, resultado tanto da evohicio demo- grafica em queda nos paises da Ocde quanto, também, das prioridades dos professores na negociacio e determinacio de suas condigdes de trabalho junto aos empregadores. Na Franca, por exemplo, o tamanho médio das classes das escolas elementares publicas passou de 30 em 1960 a 23 em 1994 € menos de 20 em 2004, o que representa uma diminuicio substancial, 124 Quadro 9 ~ Tamanho médio das classes nos estabelecimentos puiblicos e privados, por nivel de ensino (2002) Calculos baseados no miimero de estudantes e de classes Educagio priméria Primeiro ciclo do secundario ee (programa geral) Instituigdes | Instituigdes TOTAL: Institut |Instituigdes |Instituigdes | TOTAL: + |pabticas | privadas de-| privadas inde- | instituigGes | Ges pa- | privadas de-| privadas | Instituigoes pendentes |pendentes —|piblicase |blicas fpendentes indepen- | piibticas EZ do governo privadas do governo |dentes - Q) Q) |) (5) (6) @) (8) Paises da oEcD _ — a Austedlia’ 24,9 _ a 25,0 | 23.6 22,2 a 23,5 Austria 20,0 | 212 m 201 | 23,8 24,8 x(6) 23,9 Bélgica _m| om m m m m m m Belgica (fr.) 20,0 21,0 a 20,4 | 241 ag | a 21,6 Canada m m m m_| om m | m m Reptiblica “Teheca 21,3 16,8 a 243+ | 23,3 20,9 a 23 Dinamarca 19,4 16,7 a 191 | i9a 178 a 18,8 Finlandia m m a mim] oom] oa m . CAlculos baseados no mimero de estudantes ¢ de classes ‘Educagio primaria Primeiro ciclo do secundirio _ | (programa geral) nstituigdes JInstituigées [Instituigdes [TOTAL: | institai- JInstiuigdes |Intituigdes | TOTAL: pablicas | privadas de- | privadas inde- | Instituigdes | ges pa | privadas de-|privadas | Instituigies pendentes [pendentes | piblicase |blicas|pendéhtes |indepen- | pablicas do governo privadas Jdo governo |dentes __| privadas _ a QQ} @). w (5) (6) @). (8), Paises da ‘oncD. _ | Franca 23 a 22.6 25.0 13,1 243 Alemanha 22,2 _x(2) 222 260 | _x(6)_| 247 Grécia 172 us 17,5 a 26,0 | __ 23,0 Huugria 20s | 19,5 a 20.4 27 a aa | Islandia 179 | 18.8 8 12.9 w7{ on 19,1 Iulanda 242 m | om m m m m tila | a | 183 a at 20,8 lfapio | 28,7 a 343 238 a | 367 343 Coreia 35,7 a 34.8 35,7 36,5 a Lavxemburso 15.6 13 176 157 20,5 18.8 19.9 México 20,6 a _ 28 | we | 299 a | 287 | 7 29.8 Holanda x(4) x4) x) | 23.9 | om | im BS ~ Nova Zelindia m m m m{| om m m mn Noruega m m m m| im m m m Polonia 21 14 11 20,9 | 24,5 ia | 243 Pongal 18,7 a 23.0 int | igo | a | 82 |e Repiblica” flava 20,8 203 a mwa | 233 we | a spanba 19.4 9 22.5 209 | 244 28, Bs suécia m m m m | m m | om| om Suga 19,7 14.9 16.6 19,6 | 187 iss | 162 13,6_| [Turguia 29,6 La 20,2 29.4 a al| a al Reino Unido 26.0 a m m | 247 m| om m Estados Uni- . dos 20 a 19.6 a7 | 23.2 al 138 22.6 ‘Média dos 19 20,1 22 18 23,6 23,3 Ut 23,7 |paises _ - Cilculos baseados no nitmero de estudantes ¢ de classes = a Educagao prim: Primeiro ciclo do secundario - (programa geral) Instituigdes flnstiuigses fInstimigées [Torat: — |instiui- [insutuigses |i ices [TOTAL ppablicas | privadas de-|privadas inde- | mstituigdes | ges pa- | privadas d privadas | instituigGes pendentes [pendentes |pablicase [blicas | pendentes jinidepen piilicas, do governo privadas do governo |dentes __|privadas ss o Q) QB) * (a) (5) () | @ __(8) Paises asso- | ciados _| | Brasil! BI2 a 18,6 261 | 34,7 a 27.0 33,7 {Chile 32,8 36,0 24,0 32.9 | 323 355 | 253 | 32,6 | Fgito 415 36,7 35,6 409 | 443 410 | 320 43,5 | india x(4) x(4) x(4) 40,0 | x(8) x(8) |! ay 40,0 Israel 25.6 _a a 25,6 | 31,0 a a 31,0 Jamaica 343 m m mf 324 m mf m Jordénia 28,8 a a8 28,5 | 30,7 a 30,2 30,6 Malisia! 32,9 a a 32,9] 371 a a 37,1 Paraguai’ “iat 221 16,7 18,3 | 27,7 2S 94 | 263 Peru! 19,5 30,5 17,0 19,5 | 35,2 |. 37,9 23,2 33,3 Filipinas |, 40,3 a 324 39.7 | 53.7 al 449 S16 Sei Lanca 26.2 m hn m | 298 m a m Tallin 23.2 52,1 a 25,1 | 366 32,7 a 36,3 Tunisia 28,3 a 251 28,2 | 33,5_ a 19.8 33,1 Uniguai’ | 194 a m mi | 25 = 268 ze Hota: x indica que os dados estio em outra coluna, A referéncia 3 coluna aparece entre paréncests depois do "x", i. €.x(2) significa que os dados esto incluidos na coluna 2. 1. Ano de referénela 2001 Estabelectmentos piblicos apenas, sto incluidas as classes que agrupam mais de um ano. (poses esto closes em orem descent do twmnanbo mio das less no primeira ciclo do esi eco Fonte: Ocde. Quadro D2. Ver as notas no anexo 3 (www.Oede.org/els/education//e4y2002) VU ewaine aocente Quadro 10 — Nitmero de alunos por professor nos estabelecimentos de ensino publicos e privados, por nivel de ensino e expressos em periodo integral equivalente (2000) Pré-pri- ’| Primario | 1° ciclo do! 2° ciclo do| Conjunto mario secunda- | secundé- | do secun- | rio rio dario i.) 2 | @ (4) (5) Australia’ m 17,3 m m 12,6 Belgica = 15,0 15,0 97 9,7 97 Canada 18,1 18,1 18,1 19,5 18,8 Repiblica 13,1 19,7 14,7 ILS 13,1 Tcheca Dinamarca 6,6 10,4 114 14,4 12,8 Finlandia 12,2 16,9 10,7 17,0 13,8 Franca 19,1 19,8 14,7 10.4 12,5 Alemanha 23,6 19,8 15,7 133 15,2 Grécia 15,8 .| 134 10,8 10,5 10,7 Hungria 11,6 10,9 . 10,9 11,4 11,2 Islandia 5,4 12,7 12,7 9,7 m Trianda 15,1 215 15,9 15,9 15,9 Italia 13,0 11,0 10,4 10,2 103 | Japao 18,8 20.9 16,8 14,0 15,2 | Coreia } 23 32,1 21,5 20,9 22 | Luxemburgo* 20,2 15,9 x(5) X(5) 9,2 México 224 27,2 34,8 26,5 31,7 Holanda 16,8 16,8 17,1 17,1 741 Nova Zelandia 7,5 20,6 199 13,1 16,3 1, Compreende apenas os programas gerais para o 1° ¢ 2° ciclos do secundario 2, Estabelecimentos pablicos, apenas 130 4. A carga de trabalho dos professores Noruega | m 12,4 99 | 97 m | Polénia 13,1 Yi7 11,8 16,9 15,5 | Portugal 16,4 | aa 10,4 ajo 9.0 | Republica | | Eslava 10,1 18,3) | 3.8 12,8 13,2 Espanha 16,1 | 14,9 11,9 11,9 119 Suécia M 12,8 12,8 15,2 14,1 Turquia 16,0 30,5 M 14,0 14,0 Reino Ynido*'| — 21,0 21,2 17,6 12,5 14,8 | Estados Unidos 18,7 15,8 | 16,3 14,1 15,2 Média dos paises , 185 17,7 15,0 13,9 14,3 Argentina’? 