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MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO

UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO


CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS
FACULDADE DE DIREITO DO RECIFE

ATIVIDADE ASSÍNCRONA 2 : JUSTIÇA RESTAURATIVA E SOLUÇÕES DE CONFLITOS

​Adria D’Angelis Lima Nunes


Andreza Rebeca Correia
Flávia Kariny da Silva

RECIFE
2020
RESENHA

2° Encontro Meet
Tema: Justiça Restaurativa e Soluções de conflitos - Professora Marcela Mariz
Equipe: Adria D`Angelis Lima Nunes, Andreza Rebeca Correia e Flávia Kariny
da Silva

JUSTIÇA RESTAURATIVA E SOLUÇÕES DE CONFLITOS

O 2° encontro Meet contou com a participação da Professora Marcela Mariz,


servidora da Funase desde 2013 e assistente social, mesmo não sendo da área
jurídica é perceptível a grande contribuição da mesma para um visão ampla, além do
direito, que a Justiça Restaurativa precisa.
A referida professora conta o início de sua primeira experiência com a JR,
ocasião ocorrida no período em que trabalhou na unidade de medida de
semiliberdade para adolescentes que cometeram atos infracionais, momento este em
que teve contato com Mônica Mumme, conhecendo a formação dos Círculos e
enveredando pelo caminho da pesquisa.

I. JR E PERSPECTIVAS DO CRIME / SISTEMA PENAL

É válido ressaltar que o crime não é ontológico, ou seja, relativo ao ser em si


mesmo, mas foi criado, sendo assim, é possível aplicar métodos e técnicas que façam
com que, de fato, consigamos uma resposta eficaz para esse mal na sociedade.
Técnicas essas que não precisam, apenas, ser de posse do Estado, mas sim
cooperação entre os ramos da sociedade, visto a natureza da JR ser fluida, de forma
plural, afinal, como afirma Vera Regina Pereira de Andrade: “pode-se construir uma
JR conectada a diversos aspectos”.
No texto “Cultura do medo e Justiça Restaurativa” de Cláudio Daniel de Souza
e Daniel Achutti, é bastante debatido o papel das mídias jornalísticas na propagação
da cultura do medo na sociedade. Tal fato pode ser bastante observado pela forma
com que as mensagens são passadas ao público, trazendo sensação de impunidade
e insegurança, isso faz com que a população diante do amedrontamento crie uma
espécie de “violência defensiva”.
É evidente, portanto, que diante desses aspectos, a população é influenciada a
adotar determinada política criminal, valendo-se do sentimento de vitimismo e
recorrendo à defesa de mecanismos que outrora era reservado a tempos passados.
Nesse aspecto, o desenvolver dessa cultura de promoção do medo, tem-se o
crescente desejo pelas punições ilegais, mesmo que as ações estatais resultem em
morte, mesmo que para a prática do fim do crime seja apregoado a ideia constante no
Código de Hamurabi: “olho por olho, dente por dente”, ainda sim, são aceitas, logo, as
espécies de tortura, linchamentos e diversas outras agressões são por vezes aceitas
pelas pessoas em virtude da propagação da cultura do medo.
Michel Foucault aborda em “Vigiar e Punir” o processo de transformação das
formas de castigo entre 1757 e 1838:
o corpo deixou de ser alvo principal da repressão penal, e a
punição de ser um espetáculo, motivo pelo qual “a justiça não
mais assume publicamente a parte de violência que está ligada
ao seu exercício” (FOUCAULT, 2014, p.14)​.

Com isso, entendia-se a prisão pena como prisão do corpo, prisão esta que
seria peça essencial das formas de punição por parte do Estado-juiz.
Dito isso, é válido a análise se, de fato, a prisão por excelência é eficaz no seu
papel repressor, sabe-se que, pelo histórico, o caminho da resposta segue para o
negativo.
Nessa perspectiva é correto afirmar que o sistema penal atualmente adotado
reproduz e marca a essência das inconstitucionalidades relacionadas ao ser humano,
sendo nítido o descumprimento dos direitos e das garantias individuais, que no caso
brasileiro, podem ser encontradas na Constituição da República.Tal realidade do
sistema penal brasileiro é conhecida por todos, sendo alvo de diversos processos em
corte interamericana de direitos humanos, comprovando o fato de que o sistema não
apresenta soluções para os conflitos sociais, não traz respostas efetivas e
consequentemente falha na resolução de problemas sociais contemporâneos.
É preciso, ainda, lutar contra a crença de que a pena de prisão sempre existiu
e dessa forma seria difícil alterar essa realidade, é sabido que pensamentos assim
são totalmente limitantes e impedem que outras formas de resolução de conflitos seja
testada e implementada, principalmente no que diz respeito a Justiça Restaurativa,
que segundo Achutti e Pallamolla (2017, p. 438) destacam:
a justiça restaurativa “(...) antes de ser considerada uma
ideia fechada e acabada, trata-se, primordialmente, de
uma proposta conceitual que continua aberta”.

A JR se mostra uma esperança viva para o modelo atual do cárcere brasileiro,


na medida em que prioriza a participação direta dos envolvidos no caso e daqueles
que se sentirem lesados pelo ato delituoso, porém, necessariamente é preciso aceitar
que o modelo atual pouco satisfaz os anseios sociais e a resolução do problema. Com
base nisso, é importante o avanço para as novas formas de solução de conflitos que
nos é apresentada, bem como a forma a ser aplicada para fazer dar certo, ou seja, a
JR deve ser priorizada.
Portanto, diante da cultura do medo promovida pelos meios de comunicação,
fazendo com que a sociedade apoie os retrocessos sociais, sobretudo na aplicação
das penalidades ilegais, dentre outros motivos vê-se a importância da aplicação da JR
na seara penal, não apenas como uma forma alternativa de resolução de conflito mas
como uma possibilidade de ruptura com essa cultura que aprisiona a forma de pensar
da sociedade.

