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O PENSAMENTO COMUNICACIONAL DE ELISEO VERÓN

http://www.metodista.br/unesco/PCLA/revista9/perfis%209-1.htm#Resumo

Resumo
O presente artigo pretende dar continuidade à caracterização da trajetória do pensamento
comunicacional do pesquisador Eliseo Verón, iniciada pela Prof. Dra. Elizabeth Moraes Gonçalves em
1996. Neste trabalho, serão levantadas as obras e traçadas as principais temáticas, assim como
alterações no seu percurso intelectual.
Argentino, Eliseo Verón representa um pensamento inovador em comunicação na América Latina,
caracterizado pelo ecletismo por atuar em diferentes campos, e pela polêmica por buscar um novo rumo
para as ciências sociais e criticar idéias sólidas.
Discípulo de Lévi-Strauss e responsável por trazer da França os conceitos estruturalistas e semiológicos,
este pensador latino-americano realiza pesquisas não só vinculadas às universidades, mas sobretudo às
grandes empresas.
Palavras-chaves: Comunicação,Verón, biografia.
______________________________
Resumen
El presente artículo tiene por objetivo dar proseguimiento a la caracterización de la trayectoria del
pensamiento comunicacional del investigador Eliseo Verón, iniciada por la Prof. Doctora Elizabeth
Moraes Gonçalves en 1996. En este trabajo, se habrá un levantamiento de las obras y se trazará las
principales temáticas, así como alteraciones en su precurso intelectual.
Argentino, Eliseo Verón, representa un pensamiento innovador en comunicación en Latinoamérica,
caracterizado por el ecletismo por actuar en diferentes campos, y por la polémica en buscar un nuevo
rumo para las ciencias sociales y criticar ideas sólidas.
Discípulo de Lévi-Strauss y responsable por traer de Francia los conceptos estructuralistas y
semiológicos, este pensador latinoamericano realiza investigaciones no solo agregadas a las
universidades, sino también, y sobretodo a las grandes empresas.
Palabras-llave: Comunicación, Verón, biografía.

Introdução
Eliseo Verón viveu muitos anos em Paris, onde dirigiu o Departamento de Comunicação da Universidade
de Paris 8. Desde que regressou à Argentina, dirige uma empresa de consultoria em estratégias de
comunicação. Professor associado no Departamento de Sociologia da Universidade de Buenos Aires
desde 1966 e membro da CONICET, desde 1971 como investigador científico, foi diretor do Centro de
Investigações Sociais do Instituto Torcuato Di Tella. Pertence também ao comitê de redação de várias
revistas científicas na França e é editor da coleção “El Mamífero Parlante” do editorial Gedisa, em
Barcelona, Espanha.
Com diversas publicações de artigos em espanhol, inglês, francês, italiano e português, ministra cursos,
conferências e seminários em universidades e instituições de numerosos países (Estados Unidos,
México, Colômbia, Venezuela, Brasil, Peru, Uruguai, Chile, Espanha, Itália, Inglaterra, Portugal e Suíça).
Argentino, com formação basicamente filosófica e sociológica, Eliseo Verón representa um pensamento
inovador em comunicação na América Latina. Caracterizado pelo ecletismo por atuar em diferentes
campos, e pela polêmica por buscar um novo rumo para as ciências sociais e criticar idéias sólidas, foi
discípulo de Lévi-Strass e responsável por trazer da França os conceitos estruturalistas e semiológicos.
Eliseo Verón traz a ideologia aplicada à sociologia para a análise da comunicação e, da preocupação
pela interpretação ideológica dos meios, passa a buscar uma síntese teórica entre psicanálise, marxismo
e lingüística estrutural. Verón, que inicialmente estuda a comunicação ligada a fatores políticos, dedica-
se ultimamente ao estudo dos discursos sociais nos meios de comunicação: imprensa, rádio e televisão.
Além de atuar na academia, no mercado a relação empresa-sociedade/marca-consumidor, leva-o à
investigação aplicada para diversas empresas privadas e públicas, sempre estabelecendo a relação do
consumidor com o contexto social como principal fator que deve ser examinado pelas marcas.

