Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Revista - Protestantismo em Revista - Bourdieu PDF
Revista - Protestantismo em Revista - Bourdieu PDF
http://www3.est.edu.br/nepp
Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de Teologia
Volume 14, set.-dez. de 2007 – ISSN 1678 6408
Coordenador Geral
Prof. Dr. Oneide Bobsin
Conselho Editorial
Berge Furre - Universidade de Oslo
Emil A. Sobottka - PUCRS
Adriane Luísa Rodolpho – Escola Superior de Teologia
Ricardo W. Rieth – Escola Superior de Teologia/ULBRA
Edla Eggert - Unisinos
ISSN: 1678-6408
Revisão
Integrantes do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo: Adriana Weege, Adriane Luísa
Rodolpho, Alessandro Bartz, Dilceu Locir Witzke, Ezequiel de Souza, Felipe Gustavo Koch Buttelli,
Iuri Andréas Reblin, Kathlen Luana de Oliveira, Marcelo Sieben, Nivia Ivette Núñez de la Paz, Oneide
Bobsin, Rogério Sávio Link.
Editoração Eletrônica
Iuri Andréas Reblin
Os trabalhos deverão ser enviados para o correio eletrônico do Núcleo de Estudos e Pesquisa do
Protestantismo: nepp_iepg@yahoo.com.br. Consulte as normas no site da revista. Demais
informações e edições anteriores, acesse o site (http://www3.est.edu.br/nepp)
Sumário
Editorial................................................................................................................................................. 4
Textos:
Pierre Bourdieu: notas biográficas ..................................................................................................... 6
Por Adriane Luísa Rodolpho
Poder & Intrigas, uma novela teológica: considerações acerca das disputas de poder no
campo religioso à luz do pensamento de Pierre Bourdieu e de Rubem Alves.......................... 14
Por Iuri Andréas Reblin
As mulheres vão à rua, os homens ficam em casa: reflexões preliminares sobre a Rede de
Enfrentamento à Violência contra a Mulher de São Leopoldo .................................................... 74
Por Ezequiel de Souza e Laura Zacher
Editorial
Como segundo artigo, Iuri Andréas Reblin nos oferece suas “considerações
acerca das disputas de poder no campo religioso à luz do pensamento de Pierre
Bourdieu e de Rubem Alves”. Em Poder & Intrigas, uma novela teológica, Iuri
procura cruzar a teoria de campos de Bourdieu com a teologia crítica de Rubem
Alves, usando como ponte o binômio Instituição-comunidade.
O quinto artigo nos é oferecido por Nivia Ivette Núñez de la Paz e Rogério
Sávio Link. Em Bourdieu e o fazer teológico, os autores argumentam pela
possibilidade da teoria de Pierre Bourdieu ser de proveito para a teologia. Para eles,
sua sociologia contribui com a teologia na medida em que exige um compromisso
profético com o Evangelho.
Resumo:
Este artigo retoma algumas contribuições em língua francesa sobre a obra de Pierre
Bourdieu, publicadas logo após a morte deste sociólogo em 2002. Trata-se de um artigo e de
uma revista, os quais foram confrontados a alguns aspectos biográficos do autor.
Palavras-chave:
Bourdieu – religião - biografia
* Mestre em Antropologia Social pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Doutora
em Antropologia Social e Etnologia pela École des Hautes Études em Sciences Sociales (EHESS -
Paris). Professora da Escola Superior de Teologia de São Leopoldo.
1 DIANTEILL, Erwan. “Pierre Bourdieu et la religion. Synthèse critique d’une synthèse critique”.
Archives de Sciences Sociales des Religions, 118 (avril-juin) 2002, p. 5-19.
2 DORTIER, Jean-François. “Les idées pures n’existent pas”. In: Sciences Humaines, n. spécial Pierre
Bourdieu, 2002, p. 3-8.
3 DORTIER, 2002, p. 3. Tradução própria.
4 FOURNIER, Martine. “La domination masculine”. In: Sciences Humaines, n. spécial Pierre Bourdieu,
2002, p. 50-53.
A década dos anos 1960 marca o retorno do sociólogo à França (1961) e seu
ingresso na Escola Prática de Altos Estudos (EPHE) em 1964. É esse o ano de
lançamento de Les Héritiers (junto com Passeron); em 1965, junto com Boltanski,
Castel e Chamboredon, Bourdieu publica Um Art Moyen Essai sur les usages sociaux de
la photographie; no ano seguinte, aparece L’Amour de l’Art e, em 1967, Le Métier de
sociologue (com Passeron e Chamborédon). Essa intensa produção bibliográfica se
desenvolve paralelamente ao seu trabalho junto a Raymond Aron, com quem
partilha a direção do Centro Europeu de Sociologia Histórica. Ainda nessa década,
Aron e Bourdieu se desentendem e, em 1968, esse funda seu próprio laboratório: o
Centro de Sociologia Européia.
5 CHARTIER, Roger. “Le sociologue et l’historien”. In: Sciences Humaines, n. spécial Pierre Bourdieu,
2002, p. 85.
Nos anos 1980, Bourdieu publica oito livros, a maioria deles logo encarados
como ‘clássicos’: Le sens pratique, 1980; Questions de sociologie, 1981; Leçon sur la leçon
em 1982 e também Ce que parler veut dire; em 1984, Homo Academicus, 1987, Choses
dites, 1988, L’ontologie politique de Martin Heiddeger e Noblesse d’État, de 1989. Nessa
década, Bourdieu publica sozinho, com a carreira consolidada na França (apesar de
ter se desentendido com boa parte de seus colegas do campo acadêmico) parte em
busca do “mercado intelectual internacional”6, sobretudo norte-americano.
6 DORTIER, 2002.
7 TOURAINE , Alain. “Le sociologue du people”. In Sciences Humaines, n. spécial Pierre Bourdieu,
2002, p. 101-103.