II. JR COMO SOLUÇÃO DE CONFLITOS

Inicialmente é importante desmistificar a ideia de conflito, sendo normalmente


associada a algo ruim, que não deve existir, quando na realidade os conflitos fazem
parte da vida em sociedade, é ponta para atingir determinados objetivos, podendo ser
resolvidos, não há como dissociar os conflitos da vida humana. Como resultado dessa
forma pejorativa de interpretação dos conflitos fundamentou-se por muito tempo a
ideia de que só o Estado deveria possuir o poder de resolver esses conflitos, sendo,
portanto, a única instituição capaz de solucioná-lo.
Percebe-se que o Estado não precisa deter o poder de império para dirimir os
conflitos de forma exclusiva, visto haver possibilidade de dispor aos envolvidos no
conflito o poder de eles próprios chegarem a um acordo, solucionando os problemas
entre si.
Desse modo, uma crítica bastante contundente é que o Estado apresenta uma
única solução de conflito para todas as pessoas, a exemplo da pena e da força
estatal, é uma forma hegemônica, não observa as peculiaridades de cada indivíduo,
realizando uma espécie de estereotipação social, enquanto a JR proporciona o estudo
da individualidade de cada pessoa, valorizando suas características e tornando-a
essencial no processo, isso faz com que corrobore a ideia de que não existe modelo
único de solução de conflitos.
Percebe-se, ainda, que o sistema atual faz com que as pessoas esqueçam
que há unidades prisionais e são locais de graves violações aos direitos humanos,
tornando-os invisíveis a coletividade. Desse modo, implementa-se a ideia de
normalidade e satisfatoriedade.
Nessa perspectiva, vale ressaltar que a resposta estatal atual carece de
resultados eficazes, a crise do sistema penal brasileiro mostra de forma clara que o
Estado não mais consegue ofertar respostas à sociedade ou muito menos solucionar
problemas, ou pelo menos, a origem deles. A partir desse cenário de crise dos
sistemas, surge a Justiça Restaurativa a partir de movimentos sociais, chegando ao
Brasil nos anos 90, ressaltando a possibilidade de novas alternativas de resolução
dos conflitos, tendo em vista a ineficácia dos sistemas atuais.
Surge, então, a Resolução 225 do CNJ na qual orienta a prática da Justiça
Restaurativa no ambiente jurídico a fim de que não seja desvirtuada ou banalizada, a
Resolução conta com a seguinte redação:
Diante da complexidade dos fenômenos conflito e
violência, devem ser considerados, não só os aspectos
relacionais individuais, mas também, os comunitários,
institucionais e sociais que contribuem para seu
surgimento, estabelecendo-se fluxos e procedimentos
que cuidem dessas dimensões e promovam mudanças
de paradigmas, bem como, provendo-se espaços
apropriados e adequados.
Desse modo, a Resolução conta com uma série de diretrizes, incluindo a
necessidade de participação do ofensor, da comunidade e da vítima, nos casos
possíveis, diferenciando-se do atual sistema que muitas vezes há prevalência da
exclusão da vítima no processo.
O conceito de aplicação da técnica é amplo, não é um conceito fechado, a
prática é baseada no objetivo que se quer alcançar, contexto social, econômico e
político das pessoas envolvidas. A JR trata as questões com prevalência do diálogo
no decorrer do processo.

III. PRÁTICAS RESTAURATIVAS

Para a caracterização das práticas restaurativas são importantes a presença


da vítima, ofensor e facilitador, o contato da vítima com o ofensor pode ser direto ou
indireto, e caso a vítima não deseje realizar qualquer tipo de contato, o facilitador
atua.
Dentre as formas existentes de práticas restaurativas, o círculo restaurativo,
segundo a professora Vera Regina Pereira de Andrade, é o mais utilizado no Brasil,
em virtude da atuação dos povos originários.

IV. CÍRCULOS RESTAURATIVOS

Os Círculos Restaurativos são construções de paz e diálogo, nele há o


encontro entre o facilitador com as partes, vítima e ofensor. O círculo é mais inclusivo,
incorrendo em mais pessoas participantes do processo, dado que as vítimas e
ofensores podem trazer seus facilitadores, porém, pode desistir do processo a
qualquer momento, apregoando a característica da JR: a voluntariedade.
Antes do Círculo propriamente dito existe o processo pré-circular, no qual deve
ser documentado, sendo esse o momento do encontro entre vítima e ofensor.
Posterior a esse momento, tem-se o período pós-círculo que é caracterizado pelo
encontro das pessoas envolvidas no processo para exposição se o que o que foi
decidido está sendo cumprido ou não, uma espécie de acompanhamento.
É válido destacar que todo o processo é pautado no diálogo, sem barreiras, é
um momento de interação humana, no qual todas as partes são ouvidas e tratadas
com suas devidas peculiaridades, o processo restaurativo é em si um processo de
ouvida, de tratamento humanizado.
O círculo restaurativo é completamente contrário a ideia de celeridade, todos
os procedimentos são realizados sem pressa, em média de 2 a 3 meses, afinal de
contas a individualização dos participantes do processo é prioridade, caso contrário
se confundiria com os atuais sistemas, que tem como exemplo as Audiências de
Custódia, nas quais com base nos estudos da Professora Manuela Abath, a duração
em que os atores jurídicos definem a vida das pessoas é cerca de 3 minutos.
Portanto, JR como celeridade é um mito.
Conclui-se que a Justiça Restaurativa e outras formas de resolução de conflitos
contribuirá para a formação de pessoas mais afeitas ao diálogo e a aceitação por
parte delas das variações da natureza humana.

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