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f o rta l e c e n d o o s i st e m a n a c i o n a l
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
Patrimônio Imaterial:
1
PATRIMÔNIO IMATERIAL
© 2014 IPHAN
A reprodução desta publicação, na íntegra ou em parte, é permitida desde que citada sua fonte.
Publicado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional em parceria com a Organização das Nações
Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) e a Inspire Gestão Cultural (Inspire|EAD).
Esta publicação é parte de ação coordenada entre o Programa Regular da UNESCO Capacity Building on Living
Heritage (6413305006BRZ) e o Projeto de Cooperação Técnica Difusão da Política do Patrimônio Cultural Imaterial
no Brasil (914BRZ4012), entre o IPHAN e a Representação da UNESCO no Brasil, e visa a contribuir na gestão
integrada da política de promoção e salvaguarda do Patrimônio Cultural Imaterial. Os autores são responsáveis
pela escolha e pela apresentação dos fatos contidos neste livro, bem como pelas opiniões nele expressas, que não
são necessariamente as da UNESCO, nem comprometem a Organização. As indicações de nomes e a apresentação
do material ao longo desta publicação não implicam a manifestação de qualquer opinião por parte da UNESCO
a respeito da condição jurídica de qualquer país, território, cidade, região ou de suas autoridades, tampouco da
delimitação de suas fronteiras ou limites.
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FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
SUMÁRIO
PREFÁCIO. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . ............................................................... 5
APRESENTAÇÃO.. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . ............................................................... 7
1. INTRODUÇÃO
Lucas dos Santos Roque e Maria Helena Cunha............................................... 11
1.1 Um breve histórico: do curso à publicação. .................................................. 11
1.2 Sistema Nacional de Patrimônio Imaterial: conquistas e desafios.................... 13
1.3 Educação a distância (EAD): desafios de um processo formativo. . ................... 15
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PATRIMÔNIO IMATERIAL
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FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
PREFÁCIO
Grandes desafios têm se interposto à efetivação dessas políticas, dos quais podemos
mencionar a articulação federativa mediante a dimensão do território e a complexidade
dos marcos e instrumentos legais, tendo-se em vista as limitações existentes para
profissionalizar a gestão local. Mais recentemente, os impactos causados por
intervenções em grande escala, afetando diversas comunidades, vêm exigindo novos
arranjos institucionais, físicos e simbólicos, que assegurem sustentabilidade ao processo
de desenvolvimento e crescimento econômico.
1. BRASIL, 2000.
2. BRASIL, 2000.
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PATRIMÔNIO IMATERIAL
A experiência mais recente, que referencia essa publicação, mobilizou diretamente 400
pessoas, selecionadas a partir de mais de três mil inscrições, envolvendo as instâncias
públicas estadual, municipal e sociedade civil, em todos os estados brasileiros.
Sua dinâmica, a exemplo das referidas edições anteriores, tem contribuído para o
diálogo entre especialistas, gestores locais e demais agentes, favorecendo o debate e
consequentes respostas a demandas tão distintas, distribuídas pelo país.
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FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
APRESENTAÇÃO
Ao optar pela edição de um curso livre a distância (EAD) com o tema Patrimônio
Imaterial: fortalecendo o Sistema Nacional, por meio do Projeto Difusão da Política do
Patrimônio Cultural Imaterial no Brasil, parceria do Instituto do Patrimônio Histórico
e Artístico Nacional (IPHAN) com a Representação da UNESCO no Brasil, pretendeu-
se levar os conceitos e instrumentos, que já estão consolidados no âmbito federal,
para as demais esferas de governo, buscando-se também a participação fundamental
de organizações não governamentais e indivíduos com interesse na área, em todo
território nacional.
Experiências anteriores na mesma área tiveram bastante êxito, tais como: o Curso
Patrimônio Imaterial: Política e Instrumentos de Identificação, Documentação e
Salvaguarda, realizado, em duas turmas, em 2008 e 2009, e aquele realizado pelo Centro
3. Idem.
4. BRASIL, 2000.
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PATRIMÔNIO IMATERIAL
Apesar da divulgação realizada somente junto às redes sociais, houve uma grande
procura, com mais de três mil inscrições, o que determinou a realização de mais uma
turma, e deixou claro que há interesse e necessidade de ações desse tipo.
O IPHAN acredita que a realização dos cursos e a publicação do seu conteúdo, que
ora é colocado à disposição, oferecerá a um público mais amplo de profissionais as
informações necessárias para a difusão da política e da legislação do PCI, consolidando
e fortalecendo o Sistema Nacional de Patrimônio e, em consequência, o próprio Sistema
Nacional de Cultura.
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FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
CORDEL
“Patrimônio Imaterial: fortalecendo o Sistema Nacional”
Eliane Franco Pereira
Assistente social, aluna da Turma 2
I XI
A meus colegas vou falar, Instrumentos e Práticas de Salvaguarda,
Aos professores vou contar, Tivemos Rívia Bandeira de Alencar,
Nesse cordel audacioso, Instrumentos de Gestão e Práticas de Fomento,
Que irei confabular. Elizabeth Costa! Dinâmica no comentar.
II XII
Vocês nem imaginam, Convenção 2003 UNESCO,
Como me dá aflição, Sabem quem foi o doutor?
Escrever essas palavras, O Lucas dos Santos Roque,
Cheias de muita emoção! Que é um mestre de valor!
III XIII
Pensem o quanto é bom! Participação Social dos atores,
Conhecer a grandeza, E Gestão do Patrimônio Imaterial,
Do patrimônio imaterial, Letícia Costa Rodrigues Vianna,
Em EAD, ó que beleza! Levantou questões da política cultural.
IV XIV
Muitas informações, Legislação Brasileira, ó gente!
E conteúdos também, Mário Pragmácio regente,
Riquezas por demais! PNPI, estados e municípios,
Os comentários contêm. Eita! Dominou legalmente!
V XV
Ah! Ia me esquecendo, Intersetorialidade, Patrimônio,
Do que estou falando, E Desenvolvimento também,
É do curso do IPHAN, Juliana Santilli é competente!
Inspire|EAD aproximando. Empoderamento... , ela tem!
VI XVI
IPHAN e UNESCO unidos, Algumas colegas marcantes,
Na luta para preservar, Com uma forte mentalidade,
Os Patrimônios Imateriais, Pra não ser injusta com os outros,
Inspire|EAD veio encampar! Eu não falo a identidade.
VII XVII
Planos de salvaguarda, Cursamos Patrimônio Imaterial,
A PCIs miscigenados, Fortalecendo o Sistema Nacional
Legados dos ancestrais, Viajamos em EAD pelo Brasil,
Também sincretizados! Foi bastante sensacional!
VIII XVIII
Tomamos cafezinhos, Só temos a agradecer,
Sem importar a hora, Pela boa oportunidade,
Ana, tutora valente! Que a coordenação técnica,
Estava no “aqui e agora”! Concedeu-nos com a verdade.
IX XIX
Tamanha envergadura! E agora pessoal! E aí?
Nas retóricas procedentes, O curso chegou ao fim.
Comentadas em pouco tempo, Só vai deixar saudade, ai!
Tão corrido como o vento. O peito aperta em mim.
X XX
Adaptação e Ambientação em EAD, No meu cofo de segredos,
Que a Patrícia Faria orientou, Guardo todos com afeição,
E Tratando de Conceitos, Desculpem a rima truncada,
A Mônia Silvestrin ensinou! Mas estão no meu coração!
1 Introdução
Lucas dos Santos Roque
Coordenador de conteúdo
Coordenadora pedagógica
A primeira turma do curso teve início em março de 2013, mas essa demanda muito
superior ao previsto inicialmente levou aos organizadores do curso a considerarem a
necessidade de estruturação de uma segunda turma, que teve início em maio de 2013,
um pouco depois da finalização da primeira.
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PATRIMÔNIO IMATERIAL
Dessa forma, considerando que o foco principal do curso foi estabelecer um processo
que levasse ao fortalecimento do Sistema Nacional de Patrimônio Imaterial, e diante
do número excessivo de inscrições recebidas, optou-se por abrir a segunda turma,
com perfis de alunos mais diversificados com relação aos segmentos de atuação
em comparação à primeira. Essa forma de estruturação propiciou a manutenção do
foco da primeira turma mais concentrado na estruturação do Sistema Nacional, com
representantes dos estados e municípios, e na segunda turma com a ampliação
dos atores envolvidos no processo de salvaguarda do Patrimônio Imaterial, a saber:
pesquisadores, membros de ONGs e estudantes, dentre outros.
O conteúdo desta publicação tem como base as informações e os dados gerados desde
o processo de seleção até a conclusão das duas turmas. Para tanto, foram considerados
os questionários de avaliação respondidos pelos alunos, o resultado conceitual gerado
durante os fóruns de debates, estabelecidos por professores e alunos na plataforma, bem
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FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
5. Idem.
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6 Ibid.