Trajetória Comunicacional de Eliseo Verón


Estendendo as hipóteses de uma escola lingüística a outras disciplinas das ciências humanas, o
estruturalismo apresentou-se como um método rigoroso que podia trazer esperanças e progressos
decisivos para a ciência e, também, constituir um momento particular da história do pensamento
humano, reforçando a consciência crítica.
Da lingüística Saussuriana à antropologia cultural, Claude Lévi-Strauss inova ao analisar os mitos como
forma de linguagem e é o grande nome do Estruturalismo na França nas décadas de 50 e 60.
Para Saussure, reconhecido como fundador da lingüística,
“(...)a língua é uma instituição social, enquanto a palavra é um ato individual. Enquanto instituição social,
a língua é um sistema organizado de signos que exprimem idéias; representa o aspecto codificado da
linguagem. A lingüística tem por tarefa estudar as regras desse sistema organizado por meio dos quais
ele produz sentido. A linguagem pode ser segmentada, logo, analisada; trata-se de descobrir as
oposições, as diferenças que permitem a uma língua funcionar e significar”(Mattelart, 1999, p.86).
Em 1957, a Universidade de Buenos Aires abre a primeira escola de Sociologia e o pensamento de Lévi-
Strauss em Antropologia é incluído nas orientações teóricas. Eliseo Verón busca na lingüística
fundamentos teóricos para seus pensamentos sobre as ciências sociais e estuda Saussure, assim como
seu mestre Lévi-Strauss, fundamentalmente por julgar a linguagem o único tipo de conduta social cuja
função primária é a comunicação e através desta função primária o homem cumpre outras – percebe e
atua sobre a realidade social.
No final de 1961, Eliseo Verón recebe uma bolsa de estudos do Conselho Nacional de Pesquisa Técnica
e Científica da Argentina para um estágio de aperfeiçoamento no Laboratório de Antropologia Social da
França, sob a direção de Lévi-Strauss. Nesta época, Verón trava contato com uma nova visão: a
semiologia.
“A Semiologia tem por objeto todo o sistema de signos, qualquer que seja sua substância, quaisquer que
sejam seus limites: as imagens, os gestos, os sons melódicos, os objetos e os complexos dessas
substâncias que encontramos em ritos, protocolos ou espetáculos constituem, se não ‘linguagem’, ao
menos sistemas de significação. Barthes ordena os elementos fundamentais, válidos para a lingüística e
para as ciências que nela se inspiram: 1.língua e palavra; 2. significante e significado; 3. sistema e
sintagma; 4. denotação e conotação”(Mattelart ,1999, p.87).
Quando retorna à Argentina, em 1963, Verón não encontra campo para desenvolver pesquisas e aplicar
os conceitos que aprendera em Paris e, que na época, representavam um confronto entre os semiólogos
novos (dentre os quais Barthes, Greimas, Kristeva e Metz) e os levistraussianos. Assim, numa linha
bastante norte-americana, juntamente com Carlos E. Sluzki, diretor do Centro de Pesquisas Psiquiátricas
do serviço de Neuropsiquiatria da Policlínica de Lánus, busca entender as estratégias comportamentais e
os sistemas de representações, através do desenvolvimento de uma pesquisa sobre o relacionamento
dos conceitos psicanalíticos e a Teoria da Comunicação.
Com o golpe militar na Argentina, em 1966, a pesquisa em psiquiatria, incompleta e sem o apoio
institucional, encontra abrigo e condições de continuidade no Centro de Investigações Sociais do Instituto
Torcuato Di Tella, que se encarrega, em 1970, também da publicação do livro. Em 1967, Verón passa a
realçar o valor da comunicação e da ideologia e, neste período, desenvolve o interesse pela análise dos
meios de comunicação.
Crítico às teorias que não são sustentadas por pesquisas, Verón adota os conceitos pós-estruturalistas
na década de 70, onde a análise de produção recebe outra abordagem – produção e condições de
produção, determinadas pelas condições de reconhecimento.