19,9 22,7 | 13,2 9.0 11,2 Brasil” 18,5 26,6 | 34,2 38,7 35,6 © tamanho das classes é uma questio importante em todos os paises da Ocde. De maneira geral, as classes menos numerosas sio privilegiadas pelos professores porque sua carga de trabalho torna-se menor e, sobretudo, eles podem dar mais atencdo a cada aluno. Onde.os pais podem escolher o estabe- lecimento, as classes menores constituem, geralmente, o fator que eles con- sideram. Contudo, é preciso ter muita consciéncia que toda reducio do nt- mero de alunos por turma traduz-se num aumento de custos da educasio, pois é necessario envolver mais professores. Obviamente, o tamanho das tur- mas de alunos deve ser relativizada a luz de outros fatores, como o recurso mais generalizado a professores auxiliares qualificados. Além disso, quando alunos em dificuldades de aprendizagem ou com problemas de comporta- mento se integram nas classes regulares, a tarefa do professor se altera, mes- mo que 0 mimero de alunos continue o mesmo ou até diminua. Para o primério, o tamanho médio das classes varia muito conforme os paises da Ocde: passa de 36 alunos por classe na Coreia a menos de 20 alunos na Dinamarca, na Grécia, na Islandia, na Itdlia, em Luxemburgo ena Nome- ga. No primeiro ciclo do ensino secundario; a média fica entre 38 alunos por 3. Ano de referéncia: 1999. @ curma na Coreia e menos de 20 alunos na Dinamarca, na Finlandia, na Islan- dia, em Luxemburgo e na Suica (ver o quadro 10) ‘Também se pode observar que o ntimero de alunos por classe aumenta em média duas unidades do ensino primirio para o primeiro ciclo do ensino se- cundirio. Na Espanha, na Grécia, no Japao e em Luxemburgo, a média de alu- nos por classe aumenta mais de quatro unidades entre esses dois niveis de ensi- no, enquanto a Australia, a Dinamiarca, a Irlanda, a Suica e 0 Reino Unido apre- sentam uma dimixtuicio do numero de alunos por classe do primario ao pri- meiro ciclo do secundirio (cf. o quadro 9), Em 9 dos 20 paises da Ocde, as classes do setor publico contam, ao menos, trés alunos a mais do que as do se- tor privado no primario, As diferencas sdo menos acentuadas no secundério, embora o tamanho seja menos importante nos estabelecimentos privados. Além disso, como indicado no relatério da Ocde (2002, p. 316): No ensino primario, o ntimero de alunos por professor em e- quivaiente periodo integral varia de 32 alunos na Coreia a 10 na Dinamarca, sendo a média da Ocde de 18 alunos por pro- fessor neste nivel. As disparidades na taxa de enquadramen- to entre os paises sto ligeiramente mais acentuadas no ensi- no secundario, Assim, contam-se mais de 21 alunos por pro- fessor em equivalence periodo integral na Coreia e no Méxi- co, mas menos de 11 alunos por professor na Bélgica, na Grécia, na Itdlia, em Luxemburgo e em Portugal. No ensino secundario, a taxa de enquadramento médio da Ocde é de 14 alunos por professor, o que se aproxima das taxas obser- vadas na Alemanha (15), nos Estados Unidos (15), na Fin- andia (14), no Japao (15), na Poldnia (15), no Reino Unido (15), na Suécia (14) e na Turquia (14), Enfim, note-se que no ensino pré-primario o numero de alunos por pro- fessor é, geralmente, inferior ao do ensino primario, mas levemente superior ao do ensino secundério. Reconhecamos que ¢ dificil tirar conclusées precisas do conjunto dos da- dos apresentados nos grificos e quadros precedentes sobre a carga de traba- Tho dos professores nos diversos paises da Ocde, Como jé dissemos anterior- mente, é provavel que a carga de trabalho dos professores acabe equilibran- do-se por causa de fendmenos como a remuneracio, a relacdo entre os grupos mais pesados e a duracio do ensino, etc. Fiquemos com os seguintes pontos: os professores do primario passam mais tempo em classe, ao passo que, quanto mais subimos para os ciclos do secundario, mais esse tempo diminui: o tempo legal de ensino varia de maneira consideravel de pais a pais, indo do simples ao dobro se considerarmos os casos extremos; enfim, desde uns vinte anos, a média de alunos por classe tem diminuido na maioria dos paises da Ocde {32 4. A carga de trabalho dos professores 4.2. Os componentes da tarefa dos professores Os dados acima sao ainda muito globais para dar uma ideia exata da car- ga de wabalho. Com efeito, o ensino € uma ocupacio cada vez mais comple- xa que remete a uma diversidade de outras tarefas além das aulas em classe. E, portanto, necessdrio tentar avaliar o impacto desse fenémeno sobre a carga de trabalho. Infelizmente, nao foi possivel obter dados quantificéveis e re- centes a respeito de todas as tarefas docentes. Bssa auséncia de dados se expli- ca, principalmente, porque existem poucas pesquisas precisas sobre esse assunto. Explica-se também, como dissemos, pelo carter parcialmente elas- tico da tarefa dos professores que é, por definicao, dificil de quantificar. Por exemplo, o fato de um professor pensar num aluno em dificuldades num fim de semana ou em problemas disciplinares que ele experimenta com um gru- po dé alunos dificilmente ¢ mensuravel em termos de quantidade, mas nio deixam de constituir exemplos de carga informal de trabalho. Enfim, essa au- séncia de dados também se explica pela resisténcia manifestada pelos profes- sores € suas associacées diante de uma visio muito quantitativa e parcial de seu mabalho: por definicdo, a reivindicagio de uma autonomia profissional é amplamente refrataria 4 mensuracio quantitativa do tempo e ao enquadra- mento preciso do trabalho; tata-se de um comportamento bisico que orien- ta toda a relacio com a profisséo e a relag’o com o tempo contivel. 