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No que diz respeito ao conteúdo, dar voz aos participantes é fundamental para a
avaliação dos caminhos escolhidos, pois quando se escuta que o “curso me capacitou
para melhor trabalhar com as comunidades e falar com mais propriedade sobre o
Patrimônio Imaterial”, nos permite auferir que os resultados foram positivos, e que
a ampliação do acesso às informações geradas é necessária como uma iniciativa
democrática e contribuirá para o fortalecimento do Sistema Nacional. Assim,
continuamos com o depoimento de um dos alunos:
Eu achei o curso muito esclarecedor, os professores excelentes, e o
material disponibilizado igualmente satisfatório. O curso ultrapassou as
minhas expectativas, aumentando ainda mais minha conscientização
com relação ao Patrimônio Imaterial, e a vontade de contribuir para a
salvaguarda dos bens imateriais. (Turma 1)
Essa é uma das iniciativas que são incentivadas pelo formato de educação a distância,
quando os alunos extrapolam o ambiente virtual e compartilham os conhecimentos
adquiridos durante a realização do curso, cumprindo o papel de multiplicadores de um
processo formativo. Em uma perspectiva de continuidade, outro aluno afirma sobre
essa possibilidade:
O assunto é muito novo pra mim e não tenho o conhecimento necessário
sobre o Patrimônio Imaterial da minha região. Acho interessante montar
um grupo de estudo para provocar discussões, reflexões e trocas com outros
que também se interessam pelo assunto no meu município. (Turma 1)
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FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
De forma mais específica, com a relação à metodologia dos cursos a distância realizados
pela plataforma Inspire|EAD, é seguido o modelo pedagógico em que metade das
atividades envolve autoinstrução (leitura de textos e artigos de especialistas), e a outra
metade envolve aprendizagem colaborativa e a criação de uma comunidade virtual,
por meio da participação de um fórum de debates entre professores e alunos. Além
disso, são disponibilizados outros espaços na plataforma para a complementaridade
da busca de interatividade e conhecimentos, como o Cafezinho, espaço de diálogos
informais e área para cadastro de perfil dos participantes, com o objetivo de integração
dos alunos, documentos específicos para a turma, notícias e midiateca, que é uma
biblioteca digital multimídia. Neste último item, uma dos participantes relata a seguinte
experiência com a plataforma:
Em geral, tirando as particularidades já mencionadas, estou bastante
satisfeita com o curso, inclusive [destaco] a midiateca, que nos fornece
o acesso a conteúdos com primazia e com riqueza de conhecimentos,
como também todos os conteúdos que são postados pelos professores
em suas aulas as quais já participamos. (Turma 2)
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FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
2. Patrimônio Imaterial:
fortalecendo o Sistema Nacional
Para a realização das duas turmas do curso, foi estruturado um conjunto de disciplinas,
as quais são apresentadas neste tópico, como o conteúdo principal desta publicação.
Além do texto principal do autor/professor e suas respectivas referências bibliográficas,
foi incluída uma síntese do fórum de discussão realizado entre alunos e professores
na plataforma Inspire|EAD, com o objetivo de compartilhar uma parte do debate
estabelecido em torno dos temas específicos de cada disciplina.
O curso tem como aula inicial a disciplina de Adaptação e Ambientação em EAD,
ministrada pela professora Patrícia Faria. O seu objetivo é oferecer o instrumental
adequado para uma aprendizagem virtual e estabelecer uma relação amigável com a
tecnologia. Objetiva também analisar os vários pontos da plataforma do curso, otimizar
a utilização de seus recursos e explicitar a metodologia de aprendizagem adotada. Por
fim, visa a apresentar o curso, detalhar o conteúdo de cada aula, os nomes e currículos
dos profissionais envolvidos em sua concepção pedagógica.
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PATRIMÔNIO IMATERIAL
Este texto tem como objetivo propor alguns olhares acerca de conceitos importantes
para o entendimento das políticas e das ações relativas à salvaguarda do PCI. As
reflexões aqui apresentadas têm como base textos e documentos referenciais, de
cunho acadêmico e/ou institucional, assim como as experiências desenvolvidas no
âmbito da política federal do Patrimônio Imaterial.
A proposta é apontar uma definição geral desses conceitos7, de modo que possam
fornecer referências para a compreensão do campo do Patrimônio Imaterial, abarcando
as questões estruturantes que eles suscitam quando se trata de pensar as práticas de
patrimonialização no âmbito da ação estatal. Isso quer dizer que não estaremos tratando
aqui do Patrimônio Imaterial per se, mas sempre na perspectiva da sua condição de
objeto de políticas públicas.
A segunda questão relevante diz respeito à relação entre Estado e sociedade civil. Todas
as políticas públicas se destinam a atender a demandas de cidadãos, o que significa,
hoje, trabalhar na perspectiva da construção compartilhada dessas políticas, de seus
programas e ações, assim como garantir a participação de grupos sociais na sua execução
e acompanhamento. No caso da política federal de Patrimônio Imaterial, a participação
dos detentores e grupos interessados é pressuposto de qualquer uma das suas ações.
7. Muitos desses conceitos apresentam historicidades e trajetórias próprias no campo das ciências sociais, impossíveis de serem
abordadas aqui na sua integralidade. Recomendamos, portanto, a leitura dos livros indicados nas bibliografias e os textos
complementares, para o aprofundamento das questões abordadas.
8. BRASIL, 1988.
9. Na época, Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (SPHAN) (BRASIL, 1937).
10. BRASIL, 2000.
11. Ver: CRESPIAL, 2008; FONSECA; CAVALCANTI, 2008.
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FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
Partir desse princípio significa também trazer para o âmbito das políticas públicas a
questão da diversidade, e não apenas como tema ou objeto de projetos, mas funda-
mentalmente como modos diferentes de conceber o mundo e de agir. Significa dar
concretude ao cidadão universal e abstrato que o aparato estatal tradicionalmen-
te elegeu como interlocutor. Isso implica repensar o nosso modelo de Estado e de
administração pública, tanto nas suas perspectivas, como nos seus tempos, na sua
burocracia, nos seus instrumentos, nas suas dinâmicas.
A coordenação desses processos implica, por outro lado, uma alta capacidade de
articulação, negociação, mediação por parte dos órgãos governamentais e instituições
parceiras – e de tempo e recursos para que as coisas possam acontecer. Além disso, é um
caminho de mão dupla: também a sociedade civil precisa rever as suas representações
acerca do Estado, perceber que ele pode ser diverso, e que vem passando por processos
de mudança significativos nas últimas décadas – não se pode continuar pensando que
o Estado é tão somente o provedor paternalista ou o autoritário repressor.
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PATRIMÔNIO IMATERIAL
ambos ocorridos entre o final do século XVIII e início do XIX. Não é difícil entender
essa relação íntima entre eles: para unificar populações, culturas, territórios – operação
imprescindível na construção dos Estados contemporâneos – foi preciso elaborar
a própria ideia de nação, que se fundamenta em alguns elementos estruturantes:
um conjunto de pessoas que partilha uma cultura, uma língua, uma origem comum,
experiências vividas, uma única identidade, ou seja, um povo. Isso tudo geralmente
associado à existência de um território específico e de um governo único.
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FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
a. Histórico
14. No caso do Patrimônio Imaterial, esse processo de construção de valor é sempre realizado em conjunto com as comunidades
detentoras, a partir de uma solicitação destas. São elas que definem os bens a serem patrimonializados, assim como os
sentidos e os valores a eles associados, que os qualificam como patrimônio – não há requisitos externos (de excepcionalidade,
de singularidade, por exemplo), que definam, a priori, esse valor. É claro que os saberes técnicos – das equipes de pesquisas e
das instituições de patrimônio – e o próprio entendimento do Conselho Consultivo, que é quem delibera, participam desse
processo, mas eles não devem ser as partes determinantes na indicação dos valores patrimoniais.
15. CHUVA, 2009; GONÇALVES, 2002; CAVALCANTI, 2000; FONSECA, 2005.
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PATRIMÔNIO IMATERIAL
Feito esse breve histórico, que pode ser aprofundado por meio das leituras
recomendadas, é necessário tratar da relação entre as dimensões material e imaterial
do Patrimônio Cultural. Embora esse campo no Brasil tenha sido construído reiterando-
se a dicotomia entre esses dois domínios – mais em alguns momentos e menos em
outros –, hoje há uma percepção clara de que esse modelo deve ser superado, pois
do mesmo modo que podemos defender que todo o patrimônio é determinado, no
processo de seleção e reconhecimento, por estruturas de significação, de dotação de
valor – ou seja, é, no limite, intangível –, pode-se argumentar também que, de fato, não
existe Patrimônio Imaterial sem alguma espécie de materialidade por meio da qual ele
se concretize ou estabeleça uma relação de interdependência.
Do ponto de vista concreto, temos ainda outro dado a ser considerado: na percepção
de quem vive o patrimônio, essa separação não existe. As pessoas querem preservar ou
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FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
não uma praça ou uma festa, porque estabelecem – ou não – uma relação de sentido
com esses bens culturais. Elas sabem dizer por que aquilo é patrimônio para elas,
mas qual parte disso é material ou imaterial, ou o que esses termos significam nesse
contexto, é certamente uma abstração.
b. Conceito
20. Temos como exemplo dessa complexidade a decisão tomada pelo GTPI quando da definição da expressão Patrimônio
Imaterial, em 1998. Mesmo entendendo que reforçaria a ideia da falsa dicotomia entre material e imaterial, entendeu-se que
delimitar essa área como um campo específico poderia dar mais visibilidade e força para uma dimensão do Patrimônio Cultural
que, mesmo estando fortemente ligada a uma cultura material, havia sido negligenciada nas políticas de preservação.
21. BRASIL, 1988.
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PATRIMÔNIO IMATERIAL
Ao lado da ideia de cultura, temos a de identidade que, nesse caso, orienta o próprio
conceito de patrimônio. Este último tem, nos itens de I a V do artigo 216, uma proposta
de definição de escopo que abarca desde os modos de criar, fazer e viver, até os
objetos tradicionais do campo, como as obras de arte e os sítios históricos. O conceito
de identidade é mais um desses que motivam infinitos debates, apresentando uma
tradição considerável no âmbito das ciências sociais. Também solicita um olhar crítico,
sensibilidade e bom senso na sua utilização, pois tem uma predisposição imensa à
naturalização. Se isso já não é fácil de ser tratado no âmbito acadêmico, menos ainda o
é no patrimônio, para o qual o conceito papel legitimador.
Em uma acepção bem direta, podemos dizer que a identidade é aquilo que nos coloca
no mundo em oposição ao “outro”, o que nos define e nos identifica por meio do
estabelecimento de distâncias, de diferenças – e, nesse sentido, é sempre relacional.
Não há identidade eterna, imutável e homogênea, embora as representações que se
constituem em torno dela possam tender a construir signos em sentido oposto: de
reificar continuidades, unicidades, universalidades. Ela é sempre produto da linguagem,
é discurso, atravessado por intencionalidades, conflitos, valores, e se redefine em função
dos problemas e questões às quais o grupo social tem que responder em um dado
momento. A identidade, portanto, é um constructo contemporâneo, que se atualiza e
se reinventa mobilizando elementos do passado, da memória.
26
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
27
PATRIMÔNIO IMATERIAL
Quando há alguma atividade dessa natureza é sempre no contexto de uma ação mais
ampla de fortalecimento da comunidade detentora do bem cultural, como foi, por
exemplo, o Prêmio Viva Meu Mestre, que reconheceu o trabalho de mestres de capoeira
em todo o Brasil, no âmbito do Programa Pró-Capoeira. No entanto, foi uma ação
específica, pontual. Isso é diferente de programas como o Tesouros Humanos Vivos27 da
UNESCO, ou mesmo de experiências similares existentes em âmbito estadual no Brasil.