8 TOURAINE, 2002, p. 101. Tradução própria.
vento novo ao debate público, átono desde os anos 1980, fixo num ‘pensamento
único’ de inspiração neoliberal”9.
Em 1992, Bourdieu publica Les règles de l’art e Réponses Pour une antropologie
réflexive; além de Misere du monde, em 1993, aparece Libre-échange (com Hans Haacke);
em 1994, Raisons pratiques; em 1996, Sur la télévision; em 1997, Les usages sociaux de la
science e Méditations pascaliennes; em 1998, La domination masculine e Contre-feux 1
(Propos pour servir à la résistance contre l’invasion neo-libérale).
9 CORCUFF, Philippe. “Respect critique”. In: Sciences Humaines, n. spécial Pierre Bourdieu, 2002, p.
70. Tradução própria.
10 Esses propósitos foram expressos por Wiktor Stoszkowski, em seminário à l’EHESS (2001).
11 A simples referência ao título do livro da autora é elucidativa: Le savant et la politique. Essai sur le
terrorisme sociologique de Pierre Bourdieu. Verdes-Leroux, Jeannine. Ed. Grasset, 1991.
falando - e se estende para o campo social mais amplo. Nesse sentido, percebemos
como o capital simbólico de Bourdieu excede seu campo de origem e como a sua
influência se faz sentir em outras esferas sociais. É interessante notar que as noções
de Bourdieu podem ser percebidas em sua trajetória: as disputas no campo
acadêmico, a violência e o poder simbólico, a constituição de habitus e a distinção,
enfim, uma série de aproximações podem ser feitas nesse sentido.
relembra que naquela época a exigência de distância entre o sujeito e seu objeto de
pesquisa era redobrada no caso das análises relativas à religião.
14 HERVIEU-LÉGER, Daniele. “De l’utopie a la tradition: retour sur une trajectoire de recherche”. In
LAMBERT, Y.; MICHELAT, G. et PIETTE, A. (Org.) Le religieux des sociologues. Trajectoires
personnelles et débats scientifiques. Paris: l’Harmattan. 1997, p. 22. Tradução própria.
15 DIANTEILL, 2002, p. 17. Tradução própria.
Resumo:
O presente ensaio tece algumas considerações acerca das disputas de poder no campo
religioso, tendo por referencial a noção de campo de Pierre Bourdieu e o pensamento crítico
de Rubem Alves acerca da tensão instituição-comunidade.
Palavras-chave:
disputas de poder – campo religioso – Rubem Alves – Pierre Bourdieu
Rubem Alves1
* Teólogo brasileiro, mestre em teologia pela Escola Superior de Teologia (EST) de São Leopoldo
(RS) com o apoio do CNPq – Brasil. Pesquisa a teologia que está além das fronteiras institucionais e
que se manifesta em outros planos de expressão, como o cinema, os quadrinhos, os romances de
folhetim e as telenovelas e nas relações interpessoais que acontecem na cotidianidade da vida
humana.
1 ALVES, Rubem. Dogmatismo & Tolerância. São Paulo: Loyola, 2004, p. 45.
medições de forças e marcado por lutas permanentes que visam estruturar e manter
o controle sobre um determinado ambiente. Chamado por Pierre Bourdieu de campo,
esse microcosmo social é o universo intermediário entre um determinado texto e seu
contexto. Esse universo intermediário é constituído de relações entre agentes e
instituições que visam a aquisição de capital e, logo, poder, com o objetivo final de
manter o controle ou o monopólio sobre o respectivo campo em que se encontram. É
o caso, por exemplo, de emissoras que estabelecem e mantém contratos de
exclusividade com certos atores, diretores e roteiristas consagrados (o que representa
grande parte de seu capital simbólico) pois elas sabem que a atuação de tais
profissionais é um elemento-chave para garantir a boa audiência da novela. A alta
audiência significa a oportunidade de cobrar mais caro pelas inserções publicitárias
nos intervalos ou dentro das próprias novelas. Logo, aquele que detém um maior
capital específico daquele e naquele campo possui o controle do campo. Se uma
emissora consegue sucesso com suas novelas, é provável que a mesma fórmula de
sucesso (estilo de narrativa, por exemplo) seja copiada por outras emissoras. Em
outras palavras, quem tem o controle dita as regras, pelo menos até que outro surja
com algo tão revolucionário, inédito, capaz de inverter ou transformar o pólo de
forças dentro do campo. Nas palavras de Pierre Bourdieu,
O campo religioso
2 BOURDIEU, Pierre. Os usos sociais da ciência: por uma sociologia clínica do campo científico. São
Paulo: UNESP, 2004, p. 29.
3 MATEOS, Juan; CAMACHO, Fernando. Jesus e a sociedade de seu tempo. São Paulo: Paulinas, 1992, p.
53-56.
outros campos – como Pierre Bourdieu tão bem descreveu – um campo de forças e
um campo de lutas entre agentes e instituições, entre agentes e agentes e entre
agentes e fiéis.
Esse ato de envolver coisas e pessoas por uma aura sacra, Bourdieu chama de
poder de consagração. Ao modificar a natureza das coisas e das pessoas, ao transformar
o ‘assim é’ em o ‘assim deve ser’, a religião expressa sua força estruturante, sua
eficácia simbólica e revela sua função política, o que é chamado por Bourdieu de
alquimia ideológica, justamente, por ela “[...] conferir à ordem social um caráter
transcendente e inquestionável”5. Nesse sentido, a religião de uma determinada
4 OLIVEIRA, Pedro A. Ribeiro de. A teoria do trabalho religioso em Pierre Bourdieu. In: TEIXEIRA,
Faustino (Org.). Sociologia da Religião: enfoques teóricos. Petrópolis: Vozes, 2003, p. 179. Cf. também
diretamente da fonte: BOURDIEU, Pierre. A Economia das trocas simbólicas. 6. ed. São Paulo:
Perspectiva, 2005, p. 27-98.