“A lingüística estrutural negligenciara o locutor e o receptor. A lingüística comunicativa ou “pragmático-
enunciativa” estuda as relações entre eles. Beneficiou-se do desenvolvimento da filosofia da linguagem
comum (escola de Oxford), da teoria anglo-saxã sobre os atos da fala, da nova retórica belga e da
pragmática alemã”(Matellart, 1999, p.140).
A partir dos anos 80, Verón passa a buscar recursos e espaços na França, para estudar a recepção,
trabalhando concretamente com os receptores, transformando assim, as condições de pesquisa. Suas
análises sobre produção e recepção, inserem-no também no contexto empresarial. O trabalho com
empresas possibilita-lhe fazer pesquisas de campo em diversas áreas: imprensa escrita, automobilística,
cosmética e perfumaria, companhias aéreas, radiodifusão, além de pesquisas para órgãos
governamentais da França.
Em 1995, retorna ao contexto universitário argentino e começa a desenvolver o mesmo tipo de pesquisa
para empresas de seu país. Atualmente, é diretor da Pós-graduação em Ciências da Comunicação na
Universidade Hebrea Argentina Bar Ilán e dedica-se ao estudo dos discursos sociais nos meios de
comunicação.

Os meios de Comunicação
As práticas sociais de diversos tipos (políticas, religiosas, ocupacionais, etc) têm sido transformadas
pelos meios, mas Verón mostra-se resistente à aceitação da idéia de “poder total” dos meios e prefere
enxergá-los como fenômenos em si mesmos.
Para o estudioso argentino, a televisão cumpriu nos últimos vinte anos um papel civilizador
extraordinário, mas com a crescente fragmentação do público, a era das grandes audiências se acabou.
Segundo Verón, um suporte de comunicação não é bom nem ruim. Depende da forma como é utilizado
e, com a fragmentação do público, pode-se supor que os meios desempenharão outras funções.
Quanto às novas tecnologias e a parafernália conceitual ao seu redor, estas sempre vêm acompanhadas
de discursos que prometem mudar a vida das pessoas. Verón lembra do histórico dos meios de
comunicação e do que ocorreu com a fotografia e com o cinema. O privilégio de um meio pelo outro se
dá por razões culturais, políticas, etc. Cada vez que surge uma tecnologia se exagera muito e nem
sempre esta revolução é total.

Reflexões sobre algumas contribuições do teórico Eliseo Verón para a teoria marxista
Pretendemos através de investigação teórica abordar a problemática da relação infra-
estrutura/superestrutura, enquanto aspecto fundamental da concepção marxista dos fenômenos
ideológicos, do ponto de vista do olhar sociológico do teórico argentino Eliseo Verón que consegue com
muita propriedade integrar assuntos relativos às áreas de Sociologia, Antropologia, teoria da
comunicação social e Psicologia, tendo como referência uma ciência geral dos sistemas de significação.
Na obra Ideologia, Estrutura e Comunicação, Eliseo Verón, trata, entre variados temas, dos conceitos de
infra-estrutura, superestrutura e sua dimensão para a análise sociológica do “sentido da ação”. Verón vai
além da especulação filosófica atingindo a instrumentalização desses conceitos, ou seja, indo ao
encontro do plano “operacional” da distinção marxista infra-estrutura-superestrutura.
No entanto, é preciso que recapitulemos esses conceitos do ponto de vista do universo argumentativo da
perspectiva marxista para, só então, analisarmos o referido texto de Verón.
Segundo Marx e Engels, os humanos se diferenciam dos animais sobretudo por serem capazes de
produzir as condições de sua existência material e intelectual. Nós seres humanos somos o que
produzimos e como produzimos. Os homens fazem sua História mas não sob condições escolhidas por
eles, ou seja, isso não ocorre livremente, são historicamente determinados pelas condições nas quais
produzem suas vidas.
A produção e reprodução das condições de existência se realizam através da relação com a Natureza
expressa no trabalho; da divisão social do trabalho; da perpetuação da espécie, suas formas sociais
específicas para lidar com a sexualidade e a instituição família; e a forma de apropriação da natureza, a
propriedade.