Isso é particularmente importante aqui, porque há mais uma diferença a ser ressaltada,
no que se refere às expressões artísticas. Não se reconhece como passível de
patrimonialização, nessa concepção de Patrimônio Cultural, a criação artística individual,
a obra de um cantor, por exemplo, ou de um pintor. Nesse sentido, a definição da
categoria formas de expressão, tal qual se encontra no INRC, é bastante significativa:
[…] são formas de comunicação associadas a determinado grupo
social ou região, desenvolvidas por atores sociais reconhecidos
pela comunidade e em relação às quais o costume define normas,
expectativas e padrões de qualidade. Trata-se da apreensão das
performances culturais de grupos sociais [manifestações literárias,
musicais, plásticas, cênicas e lúdicas].28
27. UNESCO. Encouraging transmission of Intangible Cultural Heritage: Living Human Treasures. Disponível em: <http://www.unesco.
org/culture/ich/?pg=00061>.
28. IPHAN. 2000.
28
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
Por fim, o terceiro elemento se refere ao caráter dinâmico e processual desses bens
culturais. Com isso, falar em Patrimônio Imaterial significa incorporar ao campo
tradicional do patrimônio a dimensão do presente, das práticas culturais vivas, do
cotidiano, da sincronia. Isso significa que é imprescindível considerar as pessoas como
parte envolvida diretamente nos processos, com tudo o que isso implica em termos
das práticas de preservação e gestão do patrimônio.
A salvaguarda desses bens depende não apenas da interlocução com as pessoas, mas
também da sua vontade, do valor e do sentido que esses bens culturais têm para elas
e que as fazem querer mantê-lo vivo. Sendo assim, há um limite claro para o desejo
de preservação – e o Estado não deve intervir à revelia das comunidades detentoras.
Nesse sentido, é diferente do que acontece com bens materiais: a restauração de
um prédio, por exemplo, pode acontecer sem interlocução mais próxima com as
pessoas interessadas, embora isso não seja uma prática recomendável, salvo nos casos
emergenciais, excepcionais. Em segundo lugar, qualquer ação nesse campo pressupõe
um investimento alto na mediação, na interlocução, no fortalecimento das capacidades
e condições de vida das pessoas e grupos que podem manter vivo aqueles bens.
Existe ainda outro aspecto importante dado por essa condição de “patrimônio vivo”:
a própria natureza dos bens culturais exige que se vá além do aspecto cultural. Isso
se explicita, por exemplo, quando tratamos de saberes e técnicas tradicionais, que
geram produtos ou serviços específicos e são feitos a partir de elementos naturais,
29
PATRIMÔNIO IMATERIAL
Cabe ainda mencionar outra especificidade: bens culturais de natureza imaterial não
podem ser tratados sob a égide da “originalidade” naquilo que se refere à manutenção,
cristalizada, de características que ele apresentava quando do seu surgimento. Eles
são bens dinâmicos, e a mudança faz parte da sua natureza, por isso, temos que ter
cuidado com termos como descaracterização, degeneração, perda, pois eles geralmente
pressupõem a ideia de um modelo originário de referência como critério de valoração,
o que nem sempre é compatível com a perspectiva processual do Patrimônio Cultural.
O mais importante, portanto, é a sua continuidade no tempo e a sua capacidade de se
manter como referência cultural para as comunidades, apesar das transformações que
podem sofrer em função das mudanças nos contextos socioculturais e econômicos
nos quais se encontram inseridos29. Isso significa a sua capacidade de se constituir
como tradição, no sentido já explicitado neste texto anteriormente.
A palavra originalidade pode ter ainda outro sentido no campo do patrimônio, que
também deve ser problematizado: é aquele que se refere ao estabelecimento de uma
relação de hierarquia entre bens culturais. Não é pertinente dizer que um bem de
natureza imaterial referencial para um grupo social é mais original ou importante que o
de outro, pois isso pressuporia critérios universais e externos às próprias comunidades,
que são aquelas que definem seu valor. Assim, como dizer que a Festa do Divino
de Pirenópolis é mais importante do que a Festa do Divino de Paraty, se nem as
comunidades de referências, nem os significados associados às celebrações, são os
mesmos?
29. É claro que a manutenção de elementos estruturantes de um bem cultural ao longo do tempo é importante, inclusive para
que se possa reconhecê-lo como tal e identificar a sua continuidade. Esses elementos, entretanto, podem ser reelaborados,
reinventados e ressignificados, dentro de contextos e processos específicos sem que o bem perca, necessariamente, seu valor
como patrimônio. Até mesmo porque aquilo que se entende como “elemento estruturante” não se refere exclusivamente a
características pontuais – como seria um adereço, o uso de um instrumento ou uma marcação coreográfica –, mas a processos,
relações de significado e pertinência que se estabelecem no seio das dinâmicas culturais.
30
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
No âmbito dessa perspectiva de Patrimônio Imaterial, temos ainda dois conceitos muito
importantes, dos quais falaremos a seguir: o de referência cultural, que é o elemento
estruturante dessa política; e o de salvaguarda, que se refere ao seu campo de ação,
seus processos e instrumentos.
Ou ainda:
Referências são edificações e são paisagens naturais. São também as
artes, os ofícios, as formas de expressão e os modos de fazer. São as
festas e os lugares a que a memória e a vida social atribuem sentido
diferenciado: são as consideradas mais belas, são as mais lembradas
as mais queridas. São fatos, atividades e objetos que mobilizam
a gente mais próxima e reaproximam os que estão distantes, para
que se reviva o sentimento de participar e pertencer a um grupo,
de possuir um lugar. Referências são objetos, práticas e lugares
apropriados pela cultura na construção de sentidos de identidades,
são o que popularmente de chama de ‘raiz de uma cultura’.31
31
PATRIMÔNIO IMATERIAL
B. Salvaguarda
Entende-se por salvaguarda as medidas que visam a garantir a viabilidade do PCI, tais
como a identificação, a documentação, a investigação, a preservação, a proteção, a
promoção, a valorização, a transmissão – essencialmente por meio da educação formal
e não formal – e a revitalização desse patrimônio em seus diversos aspectos.32
O uso de tal termo no âmbito geral da política, e também no específico, pode levar
a entendimentos equivocados acerca da sua definição. Por esse motivo, é necessário
deixar claro que a definição a ser utilizada como salvaguarda é aquela explicitada no
parágrafo anterior, respaldada pela definição da Convenção. Nesse sentido, são três os
principais processos que compõem o que chamamos de salvaguarda do patrimônio
imaterial no âmbito federal: identificação, reconhecimento e apoio e fomento.
32
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
Identificação
Em segundo lugar, cabe mencionar que ela é sempre participativa, como todas as
demais ações desenvolvidas no âmbito dessa política. Isso implica pensar em uma
produção de conhecimento que traz no seu próprio cerne a mobilização dos atores
envolvidos e não apenas no sentido de participarem da pesquisa em si, mas também
de se apropriarem da própria reflexão acerca do patrimônio, da política que está
sendo proposta, das decisões em relação ao que deve ser produzido, documentado
e patrimonializado. É o Estado assumindo compromisso com os atores envolvidos na
perspectiva de construção conjunta de ações de salvaguarda para a preservação dos
bens culturais referenciais.
33. A definição e a caracterização dos instrumentos da política serão abordadas de forma mais detalhada em outro módulo do
curso.
34. No campo do PCI, por sua própria natureza e historicidade, as disciplinas com as quais se constituem as interfaces mais
importantes são a antropologia, a sociologia, a história – e a história oral – e a geografia.
33
PATRIMÔNIO IMATERIAL
Nesse sentido, cabe ainda mencionar que a maior parte das políticas públicas
apresentam instrumentos oficiais que viabilizam a sua execução e que, devido à
natureza de ação institucional – que requer comparabilidade de dados para gestão –,
tendem à padronização e à universalização. No caso da política federal de Patrimônio
Imaterial, são dois os instrumentos relacionados ao processo de identificação e que
têm como finalidade a produção de conhecimento, a realização de documentação e
a mobilização de grupos interessados: o Inventário Nacional de Referências Culturais
(INRC) e o Inventário Nacional da Diversidade Linguística (INDL).
Reconhecimento
Dos três processos que constituem a salvaguarda, este é o que apresenta um caráter mais
processual, no sentido jurídico do termo, de estabelecimento de rito. Acompanhando
os procedimentos gerais de reconhecimento já existentes no IPHAN – solicitação,
abertura de processo, instrução técnica (pesquisa e documentação para construção
do recorte e justificativa de valoração), submissão ao Conselho Consultivo do IPHAN
(instância representativa da sociedade civil) para a aprovação ou não, e inscrição nos
livros – o Registro inova em alguns aspectos, como, por exemplo, a necessidade do
pedido coletivo para o reconhecimento e a submissão das solicitações à Câmara
Setorial do Patrimônio Imaterial, para o julgamento da pertinência. Como os demais
processos da salvaguarda, a participação dos detentores aqui é fundamental, desde
o início do processo até o desenvolvimento da pesquisa, a elaboração do dossiê de
Registro e a definição daquilo que vai se tornar oficialmente Patrimônio Cultural.
34
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
Outras tantas observações poderiam ser feitas, pois o tema é complexo e suscita debate.
Nossa intenção aqui, entretanto, é apenas a de apontar para a complexidade dessa
questão e para a necessidade de que ela seja explicitada e discutida nos processos de
patrimonialização, assim como nos processos de construção das políticas e dos marcos
legais que os sustentam.
Apoio e fomento
35
PATRIMÔNIO IMATERIAL
ações de apoio indicadas nos dossiês de Registro, que foram estabelecidas junto com
os grupos interessados.
Além das ações direcionadas para os bens reconhecidos, são desenvolvidas também
outras atividades de apoio e fomento. São três os principais instrumentos referentes
a esse processo: Plano de Salvaguarda, exclusivo para bens Registrados, Ações de
Salvaguarda e Salvaguarda Emergencial. Existe ainda o Edital do Programa Nacional
do Patrimônio Imaterial (PNPI), voltado para o financiamento de projetos da sociedade
civil, que vem desempenhando papel importante, desde a sua criação, no fomento do
campo do Patrimônio Imaterial e na disseminação dessa política.
