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CARDEAL, André Morato. A Questão Do Livre Comércio
CARDEAL, André Morato. A Questão Do Livre Comércio
Ao fazer uma análise sobre o “discurso” dos livre-cambistas, Marx8, defende a idéia de que
se pode identificar em seus argumentos algo que se assemelharia ao que conhecemos como a
justificativa do consumo de massas: “(...) el bajo precio de las mercancías incrementará el
consumo; el mayor consumo fomentará una demanda mayor de fuerzas de trabajo, y a esta
demanda mayor de fuerzas de trabajo, seguirá el alza de los salarios”. O livre-câmbio favorece a
ampliação das forças produtivas, efetuando um raciocínio simples de aumento da produção e da
rentabilidade, o que seria automaticamente transferido para os salários. Isto ocorreria da seguinte
forma:
5
Para uma explicitação deste debate ver: Paulo Balanço, Eduardo Costa Pinto e Ana Maria Milani, “Crise e
globalização no capitalismo contemporâneo: alguns aspectos do debate em torno dos conceitos de Estado-nação,
Império e Imperialismo”. IX Encontro Nacional de Economia Política, Uberlândia, Anais, 8 a 11 de junho de 2004, p. 7.
6
Para esta discussão de modo mais detalhado ver: André Morato Dias Cardeal, “O século XXI e o capitalismo”. X
Encontro Nacional de Economia Política, Campinas, Anais, 24 a 27 de maio de 2005, p. 174-198.
7
Marx, op. cit., p. 548.
8
Idem, ibidem, p. 548.
3
(...) el capital productivo incrementa la demanda de trabajo, aumentará también el precio,
y, en consecuencia, el salario. La condición más favorable para el obrero es el incremento de
capital. Hay que reconocer esto. Si el capital permanece estacionario, la industria no se
estacionará, sino que retrocederá, y la primera víctima de ello, será el trabajador. Este
sucumbirá antes que el capitalista.9
Esta análise pressupõe uma redução nos salários, seguida de uma redução nos custos e,
portanto, nos preços das mercadorias, o que resultaria na ampliação da produção e das vendas e, em
conseqüência, dos salários. Entretanto, não é tão simples, pois esta transferência de uma parcela da
ampliação dos lucros para os salários não ocorre. Nas últimas décadas temos verificado no Brasil
grandes aumentos de produtividade e mesmo crescimento em alguns setores, o que contrasta com
uma compressão dos salários. Ao se considerar o caso dito mais favorável ao trabalhador, para
Marx, mesmo esta situação não garante melhores condições, pois na medida que temos um
incremento no capital produtivo, ele traz consigo, uma ampliação da acumulação e da concentração
do capital. Ocorreria, portanto, uma maior centralização dos capitais, como resultado de uma maior
divisão do trabalho e de um maior emprego de maquinaria. Também pode-se verificar que, com o
acirramento da divisão do trabalho, acaba-se substituindo a capacidade e os conhecimentos
individuais do trabalhador por processos semi-automáticos, possíveis de serem executados com
maior facilidade, resultando numa ampliação da concorrência entre os trabalhadores, intensificada
na medida que um trabalhador passa a poder sozinho executar o trabalho de vários.
El incremento de capital productivo obliga al capitalista industrial a trabajar con medios
sin cesar crecientes, arruinando con ello a los pequeños industriales y lanzándolos a las filas
del proletariado. Además, como el tipo de interés desciende en la medida en que se acumulan
los capitales, los pequeños rentistas que no pueden seguir viviendo de sus rentas se ven
también obligados a recurrir a la industria, engrosando con ello el número de los proletarios.
Por último, cuanto más crece el capital productivo más obligado se ve a producir para un
mercado cuyas necesidades desconoce. Tanto más precede la producción a la necesidad, tanto
más trata la oferta de imponer la demanda y se hacen más intensas y más repentinas las crisis.