Esse conjunto de condições é responsável, nas várias épocas, pela formação da sociedade e o
complexo sistema de formas produtivas que a regulam, conforme a divisão social do trabalho. A divisão
social do trabalho tem início na diferenciação sexual das tarefas no seio familiar, na distinção entre as
atividades de agricultura e pastoreio, entre estas e o comércio, até a fase histórica de separação entre o
campo e a cidade. Ela é a própria manifestação da existência da propriedade, a separação entre os
instrumentos e condições de trabalho e o próprio trabalho. Segundo a perspectiva marxista, a
propriedade introduz a existência dos meios de produção – condições e instrumentos de trabalho – como
algo distinto das forças produtivas – trabalho.
Quando analisamos as diferentes formas de propriedade, as variadas formas de relação entre os meios
de produção e forças produtivas, e por conseqüência as diferentes formas de divisão social do trabalho
percebemos o movimento do processo histórico e a diferença entre as sociedades: assim segue-se ao
primeiro dos modos de produção, o asiático, a escravidão, a servidão e o capitalismo.
Cada um desses modos de produção tem uma base econômica e uma superestrutura política e
ideológica. Na base econômica há as relações de produção (formas de propriedade) e as forças
produtivas (tecnologia). A verdade é que Marx preocupou-se cuidadosamente em estudar aspectos do
desenvolvimento histórico e, com maior rigor, o modo de produção capitalista. E, apesar de escrever
bastante sobre ideologia e política do capitalismo e formações pré-capitalistas, a teoria da base-
superestrutura, ou infra-estrutura e superestrutura ainda hoje provoca calorosas discussões entre os
teóricos do marxismo.
A princípio, a teoria afirma que tipos específicos de atividades políticas e intelectuais observados em
sociedades de classes podem ser explicados por referência a formas igualmente específicas de
organização econômica.
Marx e Engels observaram que a cada modo de produção a consciência dos integrantes da sociedade se
transformava. Essas transformações, segundo eles , constituem a maneira como a consciência interpreta
e representa para si o que acontece na esfera das condições materiais de produção e reprodução da
existência no dado momento histórico.
Em Contribuição à crítica da economia política, Marx esclarece:
“O conjunto das relações de produção (que corresponde ao grau de desenvolvimento das forças
produtivas materiais) constitui a estrutura econômica da sociedade, a base concreta sobre a qual se
eleva uma estrutura jurídica e política e à qual correspondem determinadas formas de consciência social.
O modo de reprodução de vida material determina o desenvolvimento da vida social, política e intelectual
em geral. Não é a consciência dos homens que determina o seu ser; é o seu ser social que
inversamente, determina sua consciência”(Contribuição à crítica da economia política – Apud CHAUI,
1995).
Esse será nosso ponto de partida para as reflexões de Verón sobre a relação infra-estrutura-
superestrutura e as conseqüências para os estudos em comunicação.
Segundo Verón, na teoria marxista é possível se falar em dois sentidos dessa relação:
“(...) Num primeiro sentido, trata-se do problema da relação entre diferentes áreas de atividade social.(...)
as formas de organização da área econômica determinam “em última instância” as formas de
organização das demais áreas, em diferentes graus (instituições políticas, familiares, religiosas, jurídicas,
etc.)”(Verón, 1968, p.142).
Em um segundo sentido:
“(...) trata-se do vínculo entre áreas de relações sociais e “sistemas de idéias” (princípios da organização
econômica, ideologias políticas, regras jurídicas, teorias sociológicas, etc.), aquilo que Engels chama “as
concepções ideológicas em cada um dos domínios”(Verón, 1968, p.142).
As conseqüências dessas observações levam Verón a apontar que no primeiro sentido a infra-estrutura
corresponderia à área econômica no plano global e a superestrutura às restantes áreas da atividade. Já
no segundo sentido a infra-estrutura abrangeria as relações sociais concretas e a superestrutura os
sistemas no plano das idéias derivadas daquelas nos variados campos da atividade social.