Estado, comunidade, portadores ou detentores são termos que se referem aos atores que
podem estar envolvidos nas ações de patrimonialização. Como o campo no qual se
desenvolvem essas ações é sempre dinâmico e bastante complexo – mais ou menos
a depender da natureza e das características dos bens culturais envolvidos –, com
exceção do Estado, nem sempre todos eles estão presentes em um mesmo contexto,
assim como a relação entre eles não tem um roteiro pré-estabelecido ou uma tipologia
norteadora.
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FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
Começando pelo termo Estado, nos referimos aqui à atuação do poder público
competente para desenvolver ações relativas à preservação do Patrimônio Cultural
que, nesse caso, quer dizer governos federal, estadual e municipal, com seus respectivos
órgãos e instituições de patrimônio. Como explicitado na introdução, a atuação
governamental é inerente aos processos de patrimonialização, de modo que ela estará
sempre presente no desenvolvimento de qualquer ação ou política.
Propõe-se, portanto, que sempre que esse termo for utilizado, seja explicitado o que se
entende por ele no contexto específico do projeto ou ação. Mais do que isso, o ideal
é que essa conceitualização seja realizada a partir dos próprios detentores. Assim, que
se discuta com eles o que se entende por comunidade, em diálogo com os contextos
concretos existentes e com as referências acadêmicas disponíveis. Dessa forma, é possível
dar densidade e concretude ao termo, problematizá-lo, explicitar seus limites e definir até
que ponto ele serve ou não para a compreensão da realidade social em estudo.
A definição de quem são os detentores nem sempre é fácil e varia muito, a depender
da natureza do bem cultural e do universo sociocultural no qual ele está inserido. O
ponto de partida para essa definição é sempre a própria prática cultural: os primeiros
37
PATRIMÔNIO IMATERIAL
detentores são as pessoas que têm uma relação direta com ela, que participam da
sua dinâmica, da sua existência, como mestres, aprendizes, artífices, idosos que detêm
memórias relacionadas à prática etc. Na maior parte das vezes, os detentores se
reconhecem como parte de um grupo que partilha um universo de práticas culturais
que vão além do próprio bem, identificando-se com alguns dos qualificativos que
podem ser associados ao conceito de comunidade – para esse grupo, o bem cultural
patrimonializado agrega valores da sua identidade coletiva, da sua história e tradições
comuns.
Para além dos detentores, existem outros grupos que devem ser considerados. No
âmbito do Patrimônio Imaterial, como já vimos, não é possível o desenvolvimento de
ações sem que se considere a articulação com outros atores sociais, principalmente
as instituições. Em qualquer projeto, é importantíssimo mobilizar outros segmentos
que tenham interesse na salvaguarda daquele bem cultural, como as organizações
da sociedade civil – (organizações não governamentais – ONGs e organizações da
sociedade civil de interesse público – Oscips; associações diversas); universidades e
centros de pesquisa; produtores culturais; pesquisadores; outros órgãos públicos etc.
Nas condições atuais de execução das ações nas instituições de patrimônio, são essas
instituições que muitas vezes realizam as pesquisas, participam das mobilizações,
atuam como mediadores nas ações de apoio e fomento, entre outros.
Referências Bibliográficas
ANDERSON, Benedict. Comunidade imaginada: reflexões sobre a origem e difusão do
nacionalismo. São Paulo: Cia. das Letras, 2008.
38
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
FONSECA, Maria Cecília L. O patrimônio em processo. Rio de Janeiro: UFRJ, MINC, IPHAN,
2005.
MAGALHÃES, Aloísio. E triunfo?: a questão dos bens culturais no brasil. Rio de Janeiro:
Nova Fronteira, 1997.
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PATRIMÔNIO IMATERIAL
Fórum de Discussão
O texto a seguir é a compilação dos debates realizados entre professor e alunos nos
fóruns de discussões da plataforma de educação a distância, tendo como base o texto
autoral do professor, publicado acima, e as seguintes perguntas orientadoras:
1. De acordo com o que foi tratado no texto, o que caracteriza o que chamamos
de Patrimônio Imaterial? Poderíamos dizer que ele se constitui como uma
dimensão específica dentro do campo do Patrimônio Cultural?
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FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
Esse valor é coletivo, é o que nos identifica, entra aí a ideia de identidade, ou seja, o
que nos define, não no sentido imutável, mas do reinventar, mobilizando elementos
do passado e do presente. Cultura e identidade são indissociáveis, pois a segunda nos
fornece referências para a construção de sentido de pertencimento, de continuidade
e de comunidade.
Por outro lado, aquilo que se entende como comunidade também não é homogêneo e
harmonioso. Há hierarquias, relações de poder, estruturas e dinâmicas próprias. O que
parece “homogêneo”, quando olhamos de fora a dinâmica de um determinado grupo,
ou o que identificamos como sua “identidade”, é uma representação, construída por
meio desses embates internos.
41
PATRIMÔNIO IMATERIAL
Observe-se que, um não vive sem o outro: se o bem que a comunidade indicar não
puder ser considerado Patrimônio Cultural segundo os critérios a e/ou b, não poderá ser
considerado Patrimônio Cultural – será um bem importante para aquela comunidade,
que pode receber apoio de outras políticas culturais, mas não um patrimônio.
42
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
39. Esta disciplina contou com duas professoras, Márcia Sant’Anna para a primeira turma e Rívia Bandeira para a segunda turma, optamos
por manter as informações geradas por ambas em cada uma das turmas.
40. Texto incorporado à primeira edição do curso a distância Patrimônio Imaterial: política e instrumentos de identificação, documentação e
salvaguarda, revisto e atualizado em abril de 2013.
41. BRASIL, 1988.
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PATRIMÔNIO IMATERIAL
O “suporte” dos valores atribuídos aos bens culturais imateriais são as pessoas e os
grupos que os mantêm, transmitem e, assim, possibilitam sua existência. Esses bens
estão inscritos nos corpos e mentes daqueles que lhes dão vida e, portanto, podem
apontar o que é importante e o que é referencial no contexto de sua preservação.
Assim, os detentores do PCI devem participar ativamente do processo de salvaguarda,
em todas as suas etapas: da identificação ao reconhecimento patrimonial e, daí, ao
apoio e fomento à continuidade da expressão cultural.
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FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
O Programa Nacional de Apoio à Cultura (Pronac), tanto no que toca ao Fundo Nacional
da Cultura quanto por meio do Incentivo a Projetos Culturais (Mecenato), tem sido
um instrumento igualmente importante para o desenvolvimento de articulações
com a sociedade, com vistas ao trabalho de salvaguarda do PCI. A Petrobras e a Caixa
Econômica Federal, por exemplo, lançaram, por meio desse programa, editais de apoio
a projetos afinados com as linhas de ação do IPHAN, e esse tipo de sinergia tem grande
alcance porque, além dos inventários que a instituição desenvolve e apoia, vários outros
trabalhos dessa natureza vêm sendo viabilizados pelo Pronac, o que torna mais viável a
meta de mapear as referências culturais em todo o território nacional.
45
PATRIMÔNIO IMATERIAL
A intenção do IPHAN, contudo, nunca foi ter o uso exclusivo dessas metodologias, mas
divulgá-las e compartilhá-las com o maior número possível de parceiros institucionais.
A metodologia do INRC, por exemplo, está disponível para qualquer órgão estadual ou
municipal de preservação que desejar utilizá-la, bastando, para tanto, que encaminhe
projeto para análise e posterior celebração de Termo de Uso e Responsabilidade com o
IPHAN. 43 Os procedimentos para o uso da metodologia e a inclusão de línguas no INDL
estão ainda em discussão.
Para que as ações de salvaguarda ocorram de modo integrado entre as esferas gover-
namentais, é fundamental o compartilhamento de métodos, categorias de análise e de
informações, o que torna ainda mais fundamental o papel dos inventários. Para produzir
conhecimento e implementar projetos de apoio a expressões que estão localizadas
em diferentes unidades da federação, esse compartilhamento é essencial, pois permite
cruzar dados e promover ações mais eficientes.
Instrumento de reconhecimento
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FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
foco, sobre as condições sociais, materiais e ambientais que propiciam sua existência,
o que possibilita diagnosticar os problemas que comprometem, ou que podem vir a
comprometer, sua continuidade, reprodução ou circulação.
Assim, da mesma forma que o inventário, o Registro não é perene: é sempre datado
e deve ser refeito após 10 (dez) anos do reconhecimento oficial. O objetivo desse
dispositivo é acompanhar as transformações ocorridas no bem cultural ou no contexto
que viabiliza sua existência, bem como reavaliar o Registro realizado. A função maior
do Registro é, portanto, firmar o compromisso de que o Estado envidará esforços para
fortalecer as condições que propiciam a continuidade do bem. Contudo, é importante
não se perder de vista que esse tipo de patrimônio é passível de desaparecimento,
não somente devido a ameaças ou fatores exógenos, mas também por eventual perda
de função simbólica, tecnológica ou mesmo econômica, junto à base social que o
sustenta. Nesses casos, o Registro realizado é mantido como documentação exaustiva
da expressão cultural, preservando-se, dessa forma, sua memória para a posteridade.
Como resultado da articulação realizada pelo IPHAN com o Programa Cultura Viva, do
MinC, a política de implementação de pontos de cultura foi articulada com os planos
de salvaguarda. Com isso, todos os bens culturais registrados passaram a fazer jus à
instalação de pontos ou pontões de cultura destinados a viabilizar a constituição de
centros de referência, que devem funcionar como locais de pesquisa, de promoção e
de transmissão das habilidades e conhecimentos vinculados às expressões registradas.
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PATRIMÔNIO IMATERIAL
Referências Bibliográficas
ABREU, Regina. ”Tesouros humanos vivos” ou quando as pessoas transformam-se
em patrimônio cultural: notas sobre a experiência francesa de distinção do “mestre
da arte”. In: ABREU, Regina, CHAGAS, Mário (Orgs.). Memória e patrimônio: ensaios
contemporâneos. Rio de Janeiro: DP&A, 2003. p. 81-94.