Y cada crisis acelera a su vez la centralización de los capitales y aumenta el proletariado.10
Esta ampliação no capital produtivo necessário provoca uma ampliação em maior escala da
concorrência, inclusive fazendo com que pequenos capitalistas sejam obrigados a integrar as fileiras
do proletariado, devido aos altos montantes de capital exigidos restringirem cada vez mais a própria
classe capitalista. O movimento verificado e apontado por Marx é que os pequenos capitalistas são
muitas vezes obrigados a integrar a classe trabalhadora, fazendo com que a remuneração do
trabalho diminua para todos e a carga de trabalho aumente para alguns, juntamente com a ampliação
do exército industrial de reserva.
Ao analisar qual influência exerceria sobre a classe trabalhadora a implantação do livre-
câmbio, Marx11, aponta para uma reflexão importante, que é o fato de que “todas las leyes
9
Idem, ibidem, p. 548-549. Esta citação se refere a forma como Marx analisa o discurso de um defensor do livre-
comércio, e não a forma como interpreta esta relação de coisas.
10
Idem, ibidem, p. 549.
11
Idem, ibidem, p. 551.
4
formuladas por los economistas desde Quesnay hasta Ricardo” utilizam o livre-comércio enquanto
premissa em seus modelos. A partir daí pode-se concluir que estas leis se fortaleceriam com a
implantação do livre-comércio, sendo que para ele, a primeira delas é que a concorrência reduz o
preço de todas as mercadorias ao seu custo mínimo de produção12. De acordo com esta lei, o salário
mínimo seria o preço natural do trabalho, ou seja, o salário natural seria aquele estritamente
necessário para o sustento do trabalhador e para manter suas condições de vida. É importante
também sempre observar que, em diversos momentos, o capitalismo se apresenta de tal maneira que
mesmo os meios mínimos para garantir as condições de vida são reduzidos cada vez mais13.
Vale ressaltar que estas condições reafirmam o que Marx14 chamou de lei geral da
acumulação capitalista. Através dela Marx nos mostra que a dinâmica fundamental da economia
capitalista atua de maneira contraditória: ao passo que cresce a riqueza social, o capital em
funcionamento, a grandeza absoluta do proletariado e a força produtiva de seu trabalho, cresce
também o exército industrial de reserva. Ou seja, a “evolução” de uma sociedade capitalista
significa, de um lado, a prosperidade de poucos, estes sendo cada vez mais reduzidos, e de outro, a
superexploração da crescente maioria.
Marx afirma que a implantação do livre-câmbio daria apenas mais liberdade ao capital,
fazendo com que este tivesse ainda mais condições para explorar a classe trabalhadora livremente,
além de se apropriar de riquezas de outros países menos desenvolvidos. Desta forma, ter-se-ia uma
maior transparência na forma real dos conflitos de classe.
Mientras mantengáis en pie la relación entre el trabajo asalariado y el capital, aunque el
cambio de mercancías se lleve a cabo bajo las condiciones más favorables, habrá siempre una
clase explotadora y otra explotada. Le resulta a uno realmente difícil llegar a comprender la
arrogancia de los librecambistas, quienes se imaginan que el empleo más ventajoso del capital
hará desaparecer el antagonismo entre el capitalista industrial y el trabajador asalariado. Muy
por el contrario. La única consecuencia de ello será que el antagonismo entre estas dos clases
se pondrá de manifiesto todavía más claramente.15
A discussão do livre-comércio nos leva também para uma outra discussão importante, a
questão da divisão internacional do trabalho e da especialização produtiva, pois os livre-cambistas e
os adeptos das teorias de vantagens comparativas apregoam que o melhor para um país é se
especializar naquilo que teoricamente teria vantagens naturais. Isso implicaria, por exemplo, o
Brasil concentrar sua produção em produtos agrícolas e produtos intensivos em mão-de-obra,
fatores que possui em abundância. Entretanto não podemos esquecer que estas “vantagens” são em
12
“Si, en vez de cosechar el trigo en nuestro país (…), descubriésemos un nuevo mercado en que pudiéramos adquirirlo
a precio más barato, ello haría bajar los salarios y aumentaría las ganancias (…). La baja de precio de los productos
agrícolas no reduce solamente los trabajadores ocupados en la agricultura, sino también los de cuantos trabajan en la
industria o en el comercio” (David Ricardo, Des principes de l’économie politique et de l’impôt. Paris, 1835, p. 178, In:
Marx, op. cit., p. 547).