4.2.1, Tarefas diversificadas Tanto ao longo de uma jomada tipica de trabalho quanto durante um ano escolar, um professor convocado a realizar diversas outras tarefis além das aulas, Essas tarefas so, principalmente: a recuperacdo, as atividades para- escolares, a tutoria ou o enquadramento disciplinar, a vigilancia, o papel de conselheiro pedagégico, a superviséo de estagiarios no magistério, a super- visio de professores em treinamento, a liberacio para atividades sindicais ¢ 0 tempo a disposicao da escola. Seria necessdrio acrescentar a esta lista as se- guintes tarefas: os encontros com os pais, os periodos de preparagio das au- las, a corregio e a avaliacdo, a participacdo as jornadas pedagégicas, o aper- feicoamento, bem como outras atividades prescritas pela convencio coleti- va, como a participacio em diferentes comissées, até mesmo 0 voluntariado, Passemos a uma descrigdo sucinta dessas diversas tarefas. As aulas em classe com presenga dos alunos Na maioria dos paises, 0 ato de ministrar aulas em classe € 0 unico ele- mento comum a todos os docentes do primério e do secundario. Embora esse ato constitua o imago da tarefa docente, seria um engano achar que tra- 182, U trabaino docente ta-se de uma atividade simples, unificada ¢ linear. Como veremos mais em detalhe nos capitulos 6 e 7, dedicados a esta questo, uma aula é uma ativida- de complexa, dinamica, na qual interferem diferentes tarefas, as vezes, im- plicadas umas nas outras. Tradicionalmente, essas tarefas sio'divididas em duas grandes categorias (DOYLE, 1986; SHULMAN, 1987). Uma primeira categoria engloba as atividades ligadas 4 gestio da classe. Nault (1994:102ss.) da uma descricio sistematica sobre isso. Esta categoria aborda, primeiramenie, as tarefas que correspondem & organigasio social da classe, ou seja, a realizacio de rotinas e o cumprimento de regras que asseguram 0 funcionamento coletivo dos alunos. Por exemplo, o professor define suas ex- pectativas em relacio aos alunos, bem como 0 seu papel: indica claramente as medidas que serio tomadas se as regras nio forem respeitadas, distribui os lugares dos alunos, apresenta o programa de trabalho etc. Em segundo lugar encontram-se as tarefas que correspondem 4 organizagdo diddtica ¢ material da aprendizagem: as formas de trabalho (em grupo, individual, etc.), os momentos de dar as notas, a divisio do trabalho, a utilizacio de livros, cadernos, etc. Enfim, em terceiro lugar, hé as tarefas relacionadas ao controle da turma e de suas atividades. Por exemplo, o professor se desloca frequentemente na sala, percorre-a com o olhar, intervém imediatamente em caso de problemas disciplinares, escreve claramente as instrugées, acompanha a transi¢io nas mu- dancas de atividades, etc. Nault elenca, assim, 70 atividades desta natureza. Uma segunda categoria de tarefas diz respeito ao ensino e & aprendiza- gem da matéria (MALO, 1997; NAULT, 1994). Bla engloba o planejamento a longo, médio e curto prazos (ano, periodo, dia) da matéria, sua separacao em sequéncias hierarquicas, as transformacées da matéria conforme o plane- jamento e a aprendizagem que consideram as preocupacées afetivas dos alu- nos, sua motivac&o, seu nivel, sua heterogeneidade, etc. Encontram-se ai, também, tarefas como a escola de exemplos, a reflexdo sobre os principais conceitos, a preparacio de tarefas adequadas, a consideraco dos conheci- mentos anteriores dos alunos, etc. Na realidade, é dificil, para o docente, separar essas duas categorias de ta- refas (a gestio do grupo eo ensino da matéria propriamente dito), pois elas estio estreitamente ligadas durante o desenvolvimento de uma aula. Como ela é “transmitida” a uma coletividade de alunos em interacio com um pro- fessor, a matéria a ensinar deve ser “interativa” (SHULMAN, 1986) a fim de que, uma vez transformada, passe a ser matéria ensinada (CHEVALLARD, 1985). Além disso, as interagdes com os alunos cobrem um amplo espectro de atitudes: fisicas, verbais, emocionais, cognitivas, morais, etc. Nos capitu- los seguintes, voltaremos a essas tarefas com mais detalhes. 134 4. A carga de trabalho dos professores. A preparacdo das aulas Se 0 ensino propriamente dito ocupa 0 essencial do tempo do professor, é preciso vincular a essa atividade central a preparacio das aulas. Na América do Norte, o tempo de preparacio ¢, em geral, de 30 a 40min/dia para o pri- mério, mas ele varia conforme as escolas. As convencGes coletivas perrnitem, muitas vezes, aos diretores de escolas agirem de acordo com seu discerni- mento no que tange a alocagio de periodos de preparagio. A média é de um periodo por dia nas escolas que funcionam em regime semestral e de dois periodos sobre oito nas escolas cujo regime nao é semestral. O tempo de preparacio pode transformar-se rapidamente em intercam- bio com os alunos ou em comunicacio com os colegas ou pais. Assim, con- forme.a ordem de prioridade estabelecida, os professores do secundirio po- dem ser obrigados a ceder seu tempo de preparacio para atender a outras ur- géncias. Além disso, um percentual mais elevado de professores que de pro- fessoras, em todos os tipos de ensino, afirmam dispor de tempo suficiente de preparacao durante o dia, embora todos e todas, na maioria das escolas, go- zem de um periodo semelhante. Essa diferenca entre os homens ¢ as mulhe- res remete claramente a sobrecarga de trabalho das ltimas, que continuam a assumir as responsabilidades familiares. As tarefas escolares fora das horas normais de trabalho: o trabalho elastico e o trabalho invisivel Anite, nos fins de semana, ou nas férias, muitas vezes os professores se ocupam com diversas atividades ligadas a seu trabalho: preparam aulas, deve- res de casa, documentacio, 0 material pedagégico e as provas, assumindo, a0 mesmo tempo, a correcio dos trabalhos dos alunos. Procuram também os pais, para solicitar sua colaboracio. Muito poucos professores afirmam nio fa- zer nenhuma corresao; no Canada, 25% dedicam mais de 11 horas por semana as tarefas escolares depois das