45. As oficinas do Balaio do Patrimônio Cultural contribuíram para a capacitação de funcionários das Superintendências Regionais do IPHAN
e de dirigentes e quadros técnicos de organismos estaduais e municipais das cinco regiões do país. Nesses encontros, foram distribuídas
publicações sobre a política federal de salvaguarda, sua legislação, conceitos, instrumentos e experiências significativas, tornando
disponíveis a esses parceiros documentos referenciais para a formulação de implementação de políticas específicas.
48
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
CRESPIAL. Estado del arte del patrimonio cultural inmaterial. Cusco, 2008.
49
PATRIMÔNIO IMATERIAL
UNESCO. Basic texts of the 2003 Convention for the Safeguarding of the Intangible Cultural
Heritage. Paris: UNESCO, 2010.
Fórum de Discussão
O texto a seguir é a compilação dos debates realizados entre professor e alunos nos
fóruns de discussões da plataforma de educação a distância, tendo como base o texto
autoral do professor, publicado acima, e as seguintes perguntas orientadoras:
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FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
No Brasil, até o momento, esse sistema foi adotado exclusivamente por governos
estaduais, já que no plano federal o sistema tem um foco mais abrangente, ou
seja, está voltado não apenas para a garantia da transmissão, mas também para as
condições sociais, ambientais e materiais que permitem a existência e a reprodução
dos bens culturais imateriais reconhecidos como patrimônio. Os sistemas estaduais
implementados diferem bastante do sistema da UNESCO, em termos de procedimentos
de seleção e de funcionamento, embora o foco seja também a valorização de detentores.
No que diz respeito à seleção, muitos estados definem os mestres que serão laureados
a partir de propostas que são encaminhadas a editais. Assim, não há um trabalho prévio
junto às comunidades e aos grupos sociais que se relacionam com o bem cultural,
para a identificação daqueles indivíduos ou grupos que aqueles consideram de fato
mestres. Essas propostas são julgadas por comissões de especialistas, conforme sugere
a UNESCO. Entretanto, a principal diferença entre o sistema internacional e os estaduais
é justamente a falta de articulação entre o mestre laureado e um programa efetivo
de transmissão. Outros problemas foram apontados, como a falta de critérios claros
para a seleção dos laureados; o caráter muitas vezes assistencialista dessas ações, sem
a contrapartida da transmissão do saber; o efeito de exclusão de outros detentores e
praticantes que também são fundamentais para a existência e a reprodução do bem
cultural. Essas reflexões não devem ser vistas como uma rejeição ao sistema. Ele pode
ser muito importante como ação de salvaguarda, sendo necessário fazer com que os
estados que o implementaram aperfeiçoem os seus sistemas, articulando-os, inclusive,
ao próprio sistema federal.
51
PATRIMÔNIO IMATERIAL
Foi ressaltado que os detentores têm um papel importante nos inventários, que
é o de transmissores do seu conhecimento às novas gerações. Entretanto, há outro
papel fundamental, que é o de identificar para o poder público – e, portanto, para
as equipes técnicas – os bens que devem ser inventariados. Com isso, a participação
dos detentores nos inventários vai ainda além, no sentido de que podem e devem
participar das próprias equipes de inventário, passando também a dominar suas
metodologias. Isso é fundamental porque, devido à sua natureza dinâmica, os bens
culturais imateriais devem ser documentados periodicamente, e ninguém melhor
para fazê-lo do que a própria comunidade detentora. Com isso, o inventário torna-se
também um instrumento de incentivo à autonomia do grupo. Um aspecto importante
mencionado é a questão do respeito aos direitos de imagem e de propriedade
intelectual dos detentores envolvidos.
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FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
Isso posto, fica cada vez mais claro que o Estado tem o papel essencial de promover
a possibilidade de compartilhamento e diálogo, difundindo informações e facilitando
o acesso a elas por diversos meios. Entretanto, é preciso estar atento ao perigo do uso
dessas estruturas organizativas para a homogeneização de identidades, a criação de
falsos consensos e a legitimação de grupos políticos. O antídoto contra esses riscos
é que essas estruturas sejam criadas efetivamente pelas bases sociais interessadas na
salvaguarda.
Introdução
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PATRIMÔNIO IMATERIAL
Instrumento de reconhecimento
1. Registro
Instrumentos de identificação
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FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
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PATRIMÔNIO IMATERIAL
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FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
Até então, foram realizados oito projetos-piloto para teste da metodologia em algumas
comunidades indígenas, afro-brasileiras, de imigração e de Libras. A expectativa do
IPHAN é concluir o manual de aplicação do INDL ainda este ano e divulgá-lo para a
sociedade em geral.
Instrumento de reconhecimento
Registro
Por outro lado, a noção de autenticidade aplicada ao Patrimônio Material também precisou
ser revisitada e foi substituída pela noção de continuidade histórica. Essa substituição
busca reconhecer a dinâmica particular de transformação do bem cultural imaterial, que
pode ser verificada por meio de estudos históricos e etnográficos que busquem observar
as características essenciais do bem e sua modificação ao longo do tempo.
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PATRIMÔNIO IMATERIAL
• Livro das Celebrações – para a inscrição de rituais e festas que marcam a vivência
coletiva do trabalho, da religiosidade, do entretenimento e de outras práticas
da vida social.
• Livro dos Lugares – para a inscrição de mercados, feiras, santuários, praças e demais
espaços onde se concentram e se reproduzem práticas culturais coletivas.
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FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
Conforme explicitado na aula anterior, item 4.2, o termo salvaguarda aplica-se a toda e
qualquer ação ou processo destinado a apoiar e fortalecer a existência dos bens culturais
de natureza imaterial. Não obstante isso, a política desenvolvida pelo IPHAN também
denomina ações de apoio e fomento como “ações de salvaguarda”. Nesse contexto,
salvaguardar um bem cultural de natureza imaterial significa atuar no sentido de apoiar e
buscar melhorar as condições sociais e materiais de produção, reprodução e transmissão,
buscar garantir meios para a continuidade do bem cultural de modo sustentável, e visar,
a longo prazo, à autonomia dos grupos detentores para a gestão de seu patrimônio.
Uma vez que o Patrimônio Cultural é uma riqueza de toda a nação, uma primeira
medida da salvaguarda consiste em buscar reconhecer parceiros, em todos os âmbitos
da sociedade, como instituições públicas locais e organizações não governamentais,
para o estabelecimento de uma agenda para o encaminhamento de demandas e
soluções para a realidade do bem registrado. Nesse sentido, o Departamento do
Patrimônio Imaterial do IPHAN recomenda a formação de um Comitê Gestor para a
Salvaguarda do Bem Registrado, formado por membros dos grupos detentores do
bem, representantes do IPHAN (DPI e Superintendências Estaduais envolvidas), dos
poderes públicos municipais e estaduais, e de outros segmentos da sociedade, para a
elaboração, a execução e a avaliação das ações, bem como para o acompanhamento
de seus desdobramentos.
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PATRIMÔNIO IMATERIAL
4. Difusão e Valorização
Esses eixos desdobram-se em 13 (treze) tipos de ações de salvaguarda, que podem ser
combinadas entre si para a execução em longo prazo. A depender do contexto de cada
bem registrado, é possível elaborar e implementar um conjunto de ações, nesse caso,
um Plano de Salvaguarda, com proposição de ações a curto, médio e longo prazo.
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FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
Há situações em que não é possível aguardar o Registro de um bem cultural para a rea-
lização de ações de salvaguarda. Ao longo da aplicação do INRC ou do desenvolvimen-
to de um processo de Registro, podem surgir situações prementes que necessitem do
apoio da política de salvaguarda. Nessa linha, apresentamos um exemplo de ação de
salvaguarda desenvolvida ao longo da instrução do Registro do bem cultural Cachoeira
de Iauaretê – Lugar Sagrado dos Povos Indígenas dos Rios Uaupés e Papuri (localizada na
região do Alto Rio Negro, distrito de Iauaretê, município de São Gabriel da Cachoeira,
Estado do Amazonas) no Livro dos Lugares em 10 de agosto de 2006.
No final dos anos 1920, missionários salesianos chegaram à região do Alto Rio Negro,
no Amazonas, com o objetivo de “civilizar” os povos indígenas por meio da catequese.
Compreenderam os ornamentos sagrados dos indígenas, que eram guardados e
utilizados cerimonialmente em rituais de iniciação e como objeto de troca entre grupos,
como “coisas do diabo”. Por esse alegado motivo, recolheram quase a totalidade dos
ornamentos e os levaram a museus ou os venderam para acervos particulares.
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PATRIMÔNIO IMATERIAL
Há ainda outra forma de ação de salvaguarda, que pode ser empregada a bens
culturais que não forem registrados ou que não estejam em processo de identificação
ou instrução de Registro. São as chamadas ações de salvaguarda emergenciais.
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FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
Os projetos podem ser apresentados por instituições públicas ou privadas sem fins
lucrativos, e devem seguir as orientações do edital de cada ano. É condição fundamental
para a aprovação do projeto a comprovação da participação e do consentimento
prévio das comunidades envolvidas ou das instituições que as representam.
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PATRIMÔNIO IMATERIAL
Ainda na linha de apoio e fomento, desta vez com o caráter de premiação, a UNESCO
realiza o Registro das Melhores Práticas de Salvaguarda. Nesse caso, o objetivo é divulgar
programas, projetos e atividades de salvaguarda que melhor refletem os princípios e os
objetivos da Convenção de 2003. Durante o período de 2009 a 2012, foram selecionados
10 programas, projetos e atividades. Dentre eles, duas experiências brasileiras: o Edital
do Programa Nacional do Patrimônio Imaterial, descrito acima, e o Museu Vivo do
Fandango.
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FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
Os segmentos culturais que podem ser contemplados pela Lei Rouanet são:
1. Artes cênicas;
2. Livros de valor artístico, literário ou humanístico;
3. Música erudita ou instrumental;
4. Exposições de artes visuais;
5. Doações de acervos para bibliotecas públicas, museus, arquivos públicos e
cinematecas, bem como treinamento de pessoal e aquisição de equipamen-
tos para a manutenção desses acervos;
6. Produção de obras cinematográficas e videofonográficas de curta e média
metragem, e preservação e difusão do acervo audiovisual;
7. Preservação do Patrimônio Cultural Material e Imaterial;
8. Construção e manutenção de salas de cinema e teatro, que poderão funcionar
também como centros culturais comunitários, em municípios com menos de
100.000 (cem mil) habitantes.