13
“Pero no es esto todo; los progresos de la industria suministran medios de sustento menos costosos. Así, vemos, que
el aguardiente sustituye a la cerveza, el algodón a la lana y el lino y las patatas al pan” (Marx, op. cit., p. 552).
14
Karl Marx, O Capital: crítica da economia política. São Paulo, Nova Cultural, 1988, v. II, p. 187-258.
15
Marx, Discurso Sobre El Problema Del Librecambio, cit, p. 552.
5
parte construídas historicamente, ou seja, o que determina se um país é detentor de altas tecnologias
ou se é apenas intensivo em mão-de-obra não é uma pré-destinação natural, mas sim um processo
construído historicamente. Além disso, a especialização não permite aos países competirem de
maneira igualitária no mercado mundial16, pois ramos industriais diferentes não têm a mesma
capacidade competitiva, existindo, conforme aponta Marx, a supremacia de alguns sobre os demais.
É importante dar atenção também ao fato de que a concorrência internacional se dá
substancialmente entre indústrias e não entre países.
Se nos dice, por ejemplo, que el librecambio hará nacer una división del trabajo
internacional y mostrará con ello a todos los países el camino de una producción que se
armonice con sus ventajas naturales. (…) Hay una circunstancia que, a este propósito, no
debemos perder nunca de vista: la de que, al convertirse todo en monopolio, existen también
hoy algunas ramas industriales que dominan a todas las demás y que, preferentemente,
aseguran a los pueblos activos la dominación sobre el mercado mundial. (…) Es
verdaderamente ridículo que los librecambistas señalen dos o tres especialidades en cada rama
industrial para lanzarlas a la balanza contra los productos de uso cotidiano cuya producción
resulta más barata en los países donde la industria se halla más desarrollada.17
Há ainda uma outra questão que não deve ser ignorada ao se analisar as relações econômicas
internacionais, principalmente quando se refere à divisão internacional do trabalho e a
especialização produtiva: não se pode perder de vista que a economia mundial não é formada por
agentes iguais, com a mesma capacidade de interação, de negociação. O que acaba ocorrendo então,
é a mistificação do real objetivo que está por trás dos Estados Nacionais, o de representar os
interesses das classes dominantes, de servir enquanto seus porta-vozes. Romo destaca que o Estado
Nacional representa portanto um papel importante inclusive nas relações entre firmas no mercado
mundial:
(…) la internacionalización del capital entra en contradicción con la existencia de Estados
nacionales, que las burguesías necesitan para luchar contra las clases obreras. El capital
monopolista se vale del Estado para evitar las consecuencias del carácter contradictorio de su
acumulación. Cada Estado apoya necesariamente unos capitales contra los demás, y pone sus
poderosos medios al servicio de la lucha por la ganancia. ‘Las instituciones o los aparatos –
señala Poulantzas – no poseen poder propio, y no hacen sino expresar y cristalizar poderes de
clase’. En estas circunstancias, es imposible hablar de capital como de algo cualitativamente
homogéneo: su fuerza y su rentabilidad no sólo son función de su tamaño sino de otras
características específicas, entre las cuales está la nacionalidad, que desempeña un papel muy
importante. Incluso si la reproducción social de las relaciones sociales de producción es aún el
Estado nacional, cuadro ideológico y político indispensable para la organización de las
relaciones sociales.18
16
“Si los librecambistas son incapaces de comprender cómo puede un país enriquecerse a costa de otro, no
necesitamos asombrarnos de que los mismos señores comprendan todavía menos que, dentro de un país, una clase se
enriquezca a costa de otra” (Idem, ibidem, p. 554).
17
Idem, ibidem, p. 553-554.
18
Héctor Guillén Romo, Lecciones de Economía Marxista. México, Fondo de Cultura Económica, 1988, p. 384-385.