5 OLIVEIRA, 2003, p. 180.
sociedade só será eficaz se ela estiver em sintonia com essa sociedade e se for capaz
de reproduzir no ‘céu’ o que existe na ‘terra’ (as estruturas hierárquicas de poder) ou
seja, se ela desempenhar funções sociais, mais ainda, se ela for capaz de incutir em
seus fiéis seus esquemas de pensamento e, assim, incorporar hábitos como se fossem
algo natural do indivíduo. “Toda a religião exerceria, assim, a função política de
eternizar uma dada ordem hierárquica entre grupos, gêneros, classes ou etnias”6. A
partir disso, Pierre Bourdieu desenvolve um caminho próprio que vai desembocar
numa nova forma de se observar e de se entender a religião. Essa nova perspectiva
acerca da religião está construída sobre três noções elaboradas por Bourdieu: a noção
de trabalho religioso, a noção de campo religioso e a “relação entre especialistas e
consumidores de bens religiosos”7.
dízimo ou outro). O segredo de tudo está em fazer os leigos acreditarem que aquilo
que os especialistas afirmam é suficiente para suprir a necessidade de sentido para
sua condição existencial. Há um reconhecimento social de que os especialistas são os
aptos a produzir, a reproduzir e a distribuir esses bens e é nesse sentido que eles
ganharão legitimidade para combater o pensamento divergente daquele que eles
difundem. O pensamento oficial se reveste de autoridade e adquire solidez em
dogmas e doutrinas e é aquele que mais perdura nos registros históricos, visto que
são escritos pelos próprios especialistas.
Não é necessário varrer a história de trás para frente para buscar evidências
dessa novela teológica permeada por intrigas, articulações melindrosas e, sobretudo,
disputas de poder. O que foi o embate entre Ário e Atanásio e seus respectivos
aliados em torno do termo ousia na confissão de fé da igreja cristã senão uma disputa
de poder? E o que dizer das intervenções do imperador Constantino ou, alguns
séculos mais adiante, do romance trágico entre Heloísa e Abelardo? E como enxergar
a tensão entre as divergências entre Martim Lutero e a igreja de seu tempo, as quais
resultaram na ex-comunhão do monge? Ou ainda, muito antes disso, o que foi a
morte de João Batista e de Jesus de Nazaré senão uma tentativa de silenciar qualquer
questionamento às autoridades religiosas de seu tempo? Disputas políticas por poder
e por controle permeiam a história da igreja cristã (e assim, muito provavelmente, de
outras instituições religiosas em suas peculiaridades) e da própria teologia. Não há
como ignorar ou negar isso. Fazê-lo é se sujeitar a um tipo mascarado de dominação
e não perceber que a visão de um todo maior está atrofiada. Uma visão
fundamentalista acaba por enrijecer qualquer diálogo na perspectiva de uma
interculturalidade, i.e., de uma conversa que reconhece, “[...] em posição de
igualdade e de alteridade, a pluralidade de culturas no mundo e sua relação de
diálogo e de enriquecimento mútuo”13. Enfim, essas disputas perpassam toda a
história e atingem a vida presente. E é por causa disso que se torna imprescindível
lançar um olhar para aqueles pensadores que, dentro do campo religioso, são capazes
de identificar essas disputas e de vislumbrar outras perspectivas.
14 ALVES, Rubem. O Deus do furacão. In: ALVES, Rubem (Org.). De dentro do Furacão: Richard Shaull
e os primórdios da Teologia da Libertação. São Paulo: Sagarana/CEDI/CLAI/Programa
Ecumênico de Pós-Graduação em Ciências da Religião, 1985, p. 21.
15 ALVES, Rubem. O Enigma da Religião. 5. ed. Campinas: Papirus, 2006, p. 10ss.
16 ALVES, 1985, p. 22.
Para Rubem Alves, duas coisas precisam ser consideradas quando se pensa
no campo religioso. Em primeiro lugar, a teologia não pode jamais se pretender como
ciência do divino e como tal julgar-se apta a descrever a fisiologia, a anatomia, ou
ainda a psicologia de Deus. A teologia enquanto ciência é uma ciência humana que
interpreta horizontes e símbolos religiosos nos quais as pessoas se agarram. No
entanto, antes disso, e, sobretudo, a teologia é sapiência, i.e., ela é um saber
vinculado intimamente à arte de viver e de amar, envolto em uma aura de grande
valor emocional e existencial. É uma atividade natural de todo ser humano cuja
busca é de encontrar-se no mundo e fazer dele seu lar. Em segundo lugar, a pergunta
em relação à religião (referindo-se a instituição religiosa, a igreja cristã enquanto
instituição) nunca é ‘o que é a religião’, mas ‘quem é a religião’; nunca ‘o que diz a
religião’, mas ‘quem diz a religião’. A religião pode ser compreendida de diversas
formas e ela sempre tem a ver com aquilo que se enxerga da realidade, mas nunca é a
totalidade da realidade que é enxergada e, por isso, torna-se perigoso para a religião
institucionalizada e para a teologia reivindicar para si a ‘questão da verdade’.
E o jogo da teologia?
Parece não existir coisa alguma mais desejável e saborosa que buscar
e encontrar a verdade: contemplar as coisas tais como elas são, dizê-
las num dizer transparente e preciso, que oferece aos olhos da razão a
visão da realidade, sem sombras e sem enganos...
E não se pode negar que assim seja, bastando para isso que se aceite
que a realidade já está pronta, dada, fixada, simplesmente à espera do
19 ALVES, Rubem. Variações sobre a vida e a morte ou o feitiço erótico-herético da teologia. São Paulo:
Loyola, 2005, p. 75.
