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Título:
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO
BÍBLICO

Por José Augusto Brayner Neto


2020

Editor: Mente Reformada

BRYNER NETO, José Augusto.. Natal: Mente Reforma2020.


_______________________________________
Sumário
1 INTRODUÇÃO............................................................................4
1.1 Metodologia........................................................................................................9

2 O BERÇO DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO COM OS


PURITANOS................................................................................. 11
2.1 A Decadência do Uso da Bíblia no Aconselhamento Bíblico..................21
2.2 O Renascimento do Aconselhamento Bíblico com o Dr. Jay E. Adams e
a controvérsia com a Psicologia Secular.....................................................28
2.3 O Lugar do Aconselhamento na Igreja Contemporânea..........................34

3 A RELAÇÃO DA PREGAÇÃO EXPOSITIVA COM O ACON-


SELHAMENTO BÍBLICO.......................................................... 40
3.1 Pregação Expositiva - Forma e Conteúdo...................................................41
3.2 A Relação da Pregação Expositiva e o Aconselhamento Bíblico – Dife-
renças e Convergências..................................................................................48
3.3 A História se Repete – A Necessidade de um Novo Retorno as Escritu-
ras.54
3.4 A Pregação Expositiva Destruindo os Ídolos do Coração ......................57
3.5 Conhecendo a Teologia da Aliança em Thomas Boston..........................66
3.6 Aplicando a Teologia da Aliança ao Problema dos Ídolos do Coração –
Na Pregação e no Aconselhamento............................................................81

4 APLICAÇÕES PRÁTICAS NA PREGAÇÃO EXPOSITIVA EM


AUXÍLIO AO ACONSELHAMENTO BÍBLICO....................... 87
4.1 A Origem das Boas Aplicações que Tratam o Coração dos Ouvintes..88
4.2. Aplicações por Categorias de Ouvintes em William Perkins..................91
4.3 O Uso das Aplicações Mentais e Práticas no Sermão em Auxílio ao
Aconselhamento Bíblico...............................................................................99
4.4 Exercitando a Aplicação Mental e Prática no Salmo 1............................102

5 CONCLUSÃO ......................................................................... 105


6 BIBLIOGRAFIA........................................................................ 111
1
1 Introdução

Historicamente as bases do cristianismo vêm sendo


atacadas de forma cada vez mais voraz pelos muitos artifí-
cios de que a sociedade orientada por Satanás tem se utili-
zado. Muitas são as pressões exercidas sobre os indivíduos
e sobre o ambiente familiar e todas elas fazem com que
os alicerces cristãos sejam abalados ao longo do tempo. A
força que a fé cristã, especialmente por meio da proclama-
ção pública e privada do evangelho sempre deteve sobre
a conduta dos que a ouvem enfurece o mundo. O secu-
larismo não suporta conviver com as influências cristãs e
parte em confronto direto para desestruturar a Igreja. Os
ímpios conspiram entre si para abandonar um compor-
tamento baseado na lei de Deus e promover seu próprio
modo de vida (Sl.2). Eles tentam se soltar das amarras da
lei divina e com isso levar as pessoas a viverem conforme
seus próprios corações. De fato, o mundo avançou bas-
tante nos seus intentos e talvez a maior de suas vitórias
parciais, tenha sido influenciar muitas pessoas a respeito
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

de como elas podem encontrar ajuda para seus problemas.


Qual o discurso devem ouvir? Que tipo de conselhos de-
vem atender? A quais fontes de autoridade precisam se
submeter?
A Palavra de Deus proclamada pública e particular-
mente tem poder para retirar cada uma dessas dúvidas do
coração humano. A Pregação é o discurso a ser ouvido
para se acertar o caminho (II Tm.3.16), o conselho sábio
a ser seguido (Pv.1.1-7) e a fonte de toda autoridade para
nossa fé e prática como afirma Pedro em sua segunda car-
ta: sobre o uso da Palavra de Deus em relação à vida cristã:
Visto como, pelo seu divino poder, nos têm sido doadas
as coisas que conduzem à vida e a piedade, pelo conheci-
mento daquele que nos chamou para a sua própria glória
e virtude, pelas quais nos têm sido doadas as suas precio-
sas e mui grandes promessas, para que por elas vos tor-
neis co-participantes da natureza divina, livrando-nos da
corrupção das paixões que há no mundo, por isso mesmo,
vós, reunindo a vossa diligência, associai com a vossa fé a
virtude; com a virtude, o conhecimento; com o conheci-
mento, o domínio próprio; com o domínio próprio, a per-
severança; com a perseverança, a piedade; com a piedade,
a fraternidade, com a fraternidade, o amor.(II Pd.1:3,4)1

A Confissão de Fé de Westminster afirma que “todo


o conselho de Deus concernente a todas as coisas neces-
sárias para a glória dele e para a salvação, fé e vida do ho-
mem, ou é expressamente declarado na Escritura ou pode
ser lógica e claramente deduzido dela”2 . Assim, todo pas-

1  Bíblia Almeida Revista e Corrigida.


2  Confissão de Fé de Westminster. Cap.I Sec.VI.

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JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

tor deve levar em consideração que seu ministério precisa


utilizar integralmente a Escritura como fonte de cada as-
pecto do seu trabalho, seja ele público ou privado. Tanto
o sermão nas reuniões públicas da Igreja, como o sermão
privado, o aconselhamento, são aspectos convergentes
do ministério pastoral. Os problemas do cotidiano preci-
sam ser tratados com a Palavra de Deus, e é exatamente
isso que o ministro faz quando prega expositivamente ou
quando aconselha em particular, como afirma o Dr. Wa-
dislau:
Não há nenhum tipo de diferença entre o sermão público e
o privado que não seja a sua abrangência, e não há necessi-
dade de categorizá-los, pois como diz “existiria algo como
pregação para aconselhamento? Certamente tal declaração é
uma redundância. A própria pregação é aconselhamento.” 3

A Pregação e o Aconselhamento Bíblico podem ser


entendidos como interdependentes, e por isso é possí-
vel se falar em uma ligação bastante estreita. A Pregação
pública do evangelho destinada aos Ministros ordenados
pela Igreja4 tem uma conotação ampla e atinge problemas
gerais de uma congregação. Enquanto isso, o aconselha-
mento bíblico, é a pregação da Palavra que atinge ques-
tões particulares do povo de Deus. É bem verdade que
em meio aos primeiros discípulos apenas a Pregação era já
assim denominada, enquanto que o aconselhamento bíbli-
co apesar de seguir características semelhantes às de hoje,

3  GOMES. Wadislau. Pregação e Aconselhamento – Uma Aproximação multiperspectiva.


Fiddes Reformata XII, nº1, 2007, pg. 74.
4  CATECISMO MAIOR DE WESTMINSTER. Pergunta 158.

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A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

não era conhecido por essa alcunha. Contudo, como diz


MacArthur, essa é “uma função natural da vida espiritual
de corpo”5 e, por isso mesmo, pregação e aconselhamen-
to bíblico são inatos ao cotidiano cristão, mesmo que não
fossem assim denominados no primeiro século.
Desde o período apostólico é perceptível como a pre-
gação e o aconselhamento eram tratados em várias cartas
enviadas à igreja de Roma (Rm. 15:14)6 , Tessalônica (I Ts.
4:18) e a carta de Tiago (Tg. 5:16) demonstrando o cuida-
do pastoral na vida dos crentes primitivos que começava
com a pregação e se estendia no aconselhamento de casa
em casa, utilizando a expressão paulina (At.20:20). Os
primeiros pais da igreja estavam cientes da importância
primordial do auxílio mútuo entre os crentes e primavam
para que não apenas os pastores, mas toda a congrega-
ção participasse de tal incumbência. Embora, a pregação
pública sempre fosse de responsabilidade dos ministros
ordenados, o testemunho particular e o aconselhamento
entre os irmãos era sempre incentivado. John MacArthur
captou bem esse espírito de cooperação entre os filhos
da Aliança “todas essas instruções aplicam-se ao povo da
igreja – não somente a uma casta sacerdotal de especialis-
tas”7 .

5  MCARTHUR Jr., John. Introdução ao Aconselhamento Bíblico. São Paulo Ed. Hagnos, 2009.
p. 21.
6  Bíblia de Estudo de Genebra. Revista e Atualizada no Brasil. Ed. Cultura Cristã. São Paulo.
2008
7  MCARTHUR Jr., John. Opus Cit., p. 21.

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JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

Com base nessas verdades, alguns questionamentos


podem ser levantados: De onde provém o movimento de
aconselhamento bíblico? Qual a ligação desse movimento
com a pregação expositiva? Quais são os fundamentos que
definem a pregação expositiva? Qual a relevância da pre-
gação expositiva para a vida das famílias da Igreja? Qual
é a forma e o conteúdo da pregação expositiva? Como
conhecer melhor o rebanho no intuito de utilizar a prega-
ção expositiva como uma ferramenta do aconselhamento
bíblico? Como os ídolos do coração devem ser destro-
nados por meio da pregação expositiva? Como aplicar o
sermão expositivo para os diferentes problemas tratados
no aconselhamento bíblico? Quais devem ser os efeitos
esperados na Igreja mediante a pregação expositiva para a
vida prática dos ouvintes em suas diferentes faixas etárias?
Esse estudo tem como objetivo geral apresentar uma
solução bíblica reformada para o uso da pregação exposi-
tiva nas Igrejas como parte do aconselhamento bíblico. A
proposta da pesquisa deverá passar pelos seguintes passos:
1) Avaliar como o movimento de aconselhamento bíblico
na história da igreja cristã se desenvolveu; 2) Identificar
o momento histórico onde a Escritura perdeu a primazia
no aconselhamento conjugal; 3) Analisar biblicamente a
importância do retorno ao uso das Escrituras no acon-
selhamento de pessoas em crise; 4) Apresentar a forma
e o conteúdo do sermão expositivo, bem como sua im-
portância; 5) Apresentar uma análise de como o sermão
expositivo se evidencia como Palavra de Deus aplicada à

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A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

Igreja; 6) Identificar a influência dos ídolos no coração em


meio a um lar em crise e como a pregação expositiva pode
contribuir com a restauração desses lares; Expor soluções
práticas e viáveis para que o sermão expositivo possa ser
usado pelos pregadores efetivamente nas questões parti-
culares das diferentes faixas e categorias de ouvintes na
Igreja. 7) Apresentar as contribuições práticas do uso da
pregação expositiva em conjunto com o aconselhamento
bíblico.
1.1 Metodologia
A pesquisa para elaboração do trabalho monográ-
fico será realizada por meio de consultas as obras de di-
versos autores que falam sobre o tema da pregação ex-
positiva e do aconselhamento bíblico. Definido o tema,
deverão ser relacionadas as obras que poderão compor
um arcabouço teórico mínimo para o início do desenvol-
vimento do trabalho. Nessa etapa as citadas obras deverão
ser lidas e fichadas sob a perspectiva geral da pesquisa, ou
seja, delimitando a leitura dos capítulos que sejam relacio-
nados ao tema proposto e que assim, contribuam com o
seu conteúdo.
O escopo geral do trabalho deverá gerar diversos
capítulos que formam os títulos das divisões naturais para
que o todo possa ser entendido. Diante disso, a mono-
grafia deverá ter um capítulo inicial com uma introdução
que identifique a relevância histórica do tema a ser apre-
sentado ao longo do trabalho. O segundo capítulo deverá

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JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

abordar a questão da pregação expositiva em suas diversas


aplicações. Em seguida, uma parte do trabalho se dedicará
a avaliar como os ídolos do coração podem ser destro-
nados por meio da pregação expositiva, bem como a in-
fluência da teologia da Aliança na pregação expositiva. O
quarto capítulo apresentará uma proposta de aplicações
práticas do sermão que possam servir como auxílio ao
trabalho pastoral, por fim, uma conclusão que apresente
qual resultado final da pesquisa delimitando a verdadeira
importância do uso da pregação expositiva como uma fer-
ramenta do aconselhamento bíblico.

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2
2 O Berço do Aconselhamento Bíblico
com os Puritanos

Dá-se o nome de “puritanismo” ao movimento


ocorrido na Inglaterra no período entre o final do século
XVI e o século XVIII, o qual tinha como intento princi-
pal promover uma reforma profunda na igreja nacional.
Diferentemente de outros países, a Inglaterra não expe-
rimentou grandes mudanças no que diz respeito ao culto
e à exigência de santidade de vida dos líderes e dos fiéis
após a Reforma Protestante. Segundo o Rev. Augustus, os
puritanos acusavam a Igreja da Inglaterra de haver parado
entre Roma e Genebra8 , ou seja, não saíram totalmente
do catolicismo. Um grupo, entretanto, ansiava por mu-
danças urgentes que deveriam trazer a Igreja novamente
aos princípios escriturísticos:
Porém, havia um partido muito forte na Inglaterra, pro-
fundamente desejoso de fazer mudanças mais radicais.
Muitos dos seus membros tinham fugido, durante as per-
seguições da rainha Maria, para Genebra e outros lu-

8  LOPES. Augustus Nicodemus. A Bíblia e seus Intérpretes – Uma Breve História da Interpre-
tação. São Paulo: Cultura Cristã, 2007. p. 172.
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

gares do continente, e experimentaram a influência de


movimentos protestantes que tinham se afastado mais
das doutrinas tradicionais do que o movimento na Ingla-
terra. Esses homens foram apelidados de “puritanos”9 .

Segundo Sales “o movimento puritano poderia ser


definido como um movimento na Igreja da Inglaterra, da
metade do século XVI até o começo do século XVIII que
buscou reformulação na vida da Igreja e purificação na
vida dos crentes, individualmente”10 . Esses homens luta-
ram arduamente para alcançar uma igreja, um culto e uma
vida mais puras. Os ideais puritanos permeavam todas as
áreas de suas ações. A ênfase dada na pregação da Palavra
de Deus estava intimamente relacionada à convicção puri-
tana de que Deus fala através das Escrituras. Nas palavras
de Leland Ryken foi pelo púlpito que o puritanismo fez
sua marca na nação inglesa, no início do século XVII11 .
A apreciação puritana pela Palavra de Deus era tão gran-
de que Thomas Watson chegou a afirmar que “em cada
linha que você lê, imagine Deus a falar consigo”12 . Afir-
mação semelhante fez outro puritano chamado Thomas
Goodwin “as coisas que estão escritas são extratos e cópia
da Bíblia que Deus tem no seu coração, e que foi escrita
desde a eternidade”13 .

9  NICHOLS, Robert H. História da Igreja Cristã. São Paulo. Ed. Cultura Cristã. 2008. p. 192.
10  Ibid. p. 42.
11  RYKEN, Leland. Santos no Mundo. Os Puritanos como Realmente Eram. São José dos
Campos – SP. Ed. Fiel. P.164;
12  WATSON, Thomas. Apud LUCENA, Sóstenes Raniely. O Compromisso Puritano com as
Escrituras. Disponível em: http://puritanosvivos.blogspot.com.br/2010_02_01_archive.html.
Acessado em 05/12/12.
13  GOODWIN, Thomas apud LOPES. Augustus Nicodemus. A Bíblia e seus Intérpretes, p.

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A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

A partir da Palavra de Deus toda a teologia puritana


tomava conta de suas vidas e de tudo que fizessem. Para
um puritano, a Bíblia era “[...] na verdade, o bem mais
precioso que há neste mundo. Sua profunda convicção
era a reverência para com Deus e implicava em reverência
para com as Escrituras”14 . O trabalho pastoral nasce da
importância dada à revelação bíblica.
Seguindo esse pensamento, os puritanos tinham uma
visão completamente bíblica dos problemas que chega-
vam aos seus gabinetes. Sempre que a congregação preci-
sava de um auxílio ligado a um problema geral, a pregação
pública da Palavra tratava as questões da Igreja. Quan-
do fosse necessário o acompanhamento mais pessoal, os
pastores buscavam por meio do aconselhamento bíblico,
direcionar as ovelhas de Cristo por caminhos mais segu-
ros. Kellemen afirma que “os puritanos tinham tamanha
profundidade na sua psicologia bíblica que apreciaram a
compreensão abrangente da imago dei como relacional, ra-
cional, volitiva e emocional”15 .
Essa preocupação com a centralidade da Escritura na
vida dos puritanos começava em casa. A família deveria
ser o primeiro local onde a Bíblia seria aplicada. Antes de
aplicar sua teologia a qualquer outro membro da congre-
gação, os puritanos apreciavam a palavra e os conselhos

173.
14  LOPES. Augustus Nicodemus. A Bíblia e seus Intérpretes, p. 43.
15  KELLEMEN, Bob. Review of A History of Pastoral Care in America.

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JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

que emanam dela em seu próprio lar. Uma casa bem or-
denada estava sempre sob a liderança sábia e amorosa do
marido, auxiliado de perto pela sua esposa. Nas palavras
de William Perkins, o companheirismo no lar possibili-
ta que “os cônjuges cumpram os deveres de sua vocação
de maneira melhor e mais agradável”16. Marido e mulher
formavam um ambiente propício para o desenvolvimento
saudável dos filhos da aliança e serviam de espelho para
seus futuros casamentos. Os puritanos mantinham grande
zelo por esse ambiente de harmonia por saberem que no
lar os indivíduos são formados em seu caráter e lá tam-
bém é onde começam ocorrer os primeiros problemas
que caso não sejam tratados, ganharão maior proporção.
O relato de George Withefield (1714-1770) reforça essa
verdade, quando na ocasião de sua visita feita à residência
do puritano Jonathan Edwards (1703-1758). Withefield
deixa claro como a Palavra de Deus era abundante na casa
de Edwards a ponto de ficar bastante evidente o clima de
grande harmonia que vivia no casamento com sua esposa
e no cuidado com seus filhos.
O Senhor Edward é um cristão excelente, eu não vi ninguém
igual em toda a Nova Inglaterra. Senti grande satisfação em
estar em sua casa. Um doce casal que eu ainda não tinha
visto em minha vida. Seus filhos eram exemplos de simplici-
dade cristã. A Sra. Edwards é adornada com o espírito calmo
e manso. Ela falava solidamente das coisas de Deus, e parecia
ser uma grande ajudadora para o seu marido ao ponto que ela
causou em mim o desejo de renovar as orações, que por alguns
meses, eu tenho colocado diante de Deus. Que ele se digne

16  PERKINS. William. Christian Economy. In: The Works of William Perkins. S.N.T., p. 420.

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A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

de enviar-me uma filha de Abraão para ser minha esposa17 .

Todavia, mesmo com toda essa atenção dada à Pa-


lavra exposta e aplicada na prática dos indivíduos e das
famílias, os problemas costumavam atingir também o seio
sagrado desses homens do século XVII. Nessas horas,
os pastores puritanos entravam decisivamente em cena.
Cientes que a visitação era algo extremamente importante
no ministério pastoral, os puritanos buscavam estar sem-
pre em contato com as famílias assim que detectavam os
problemas conjugais, as intrigas entre os membros da fa-
mília e até mesmo entre os irmãos da Igreja. A reação a
essas questões era rápida e poderosa, pois eles imediata-
mente começavam a tratar cada caso pregando e aplican-
do a Palavra de Deus.
Essa proeminência no cuidado da família in loco fica
latente nas palavras do puritano inglês do século XVII,
Richard Baxter:
“Temos de olhar especialmente para as famílias, para
que sejam bem ordenadas e os deveres de cada re-
lacionamento sejam realizados. A vida religiosa e o
bem-estar e glória, tanto da igreja quanto do Esta-
do, dependem muito da ordem e do dever familiar”18 .

Esse é um pensamento que se perpetua até mesmo


entre aqueles que herdaram a teologia puritana hoje como
no caso do Rev. Scipione que diz em suas palavras que “A
família é o centro que permite o funcionamento das de-

17  WITHFIELD, George apud BEEKE. Joel. A Puritan Theology: Doctrine for Life. S.N.T.
18  BAXTER, Richard. Manual Pastoral do Discipulado. São Paulo: Cultura Cristã, 2008. p. 83

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mais instituições ordenadas por Deus.”19 A casa deveria


ser um ambiente de harmonia e paz, qualidades que só a
comunhão com Deus pode garantir através de uma vida
de acordo com a revelação escriturística. Portanto, é jus-
tamente no lar que deve começar o trabalho dos pastores.
Na sua própria casa, mas também nas visitas às casas dos
irmãos da Igreja. É justamente conhecendo o rebanho
que a ele está confiado que seu ministério público poderá
ser mais efetivo, pois ele saberá exatamente quais são as
grandes questões que têm abalado o povo de Deus.
Esse misto de visitação e pregação pública, foi a tôni-
ca do trabalho pastoral entre os puritanos ingleses e logo
vieram os resultados. Somente a Escritura lhes bastava
para resolver os muitos problemas de suas congregações e
eles criam piamente nela e a partir dela cuidavam do povo.
Segundo MacArthur, a veemente afirmação puritana do
poder da Palavra de Deus os levou a recusar a introdução
de teorias psicológicas que sugerissem um novo tipo de
interpretação dos textos sagrados20 . Para William Ames,
“Não há qualquer preceito de verdade universal pertinente
ao bem viver quanto à economia doméstica, à moralidade
à vida política, ou à criação de leis que não pertença, por
direito, à teologia”21 . Com essa visão singular do poder da
Palavra de Deus os puritanos tratavam de questões com-
19  SCIPIONE, George C. Marriage and Family Couseling. S/Loc.: Biblical Couseling Institute,
2011. p. 9.
20  MCARTHUR Jr., John. Introdução ao Aconselhamento Bíblico, p. 44.
21  AMES, William. Marrow of Theology. Pennsylvania: Press University of Pennsylvania
Press., 1979. p. 113.