aulas, 30% Ihes dedicam de uma a cinco horas e 40%, de seis a dez horas. Além disso, a fim de manter a aten¢io dos alunos em dasse, os professores precisam também familiarizar-se com suas preferéncias e seus gostos. Para isso, entre outras coisas, precisam olhar alguns programas te- levisivos e assistir filmes para criancas e adolescentes. Essa atualizaco do gosto das criancas € dos jovens permite atrair o interesse dos alunos. Nesse sentido, 0 trabalho fora do horario Was aulas se justifica por diversas raz6es, sobretudo para a adaptacio constante do ensino para torna-lo mais interessante € mais" pertinente. Ademais, devido aos componentes emocionais da relagio com os alunos, nem sempre é facil ou mesmo possivel desembaracar-se completa mente de alguns cuidados fora do tempo de trabalho. © trabalho docente As atividades paraescolares O tempo que passam com os alunos fora da classe fornece aos professo- res ocasido de interagir de maneira informal com eles e de desenvolver rela- Ges positivas e enriquecedoras com eles. No Canad, 40% (primirio) a 45% (secundario) dos professores participam dessas atividades: esportes diversos, lazer, atividades culturais, campeonatos, competicées diversas, etc. Por ou- tro lado, estas atividades ndo podem tornar-se excessivas. As horas e a ener- gia empregadas a essas atividades somam-se as exigidaspor todas as outras obrigacGes associadas ao ensino. A avaliagdo dos alunos Nao dispomos de dados quantificdveis sobre esse aspecto do trabalho. Contudo, os dados de nossas entrevistas e observagdes permitem identificar uma constatacio geral quanto a avaliacdo dos alunos: nao se trata, absoluta- mente, de uma atividade mecanica que consista unicamente em contabilizar notas; pelo contrario, a avaliagio parece corresponder a um processo social bastante complexo em que o julgamento profissional dos professores se con- fronta com uma multidio de critérios, expectativas, necessidades, normas ¢ dificuldades. Nesse sentido, a avaliacdo é uma operacio dificil. Ela faz apelo a critérios socialmente partilhados. Inicialmente, existem tensGes entre os professores e os outros grupos (pais, o mundo dos negécios, direcao, alunos, etc.) em razio dos diferentes modos como estes interpretam e utilizam as notas dos alunos. O proceso de avaliaco forca os professores a encontrar um justo equilibrio entre essas demandas e as necessidades dos alunos. Por exemplo, as expectativas dos pais sobre seus filhos aparece claramente no momento da entrega dos boletins escolares. Em seguida, os professores indicam que utilizam diversos critérios no momento de avaliar os alunos e que os adaptam conforme o ciclo de ensino €, no caso dos ciclos superiores, de acordo com os planos de estudo para de- pois do secundario. A maneira de avaliar os alunos seria, amplamente, fun- cio do encaminhamento escolar previsto ou antecipado pelo e/ou para o aluno. No maternal, os professores se baseiam em larga medida na observa- cio para avaliar os alunos e tendem a privilegiar o método de registro ocasio- nal do comportamento do aluno para informar aos pais. No segundo ciclo do primario (4° a 6° ano), os professores tendem a considerar uma variedade maior de fatores na sua avaliacdo: 0 esforco do aluno, os exames, os deveres de casa, as atividades de classe e os cadernos de exercicio. O comportamento em classe (participacio, colaboracao e atitude) também é importante para 60% entre eles. Além disso, os professores tém a tendéncia a ver a aprendiza- 136 4. A carga de trabalho dos professores. gem da lingua materna e das matematicas como a base do desenvolvimento das competéncias nos alunos, atribuindo, portanto, uma importincia maior a essas matérias, Esse iiltimo ponto é corroborado pelos dados que temos a propésito dos programas escolares e da hierarquia entre as matérias. No inicio do secundirio (7° ao 9° ano), em todas as matérias, a maioria dos professores consideram que o esforco tem um papel maior na avaliacio dos alunos que os resultados objetivos dos controles e das provas. Os profes- sores do primeiro ciclo do secundario, que entram em classe por turnos, se confrontam com o desafio de encontrar um método de avaliagio apropriado ao fato de que suas relacdes com cada um dos alunos sio menos frequentes. Finalmente, no fim do secundario (10° ao 11° ou 12° ano), os professores ponderam diferentemente 0 conjunto dos fatores anteriormente identifica~ dos. Os resultados das verificacSes e dos exames cumprem um papel mais importante no processo de avaliaco dos alunos que se dirigem 4 universida- de. Quando avaliam os alunos do segundo ciclo do secundario que ndo estao se preparando para estudos universitirios, os professores tm em conta um conjurito de fatores semelhantes aos aplicados pelos do 7° ao 9° ano. Dio mais importancia as atividades sociais, mais particularmente no dominio da muisica, da educacio fisica e das artes. Acrescentemos a esses elementos de anilise o fato de que as atividades de avaliacio variam também conforme as matérias. No secundério, por exem- plo, os professores da lingua materna devem corrigir grandes quantidades de textos e fazer varios comentarios ¢ indicacées a fim de fomnecer aos alunos re- tornos significativos € proveitosos sobre seu aprendizado, seu progresso e seus erros, Mas em outras matérias (ciéncias, matematicas, etc.), a avaliacio se limita, as vezes, a provas padronizadas, em que basta somar os pontos. Em resumo, verifica-se, portanto, que as atividades de avaliacéo nio se limitam a dar notas em alguns momentos determinados pela burocracia es- colar. Trata-se, pelo contrario, de atividades complexas, continuas, que to- mam formas diversas; elas se baseiam em diferentes critérios e dio lugar a tratos significativos com os alunos, os pais, os administradores escolares ¢ a