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18/08/2020 Cantigas Satíricas

Cantigas Satíricas
Cantigas de Ninar Das satíricas temos o Lundu, que foi dança popular de procedência negra e hoje é usada como canção alegre e crítica.
Incluímos também os desafios e martelos, nos quais os contendores se criticam mutuamente até que um deles não consegue
Cantigas de Roda superar o adversário e acaba entregando os pontos.
Roda de Adultos
Lundu: 
Cantigas de Trabalho
Cantigas Sentimentais Quando eu era pequenina
E aprendia o bê-á-bá
Cantigas Satíricas
Minha mestra me ensinava
Cantigas de Rixas O lundu do marruá.
Cantos Religiosos
Cantigas de Velório Desafios:
Outros Cantares Disputa poética, cantada, parte de improviso e parte decorada, entre os cantadores.
É gênero que recebemos de Portugal e conhecido em todo o Brasil, mantido especialmente no Nordeste Brasileiro, mais no
Instrumentos Musicais sertão do que orla litorânea.
Cantando o Brasil Os instrumentos de acompanhamento são a viola e a rabeca no Norte, a sanfona, o violão, no Sul, sem que possam fixar
preferências. Velhos cantadores do passado, como o negro Inácio da Catingueira, usavam o pandeiro.
O desafio é o canto amebeu dos pastores gregos, duelo de improvisação entre pastores, canto alternado, obrigando respostas
às perguntas do adversário. (Charles Barbier, “Une Étude sur les Idylles de Théocrite”, Oeuvres Complètes de Théocrite, ed.
Garnier, 33-34, Paris, 1899). São vestígios claros em Teócrito (Idílios V, VIII e IX), Vergílio (Éclogas III, V e VII). A
técnica do canto amebeu fora empregada por Homero (Ilíada, I, 604, Odisséia, CCIV, 60). Horácio alude a uma disputa
entre os bufões Sarmentus e Messius Cicerus (Sátiras, I, V). Devia ser muito conhecido nas populações rurais, porque
Vergílio atesta sua vitalidade nessa região.
Passa a Idade Média, reaparecendo na Europa com os jongleurs, trouvères, troubadours, minnesingers na França do sul e do
norte, Flandres, Alemanha, com o nome de disputa, tenson, jeux-partis, diálogos contraditados ao som de alaúdes ou viola,
a viola de arco, avó da rabeca sertaneja. Também podia dispensar instrumentos musicais, como se vê num códice do século
XIV, o Cancioneiro de Heidelberg, na miniatura guerra de Wartburg.
No Cancioneiro Português que pertenceu a Ângelo Colocci, encontrado na livraria do Conde Brancutti, pelos romancistas
Molteni e Monaci, há, nas primeiras folhas, um fragmento de poética provençal do século XIV, publicado por Teófilo Braga
(Era Nova, 414-420, Lisboa, 1881).
Os cantos mais preferidos dos mestres-cantores alemães era os Wettgesange.
Nos velhos cancioneiros ibéricos equivalem às Perguntas y Respuestas, desafio em Portugal, pallo, payada, payada-de-
contrapunto, espalhadas por toda a América, desde o México à Argentina (Luís Câmara Cascudo, Vaqueiros e Cantadores,
125-180. ed. Globo, Porto Alegre, 1939).
Os árabes conheciam o desafio, e a influência é visível na música dos cantadores sertanejos. O desafio na África é uma
projeção árabe.
Como o desafio é, em linha reta, vindo do canto amebeu e este pertencia ao ciclo pastoral, acompanhado pelos instrumentos
de sopro, os cantadores do Nordeste cantam o desafio, o velho, o legítimo, o verdadeiro, sem acompanhamento musical. No
intervalo entre a pergunta e a resposta executam um pequenino trecho, exclusivamente musical, enquanto um dos
adversários prepara o verso seguinte. Noutros exemplos, embora sem o acompanhamento ao canto, fazem ouvir um arpejo
no fim de cada verso, jamais coincidindo com a voz humana.
O desafio era, mesmo na capital do reino do Brasil, divertimento típico, indispensável nas festas portuguesas no Rio de
Janeiro.
“Já se sabe que houve nesse dia função; os convidados do dono da casa, todos d’além-mar, cantaram ao desafio segundo o
costume; os convidados da comadre, que eram todos da terra, dançaram o fado”. (Manuel Antônio de Almeida, Memórias
de um Sargento de Milícias, 8, São Paulo, 1925).

Cantoria:
Ato de cantar, a disputa poética cantada, o desafio entre os cantadores do nordeste brasileiro.

“Respondeu Manuel Raimundo:


  Canto, pois não, sim senhor,
  Sou novo na cantoria,
  Mas não temo cantador,
  Depois que me esquenta o sangue,
  Canto seja com quem for”.

  “Umas trezentas pessoas


  Em pouco tempo “afluía”,
  Cada qual mais desejosa
  De assistir à cantoria:
  Cada um interrogava
  Qual dos dois apanharia?”

Trechos da “Peleja de Manuel Raimundo com Manuel Campina” e da “Peleja de Serra-Azul com Azulão”.

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Carretilha:
O mesmo que carritia, versos de cinco sílabas usados nos desafios sertanejos.

“Cantador que anda


  Tomando peitica,
  Apanha que fica
  Com a orelha bamba;
  Quando se amocamba
  O ninho desmancho,
  Não acha agasalho,
  Encontra é trabalho
  Pesado e de gancho...”