Os dois sentidos mencionados permitiría-nos analiticamente considerar quatro tipos de problemas:
relações entre áreas de atividade social, considerada cada uma de forma global e como exemplo
poderíamos mencionar a relação entre Economia e Estado enquanto instituições
relações entre sistemas de idéias institucionalizadas de diversas áreas, um exemplo seria as teorias
econômicas e crenças religiosas.
relações entre os sistemas de relações sociais concretas de um lado e as idéias institucionalizadas,
como o surgimento de determinadas formas de intercâmbio e a elaboração da teoria econômica
relações entre os sistemas de relações sociais em dada área de atividade e os sistemas de idéias
institucionalizadas de uma outra área, como a relação entre o surgimento das formas capitalistas e os
sistemas de idéias e valores protestantes
Nos ateremos as relações c) e d) do esquema, do problema das relações sociais e sistemas de idéias
institucionalizadas, que seria exatamente o segundo sentido da dicotomia infra-estrutura-superestrutura.
Verón relembra que na literatura sociológica do século XX a questão da “determinação social das idéias”
aparece na discussão da relação entre as idéias e ação social. Segundo o autor é freqüente na literatura
da sociologia da ação e especialmente na referência teórica de Talcott Parsons encontrarmos mal
entendidos em relação às idéias de Marx sobre a “relação entre base material e idéias”. A sociologia da
ação refere-se ao conceito de idéia como “componentes analíticos de toda ação humana”, Marx refere-se
a “sistemas específicos de idéias institucionalizadas e suas relações com sistemas específicos de
relações sociais, em uma sociedade global”(1968, p.147).
A oposição entre sociologia da ação e marxismo deriva antes de mais nada, segundo Verón, de uma
generalização feita, pela teoria da ação, de um desses níveis em sua existência particular: “a descrição
da ação social do ponto de vista do ator individual” (1968, p.149). Do modelo derivado de “tipos de ação”,
individual, a sociologia da ação tenta conceituar o modo de existência das idéias no plano da sociedade
global:
“Na sociologia da ação, a relação entre sistemas de relações sociais e idéias institucionalizadas (que é o
que está proposto na distinção infra-estrutura-superestrutura) se conceitua nos termos do problema da
relação do ator individual com suas idéias”(Verón, 1968, p.149).
Verón, de forma clara e objetiva, critica a postura da teoria sociológica que privilegia uma concepção
subjetivista da ação social, herdada do idealismo filosófico e que se cristalizou na figura de Weber e nos
estudos de Parsons. Segundo Verón, o que interessa a Marx é a descrição de sociedades globais
concretas e especificamente as sociedades capitalistas e o modelo “ideal” de ação racional, como é
possível enunciar do ponto de vista do ator, não se aplica à sociedade global.
E então segue diferenciando as respectivas unidades de análise: o ator em sua relação com outros
atores e o “sistema de idéias” no plano da sociedade global. Para o autor, se considerarmos construções
hipotéticas, na tentativa de estudarmos a ação social do ponto de vista do ator é necessário supor uma
“teoria dos signos ou dos fenômenos de significação”, modelos dos processos de significação para aí
então elaborarmos tipologias de orientações, expectativas, etc. Já no plano da sociedade global, Verón
argumenta:
“(...) nesse plano os ‘sistemas de idéias’, os componentes da superestrutura, não são nem mecanismos
inferidos de controle interno, nem condutas observáveis: são referência aos atores sociais, componentes
do meio ambiente, elementos dotados de uma existência que não é hipotética nem tampouco se
confunde com a conduta dos atores: são mensagens materializadas”(Verón, 1968, pg.153).
O que a autor nos esclarece é que o “sistema de idéias”, componente da superestrutura possui uma
existência material que é o que ele chama de “texto” – todo conjunto de signos pertencentes a um
determinado universo de discurso que é delimitado por um código e transmitido em uma situação
determinada e sobre a base de um suporte físico distinguível da conduta dos receptores. O sistema de
idéias seria entidades observáveis e perfeitamente distinguíveis da “ação social dessas comunidades”.
Considerando o que já foi dito, podemos então expressar qual a “definição operacional” da relação infra-
estrutura-superestrutura para Verón:
Trata-se da “relação entre sistemas de conduta observável de coletividades no interior da sociedade
global e mensagens socialmente institucionalizadas sob a forma de textos”(1968,p.154).