6
imperialismo, que cada vez mais exacerbadamente, busca conquistar esferas mais lucrativas para a
inversão de seus capitais, o que se manifesta na incansável defesa da livre mobilidade de capitais e
do livre-comércio19. Esta movimentação internacional de capitais deve ser analisada à luz da lei
geral do sistema capitalista, a lei da queda tendencial da taxa de lucro, que faz com que esta busca
de vantagens, de esferas para garantir a rentabilidade, se torne fundamental para a manutenção do
próprio capitalismo20.
Por conseqüência da necessidade da busca de rentabilidade, verifica-se que a atuação dos
países centrais do sistema do capital é incisiva quando se trata de defender os interesses de
liberalização do capital (dar-lhe melhores condições para a exploração). É importante observar-se
também que estes movimentos de defesa da liberalização das economias não vem sendo reservados
exclusivamente à potência hegemônica internacional, mas a todo o centro do sistema do capital.
Segundo Chesnais21, é nos Estados Unidos que se vê uma adequação, mais perfeita do que em
qualquer outro grande governo “civilizado”, do sistema político e da filosofia social em relação às
necessidades de uma valorização do capital livre de qualquer freio. Foram eles que tomaram a
iniciativa, mais do que outros países, de publicar em editais, antes de tudo, as políticas de ajuste
estrutural e mais tarde de liberalização e desregulamentação financeira e comercial, pois estas
políticas são aquelas que melhor correspondem tanto a seus interesses de grande potência, quanto
àqueles de seus lobbies. Os governos de todos os países onde o capital financeiro é desenvolvido
estão comprometidos com a ordem mundial liberalizada. Todas as iniciativas que os Estados Unidos
tomaram no FMI, no Banco Mundial, na OCDE22, no GATT23 e, mais tarde, na Organização
19
“Así, pues, la conquista del mercado mundial por la industria capitalista no se realiza por medios puramente
económicos. La presión y la fuerza política y militar han jugado aquí un papel importante, cuando no decisivo. Las
condiciones de desigualdad política, los desiguales tratados impuestos a China, a India, permitieron a Gran Bretaña
conquistar el mercado mundial y lograr un monopolio de productividad. Una vez concluida esta conquista, la
proclamación del dogma universal del libre cambio, que se volvió a imponer por la fuerza a las antiguas víctimas, se
convirtió en el arma esencial de Gran Bretaña (y, en cierta medida, de Francia, Bélgica, los Países Bajos, etc.), para
destruir la industria que existía en los países asiáticos, y para frenar su industrialización durante medio siglo” (Ernest
Mandel, Tratado de economia marxista. México, Editora Era, 1969, p. 258).
20
“Com sua importância e suas proporções atuais, a exportação de capitais é, pois, provocada, como se vê, pelas
particularidades da evolução econômica dos últimos anos. Se a examinarmos do ponto de vista da expansão das
formas de organização do capitalismo moderno, ela é apenas a conquista e a monopolização de novas esferas de
investimento de capital pelos monopólios de uma grande potência, ou, então – se se toma o processo em seu conjunto –
por uma indústria nacional organizada ou ainda por um capital financeiro nacional. A exportação de capital constitui
o método mais cômodo de aplicação da política econômica dos grupos financeiros que, com a maior facilidade,
colocam sob sua dependência novas regiões. Eis por que o agravamento da concorrência entre os diversos Estados
aparece, nesse quadro, com relevo particular” (Nikolai Ivanivitch Bukharin, A Economia Mundial e o Imperialismo.
São Paulo, Abril Cultural, 1984, p. 93).
21
François Chesnais, “Mundialização: o capital financeiro no comando”. Revista Outubro, n° 05, 2001, p. 15-16.
22
A Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) sucedeu à Organização Européia de
Cooperação Econômica, que foi criada para administrar a ajuda dos Estados Unidos e do Canadá, no quadro do Plano
Marshall, ao processo de reconstrução européia que se seguiu à 2ª Guerra Mundial. Desde que iniciou a sua atividade,
em 1961, a OCDE, que conta hoje com 30 países membros, tem por missão reforçar a economia dos países membros,
melhorar a sua eficácia, promover a economia de mercado, desenvolver um sistema de trocas livres e contribuir para o
desenvolvimento e industrialização dos países.