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PATRIMÔNIO IMATERIAL
À guisa de conclusão
Referências Bibliográficas
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FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
outras providências. Diário Oficial da União. Brasília, DF, 24 dez. 1991. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8313cons.htm>.
IPHAN. Patrimônio Imaterial: o registro do patrimônio imaterial – dossiê final das atividades
da Comissão e do Grupo de Trabalho Patrimônio Imaterial. 4.ed. Brasília, 2006a.
Fórum de Discussão
O texto a seguir é a compilação dos debates realizados entre professor e alunos nos
fóruns de discussões da plataforma de educação a distância, tendo como base o texto
autoral do professor, publicado acima, e as seguintes perguntas orientadoras:
Uma das discussões desenvolvidas nos fóruns da disciplina foi sobre o caráter
participativo na aplicação dos instrumentos de salvaguarda. De acordo com o Decreto
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PATRIMÔNIO IMATERIAL
Nesse sentido, foi discutida a importância de deixar clara a sutil diferenciação entre o
“caráter participativo” da Política de Patrimônio Imaterial e a “gestão compartilhada”.
Para a execução da política de salvaguarda do PCI, a participação dos detentores/
produtores é condição básica e insubstituível. Essa participação é considerada por
meio da escuta das demandas diretas dos detentores/produtores, como também pela
elaboração e execução de ações por eles próprios – isto é, criar condições para que
os detentores/produtores sejam sujeitos ativos na salvaguarda –, como pesquisadores
de suas referências culturais, elaboradores, monitores e avaliadores das ações de
salvaguarda, propositores de políticas públicas e interlocutores das instâncias oficiais
que promovem apoio e fomento ao patrimônio. São nestes dois últimos aspectos que
reside a “gestão compartilhada” que, a partir daí, deve ser amplificada.
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FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
Outra questão debatida durante os fóruns centrou-se no desafio que constitui viabilizar
a participação “real” desses detentores, uma vez que há diferentes problemas nessa
relação: da falta de conhecimento de muitos detentores, representantes que não
se legitimam a partir do interesse de todos, a interferências de empresas ou grupos
financeiros que, em troca de apoio financeiro, alteram de maneira danosa as práticas
de PCI.
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FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
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PATRIMÔNIO IMATERIAL
mas que não se descuidam da cautela, ou discrição, no trato com as diversas faces das
identidades socioculturais. Algumas das questões mais pertinentes serão discutidas a
seguir.
O Modo de Fazer Viola de Cocho foi registrado como Patrimônio Cultural do Brasil, no
Livro dos Saberes, em 2005. A instrução do processo reuniu informações, imagens,
vídeos e partituras, um material colhido nos municípios de Cuiabá, Santo Antônio de
Leverger, Nossa Senhora do Livramento, Poconé, Jangadas, Nobres, Várzea Grande, em
Mato Grosso, e em Corumbá e Ladário, no Mato Grosso do Sul.
Isso significa que aquilo que chamamos de território de uma prática cultural não se
trata de uma unidade territorial delimitada geopoliticamente, mas sim de uma região
que apresenta referências socioculturais partilhadas por determinadas populações,
vinculadas aos modos de vida, saberes e fazeres dessas populações. Mais do que uma
territorialidade disputada por dois estados, a região ao longo do Rio Cuiabá é base para
os cururueiros, que se deslocam rio abaixo e rio acima, para uma prática cultural que
passa ao largo de contendas administrativas.
Da mesma forma, o Ofício das Baianas de Acarajé, registrado no Livro dos Saberes em
2005, tomando como referência a cidade de Salvador (BA), se ramifica por outros
estados e municípios brasileiros nos quais as associações das baianas encontram
maior ou menor receptividade por parte dos poderes locais, muitos dos quais não se
mostram ainda sensibilizados para o fomento e a salvaguarda dos patrimônios culturais
existentes em suas regiões.
Nesse sentido, a visibilidade conferida ao bem cultural é ponto fundamental para sua
proteção e preservação. A reivindicação de legitimidade como representante de uma
prática cultural, isto é, o exercício e o domínio dos sentidos e significados que revestem
o bem cultural, dificilmente ocorre sem conflitos e tensões entre os atores sociais
envolvidos nesse diálogo. O reconhecimento público advindo da titulação confere aos
grupos praticantes a possibilidade e o direito de interlocução com os poderes públicos
e com a sociedade mais ampla. É por meio dessa interlocução que se torna possível
e viável a construção de um conceito de patrimônio mais condizente com o cenário
cultural que se deseja.
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FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
Nunca é demais insistir na cautela que deve acompanhar a promoção de uma prática
cultural. Embora a visibilidade seja um dos vetores no campo de forças da valorização
da diversidade cultural, corre-se o risco da banalização e da folclorização das práticas
e expressões. A espetacularização de danças e celebrações modifica a duração do
ritual, o tempo social em que ele ocorre, afetando também as vinculações com outras
dimensões culturais das quais ele faz parte. Isso ocorre porque uma política para o
fomento e a proteção do Patrimônio Cultural não se restringe à manifestação, mas
atinge o cotidiano e se estende ao modo de vida dos grupos envolvidos.
A transmissão dos saberes e fazeres das culturas populares exige a participação direta
dos mestres, mestras e demais praticantes. Tomando novamente como ilustração o
Modo de Fazer Viola de Cocho, as oficinas de repasse de saber, bem-sucedidas de modo
geral, contaram com uma dificuldade que atinge diretamente a técnica artesanal.
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PATRIMÔNIO IMATERIAL
Foram realizados diversos acordos de cooperação para garantir aos mestres o acesso à
matéria-prima. A Fundação Dom Aquino se prontificou a obter as mudas de ximbuva
e delas cuidar até a época de replantio em local definitivo. A partir daí, a Universidade
Federal de Mato Grosso (UFMT) poderia se encarregar do cultivo e ofereceu também
áreas para o replantio no campus. Entretanto, além da preservação e multiplicação da
espécie nativa, os mestres precisam de licenciamento para o corte. O replantio deve
ocorrer em área onde lhes seja possível cortar o tronco para a confecção do corpo da viola.
O modo de confecção, a ser transmitido pelos mestres, inicia-se com o próprio corte da
madeira, que deve ser feito sempre na lua minguante, ou ela corre o risco de ser atacada
por carunchos. O corte também requer uma técnica específica para que a madeira
não trinque ou fissure. Em virtude da legislação ambiental em prol da manutenção
do ecossistema, algumas das matérias-primas empregadas tradicionalmente na
confecção da viola de cocho não são mais viáveis e foram substituídas. As tripas de
macaco, quati e ouriço, utilizadas para as cordas, foram substituídas por linhas de pesca
de diferentes espessuras, e a cola industrializada substituiu um grude feito a partir de
uma pequena bexiga natatória de peixes, conhecida como poca. As dificuldades que
envolvem o licenciamento para o corte, porém, ainda não foram superadas e requerem
uma participação direta dos poderes locais, para a reserva de uma área específica que
possibilite o acesso dos mestres.
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FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
Por outro lado, o modo de fazer renda irlandesa em Divina Pastora emprega a linha de
algodão industrializada e o cordão lacê, fabricado pela Ypu, para o contorno dos moldes.
O repasse de saber, porém, anteriormente transmitido informalmente como parte de
um modo de vida compartilhado pelas mulheres, envolvendo relações de parentesco
e vizinhança, o que conferia relações mais duradouras entre mestras e aprendizes, hoje
se difunde por meio de cursos institucionais e se expande por outras localidades. Os
municípios de Laranjeiras, Estância, Barra dos Coqueiros e Aracaju sediaram cursos de
75
PATRIMÔNIO IMATERIAL
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FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
la de forma adequada. Por sua vez, as artesãs de Barreirinhas aprenderam uma forma
diferente de retirar a fibra do olho de buriti e um novo ponto de crochê, com o qual
prometeram desenvolver uma bolsa e chamá-la de bolsa Canguçu.
O peso das desigualdades sociais se faz sentir em várias instâncias, e não poderia deixar
de afetar os mecanismos de acesso aos recursos para fomento. O desenvolvimento
de uma política pública para a cultura deve levar em conta a inadequação do sistema
administrativo e jurídico para a seleção de projetos, celebração de convênios, repasse
de recursos e prestação de contas. Tal sistema é incapaz de incorporar segmentos
sociais que não dominam esses códigos, muitas vezes iletrados ou que não dispõem
da documentação mínima para o acesso a recursos e oportunidades. A cautela previne
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PATRIMÔNIO IMATERIAL
A transformação social ampla e efetiva pela qual nos empenhamos terá que se
beneficiar de ações de educação patrimonial que disseminem o conhecimento sobre
nossos bens culturais, para que a própria sociedade queira preservá-los.
As cuias de Santarém (PA) são confeccionadas a partir dos frutos da árvore Crescentia
cujete, conhecida localmente como cuieira, que, seguindo tecnologias tradicionais de
matrizes indígenas, são cortados ao meio, lixados, tratados, tingidos por pigmentos
naturais e ornamentados com desenhos e incisos. As cuias são utilizadas como
recipientes para água, chá, café, cachaça, açaí, mingaus e, sobretudo, para o tacacá, um
dos pratos de referência cultural nos estados da Região Norte do Brasil, que é servido
em cuias pelas tacacazeira. No município de Santarém, a produção de cuias ocorre
principalmente nas comunidades das várzeas do Rio Amazonas, mais especificamente
na região do Aritapera, distante de Santarém de três a seis horas de viagem de barco,
abarcando cinco comunidades – Centro do Aritapera, Carapanatuba, Enseada do
Aritapera, Surubim-Açu e Cabeça d’Onça –, que distam entre si cerca de duas horas de
viagem de barco.
Em 2005, a Associação das Artesãs Ribeirinhas de Santarém (Asarisan)
captou recursos junto ao Ministério da Cultura, via edital público, para
um projeto de implantação do Ponto de Cultura do Aritapera, no
Centro do Aritapera. O projeto previu, além de uma ação educativa,
uma sala de leitura com biblioteca comunitária, além de espaços
de reunião, produção, exposição e comercialização de cuias, com
o objetivo de contribuir para o aprimoramento das condições de
trabalho, divulgação e comercialização da produção.