Dito isto, podemos passar para a próxima discussão referente ao conceito de superestrutura, já definido,
e os níveis de comunicação.

Superestrutura e níveis de comunicação


Para dar prosseguimento a discussão, Verón aborda uma palavra-chave que envolve o conceito de
superestrutura e níveis de comunicação: “idéia” (crença, opinião,etc).
Essa palavra e seus semelhantes:
“(...)arrastam irremediavelmente consigo uma concepção estática e “representacional” dos processos de
significação e implícita ou explicitamente se entendem como um repertório de imagens” (Verón, 1968,
p.155).
Mais adiante Verón define então “idéias” como sendo “sistemas de relações que devem ser
especificados em termos de sistemas de operações” (1968, p.156). Sugere a partir daí que os
fenômenos superestruturais são concebidos como um enorme receptáculo de conteúdos (idéias, valores,
normas), seria um complexo processo de circulação (emissão-transmissão-recepção) de textos e esses
não tem sentido fora da especificação do sistema de operações sintático-semânticas que define a
recepção por parte do destinatário.
Dito isto, uma análise dos fenômenos superestruturais deveria, segundo o autor, responder a transição
de uma concepção “representacional” a uma concepção “operacional” da significação, ou seja, “da noção
de idéia à de signo, da noção de orientação à de comunicação”(1968, p.156).
Verón critica qualquer classificação de “idéias” em “tipos” – como faz a sociologia da ação e a
diferenciação entre “idéias existenciais empíricas” e “normas” como se fossem signos de tipo distinto - se
esta não tiver como base o estudo das modalidades específicas de comportamento dos signos nos
vários níveis em que a ação social pode se analisada.
Assim podemos compreender que do ponto de vista do autor:
“Toda classificação em conceitos, normas, valores, dos conteúdos culturais – seja qual for à terminologia
empregada – é, do ponto de vista semiológico, uma classificação funcional, uma classificação de
processos e não de entidades”(Verón, 1968, p.157).
Nesse momento podemos enfatizar a grande contribuição do teórico Verón, ao trazer da lingüística e dos
estudos da pragmática da comunicação elementos significativos para discussão da relação infra-
estrutura e superestrutura, pois é desse domínio que advém a idéia de que:
“todo o signo, mesmo aqueles em que a função denotativa é predominante, tem uma dimensão
‘normativa’ na medida em que exerce um efeito sobre o receptor, e que este efeito não é
aleatório”(Verón, 1968, p.157).
Por isso não faz sentido a distinção clássica na sociologia da ação entre “idéias existencias” por um lado,
e “normas” , por outro.
E a propósito da relação entre níveis de comunicação e distinção infra-estrutura/superestrutura parte da
distinção entre os níveis de comunicação interpessoal e a comunicação no nível grupal (da sociedade
global).
No plano pessoal, a comunicação acontece através do funcionamento de três séries de informação:
 a série lingüística (auditiva)
 a série paralinguística (volume, tom, ritmo,etc)
 a linguagem corporal (gestos, expressões, posturas)
Já no plano da sociedade global, a comunicação restringiu-se por muito tempo à transmissão de
mensagens lingüísticas em transcrição gráfica e não obstante o surgimento de novos suportes materiais
para essas mensagens “há uma grande quantidade de mensagens que continuam sendo apenas
lingüísticas"(1968, p.159).
Verón observa que quando Marx e Engels abordavam o conceito de “superestrutura” – no segundo
sentido da distinção que já fora definido – referiam-se a mensagens lingüísticas sobre o “direito”, a
“filosofia”, “crenças religiosas” e assim por diante.
E desse ponto de vista o estudo sociológico da superestrutura, da determinação social das idéias: “tem
sido o estudo dos mecanismos da significação que podem operar na comunicação lingüística”(1968,
p.159).