sociedade em geral, pois, ao serem registradas, essas avaliagdes servem para comparacées de rendimento das escolas O aperfeigoamento Outra atividade importante na qual os docentes investem muito tempo € © aperfeicoamento. Os professores da maioria dos paises tém acrescido de modo significativo sua escolaridade ao longo das uiltimas décadas. Por exem- plo, no Canada, no espaco de apenas 20 anos, 0 conjunto do corpo docente 197 aumenta sua escolaridade em média 0,88 ano; os progressos mais importan- tes se realizam no primério (1,22 ano), seguidos do maternal (0,86) e do se- cundario (0,65). Em 1965, a escolaridade média do pessoal docente era de 15,4 anos; em 1986, era de 16,4 anos, ou seja, um pouco mais do que um primeiro ciclo universitério; no secundirio, est4 muito perto de chegar aos 17 anos (16,9). Em 2002, ela é de 17 anos para todos os novos professores. Em suma, percebe-se que os professores, além de sua semana normal de tra- balho, tém investido. um tempo consideravel em sua formacio ao longo das décadas. Fendmenos semelhantes se encontram na mafbr parte dos paises, pois em toda parte as exigéncias basicas para a formacio docente estio subin- do. Seu aperfeicoamento acontece de diversas formas: jornadas pedagdgicas, congressos, coléquios ou conferéncias, aperfeicoamento universitério, es gios, autoformagao, aprendizado com os colegas, etc. © auxilio profissional mituo Também 0 auxilio profissional mituo faz parte da tarefa dos professores, embora, geralmente, de um modo informal. £ preciso incluir nestas ativida- des de mitua ajuda profissional o apoio aos professores novos € a supervisio dos estagiarios, Essas atividades, quando cumpridas com seriedade, deman- dam muita disponibilidade, empatia e habilidade da parte dos professores encarregados que recebem estagidrios ou ajudam seus colegas. Segundo os comentarios levantados pelos professores, o acompanhamento de estagiarios seria uma tarefa pesada e envolvente do ponto de vista da responsabilidade profissional. Esta também é uma tarefa diversificada, uma vez que, além do enquadramento cotidiano dos estagiarios, compreende diversas atividades diferentes: avaliacao das atividades dos estagiarios, colaboracio com os su- pervisores universitarios, participacio em atividades de formacio, encontro com os professores associados, encontros com a direcio da escola, gestio dos orcamentos de estgios, etc. Os que entrevistamos nesta pesquisa lamentam também, em alguns casos, 0 pouco apoio oferecido pela universidade e a pouca ajuda dada pela direco da escola. Eles insistem ainda que a definicio de seu papel se caracteriza pela falta de precisio. Mas a pesquisa também mostra que os professores se sentem, em geral, valorizados por essa partici- pacao na formacio dos estagidrios e que gostariam que sua contribuicio fos- se mais reconhecida. Uma sintese dos estudos britanicos, canadenses e eu- ropeus confirma tal situacio (RAYMOND & LENOIR, 1997) a respeito do papel dos profissionais docentes na formacio inicial. A guisa de conclusio desta parte 1 do capitulo 4, 0 quadro 1 1 apresenta o conjunto das atividades com as quais os professores podem confrontar-se, conforme nossos dados e os documentos consultados. Como ja visto anterior- 138 4. A carga de trabalho dos professores mente, essas atividades nao formam um conjunto disparate; repartem-se em blocos de importincia desigual. Os professores nio realizam todas essas ati- vidades em cada um dos blocos. Algumas delas ocupam a grande maioria dos professores (ensino, recuperacio, vigilancia, etc.), a0 passo que outras s6 di- zem respeito a uma pequena minoria (atividades sindicais, conselhos peda- gogicos, chefes de equipe, etc.). Além disso, precisamos levar em conta que 0s professores muitas vezes fazem coisas diferentes dependendo do momen- to de sua carreira (por exemplo, os mais velhos ajudando os mais jovens, 0s novos dedicando-se mais na preparacio das aulas ou, no aperfeicoamento, etc.). Enfim, devemos levar em conta o carter obrigatorio ou facultativo de certas atividades. __- Quadro 11 ~ Os diferentes blocos de atividades dos professores Bloco | - As atividades com os alunos Administracio de Tutorado Vigilancia Recupera¢ao aulas Manutengio da Organizagio de —_—Participago em. Outras (interven- disciplina atividades paraes- atividades paraes- ces pontuais colares colares junto aos alu- nos, etc.) Bloco 2 - As atividades para os alunos Encontros com os Preparacio peda- Correges e avali- Preparacio do pais Sgica das aulas__acbes material Bloco 3 - As atividades com ou para os colegas Supervisio de es- Apoio a outros Supervisiode —_Intercimmbios pe- tagidrios no ma-_professores professoresem —_ dagégicos com os gistério fase probatéria__pares Bloco 4 ~ As atividades de formagio e de desenvolvimento profissional Participagio nas Formacio oficial Formacio pessoal Participacio em jornadas pedagé- (aperfeicoamen-_(leitura, etc.) associagées pro- gicas to) fissionais As atividades ligadas a organizacio escolar Liberacdo para. —-Participagdo em ~—Conselho pedagé- Chefe de grupo atividades sindi- diferentes comis- gico ou responsivel de cais sdes matéria +20 VU rapaino docente Este quadro permite pér em relevo o modo de organizacio da atividade docente segundo as relacdes que eles estabelecem com os diversos compo- nentes de sua tarefa: ’ + O essencial da tarefa dos professores gira em torno da relacio com os alunos, na medida em que o ensino (com as tarefas conexas de prepara- cio e de avaliacio), a vigildncia, as atividades de recuperacio, a partici- pacio na organizacao de atividades paraescolares, os encontros com os pais € 0 tutorado ou a manutencio da disciplina-dizem respeito em pri- meiro lugar aos alunos. A maioria dessas atividades é obrigatoria (princi- palmente aquelas que decorrem da convencio coletiva), a0 paso que outras apresentam um cardter incontornavel. As atividades de ensino tém uma duracio fixada pela convencio, enquanto as outras sio mais ou me- nos flexiveis. 