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A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

plexas como as ligadas ao casamento e à criação de filhos,


por meio da pregação pública e particular. Em ambos os
casos eles dispunham de um único instrumento em mãos,
a Bíblia Sagrada.
A pregação puritana e o seu método de aconselha-
mento se baseavam em três áreas do entendimento hu-
mano. Inicialmente, seria necessário o pastor abordar a
pessoa por meio da identificação e correção relativa ao
verdadeiro conhecimento a respeito de Deus, de si mes-
mo, e do pecado. Essa é uma tríade sistematizada por João
Calvino (1509-1564) que apesar de não ser contemporâ-
neo, tinha um pensamento alinhado aos puritanos nesse
quesito:
E assim na consciência da nossa ignorância, fatuidade, pe-
núria, fraqueza, enfim, de nossa própria depravação e cor-
rupção, reconhecemos que em nenhuma outra parte, se-
não no Senhor, se situam a verdadeira luz da sabedoria, a
sólida virtude, a plena abundância de tudo que é bom,
a pureza da justiça, e daí somos por nossos próprios ma-
les instigados à consideração das excelências de Deus.
Nem podemos aspirar a ele com seriedade antes que te-
nhamos começado a descontentar-nos de nós mesmos22 .

O conhecimento correto de quem é Deus é tão bási-


co para a vida diária quanto é em relação à teologia. A. W.
Tozer diz que “corresponde a adorar o que a fundação do
Templo: onde quer que ela seja inadequada ou esteja fora
de esquadro, toda estrutura, mais cedo ou mais tarde, rui-

22  CALVINO. João. Institutas da Religião Cristã. Vol. I. São Paulo: Cultura Cristã. 2003. p. 38.

17
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

rá”23 . Todavia, tal conhecimento não deve ser considera-


do como algo que o indivíduo sozinho poderá adquirir. O
entendimento adequado sobre o ser de Deus só é possível
mediante a sua disposição em revelar-se, como acrescenta
Beeke:
Nenhum conhecimento de Deus é possível à parte do próprio
Deus, ele tem que se revelar. Os puritanos afirmaram que so-
mente através de Cristo, por meio do Espírito Santo alguém
pode chegar ao conhecimento de Deus que suficiente para
salvação - consequentemente o conceito do conhecimento
duplo de Deus (duplex cognitio Dei). A teologia natural é su-
ficiente para deixar os homens indesculpáveis (Rm. 1-18-21),
mas não pode salvá-los, pois o conhecimento salvífico é en-
contrado somente em Cristo. O conhecimento que Cristo tem
de Deus capacitá-lo a revelar a Deus; desta forma, revelação
sobrenatural tem um foco explicitamente cristocêntrico24 .

Os puritanos sempre deram muita ênfase sobre o en-


tendimento correto do ser divino. Ter uma compreensão
dúbia sobre o Deus verdadeiro é o mesmo que fazê-lo fal-
so. Alguém que não conhece a Deus de maneira acertada
terá sérias dificuldades em sua vida cotidiana.
A segunda área analisada pelos puritanos no proces-
so de avaliação do indivíduo estava ligada à compreensão
sobre quem é o homem. A consciência que o ser humano
tem de si mesmo e do seu semelhante determinará o ca-
minho pelo qual deve seguir. A partir do julgamento feito
de acordo com as Escrituras sobre quem é o homem, os
juízos morais podem ser tomados. Sales diz que “a consci-
23  TOZER. A.W. The Knowledge of the Holy. New York: Harper and Row, 1961. p. 9.
24  BEEKE. Joel. A Puritan Theology: Doctrine for Life, S.N.T.

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A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

ência funciona como nosso sistema nervoso espiritual – a


dor da culpa informa à compreensão de que algo está er-
rado e carece de correção”25 . Até mesmo o entendimento
correto de Deus passa pela compreensão acertada de si
próprio, como mais uma vez confirma Calvino “Conse-
quentemente, pelo conhecimento de si mesmo cada um é
não apenas aguilhoado a buscar a Deus, mas até como que
conduzido pela mão a achá-lo”26 .
Por fim, os puritanos analisavam a compreensão que
se tinha do pecado. Se hoje muitos acham que o pecado
nada mais é que um desvio de conduta, para os puritanos
o pecado era uma agressão contra a santidade de Deus.
Charnock chegou ao ponto de dizer que “todo pecado
se encontra em um ateísmo secreto”27 . Aqui se percebe
o ponto central da teologia puritana que governava tan-
to a pregação quanto o aconselhamento. O pecado é a
transgressão da lei de Deus e, por isso, deve ser tratado
com a Palavra do próprio Deus. A má compreensão sobre
quem é Deus e quem é o homem é derivada da presença
do pecado na raça humana. Portanto, aqui está o foco do
problema e desse ponto parte o tratamento dos distúrbios
práticos e, por conseguinte, no casamento.
Seguindo essa tríade, conhecimento de Deus, do ho-
mem e do pecado, os puritanos tratavam cada problema
25  SALES. Ken L. apud KELLER, Timothy. Puritan Resources for Biblical Counseling.
26  CALVINO. João. Institutas da Religião Cristã. Vol. I, p. 39.
27  CHARNOCK, Stephen. Discourses Upon the Existences and Atributes of God. Miami:
Grand Rapids, 1979. p. 93-94.

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JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

que abatia a congregação ou membros específicos, sem-


pre utilizando a ferramenta eficaz da pregação pública e
particular com base nas Escrituras. Conforme John Owen
(1616-1683) “o santo Espírito provê o testemunho que ca-
pacita crentes a reconhecer e receber as Escrituras como a
Palavra de Deus”28 e sendo ela a voz do próprio Criador
a solução dos problemas seguiria por meios determina-
dos pela mudança de vida por meio do evangelho e não
apenas na mudança de alguns hábitos. O Deus da Bíblia
é poderoso para mudar a natureza do homem e, por isso
mesmo, sua Palavra é suficiente para tratar as crises do ho-
mem em sua relação com a criação e com seu semelhante.
Portanto, com a Bíblia o pastor puritano pôde exercer o
seu papel de avaliar cada caso à luz da Escritura. William
Perkins defendia que ao se conhecer o problema do peca-
dor, o ministro deveria interpretá-lo à luz da Escritura e
confrontá-lo com a mesma autoridade para que o pecador
“expondo em aberto suas vontades, confessando seus pe-
cados, rogando perdão.29 chegasse ao arrependimento e
consequente perdão.
Seguindo tais princípios, milhares de pessoas vive-
ram ao longo desses quase três séculos do puritanismo
(XVI-XVIII), sob a suprema autoridade das Escrituras.
Os tempos do puritanismo até hoje são lembrados pelos
crentes como a época áurea tanto da pregação como do
aconselhamento. Isso não quer dizer que eles não passas-
28  OWEN, John apud BEEKE, Joel. A Puritan Theology: Doctrine for Life. S.N.T.
29  PERKINS. William. The Calling of the Ministry, Brown, p.74.

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A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

sem por problemas, nem tivessem suas muitas dificulda-


des, mas aquelas gerações foram imensamente abençoadas
com boas pregações e conselhos de homens submissos à
Palavra de Deus. Essa foi a receita para o povo de Deus
buscar a vida de santidade em meio a tantos percalços
dessa Terra.

2.1 A Decadência do Uso da Bíblia no Aconselhamento


Bíblico
Se até o século XVIII a Bíblia reinou soberana nos
púlpitos e gabinetes pastorais, a partir do século seguinte
essa situação mudou radicalmente. As grandes obras de
cuidado pastoral produzidas no período do avivamento
puritano que tinham como base a Escritura, tais como:
Precious Remedies Against Satan´s Devices (Precio-
sos Antídotos Contra as Armas de Satanás) de Thomas
Brooks, A Christian Directory (Um Catálogo Cristão) de
Richard Baxter ou ainda The Pilgrim´s Progress (O Pe-
regrino), foram deixadas de lado e perderam a primazia
até mesmo nas Igrejas ditas conservadoras. Comentando
sobre esse abandono do legado puritano no aconselha-
mento bíblico, Sales afirma:
Cada um desses escritores pastorais tinha uma arden-
te preocupação pela correção doutrinária, pela retidão
moral, por uma vida devocional disciplinada e pelo ser-
viço cristão. Mas esses pastores também possuíam uma
rica medida do amor perspicaz do Apascentador; eles não
apenas conheciam as pessoas intimamente, mas também
evidenciavam sensibilidade especial pelo caminho da san-
tificação progressiva. (...) Nos séculos XIX e XX os cris-

21
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

tãos norte-americanos, em linhas gerais, perderam tanto


o uso das verdades quanto as habilidades adquiridas ante-
riormente. Isto quer dizer que a sabedoria prática na cura
de almas minguou, mesmo enquanto igreja conservado-
ra, por definição, manteve-se com a doutrina ortodoxa30 .

O grande inimigo do aconselhamento bíblico, sem


dúvidas, foi a chamada “teologia liberal”. O grupo de te-
ólogos que deu origem à teologia liberal teve início com a
influência do Iluminismo e do Racionalismo na socieda-
de do século XIX. Osvaldo Carreiro comentando sobre
o surgimento histórico do liberalismo disse: “Sob influ-
ência do ‘iluminismo’, a Teologia Liberal tem como uma
das principais características a rejeição da intervenção so-
brenatural de Deus e o repúdio à autoridade das Escritu-
ras”31. Em uma época onde o homem era exaltado como
o centro das relações sociais, não seria estranho que a Pa-
lavra de Deus perdesse sua influência na doutrinação das
pessoas. Os Reverendos Augustus Nicodemus e Mauro
Meister acrescentam informações sobre o surgimento do
liberalismo quando dizem que:
Esse movimento tem uma origem bem antiga. Em linhas
gerais, o liberalismo é o resultado do iluminismo, caracte-
rizado pela revolta contra a religião e o cristianismo par-
ticular. Seu referencial teórico era o racionalismo e o em-
pirismo – filosofias antagônicas, mas que concluem juntas
que Deus precisa ser excluído do universo humano32 .

30  SALES. Ken L. John. Jr. Introdução ao Aconselhamento Bíblico – Um Guia Básico de Prin-
cípios e Práticas de Aconselhamento. São Paulo: Hagnos, 2009. p. 65,66.
31  CARREIRO, Osvaldo. O Aconselhamento Bíblico e a Psicologia Cristã. Disponível em:
http://www.ibcu. org.br/escolabiblica/Escola%20B%EDblica%20%20Recursos%20Dis-
pon%EDveis/Minist%E9rios_Aconselhamento%20B%EDblico/20111107/Aconselhamen-
to%20Biblico-aula5%20e%206.pdf. Acessado em 7/12/12.
32  LOPES, Augustus Nicodemus; MEISTER, Mauro. Apostasia Liberal no Brasil e no Mundo.

22
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

O liberalismo teológico nada mais foi que a junção


do movimento que exaltou o homem e a ciência como
proprietários da verdade e dignos de toda honra (Ilumi-
nismo), com outro movimento que cultivava a experiência
acima de qualquer outro bem (empirismo). Dessa união
o produto final foi a exclusão de Deus da vida do ho-
mem. A falsa ênfase dada por muitos liberais estava ligada
a uma suposta impossibilidade de sustentação do cristia-
nismo como religião popular, caso não houvesse sérias e
urgentes mudanças, como confirma o historiador William
R. Hutchison “A marca peculiar do modernismo (libera-
lismo) é a insistência de que a teologia tem de adotar uma
atitude simpática para com a cultura secular e se esforçar,
conscientemente, para concordar com ela”33 .
Engodados com a ânsia de respeitabilidade frente
à comunidade acadêmica que cada vez mais exigia com-
provações científicas e menos participação religiosa no
tratamento dos problemas de conduta, muitos teólogos
declinaram de suas convicções concernentes à Bíblia. Os
pastores deixaram sua aptidão natural como cuidadores
de ovelhas, “psicologizando” a pregação que deixou de ser
bíblica e passou a ser um discurso herético. Além disso,
como seria de esperar quando há o abandono da prega-
ção, o aconselhamento também sofreu fortes mudanças.
As questões não eram mais tratadas nos gabinetes pasto-
Disponível em: http://voltemosaoevangelho.com/blog/ 2012/02/augustus-nicodemus-e-mauro-
-meister-apostasia-liberal-no-brasil-e-no-mundo-cc2012/#ixzz2EPczr2c2. Acessado em 7/12/12.
33  HUTCHISON, William R. American Protestant Thought in the Liberal Era. Lanham: Uni-
versity Press of America, 1968. p. 4.

23
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

rais, mas passaram a ser encaminhadas às mãos de “espe-


cialistas”. MacArthur critica tal posição: “A habilidade de
um pastor é uma arte e ciência aplicada, é uma forma de
amor que transborda no conhecimento e discernimento
no trabalhar com pessoas. Entretanto essa capacidade de
aplicar à verdade para ‘casos’ específicos atrofiou”34 .
Tal habilidade citada por Macarthur fora subesti-
mada pelos próprios pastores. Muitos deles se submete-
ram ao crivo da teologia liberal e da psicologia e acabaram
fazendo crescer um novo tipo de pregação e aconselha-
mento, os quais perderam o caráter bíblico e passaram a
ser secularizados e mundanos. Os casos de problemas dos
membros das igrejas deixaram de ser entendidos como
frutos do pecado e passaram a ser nomeados como dis-
túrbios de conduta que deveriam ser rapidamente repas-
sados aos “profissionais” da área. Ciente da inconsistência
atribuída aos pastores e da reação que muitos ministros
tiveram frente à psicologia secular, Philip Rieff, sociólogo
agnóstico, pôs um título muito sugestivo em seu livro que
denota a “vitória” dos psicólogos sobre os pastores “The
Triumph of the Therapeutic” (O Triunfo da Terapia) fa-
zendo uma séria observação “O homem religioso nasceu
para ser salvo, o homem psicológico nasceu para ser agra-
dado”35 . Nesse livro, Rieff aponta as consequências dos
ensinamentos freudianos. Para ele, na era pós-Freud, as

34  MCARTHUR Jr., John. Introdução ao Aconselhamento Bíblico, p. 66.


35  RIEFF, Philip. The Triumph of the Therapeutic: Uses of the Faith After Freud. Chicago:
University of Chicago Press, 1987. p. 24.

24
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

terapias religiosas perderam força até quase desaparecer.


Entretanto, Rieff, afirma que não há outro sistema con-
cebível de tratamento para o homem moderno que não
passe pela moral religiosa36.
Sendo o aconselhamento bíblico considerado insus-
tentável para a sociedade moderna, a busca por um novo
caminho era mais que urgente. Nesse mesmo período
crescia a disseminação dos pensamentos da psicologia se-
cular. Essa pseudociência pretendia ser uma estudiosa da
alma humana utilizando a falácia da comprovação científi-
ca que supostamente atestava sua veracidade. Esse ponto
de vista foi veementemente atacado por MacArhur ao di-
zer que “a palavra psicologia literalmente significa ‘o es-
tudo da alma’. O verdadeiro estudo da alma não pode ser
praticado por não-cristãos”37 . Mesmo nunca conseguin-
do comprovar sua eficiência, e sendo criticada até hoje,
a psicologia secular conseguiu muito espaço até mesmo
nos púlpitos e gabinetes pastorais. Essa ascensão foi tão
meteórica que chegou a atingir cristãos conservadores, os
quais foram enganados pelas falácias da psicologia, como
atesta Jay Adams:
quase todos os livros recentes de aconselhamento para
pastores, até mesmo os conservadores, são escritos a
partir de uma perspectiva freudiana, no sentido de que
eles dependem em larga escala das pressuposições da
ética da não responsabilidade defendida por Freud38 .

36  Ibid, p. 24.


37  MCARTHUR Jr., John. Introdução ao Aconselhamento Bíblico, p. 26.
38  ADAMS, Jay. Conselheiro Capaz. São José dos Campos: Fiel, 1970. p. 53-54.

25
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

Macarthur, por sua vez, definiu três grandes círculos


onde a psicologia atuava com grande força no cenário cul-
tural entre o final do século XIX e a primeira metade do
século XX:
O círculo maior e exterior era a psicologia secular. Den-
tro desse círculo, os pioneiros na criação de teorias, os
programas de graduação e pós-graduação, as credenciais,
o sistema de saúde mental, as revistas, e os livros deter-
minaram o ritmo intelectual e metodológico. O círculo
do meio consistia da teologia pastoral liberal, que defi-
niu o campo do aconselhamento pastoral, até mesmo em
seminários conservadores. O círculo menor continha
crentes professos que eram psicólogos e terapeutas39 .

Diante da afirmação de Adams e da divisão pro-


posta por Macarthur é possível perceber como a socie-
dade estava (e em muitos casos ainda está) sendo regida
por um conjunto de técnicas seculares, que ora eram mais
ou menos travestidas de um pseudocristianismo. O início
do século XX teve como grande marca o uso das ciên-
cias sociais como fonte suprema para o trabalho pastoral.
As compreensões bíblicas que anteriormente foram tão
úteis para solução de conflitos pessoais, estavam subjuga-
das, até mesmo na Igreja, a uma posição marginal. A falsa
afirmação que engodava a muitos era “não é conveniente
misturar religião com problemas do cotidiano moderno”
.40 Esse erro crasso permitiu que o cuidado pastoral fosse
passado às mãos de descrentes o que por si só já demons-
tra o grau de distanciamento da verdade que viveu a socie-

39  MCARTHUR Jr., John. Introdução ao Aconselhamento Bíblico, p. 68.


40  ADAMS, Jay. Conselheiro Capaz, p. 53-54.

26
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

dade entre os século XIX e XX. O abandono das Escritu-


ras para dar lugar a técnicas seculares é algo extremamente
prejudicial como confirma Jay Adams: “Na prática do
aconselhamento faz mister a autoridade divina. Somente
o aconselhamento bíblico se reveste dessa autoridade”41 .
O próprio Freud, pai da psicologia moderna, foi contrário
ao uso de psicanalistas como médicos da alma, mas afir-
mava com veemência que eles eram “obreiros pastorais
seculares” 42. Para Freud, um obreiro pastoral secular não
necessariamente necessitaria de preparo, ele poderia ser
douto ou leigo. Para Carl Jung os psicoterapeutas devem
ser mais e mais empurrados para desempenharem o tra-
balho de um teólogo, já que possuem as armas adequadas
para lidar com os problemas psíquicos43 .
Essa insistência dos psicólogos e psicoterapeutas
em servirem como sacerdotes seculares não se restringiu
apenas ao reduto acadêmico, mas tomou grande vulto nas
igrejas. Nelas, os pensamentos dos “profissionais” da área
adentraram com toda vivacidade em meio aos crentes.
Pastores liberais pregavam uma Escritura esvaziada de au-
toridade, inclusive para o aconselhamento. Nesse contex-
to ministros do evangelho liberal como Harry Emerson
Fosdick, cederam seus púlpitos para líderes do movimen-
to de saúde mental despejar suas ideias mundanas, como
41  ADAMS. Jay. Cristão, p. 27.
42  FREUD, Sigmund. The Manual do Conselheiro Freud Reader. Nova York: Peter Gay, 1989.
p. 682.
43  JUNG, Carl. Modern Man in Search of a Soul. Nova York: Harcourt Brace Jovanovich,
1933. p. 241.

27
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

salienta Powlison44. Dessa forma, teologia liberal e psico-


logia secular formaram uma união que resultou em um
império pastoral secular onde Igrejas eram alimentadas
com sermões sem nenhuma substância bíblica e pessoas
em crise eram tratadas como necessitadas de atenção e
compreensão, jamais de correção. Dorrien alerta sobre o
perigo do liberalismo “Ensinar uma doutrina como essa
a respeito de Deus é infligir ao cristianismo uma injúria
terrível e subverter os próprios alicerces da moralidade”45.
Quanto aos conservadores que ainda restaram, suas vozes
foram silenciadas e não se viu lançamentos de obras con-
trárias à psicologização da igreja por vários anos. O secu-
larismo tomou não apenas o mundo como um todo, mas
se enraizou na igreja, outrora coluna e baluarte da verdade
(I Tm. 3:15).
2.2 O Renascimento do Aconselhamento Bíblico com o
Dr. Jay E. Adams e a controvérsia com a Psicologia Secu-
lar
Após mais de um século esquecida pelos pastores e
desonrada pelos profissionais de saúde mental, e mesmo
ainda em meio a esse contexto de descrédito, a Bíblia co-
meçou a ter novamente lugar na pregação e no aconselha-
mento de pessoas em crise. Segundo Powlison, a redesco-
berta do aconselhamento bíblico está intimamente ligada

44  POWLISON, David A.The Biblical Counseling Movement – History and Context. Greens-
boro: New Growth Press, 2010. p. 1.
45  DORRIEN, Gary. The Making of America Liberal Theology: Imagining Progressive Reli-
gion, 1805-1900. Louisville: Westminster/John Knox Press, 2001. p. 18.

28
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

ao nome de um homem apaixonado por pregação bíblica,


o Dr. Jay E. Adams46 . Adams sempre foi um pastor que
amou a pregação do evangelho em público e particular. A
retomada da Escritura como fonte do aconselhamento, só
poderia vir por meio de um Ministro que ama a Palavra
de Deus. Essa é mais uma prova da íntima ligação entre
pregação e aconselhamento. Jay Adams, o ícone desse re-
torno do aconselhamento aos gabinetes pastoral, antes de
tudo, é um homem que dedicou boa parte da sua vida ao
estudo da pregação, alcançando o doutorado na área.
A história de Adams é bem resumida por Powlison:
Jay Adams (nascido em 1929) cresceu em Baltimore, filho
único de um policial e uma secretária. Convertido a Cris-
to no ensino médio, ele obteve o título de Bacharel em
Divindades no Reformed Espicopal Seminary (Seminário
Episcopal Reformado – Filadelfia, EUA) e o título de Ba-
charel em Ciências Sociais em Clássicos na John Hopkins
University (Baltimore, EUA) em 1952. Adams atuou como
diretor regional da mocidade para Cristo no começo da dé-
cada de 50. (...) Também obteve Doutorado em Teologia Sa-
grada na Temple University (Filadelfia, EUA) e 1958 e dou-
torado em oratória da University of Missouri em 1969” 47.