Assim sendo, esquece-se que a organização social compreende uma complexa rede de sistemas de
relações interpessoais localizados em marcos institucionais específicos e Verón ressalta a importância
dos códigos analógicos e outros códigos paralinguísticos para distinção infra-estrutura-superestrutura
pois opera justamente separando;
“(...) fatos que, do ponto de vista da comunicação, apresentam justamente diferenças fundamentais: o
primeiro membro da dicotomia agrupa fatos de interação nos quais a comunicação paralingüística e os
códigos analógicos têm importância; o segundo membro agrupa especificamente as mensagens sociais
transmitidas através do sistema digital da língua”(Verón, 1968, p.160).
Em função do que até aqui fora exposto podemos afirmar que no modelo marxista a distinção entre uma
“infra-estrutura” - concebida como uma área funcional do sistema de ação e que parece apresentar a
especificidade de ser mais “básica” ou “primária” em relação às outras - e uma “superestrutura” -
mensagens socialmente institucionalizadas em “textos” - contém o problema da relação entre sistemas
analógicos e sistemas digitais de codificação.
Verón assinala que a problemática sociológica, da qual tratamos nessa breve discussão, girou durante
muito tempo em torno da comunicação em mensagens lingüísticas, pois nos tempos de Marx a
transmissão em massa de conteúdos ideológicos só podia assumir a forma de textos lingüísticos. No
entanto, as inovações tecnológicas na esfera da comunicação verificada ao longo do século XX
trouxeram também modificações nos modos de operação dos fenômenos superestruturais. E a proposta
do autor, em relação à determinação, é de que tais inovações afetam a “própria estrutura da
comunicação dos conteúdos ideológicos”:
“(...) a diferença entre um processo político em que a comunicação se estabelece predominantemente
através de mensagens lingüísticas, nas quais o efeito opera graças aos mecanismos semiológicos
possíveis em uma série digital não acompanhada de outras séries, e uma situação na qual intervém de
forma decisiva a televisão, por exemplo, não é uma mera diferença de “canais de comunicação”: é uma
diferença na estrutura semântica da informação transmitida”(Verón, 1968, p.162).
De fato, tanto o cinema como a televisão tornaram possível a transmissão em massa de mensagens
paralinguísticas de conteúdos codificados analogicamente e os estudos sobre a dicotomia infra-estrutura-
superestrutura seguiram pecando pela ingenuidade e por permanecerem à margem dos progressos da
lingüística contemporânea.
“O certo é que o estudo das propriedades das mensagens muito complexas (nas quais intervêm códigos
analógicos e paralinguísticos juntamente com o código digital da língua), com as armas conceituais da
semiologia, ainda está por ser feita”(Verón, 1968, p.163).
Quanto ao problema da determinação, Verón, observa que muitos autores ao afirmarem a influência que
as “idéias” exercem sobre a ação acreditam estarem abandonando a hipótese marxista sobre a
“determinação material da superestrutura”. E argumenta que esse fato deve-se a uma confusão pois
quando a teoria marxista afirma que os fenômenos superestruturais estão determinados pela infra-
estrutura, ou seja, pela base material, trata da hipótese que remete ao problema da “gênese da
mensagem”, da emissão dos textos. Isso significa compreender “por que foram emitidas estas
mensagens com estas características e não outras” devendo proceder à identificação social da fonte
(1968, p. 163). Para que essa compreensão seja atingida, é necessário alcançarmos a causalidade das
condutas e é evidente que não podemos explicar as características do ator social pela estrutura de suas
mensagens e sim pelo inverso.
Essa foi apenas uma tentativa de apresentação de alguns pontos de vista de Eliseo Verón a propósito
dos fenômenos superestruturais. Partindo de um objetivo metodológico e empírico, explorando “mediante
que métodos e técnicas se pode chegar a um estudo rigoroso das dimensões superestruturais” (1968,
p.141) de alguns processos dos sistemas sociais, alcança seu propósito de maneira sempre clara e
precisa dialogando com a sociologia do conhecimento até atingir o campo da semiologia e suas
contribuições para a discussão da relação infra-estrutura e superestrutura.

Livros publicados
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Lenguaje y Comunicación Social. Buenos Aires: 1969.
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Construire I’ événement, Les médias et I’ accident de Three Mile island. Paris: 1981, Buenos Aires: 1983.
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(colaboração E. Fouquier).
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