2 + Um segundo bloco de atividades, de importancia menor, se refere A re- lacdo com os pares: supervisio de estagidrios de professores em inser- cao profissional, a ajuda a outros professores ¢ intercimbios pedagégi- cos entré os colegas. Estas atividades nao so obrigatorias. Uma minoria de professores se dedicam as duas primeiras, enquanto as outras duas ge- ralmente dao lugar a praticas informais. + Um terceiro bloco de atividades so aquelas ligadas a formacio e ao de- senvolvimento profissional. Exceto pelas jornadas pedagégicas, elas nio sio obrigatérias, mas uma boa maioria de professores participam regu- larmente delas. + Enfim, um tltimo bloco compée-se, sobretudo, da participacio dos professores na organizacio escolar, como as varias comisses, o papel do chefe de equipe, bem como as atividades sindicais. Tais tarefas nio sio obrigatorias e sao realizadas por uma pequena minoria de professores. Os dados quantificaveis que pudemos recolher si muito limitados para formular um julgamento preciso sobre o tempo de trabalho dos professores. Contudo, eles permitem elaborarmos algumas hipéteses. Globalmente, po- demos dizer que a semana normal de trabalho da vasta maioria dos professo- res dos paises da Ocde gira, atualmente, em torno de 37 a 40 horas, sendo 27 horas obrigatérias de presenca na escola, 5 a 8 horas em casa, o resto do tem- po estando ocupado com outras atividades na escola ou-em outro lugar (ati- vidades paraescolares, formagio, etc.). A partir dessas informacées pode- mos, entio, perceber que a carga de trabalho, analisada pelo ntimero de ho- Tas semanais, realmente ndo mudou nos tltimos trinta anos. Se houve um aumento nessa carga, este é, antes, qualitativo. 140 4. A carga de trabalho dos professores Contudo, na avaliacdo da carga real de trabalho, é importante ter presen- tea composicao sexual do corpo docente, que é 85% feminino no primérioe 55% no secundirio na maioria dos paises. Ora, com todos os dados atuais so- bre essa questo, sabemos que as mulheres assumem também uma carga de trabalho na familia claramente maior do que os homens. Neste sentido, a se- mana média de 37 a 40 horas dos professores ndo é mais que a ponta do ia- berg de seu trabalho pessoal, que é em parte um trabalho invisivel aos olhos das autoridades escolares, sejam patronais ou sindicais Pudemos constatar que 0 trabalho docente é bastaite diversificado. Mes- mo assim, apesar dessa diversidade, quando nos defrontamos com as grandes categorias de atividades e seus objetos, « docéncia permanece essencialmente uma pratica centrada-nos alunos, em tomo dos alunos, para os alunos. Neste sentido, nao devernos exa- gerar nessa diversidade de tarefas dos professores, pois a maioria delas tén um denominador comum: sua rela¢o com os alunos. Em nossa opiniio, a diversi- dade do trabalho docente esté mais da multiplicidade de agSes que os profes- sores precisam realizar com os alunos. Se o trabalho docente é complexo, no é tanto por causa de sua divisio interna em tarefas diferentes, sendo devido & propria natureza da relacio com os alunos. Em outros termos, a complexidade dessa profissio decorre de seu objeto de trabalho — seres humanos que preci- sam cooperar na tarefa — mais que a soma e a variedade das tarefas. Portanto, € esse aspecto central do trabalho docente que abordaremos agora. 4.3. As relagdes com os alunos A ideia central que orienta esta obra ¢ que ensinar é trabalhar com seres humanos, sobre seres humanos, para seres humanos, Esta impregnacio do trabalho pelo “objeto humano” merece ser problematizada, pois ela é 0 co- ragao da profissio docente. Que significa, para os professores, trabalhar com jovens seres humanos no objetivo de formé-los ¢ instrui-los? Quais sio as exigéncias e as caracteristicas inerentes a um trabalho com e sobre um tal “objeto”? Como este objeto afeta o mandato dos professores? Quais sio os desafios, as significagdes e as consequéncias decorrentes do fato de sen obje- to de trabalho cotidiano corresponder a seres humanos com os quais instau- ram relacSes de diversas modalidades: profissionais, pessoais, afetivas, so- iais, culturais, de tinguagem, etc. Como os professores enxergam os alunos © as relaces que estabelecem com eles? Vimos na seco. precedente deste capitulo que os alunos se situam no co- racdo da tarefa dos professores, da qual eles constituem, por assim dizer, 0 “objeto” central do trabalho. Esta segunda secdo estuda este “objeto” através Q trabalho decente das representagdes veiculadas pelos professores que interrogamos a respeito de suas relacdes com os alunos, suas dificuldades e satisfacdes, bem como so- bre suas expectativas. Trata-se de, a partir do material empirico que tiramos das entrevistas e observa¢Ses, centrar e precisar o objeto de trabalho tal como o percebem e definem os professores. Veremos que a relacio dos professores com os alunos revela-se complexa, variada e comporta tensdes, dilemas im- portantes; é ainda uma relacio determinada por fatores ambientais (pobreza, violéncia, origem étnica, etc.) ia 4.3.1, Uma relacdo mais complexa do que outrora Para falar da relacdo dos professores com seus alunos de hoje comecemos adotando um ponto de vista mais amplo sobre a sociedade e a escola. Esse pon- to de vista mais amplo é o dos professores com quem nos encontramos, por- que eles nos falaram justamente das transformacdes profundas da sociedade € de seus miiltiplos impactos sobre-as criancas e os jovens. Em suma, nio pode- mos compreender a relacdo atual entre os jovens e os professores sem situd-la antes num contexto social mais vasto que modifica seu teor. Em sua