Entretanto, nem mesmo um indivíduo tão capacitado


assim poderia empreender tão grande obra sem sofrer sé-
rios ataques. Um trabalho que em tempos passados, como
na época dos puritanos, poderia parecer simples como re-
vela o Rev. Scipione “o trabalho de Adams foi apresen-
tar novamente a Escritura como suficiente no trabalho
46  POWLISON, David A.The Biblical Counseling Movement – History and Context, p. 71.
47  POWLISON, David A.The Biblical Counseling Movement – History and Context, p. 71.

29
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

do ministério pastoral”48, na verdade transformou-se em


uma grande empreitada para um pastor do século XX.
Para Adams “a psicologia é tão ruim quanto os liberais.
Ela não é correta e não funciona. Mas o que fazer para
ajudar realmente as pessoas?”49 A resposta não era tão fá-
cil. Inundado em um ambiente onde a psicologia ditava
regras aos pastores ao subirem no púlpito e entrarem em
seus gabinetes de aconselhamento, propor algo diferente
seria encarado como insanidade pela maior parte da co-
munidade de saúde mental. Adams começou, então, a se
dedicar à leitura das obras dos psicólogos do século XX. O
próprio Adams confirma sua voracidade na busca por um
método consistente de aconselhamento “Enquanto estu-
dava no Temple, fiz dois cursos de aconselhamento com
um psiquiatra de tendência freudiana”50 . As tentativas de
Adams foram sempre frustradas em virtude da expansão
cada vez maior do aconselhamento com base nas percep-
ções de Freud. Os pastores estavam sendo convencidos
diariamente de sua incapacidade no trato das questões hu-
manas. Segundo Kellemen “Com o tempo, o raciocínio
da psicologia secular veio para superar a psicologia bíblica
para muitos pastores”51 .
A grande virada na história de Adams se deu quan-

48  SCIPIONE, George C. The History of the Biblical Counseling Movement. S.N.T.
49  ADAMS, Betty Jay. In: POWLISON, David. Introdução ao Aconselhamento Bíblico. Hag-
nos: São Paulo, 2009. p. 71. Em entrevista a David Powlison.
50  ADAMS, Jay. The Power of Error. Phillipsburg N.J.: Presbyterian and Reformed, 1978.
51  KELLEMEN, Bob. Review of A History of Pastoral Care in America.

30
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

do foi chamado a ministrar aulas de teologia prática no


Westminster Theological Seminary (EUA) em 1963. Sem
saber ao certo o que iria ensinar e qual método utilizar,
Adams tomou conhecimento das obras de um respeitado
psicólogo, O. Hobart Mowrer. Powlison conta como foi
esse encontro com a obra de Mowrer e suas implicações:
Aquele discurso, o livro de Mowrer, The Crisis in Psychiatry
and Religion (A Crise na Psciquiatria e na Religião – Princeton:
Van Nostrand, 1961), e um curso intensivo de seis semanas
com Mowrer naquele verão tiveram um efeito estimulante em
Adams. Mowrer “removeu a sujeira para mim. Ele destruiu
Freud, que era o sistema reinante, e colocou em dúvida os
profissionais de saúde mental. Seu sistema positivo foi com-
pletamente não-bíblico, mas me deu a confiança para seguir52 .

Esse encontro com a obra de Mowrer apesar de não


produzir frutos que poderiam ser utilizados diretamen-
te no aconselhamento, proporcionou a Adams a possi-
bilidade de pensar contrário a sua época. Os dois anos
seguintes a esse encontro com Mowrer, 1964 e 65, fo-
ram dedicados quase que exclusivamente por Adams, aos
estudos sobre aconselhamento de pessoas em crise com
uma perspectiva bíblica “noite e dia, aconselhando e es-
tudando: estudando pessoas, estudando livros de aconse-
lhamento, estudando a Bíblia”53 . O resultado de todo esse
empenho foi vivenciado por Adams com a criação de um
curso de aconselhamento bíblico no Seminário de West-
minster, bem como a produção de sua primeira obra “O
Conselheiro Capaz”. Esse livro de vanguarda impactou
52  POWLISON, David A.The Biblical Counseling Movement – History and Context, p. 72.
53  Ibid, p. 72.

31
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

decisivamente o ambiente do aconselhamento na segunda


metade do século XX como afirma Powlison:
Em 1970 Jay Adams, uma pastor presbiteriano e pro-
fessor de seminário de quarenta e um anos de idade, pu-
blicou um livro inflamatório sobre aconselhamento. Ele
o escreveu para atingir os protestantes conservadores,
principalmente, pastores e estudantes de seminários, mas
também incluiu leigos e profissionais de saúde mental54 .

Segundo Powlison a segunda obra de Adams, O Ma-


nual do Conselheiro Capaz, “afinou a filosofia do aconse-
lhamento bíblico e forneceu métodos de aconselhamento,
incluindo uma abordagem sobre como entender e resol-
ver problemas particulares”55 .
O Rev. Scipione em sua palestra sobre a história do
movimento do aconselhamento bíblico diz que essa tra-
jetória é dividida entre antes e depois de Jay Adams 56.
A Bíblia foi conclamada novamente a orientar a vida das
pessoas. Powlison diz que Adams atacara a proeminência
da psicologia e psiquiatria no aconselhamento, mostrando
como eram inconsistentes57 . O novo método utilizado
por Adams era a chamada “confrontação noutética”, ou
seja, “é a confrontação que é feita, brotando da preocupa-
ção visando os propósitos de mudança de algo que Deus
quer que mude”58 . Esse novo sistema de aconselhamento

54  POWLISON, David A.The Biblical Counseling Movement – History and Context, p. 72.
55  Ibid. p. 21.
56  SCIPIONE. George. The History of the Biblical Counseling Movement, S.N.T.
57  POWLISON, David A.The Biblical Counseling Movement – History and Context, p. 73.
58  ADAMS, Jay. Ready to Restore. Phillipsburgh: Presbyterian and Reformed, 1981. p. 9-12.

32
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

estava ligado tanto a pregação pública, pois Adams an-


tes de tudo era um pregador da Palavra de Deus, quanto
ao tratamento particular de cada caso utilizando a Escri-
tura para orientar o aconselhando. Powlison comenta o
novo formato de aconselhamento de Adams “Ele deu o
diagnóstico correto do quadro, estabeleceu objetivos para
o aconselhamento da igreja empregando os ingredientes
tradicionais da mensagem cristã”59 . Scipione enfatiza o
pensamento de Adams “O aconselhamento de famílias e
casamentos é trabalho do pastor. A palavra de Deus dá
um modelo para este trabalho” 60.
As restrições de Adams em relação ao sistema de
pastoreio por meio de pregação e aconselhamento reinan-
te até o início do século XX foram cada vez mais expos-
tas. Powlison relata as observações que Adams fazia sobre
a estrutura secular de tratamento de pessoas em crise:
Na visão de Adams, o sistema de educação, treinamento, li-
cenciamento: os instrumentos de publicação e relações pú-
blicas; as agências que prestavam serviços – todos esses eram
inimigos, não amigos, porque eles manifestavam preconceito
contrário às crenças das igrejas protestantes conservadoras 61.

Para Adams a igreja e o pastor formavam a institui-


ção primária para o propósito de reconstruir o serviço de
aconselhamento. Powlison faz uma boa conceituação do
serviço pastoral antes de Adams, ele diz que era como um

59  POWLISON, David A.The Biblical Counseling Movement – History and Context, p. 73.
60  SCIPIONE, George C. Marriage and Family Couseling, p. 6.
61  POWLISON, David A.The Biblical Counseling Movement – History and Context, p. 73.

33
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

“lobo em pele de cordeiro”62 . Powlison ainda acrescenta


informações dizendo que o sistema proposto por Adams
não tinha pretensões de abafar o sistema acadêmico me-
diante conclusões científicas, apesar de não se opor à ciên-
cia, ele se identificava com conclusões pressuposicionais63
. A partir de uma cosmovisão cristã, Adams se propôs
a confrontar as cosmovisões seculares que influenciavam
diretamente as ações humanas. A convicção de Adams
quanto seu modo de confronto direto com o aconse-
lhamento secular está intimamente ligado a suas crenças
calvinistas, por isso mesmo Powlison trata o sistema de
pensamento de Adams como aconselhamento bíblico re-
formado64 .
2.3 O Lugar do Aconselhamento na Igreja Contemporâ-
nea
As obras de Adams se desenvolveram, todavia, ele
não ficou apenas no campo teórico. Sensibilizado pela ne-
cessidade iminente da preparação de pastores para obra
de aconselhamento bíblico, Adams juntamente com ou-
tros colegas imbuídos na mesma causa, inauguraram em
1967 a Fundação Cristã de Aconselhamento e de Educa-
ção. Nesse lugar pessoas eram tratadas a partir da Escri-
tura e pastores treinados para utilizar a Palavra de Deus
como fonte de autoridade no serviço pastoral de aconse-
lhamento. Dessa Fundação inicial surgiram muitos outros
62 Ibid.
63 Ibid.
64 Ibid.

34
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

órgãos de aconselhamento bíblico pelos Estados Unidos


e pelo mundo que enfatizam a necessidade da pregação e
do aconselhamento serem sempre produzidos a partir da
Palavra de Deus, como relata Powlison:
Para suprir essas e outras necessidades, Adams associou-se
a vários outros para fundar a National Association of Nou-
thetic Counseliors (Associação Nacional de Conselheiros
Noutéticos - NANC) em 1976. Hoje a NANC publica uma
revista trimestral, a The Biblical Counselor (O Conselhei-
ro Bíblico), e coordena uma grande conferência anual 65.

A influência de Adams alcançou limites até en-


tão inesperados. Todo o EUA foi impactado, os cursos
de aconselhamento bíblico noutético se proliferaram e
romperam as barreiras do país. Atualmente países como
Alemanha, África do Sul, Inglaterra e Suíça formam as-
sociações e cursos para solidificação do aconselhamento
bíblico noutético. O pensamento de Adams foi desenvol-
vido por outros estudiosos como no caso de John MacAr-
thur, como cita Powlison:
No final da década de 80, John MacArthur e seus co-
laboradores voltaram a atenção mais particularmen-
te para assuntos ligados ao aconselhamento bíbli-
co e à psicologia secular. Reestruturaram o currículo,
tanto na faculdade quanto do seminário para refletir o
compromisso de utilizar a verdade bíblica para explicar
as necessidades das pessoas e para oferecer-lhes ajuda.66

Através da obra de Adams a Bíblia voltou a ter pro-


eminência no trabalho pastoral. Embora muitas vezes ain-
65  POWLISON, David A.The Biblical Counseling Movement – History and Context, p. 73.
66  Ibid, p. 77.

35
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

da seja atacada e descreditada até mesmo por pastores,


a Palavra de Deus retornou a muitos púlpitos e gabine-
tes pastorais como autoridade suprema na restauração de
pessoas e casais em crise. Adams jamais pretendeu for-
mular um método que por si só fosse eficaz no aconselha-
mento, mas sua ênfase na Bíblia possibilitou o retorno à
crença que só o Espírito Santo agindo na sua Palavra pode
transformar pessoas como confirma o Rev. Scipione “não
é tarefa do homem converter pessoas, mudar seus hábitos,
essa é uma tarefa do Espírito Santo, nós devemos apenas
pregar o evangelho e aguardar os resultados da ação do
Espírito Santo.(...) aconselhamento nada mais é que disci-
pulado.67”
Por conseguinte, desde a segunda metade do século
XX como pôde ser observado, o uso das Escrituras retor-
nou ao tratamento das crises individuais e conjugais. Após
Adams, a Igreja novamente se firmou na Palavra de Deus
como “proveitosa para ensinar, redarguir, para corrigir,
para instrução em justiça; para que o homem de Deus seja
perfeito, e perfeitamente habilitado para toda boa obra (II
Tm. 3:16). Hoje os indivíduos e casais têm novamente a
sua disposição, a despeito de alguns que insistem em seguir
no tratamento psicológico, pastores comprometidos com
a Palavra de Deus que se utilizam da sua autoridade e efi-
cácia. Portanto, é mister que as famílias crentes dispensem
a atenção necessária a estes homens pois são portadores

67  SCIPIONE, George C. The History of the Biblical Counseling Movement. S.N.T.

36
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

das verdades divinas que podem transformar radicalmente


vidas individuais e casamentos. De fato, glorificar a Deus
por meio do auxílio à Família da Aliança sempre foi um
dos principais objetivos da pregação e do aconselhamen-
to bíblicos, como confirma Roos “Se maridos e esposas
querem levar frutos do seu matrimônio, tanto para Deus
como para eles mesmos, então hão de reconhecer sua de-
pendência de Deus, unicamente de Deus”68 .
Como visto nesse artigo, na segunda metade do sé-
culo XX a Bíblia obteve novamente a proeminência em
boa parte dos círculos evangélicos, a qual outrora fora
perdida nos púlpitos e gabinetes pastorais do século XIV
e início do século XX. À medida que a Escritura voltou a
ser pregada como de fato é, Palavra de Deus, o seu uso no
aconselhamento também foi transformado. A pregação
pública e particular se tornaram novamente ferramentas
eficazes que andam juntas no trabalho de muitos ministros
do evangelho em todo o mundo. Desde Adams até hoje,
muitos pastores têm sido despertados para a pregação da
Palavra não apenas nos Domingos, mas durante toda a
semana em seus gabinetes pastorais. Muitas Igrejas volta-
ram a dispor dos discipulados de membros para doutrinar
famílias durante a semana como fazia Richard Baxter que
abria sua casa as quintas feiras à noite como “uma terapia
de grupo”. O grupo reunia-se para “repetir” o sermão do
Domingo anterior. 69 A pregação expositiva tem ganhado
68  ROOS, Beerman E. La Revolucion Sexual. Barcelona: Felire, 2000. p. 34
69  Ibid. p.167

37
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

mais espaço em muitos lugares do mundo. O povo de


Deus, apesar de ainda permanecer apático em sua grande
maioria, tem despertado aos poucos dando maior valor
a pregadores que amam o cuidado das ovelhas tratando
o sermão como algo que leva alguém mais para perto do
céu ou do inferno, como dizia John Preston.70 Fica cla-
ro que ao longo da história, sempre a Igreja se afastou
da pregação bíblica, imediatamente o direcionamento das
vidas dos membros passou a ser cada vez mais mundano.
Entretanto, quando a pregação voltou a ter centralidade
em muitos púlpitos, o aconselhamento bíblico também
ganhou espaço e passou a ser novamente utilizado pelos
crentes como uma ferramenta eficaz para solução de seus
problemas espirituais.
Portanto, nada mais deve preocupar a Igreja do que
o afastamento das Escrituras. Absolutamente nada pode
ser mais destrutível para a Comunidade dos Santo do que
o distanciamento da Palavra de Deus, pois isso implica em
uma decadência completa em todas as áreas da vida dos
crentes. Sem pregação genuína não há saúde na Igreja.
Uma Igreja doente de pregação não poderá ser tratada
por meio de aconselhamento bíblico já que este depen-
de daquele. Enfim, pregação e aconselhamento bíblicos
são de fato, duas facetas da grande maravilha do evange-
lho dado pelo Senhor Jesus que são apenas nos garante a
eternidade, mas nos concede a benção de vivermos nessa

70  Ibid. John Preston Apud. Leland Ryken. p.163

38
terra guiados pela voz do Criador, enquanto o mundo jaz
no Maligno.
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

3
3 A Relação da Pregação Expositiva com
o Aconselhamento Bíblico

Com o ressurgimento do Aconselhamento Bíblico


em meio à Igreja, uma outra verdade também foi retoma-
da, a eficácia da pregação pública na vida privada. Ora,
se de fato as pessoas precisam ser tratadas por meio da
Palavra em suas questões particulares, como isso poderia
estar dissociado do exercício público do aconselhamento
por meio da pregação? Os pastores/conselheiros passa-
ram a verificar a necessidade de aliar o sermão público a
atividade privada do aconselhamento. A pregação exposi-
tiva voltou a ter grande destaque entre aqueles que real-
mente creem haver nas Sagradas Letras, tudo aquilo que
nos é necessário para vida e piedade (II Pd.1:3). Diante
dessa constatação, se faz necessário verificarmos as ba-
ses da pregação expositiva antes mesmo de identificarmos
como ela pode contribuir nesse processo. Essa análise não
se propõe a ser exaustiva, pois não é o foco do presente
trabalho, todavia, serão apresentadas os fundamentos da

40
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

pregação que se propõe a ser expositiva, levando em con-


ta a sua forma e conteúdo.
3.1 Pregação Expositiva - Forma e Conteúdo
Antes de mais nada quando se trata de pregação ex-
positiva um princípio precisa ser levado adiante de todos
os outros, a pregação que expõe o texto bíblico é a pró-
pria voz de Deus falando à congregação (Vox Dei). Um
sermão expositivo é aquele que toma o ponto principal de
uma passagem da Escritura, faz dele o ponto principal do
sermão e o aplica à vida de hoje.71 Nas palavras de Kol-
ler “quando o pregador comunica fielmente a Palavra de
Deus, ele fala com autoridade.”72 Seguindo o mesmo ra-
ciocínio de autoridade da pregação, Bryan Chapell afirma:
“Os pregadores expositivos e as pessoas que se assen-
tam diante deles a cada semana estão convencidos de que
as Escrituras podem ser escavadas com o objetivo de ex-
trair a sabedoria de Deus e o poder para a vida diária.
Uma pregação pobre pode, ocasionalmente, lançar algu-
ma dúvida, porém a pregação revela, de fato, o que a Bí-
blia diz vem mantendo viva essa convicção por centenas
de gerações. Nosso objetivo como pregadores expositivos
é manter viva essa fé, demonstrando semana após sema-
na o que a Palavra de Deus afirma com respeito as pre-
ocupações que nós e nossos ouvintes enfrentamos.”73

Sendo a pregação expositiva a própria voz do Deus

71  HORTON. Michael. Why should a pastor preach expositionally?. Disponível em: ht-
tp://9marks.org/answer/why-should-pastor-preach-expositionally/ . Acessado em: 15/03/2016
72  KOLLER. Charles W. How to Preach Without Notes, Grand Rapids, Michigan, William
Eerdmans Publisihng House, pg.15.
73  CHAPPELL. Bryan. Pregação Cristocêntrica – Restaurando o Sermão Expositivo, Ed.
Cultura Cristã, São Paulo, 2007, pg.83.

41
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

vivo, deve ser tratada como um discurso para o povo do


Deus da Palavra. Assim uma das características marcantes
da pregação expositiva é que ela expõe o texto não sim-
plesmente para que os ouvintes sejam informados do que
Deus dizia aos leitores originais, mas o que Ele fala em
relação os problemas da atualidade. Mohler Jr. conceitua
a pregação expositiva como sendo “aquele estilo de pre-
gação cristã que tem como propósito central a apresenta-
ção e aplicação do texto bíblico”74 . Nesse sentido John
Broadus afirma “a aplicação do sermão não é meramente
um apêndice para discussão, ou parte subordinada a ele,
mas é a principal coisa a ser feita.”75 Jack Hughes, pastor
em Burbank, Califórnia, diz que “os pastores de hoje dei-
xaram de considerar a diferença entre princípios, aplica-
ção e implementação”76 assim, muitos acabam laborando
em erro quando esquecem a completude da natureza do
sermão bíblico, pois ele tem um único objetivo, oferecer
subsídios para que a aplicação emane do próprio texto.
Assim sendo, devemos levar em conta tal urgência da
pregação lembrando que essa é uma santa atividade que
emana da própria natureza do trabalho pastoral. A cada
ministro do evangelho, e somente a eles, cumpre exercer
o ministério público da pregação, como defendido nos
74  MOHLER JR. R. Albert. A Pregação da Cruz – Um chamado a Pregação Expositiva e
Centrada no Evangelho como Foco do Ministério Pastoral. Ed. Cultura Cristã, São Paulo, 2010,
pg.64.
75  BROADUS, John A. On The Preparation and Delivery of Sermons, org. por J.B. Weathers-
poon, Harper and Row, pg.210.
76  HUGHES, Jack, Implementation: the missing ingredient. Journal of Modern Ministry, Vol.
1, Issue 1, 2004, pg. 83.