Para Rubem Alves, a teologia se encontra presa num círculo vicioso, do qual
ela não consegue escapar. A instituição religiosa legitima a forma como a teologia
deve se comportar e agir. Não há contestação, pois a instituição religiosa se encontra
ao lado (e a serviço) da verdade sobre Deus. E o que é ter a verdade sobre Deus? É ter
um pensamento que se cristalizou na instituição religiosa e serve de modelo de
crença. E aquilo que for contrário a esse modelo de crença gera um conflito e uma
resposta repressora. Isso significa que qualquer pensamento divergente é excluído e
precisa ser reprimido. Se ele se manifesta fora da instituição religiosa, ele é
desprezado, pois, fora da instituição religiosa (e aí se pode incluir hoje a academia de
teologia) não há legitimidade para se falar de Deus. Embora seja possível para quem
está fora da instituição religiosa falar de Deus, ele há de se sujeitar às correções do
especialista (teólogo, sacerdote...) pois é este, em última instância, que detém a
verdade sobre Deus.
instituição religiosa. Nesse sentido, Rubem Alves ressalta que a “heresia não é algo
que se situa no plano da verdade, como oposição a ela. A heresia se situa no plano do
poder. Ortodoxos são os fortes [...]. Por isso eles se definem como portadores da
verdade e aos seus adversários como portadores da mentira”22. Ortodoxos são
aqueles que acreditam trilhar o “caminho correto” da teologia, por conhecerem a sua
“doutrina correta”. Os ortodoxos são os chefes da instituição religiosa. São aqueles
que legitimam o próprio “caminho correto” da teologia e buscam desesperadamente
pela verdade sobre Deus, que não está na realidade presente, mas na realidade que
está além do presente.
Considerações Finais
23 ALVES, Rubem. Sei que a vida vale a pena... Tempo e Presença. Rio de Janeiro, n. 224, out., 1987, p.
26-27.
24 ALVES, Rubem. Se eu pudesse viver minha vida novamente... 8. ed. Campinas: Verus, 2004, p. 23.
25 ALVES, Rubem. Lições de Feitiçaria. São Paulo: Loyola, 2000, p. 20.
Resumo:
Este artigo tem o propósito de apresentar a sociologia da religião de Max Weber a partir da
interpretação bourdiana da teoria da religião. Delineia-se através da sistematização de Pierre
Bourdieu, levando-se em conta a teoria sociológica weberiana da religião, observando-se o
recorte e a operacionalização do autor.
Palavras-chave:
Sociologia da religião - Max Weber - Pierre Bourdieu
7 O sociólogo Pedro de Oliveira afirma que no conceito de trabalho religioso reside a maior
contribuição à sociologia da religião por Pierre Bourdieu. Para ele, “há trabalho religioso quando
seres humanos produzem e objetivam práticas ou discursos revestidos de sagrado, e assim
atendem a uma necessidade de expressão de um grupo ou classe social”. Oliveira, Pedro A. Ribeiro
de. A teoria do trabalho religioso em Pierre Bourdieu. In: TEIXEIRA, Faustino. Sociologia da religião.
Petrópolis: Vozes, 2003, p. 182.
8 BOURDIEU, 1992, p. 79.
9 BOURDIEU, 1992, p. 80.
10 BOURDIEU, 1992, p. 81.
11 BOURDIEU, 1992, p. 81.
econômica e social dos leigos16. Para Bourdieu, pode-se falar de interesses religiosos
quando surge uma demanda ideológica, isto é, a
Nesse ínterim, Bourdieu faz notar que, na luta pela concorrência religiosa, os
instrumentos e estratégias utilizadas dependem da autoridade religiosa, levando
ainda em conta a posição na divisão do trabalho23 e a posição na estrutura objetiva.
tipo racional”, que tem sua força de ação contínua e cotidiana, auxiliado por um
aparelho administrativo potente e organizado burocraticamente25.
Nesse sentido, para que o profeta inculque uma conduta de vida de efeito
duradouro, é necessário que a profecia morra, no intuito de não mais ser uma
mensagem de ruptura à rotina e à ordem social, incorporado ao corpo sacerdotal
“moeda cotidiana do capital original de carisma”26. No fim, conforme Bourdieu, na
luta pelo exercício legítimo do poder religioso, o que vai prevalecer é a autoridade e a
força que se conquistou no transcorrer da luta.
4. Sobre a legitimidade religiosa, Bourdieu tece que ela é resultado direto das
lutas passadas pelo exercício legitimo da religião. O que ocorre de forma violenta e
depende das armas materiais ou simbólicas que os agentes pelo monopólio do
exercício religioso legítimo podem usar nas relações de peleja religiosa. O sociólogo
destaca que, enquanto a autoridade do profeta é estabelecida a cada instante,
dependendo da oferta e demanda de serviço religioso, o sacerdote “dispõe de uma
autoridade de função que o dispensa de conquistar e de confirmar continuamente
sua autoridade e o protege das conseqüências do fracasso de sua ação religiosa”27.
Apontamentos críticos
Resumo:
Este artigo é o resultado de uma observação, situada numa pesquisa mais ampla que procura
compreender o papel do culto cristão na constituição das diferenças sociais, dos papéis que
diferentes agentes desempenham no universo das relações sociais. A pesquisa é amplamente
respaldada pela análise bourdieusiana, a qual projeta sobre uma prática eclesial – a
celebração litúrgica comunitária – referencial crítico que visa possibilitar compreender o
culto como lugar de diferenciação social. Neste sentido, este artigo, ainda que
experimentalmente, trabalha com o cerne da investigação proposta nesta pesquisa mais
ampla. Após ser realizada aplicação de referencial teórico bourdieusiano em uma observação
de um culto ordinário, pode-se perceber que nada no culto está livre de prerrogativas
distintivas que (re)afirmam o lugar social dos determinados agentes. Esta reflexão crítica visa
representar acréscimo à prática eclesial, atentando para aqueles momentos em que ela não
exerce sua função primordial – a de acolher com amor pessoas em suas diferenças.