obra Changing Teachers, Changing Times, Teachers’ Work and Culture in the Postmodern Age (199+), Hargreaves afirma que nossa sociedade atual est4 numa ‘fase de transigao entre a modernidade € a pdos-modernidade e esta fase de transi¢ao afeta profundamente a missao da escola e o trabalho docente. Para esse autor, a sociedade atual — pés-moderna — se desenvolve a partir das sete dimensdes seguintes: 1) a flexibilidade ocupacional e a complexidade tecno- logica, maximizando a rapidez de adaptacdo e a produtividade, mas engen- drando também uma maior desocupacio, sobretudo dos jovens, € ocultando o debate sobre os usos da tecnologia; 2) a globalizacio das economias, dos intercambios e das comunicacées que gera inseguranca e semeia a diivida so- bre as identidades nacionais existentes num contexto mais € mais diversifica- do e multicultural; 3) a incerteza moral ¢ cientifica que reduz a confianga nos saberes ¢ na expertise; Hargreaves fala da necessidade de que cada um, espe- cialmente os professores, desenvolvam “certezas ancoradas” (situated certainties), em oposicao as certezas cientificas; 4) a fluidez organizacional que Hargrea- ves expressa pela imagem do “mosaico movedi¢o”; 5) a ansiedade pessoal e a busca de autenticidade num mundo sem raizes morais profundas e seguras, a construcao de si mesmo como trabalho da vida inteira; 6) um refinamento © uma complexidade tecnolégica que criam um mundo de imagens instanti- neas e de aparéncias artificiais; 7) a compressio do tempo e do espaco que pode significar uma flexibilidade maior e uma comunicagio melhor, mas 142 4. A carga de trabalho des professores que pode também provocar sobrecargas de inovagio e de mudancas, uma certa superficialidade e a perda de sentido e de direcio (HARGREAVES, 1994: 83-85) © mundo dos jovens muda mais depressa que a escola Diante desses fendmenos, o sistema escolar parece um verdadeiro dinos- sauro. Hlaborado na época da sociedade industrial, ele segue seu caminho como se nada houvesse e parece ter muita dificuldade para integrar as mudan- cas em curso. Em resumo, ele parece uma estrutura erguida uma vez por todas, como uma organizacio fossilizada. Mas, na verdade, essas mudancas afetam a missio dos professores. Na realidade, podemos colocar a hipotese de que a condicdo e a profissio docentes estio atualmente em fase de mutacio. Essa miatagdo deve-se essencialmente ao surgimento de novas definigdes e & exten- sio de novos usos do conhecimento em nossas sociedades pés-industriais, que modificdm as missdes ¢ os papéis tradicionais da escola em geral ¢ dos profes- sores em particular, aferando os fundamentos de sua formacdo e de sua com- peténcia profissional, bem como as bases do “saber-ensinar” Os professores nao sio indiferentes a esses fendmenos, longe disso, pois eles os vivern por dentro, embora sem possuir necessariamente uma visio de conjunto das mudancas em curso, Podemos pensar que, através da mrediacao desses fendmenos, toda a relacdo dos professores com seus alunos se trans- forma, atualmente. Vejamos como eles percebem e reagem a isso. Para os professores com quem conversamos, ¢ dos quais citamos aqui as palavras, o monopélio da escola como instancia de legitimagio, junto aos alunos, dos conhecimentos socialmente titeis parece agora seriamente colo- cado em questio. Oaluno esta mais consciente de que a escola nfo é0 tinico lugar onde ele aprende. Antes a escola era mais mitifica- da, era 0 estabelecimento onde se dava ¢ recebia o saber. Hoje, os jovens percebem mais que a escola s6 faz uma parte de seu aprendizado, que nao é 0 inico lugar onde se pode aprender. Aprende-se na escola, sim, mas-também aprende muito fora dela. Disso decorre uma certa desvalorizacio da formacio escolar, ligada prin- cipalmente a inflacio de diplomas e ao surgimento de novas modalidades de formacao, exteriores 4 escola. A crianga que esti em contato com a era da informatica ¢ da celevistio durante grande parte de sua vida esta acostu- mada com espetdculos, viaja, diferentemente da crianga de 30 anos atras que, enfim, saia muito pou de. Nossos alunos vio em duas semanas para a Inglaterra Eles fazem intercimbios. Em todo caso, a crianga de hoje sentar-se por 75 minutos a escutar um professor que pos. sui o saber, isso é bem dificil. Ela se desliga facilmente, seu tempo de atengio ¢ de motivagao é muito limitado. Hoje fala-se até de uma sociedade “sobre-educada”, instruida demais, 0 que causa espanto e perturbacio em relacdo & antiga moral de instrugio dos anos do pés-guerra. Em varias etapas de formacio, os diplomas atueis ainda valem alguma coisa? E certo que alguém que tivesse um segundo ciclo em mi- nha época era, quem sabe, melhor visto do que um segun- do ciclo de hoje, ou um primeiro ciclo, quem sabe. Em minha época, um primeiro ciclo, universitirio ja era algu- ma coisa. Hoje existem muito mais primeiros ciclos un versitirios. As normas também nao sio ma rd que eles continuario a ser o que siio? E uma questio que se coloca em todos os niveis do ensino: no nivel cole- gial, no nivel secundério. Seré que vai continuar sendo a mesma coisa, sera que isso teri o mesmo valor reconheci- do por todos? Isto também é uma escola da sociedade. Pode ser que dentro de alguns anos, para ser porteiro na escola, sera preciso ter um primeiro ciclo. Quem sabe. Ou tal¥vez sera necessirio um diploma de colegial; eu nao sei Como isso vai evoluir. as mesmas. A recente evolucao da economia e do emprego mostra que 0 retorno dos saberes escolares na vida profissional nio € mais garantido, hoje: ja no existe “transago natural e automatica”, nem de correspondéncia, para retomar num sentido mais amplo a expressio de Bowles & Gintis (1977), entre a escola e 0 emprego, entre a escola ¢ a promoco ou a mobilidade social, entre a escola ea aquisicZo de