23
Acordo Geral sobre Tarifas de Comércio (GATT), mais tarde foi substituído pela Organização Mundial do Comércio
(OMC).
7
Mundial do Comércio (OMC), foram apoiadas e aplicadas na Europa pelo Reino Unido e setores
importantes da União Européia. Ultimamente, não é dos Estados Unidos que veio o projeto da
‘Rodada do Milênio’ na OMC, mas da União Européia. Deve-se destacar também que foram, antes
de tudo, setores antagônicos da sociedade americana que atacaram frontalmente a OMC em Seattle.
É por isso que se deve considerar que: “A mundialização contemporânea não é ‘americana’. Ela é
capitalista e é como tal que ela deve ser combatida”24.
Mas, em conflito com estas tendências, as regulamentações defendidas e efetuadas pelos
organismos multilaterais e os tratados de comércio em nível mundial, observa-se que discurso e
prática estão distanciados nas grandes potências internacionais. Ao mesmo tempo em que se
negocia abertura comercial na ALCA, os EUA apresentam dificuldades internamente, inclusive
dentro do próprio Congresso, para aprovar medidas de liberalização. O mesmo ocorre, por exemplo,
com respeito ao corte de subsídios para os produtos agrícolas na União Européia. A partir daí fica
ainda mais claro qual é o real objetivo dos acordos de livre-comércio, o intuito de garantir áreas de
exploração privilegiada para as grandes potências, ou seja, tentativa de garantir esferas para
exportação de mercadorias e capitais que garantam a lucratividade dos grandes trustes, fundos e
grupos financeiros destes países. O fato marcante é a tentativa de embasar a defesa deste tipo de
prática na total mistificação da suas reais conseqüências, como se pode verificar nos relatórios
oficiais das rodadas de negociação para a implementação da ALCA25. Estas conseqüências podem
ser graves, como se percebe ao analisar a economia mexicana depois da implementação do NAFTA,
onde as promessas foram revertidas em uma piora considerável nas condições econômicas do país26.
Esta defesa da liberalização comercial, feita e não cumprida pelos países imperialistas,
ocorre porque até certo ponto as barreiras protecionistas acabam atuando na defesa dos interesses
dos capitais nacionais, pois se contrapõe, em parte, à transferência de valor para o país que tem
maior produtividade27. Essa contraposição se dá pelo fato de que o país fica menos exposto à
24
Chesnais, op. cit., p. 16.
25
“O livre comércio e uma maior integração econômica são fatores essenciais para o desenvolvimento sustentável.
Nesse contexto, novos avanços serão obtidos à medida que nos empenharmos em fazer a liberalização do comércio e as
políticas ambientais se apoiarem mutuamente, levando em consideração os esforços do GATT/OMC e de outras
organizações internacionais. À medida que prosseguir a integração econômica no Hemisfério, estaremos assegurando,
de forma crescente, a observância e promoção dos direitos do trabalhador, conforme definidos pelas convenções
internacionais pertinentes” (I Cúpula das Américas, “Plano de Ação”. Miami, dezembro de 1994. Disponível em:
http://www.ftaa.com.br).
26
Para maiores detalhes ver Borges (Altamiro Borges, “A trágica experiência do Nafta”. 2003, Disponível em:
http://resistir.info/brasil/alca_nafta.html): “Nos anos 70, antes da implantação do acordo (NAFTA), a economia
mexicana crescia, em média, 6,6% ao ano. Já nos anos 90, o crescimento despencou para 3,3%. Agora, com a
travagem da economia americana, a situação degringolou de vez. ‘O México entrou em recessão no ano passado. Seu
déficit na balança comercial saltou quase 22% e suas exportações encolheram 5%. De resto, perdeu receita com a
queda do preço do petróleo, produto que gera um terço do seu rendimento’. A previsão do governo é que a economia
cresça apenas 1,7% em 2002”.