Palavras-Chave:
Culto Cristão - Liturgia - Performance - Bourdieu - Observação
1 Considerações preliminares:
Este trabalho de observação não tem a pretensão de ser uma análise objetiva
da realidade, mas um ensaio, uma experiência. Menciono isso pelo fato de que
algumas afirmações que me proponho a fazer têm um caráter bastante subjetivo,
podendo soar injustas ou até irreais para quem não concebe a realidade a partir dos
mesmos pressupostos que aqui serão lançados. No entanto, esse exercício de
observação de um culto da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB)
tem por objetivo alçar vôo sobre outra forma de abordagem e de análise do tema:
culto. Por isso, ainda que provisória e questionável, ela representa um acréscimo no
âmbito da investigação científica que se realiza na Escola Superior de Teologia (EST)
e na maneira de se conceber a vida cultual dentro da própria IECLB.
2 Da Observação
1 Aqui o que se compreende por observação não tem respaldo bibliográfico sobre a pesquisa social.
Como observação participante compreende-se o olhar parcial e comprometido de alguém que
pertence ao grupo e que celebra culto conjuntamente.
3 O Culto
Mais adiante, havia uma mesa com dois homens (um deles era o tesoureiro
da paróquia) sobre a qual havia um bilhete dizendo: “atualização dos membros”.
Eles tinham uma lista de nomes, dos membros da paróquia, e aceitavam o
pagamento das contribuições.
3.2 No templo
4 Aqui se fará referência aos dois pastores (homens) que oficiaram o culto como A e B.
O tema da prédica, assim como o tema do culto, era “os limites te protegem”.
Ao verificar no texto bíblico que Jesus proibira seus discípulos de mandarem cair
fogo do céu sobre a Samaria, a prédica fez menção às proibições que nos são
impostas na vida, pelas diversas pessoas e situações, como contendo algo de
positivo, de proveitoso para o nosso aprendizado, como no caso dos discípulos.
5 Termos utilizados neste texto conforme o Livro de Culto da IECLB. Ver MARTINI, Romeu R. Livro de
Culto. São Leopoldo: Sinodal, 2003, p. 19.
Por quatro ou cinco vezes trocaram as pessoas do semicírculo, até que todos,
inclusive os músicos (pianista e grupo de canto que auxilia na liturgia) e os dois
pastores tomassem a Ceia. Os semicírculos eram dispersos após uma pequena bênção
e envio que um dos pastores realizava, mencionando um versículo bíblico. Muitas
pessoas o escutavam e depois dobravam os joelhos e baixavam a cabeça como uma
espécie de reverência em direção da cruz. A ceia é realizada de maneira bem
silenciosa, tendo apenas o acompanhamento musical do pianista.
Após a liturgia da Ceia, o pastor B fez a oração memorial para duas famílias.
Na primeira menção, o pastor pediu que a família do falecido se colocasse de pé para
a comunidade identificá-la. Após isso, fez a leitura dos dados da pessoa falecida e
referiu-se ao seu sepultamento no Cemitério Evangélico (da comunidade) com as
seguintes palavras: “[...] foi sepultado cristãmente [sic] no Cemitério Evangélico”.
Para a segunda família enlutada, o pastor agiu da mesma maneira. No entanto, pelo
fato do falecido ter sido cremado (provavelmente por isso), o pastor não fez a
menção acima de que havia sido “sepultado cristãmente” [sic]. Após a oração
memorial, foi feito um interlúdio (musicado).
O texto que será utilizado aqui para servir de referencial para a análise da
observação é do livro A Economia das Trocas Lingüísticas de Pierre Bourdieu, os seus
dois primeiros capítulos, A Economia das Trocas Lingüísticas e Linguagem e Poder
Simbólico6.
6 BOURDIEU, Pierre. A Economia das Trocas Lingüísticas: o que falar quer dizer. São Paulo: EDUSP,
1996, p. 9-128.
7 BOURDIEU, 1996, p. 23-24.
Professores e professoras adequam a língua das crianças àquela “criada” pelo corpo
de especialistas na área da lingüística11.
Nesses termos, um discurso é tão mais poderoso quanto maior for o seu
reconhecimento por parte do grupo social ou da sociedade em geral, através de seus
sistemas de reconhecimento (diplomas, títulos, etc.). A pessoa que tem competência
legítima para proferir determinados discursos a tem por haver recebido
estatutariamente autoridade de um grupo de pessoas. Essa autoridade, quando
manifesta na performance17 do ator social, tem poder de instituir realidade e, portanto,
de ser seguida ou imitada por aqueles que a observam18. A partir dessa constatação,
Bourdieu afirma que a eficácia de qualquer discurso, inclusive do discurso religioso
ou ritual, está assentada na dominação simbólica situada no âmbito das trocas
lingüísticas.
21 A representação pode ser concebida em dois sentidos: a) a própria delegação que o agente adquire,
personificando o grupo, e b) o conteúdo da sua fala como sendo correspondente às categorias que
se imputa sobre os indivíduos, tendo, assim, a representação à força de determinar a priori a ordem
das coisas socialmente constituídas como algo naturalmente ou biologicamente incontestável.
BOURDIEU, 1996, p. 81-83 e ainda as páginas 107-116.
22 BOURDIEU, 1996, p. 81.
23 BOURDIEU, 1996, p. 82-83.
24 BOURDIEU, 1996, p. 83.
transformação social quando suas palavras de ordem estão respaldadas pelo capital
simbólico, poder acumulado, tanto pelo grupo quanto pelo agente que o profere. Em
suma, as palavras só surtem efeito quando autorizadas ou legitimadas por um poder
(capital) simbólico, sem o qual elas cairiam no vazio, não podendo operar na
realidade aquilo que elas pretendem25.
importante nesses ritos, a saber, não a passagem em si, mas a capacidade de instituir
a diferença. Assim, os ritos não são balizados pela situação a que eles remetem, mas
pelo corte arbitrário que eles exercem, capaz de definir a realidade, concebida
socialmente, como algo inscrito na natureza das coisas, portanto, na irrevogabilidade
das conseqüências dos ritos para os que o sofrem (são permitidos) e os que não o
podem sofrer28.
