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2 O ADVOGADO E A PSICOLOGIA JURÍDICA

Dentre os vários ramos da Psicologia, a Psicologia Jurídica é uma


especialidade que estabelece um elemento conectivo entre Direito e Psicologia,
sendo, então, de grande valia, como coadjuvante ao Direito, de variadas formas e
possibilidades, conforme relata Jesus (2001, p.34):

A Psicologia Jurídica é fundamentada como uma especialidade que


desenvolve um grande e específico campo de relações entre os
mundos do Direito e da Psicologia, nos aspectos teóricos,
explicativos e de pesquisa, como também na aplicação, na avaliação
e no tratamento.

Apesar da Psicologia jurídica aproximar o Direito e a Psicologia, no


momento em que busca compreender e atuar na mitigação de conflitos, nota-se que
há substanciais diferenças entre as duas disciplinas, como nos traz Silva (2014, p.7):

A Psicologia e o Direito são áreas do conhecimento científico


voltadas para a compreensão do comportamento humano. Porém,
diferem quanto ao objetivo formal: a Psicologia volta-se ao mundo do
ser, e tem como seu ponto de análise os processos psíquicos
conscientes e inconscientes, individuais e sociais que governam a
conduta humana; o Direito, por sua vez, volta-se ao mundo do dever
ser, e supõe a regulamentação e legislação do trabalho
interdisciplinar entre médicos, advogados, psiquiatras e psicólogos
forenses.

Ou seja, cada qual com sua especificidade bem definida, em seus


campos de atuação, tornando-se claro que as duas ciências se complementam,
fornecendo cada uma delas subsídios próprios para que se consiga alcançar uma
composição satisfatória, como se vê em Souza (2014, sn)1

1
Disponívelem:http://www.notariado.org.br/index.php?
pG=X19leGliZV9ub3RpY2lhcw==&in=NDY4Mg==&filtro=1&Data=. Acesso em 29 mar. 2017.
Em um contexto judicial, o objetivo é verificar e determinar se os
fatos realmente ocorreram. Possibilitando a responsabilização, a
proteção da sociedade e garantindo os direitos. Em um contexto
clínico, o psicólogo deve observar os sintomas com o intuito principal
de intervir e auxiliar o sujeito a lidar com esses sintomas. No âmbito
social o psicólogo ajuda o sujeito a lidar com o ocorrido, orienta e
auxilia na utilização dos recursos e meios necessários a esse fim,
atuando na segurança pública, inclui, também, o sistema jurídico.

Ressalvada a importância da Psicologia Jurídica, juntamente com seu


conceito, principais características e áreas de atuação, faz-se mister um maior
detalhamento quanto às funções e deveres do advogado, para que se possa realizar
uma conexão entre ambos e ressaltar a relevância da atuação conjunta na solução
de conflitos que derivem do direito sucessório.

Percebe-se que o profissional do Direito que possui um papel


preponderante no que tange à resolução de conflitos na sociedade moderna, pois,
conhecedor das leis, é quem deve buscar soluções, podendo utilizar-se de todos os
recursos legais para alcançar sua pretensão, conforme se aduz na Constituição
Federal de 1988, em seu art. 133: “O advogado é indispensável à administração da
justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão,
nos limites da lei”. Ou ainda pode buscar nas vias extrajudiciais soluções para
dirimir tais embates, quando necessário.

Também há que se atentar para sua função social, disposta


expressamente no Estatuto da Advocacia e da OAB, que em seu art.2°, § 1°assim
pronuncia: “No seu ministério privado, o advogado presta serviço público e exerce
função social”. Logo, é possível , mais uma vez , observar a relevância do exercício
da advocacia na sociedade.

Um dos requisitos necessários ao Advogado quando da sua convivência


social, trata-se de apresentar no seu cotidiano uma postura equilibrada, marcada
por posições ponderadas, corretas e assertivas, conforme se vê no Código e
disciplina da OAB, que relata ao tratar das regras deontológicas fundamentais, em
seu art. 2°: ”O advogado, indispensável à administração da justiça, é defensor do
Estado democrático de direito, da cidadania, da moralidade pública, da justiça e da
paz social, subordinando a atividade do seu Ministério Privado à elevada função
pública que exerce”.

Isso posto, pode-se delinear mais precisamente como deve se situar o


advogado socialmente e no seu ambiente de trabalho, e tal fato é relevante na
relação com o cliente quanto à confiança que deve ser estabelecida entre ambos, ao
se adentrar a seara do Direito das Sucessões; porém, podem haver outras partes
interessadas , as quais podem dificultar muito, a célere e satisfatória resolução da
causa.

Apesar de o cliente colocar nas mãos do advogado suas questões


relativas à sucessão, esperando um rápido e satisfatório desfecho, pode ser que tal
não aconteça, não só devido à morosidade da justiça, mas também por
desconfianças e desacordos entre os envolvidos que, ao invés de unirem esforços
para a consecução de uma partilha célere e igualitária, deixam-se levar por questões
pessoais, dificultando, e; em alguns casos, até impossibilitando a efetiva resolução
da questão sucessória ora demandada.