42
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

padrões de Westminster77 . Portanto, fazê-lo de um modo


fiel, compreensivo e relevante aos seus ouvintes é impera-
tivo para que a Igreja seja, de fato, abençoada com os ser-
mões. Portanto, quando um pregador ordenado da Palavra
de Deus se levanta para proclamar as verdades do Reino
dos Céus, ele precisa lembrar que ali está um povo que
necessita não apenas de conhecimento bíblico, mas desse
conhecimento aplicado fielmente as necessidades cotidia-
nas. A Palavra de Deus é poderosa para toda questão de
fé e prática (II Pd.1.3), por isso, os problemas atuais dos
ouvintes devem ser contemplados na pregação. Esse sem
dúvidas é um dos trabalhos mais proveitosos do ministé-
rio pastoral, pois age diretamente na vida das pessoas.
Esse não é um princípio novo, uma aplicabilidade
moderna da pregação, mas procede da própria Escritura
que nos fornece exemplos de sermões que usam o concei-
to de explicação e aplicação da verdade como no exemplo
abaixo:
“Esdras abriu o livro a vista de todo o povo, porque esta-
va acima dele; abrindo-o ele, todo o povo se pôs em pé.
Esdras bendisse ao Senhor, o grande Deus; e todo o povo
responder: Amém! Amém! E, levantando as mãos, inclina-
ram-se e adoraram o Senhor, com o rosto em terra. E Jesua,
Bani, Serebias, Jamim, Acube, Sabetai, Hodias, Maaseias,
Quelita, Azarias, Jozadabe, Hanã, Pelaías e os levitas ensi-
navam o povo na lei; e o povo estava no seu lugar. Leram
no Livro da Lei, na Lei de Deus, claramente, dando explica-

77  CMW. P.158. Comentado por Johannes Gerardos Vos. São Paulo, 2007, Ed. Os Puritanos,
P.508

43
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

ções, de maneira que entendessem o que se lia (Ne.8:5-8)”78

Fica claro que o sermão proferido por Esdras foi


composto por três elementos como acertadamente notou
Chapell “a apresentação da Palavra (foi lida), a explicação
da Palavra (tornando-se clara e dando seu significado), e
a exortação fundamentada na Palavra”79 . Nesses termos,
conclui-se que o sermão bíblico ou expositivo, contribui
para que os ouvintes não apenas sejam informados sobre
nuances do textos, mas muito mais que isso, eles são aler-
tados, exortados, orientados e confortados pelas aplica-
ções práticas que emanam da exposição bíblica.
Segundo Calvino,
... não basta ensinar, se você não insta... Pois a dou-
trina do evangelho é ajudada por exortações, para que não
fique sem efeito... é responsabilidade do embaixador reforçar
com argumentos... Eles [os pregadores] não apenas “ofere-
cem”... a graça de Deus, mas se esforçam... para que ela não
seja oferecida em vão.5 Uma exortação não exclui a doutri-
na... este é o ofício do que ensina: não proferir palavras de
seu próprio pensamento, mas da Escritura...6 Mas sabemos
que o uso do ensino é duplo; primeiro, que aqueles que se-
jam totalmente ignorantes aprendam os elementos primá-
rios, e segundo, que aqueles que são iniciados, progridam.80

A estrutura ou forma do sermão expositivo é sim-


ples e poderosa para alcançar o coração do pecador. Ela
revela a verdade de um texto inspirado, explica como essa
verdade foi vivida no contexto passado, mas rapidamente

78  BÍBLIA DE GENEBRA, Ed. Cultura Cristã, São Paulo, 2008, pg. 559.
79  Ibid. p.86.
80  CALVINO, João. Apud. GOMES, Wadislau. Pregação e Aconselhamento: Uma Aproxima-
ção Multiperspectiva. Fides Reformata, XII, N.1, 2007, Pg.73-79.

44
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

faz um movimento que coloca o ouvinte como centro da


aplicação. A pregação vívida é aquela que fala com o ou-
vinte e ele está consciente dessa verdade tem a ver consigo
mesmo. A pregação morta, fria e sem eficácia é aquela que
o ouvinte entende que o pregador fala sobre outro indiví-
duo, ela totalmente impessoal. Não ligação entre o texto
explicado acima no púlpito e a congregação que está logo
abaixo, diante do pregador. Há certo ambiente de frieza e
desinteresse, pois os ouvintes não percebem o real objeti-
vo prático do que está sendo pregado. Muitas vezes a con-
gregação ouve como se o sermão falasse de outro, seria
Deus falando para os ouvintes originais, mas sem relação
com a presente geração. Não parece ser esse o ensino da
Palavra de Deus. Vejamos, por exemplo, como deveria ser
passado adiante a história da libertação do povo israelita
do Egito:
“E uma vez dentro da terra que o Senhor Deus vos dará,
como tem dito, observai este rito. Quando vossos filhos per-
guntarem: Que rito é este? Respondereis: É o sacrifício da
Santa Páscoa ao Senhor, que passou por cima das casas dos
filhos de Israel no Egito, quando feriu o Egito e livrou nos-
sas casas. Então o povo se inclinou e adorou.” (Êx.12.25-27)

Perceba que quando os filhos nas próximas gera-


ções, questionassem a respeito do que significava a Pás-
coa, deveria ser relembrado aquilo que Deus fez na saída
do povo do Egito, e isso de uma maneira muito pessoal.
As futuras gerações ensinariam aos seus filhos que o que
ocorreu na saída do cativeiro egípcio aconteceu com “as
nossas casas”. O intrigante é que na verdade isso de fato

45
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

não aconteceu com as casas das gerações seguintes. Mas a


pregação evangelística que falaria a respeito da libertação
do povo do Egito, deveria aliar o fato passado com a ver-
dade presente, ou seja, o que ocorreu com os pais ocorre
também com os filhos. Philip Ryken fala sobre essa iden-
tificação do povo de Israel como um todo com aquela
história em particular “A partir desse dia, quando os ju-
deus celebrassem a Páscoa comemorariam uma libertação
nacional. Eles reafirmariam sua identidade relembrando o
resgate que Deus exerceu da escravidão do Egito.”81 Essa
é a história de libertação de um povo. Assim, quando um
sermão é pregado em nossa época tendo como base um
texto antigo, precisa ter tanta empatia entre texto e ouvin-
te que eles compreendam que aquela é a sua história, ou
seja, que ela é relevante para o ouvinte de hoje.
Não apenas a identificação com o texto é importante,
mas o pregador expositivo precisa conduzir as aplicações
adequadas, evitando que os seus ouvintes caiam nos erro
de aplicar o texto àquilo que ele não quis dizer. Observan-
do a urgência pela pregação pessoal e autoritativa, James
Lansberry descreve muito bem os três fatores primordiais
do sermão, enfatizando a debilidade dos ouvintes em apli-
carem as verdades sozinhos e a iminente e consequente
necessidade do Ministro da Palavra em de guiar sua con-
gregação no que diz respeito a aplicações mais específicas
do sermão, como segue:

81  RYKEN, Philip Graham. Commentary of Exodus – Saved for God´s Glory. Wheaton,
Crossway, 2012, p.338.

46
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

“Entretanto, negligenciando os três fatores: simplicidade,


autoridade e praticidade, você estará retirando o âmago do
poder transformador da palavra pregada. Nós [os ouvintes]
somos ovelhas estultas; precisamos de sermões de estrutu-
ra simples. Somos rebeldes, pecadores de ouvidos surdos;
precisamos de mensagens entregues com autoridade. So-
mos confusos, vagantes; precisamos de algo que mude a
nossa vida de maneira prática. Oro, pedindo a Deus que
nos dê isto: que a cada Dia do Senhor ele nos alimente
com boa comida temperada com estes três ingredientes.”82

É válido salientar que ainda que seja extremamente


urgente que a pregação expositiva cumpra o propósito de
falar aos ouvintes da atualidade em seus problemas do
século XXI, isso não quer dizer que o pregador deverá até
mesmo corromper o texto para que ele se torne relevante
para esta época. Pelo contrário, basta que ele apresente as
verdades atemporais do evangelho para que ele cumpra
o seu papel prático. Não se sustenta, portanto, o apelo
contemporâneo de incentivar os pregadores a se tornarem
relevantes por meio de um sermão temático que pouco se
utiliza das verdades extraída de um texto bíblico, como
afirma Mohler:
“Todavia, mesmo em face da diversidade cultural, os cristãos
devem expressar a autoridade transcultural da Bíblica, por-
que eles são os únicos no planeta com uma mensagem que é
destinada a pessoas que de todas as culturas. Além disso, nós
temos a única mensagem que não precisa ser transformada
e redefinida em cada circunstância cultural, porque estamos
falando sobre condições permanentes como o pecado, o ca-
ráter de Deus e a cruz do Senhor Jesus Cristo. Começamos
com a primazia do texto da Escritura, porque começamos

82  LANBERRY, James, A view from the pew. The Journal of Modern Ministry, Vol. 2, Issue 1,
pg.139-143.

47
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

com determinadas convicções definitivas a respeito daquele


texto que se mantém verdadeiro em todas as culturas – sua
infalibilidade, sua autoridade e sua total confiabilidade.”83

Diante dessa verdade, muito embora a aplicação


seja de suma importância para o pregador, não haverá
proveito algum se aplicações não procederem de uma ver-
dade bíblica extraída do texto. Um sermão que expõe as
verdades divinas e apresenta sua relevância intrínseca, é
não apenas chamativo aos olhos e ouvidos, mas poderoso
ao falar ao coração do pecador. Isso se dá, porque esse é
o único tipo de sermão que fielmente comunica a vontade
ao seu povo. A estrutura, forma e aplicação do sermão
expositivo fornecem o meio pelo qual a Palavra de Deus
chegue claramente ao seu povo e nada mais poderia ser
efetivo no tratamento de problemas pessoais dos mem-
bros que uma ferramenta como essa. Portanto, após co-
nhecer o sermão expositivo e suas aplicações, precisamos
compreender como ele pode se relacionar com o trabalho
do aconselhamento levando em conta as diferenças das
duas atividades e suas muitas semelhanças.

3.2 A Relação da Pregação Expositiva e o Aconselhamen-


to Bíblico – Diferenças e Convergências
A questão que deve ser levantada em seguida à com-
preensão da importância da pregação expositiva para a
vida prática da Igreja, é entender como esse tipo de pre-
gação pode contribuir para o trabalho de aconselhamento
83  Ibid. pg.65.

48
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

bíblico. A grande diferença entre aconselhamento e pre-


gação talvez esteja mais ligada à abrangência de atuação
do que com a própria natureza da atividade. Isso se dá,
pois ambas tratam da Palavra de Deus seja em público
ou particular. Entretanto, muitas pessoas têm dificuldades
em conectar esses dois pontos do ministério da pregação.
O Rev. Wadislau Gomes, especialista nas áreas de acon-
selhamento e pregação, deixa claro que muito embora os
termos “pregação expositiva” e “aconselhamento bíblico”
pareçam de antemão matérias distintas dentro da Teologia
Pastoral, elas se relacionam com bastante facilidade.84 To-
davia, para que essa correlação seja perceptível e coerente,
faz-se necessário a definição de cada um desses termos.
Segundo John Stott, a pregação para ser bíblica deve
ser expositiva e o argumento apresentado é que a figura
utilizada na Escritura para ilustrar o papel do pregador é
a do arauto ou pregoeiro municipal que apenas expõe a
mensagem do seu Senhor. Ele não cria a mensagem, mas
simplesmente a recebe, ouve a ordem de proclamar e a
põe em prática.85 Para Martyn Loyd Johnes, a pregação
expositiva se coaduna com o que disse o apóstolo Paulo
“prega a Palavra” ou “preguei todo o conselho de Deus”.
A mensagem da pregação se coaduna com aquilo que o
pregador recebeu de Deus, ele só expõe o que lhe foi da-
do.86
84  GOMES. Wadislau Martins. FIDES REFORMATA XII, Nº 1. 2007. Pg. 73,74
85  STOTT. John. Eu Creio na Pregação. Ed. Vida. São Paulo. 2003. pg. 143
86  LLOYD-JONES. Martin. Pregação e Pregadores. Ed. Fiel. São Paulo. 2008. pg. 61

49
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

Essa mensagem porém, tem como fundamento fa-


tos da revelação divina ocorridos há milhares de anos o
que produz certo distanciamento hermenêutico, tempo-
ral, linguístico e cultural. Dessa forma, o ouvinte da ex-
posição do texto bíblico no século XXI necessita que as
aplicações sejam vívidas e respondam as questões de sua
época. Nessa linha de raciocínio, Stott diz que existem
duas perspectivas centrais para o bom expositor bíblico.
Em primeiro lugar ele precisa ser fiel ao texto bíblico, se-
melhantemente, também é sua obrigação ter sensibilidade
com o público moderno. 87 Percebe-se que há um estreito
laço entre a pregação fiel das Escrituras e sua aplicabili-
dade nos problemas cotidianos das pessoas. Assim sendo,
não é apenas justo, mas necessário que a pregação bíblica
seja utilizada como uma ferramenta eficaz no tratamento
dos diversos problemas nas mais variadas áreas da vida do
povo de Deus.
Para Martin Bucer, a aproximação entre pregação e
vida piedosa traz a lume a figura do pregador que não
apenas expõe a mensagem publicamente e de maneira
geral, mas desce do púlpito para tratar no seu gabinete
através do aconselhamento bíblico. 88 Bob Kellemen, evi-
denciando a profundidade da teologia prática dos purita-
nos, afirmava que a psicologia bíblica trabalhada por es-
ses homens era tão abrangente que compreendia a imago

87  STOTT. John. In: LARSON. Craig B.; ROBINSON. Haddon. Shedd Publicações. 2009.
p.29,30.
88  BUCER. Martin. Concerning the True Care of Souls. Banner of Truth, 2009. p. 23.

50
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

dei como relacional, racional, volitiva e emocional o que


promove um cabedal completo para o trabalho pastoral
do púlpito até o gabinete. 89 Jay Adams em uma de suas
palestras ministradas no Brasil nos anos oitenta contun-
dentemente afirmou que a pregação bíblica expositiva é
uma das ferramentas vitais para o aconselhamento bíblico
da igreja na qual se pastoreia. Portanto, o ato de pastorear
está intrinsecamente ligado tanto a pregação quanto ao
aconselhamento.
Segundo Wadislau Gomes o trabalho do pastor ao
confeccionar um sermão não se prende à exposição do
texto, mas a sua capacidade não só de interpretar a Pala-
vra, mas também de interpretar pessoas e aconselhá-las
também pela pregação pública da Palavra.90 O pastor deve
considerar os seus ouvintes de maneira central e não deve
relegá-los a um ponto marginal como muitas vezes acon-
tece. A necessidade de perceber as os problemas, angús-
tias, tribulações e pecados nos quais seus ouvintes estão
relacionados fará do pregador um homem que fala ao co-
ração e não apenas a mente dos ouvintes.
Pensando nessa necessidade de aliar pregação e acon-
selhamento, podemos perceber que o trabalho do prega-
dor pode ser mais bem definido ao utilizarmos o termo
pelo qual seu ofício é mais conhecido. O Ministro da Pa-
lavra e dos Sacramentos é conhecido nas Escrituras como

89  KELLEMEN, Bob. Review of A History of Pastoral Care in America


90  GOMES. Wadislau. Aconselhamento Redentivo. São Paulo. Ed. Cultura Cristã. 2004. p.8

51
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

Pastor e, portanto as ovelhas dependem bastante de um


ministério pastoral efetivo, como ensina Richard Baxter:
“Deus reformar o ministério estimulando os pastores aos seus
deveres de modo zeloso e fiel, o povo certamente será refor-
mado. Todas as Igrejas permanecem ou caem, conforme o
ministério permanece de pé ou cai, não em termos de riquezas
ou grandiosidades mundanas, mas em conhecimento (doutri-
nário e experimental), no zelo e na aptidão para sua obra.”91

As obrigações do pregador são mais bem compre-


endidas quando avaliadas de um modo completo e não
fracionado. É comum perceber que na presente época al-
guns pastores dizem que são vocacionados para a prega-
ção e não para o aconselhamento, para a visita e não para
o púlpito, mas todas essas são funções do mesmo ofício.
O pregador desce do púlpito, mas seu trabalho não acaba,
ele ainda precisa visitar as casas dos membros, atender os
fieis no seu gabinete sabendo que tudo isso compreen-
de seu chamado pastoral. Por conseguinte, em cada uma
dessas atividades a Palavra é sua ferramenta principal, o
conhecimento da congregação um suporte, e as aplica-
ções bíblicas a chave pela qual o coração do pecador será
aberto. Assim saímos do erro não apenas do fracionamen-
to do ministério pastoral, como nos livramos também da
separação injusta entre Pregação e Aconselhamento. Co-
meçamos, então a concluir que com diz o Rev. Wadislau a
pregação no culto público faz parte do próprio aconselha-

91  BAXTER, Richard. Reliquiae Baxterianiae, p.86, apud. J.I. Packer, O Puritanismo como
Movimento de Reavivamento, p.45, apud. Franklin Ferreira, Servo da Palavra de Deus, O Ofício
Pastoral em Richard Baxter, p.5.

52
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

mento.92 As semelhanças entre as duas atividades são tão


fortes e ficam ainda mais unidas por meio da consciência
que o pastor é quem as exerce, que passamos a perceber
que muitas vezes pregação e aconselhamento andam tão
próximos que muitas vezes é até mesmo difícil diferenci-
á-los.
O trabalho do pastor mediante essa perspectiva, se
conforma ao que disse o apóstolo Paulo em Atos 20:20
“jamais deixando de os anunciar coisa alguma proveitosa
e de vo-la ensinar publicamente e também de casa em
casa”93 (grifo do autor). O apóstolo não se furtava em
ensinar o evangelho apenas nas pregações públicas, mas
também de maneira privada resolvendo problemas parti-
culares à luz das Escrituras. Ele estava sempre disponível
a ir até à casa de cada membro da Igreja e pregar a Palavra
aplicando-a aos casos específicos de cada família. À medi-
da que a pregação pública e particular vai sendo ministra-
da ao coração do indivíduo, esse é cada vez mais moldado
em seu caráter e consequentemente em suas atitudes, o
que o leva a se conformar não apenas a um padrão com-
portamentalista, mas ao padrão de Cristo.94 A pregação
particular não substitui o caráter público do ministério
pastoral, mas o auxilia no trato de questões específicas
de cada lar. Aos Domingos o ministro prega a Palavra de
Deus em aplicações gerais e até certo ponto, específicas,
92  Ibid. p. 74.
93  BÍBLIA SAGRADA. Revista e Atualizada. Sociedade Bíblica do Brasil.
94  HORTON. Michael. Um Melhor Caminho. São Paulo. Ed. Cultura Cristã. 2007. p. 67,68.

53
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

mas é durante a semana quando se senta com indivíduos


e famílias que as verdades da Bíblia se tornam ainda mais
diretas pelo nível de profundidade que o aconselhamento
oferece.
3.3 A História se Repete – A Necessidade de um Novo
Retorno as Escrituras
Todavia, parece que em certo sentido, a Igreja tem
retrocedido a problemas que pareciam ter sido superados.
Assim como vimos neste trabalho, especificamente no ca-
pítulo que trata da decadência e do retorno das Escrituras
aos púlpitos e gabinetes no século XIX e início do século
XX, parece que o problema mais uma vez está presente
no século XXI. É comum ver nos púlpitos das Igrejas
contemporâneas o que Powlison chama de “esvaziamento
da centralidade das Escrituras tanto na pregação como no
aconselhamento”95 . Essa tendência está culminando mais
uma vez na substituição da fonte de autoridade que deixa
de ser a Bíblia e passa a ceder lugar as teorias humanistas.
Neste sentido corrobora Jack Hughes, pastor em Burbank,
Califórnia, EUA, quando assevera que os pastores de hoje
deixaram de considerar a diferença entre princípios, apli-
cação e implementação, assim, não se utilizam mais da
supremacia das Escrituras, mas das limitadas estratégias
comportamentalistas. 96 Muito mais do que falta de capa-
citação para lidar com o texto bíblico, o diagnóstico desse

95  Ibid. p.3.


96  HUGHES. Jack. Implementation: The Missing Ingredient. Journal of Modern Ministry, Vol.
1, Issue 1. 2004. p.83-93.

54
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

desvio dos pastores, pode estar muito mais ligado com a


falta de fé na suficiência das Escrituras, resquício ainda
do século XIX no período já contemplado no primeiro
capítulo deste trabalho, onde campeava a teologia liberal.
Mais uma vez, não há outra saída para a Igreja que
não seja por meio da pregação da Palavra de Deus. Sendo
a Escritura a voz do próprio Criador, a única esperan-
ça para o pecador é se submeter a um trabalho contínuo
e efetivo de aconselhamento e pregação bíblica onde as
Sagradas Escrituras formam o centro e a fonte completa
de autoridade para fé e prática.97 Macathur reforça essa
verdade quando afirma que a Bíblia aplicada ao cristão
é tão exaustiva no tratamento dos problemas cotidianos
que torna o crente cada vez mais semelhante a Jesus Cris-
to. Este é o processo de santificação bíblica. Esse também
é o alvo do aconselhamento bíblico tanto público quanto
privado.98 Portanto, se existem pessoas precisando de au-
xílio espiritual, não há nenhum meio humano que possa
efetivamente resolver tal problema. Isso porque os mé-
todos humanos não são adequados a tratar daquilo que é
espiritual. A prática de utilizar a pregação das Escrituras
é comprovada tanto nas evidências teológicas quanto prá-
ticas e precisa urgentemente voltar a fazer parte dos púl-
pitos contemporâneos a despeito de todas as argumenta-
ções mundanas que muitos têm sugerido. Mas parece que

97  ADAMS. Jay. Manual do Conselheiro Cristão. Ed. Cultura Cristã. São Paulo. 2011. p. 27.
98  MACTHUR. John; MACK. Wayne. Introdução ao Aconselhamento Bíblico. Ed. Fiel. São
Paulo. p.27

55
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

não apenas o problema é o mesmo, mas a motivação pela


qual ele retornou ao meio cristão também.
A suficiência da Palavra de Deus tem sido despreza-
da. É comum encontrar pastores que duvidam do poder
da Palavra para tratar de assuntos que na presente época,
parecem ser mais bem tratados pelos especialistas secula-
res. Entretanto, a crença na Suficiência das Escrituras não
é questão meramente teórica, um assunto para se aprender
no Seminário e depois abandoná-lo. Gerard Van Groni-
gen diz que nos muitos anos em que ele vem trabalhando
utilizando a pregação da Bíblia em público e privadamen-
te, sempre tem obtido ótimos resultados com os crentes,
pois ela os dirige, corrige, alerta, encaminha e solidifica
em bases fortes.99 Essa apreciação pela Palavra e crença
na sua eficácia é mais que urgente para os nossos dias. Os
pastores precisam lembrar daquilo que tinham em mãos
e no coração os pais puritanos, continua a disposição da
Igreja. Os Ministros precisam a ter a confiança dos anti-
gos pastores como Richard Baxter falando do seu apreço
pelo poder das Escrituras quando aplicadas ao coração:
“Todo o nosso trabalho deve ser realizado de modo es-
piritual, como homens dirigidos pelo Espírito Santo. Na
pregação de alguns homens há um certo toque espiritual
proeminente, que os ouvintes espirituais podem discernir
e apreciar... Nossos argumentos e ilustrações sobre a ver-
dade divina também precisam ser espirituais, extraídos das
Santas Escrituras... Perder a apreciação pela excelência da
Bíblia é sinal de um coração desanimado; pois no coração

99  GRONINGEN. Gerard Van. GRONINGEN. Herriet. A Família da Aliança. Ed. Cultura
Cristã. São Paulo. 2009

56
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

espiritual há um apego à Palavra de Deus, visto que essa


foi a semente que regenerou aquele coração. A Palavra é o
selo que deixou todas as impressões santas que existem nos
corações dos verdadeiros crentes, e que estampou sobre os
mesmos a imagem de Deus; e, por essa razão, eles precisam
ter... uma elevada apreciação por ela, enquanto viverem...”100

Assim, a pregação da Palavra de Deus como ferra-


menta do aconselhamento bíblico não é apenas uma op-
ção, mas uma verdade teológica e prática asseverada ao
longo da história da Igreja cristã, e que precisa ser retoma-
da em boa parte dos púlpitos da presente era. Essa urgên-
cia se dá não por conta de um saudosismo sem sentido,
mas porque somente a Palavra de Deus é eficiente para
lidar com seu inimigo mais perigoso, o seu coração peca-
minoso e os ídolos que ele mesmo produz.
3.4 A Pregação Expositiva Destruindo os Ídolos do Cora-
ção
As verdades relativas à pregação e ao aconselhamen-
to muitas vezes se unem para tratar de problemas dos
mais variados. Todavia, certamente, um dos mais comuns
e graves problemas que a pregação expositiva pode servir
nas questões ligadas ao aconselhamento é quando lidamos
com os chamados “problemas do coração”. Na Escritu-
ra o coração não é simplesmente o órgão que bombeia
sangue para o corpo, mas é a completude do ser humano.
Disse Jesus que “do coração procedem os maus desíg-

100  Richard Baxter, op. cit., passim. Apud. Franklin Ferreira, Servo da Palavra de Deus, O
Ofício Pastoral em Richard Baxter, p.7.