Como último ponto de discussão que é interessante para este trabalho, Pierre
Bourdieu reflete sobre os limites da eficácia política33 que está permanentemente
incutida em todos os aspectos demonstrados anteriormente. A luta existente entre os
discursos dos diferentes grupos sociais para elaborar o discurso socialmente aceito de
classificação objetiva da realidade é subjacente a todos os mecanismos, dos quais
fazem uso esses mesmos discursos no processo de inculcação e de somatização dos
seus respectivos valores. Sendo também a linguagem e os discursos rituais e coletivos
espaço onde há consagração de um determinado discurso e condenação de outro ao
desaparecimento (já que o discurso dominante elabora as categorias de percepção do
que existe e do que não existe), cabe a consideração de que todos os enunciados
performáticos têm uma condição essencialmente política e, como se afirmou no início
desta reflexão, nunca neutra.
35 BOURDIEU, 1996, p. 118. Heresia, para Bourdieu, é o discurso que discorda da doxa. Sendo a doxa
compreendida como o discurso dominante acerca da visão de mundo – discurso que se torna senso
comum e determina como dominados e dominantes concebem a realidade – a heresia é, portanto,
uma visão alternativa daqueles dominados que, desvinculando-se da visão dominante, conseguem
vislumbrar uma ordem social diferente, mais justa. Esse discurso herético, desempenhado nas
performances dos heresiarcas, tem características de um discurso profético, que anuncia uma nova
maneira de conceber as relações sociais até então velada.
36 BOURDIEU, 1996, p. 119.
37 BOURDIEU, 1996, p. 118.
38 BOURDIEU, 1996, p. 118.
esposa do pastor (agente autorizado a proferir o discurso)? Faz ela parte desse
agente? Ou ela é só mais uma pessoa saudando a seus e a suas conhecidas? Se for o
caso de a esposa do pastor fazer parte desse “agente autorizado”, então deveríamos
sempre direcionar o foco no agente autorizado para dois locais: o pastor em si e a sua
esposa, verificando no decorrer do culto qual função executa cada um deles. Além
disso, se a esposa compõe o agente autorizado, deveríamos sempre observar a ação
performativa do pastor (pastora) em relação à sua condição de solteiro ou casado.
ser visto de duas maneiras: Ela mesma não se sente à vontade para tratar dos temas
cotidianos com as suas conhecidas (hipótese que acho mais provável) ou o grupo de
senhoras não cria um espaço acolhedor para conversar com a senhora enlutada sobre
seu luto. Talvez as duas hipóteses ajam sutil e simultaneamente.
40 Uma análise deste fato que levasse em consideração o peso da tradição talvez fosse mais profícua e
apresentasse mais elementos explicativos para tal diferenciação. O argumento do peso da tradição,
portanto, é perfeitamente válido, embora aqui tenha se preferido dissertar sobre a possibilidade de
aspectos econômicos também exercerem força no julgamento que o ator da performance faz das
pessoas envolvidas. A opção pelo fator econômico e não pelo fator da tradição – que, reafirmo,
talvez seja mais forte – se dá pelo fato de que este ensaio pretende mostrar a
multidimensionalidade dos aspectos que estão envolvidos no julgamento social. O argumento
econômico é sempre o mais espinhoso, do qual mais se procura fugir, no entanto, ele está presente,
como ressaltaria a tradição marxista, à qual Bourdieu deve muitas de suas idéias.
Resumo:
O presente artigo tematiza a relação entre Bourdieu e o fazer teológico. Mesmo que este
entrecruzamento, para o pensamento de alguns, seja difícil de ser estabelecido, assumimos a
tarefa. Acreditamos que os pressupostos bourdianos podem contribuir com a teologia na
medida em que eles exigem um compromisso profético com o Evangelho.
Palavras-chave:
Bourdieu – teologia - trabalho religioso - profetismo
* Nivia Ivette Núñez de la Paz é doutoranda do PPG da Faculdades EST e bolsista CNPq. Pesquisa o
fenômeno religioso Comunidade Canção Nova, perguntando pela identidade que decorre da
relação entre religião e mídia. Endereço eletrônico para contato: nivianpaz@yahoo.com.br.
** Rogério Sávio Link faz doutorado, como bolsista da Capes, em teologia e história na Faculdades
EST em São Leopoldo, Rio Grande do Sul. Seu tema de estudo é a migração e formação do
luteranismo na Amazônia. Endereço eletrônico para contato: linkrogerio@yahoo.com.br.
1 OLIVEIRA, Pedro A. Ribeiro. A teoria do trabalho religioso em Pierre Bourdieu. In: TEIXEIRA,
Faustino (org.). Sociologia da Religião: Enfoques teóricos. Petrópolis: Vozes, 2003, (p. 177-197.) p.
186s., 188.
2 Nomeados como reverendos, padres, pastores, obreiros etc., segundo a denominação a qual
pertencem.
3 A religiosidade popular é toda e qualquer expressão religiosa que está fora do controle das
instituições religiosas oficiais. É a partir dessa concepção que André Droogers vai analisar a
religiosidade popular luterana. Cf. DROOGERS, André. Religiosidade Popular Luterana. São
Leopoldo: Sinodal, 1984.
4 Cf. BOURDIEU, Pierre. Gênese e estrutura do campo religioso. In: MICELI, Sergio (org.). A
economia das trocas simbólicas. São Paulo: Perspectiva, 1992, (p. 27-78.) p. 39.
5 Cf. BOURDIEU, Pierre. Razões práticas: Sobre a teoria da ação. Campinas: Papirus, 1996, p. 158.
6 BOURDIEU, 1996, p. 184s.
7 Cf. BOURDIEU, 1996, p. 161ss., 193.
Por outro lado, mesmo que um clérigo queira contestar o sistema, ele é
condicionado a reproduzi-lo, pois sua manutenção vem da ordem. “Em uma
sociedade dividida em classes, a estrutura dos sistemas de representações e práticas
religiosas próprias aos diferentes grupos ou classes, contribui para a perpetuação e
para a reprodução da ordem social [...]”14. Assim, os contestadores são acusados por
aqueles que estão nas direções das instituições de não fazerem mais parte da igreja,
de estarem subvertendo a ordem. “Neste sentido, por estar investida de uma função
de manutenção da ordem simbólica em virtude de sua posição na estrutura do
campo religioso, uma instituição como a Igreja contribui sempre para a manutenção
da ordem política”15.