Nessa lacuna entraria o psicólogo, que traçando um perfil detalhado do


cliente e demais interessados, poderia ajudar na condução do processo, uma vez
que , identificados os elementos subjetivos inerentes à psique de cada um, tornar-
se-ia mais fácil a aproximação e o entendimento, mitigando o sofrimento iniciado
com a abertura da sucessão. A aproximação entre o Psicólogo e o Advogado é cada
vez mais comum, como relata Mastroianni (2016, p.349):

A aproximação entre Psicologia e Direito ocorreu inicialmente no


campo do Direito Penal, enfocando-se principalmente as questões
relativas à Psicopatologia e Psicologia Clínica. Atualmente a relação
entre estas disciplinas se expandiu para outros campos, ampliando-
se a compreensão entre indivíduo-sociedade-justiça. Buscou-se
compreender a importância dos conhecimentos oriundos da
Psicologia no andamento e resolução dos processos judiciais, sob o
olhar dos operadores do Direito.

Essa relação conjunta poderia se dar a nível de escritório particular de


advocacia, aonde o psicólogo judicial prestaria uma efetiva assistência ao advogado
constituído, na identificação de possíveis fatores psicológicos, desavenças pessoais,
estado de espírito, mágoas porventura existentes entre os herdeiros; sempre no
intuito de acalmar os ânimos, de maneira que a sucessão possa ser vista como uma
etapa necessária, porém sem necessidade de embates que só viriam a aumentar o
tempo, os desgastes psicológicos e a encarecer o processo sucessório, tal qual
acontece nas perícias , como se observa em Groeninga (2016, sn)2:

As perícias psicológicas são instrumentos cada vez mais


fundamentais nas demandas judiciais de famílias que necessitam de
equilíbrio no exercício das funções parentais. Equilíbrio perdido, ou
mesmo nunca atingido, nas crises decorrentes das separações —
em sentido lato —, e em discussões a respeito do exercício do poder
familiar. Equilíbrio que deve ser ponderado levando-se em conta os
interesses e necessidades de crianças, adolescentes e, também, dos
adultos. Interesses e direitos que devem ser necessariamente
complementares numa família.

Aduz-se, então, que dessa coordenação profissional podem ocorrer


muitas vantagens, tais como economia processual, celeridade, menor desgaste das
partes; podendo-se inclusive ,através de um processo de maior aproximação entre
os interessados, resolver-se tudo pela via extrajudicial, a qual deve contar ainda
assim com a presença do advogado constituído, não trazendo prejuízo para a classe
profissional, conforme se observa no art. 610 presente no novo Código Processo
Civil (Lei n° 13105/ 2015) :

Art. 610.  Havendo testamento ou interessado incapaz, proceder-se-


á ao inventário judicial. § 1o  Se todos forem capazes e concordes, o
inventário e a partilha poderão ser feitos por escritura pública, a qual
constituirá documento hábil para qualquer ato de registro, bem como
para levantamento de importância depositada em instituições
financeiras. § 2o  O tabelião somente lavrará a escritura pública se
todas as partes interessadas estiverem assistidas por advogado ou
por defensor público, cuja qualificação e assinatura constarão do ato
notarial.

2
Disponível em: http://www.conjur.com.br/2016-abr-24/processo-familiar-cpc-valorizou-aspectos-psicologia-
direito-familia. Acesso em 10 maio 2017.
Ainda sobre esse artigo, um ponto que merece destaque é a necessidade
de consenso entre as partes para que se possa realizar o inventário e a partilha
extrajudiciais, como observa Luz (2017, p.479):

O inventário e a partilha somente poderão ser feitos por escritura


mediante consenso ou por mútuo consentimento, como consta na
nova regra. Não se admite, pois, que as partes compareçam em
cartório demonstrando dúvidas ou discutindo questões ainda
pendentes.

Outro aspecto a ser considerado quanto à importância do auxílio do


psicólogo ao advogado diz respeito à sanidade mental e aspectos subjetivos dos
envolvidos, como coação, por exemplo. Sobre o assunto trata a resolução n° 35 do
Conselho Nacional de Justiça,que regulamenta a lei n° 11.441/07 (Lei que autoriza o
inventário e partilha por escritura pública) em seu artigo 32: “O tabelião poderá se
negar a lavrar a escritura de inventário ou partilha se houver fundados indícios de
fraude ou em caso de dúvidas sobre a declaração de vontade de algum dos
herdeiros, fundamentando a recusa por escrito”.

Sobre o mesmo tema, explica Venosa (2014, p.93):

Na verdade,o exame de higidez mental dos declarantes é algo que


deve merecer sempre a atenção do agente delegado em todos os
seus atos de ofício. Aqui a responsabilidade avulta, tal como no
testamento, tendo em vista inevitáveis paixões e interesses
conflitantes que podem facilmente aflorar.

Portanto, vê-se que em variadas situações, a atuação conjunta do


psicólogo seria de grande valia ao advogado, inclusive retirando do mesmo a carga
emocional envolvida nesses em casos, através de diagnósticos precisos quanto ao
estado de ânimo dos interessados, deixando para o operador do Direito os cuidados
inerentes apenas ao exercício de sua profissão, não tendo que intervir em situações
emocionais, extremamente desgastantes para todos os envolvidos.
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