27
“Por lo demás, el sistema proteccionista no es más que un medio para fomentar en un país la gran industria, es
decir, para hacerlo depender del mercado mundial; y, a partir del momento en que se depende del mercado mundial, se
depende en mayor o menor medida del librecambio. Además, el sistema proteccionista desarrolla la libre competencia
8
economia mundial, podendo direcionar esforços para o desenvolvimento de seu mercado interno, na
medida em que as barreiras são voltadas para a proteção de determinado conjunto de indústrias
nacionais. O que ocorre, portanto, é que este livre-comércio significa a derrubada destas barreiras
protetoras nos países mais fracos e sua manutenção, mesmo que em partes ou de forma modificada,
nos países centrais.
Sabe-se que os cartéis tiveram como conseqüência a criação de tarifas protecionistas de
um tipo novo, e original: como já notava Engels, no Livro III, de O Capital,28 protegendo-se
precisamente os produtos suscetíveis de serem exportados. Também sabemos que os cartéis e
o capital financeiro dispõem de um sistema que lhes é próprio – o ‘da exportação a preço vil’,
o do ‘dumping’ (...) Se a Alemanha aumenta o seu comércio com as colônias inglesas mais
rapidamente do que a própria Inglaterra isso apenas prova uma coisa: que o imperialismo
alemão é mais forte, melhor organizado do que o imperialismo inglês, que lhe é superior; mas
isso, não prova, de forma alguma, a ‘supremacia’ do comércio livre. E isto porque esta luta
não opõe o comércio livre ao protecionismo, à dependência colonial, mas opõe entre si dois
imperialismos rivais, dois monopólios, dois grupos de capital financeiro. A supremacia do
imperialismo alemão sobre o imperialismo inglês é mais forte do que a muralha das fronteiras
coloniais ou a das tarifas aduaneiras protetoras; tirar daí argumentos a favor da liberdade do
comércio e da ‘democracia pacífica’ é divulgar asneiras, é esquecer os traços e os caracteres
essenciais do imperialismo, é substituir o marxismo pelo reformismo pequeno-burguês.29
dentro de país. Por eso vemos que en aquellos países en que la burguesía comienza a abrirse camino como clase, por
ejemplo en Alemania, hace grandes esfuerzos por obtener aranceles protectores. Estas son para ella las armas contra
el feudalismo y el Estado absoluto, representan para ella el medio de concentrar sus fuerzas y realizar el librecambio
dentro del país” (Marx, Discurso Sobre El Problema Del Librecambio, cit, p. 554).
28
Para esta mesma discussão ver também: Bukharin, op. cit., capítulo IV.
29
Lênin, op. cit., p. 113. Da mesma forma o inverso é considerado verdade, na afirmação de Hilferding, pois nem livre-
comércio, nem protecionismo resolveriam os problemas da classe trabalhadora: “se o capital não pode desenvolver
outra política que a imperialista, então o proletariado não pode contrapor à imperialista uma política que foi a do
tempo da hegemonia do capital industrial; não é próprio do proletariado opor a política capitalista mais avançada a
política ultrapassada da era do livre-comércio e da hostilidade estatal. A resposta do proletariado à política
econômica do capital financeiro – o imperialismo - não pode ser o livre-comércio; só pode ser o socialismo” (Rudolf
Hilferding, O Capital Financeiro. São Paulo, Nova Cultural, 1985, p. 343).
30
Marx nos elucida que o fim das tarifas de proteção e das barreiras comerciais, o desaparecimento das circunstancias
secundarias que hoje mascaram as verdadeiras causas para a situação miserável em que se encontram os trabalhadores,
o trabalhador verá então que o capital liberto de suas “travas” não o fará menos escravo que aquele que está sujeito a
medidas protecionistas. “Pero, en general, el sistema proteccionista es hoy un sistema conservador, mientras que el
sistema librecambista actúa destructivamente. Desintegra las nacionalidades anteriores y hace culminar el
antagonismo entre el proletariado y la burguesía. En una palabra, el sistema de la libertad de comercio, acelera la
9
abertura comercial é uma questão que não responde aos problemas da classe trabalhadora, embora
atue, ao dar maior liberdade ao capital, no sentido de explicitar as contradições inerentes ao próprio
modo de funcionamento do sistema capitalista. Age então clarificando que o responsável pelas
mazelas sociais não é um modo específico de gestão do capital historicamente determinado (como o
neoliberalismo ou o Estado do Bem Estar Social), mas sim o próprio sistema do capital, em
consonância com o fato de que o modo específico de gestão do sistema relaciona-se com as
condições históricas de cada período, e com a maior ou menor necessidade de ofensiva do capital
sobre as forças produtivas, os trabalhadores.