57
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

nios”101 , o Senhor ensina que ele é a sede de todas as


emoções, sentimentos, inclinações e afeições do homem,
portanto, tratar o coração é tratar do próprio homem
como um todo. Diante disso, o olhar pastoral deve ser um
olhar minucioso para que permita-lhe conhecer o coração
do homem. Somente assim qualquer tipo de ação que se
siga poderá ter efeito real na vida de suas ovelhas.
Sabendo que os problemas familiares são exatamen-
te aqueles que chegam aos gabinetes para serem tratados
pelos pastores, percebe-se como as famílias e as Igrejas
são instituições multi dependentes e, que, portanto, preci-
sam ser avaliadas em sua inteireza. Portanto, o ministério
pastoral de pregação deve estar sempre atento e disponí-
vel para ser utilizado sempre que necessário para tratar o
coração dos seus membros. A pregação expositiva, sem
sombra de dúvidas é um meio eficaz e necessário para que
isso ocorra, pois, como disse João Calvino “Onde quer
que o evangelho seja pregado, é como se o próprio Deus
viesse para o meio de nós”.102
Entretanto, para que o ministro da Palavra seja efe-
tivo nesse trabalho, ele não pode ser simplesmente um
exegeta do texto das Escrituras, mas como já vimos, o
pastor deve aprender a fazer a correta hermenêutica das
pessoas.103 Embora haja uma universalidade na abrangên-

101  Ibid. pg.1122


102  CALVINO. João. Comentário nos Evangelhos Sinóticos. Pg. 14.
103  Ibid. pg. 85

58
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

cia e profundidade da ação do pecado desde a queda re-


latada em Gênesis 3, há certamente uma área específica
onde a luta se torna cada vez mais urgente, e por onde,
consequentemente, deve começar a observação do pastor.
O lar cristão tem se tornado muitas vezes um ambiente
de embates e constantes desavenças. O foco dos ataques
inimigos na família está ligado à função que ela desempe-
nha como lastro social. Uma sociedade pode ser medida a
partir da consistência de suas famílias. O grande problema
é que até mesmo aquelas famílias que portam a Palavra da
verdade, têm sucumbido à superficialidade no tratamento
da doutrina cristã em tempos pós-modernos. Essa falta
de zelo com a doutrina cristã que não é comum apenas na
presente era, já fora alertada com profunda sabedoria por
Richard Baxter:
Não veremos grandes reformas até que obtenhamos a
reforma na família. Poderá haver um pouco de religião
aqui e ali, mas enquanto as transformações estiverem res-
tritas a pessoas particulares, e não forem promovidas
nas famílias, não prosperarão nem produzirão frutos.104

Sem a presença efetiva e substancial de Cristo na vida


dos indivíduos e, consequentemente, das famílias, algo to-
mará os seus corações. A negligência na vida espiritual é
um fator que deve ser considerado, entendendo que de
uma forma ou de outra, sempre há espiritualidade em uma
casa. A questão é definir qual tipo está sendo administra-
da. Isso ocorre pela grande tendência que o ser humano
tem em adorar o divino. Dessa forma, quando o verdadei-
104  BAXTER, Richard. Manual Pastoral do Discipulado. p. 83.

59
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

ro Senhor não lhe é revelado, o homem trata de inventar


um ídolo em conformidade com o seu coração. Esse nem
sempre como acertadamente afirma Calvino:
Também vemos isso todos os dias, por experiência. Sim, pois
a carne não descansa enquanto não encontra alguma obra de
ficção semelhante à sua natureza na qual se regozija como
se fosse a imagem de Deus. Porque em quase todos os tem-
pos, desde que o mundo existe, os homens, seguindo essa
cupidez, fabricam imagens para terem certeza de que Deus
está perto deles quando têm diante dos seus olhos algum
sinal da Sua presença. Pois bem, julgando ver Deus em tais
imagens, eles as adoram. Finalmente, com o olhar e com o
pensamento totalmente fixos, eles se brutalizam mais ainda,
pois, como se houvesse alguma divindade dentro do pau ou
da pedra, são levados a prestar-lhe reverência e admiração.105

A idolatria, entretanto, nem sempre é exteriorizada.


Na maioria dos casos o ídolo é erigido e cultuado no mais
oculto do coração humano. O ser humano cria uma fal-
sa necessidade, mas imediatamente percebe sua impossi-
bilidade de alcançá-la sozinho. Ao ser confrontado com
essa conclusão, sendo um ser intrinsecamente religioso,
cria para si um deus que deverá ser também seu redentor.
É quando, só então, inicia-se o serviço religioso idólatra
para alcance da prece. Powlison fala com grande proprie-
dade sobre o assunto:

“A noção de idolatria emerge mais frequentemente em dis-


cussões sobre o culto de imagens físicas, a criação de falsos
deuses. Mas as Escrituras desenvolvem o tema da idolatria
em pelo menos duas direções principais relativas á minha ar-
gumentação aqui. Primeiro, a Bíblia internaliza o problema.

105  CALVINO, João. As Institutas da Religião Cristã. Vol. 1, p. 187.

60
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

“Ídolos do coração” são literalmente descritos em Ezequiel


14:1-8. A adoração de ídolos tangíveis é, perigosamente, a
expressão de uma deserção prévia de IHWH seu Deus 3.
“Ídolos do coração” é apenas uma de muitas metáforas.”106

Na busca da satisfação pessoal o homem mancha-


do pelo pecado está disposto a utilizar dos recursos dis-
poníveis, sejam eles lícitos ou não para que seu objetivo
seja consumado. William Edgar explica que “toda busca
humana de significado está ligada ao fato de se saber que
existe algo mais que este mundo, esse conhecimento acer-
ca de algo que vai além da realidade visível e presente.” 107
Segundo Philips:
Para alguns homens, o sucesso é o seu deus, eles o adoram
e o servem. Para outros, isso é a fama ou prazer. Mulhe-
res muitas vezes adoram a beleza ou se apaixonar. Seja o
que for, nós adoramos isso porque pensamos que nos
será a realização de nossas vidas. Isso nos assegurará con-
tra o mundo hostil, isso nos dará satisfação – em resumo,
isso será o nosso Salvador. Assim, quando um idólatra diz
“eu te amo”, o que ele quer dizer é “você é o meio pelo
qual conseguirei o que quero. Você está servindo mi-
nhas necessidades e garantindo minhas esperanças.108

As afirmações de Philips são extremamente duras


e bíblicas, além de estarem em consonância com o que
acontece nos lares assolados pela falsa crença. A medida
que os relacionamentos transgridem os limites ordenados
pelo Criador, a tendência é tornar-se um relacionamento
106  POWLINSON. David. Ídolos do Coração e a Feira de Vaidades, Ed. Refúgio. p. 3
107  EDGAR, William. Truth in all its glory: Commending the Reformed faith. Phillipsburg:
Presbyterian and Reformed, 2004, p. 15
108  PHILIPS, Richard D.; PHILIPS, Sharon L. Holding Hands, Holding Hearts, p. 458.

61
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

rebelde pautado na idolatria (I Sm. 15:23)109 . Confirman-


do essa afirmação o capítulo terceiro de Eclesiastes in-
forma que o homem que vive em um mundo pós-queda
anseia pela eternidade como por Deus (Ec. 3:11). Todavia,
essa ânsia não é exercida de maneira correta. O coração
pecaminoso anseia por um deus idólatra. Franz Delitzsch
explica acerca do texto de Eclesiastes 3.11:
O autor quer dizer que Deus não apenas designou a cada
um o seu tempo na história. Mas também estabeleceu no
homem um impulso que o leva além do temporal em di-
reção ao eterno: está em sua natureza não se contentar
com o temporal, mas romper os limites que este traça ao
seu redor, para escapar da prisão e inquietude na qual ele é
mantido, e no meio das incessantes mudanças do tempo se
consolar dirigindo seus pensamentos para a eternidade110 .

A adoração de um deus feito pela mente pecaminosa


do ser humano o leva a servi-lo em toda a sua vida, espe-
cialmente no casamento. O perigo da idolatria foi exposto
de forma magistral quando o reformador genebrino, João
Calvino, afirmou:
Portanto, a seus próprios delírios cultuam e adoram quan-
tos a Deus alçam seus ritos inventados, pois de modo al-
gum assim ousariam gracejar com Deus, se já antes tives-
sem moldado um deus congruente com os absurdos de suas
ridicularias. E assim o Apóstolo sentencia ser ignorância
de Deus essa vaga e errônea opinião com respeito a divin-
dade: ‘Quando desconhecíeis a Deus’, diz ele, ‘servíeis aos
que por natureza não eram deuses’ (Gl. 4:8).(...) Tampouco,
vem muito o caso, pelo menos neste ponto, se porventu-
ra concebes a um só deus ou a muitos, porque sempre te

109  PHILIPS, Richard D.; PHILIPS, Sharon L. Holding Hands, Holding Hearts, p. 458.
110  DELITZSCH, Franz. Commentary on the Song of Songs and Ecclesiastes. S/Loc: Wipf &
Stock, 2008. p. 261.

62
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

apartas do Deus verdadeiro e dele careces quando, deixan-


do ele de parte, não te resta senão um ídolo execrável 111.

O ídolo formado no coração humano nada mais é


que um reflexo das suas ansiedades que estão em busca de
satisfação. O pecador então, concebe em seu íntimo um
falso deus e a ele serve. Por ele espera ansiosamente ser
satisfeito, mas isso não se consumará. O ídolo nada mais
é que uma loucura frívola fabricada no enganoso coração
do pecador. Ele anseia servir a quem não existe, serve
a sua própria concupiscência e está fadado ao fracasso.
Assim, deixando de buscar sua satisfação em Cristo, o pe-
cador anela por um novo “salvador” que jamais poderá
redimi-lo, já que é obra de suas próprias mãos como sa-
biamente percebe Cipriano:
“Estes que não são deuses, os quais as pessoas comuns
adoram, são conhecidos por isto. Eles eram anteriormente
reis, que por conta de suas memórias reais começaram a ser
adorados por seus povos, mesmo depois de mortos. Desde
então templos foram erigidos em honra deles; desde então
imagens foram esculpidas para conservar as expressões do
falecido; e homens sacrificaram vítimas, e celebraram dias de
festas, com a intenção de lhes dar honras. Então, para os que
vieram depois, estes ritos tornaram-se sagrados, os quais,
primeiramente, foram adotados como um conforto.”112

A nulidade dos ídolos precisa ser substituída, pois


antes que isso aconteça o pecador sempre encontrara um
novo deus a quem servir, à medida que o anterior lhe frus-
trou. Paul Washer comentando sobre o erro da idolatria
111  CALVINO, João. As Institutas da Religião Cristã. Vol. 2, p. 50.
112  CRIPRIANO. São de Cartago. A Inutilidade dos Ídolos. Sec. I. disponível em: http://www.
veritatis.com.br/patristica/obras/8459-da-inutilidade-dos-idolos Acessado em 11/09/2014

63
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

diz que:
A menos que alguém enxergue sua dependência total de
Deus atentando para sua posição de inferioridade, tudo que
ele vive nada mais é que uma idolatria. Portanto, quando
Deus o quebranta, tal pessoa começa a ser preenchida com a
verdadeira vida, humildade, serviço e gozo. Mas a maior rea-
lização nesse caso está relacionada a transformação em cur-
so. Antes o gozo próprio era a sua própria realização, ou seja,
idolatria. Mas à medida que o Senhor trabalha em alguém,
tal pessoa desiste da sua realização em si própria e olha ape-
nas para Cristo. Cristo é sua realização e sua confiança.”113

Essa verdade tem a grande promotora de crises nas


uniões matrimoniais. Um casamento em que os cônjuges
não estão satisfeitos em Cristo é, sem dúvidas, uma união
de idolatras que gerará uma outra geração de adoradores
pagãos. Para alcançar o seu objetivo, marido ou esposa,
nada mais são que um meio para tal fim. Para Philips, o
problema maior é que os ídolos jamais satisfazem, mas
sempre exigem cada vez mais. Os ídolos só aumentam o
peso sobre o idolatra e nunca deixam nada de valor dura-
douro em troca. 114 Garofalo diz que:
Não há quantidade de comida, de Copa do Mundo ou de
amizade que possa de fato satisfazer os anseios eternos. Em-
bora essas coisas às vezes possam reproduzir uma alegria
transcendente, elas não podem reproduzir plenamente o
Criador, pois elas são criações. Ídolos podem mostrar as-
pectos transcendentes e imanentes, mas sempre são enga-
nosos e imperfeitos, sempre falham em suas promessas.115

113  WASHER. Paul D. Jesus: Nossa Alegria e Confiança. Disponível em: http://www.youtube.
com/watch?v= tGIXSjHVluY. Acessado em: 26/02/2013
114  PHILIPS, Richard D.; PHILIPS, Sharon L. Holding Hands, Holding Hearts, p. 493.
115  GAROFALO, Emílio Neto. A Busca humana da Diversão sob a Ótica Bíblica de Criação-
-Queda-Redenção. In: Fides Reformata Vol. XVI, Nº 2. São Paulo: S/ed., 2011. p. 45

64
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

Herman Bavinck explora esta trágica dinâmica com


as seguintes asseverações:
A conclusão, portanto, é a de Agostinho, que disse que o
coração do homem foi criado para Deus e não encontra
descanso até descansar no coração do Pai. Logo, o que to-
dos os homens estão buscando é Deus; mas, como também
disse Agostinho, eles não o procuram da maneira certa e
nem no lugar certo. Eles o buscam aqui embaixo, mas ele
está acima. Eles o buscam na Terra, mas ele está no céu.
Eles o buscam longe, e ele está perto. Eles o buscam no
dinheiro, na propriedade, na fama, no poder e na paixão;
e ele é encontrado em lugares altos e espirituais, e com o
que é de espirito humilde e contrito (Is 57.15). Mas assim
mesmo o buscam, se por acaso pudessem tentar senti-lo e
encontrá-lo (At 17.27). Eles o buscam ao mesmo tempo em
que fogem dele. Eles não têm interesse em conhecer seus ca-
minhos, mas não conseguem viver sem eles. Eles sentem-se
atraídos a Deus e ao mesmo tempo sentem repulsa por ele.116

Tudo isso desemboca nas relações sociais dos ho-


mens em suas diversas esferas. O ser humano em busca
de satisfação, começa a confundir conceitos e passa a se
enganar a ponto de servir aos seus ídolos ao tempo em
que sente que está longe da idolatria. Ele se envolve em
um relacionamento puramente romântico onde a atração
é o grande motivador, mas chama isso de amor. Enquanto
que em um relacionamento maduro mediante um amor
piedoso e bíblico, ele serviria a Deus e desfrutaria da com-
panhia das pessoas com uma disposição altruísta. Philips
confirma essa afirmação quando assevera que:
A Bíblia apresenta a melhor expressão do amor em termos
da doação de Deus mediante seu Filho, Jesus Cristo: “Porque

116  BAVINCK, Herman. Our reasonable faith. Miami: Eerdmans, s/d. p. 22-23.

65
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

Deus amou o mundo de tal maneira, que deu (grifo meu)


seu único filho” (Jo. 3:16). Esse é o amor que devemos li-
gar nossos pensamentos e palavras, nossos sentimentos e
interações. O resultado disto é que quando duas pessoas
amam com esse amor que vem de Deus, na maravilhosa re-
alização da união, essas duas pessoas dão tudo da sua indi-
vidualidade, o que Paulo chama de “perfeita harmonia”117 .

Um relacionamento baseado em idolatria resulta sem-


pre em conflitos e destruição. Todavia, quando as pessoas
estão satisfeitas em Cristo esta situação é bastante diferen-
te. Eles podem gozar de plena alegria em seu Salvador. Jay
Adams falando sobre a necessidade da realização do ho-
mem em Cristo, exclusivamente, diz que “Portanto, todos
os propósitos só assumem significado final se estiverem
relacionados a Ele (Cristo). Fora dele, tudo não passará de
objetivos isolados simples e a curto prazo”.118 Essa rela-
ção com Cristo é pactual, ou seja, cada indivíduo precisa
estar em Aliança com Deus em Cristo, para que os frutos
dessa relação bendita possam ser vistos em si mesmo, na
família e em toda sociedade. Portanto, nada mais urgen-
te que conhecer um pouco mais dessa Teologia Pactual
e, posteriormente, da sua efetiva aplicação no aconselha-
mento bíblico.
3.5 Conhecendo a Teologia da Aliança em Thomas Bos-
ton
Há inegavelmente uma relação entre o homem e
o Deus a quem ele serve, e tal relação é pactual. Essa é
117  Ibid, p. 542.
118  ADAMS, Jay. A Vida Cristã no Lar, p. 75.

66
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

estrutura da revelação divina, Deus se relaciona com o


home através de um Pacto. Ou o homem está pactuado a
Deus em Cristo e consequentemente, vive segundo a sua
lei e desfruta da sua graça, ou está pactuado a um ídolo e
lhe serve. Portanto, se o próprio Deus resolveu se revelar
assim, e esta forma de revelação pactual se constitui em
uma lente pela qual devemos enxergar a Escritura e o rela-
cionamento entre Criador e Criatura. Como bem afirmou
o Rev. Helio Silva quando disse que a Teologia do Pacto
é a espinha dorsal da Escritura e dos símbolos de fé re-
formados119 , portanto, com um bom conhecimento dela
será possível avaliar melhor como a situação espiritual dos
indivíduos e consequentemente buscar soluções para seus
problemas. Além disso, se a Escritura é estruturada120 por
meio do Pacto de Deus com seu Filho, a Pregação que
se dispõe a ser expositiva e aplicativa, precisa conhecer e
considerar essa estrutura.
Para essa avaliação preliminar da Teologia Pactu-
al será utilizada no presente tópico sobre o tema a obra
do puritano Thomas Boston em resumo dos seus quatro
capítulos sobre O Pacto das Obras e o Pacto da Graça.
Desse ponto em diante e até o final desse tópico, será
utilizado o volume I da obra de Boston segundo a divisão
por ele proposta para o tema:

119  SILVA. Hélio O. Que é o Homem para que dele Te lembres? Disponível em http://revhe-
lio.blogspot.com.br/2011/04/aula-10-doutrina-biblica-do-pacto-das.html, Acessado em: 27 de
Abril de 2017.
120  BOSTON, Thomas, The Complete Work of Thomas Boston. cap. 11,19. Versão em
Kindle.