uma expertise, Em suma, os professores ja nio podem prometer a todos os alunos que a formacio que oferecem é a chave do sucesso. Tudo leva a crer que esta evolucio vai continuar. Ja nao basta ficar muito tempo na escola, é preciso também aprender outras coisas em outros lugares, dotar-se de trunfos raros num mercado de qualificacdes e competéncias cada vez mais exigentes. A televisio, a extensio da auto-estrada eletrénica e do “ciberespaco” fazem prever mudangas ainda mais considerdveis: 144 A sociedade oferece tantas coisas Ais criangas que elas po- dem ter tudo 0 que querem: é preciso ser muito bom para conseguir concorrer com os videos e equipamentos ele- trOnicos, o computador, as quatro rodas, etc 4. A carga de trabalho dos protessores As criangas mudaram porque so muito mais instruidas do que ances por todo tipo de incervengées, a televise, os computadores, isto deixa as criangas espertas. Os professores ndo podem mais se comportar como simples transmisso- res de conhecimentos estaveis ou invaridveis e de uma cultura “etema”: a cultura escolar, como também a cultura da sociedade, sio envolvidas por um turbilhdo. A multiplicacio de inovagdes de técnicas, a velocidade sempre maior com que séo colocados em circulacao e desaparecem objetos e saberes, certezas ¢ ideias, provocam nos professores o sentimento de estar sendo con- tinuamente ultrapassados. Em suma, a escola fica para trés. A escola nio mudou o bastante para a crianga de ho} ‘Tem-se uma crianga nova numa escola velha. - Todos esses fendmenos modificam profundamente o continuum tradicio- nal de formacio baseado na sequéncia “familia-escola”. Hles instauram fora da familia e da escola novos campos de transmissao € de circulacio de saberes sociais suscetiveis de se cristalizar, nos jovens, como modelos de vida que es- capam a6 controle das autoridades paternas e escolares. Por exemplo, a tele- visdo, Os jogos eletrOnicos, o cinema, o mundo das vedetes do rock, 0 univer- so do consumo, etc. tornaram-se fontes de modelos de vida entre os jovens e 0s menos jovens. . Sao criangas da imagem. Bom, porque grande parte delas nao sao, talvez, muito ricas, mas veem televisdo a cabo ¢ 0s videos, entio sio criangis da imagem, que devoram, devoram © devoram, que estio, provavelmente, satura- das, © depois temos que constatar que aqueles que me- thor se desenvolvem ¢ que tém melhor rendimento, mui- tas vezes, sio criangas para quem a televisio ¢ limitada “Esse programa, sim, ¢ depois voce desliga”, ¢ pronto. Se, wadicionalmente, o professor servia de mediador entre 0 aluno € 0s conhecimentos sociais transformados em conhecimentos escolares, essa me- diacdo, hoje, tende a se pluralizar ¢ relativizar-se: 0 professor é um mediador de conhecimentos entre muitos outros. Os conhecimentos nao se limitam mais aos conhecimentos escolares. As criancas estio mais informadas sobre toda espécie de assuntos. As crianeas sabem muito mais, hoje, do que sabiam antes. Muito mais sobre assuntos variados. Claro, as criangas de hoje também discutem muito mais Elas querem saber o porqué das coisas, Elas ndo vém sim- plesmente 3 escola para receber. 9 criangas, mas so mais abertas. A celevisdo as tornou mais abertas. 145 As criancas podem the falar, por exemplo, de coisas que voeé ignora, Eu tinha uns garotinhos na terceira série do primério noano passado que me falavam dos dinossauros, que sabiam todos os nomes deles, que eu mesmo nao sa- bia, ¢ um menino ha sete ou vito anos nao saberia, porque siio 0s livros ¢ a televisio que trouxeram a informagio. Esta dimensdo no é somente negativa. A midia, principalmente, segun- do alguns professores, permite que as criancas sejam mais bem informadas ¢ mais abertas. Mas os’professores também constatam que estabeleceu-se uma distancia entre sua cultura ¢ a das criancas. Elas n4 sabem mais o que as crian- cas vivem, sentem e pensam. No fundo, as criancas nio mudam, ¢ o “siste- ma” que muda, é a sociedade que se transforma e essa evolucio € responsive pelas dificuldades que os professores experimentam para manter e renovar uma relacao especificamente pedagégica com as criancas. Os professores in- sistem muito no fato de que as criancas esto mais ansiosas que antes, mais sujeitas a todo tipo de experiéncias, que elas amadurecem muito ripido. Os alunos sao nitidamente mais pragmatics do que eram. Muito niais inquietos, também, do que eles eram. Conse- quentemente, mais impacientes, mais estressados do que eram, O que eu chamaria de estresse dos alunos, seu prag- matismo, suas inquietagdes, tudo estd aumentando. As criangas sio mais dificeis. As criancas t¢m muito mais necessidade de calor, de amor. Ficam sozinhas muito cedo, quase todos os pais trabalham, A gente sente que os alunos ouvem menos, sio, calvez, menos capazes de concentrar-se. Eles tm muitas outras coisas externas que 0s perturbam, mais do que tinham hi uns vinte anos, por exemplo. A fragilizacdo dos modelos estveis de educacio — familiares e escolares — faz com que, muitas vezes, os jovens nao saibam mais muito bem a que ea quem voltar-se. Sendo deixados a si mesmos, eles podem se comportar como tiranos, o que Arend ja havia mencionado em La crise de la culture (1972). Em alguns casos, a crianca se torna rei e senhor. Muitas vezes eu sinto que ha criangas que sio senhoras de siem casa; isto se percebe em suas reagdes, no modo como 08 pais reagem com elas. Muitas vezes, nio sio os pais que decidem, mas a crianga é que decide quase tudo 0 que faz € 0 que acontece na casa, depois a gente sente um pouco isso até na escola, No fundo, sao as proprias bases da aprendizagem escolar que se encon- tam, agora, fragilizadas. O que é importante aprender? O que é preciso co- nhecer, hoje? Bsté ficando cada vez mais dificil de responder a estas pergun- 146

Você também pode gostar