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FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
rico material coletado entre os jovens estudantes foi completado com conteúdos que
trazem diversos traços culturais, trabalhando a familiaridade e o estranhamento para
um pensar sempre renovado.
Referências Bibliográficas
BELAS, Carla Arouca. Capim dourado: costuras e trançados do Jalapão. Rio de Janeiro:
IPHAN, CNFCP, 2011. (Sala do artista popular, 145).
BEZERRA, Aída; COSTA, Renata (Orgs.). Almanaque Pitinga. Rio de Janeiro: IPHAN, CNFCP,
2011.
CARNEIRO, Edison. A sabedoria popular. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2008.
CARVALHO, Luciana. Cuias de Santarém. Rio de Janeiro: Funarte, CNFCP, 2003. (Sala do
artista popular, 108).
CASTRO, Maria Laura Viveiros de; FONSECA, Maria Cecília Londres. Patrimônio imaterial
no Brasil: legislação e políticas estaduais. Brasília: UNESCO, Educarte, 2008.
DANTAS, Beatriz Góis. Renda de Divina Pastora. Rio de Janeiro: IPHAN, CNFCP, 2011. (Sala
do artista popular: extra série).
DIAS, Letícia; VIANNA, Letícia. Viola de cocho pantaneira. Rio de Janeiro: Funarte, CNFCP,
2003. (Sala do artista popular, 109).
79
PATRIMÔNIO IMATERIAL
LIMA, Ricardo. O traiado e o urdido: tecidos de buriti dos Gerais da Bahia. Rio de Janeiro:
IPHAN, CNFCP, 2008. (Sala do artista popular, 141).
YÚDICE, George. A conveniência da cultura: usos da cultura na era global. Belo Horizonte:
Editora UFMG, 2004.
Fórum de Discussão
O texto a seguir é a compilação dos debates realizados entre professor e alunos nos
fóruns de discussões da plataforma de educação a distância, tendo como base o texto
autoral do professor, publicado acima, e as seguintes perguntas orientadoras:
3. Até que ponto as expectativas dos mediadores culturais e a dos grupos estão
em sintonia, e como essa interlocução pode ser afinada?
Uma das discussões desenvolvidas nesta disciplina foi sobre como promover
a autonomia dos grupos produtores de bens culturais no acesso a recursos e
oportunidades, no contexto brasileiro, marcado por grande diversidade cultural e
desigualdades sociais. De acordo com o debatido, não há uma receita única sobre
como possibilitar maior autonomia para o grupo, já que essa autonomia não é algo
dado pelo poder público, mas um caminho que deve ser construído conjuntamente.
80
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
Nota-se que essas ações dizem respeito a políticas de inclusão social. É por isso
que o fomento ao Patrimônio Cultural deve ser encarado como um vetor para o
desenvolvimento econômico e social. Assim, nota-se que muitas vezes, os problemas
enfrentados pelos grupos dependem de outras políticas e da atuação de outros
ministérios. Fomento e salvaguarda do Patrimônio Cultural, podem vir a nos solicitar
a capacidade de formar parcerias, de dialogar com outros poderes, de articular ações
para além daquilo que nos compete.
Outro aspecto discutido foi até que ponto as expectativas dos mediadores culturais
e dos grupos estão em sintonia, e como essa interlocução pode ser afinada. A
sintonia entre mediadores culturais e grupos somente acontece quando: o diálogo
está presente; é possível estabelecer metas, propostas e projetos de salvaguarda, que
tenham critérios definidos em conjunto para avaliação do bem cultural; está de acordo
com mecanismos legais constantes no Plano Nacional de Cultura; há valorização,
por parte dos mediadores, dos aspectos sociais, econômicos, espirituais e materiais
dos detentores; há processos efetivos de educação patrimonial; há respeito ao
conhecimento acumulado pelos grupos; há compreensão por parte do mediador e
entendimento por parte dos grupos sobre o que seja salvaguarda. Esta última, então,
é muito mais importante do que se pode imaginar. Outras vezes, os grupos nutrem
expectativas bastante elevadas com relação ao alcance de um plano de salvaguarda.
E às vezes, pelo contrário, deixam de usufruir de parcerias que poderiam lhes ser
benéficas. Essa pequena lista acima parece simples e óbvia, mas é bom tê-la sempre
em mente porque as relações interpessoais, como todos nós já experienciamos, são
campo fértil para mal-entendidos.
Outro ponto de debate foi sobre quais poderiam ser os indicadores para a avaliação de
uma ação de fomento ou salvaguarda bem-sucedida. Alguns indicadores de avaliação
das ações bem-sucedidas de fomento ou salvaguarda do PCI seriam, entre outras, as
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PATRIMÔNIO IMATERIAL
Introdução
82
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
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PATRIMÔNIO IMATERIAL
Tal como já dito, a UNESCO desenvolveu uma série de instrumentos jurídicos para
ajudar os Estados a oferecer uma melhor proteção à cultura, em todas suas formas. Esses
instrumentos são apresentados como declarações, recomendações ou convenções,
assim definidos:
Destas, chamo a atenção para três, as quais contribuem para a promoção da diversidade
cultural e apresentam-se, em alguns aspectos, de forma complementar. São elas: as
Convenções de Proteção ao Patrimônio Mundial Cultural e Natural (1972), de Proteção e
Promoção da Diversidade das Expressões Culturais (2005) e a Salvaguarda do Patrimônio
Cultural Imaterial (2003). Se se consultar o material de suporte ao desenvolvimento
84
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
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PATRIMÔNIO IMATERIAL
Grande parte do PCI não seria viável, se não houvesse remuneração direta ou indireta
pelo tempo e outros investimentos associados à sua prática e transmissão. Cada vez
mais, e de formas diferentes, as pessoas desejam beneficiar-se financeiramente do
conhecimento e das habilidades associadas ao PCI – por meio do acesso a novos
mercados, por exemplo, geralmente fora da comunidade. A promoção do PCI ou a
conscientização a respeito dele podem gerar novos benefícios financeiros ou de outra
natureza para as comunidades envolvidas.
86
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
Introdução à Convenção
Objetivos
Para alcançar esses objetivos, duas listas e um registro de melhores práticas de salvaguarda
foram estabelecidos pela Convenção. Os Estados-partes poderão indicar elementos
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PATRIMÔNIO IMATERIAL
para inscrição nas listas, assim como indicar, para inscrição no registro das melhores
práticas de salvaguarda e outras experiências na implementação da Convenção.
Órgãos da Convenção
Diretrizes Operacionais
88
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
• Preparação de inventários;
89
PATRIMÔNIO IMATERIAL
Listas
Entretanto, nos primeiros anos de sua implementação, houve uma leitura por parte dos
Estados-partes no sentido de encarar a Lista de Salvaguarda Urgente como um tipo
de punição ou de maneira negativa. Esse tipo de interpretação fez com que houvesse
uma grande demanda pela inclusão de manifestações na Lista Representativa, vista
como um prêmio, e nenhuma na de Salvaguarda Urgente. Esse tipo de interpretação
consistiu em um equívoco, uma vez que esta última serve unicamente como um
processo de estabelecimento de prioridades quando da destinação de recursos do
Fundo do PCI. Assim, aqueles bens inscritos na Lista de Salvaguarda Urgente têm
prioridade no recebimento de recursos, em detrimento daqueles que estão na Lista
Representativa. Além disso, os bens inscritos na Lista de Salvaguarda Urgente podem
ser retirados e enviados para a Lista Representativa assim que o Estado-parte avaliar
como pertinente para tal – quando as medidas de salvaguarda tenham surtido efeito e
a manifestação não esteja mais sob ameaça.
90
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
Alguns aspectos são particularmente importantes nessa definição dada pela Convenção
de 2003. O primeiro deles está relacionado com o caráter de “expressões vivas”, porque
fazem parte do cotidiano das comunidades, as quais consideram essas manifestações
partes importantes do seu sentimento de identidade e continuidade. “Vivas”, ainda,
porque estão sujeitas a mudanças constantes, em função dos novos significados
conferidos por seus detentores, no caminho da construção de sua realidade.
Por fim, considero importante chamar a atenção, neste tópico, para o fato de que
as expressões reconhecidas do Patrimônio Imaterial devem ser compatíveis com os
instrumentos jurídicos internacionais existentes em matéria de direitos humanos e
com os imperativos de respeito mútuo entre comunidades, grupos e indivíduos. Essa
é uma questão importante quando se trata de determinadas culturas que envolvem,
em suas práticas tradicionais, formas de submissão e agressão aos direitos humanos.
Geralmente, esse tipo de prática envolve mulheres, crianças e disputas com outros
grupos, e não podem ser consideradas como PCI no âmbito da Convenção.
91
PATRIMÔNIO IMATERIAL
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FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
Esta definição ampla nos permite compreender que as ações de salvaguarda do PCI
são tantas quanto são os grupos e as manifestações. Assim, não há uma receita pré-
estabelecida que garanta o sucesso de um processo de salvaguarda. Em alguns casos,
garantir a salvaguarda pode ser garantir a disponibilidade de matéria-prima para a
realização de determinada atividade. Em outros, pode ser cuidar da saúde infantil – em
uma comunidade em que há elevado índice de mortalidade nos primeiros anos de vida
– e, em outros ainda, pode ser intermediar um processo de transmissão geracional, em
função da perda de interesse dos mais jovens pelas práticas tradicionais.
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PATRIMÔNIO IMATERIAL
Todos os processos de salvaguarda devem se iniciar com uma avaliação dos fatores
que ameaçam a representação e/ou a transmissão. A partir dessa análise, devem--se
dimensionar os riscos a que o elemento do PCI está submetido, as medidas adequadas
para garantir sua salvaguarda e a urgência com que essas ações devem ser empreendidas,
bem como os parceiros ou potenciais parceiros a serem envolvidos nesse processo.
Para garantir a participação comunitária nas atividades relativas ao seu PCI e dar-lhes
assistência na sua salvaguarda, faz-se necessária uma discussão informada entre os
membros da comunidade sobre os vários interesses e perspectivas da comunidade
envolvida e os de outros atores. Em seguida, pode haver discussões com esses outros
atores, incluindo especialistas e agências governamentais.