67
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

1) O caráter relacional do pacto das obras


2) A estrutura do pacto das obras
3) As exigências do pacto das obras
4) A esperança do novo pacto
1) O caráter relacional do pacto:
É interessante que esse conceito de exigência pactual
de Deus tenha seu início justamente no Éden. Perceba
que há uma estrutura até que a exigência divina se concre-
tize. Deus primeiro cria as coisas, o homem, o coloca no
jardim e lhe dá uma lei, ou seja, só no final dessa ordem
é que Deus entra no pacto com Adão. Isso nos leva a en-
tender um conceito inicial entre as exigências da lei a toda
criatura e a exigência pactual. Em certo sentido, Todos
são filhos de Deus como criaturas, mas nem todas estão
debaixo do pacto. Isso fica claro porque uma coisa foi
Deus ter feito o homem e outra foi ele ter dado um pacto.
O homem não foi criado já no pacto, mas para o pacto.
Isso nos leva a entender como nem todos são membros
da Aliança. No desenrolar da revelação isso vai ficando
mais claro com a distinção das duas genealogias, uma que
vive no pacto com Deus e ama a sua lei, e outra que não
tem aliança com o Senhor e vive em rebeldia. Sob essas
bases é que se deve entender por exemplo, o conceito de
casamento. Em certo sentido todo ser humano pode se
casar, pois como criaturas divinas essa é a ordem do Cria-

68
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

dor, crescei e multiplicai. No mesmo sentido, todos devem


trabalhar, pois Deus disse ao homem que deveria dominar
a terra. Contudo, somente aos filhos da promessa ele deu
a possibilidade de amar sua lei no sentido espiritual. So-
mente aqueles que estão no pacto com Deus irão buscar
amar os seus mandamentos e ter prazer neles. Os demais
se revoltarão contra as ordens divinas.
CFW VII. SEC I. “Tão grande é a distância entre
Deus e a criatura, que, embora as criaturas racionais lhe
devam obediência como ao seu Criador, nunca poderiam
fruir nada dele como bem-aventurança e recompensa, se-
não por alguma voluntária condescendência da parte de
Deus, a qual foi ele servido significar por meio de um
pacto.”
Desde a criação Deus demonstrou o caráter relacio-
nal que manteria com sua criatura, dando-lhe todos os
prazeres dessa vida (paz, família, trabalho bens, etc), mas
isso é elevado a última potência quando ele revela que irá
se relacionar por meio de um Pacto. Essa é a grande de-
monstração de toda a bondade de Deus ainda antes que
sua misericórdia nos fosse apresentada. Mesmo sem ele
salvar o homem por ainda não ser necessário, Deus apre-
senta o seu amor em entrar num Pacto onde ele apresenta
sua condescendência as suas criaturas. Quem poderia en-
tão, reclamar de injustiça ao ser condenado pelo Senhor
se tudo que ele fez foi por meio de sua livre graça, seja em
dar o homem a vida ou livrá-lo da morte?

69
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

2) Entendendo a Estrutura do Pacto das Obras:


Boston diz que em primeiro lugar deve ser atentado
que esse Pacto é composto por duas partes, Deus e Adão
(Pacto das Obras). Além disso, precisa ser observado o
caráter judicial do Pacto das Obras, pois o padrão de san-
tidade era o mais alto possível. Adão foi chamado para
obedecer ao Senhor completamente. É justamente por
isso que essa primeira administração da Aliança de Deus e
o seu povo é chamado pacto de obras.
3) Pacto de Vida e Morte (recompensas - sacra-
mento)
Se o homem obedecer certamente viveria, se desobe-
decer, certamente morreria (Gn.2:15-17). Essas eram as
duas possibilidade para o homem, vida ou morte. Segun-
do Thomas Boston, Satanás sabendo da bondade divina
e seu desejo de que o homem se mantivesse nesse estado,
logo buscou tentá-lo em seguida à Criação. É válido saber,
que caso Adão se mantivesse fiel ao Pacto, uma benção
lhe seria dada, o acesso à árvore da vida eterna, chamado
aqui de sacramento, parte final do pacto. Adão se man-
teria perfeito após o estágio inicial de provação. Seria o
equivalente à Perseverança dos Santos hoje. Entretanto,
alguns teólogos vão ter dificuldade com o termo Pacto,
porque esse termo não aparece antes de Gênesis 9:9, mas
esse não parece ser um bom argumento. Boston, então,
propõe alguns argumentos contra essa perspectiva equi-

70
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

vocada a respeito do Pacto:


Argumento 1 – Pacto com Davi (II Sm.7; Sl.89:1-3):
Ora, mas os estudiosos que defendem essa tese não aten-
tam por exemplo no fato da palavra pacto não apare-
cer em II Samuel 7, quando é ponto pacífico que Deus
faz aliança com Davi ali (só parecerá no Salmo 89:1-3).
Argumento 2 – José fala de adultério antes da lei: Ou ain-
da, quando o adultério ainda não ter sido expresso em
lei antes do capítulo 20 de Êxodo, mas José fala clara-
mente que não cometeria pecado, ou seja, transgres-
são da lei, contra Deus e contra o seu senhor terreno.
Argumento 3 –Por fim, Thomas Boston ainda defende o Pac-
to das Obras com base Em Oseias 6:7 “Eles, porém, como
Adão, transgrediram o pacto; nisso eles se portaram aleivo-
samente contra mim.” Ou ainda no livro de Jó (31:33). Isso
porque apesar de um conceito não está claramente expresso
na Escritura, não quer dizer que ele não seja conhecido. O
apóstolo Paulo, por exemplo, na carta aos Romanos diz que
a lei de Deus está cravada nos corações dos homens. Isso
nos revela que até mesmo aqueles que nunca leram os Dez
Mandamentos tem a lei de Deus em seus corações e por isso
mesmo, se tornam indesculpáveis, como mais uma vez Paulo
ensina agora no capítulo primeiro da mesma carta. Portanto,
existia sim um Pacto no Éden, Adão precisava guardar a lei
que lhe foi positivada pelo Senhor. No caso de Adão, toda a
lei estava resumida no fato de não comer do fruto. Caso ele
obedecesse plenamente essa ordem divina de todo o coração
e de maneira contínua, ele receberia a recompensa de Deus
para aqueles que guardam seus mandamentos, Adão teria
acesso a árvore da vida, ou seja, Adão entraria no Descanso
Eterno de Deus em um estado em que não mais pecaria.

4) Entendendo as Exigências do Pacto:


Como sabemos, porém, Adão não se manteve no Es-
tado de perfeição. Sendo provado no Jardim de Deus, ele
desobedeceu sua lei. Perceba que sua desobediência não

71
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

começou com um ato físico, mas com uma inclinação no


coração. Foi o desejo de ser como Deus, não manifesto
em palavras, nem mesmo, a priori, em atitudes. Mas sendo
Eva enganada pela serpente, Adão foi seduzido pela sua
própria cobiça. Portanto, foi justamente nesse ponto que
começou a sua desgraça. Ele não guardou seu coração e,
consequentemente, não guardou a lei de Deus. Foi lá no
mais recôndito do seu ser que começou o pecado. Como
Tiago diz nas sua carta:
“Cada um, porém, é tentado, quando atraído e engoda-
do pela sua própria concupiscência; então a concupis-
cência, havendo concebido, dá à luz o pecado; e o pe-
cado, sendo consumado, gera a morte.” (Tg.1:14,15).”121

O problema de Adão é que nesse pacto não havia o


conceito de graça no sentido redentivo. Sim, é verdade
que de certa maneira o Senhor derramou sua graça sim-
plesmente no fato de providenciar todas as coisas para o
homem sem que ele nada merecesse, mas essa não é a gra-
ça da qual estamos falando. Segundo os nossos símbolos
de fé, essa é chamada de condescendência divina. O ato
onde Deus de maneira bondosa trata com sua criatura.
Entretanto, o conceito de graça no sentido redentivo não
existia, até porque não lhes era necessário. Ora, o homem
foi feito perfeito, logo não haveria necessidade de graça
redentiva, já que não haveria do que ser redimido. Tam-
bém não se tinha a figura de um Mediador, pois o trato
entre Deus e os homens era imediato. Esse foi o gran-

121  BIBLIA ARA, Tradução João Ferreira de Almeida, SBB, 2008, pg.1598

72
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

de problema de adão, pois sem mediador e sem graça,


no momento em que pecou foi condenado sumariamente
sem possibilidade de redenção enquanto estivesse nesse
pacto.
A situação de Adão era terrível. Seu pecado foi tão
horrendo que levou toda a raça humana consigo. Adão,
sem dúvidas, foi o maior assassino que a Terra já viu, pois
matou toda a humanidade consigo, como disse Paulo es-
crevendo aos Romanos (5:12). Todos dali em diante esta-
vam condenados ao inferno desde o seu nascimento. Não
haveria esperança, já que no Pacto das Obras uma única
quebra da lei de Deus resultaria em desgraça eterna e ge-
ral para todos os homens. Contemplemos o desespero de
Adão: A obediência deveria ser cumprida em toda a lei.
Mas o que é isso? Paulo explica isso com riqueza de deta-
lhes quando escreve aos Gálatas (3.10-12). O apóstolo diz
que desde o primeiro pensamento, em todos os aspectos,
em todos os níveis e até o fim. Não seria apenas:
1) Aspecto externo e interno: Aqui a bíblia fala do
coração, afeições, entendimento e espírito, Todo o nosso
ser precisa amar a lei de Deus. Eu devo amar a Deus com
minha razão, com minhas emoções e com meu espírito.
2) Sentido positivo e negativo: A cada mandamento
eu preciso está atento para guardá-lo tanto no aspecto po-
sitivo, o que preciso fazer, e negativo, o que me é proibido
fazer.

73
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

3) Palavras e pensamentos: O foro íntimo pertence


ao Senhor, não importa se a palavra me veio a boca, pois
Deus já a conhece toda. Portanto, guardar a lei de Deus
abrange meus pensamentos, minhas intenções que não
foram expressas.
4) Toda a vida – ativa e passiva (gl.3:10 “maldito todo
aquele que não permanece na lei”): Para quem quer guar-
dar a Lei precisa saber que ainda que o faça na maior par-
te de sua vida, mas erre apenas uma vez, o único pecado
que cometera lhe levara ao inferno do mesmo modo que
o pecador obstinado. Cristo e plicou muito bem isso no
Sermão do Monte quando em Mateus 5 ele expõe toda a
abrangência da lei, já Tiago mostra que a amplitude dessa
obediência se referia a todos os mandamentos e a cada um
deles separadamente. Não se poderia guardar nove e pecar
em um, o pecado contra um mandamento era a queda nos
dez. A Obediência requerida é o que podemos chamar de
obediência ativa e passiva que foi requerida a Adão. Isso
quer dizer que Adão foi chamado para obedecer a Deus
em todos os níveis e em todos os seus dias. Ele não pode-
ria se desviar nem por um só momento, pois estava naqui-
lo que se chama comumente entre os teólogos de estágio
probatório, o qual se passasse alcançaria o prêmio da vida
eterna. Foi isso que Deus requereu do nosso primeiro pai.
E nós estávamos em Adão. Quando ele não cumpriu a lei
na sua vida, todos caímos nele.
Esse é o grande ponto da lei. Os homens muitas

74
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

vezes tentam guardar a lei do Senhor e assim receber as


bênçãos divinas. Todas as religiões pregam isso, “faça as-
sim e deus vai lhe abençoar”, “seja bonzinho e deus lhe
recompensará”, mas mesmo que você não consiga fazer
tudo como deus requer, não se preocupe, ele vai enten-
der. Oram irmãos, esse não o Deus da Escritura. A Pala-
vra de Deus ensina que aqueles que querem tentar viver
da lei, precisam obedecê-la toda e plenamente. Ele diz
que nenhum erro sequer será tolerado. Imagine que jugo
desgraçado é esse! Viver eternamente nos escombros do
pacto das obras tentando observar a lei de Deus. O mais
interessante é que na época de Cristo homens extrema-
mente religiosos, de altíssima reputação entre o povo, res-
peitados e admirados como o partido dos fariseus foram
chamados de hipócritas por Jesus. Veja só, se homens do
mais alto grau de moralidade daquele tempo eram hipó-
critas, imaginemos aqueles que tentam viver nessa tensão
e ainda querem levar outros consigo. O que deus requer é
que façamos tudo de coração: Sabemos portanto, que esse
padrão é altíssimo. Que Deus deu a lei a Adão para que ele
guardasse e o fato de não guardá-la causaria a morte uni-
versal dos homens. A difícil missão de Adão era observar
a lei de Deus em todos os seus aspectos, como já vimos.
Mas pensemos sobre isso em nossas vidas. Deus quer que
guardemos sua lei completamente, ou de coração, como
é dito. Isso nos ensina que não basta ir à igreja, abraçar o
irmão, dizer que ama a igreja, cantar salmos, entregar nos-
sas ofertas precisamos fazer tudo de coração. Pois hipo-

75
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

crisia e falsidade formam uma constante em nossas vidas.


Não basta ouvir a Palavra, mas fazê-lo de coração.
Como já vimos a lei já estava em seu coração, toda
a vontade de Deus foi implantada na raça humana num
sentido geral. Entretanto, quando Deus se revela a Adão
pactualmente ele lhe concede um conhecimento distinto
da lei. Deus positiva (simbolicamente - Thomas Boston)
a sua lei, ele a expressa no limite dado em não comer do
fruto. Assim como ele está dizendo aqui em Êxodo “estes
são meus estatutos, por isso não se desviem deles”, res-
peitando o princípio da progressividade da revelação, lá
atrás Deus já entregara a Adão a sua lei. Mas se resta algu-
ma dúvida sobre essa questão, vejamos. O que significa a
Adão cumprir aquele mandamento. Caso Adão se manti-
vesse debaixo da ordem de Deus (havia essa possibilidade,
pois ele era perfeito, porém mutável, só Deus é perfeito
e imutável) ele continuaria em Aliança com seu Senhor e
manteria toda a humanidade viva, ou seja, ele demonstra-
ria amor por deus e pelo seu próximo. Mas o que a lei nas
palavras do próprio Senhor Jesus Cristo, não amar a Deus
acima de todas as coisas e ao próximo como a si mes-
mo? Então, Adão quando comeu do fruto demonstrou
rebeldia diante de Deus, não honrando o seu nome, mas
buscando viver segundo sua própria lei, e não amou o seu
próximo, pois levou consigo toda a raça humana. Portan-
to, a queda de Adão foi sim a quebra dos Dez Mandamen-
tos, a primeira e segunda tábua da lei. Essa é a afirmação
de grandes teólogos como o puritano Thomas Boston em

76
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

sua obra sobre o Pacto das Obras. A única solução seria


um novo pacto.
5) A Necessidade de um Novo Pacto
Ainda no Éden, antes de expulsar o homem do Jar-
dim, Deus o entrega uma promessa. Haveria de nascer um
filho da mulher e nele haveria esperança para o homem,
pois este menino esmagaria a cabeça da serpente. Alguns
estudiosos têm dificuldade de entender que aqui começa
um novo e permanente pacto, mas basta olhar para o que
Adão faz e veremos a sua fé nessa nova Aliança. Ele re-
cobra as forças e é agraciado por Deus com novas vestes
que cobrem suas vergonhas (Is.59). Mas não só isso, ele
muda o nome de sua esposa de varoa para Eva, ou seja,
mãe de filhos. Adão creu na promessa do Senhor que viria
um filho que salvaria a humanidade, um novo Adão. Veja
que a lei não foi modificada para que Adão fosse salvo
mesmo pecando, mas o que muda é o relacionamento de
Deus que agora passa a ser com esse menino, um pacto
entre Deus e Cristo. Agora, Adão não pode ser mais o
representante pactual, mas é o próprio filho de Deus que
assume essa posição.
Perceba que esse Pacto da Graça não se encontra
apenas no Novo Testamento, mas já em Êxodo toda a
linguagem é baseada na Graça. Veja ainda que a libertação
da opressão do Egito não vem por meio da obediência,
mas pela fé naquilo que Deus disse ao povo por meio de

77
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

seu Mediador, Moisés. Ele prometeu libertar o povo e as-


sim o fez. Deus por meio do cordeiro que foi aspergido
nos umbrais das casas dos israelitas não permitiu que a
morte tocasse no seu povo. O Egito foi destruído, mas de
lá saiu da morte para vida um povo para o próprio Deus.
Eles agora podem viver livres das cargas da escravidão,
mas ao chegarem ao Sinai são apresentados à santidade de
Deus. O pacto é firmado por meio da graça no momento
da entrega da lei. O Senhor que libertou seu povo do Egi-
to agora tem suas exigências que são resumidas nos Dez
Mandamentos e aplicadas em diversas situações no Livro
da Aliança. O povo é chamado a obedecer a Deus nos
mesmos moldes do primeiro pacto, mas com uma enorme
diferença, eles não o farão para salvação, mas porque já
foram salvos. O padrão é o mesmo a distinção é quem o
cumprirá.
Veja se não é assim também no Novo Testamento. Ao
homem era requerida obediência completa à lei de Deus
e a sua desconformidade era motivo de estarem todos no
inferno. A única solução seria um Mediador para esse pac-
to. Não poderia ser mais Moisés, nem Davi, nem qualquer
um outro. Por isso mesmo Cristo se apresenta para cum-
prir toda a lei em nosso lugar. Aqui está o ponto de conta-
to das suas alianças - a justiça, pois tanto para Adão como
para Cristo a perfeita obediência foi requerida. Ele que
foi feito à semelhança do homem, mas sem pecado, pôde
ser separado para seu ofício de Mediador superior como
diz o autor aos hebreus. Toda a lei em todos os sentidos,

78
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

não apenas na sua morte como em toda sua vida. Alguns


teólogos entendem que a obediência de Cristo se resume
a sua morte, mas isso não seria justo com o caráter de re-
presentante federativo com semelhanças em Adão. Adão
precisava obedecer em vida e Cristo também. Ele mesmo
disse a João Batista que seria necessário cumprir toda a
justiça, (Mt.3), ou seja, toda a lei de Deus. Mas isso ele fez
não apenas em vida mas ele foi até à morte obedecendo
a santa lei do Senhor (Fp.2:5-10). Veja que a linguagem
de Paulo não diz na morte, mas até à morte, ou seja, des-
de que o pacto foi firmado entre Deus e Cristo, este se
comprometeu em guardar a sua lei todos os dias de sua
vida e em todos os níveis que a ele foram exigidos, É por
isso que podemos ter firme confiança que Em Cristo, o
nosso novo representante, nós temos vida plena, pois ele
cumpriu todos os requisitos da lei de Deus, em todos os
graus e níveis e em toda a sua extensão para que nós não
tenhamos que levar esse fardo pesado, mas carregar o seu
jugo suave e seu fardo leve.
O homem é sempre tentado a confiar em suas pró-
prias forças, mas esse é um grande engano. Quantas pes-
soas não estão hoje no inferno porque tentaram de al-
guma maneira observar sozinhos a lei de Deus para sua
salvação. Esse é o estado mais doentio e perigoso do ser
humano, quando ele tenta ser redentor pra si mesmo. Essa
atitude não apenas nega a obra de Cristo, mas tripudia do
seu sofrimento. Tudo que ele fez, o fez para que os peca-
dores possam alcançar aquilo que Adão não conseguiu, a

79
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

vida plena. Em Cristo aqueles que se arrependeram dos


seus pecados têm a certeza que mesmo quando não con-
seguem guardar a lei de Deus como deveriam, podem se
tranquilizar porque tem um Mediador e Redentor que os
livra do castigo eterno. Aqueles porém que insistem em
continuar em meio aos escombros do Pacto das Obras
devem ter a certeza que jamais conseguirão a vida sem
Cristo. É válido lembrar que Deus fechou o caminho de
volta à árvore da vida (Gn.3.24), ninguém chegará a ela
sem ser por Cristo.
Toda essa obra de Cristo não foi simplesmente para
livrar o homem do castigo final, o que de fato já seria uma
grande benção. Boston, todavia, alerta para uma aparente
incoerência na obra de Cristo, se a exposição a seu respei-
to parasse por aqui. Isso porque o puritano bem lembra
que se o homem fosse livrado do castigo final, ele volta-
ria ao mesmo estado de Adão. Entretanto, no sacrifício
de Cristo o pecador redimido avançou à frente de Adão,
pois não apenas foi salvo do inferno, mas declarado jus-
tos diante de Deus. E isso traz a certeza para o redimido
que ele não apenas não irá para o inferno, como também
nunca poderá perder essa condição de justiça já que sua
justiça não é própria, mas de Cristo (Rm.5.1). Assim, um
grande conforto tem os crente aqui, pois são declarados
justos de uma vez por todas e têm a certeza de permane-
cerem assim eternamente, pois Cristo cumpriu toda a lei
lhes imputando a sua justiça e tomando sobre si a culpa
do pecador (Rm.4.20-25).

80
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

Nas palavras de Thomas Boston:


“desista dessa tentativa de buscar vida no falido Pacto das
Obras, tome posse do Pacto Superior, e suba na carruagem de
Cristo, que nos levará em segurança para a vida eterna. Aque-
la carruagem que Adão dirigia, não foi tão longe até ser to-
talmente destruída, e fez-se imprópria para carregar qualquer
um para o céu. Ela se quebrou com o menor peso do pecado,
e assim nunca poderá conduzir você para o céu. Entretanto, se
você entrar na carruagem no Pacto da Graça, será transporta-
do com segurança para a terra do eterno descanso e glória”122.