Marco:
É uma construção imaginária, que os cantadores do Nordeste dizem ter mandado erguer, cheia de armas invencíveis, espécie de
fortaleza inexpugnável, com segredos defensivos e forças mágicas, a que ninguém poderá resistir. Os velhos cantadores de
outrora, no embate do desafio, descreviam os assombros do marco, cabendo ao adversário, no ímpeto da improvisação, desarmar
o arsenal, num combate de viva imaginação:

Eu vou contar uma história, Mandei bombear o marco


Quem quiser preste atenção, Com 1200 cano.
De um marco que eu levantei Todos do mesmo modelo
No centro do meu sertão, Dum canhão americano.
Sobre os desertos dum ermo, Até com outra nação
Pra dividir meu quarteirão. Nós já temos munição
................................................. Para brigar quinze anos.
............................................
Vou assentar o meu marco, Saiba Deus e todo mundo;
Deixar minha divisão; Meu marco está assentado
Ó meu Deus, dê-me um talento, Com orde do imperadô
Igual vós deste a Sansão! Licença do delegado!
Dê-me ciência pra obra Com dez légua de distança,
Igual a rei Salomão! Meu ronco é diferençado!...
(Leonardo Mota, Violeiros do Norte, 82-83, 96-97, São Paulo, 1925).

Parcela:
Fórmula poética entre os cantadores do Nordeste do Brasil, muito empregada nos grandes “desafios”, que se tornaram famosos.
A parcela pode ter 8 a 10 versos, tendo os nomes de parcela de 8 e de parcela de dez respectivamente. A fórmula é sempre
ABBAACCDDC e na parcela de oito o primeiro verso é livre, ABBCCDDC. A mais típica e preferida é a parcela de dez, onde
há deliciosos exemplos de remoque e viva imaginação (Vaqueiros e Cantadores, Porto Alegre, 1939).
Eu dou-te uma surra, Aquilo que digo Vai minha Parcela
Quebro o espinhaço, Tu estás dizendo, Muito apreciada
E não me embaraço Pelo que estou vendo Não sendo cansado
Com coisa tão pouca. Estou cantando só... Gosto muito dela.
Te escangalho a boca, É muito melhor Se torno mais bela
Não te deixo um dente, Que você se ajeite Assim desse jeito.
Moleque indecente, Você se endireite, Sou cantor perfeito
Te ajeita comigo, Que estou zangado,  Pra qualquer sala
Que estou no perigo. Moleque safado, Só com escala
Você me respeite... Tu estás satisfeito!
Estou no perigo,
Sou renitente, Você me respeite,  Vamos Francalino,
Te ajeita comigo, Moleque safado, Endireite a goela
Cantor indecente; Que estou zangado,  Você na Parcela
Não te deixo um dente Você se endireite; Pra mim é menino!
Escangalho a boca,  É bom que se ajeite, Perdes o destino
Com coisa tão pouca Eu acho melhor Da tua morada.
Eu não me embaraço, Eu ir cantar só,  Não sabe a estrada
Eu dou-te uma surra, Pelo que estou vendo Por onde chegou;
Quebro o espinhaço! Você sai perdendo Meu chiqueirador
Você me respeite... É teu camarada!

Peleja:
Luta poética entre os cantadores sertanejos, desafio cantado, o debate de improviso.

Eu achei ser desaforo Eu gosto de ouvir pelejas


De um cantador xerém, Sendo bons os cantadores
Andar fazendo pelejas Porque depois tenho assunto

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Sem as ter tido com alguém; Para contar aos leitores;


Segui pelo rastro dele Prefiro uma cantoria
Fui o pegar no Belém A ouvir histórias de amores.
(trechos da Peleja de Antônio da Cru com Antônio Tomé e da Peleja do João Piauí com José da Catinguera).

Mourão:
O mesmo que trocado, tipo de versos usados na cantoria sertaneja. Há de cinco e de sete pés, os mais usuais. São dialogados e
difíceis, obrigando a resposta imediata do outro cantador, dentro de rimas já escolhidas e limitadas. Um mourão ou moirão, de
cinco pés:

A) – Vamos cantar o mourão,


B) – Prestando toda a atenção!
A) – Que o mourão bem estudado
         É obra que faz agrado
         E causa satisfação.

Os cantadores José Siqueira de Amorim (cearense) e Lourival Bandeira Lima (alagoano) cantaram na casa de Câmara Cascudo,
na noite de 23 de maio de 1949, um mourão de dez pés, obrigando a enunciação de números. Siqueira de Amorim denominou-o
“Mourão de Você vai”:

A) – Vou começar um trabalho


          Pra você me acompanhar;
          Lá vai, 1, 2 e 3...
B) – Eu não posso dispensar
         E nisto não me atrapalho,
         Lá vai 4, 5 e 6...
A) – Mas cantando desta vez
         Tu tens de encontrar um pai!
         Você vai!
B) – Se eu cair o povo diz
         Que eu caí foi porque quis
         Se for por dez pés, lá vai!...

Os mourões e trocados não são tipos comuns de cantoria, e os cantadores usam apenas nas demonstrações públicas de agilidade
mental, espécie de apresentação das possibilidades de improvisação no gênero.
Ligeira:
Uma das formas poéticas empregadas durante o desafio. São versos improvisados ou não, monorrimados, num ritmo aceso e
vivo. Ocorre às vezes o refrão.
Há exemplos no Nordeste e no Brasil Central (Vaqueiros e Cantadores):

Tanto faz dar na cabeça


Como na cabeça dar...
Sou espinho de jurema,
Pescoço de morruá...

Do Brasil Central (Goiás e Mato Grosso):

E baliá!
Doutro lado grita gente
Sá Dona manda passá;
E baliá!
E se for bonita eu passo
Se for feia deixo lá...

Fontes : Folclore Brasileiro / Nilza B. Megale- Petrópolis: Editora Vozes, 1999.


Dicionário do Folclore Brasileiro - Câmara Cascudo, Rio de Janeiro: Ediouro Publicações S.A. sem data

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