Resumo:
O presente artigo é resultado parcial de uma pesquisa para o Seminário IV em Sociologia:
Prática de análises sociológicas, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. A pesquisa
foi realizada junto à Rede de Enfrentamento à Violência contra a Mulher de São Leopoldo
(REVM-SL). Tendo em vista os avanços nas políticas públicas das mulheres no município de
São Leopoldo, a pesquisa procurava entender essas transformações de forma processual.
Chegamos à REVM-SL por indicação de uma integrante e, a partir de observação
participante e questionários, algumas hipóteses foram formuladas. Encarando a REVM como
um movimento social organizado, problematizamos sua atuação em relação à mobilização,
caráter e divulgação das informações. Elementos que pretendemos elucidar na continuidade
da pesquisa são o capital social das pessoas integrante e sua influência na posição dentro da
Rede, as transformações no campo de produção de políticas públicas para as mulheres e a
relação dessas transformações no contexto mais amplo da sociedade.
Palavras-chave:
Violência contra a mulher - movimentos sociais - análise de redes sociais
“mulher” no município de São Leopoldo. Ela surgiu no ano de 2006, após ser
constatado durante o processo de Pré-Conferências e I Conferência Municipal da
Mulher, em 2005, que havia muitas entidades que trabalhavam com o mesmo
público, sem cooperação e sem conhecimento das ações umas das outras.
2 Entendemos a Rede de Enfrentamento à Violência contra a Mulher como um movimento social por
se enquadrar nos critérios propostos por Alberto Melucci, conforme a nota 11.
3 MATOS, Maria I. S. Por uma história das sensibilidades: em foco – a masculinidade. História:
Questões & Debates, n. 34, 2001, p. 45-63.
4 SCOTT, Joan. História das Mulheres. In: BURKE, Peter (Org.). A escrita da história: novas
perspectivas. São Paulo: UNESP, 1992, p. 63-95.
5 COSTA, Sérgio. Categoria analítica ou passe-partout político-normativo: notas bibliográficas sobre
o conceito de sociedade civil. Boletim Informativo e Bibliográfico de Ciências Sociais, n. 43, jan./jul.
1997a, p. 3-25.
6 COSTA, Sérgio. Esfera pública, sociedade civil e movimentos sociais no Brasil. Novos Estudos, n. 38,
1994, p. 39.
7 von HALDENWANG, Christian. Governanza sistémica y desarrollo en América Latina. Revista de
la CEPAL , n. 85, abr. 2005, p. 35-52.
8 COSTA, Sérgio. Movimentos sociais, democratização e a construção de esferas públicas locais.
Revista Brasileira de Ciências Sociais, São Paulo, vol.12, n. 35, 1997b. Disponível em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-
69091997000300008&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 12 dez. 2007.)
formas de ação.
Melucci afirma que até os anos 1970, havia a tentativa de reduzir a ação
coletiva a efeito de crises estruturais ou sistema de crenças compartilhadas, e as
tentativas de superar estas abordagens caíram em dualismos, relegando a ação às
categorias de patológica ou marginal. Ele entende que um dos erros das teorias da
década de 1970 consistia em acentuar, por um lado, o como o movimento se
estabelece, relegando o porquê a segundo plano; ou, por outro lado, acentuar o porquê,
esquecendo o como. Na década de 1980, as abordagens integraram os movimentos
sociais em sistemas, reduzindo sua ação ao nível político:
9 MELUCCI, Alberto. “Um objetivo para os movimentos sociais?” Lua nova. São Paulo: CEDEC, n.
17, jun. 1989.
10 MELUCCI, 1989, p. 53.
com que seja alterada a própria lógica das sociedades complexas. Como exposto
acima, não há uma definição clara acerca do que seja um movimento social. A maior
parte dessas definições são abstrações empíricas, onde há a tentativa de isolamento
de alguns aspectos empíricos dos fenômenos coletivos. A partir desses isolamentos,
cada autor escolhe aspectos diferentes, o que torna difícil uma comparação. Melucci
define o que entende por movimento social da seguinte forma: “Eu defino
analiticamente um movimento social como uma forma de ação coletiva (a) baseada
na solidariedade, (b) desenvolvendo um conflito, (c) rompendo os limites do sistema
em que ocorre a ação”11.
13 BOURDIEU, Pierre. A representação política: Elementos para uma teoria do campo político. In:
BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. 4. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1989.
14 MELUCCI, 1989, p. 61.
15 MELUCCI, 1989, p. 61.
As relações da rede
19 BOURDIEU, Pierre. A dominação masculina. 5. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2007. p. 18.
20 SCOTT, 1992.
Mulher constituiria uma rede egocentrada? Como o tipo de rede que se configura no
caso da Rede de Enfrentamento à Violência contra a Mulher influencia a sua prática?
Para procurar responder, adotamos, para este trabalho, o método de pesquisa
denominado «Análise de Redes Sociais». Propomos, a partir de uma abordagem
relacional, uma análise de redes sociais amparada na análise quali-quantitativa,
através da construção de sócio-gramas e matrizes que receberão tratamento
estatístico. Com a técnica “bola de neve”, conseguimos entrevistar os principais
atores sociais que participam da Rede de Enfrentamento à Violência contra a Mulher.
Então, formulamos um questionário semi-aberto a ser aplicado entre os membros da
rede. O roteiro de entrevista buscava principalmente:
rede;
• Mapear quais os vínculos estabelecidos e quais não;
Reflexões finais
nacional.
Referências
BOURDIEU, Pierre. A dominação masculina. 5. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2007.
BOURDIEU, Pierre. A representação política: Elementos para uma teoria do campo político.