3.6 Aplicando a Teologia da Aliança ao Problema dos


Ídolos do Coração – Na Pregação e no Aconselhamento
Mediante a melhor compreensão da Teologia da
Aliança, será possível passar a tratá-la em sua ligação com
as conexões com a pregação e a consequente aplicação
prática para indivíduos e famílias. Conhecendo a maneira
com que Deus resolveu se relacionar com os homens por
meio de uma Aliança, podemos entender melhor como
surgem os problemas entres os indivíduos e como a pre-
gação e o aconselhamento podem contribuir com a solu-
ção.
Assim como Deus não se revela em solidão, mas em
uma Trindade, por semelhante modo, Ele também resol-
veu determinar que o homem se relacione entre si, em
comunidade. O Criador não formou pessoas para vive-
rem no isolamento, mas em coletividade, mas essa rela-
ção apresenta muitas tensões e é por isso que os pastores
precisam estar atentos a cada inclinação idólatra que surge

122  BOSTON. Thomas. Complete Works. Ephesians Four Group. 2014, Pg.5331 - ebook

81
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

no coração das suas ovelhas. A teologia da Aliança nos


ajuda a entender bem esse perigo. Não existe um pro-
blema isolado na Igreja, quando um membro sofre, todo
o corpo sofre junto (I Co.12.26). A Igreja é o corpo de
Cristo e cada crente, membro desse corpo, é responsável
pela saúde dele como um todo. Essa é a lógica pactual da
Igreja, como ensina a Escritura. São muitos os casos que
poderiam ser citados, porém o caso do pecado de Acã irá
deixar muito clara a relação entre o indivíduo e a Igreja.
Josué.7.1 “Prevaricaram os filhos de Israel nas coisas conde-
nadas; porque Acã, filho de Carmi, filho de Zabdi, filho de
Zera, da tribo de Judá, tomou das coisas condenadas. A ira
do SENHOR se acendeu contra os filhos de Israel (...) v.11
Israel pecou, e violaram a minha aliança, aquilo que eu lhes
ordenara, pois tomaram das coisas condenadas, e furtaram,
e dissimularam, e até debaixo da sua bagagem o puseram.”

Veja como esse texto deixa clara a ligação entre um


membro com o todo da Igreja. Acã pecou tomando dos
despojos de guerra que foram proibidos pelo Senhor. Ele
pecou sozinho contra Deus, mas enquanto se manteve em
pecado, a Igreja toda sofreu. É por isso que o cuidado da
liderança com cada ovelha que Deus lhe confiou para pas-
torear é mais importante e efetivo do que o cuidado sim-
plesmente com a comunidade como um todo. Quando um
indivíduo de uma família está satisfeito em Cristo a expec-
tativa de cada integrante muda diametralmente. Segundo
Philips “a manipulação cede lugar ao serviço: a relação de
servir um ao outro no cumprimento de dois grandes man-

82
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

damentos de Deus”123 . Assim, indivíduos bem firmados


na fé cristã, formam famílias fortes e consequentemente,
Igrejas fortes. Esse é o caminho para que a Igreja fuja da
idolatria e dos problemas consequentes.
Como pode ser percebido, fora de uma satisfação
plena em Cristo onde cada pessoa tem nele o Amado da
sua Alma, o mais precioso dentre os milhares, a felicida-
de individual, a família, o casamento ou qualquer outro
tipo de relacionamento entre pecadores será uma grande
batalha. A guerra será travada desde o coração do indiví-
duo e atingirá a casa e consequentemente a Igreja, onde o
“deus” que cada indivíduo erigiu em seu coração irá lutar
para conseguir seus intentos. Seja o ídolo da bebida, do
sexo, dos prazeres mundanos ou até mesmo da satisfação
profissional, a pregação do evangelho de Cristo aplicada
as diferentes necessidades da congregação, será válida no
trato dos problemas particulares de cada membro da co-
munidade. Tal satisfação influenciará claramente no bem
estar da Igreja como um todo.
Entretanto, que efetividade haveria nesse tipo de
pregação que age diretamente no coração, quando esses
não foram regenerados. Portanto é válido salientar que o
poder da pregação em primeiro lugar é regenerador e só
então transformador. Isso nos ensina que esses ídolos do
coração primeiro precisam ser destruídos para cederem
lugar a quem lhe é de direito, Cristo, e isso na conversão.
123  PHILIPS, Richard D.; PHILIPS, Sharon L. Holding Hands, Holding Hearts, p. 510.

83
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

Somente então é operada a transformação que se espe-


ra na vida cotidiana de cada família, pois apenas aqueles
que se encontram em Aliança com o Senhor mediante a
fé, podem se beneficiar dos resultados da santificação por
meio da Palavra (Is. 54;5; Ef. 5;32). Como acertadamente
afirma Philips:
“O casal de crentes resolve não seguir seu próprio caminho,
mas comissioná-lo nas mãos do Senhor. Outros podem pare-
cer felizes, mas sem Deus em seus corações nunca poderão,
nunca terão descanso; já o crente pode sempre descansar en-
tregando o seu coração (ele ou ela) nas mãos do Senhor.”124

Essa Aliança com Deus demanda que os homens se-


jam transformados em todas suas relações, inclusive em
família. Além disso, a relação primária com o Criador ser-
virá de base e referencial para as demais relações sociais.
Portanto, assim como no casamento entre Cristo e a Igre-
ja não há espaço para outro deus, nos relacionamentos
humanos, não pode haver espaço para um terceiro. Quan-
do alguém está entregue à adoração idolatra, todos os seus
demais relacionamentos estarão corrompidos, a partir da
sua comunhão com o Criador. Por mais que o homem
busque satisfação nas coisas desse mundo, nada lhe será
suficiente, pois é inadequado ao coração do homem. Se-
gundo Calvino, a segurança dos crentes na promessa de
redenção de suas vidas completa está no selo da fé que
conforta o coração do cristão nas promessas do porvir. 125
Deus preenche tudo em todos, ele redime vidas individu-

124  PHILIPS, Richard D.; PHILIPS, Sharon L. Holding Hands, Holding Hearts, p. 439.
125  ADAMS, Jay E. Uma Herança Garantida. P. 201.

84
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

ais e casamentos em crise por meio da cruz de Cristo. O


sangue do cordeiro exposto por meio da pregação fiel da
Palavra, despedaça os ídolos do coração humano restando
apenas o serviço familiar conjunto ao único Deus digno
de adoração. A única esperança para o pecador está na
completude que Cristo oferece. Por meio dela os lares e,
consequentemente, a sociedade serão redimidos e trans-
formados à semelhança Dele. Onde mais alguém pode
encontrar as riquezas do evangelho que tem poder para
libertar o pecador de seus ídolos, senão por meio da pre-
gação pública e particular?
É por meio do anuncio do evangelho que todas es-
sas tenções interiores do coração humano, que são muitas
vezes exteriorizadas por meio da depressão, tristeza, raiva
ou inveja, só poderão ser tratadas se a Palavra de Deus,
como espada de dois gumes que é, penetrar o mais pro-
fundo da alma do pecador e ali destronar o seu ídolo. Esse
trabalho de pregação no púlpito desperta os crentes para
pecados que vem cometendo no coração ou já exterior-
mente. Muitos desses pecados são tratados simplesmente
pelas palavras ditas no sermão, outros são alertados ali e
tratados posteriormente no gabinete. Gomes está certo da
ligação harmoniosa e natural entre a pregação e o acon-
selhamento e a urgência que os pregadores devem ter em
apresentá-la, quando diz as seguintes palavras:
“A pregação para aconselhamento não é diferente de qual-
quer outra, senão que requer um trabalho hermenêuti-
co da Palavra e da audiência para uma exposição calorosa

85
e autêntica cujo objetivo é edificar, exortar e consolar. Ela
se mostrará efetiva quando exibir a relação entre a unida-
de multiperspectiva da mensagem e a coerência do ato-es-
trutura (atividade interna e externa da palavra e da vida)
do pregador com o objetivo de transformar o caráter dos
ouvintes e de produzir mudança de comportamento.”126

Assim, diante da constatação da importância do ser-


mão expositivo e sua ligação direta com a teologia da
Aliança e suas aplicações no aconselhamento bíblico, nada
seria mais urgente do que investigar as múltiplas manei-
ras de aplicação das verdades da Palavra de Deus para a
vida da congregação. Como ficou claro, não se trata de um
exercício técnico, a harmonização entre pregação exposi-
tiva e aconselhamento é natural, como disse Gomes “não
há outra forma de pregar se não aconselhando”.
Mediante essa asseveração o que fica em pauta não é
a validade ou necessidade do sermão como ferramenta do
aconselhamento, mas as melhores maneiras de colocar em
prática algo que está intrínseco nessa atividade. Por isso
mesmo, faz-se necessária uma análise das estratégias mais
eficientes de utilização das aplicações práticas do sermão.
Assim sendo, o próximo capítulo será dedicado à análise
de diversas abordagens nas aplicações práticas, levando
em conta as categorias de problemas e de ouvintes.

126  Ibid. pg.80


A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

4
4 Aplicações Práticas Na Pregação Ex-
positiva Em Auxílio Ao Aconselhamento
Bíblico

Diante do que já foi exposto neste trabalho há uma


associação inevitável entre Pregação Expositiva e Aconse-
lhamento Bíblico. Isso se comprova, pois no declínio da
pregação com a entrada do liberalismo teológico, foi per-
cebido no primeiro capítulo o declínio conjunto do Acon-
selhamento Bíblico pastoral. Assim também, com o traba-
lho de retomada da Pregação Expositiva e de suas antigas
bases, houve também a retomada do trabalho pastoral do
aconselhamento com as Escrituras. Assim sendo, perce-
bemos que estamos diante de dois aspectos do ministério
pastoral que andam juntos e que precisam ser tratados
em sua inteireza. Para isso, então, se faz necessário inves-
tigar ainda como aplicar na prática a pregação expositiva
em conjunto com o trabalho de aconselhamento pastoral.
Nesse último capítulo será abordada, portanto, as técnicas
da pregação expositiva que formam o ministério públi-

87
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

co do pastor, e como essas técnicas podem contribuir o


aconselhamento bíblico, ou seja, o aspecto particular do
trabalho dos ministros.
4.1 A Origem das Boas Aplicações que Tratam o Cora-
ção dos Ouvintes
É fato que existem muitos pastores que são extre-
mamente hábeis nas línguas originar, grandes exegetas e
explicam muito bem o texto, mas parece que toda aquela
teologia acaba não se conectando com os membros da
Igreja. Muitos trazem as ferramentas de trabalho para o
sermão apresentando a Igreja uma exegese e não um ser-
mão, como sabiamente advertiu o Dr. Pipa. Assim como
uma boa cozinheira prepara os pratos na cozinha deixan-
do as panelas e levando a mesa apenas a refeição bem ex-
posta, um bom pregador trabalha em particular com suas
ferramentas, e traz para a Igreja uma explicação simples,
porém não simplória do texto, e rapidamente fala ao cora-
ção por meio das aplicações127 . A isso Perkins chama de
aproximação bíblica da exposição.128
Devemos estar cientes que aqueles que se chegam a
Igreja no Dia do Senhor, aguardam ansiosamente a voz
de Deus para os acudir em suas muitas necessidades, to-
davia, o que eles têm diante de si é um homem. Isso não
deveria os desesperar, pois esse foi o meio escolhido por

127  PIPA, Joseph. Sermão Puritano. Espiritual e Claro. Editora Clire, Recife-PE, 2013, p.12.
128  PERKINS, William. The Art of Prophesying with tha Calling of the Ministry. Kindle
Edited by M.J. André. P.51.

88
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

Deus para se revelar ao seu povo (Hb.1:1,2). Entretanto,


tais homens designados para essa gloriosa obra precisam
ter empatia com o povo de Deus, como afirma o Dr. Pipa
“nosso sermão poderia estar tão cheio de símbolos e me-
táforas, extraídos do lugar de trabalho, da fazenda, do lar,
de tal forma que possa haver uma empatia entre o que o
pastor está falando e o povo” 129. O mesmo autor ainda
diz que essa empatia entre pregador e ouvintes deve ser
exercitada por meio das aplicações e ilustrações que este-
jam de acordo com a vida da congregação, e não surgirem
simplesmente das leituras do pregador130 . Quando a Igreja
percebe que o que o pregador fala diz respeito justamente
a sua vida prática, e não somente a questões do passado,
ele se identifica com o tema e passa a estar mais receptivo
ao que está sendo pregado, o que inevitavelmente o leva a
considerar as exortações feitas naquele momento.
É necessário, entretanto, entender que essa empa-
tia que desembocará em boas aplicações do sermão, não
pode ser fabricada, mas ela é fruto de uma vida de piedade
no lar, da convivência do pregador com a congregação e
do estudo e meditação nos textos que serão pregados. Em
termos de vida de piedade é possível citar William Golge
que pregava três vezes por semana por 45 anos seguidos,
ajudava o pobre, auxiliava outros pastores, escreveu 11 li-
vros, e cooperou na assembleia de Westminster. Ele e sua
esposa Elizabete tiveram 13 filhos, 8 sobreviverão até à
129  Ibid. p.10.
130  Ibid. p.11.

89
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

fase adulta. Uma família que conhecia a Cristo131. Golge


liderava sua família em oração a cada dia. Ninguém, nem
sua mulher, nem seus filhos, nem um servo que viveu com
ele, jamais observou uma atitude de ira ou destempero,
ou ainda uma palavra de ódio a qualquer pessoa . Golge
pregava primeiro a sua própria casa, compreendia os an-
seios da família, batalha espiritualmente com sua esposa
e filhos, esse era o começo do seu sermão. Além da vida
de piedade no lar, é mandatário para o pregador que ele
conheça sua congregação como bem disse Calvino ao co-
mentar Atos 20.20:
“O que quer que os outros pensem não consideramos nosso
cargo como algo nos limites tão estreitos como se, quando
o sermão estiver terminado, pudéssemos descansar como se
nossa tarefa tivesse acabado. Aqueles cujo sangue será requeri-
do de nós, se os perdemos por causa da nossa preguiça, devem
ser cuidados muito mais de perto e de modo mais vigilante.”132

Já ao comentar I Ts. 2:11 o reformador genebrino


acrescenta que “não é suficiente que do púlpito, um pas-
tor ensine a todas as pessoas conjuntamente, pois ele não
acrescenta instrução particular de acordo com as necessi-
dades e circunstâncias específicas de cada caso”133 Calvi-
no insistia no mesmo comentário que um pastor é como
um Pai para cada pessoa, e um bom pai conhece de perto
seu filho.
131  BEEKE, Joel, The Puritans on Walking Godly in the Home. Cap. 53.
132  CALVIN, John.. Calvin´s Commentaries – The Acts Of The Apostles . Vol. II. Grand
Rapids, Michigan: Eerdmans Publishins Company. 1973 p. 175
133  Calvin , John. Calvin´s Commentaries – The Epistles Of Paul – The Apostle To The
Romans And To The Thessalonians. Grand R apids , Michigan : Eerdmans Publishins Company.
p. 345

90
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

Por fim, para que as boas aplicações práticas pos-


sam surgir no sermão ainda, é importante que o pregador
conheça bem a teologia do texto e gaste tempo meditan-
do antes de pregar. Não basta apenas um estudo rápido e
técnico, mas o pregador precisa pensar no texto, lembrar
das muitas necessidades da sua comunidade (isso sem ex-
por os problemas particulares em público) e, só então,
conectar tudo isso no sermão. Assim, a vida de piedade
no lar, associada à visitação e estudo com meditação pro-
movem ricas aplicações aos ouvintes. Como bem afirma
Perkins que após a lei ser devidamente aplicada pela ex-
plicação doutrinária, o pregador tem o segundo trabalho
que é apresentar o remédio que não existe na lei (Gl.3:10).
Aquele antídoto para o desespero que é a aplicação do
evangelho não apenas para nos convencer do erro, mas
para nos animar por meio do Espírito Santo a vivermos
de acordo com sua Palavra.134
Apesar de já ter sido discutida a origem das boas
aplicações, é fato que elas surgem de uma certa técnica
que o pregador aplica e que ao longo da história da Igreja,
e principalmente entre os puritanos (período que será uti-
lizado a seguir), é possível identificar um caminho básico
das aplicações que contribuem para o auxílio no trato das
questões particulares da Igreja.
4.2. Aplicações por Categorias de Ouvintes em William
Perkins

134  Ibid. pg.51

91
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

Por mais bem preparado que o pregador esteja ao


chegar ao púlpito, seja em sua vida devocional, em suas
visitações ou ainda na exegese e meditação do texto, ainda
há um elemento muito forte que precisa ser atentado, a di-
versidade de categorias de ouvintes que aguardam ouvir a
pregação. Aos pés do púlpito estão crianças, jovens casais
mais experientes e as senhorinhas da reunião de oração.
Além disso, ainda existem os visitantes de outras congre-
gações, os incrédulos que por ali chegaram pela primeira
vez, ou ainda aqueles que ouvem o sermão já há alguns
anos, mas jamais se converteram. Como falar a um publi-
co tão vasto assim, considerando que cada uma daquelas
pessoas necessitava de ajuda vinda de Deus. Além disso,
como usar aqueles cinquenta ou sessenta minutos da pre-
gação para começar ou dar continuidade ao tratamentos
de problemas pontuais nas diversas famílias da Igreja?
William Perkins, iminente pregador puritano do sé-
culo XVII, na sua obra “A Arte de Profetizar” apresenta
pelo menos sete tipos de ouvintes presentes em uma con-
gregação, e por conseguinte, sete caminhos pelos quais
tais categorias de ouvintes devem ser atingidas por meio
das aplicações do sermão:
1) Os descrentes, ignorantes e não ensináveis :135
Para estes Perkins aconselha que os pregadores em pri-
meiro lugar os prepare para a doutrina da Palavra. O autor
usa o exemplo de Jeosafá que pôs os levitas para ensina-
135  Ibid. 52,53

92
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

rem o povo a ter cuidado com os ídolos por meio da lei.


Perkins diz que os pregadores precisam em primeiro lugar
argumentar no seu discurso reprovando os pecados em
que provavelmente estejam metidos para que suas cons-
ciências sejam tocadas e seja produzido temor em seus
corações. Somente a partir daí eles se tornarão ensináveis.
Então, é o momento de se concentrar em pontos gerais
como fez o Paulo (Atos 17:30,31). Após essa argumenta-
ção mais geral, o pregador partirá para pontos mais es-
pecíficos a respeito dos pecados. Mas se após todo esse
caminho exposto os descrentes permanecerem rebeldes
ao ensino, então melhor deixá-los ir como estão (Pv.9.8,
Mt.7:6), pois o pregador já cumpriu sua missão para com
eles.
2) Aqueles que são ensináveis, mas ignorantes
:136 A estes Perkins aponta o caminho dos catecismos que
podem e devem ser bem utilizados na exposição bíbli-
ca. Nesse caso, essas pessoas precisam ser apresentadas
as perguntas do catecismos e suas respostas, isso porque,
tendo uma disposição para aprender, mas ainda não o co-
nhecimento, este é um caminho extremamente eficaz para
ensinar. Neste ponto da pregação, o pregador irá fazer
uma diferenciação entre leite e alimento sólido (I Co.3.1,2;
Hb.5:13), pois a estes que estão ainda engatinhando na fé,
é necessário ser bem expostas as bases da doutrina an-
tes de se chegar as questões mais complexas. O prega-

136  Ibid. 53,54

93
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

dor, portanto, é chamado a pregar simples, mas não sendo


simplório, evidenciando as bases da fé e as aplicando as
necessidades do que tem pouca instrução.
3) Aqueles que têm conhecimento, mas não tem
humildade :137 O autor aponta ainda aqueles que já co-
nheceram um pouco de doutrina, mas lhes falta humil-
dade para se submeter à vontade de Deus. Eles aprende-
ram e a doutrina ficou apenas em suas mentes, mas jamais
desceu para o coração. Portanto, o pregador precisa estar
preparado para apresentar todo o peso do pecado a fim
de que eles possam ter consciências do quão maligno é o
mau que cometem. Por meio da pregação que apresenta
na prática os casos de pecados e como Deus os tratará, o
ouvinte pode ser levado à verdadeira tristeza que procede
da consciência do pecado. Caso isso não aconteça, eles
jamais irão dar crédito à doutrina e nunca se submeterão
ao mandamento. Mas quando o pregador diz ao soberbo
que é com ele que a Palavra está falando, eles podem ser
humilhados e começar a se identificar com o que é dito e
serem assim tratados em seus problemas.
4) Aqueles que já se tornaram humildes pela pre-
gação :138 Quanto aqueles que por meio da exposição da
lei já tem se tornado humildes diante de Deus, o prega-
dor precisa os considerar em suas necessidades. Portanto,
aos que já foram tratados e quebrantados o outro aspec-

137  Ibid. p.55-57


138 Ibid.p.57

94
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

to da pregação deve ser a apresentação do conforto que


vem de Deus. Perkins sugere pelo menos dois exemplos
a esse respeito. O primeiro se encontra em Gênesis (3.9-
15) quando à medida que Deus pronuncia a condenação
em seguida é declarada a promessa da vinda do Messias
(Gn.3.15). O segundo exemplo apresentado pelo mesmo
puritano se encontra em II Sm.12.1-13 quando o profeta
Natã, enviado por Deus, vai até Davi e não apenas aponta
o seu pecado, mas assim que o Rei reconhece sua iniqui-
dade, se apresenta arrependido, vem em seguida as pala-
vras de conforto “o Senhor perdoou o seu pecado. Não
morrerás”. Mesmo sem poder distinguir quem realmente
está arrependido durante a pregação, Perkins ensina que é
papel do ministro utilizar-se desses exemplos como guia
de procedimento para reanimar os que foram confronta-
dos e humilhados pelos seus pecados.
5) Aqueles que já creem :139 Nesse ponto o prega-
dor é chamado a ensinar as doutrinas bíblicas que foram
encontrados naquele texto e apresentar aos crentes a jus-
tificação, santificação e perseverança. Além disso, o minis-
tro ainda deverá aplicar a lei ao crente, não no mesmo sen-
tido que fez com na primeira ocasião quando convencia
sua audiência do pecado, mas para mostrar-lhes, que mes-
mo não estando mais debaixo da maldição da lei, precisão
observá-la para sua santificação, como ensina o apóstolo
Paulo (Rm.8.1; I Tm.1:9). Teríamos aqui as aplicações prá-