Ao se compreender que o neoliberalismo não é diferente do próprio capitalismo, mas
simplesmente a forma como este se apresenta na atual conjuntura, e que o imperialismo ao se
encontrar caracterizado enquanto “Imperialismo Senil”32 já responde por tamanha exploração da
classe trabalhadora, manifesta em ofensivas aos direitos trabalhistas, previdenciários, compressão
salarial e altíssimos níveis de desemprego, que caberiam algumas ponderações a este argumento,
pois dar ainda mais liberdade ao capital significaria uma aceleração na destruição da própria classe
trabalhadora, principalmente nos países subdesenvolvidos. É sob esta perspectiva que se justifica a
atuação dos movimentos políticos e sociais representativos da classe trabalhadora, que em todo
continente americano, e não só nele, mantém sua organização de forma a combater a
implementação da ALCA e também de modo a combater as normas impostas principalmente pela
OMC e pelo FMI.
revolución social. Solamente en este sentido revolucionario emito yo, señores, mi voto a favor del librecambio” (Marx,
Discurso Sobre El Problema Del Librecambio, cit, p. 554).
31
“El problema del librecambio y la protección arancelaria se mueve todo él dentro de los límites del actual sistema de
producción capitalista, razón por la cual no tiene interés directo para los socialistas, que reclaman la abolición de este
sistema. Pero sí les interesa indirectamente, en el sentido de que desean asegurar al sistema de producción actual la
mayor libertad de desarrollo posible y la más rápida expansión, ya que con ello se desplegarán también sus necesarias
consecuencias económicas: la miseria de la gran masa del pueblo como consecuencia de la superproducción, que
provoca crisis periódicas o estancamientos crónicos del intercambio; la escisión de la sociedad en una pequeña clase
de grandes capitalistas y un gran clase de esclavos asalariados que realmente van transmitiéndose por herencia, de
proletarios cuyo número aumenta sin cesar, en tanto que va dejándolos sin trabajo, constantemente, la nueva
maquinaria que desplaza al trabajador; en una palabra, la entrada de la sociedad en un callejón sin salida, del que no
hay escape fuera de la total transformación de la estructura económica que sirve de base a la sociedad” (Engels, op.
cit., p. 567-568).
32
Com relação a esta discussão sobre o imperialismo e atual fase do capitalismo, destacamos o conceito de Gluckstein,
que chama a atual fase de “Imperialismo Senil”. Para ele esta nova face assumida pelo imperialismo seria caracterizada
pela tendência mundial de financeirização da riqueza e dos fluxos de capital, o que força os capitalistas na tentativa de
defender a sua taxa de lucro, a única alternativa de “destruir as forças produtivas, destruir as fábricas, destruir a força
de trabalho viva, que está dentro das fábricas, é por isso que está sendo organizada a desertificação industrial da
França, é por isso também que destroem a força de trabalho humana, por exemplo, organizando a ofensiva contra o
‘custo do trabalho’. (...) É isto que faz com que o que era parcialmente progressista, no capitalismo ascendente, ceda
lugar hoje a um sistema que de nenhuma maneira apresenta qualquer traço progressista e que, sob todas as formas,
procure preservar o lugar da classe capitalista sob a forma de destruição da classe operária, de suas conquistas
[como, por exemplo, aqui no Brasil mais recentemente os ataques ao sistema previdenciário] e de suas organizações
[poderíamos citar a necessidade de destruir/cooptar os partidos dos trabalhadores, o que vem se concretizando de forma
acelerada no Brasil, com o PT]” (Daniel Gluckstein, O Imperialismo Senil. São Paulo, Comissão de Formação de O
Trabalho, 1995, p. 135).