In: BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. 4. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1989.
COSTA, Sérgio. Esfera pública, sociedade civil e movimentos sociais no Brasil. Novos Estudos,
n. 38, 1994.
FÓRUM Regional discute ferramentas para o fim da violência contra a mulher, criança e
adolescente. Disponível em:
<http://www.novohamburgo.rs.gov.br/index.php?language=&content=news&id=935>.
Acesso em 13 dez. 2007.
MATOS, Maria I. S. Por uma história das sensibilidades: em foco – a masculinidade. História:
Questões & Debates, n. 34, 2001, p. 45-63.
MELUCCI, Alberto. “Um objetivo para os movimentos sociais?” Lua nova. São Paulo:
CEDEC, n. 17, jun. 1989.
SCOTT, Joan. História das Mulheres. In: BURKE, Peter (org.). A escrita da história: novas
perspectivas. São Paulo: UNESP, 1992, p. 63-95.
Leitura de:
BOURDIEU, Pierre. A Dominação Masculina. 5. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2007. Do
original La Domination Masculine, 1998.
Introdução
masculina, até 1998, só havia sido tangenciada por artigos pequenos. No entanto, esta
sua reflexão – ainda que rápida e incompleta – contribuiu bastante para a discussão
que se desenvolveu desde os anos 60, sobretudo na ordem do movimento feminista.
Bourdieu teve ampla receptividade, tanto que alguns conceitos que apresentava para
descrever o processo de dominação masculina tornaram-se senso comum, tais como
habitus, incorporação da dominação, etc. Suas teses foram logo bastante questionadas
e criticadas, principalmente pelo seu caráter supostamente determinista. Também a
compreensão de Bourdieu sobre a ineficácia do trabalho de conscientização foi
rechaçada.
É baseado nesta constatação que ele parte para demonstrar que a mudança
social, que gere igualdade nas relações de gênero, deve partir das instituições que
A Obra
dominação inscrevendo-a em uma natureza biológica que é, por sua vez, ela uma
própria construção social naturalizada” (BOURDIEU, 1998, p. 33).
Para fazer melhor compreendido o que Bourdieu entende por simbólico, ele
mostra justamente aquilo que não é sua compreensão de simbólico, rebatendo críticas
e más compreensões vinculadas à sua tese. Para Bourdieu, violência simbólica não
minimiza a violência física e não quer desvirtuar a importante discussão sobre
violência doméstica. A violência simbólica é o fundamento, aquilo que justifica a
agressão – no sentido de oferecer razões para que homens possam arrogar-se a
[...] se apresentam como coisas a serem feitas, ou que não podem ser
feitas, naturais ou impensáveis, normais ou extraordinárias, para tal
ou qual categoria, isto é, particularmente para um homem ou para uma
mulher (e de tal ou qual condição). As “expectativas coletivas”, como
diria Marcel Mauss, ou as “potencialidades objetivas”, na expressão
de Max Weber, que os agentes sociais descobrem a todo instante,
nada têm de abstrato, nem de teórico [...] (BOURDIEU, 1998, p. 72)
constituem a vida social. Jogos estes que são depositários de poder simbólico e que,
portanto, são indispensáveis para a vida social. Nestes jogos o homem exercita sua
libido dominandi. Neles o homem deve confirmar toda a expectativa que se lançou
sobre a criança. Por isso, ser homem – para Bourdieu – é sempre ser criança,
procurando através dos jogos infantis (tais como a política, a guerra e muitas outras
discussões tipicamente masculinas) tornar-se aquilo que dele se espera.
A mulher é socializada para assistir a estes jogos de fora. Ela não compartilha
da gravidade que parece tão urgente nestes jogos. As mulheres são cúmplices dos
homens nestes jogos (quando não são moedas de troca, como nas páginas 55 e
seguintes – a economia dos bens simbólicos). No entanto, elas são também lúcidas e
sabem que o valor da existência não está na confirmação da masculinidade
vencedora dos jogos sociais. Elas compartilham da lucidez dos dominados que, muito
embora sofram as sanções sociais destes jogos, sabem que é apenas um jogo de
confirmação ou não das expectativas e dos desejos sociais impostos aos homens e que
se tornam de fato desejo por poder.
Permanências e Mudanças
necessário um trabalho histórico engajado, que não apenas constata, mas milita em
favor da desconstrução destes pressupostos androcêntricos.
Esta opção parece ter sido uma escolha fácil do autor para um problema que
ele mesmo criou. Ou talvez tenha sido uma resposta fácil àqueles que não
conseguiam se convencer da sua tese de que somente um intenso trabalho de
revolução simbólica, que incidisse sobre as instituições que produzem e reproduzem
maneiras de ser, poderia, lentamente, reverter uma realidade social que, cada vez
mais atenuada, continua sustentada por uma visão de mundo androcêntrica.
Bourdieu não necessita “pedir desculpas” por criticar. Seu próprio trabalho de
desconstrução crítica já parece estar prenhe de um amor por uma futuridade livre do
domínio cultural, simbólico, social e econômico de uma elite que não se constitui por
mérito nem por vontade divina, mas por herança. É na procura por demonstrar esta
herança e tentar desconstruí-la enquanto valor aceito universalmente para atribuir
destino positivo a uns e negativo a outros que reside o mérito de Bourdieu.
Protestantismo em Revista. São Leopoldo, v. 14, set.-dez. 2007. ISSN 1678 6408 Disponível em:
<http://www3.est.edu.br/nepp/revista/014/ano06n3.pdf> Acesso em: 30/05/2008
(Exemplo)
BUTTELLI, Felipe Gustavo Koch. Bourdieu e o Culto Cristão: relatos de uma observação.
Protestantismo em Revista. São Leopoldo, v. 14, set.-dez 2007, p. 44-66. ISSN 1678 6408. Disponível em:
<http://www3.est.edu.br/nepp/revista/014/ano06n3.pdf> Acesso em: 30/05/2008.