139 Ibid.p.57,58.

95
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

ticas da pregação sob a ótica do chamado, terceiro uso da


lei 140, ou uso para santificação, conforme ensina também
Greg Bahnsen.
6) Aqueles que voltaram a cair no pecado :141 Nes-
ses casos a pessoa pode estar com um problema sério a
respeito da compreensão doutrinária da pessoa e obra de
Cristo. Portanto, um trabalho adequado precisa ser feito
pelo Pastor para que pessoas que caíram possam ser reer-
guidas. O crente nesse estado precisa inicialmente de ser
lembrado que o perdão é para todos os tipos de pecado,
que as promessas do evangelho são para todos os crentes,
que a vontade dele precisa ser de acordo com sua fé. O
encorajamento para o aumento da fé e para os usos dos
meios de graça como a oração em particular e em grupos
devem fazer parte das aplicações. Por fim, ainda é necessá-
rio relembrar aos que caíram novamente, que os pecados
que eles cometeram, apesar de serem terríveis e horrendos
aos olhos de Deus, não os tiram do estado de graça que já
alcançaram em Cristo. Mais uma vez exemplos como o de
Davi em seu adultério, Noé em sua bebedice, e Pedro na
sua negação são citados por Perkins como boas ferramen-
tas para o pregador se utilizar nesse trabalho.
7) Congregações com Crentes e Descrentes :142

140  BAHNSEN. Greg. Os Tradicionais Usos da Lei. Disponível em: http://www.monergismo.


com/textos/lei_evangelho/os-tres-usos-lei_banhsen.pdf. Acessado em: 27/07/2017.
141  BAHNSEN. Greg. Os Tradicionais Usos da Lei. Disponível em: http://www.monergismo.
com/textos/lei_evangelho/os-tres-usos-lei_banhsen.pdf. Acessado em: 27/07/2017.
142 Ibid.p.60,61

96
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

O autor relembra que esta é a situação mais comum nas


Igrejas. Todas os seis primeiros caminhos para aplicação
eficiente em tratar os inúmeros problemas dos ouvintes
precisam ser considerados sob a perspectiva que audiên-
cia é mista. Assim, Perkins assume que esta é uma dificul-
dade muito grande que os pregadores enfrentam sempre,
pois tem que usar tais aplicações sem separar seu público.
É possível que ao tempo em que esteja apresentando a lei
para um ímpio que nunca a ouviu e precisa ser completa-
mente convencido da maldade do seu pecado, um ouvinte
crente esteja na mesma congregação e ouça aquelas duras
palavras. É possível também que o conforto do evange-
lho esteja sendo pregado, e ímpios ouçam aquilo que pos-
sam desejar se apropriar de tais promessas que não são
próprias dos tais. Então, o puritano traz duas perguntas
extremamente complexas: Como não desesperar o que já
está abatido? Como não dar falsas esperanças àquele que
não se arrependeu? A resposta também não é simples,
mas é necessário saber a lei vai ser pregada para todos no
mesmo ambiente e os de coração duro irão ouvir sem se
arrepender. Todavia, os crentes estarão ali, serão afligidos
da sua consciência, mas ajudados ao ouvirem a voz do
evangelho aplicado especialmente aos tais.
Fica evidente que se Perkins não conseguiu reunir
todos os tipos ou categorias de ouvintes em sua explana-
ção a respeito de uma espécie de guia de aplicações, ele se
aproximou bastante disso. Levando em consideração tal
ferramenta apresentada pelo puritano, os pregadores con-

97
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

temporâneos podem utilizar-se desse diagnóstico e das


técnicas de aplicação em sermões e, com isso, desenvol-
ver no púlpito boa parte do trabalho que muitas vezes só
é feito em particular no gabinete. O púlpito fiel ao texto
e nas aplicações traz Cristo para o meio da congregação
e ele trata os ouvintes como bem afirmou Calvino “onde
quer que o evangelho seja pregado, é como se o próprio
Deus viesse para o meio de nós”143 .
A pregação que compreende seus ouvintes e conse-
gue atingir as diversas necessidades da Igreja, serve tanto
para ajudar os que já estão debaixo do aconselhamento
bíblico, como aqueles que mesmo passando por proble-
mas particulares não procuraram ainda ajuda pastoral,
seja por temor ou mesmo por achar que ainda não lhes
foi necessário. Toda essa preocupação com as aplicações
não deve ser apenas dos pregadores, mas também dos ou-
vintes que precisam estar atentos como advertiu Thomas
Watson “nossas mentes não podem deixar passar os ser-
mões como água através de uma peneira”144 . Os ouvintes,
precisam compreender que ouvir sermões é um exercício
não apenas prazeroso, mas extremamente necessário para
manter-se firme na fé, ou ainda ser reerguido, consolado e
estimulado na perseverança.
Dessa forma, toda a Congregação é beneficiada quan-
do do púlpito o pregador consegue atingir muitas deman-

143  CALVINO. João. Comentário nos Evangelhos Sinóticos. Ed. Fiel. P.14
144  BEEKE, Joel, apud WATSON, Thomas, Família na Igreja. Clire, p.26.

98
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

das dos ouvintes por meio de uma estrutura de aplicações


práticas que levem em consideração as diversas categorias
de ouvintes que ali se encontram. Apesar da eficácia dessas
aplicações depender exclusivamente da ação do Espírito
Santo que conduz o coração daqueles que estão ouvindo
a Palavra145 , ainda assim, o Ministro do Evangelho deve
ser atento e sensível as necessidades da Igreja e procurar
aplicar a pregação às muitas necessidades espirituais do
povo de Deus.
4.3 O Uso das Aplicações Mentais e Práticas no Sermão
em Auxílio ao Aconselhamento Bíblico
A Escritura trata a totalidade do ser humano como
sendo composto de corpo e alma (Gn.2:7), e esta compo-
sição deve servir ao Criador e amá-Lo de todo o coração,
entendimento e com todas as suas forças (Mt.12.28-30).
Essa expressão indica que a religião revelada por Deus
precisa envolver o ser humano por completo. Não pode
haver dissociação das partes, mas tudo que se relacionar
a adoração verdadeira, precisa necessariamente lidar com
o homem todo. Assim, a pregação bíblica não pode des-
considerar a natureza humana, conforme o Criador a es-
truturou. Portanto, o sermão deve compreender tanto em
sua explicação como nas aplicações as necessidades totais
dos homens. As aplicações precisam atingir a mente do
ser humano para transformá-la (Rm.12.1,2), e considerar
também as suas práticas. William Perkins propõe uma di-

145  Confissão de Fé de Westminster, Cap. I, Sec. V.

99
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

visão na estrutura da pregação que atente para a comple-


tude do homem. Assim, o puritano categoriza a pregação
e suas aplicações em mentais e práticas146 .
A aplicação mental concerne o uso tanto da doutrina
como da reprovação bíblica, conforme o ensino paulino
(II Tm.3.16,17). Segundo Perkins “quando envolver dou-
trina, o ensino bíblico informa à mente a fim de habilitá-la
a fazer um julgamento correto sobre o que deve ser cri-
do.”147 Já a reprovação tem outro caráter. Ela irá apresen-
tar à mente o erro e fazê-la retomar o caminho adequado
da fé. Tanto o ensino quanto a reprovação, diz Perkins,
precisa levar em consideração em primeiro lugar a com-
preensão adequada da doutrina em questão; a necessidade
da repreensão, ou seja, se aquele é um problema da con-
gregação, ou se o pregador está suscitando uma questão
que não está na ordem do dia daqueles crentes; por fim,
que a repreensão não seja feita simplesmente com base no
conteúdo bíblica, mas também de forma gentil e fraternal.
O pregador, portanto, precisa estar ciente da compreen-
são dos ouvintes, da necessidade do que está sendo falado
e considerar antes de tudo, os ouvintes como irmãos em
Cristo e repreendê-los em amor.
Já em relação ao que Perkins chama de “aplicação
prática” deve ser levado em consideração a maneira de
viver, a conduta individual dos ouvintes. Enquanto a pri-

146  Ibid. Pg.62


147  Ibid. Pg.62

100
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

meira está lidando com as aplicações mentais que devem


transformar o impulso do coração do homem, está irá li-
dar diretamente com a forma adequada de reagir a tais im-
pulsos. Para Perkins, essa aplicação prática envolve “ins-
trução e correção”148 .
A aplicação instrutiva é aquela que ensina o ouvin-
te a se relacionar adequadamente nos diversos ambien-
tes como família, Igreja e Estado. O conteúdo dessa apli-
cação prática e instrutiva é tanto encorajamento quanto
exortação (Rm.15.4). A Correção aplica a doutrina que
em primeiro lugar atingiu a mente de alguém que vive na
injustiça e impiedade, e passa a corrigir o caminho a se-
guir. Essa correção prática diz respeito à admoestação do
ouvinte por meio de uma aproximação com circunstân-
cias reais. Perkins aponta o exemplo de Natã quando por
meio de uma parábola apontou o erro de Davi e o levou
não apenas a pensar no seu pecado, como mudar de cami-
nho (II Sm.12). O próprio apóstolo Paulo também se uti-
lizou da ferramenta da aplicação prática e circunstancial
quando tratava da idolatria dos Efésios. Ele simplesmente
apresentou a doutrina a mente dos seus interlocutores, e
passou a apontar ao redor deles onde estava o erro e o
caminho para correção (At.19.26,35,37).
A aplicação prática, portanto, é extremamente espe-
cífica no apontamento dos casos envolvidos e no cami-
nho a ser seguido. Ela se torna ainda mais eficiente à me-
148  Ibid. Pg.63

101
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

dida que os ouvintes conseguem se identificar claramente


com as situações descritas. Esta é uma maneira pessoal de
aplicar o texto e falar diretamente com o público. Perkins
afirma que tal tipo de aplicação chega a ser tão direta, que
até mesmo os pregadores se sentem compelidos a serem
incluídos em tais exortações e orientações que surgem na
pregação. Isso faz com que o pregador seja cada vez mais
suave e gentil em suas palavras, pois além de falar a prega-
ção, ele próprio se envolve com o que está sendo tratado.
Essa foi uma experiência que o próprio apostolo Paulo
teve em seu ministério ( I Co.4.6), portanto é uma estrutu-
ra de aplicação bíblica que relaciona tanto a congregação
quanto o pregador na necessidade de mudança.
4.4 Exercitando a Aplicação Mental e Prática no Salmo 1
Diante das informações obtidas a respeito de como
as aplicações mentais e práticas podem lidar tanto com a
disposição do coração, quanto com correção da prática, é
possível verificar em um texto bíblico como essa estrutura
deve ser posta em prática, conforme o ensino de William
Perkins.
“Bem aventurado o homem que
não anda no conselho dos ímpios,
Não se detém no caminho dos pecadores,
Nem se assenta na roda dos escarnecedores” (Sl.1.1)

Em primeiro lugar, deve ser estabelecida a doutrina


a ser tratada, em seguida a repreensão bíblica em amor e,
por fim, a correção do caminho:

102
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

Doutrina: Autoridade das Escrituras e a sua Supre-


macia sobre a Sabedoria Humana - A necessidade de não
seguir outra Palavra que não a do Senhor.
Reprovação: Os crentes não devem dar ouvidos a
conselhos que não procedem de princípios bíblicos.
Os que ouvem a Palavra de Deus seguem seu cami-
nho, mas os que dão ouvidos aos ímpios serão seus discí-
pulos.
Haverá uma progressão no desvio dos que ouvem o
conselho de ímpios, eles começaram ouvindo e após certo
tempo, se farão um com os que escarnecem de Deus.
Correção (aplicações circunstanciais): Rejeite todo e
qualquer conselho que não tenha origem em princípios da
Palavra do Senhor.
Rejeite o conselho de amigos ímpios, ou daqueles
que mesmo afirmando serem crentes lhe trazem suges-
tões malignas. Se há problema no casamento e alguém lhe
sugere a separação, aí está um conselho ímpio. Se você
está grávida e se preocupa sobre como irá criar seu filho
já que o seu marido está passando dificuldades financeiras,
e nesse momento alguém lhe indica o aborto, aí está um
conselho ímpio.
Se alguém percebe que você está triste e lhe aconse-
lha a fazer o que você gosta, independentemente se isso
fere ou não a Palavra de Deus, aí está um conselho ímpio.

103
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

Tenha cuidado com as terapias seculares que a todo


instante trabalham para lhe convencer que as angústias do
homem são causadas simplesmente pela pressão da reli-
gião. Tais terapeutas tentam tirar o peso da culpa pelo pe-
cado negando-o, mas Cristo pode tirar esse peso por meio
da confissão de pecados e pela fé na sua obra redentiva
(Mt.11.28-30).
Tenha prazer em ouvir sermões, ler bons livros cris-
tãos, participar dos cultos dominicais e dos estudos bí-
blicos. Encha seu coração das coisas de Deus. Ouça os
conselhos do Senhor e siga o caminho seguro.

104
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

5
5 Conclusão

Mediante a pesquisa realizada foi possível observar


não somente a ligação que há entre a pregação expositiva
e o aconselhamento bíblico, como também a importân-
cia que a exposição pública da Palavra de Deus mantém
sobre o trabalho pastoral privado. Além disso, ainda se
pôde verificar que nas épocas onde a pregação expositi-
va foi enfatizada tanto na Reforma Protestante (Séc.XVI)
como no período do Puritanismo (Séc.XVII,XVIII) o
aconselhamento bíblico foi grandemente beneficiado e
desenvolvido. Por outro lado, em períodos de decadência
da pregação bíblica, como no século XIX com o libera-
lismo teológico, os gabinetes pastorais foram esvaziados,
à medida que os consultórios dos terapeutas se enchiam
cada vez mais. Diante disso, facilmente pode ser observa-
da a harmonia desses dois aspectos do ministério pastoral:
pregação pública (sermão) e privada (aconselhamento), e
como os pastores podem e devem se valer do sermão para
ajudar a resolver questões particulares da membresia nas

105
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

Igrejas locais.
A importância desse retorno às Escrituras é um pon-
to preponderante para que possamos responder as ques-
tões propostas no início do trabalho. Sem uma fonte de
autoridade confiável, não seria possível ser analisado o
assunto ora em questão. Apenas a partir da delimitação
das Sagradas Letras como fonte de autoridade para fé e
prática do homem foi possível entender como a Palavra
de Deus enxerga o homem como um todo, levando em
consideração suas diversas necessidades e tratando-as a
partir da exposição bíblica aplicativa.
A Escritura, inspirada e autoritativa, rege a vida do
ser humano, é a regra de fé e prática e portanto, deve ser
também o norte para exortações e correções na caminha-
da cristã dos homens pecadores. Assim sendo, o uso da
pregação expositiva ao lado do aconselhamento bíblico
não é algo apenas relevante, mas um caminho seguro para
pastores e Igrejas tratarem as diversas necessidade das
suas almas. Nesse caminho onde muitos podem se sentir
inseguros em algum momento, basta que sejam lembrados
também da Aliança que foi feita na cruz e como ela garan-
te a posição espiritual dos crentes (Rm.8.29-39).
Se é inevitável que sobrevenham os problemas no
meio do povo de Deus, se faz necessário que a solução
deles parta somente do uso da revelação do próprio Deus
ao seu povo. Quando os crentes buscam ao Senhor na
pregação pública e no aconselhamento particular, podem
ter certeza que serão ouvidos pelo Senhor. Mas quando
106
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

se entregam a preferências do seu coração ou aos con-


selhos ímpios daqueles sacerdotes seculares (terapeutas),
como bem observa Jay Adams, a busca por solução será
inevitavelmente infrutífera. Pascal apresenta uma imagem
aterrorizadora do homem que vive debaixo dos conselhos
de ímpios e não é regido pela Palavra de Deus para tratar
sua alma.
“Ele busca a Deus, mas se perde na criatura. Nasce filho
da casa, mas se alimenta dos sabugos dos porcos numa
terra distante. Ele deixa a fonte de águas vivas por cister-
nas rotas que não retêm água (Jr 2.13). Ele é como um
homem faminto que sonha que está comendo e quando
acorda vê que sua alma está vazia; como um homem se-
dento que sonha que está bebendo e quando acorda vê que
está débil e sua alma ainda mantém o apetite (Is 29.8)149 .

Os crentes, porém ouvem o Senhor e não se estri-


bam na sua própria sabedoria (Pv.3.5), eles amam a Lei do
Senhor e preferem meditar nela em pública e em parti-
cular, todo o tempo (Sl.1.2), estão prontos para se curvar
as doutrinas bíblicas e rejeitam as sugestões de Satanás.
Brian Chappel resume o poder da Palavra na Pregação e
sua ação na vida prática do crente da seguinte maneira:
“Assim não é algo meramente prosaico insistir que o prega-
dor servir ao texto, pois se a Palavra é a presença mediadora
de Cristo, o serviço é devido. Paulo instrui corretamente o
jovem Timóteo a ser um obreiro que maneja bem a palavra
da verdade (II Tm.2.15), pois a Palavra de Deus é “viva e efi-
caz” (Hb.4.12). A verdade da Escritura não é objeto passivo
para nossa investigação e apresentação. A Palavra nos exa-
mina. Ela é apta para discernir pensamentos e propósitos do
coração (Hb.4.12b). Cristo permanece ativo em sua Palavra
levando a efeito tarefas divinas que o apresentador da Pala-

149  PASCAL, Blaise. Pensées and Other Writings - Oxford World’s Classics. Oxford: Oxford
University Press, 1999, p. 12.
107
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

vra não tem o direito ou a capacidade pessoal de assumir.”150

Conclui então, que o poder da pregação do evangelho


publicamente transcende o momento em que a pregação
está sendo ministrada e acompanha os ouvintes por toda
semana. O sermão do Domingo faz com que os crentes
meditem em suas ações, revejam suas prioridades diárias,
exercitem melhor sua fé e mudem o caminho que têm
seguido. Leland Ryken assevera que Richard Baxter abria
sua casa as quintas feiras à noite como “uma terapia de
grupo”. O grupo reunia-se para “repetir” o sermão do
Domingo anterior.151 O aconselhamento bíblico, então,
deixa de ser visto como um aspecto isolado do trabalho
pastoral, ou ainda, como trabalho de um terceiro ofício na
Igreja (além de presbíteros e diáconos) e passa a ser en-
xergado como um trabalho pastoral integrado. O Ministro
da Palavra é o conselheiro mais habilitado da Igreja, sem
desconsiderar o aspecto do aconselhamento mutuo en-
tre os irmãos (Cl.3.16), mas somente ele tem os recursos
completos para o desempenho do aconselhamento bíbli-
co como um sistema de ensino e correção de vida.
O trabalho pastoral envolve o aconselhamento e este
começa no púlpito, passa pela vida comunitária de visita-
ção e convivência e desemboca no gabinete para que os
casos específicos sejam tratados. O púlpito, portanto, é o
princípio de todo o trabalho de aconselhamento na Igre-
ja. De lá os crentes aprendem as doutrinas que irão reger

150  CHAPELL, Brian. Pregação Cristocêntrica. O Poder da Palavra. Disponível em: http://
www.monergismo.com/textos/pregação/poder_palavra_chapell.html. Acessado em: 11/08/2017
151  RYKEN. Leland. Santos no Mundo. Ed. Fiel. pg.167.
108
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

suas vidas. De lá também flui o caminho que os leva para


mais perto do céu ou do inferno, como afirma Ryken152
. Dessa forma, o ministro da Palavra tem uma enorme
responsabilidade em conhecer muito bem a sua congrega-
ção para perceber exatamente quais são suas necessidades.
Isso não deve o levar a pregar sermões direcionados a
determinados problemas particulares, pois como foi vis-
to durante este trabalho, esse é papel do aconselhamen-
to particular, mas ao conhecer sua congregação, ele terá
maior capacidade de aplicar os textos à vivência diária dos
crentes aos quais pastoreia, e assim, tratar muitos casos
sem a necessidade de levá-los ao Gabinete Pastoral. Como
bem afirma Perkins, todo Ministro é um duplo intérpre-
te - o intérprete de Deus para as pessoas ao pregar para
elas, e o intérprete das pessoas para Deus, expondo em
aberto suas vontades, confessando seus pecados, rogando
perdão153 .
Nenhum método, porém, pode ser supervaloriza-
do acima do poder que o evangelho tem em si próprio.
O poder da pregação e seu auxílio como ferramenta do
aconselhamento só tem efeito efetivo por meio da ação
do Espírito Santo. A Pregação fiel da Palavra de Deus é
a Palavra de Deus e é exatamente nisso que se deve espe-
rar resultados. Aqueles que intentam trabalhar no aconse-
lhamento pastoral precisam estar cientes disso. Nenhum
método ou estratégia será eficaz caso o próprio Deus não
opere na vida do aconselhado, como sabiamente assevera

152  Ibid. p.163.


153  PERKINS, William. The Calling Of The Ministry, Pg.74.
109
JOSÉ AUGUSTO BRAYNER NETO

Jay Adams:
“Na prática do aconselhamento se faz mister a autoridade di-
vina. Somente o aconselhamento bíblico se reveste dessa au-
toridade. O conselheiro, por ser homem que Deus mandou
consagrar, exercita a plena autoridade de aconselhamento que
foi outorgada por Cristo à Igreja organizada (I Ts. 5:12-13).

110
A PREGAÇÃO EXPOSITIVA COMO FERRAMENTA DO ACONSELHAMENTO BÍBLICO

6
6 Bibliografia

ADAMS, Betty Jane. Entrevista a David Powlison. In: MacARTHUR


JR., John F; MACK, Wayne. Introdução ao Aconselhamento Bíblico:
um guia básico de princípios e práticas de aconselhamento. São Paulo:
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