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FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
Estados
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PATRIMÔNIO IMATERIAL
Três DOs (DO 23, 81 e 82) também impõem obrigações aos Estados-partes por meio da
utilização do termo deverão:
Comunidades envolvidas
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FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
portadores de tradições ativos. É por isso que a Convenção solicita que eles participem
da identificação e da definição do seu PCI, assim como da sua gestão. Também por isso,
as DOs insistem na participação das comunidades envolvidas, bem como em ter seu
consentimento, em qualquer atividade de salvaguarda e em outras que envolvam seu
PCI, executadas nos Estados-partes.
Um aspecto importante a destacar é que, embora as pessoas não possam fazer uso
da Convenção para estabelecer direitos de propriedade intelectual sobre o seu PCI,
ou para substanciar reivindicações territoriais ou históricas, a Convenção reconhece a
tutela que as comunidades envolvidas exercem sobre seu próprio PCI.
Diversas tarefas possíveis são indicadas para as ONGs, especialistas e vários tipos de
instituições e organizações na implementação da Convenção, tanto no âmbito nacional
como no internacional (Artigos 8, 9 e 11(b); DOs 79-96).
A Convenção faz referência explícita a possíveis tarefas para as ONGs (nos Artigos 9
e 11(b)), mas diz pouco sobre outros tipos de organizações. Ela apenas menciona
a conveniência de se ter organismos com competência no âmbito nacional para
salvaguardar o PCI, assim como instituições de treinamento e documentação (Artigo
13). As DOs, por outro lado, recomendam muitas atividades possíveis que podem ser
97
PATRIMÔNIO IMATERIAL
• identificar, definir e inventariar o PCI (Artigos 11(b) e 12; DOs 80 e 90) (em
11(b), a Convenção menciona apenas as ONGs, então, na DO 90, elas são
novamente mencionadas);
Desenvolvimento sustentável
No Artigo 2.1, a Convenção deixa claro que para efeito da Convenção, não será
levado em consideração o PCI que não for compatível com os requerimentos do
desenvolvimento sustentável.
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FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
O PCI é praticado e transmitido pelas comunidades envolvidas por razões que incluem
a manutenção de seu sentido de identidade e continuidade, o seu bem estar social,
o controle de seu ambiente natural e social e a geração de renda. Muito do que é
denominado conhecimento tradicional ou indígena é ou pode ser integrado em
assistência à saúde moderna, educação e gestão do ambiente natural e social. O
conhecimento e as práticas relativas à natureza e ao universo podem também ajudar a
garantir a disponibilidade sustentável de recursos naturais específicos necessários para
a prática de um elemento do PCI.
Uma vez que salvaguardar o Patrimônio Imaterial significa garantir que ele continue a
ser praticado nos dias atuais sem comprometer a habilidade das gerações futuras de
usufruírem do mesmo no futuro, o Patrimônio Imaterial pode contribuir e se beneficiar
das agendas de desenvolvimento sustentável.
O escopo deste processo de capacitação inclui apoiar a revisão das políticas e legislação,
o redesenho da infraestrutura institucional para atender às necessidades de salvaguarda
do PCI, o desenvolvimento de métodos e sistemas de inventário, o envolvimento de
todos os interessados e a valorização do conhecimento e habilidades necessárias para
solicitar assistência internacional ou apresentar candidaturas às Listas da Convenção.
99
PATRIMÔNIO IMATERIAL
Para tanto, foram elaborados materiais de treinamento, como power points, manuais,
exercícios e formulários de avaliação, e foram treinados 65 peritos regionais (25 deles
da África, sendo 40% destes, mulheres). Esta rede de facilitadores realizou, de 2010 até
o presente momento, mais de 60 atividades de capacitação em todo o mundo, tanto
no sentido de capacitar governos locais para a ratificação da Convenção quanto para a
realização de inventários e outras atividades de salvaguarda.
Anexo I
Estudo de caso
Tradições e práticas associadas aos Kayas nas florestas sagradas dos Mijikenda foram
inscritas na LSU em 2009. Trata-se de música tradicional e danças, orações e canções,
a produção de objetos de rituais sagrados, assim como práticas de rituais e cerimônias
e uma consciência aguda e conhecimento do mundo natural, associado com Kayas
do Mijikenda. Kayas são lugares sagrados nas florestas, delineando o litoral do Quênia,
onde viviam os ancestrais do Mijikenda. Hoje, os Mijikenda já não vivem nos Kayas,
porém retornam a elas para práticas tradicionais. Alguns dos Kayas foram inscritos na
Lista de Patrimônio da Humanidade, que tem incentivado um número crescente de
turistas a visitá-los.
100
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
Consentimento da comunidade
101
PATRIMÔNIO IMATERIAL
Para quem quiser ter mais informações, pode acessar o link abaixo, onde encontrarão
textos, fotos e um vídeo sobre este processo. Esse material está em inglês, mas ainda assim,
vale a pena conferir: <http://www.UNESCO.org/culture/PCI/index.php? USL=00313>.
Referências Bibliográficas
BRAYNER, Natália Guerra. Patrimônio cultural imaterial: para saber mais. Brasília: IPHAN,
2007. Disponível em: <http://www.iphan.gov.br/portal/baixaFcdAnexo.do?id=3172>.
TEIXEIRA, João Gabriel L.C. et al (Org). Patrimônio imaterial, performance cultural e (re)
tradicionalização. Brasília: ICS-UNB, 2004.
VIANNA, Letícia C. R.; SALAMA, Morena R. L. Avaliação dos planos e ações de salvaguarda
de bens culturais registrados como patrimônio imaterial brasileiro. In: CALABRE, Lia
(Org.). Políticas culturais: pesquisa e formação. São Paulo: Itaú Cultural; Rio de Janeiro:
Fundação Casa de Rui Barbosa, 2012.
Fórum de Discussão
O texto a seguir é a compilação dos debates realizados entre professor e alunos nos
Fóruns de discussões da plataforma de educação a distância, tendo como base o texto
autoral do professor, publicado acima, e as seguintes perguntas orientadoras:
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FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
Uma das discussões desenvolvidas nessa disciplina foi como identificar e categorizar
os riscos e ameaças a que está submetido uma manifestação de PCI. De acordo com
a Convenção de 2003, ameaças à viabilidade são problemas atuais que dificultam a
promulgação e a transmissão do elemento. Riscos são problemas previstos. Tendo
como base esta definição inicial, foi ressaltada a necessidade do envolvimento
da comunidade que detém o PCI, para a identificação das ameaças e riscos. Foram
debatidas algumas metodologias para se estruturar um trabalho de identificação de
riscos.
Fatores intrínsecos:
Ausência de mapeamento, identificação, inventário e registro do PCI; falta de
interligação entre as várias áreas do conhecimento (popular e científico) que podem
atuar como aliados na promoção, capacitação, mediação e divulgação do savoir faire;
perda (morte) dos mestres dos saberes sem haver passado seu conhecimento as novas
gerações; dificuldades econômicas; falta de matéria-prima; preconceito sobre algumas
expressões do PCI; a falta de interesse das gerações mais novas em dar continuidade à
manifestação do PCI; a questão da fragilidade social familiar e de grupos locais.
Fatores extrínsecos:
Desenvolvimento urbano descontrolado; modismo cultural; teatralização das
manifestações culturais; divulgação da cultura de massa; falta de financiamento e
103
PATRIMÔNIO IMATERIAL
Foi discutido que uma boa metodologia para este levantamento é a técnica da
FOFA (Fortalezas e Oportunidades, Fraquezas e Ameaças) ou análise de SWOT, como
também é chamada. Esse processo deve ser considerado como parte de um plano
de salvaguarda e a análise deve ser realizada em conjunto com a comunidade. Uma
sequencia de trabalho possível é elencar cada um dos problemas internos e analisá-los
por meio da utilização do marco lógico, baseado na árvore de problemas e soluções.
A partir da transformação da árvore de problemas em árvore de soluções, é possível
realizar a montagem de uma matriz com as metas e objetivos aí expressos. Esta matriz
é a base do Plano de Salvaguarda.
Outro ponto discutido foi acerca de quais os riscos e possibilidades que processos de
geração de renda, de patrimonialização e de inclusão nas Listas da UNESCO podem
trazer para as manifestações de natureza imaterial.
Riscos Possibilidades
Mercantilização do PCI Difusão do PCI
Padronização do PCI Visibilidade do PCI
Descontextualização do PCI Valorização do PCI
Hierarquização do PCI Universalização do PCI
Salvaguarda do PCI
Apropriação do PCI por outros grupos
Autossustentação do PCI
A Convenção de 2003 e suas DOs sugerem várias formas gerais de mitigar riscos
decorrentes da geração de renda. Além das apresentadas, as comunidades e outras
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FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
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PATRIMÔNIO IMATERIAL
Do que se fala
A noção exata do que seja patrimônio é relativa, depende de quem fala e de que
ponto de vista se fala. Mas geralmente remete à riqueza que é construída, reconhecida,
conservada e transmitida. Um legado no melhor sentido. Patrimônio é um conceito,
portanto, passível de conter múltiplos significados socialmente compartilhados ao
longo da história de cada sociedade. No âmbito do Estado Moderno73 e em termos
gerais, a noção de patrimônio é muito importante historicamente. Diz respeito ao
valor definido e declarado a certo bem e estabelece titularidade deste bem a alguém
que passa a ter o direito de transferência. Este valor é constituído e definido como
bem patrimonial em função de um rol de interesses, legislações e regulamentações
para a proteção de direitos de propriedade, de titularidade (individuais, familiares,
institucionais, coletivas, nacionais) jurisprudências para solução de conflitos, atribuições
cartoriais, procedimentos de reconhecimento e certificações, normas, impostos e taxas
para manutenção e transferências desses bens.
73. A forma de organização política e social que é bastante plástica, presente, abrangente e permeável a diversas culturas e
sociedades.
106
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
que transcendem à natureza humana e são fundamentais para sua manutenção, como
fauna, flora, águas e ar, já são nominados patrimônio na medida em que se percebe a
possibilidade de privação a partir da experiência concreta para alguns segmentos das
sociedades nacionais.
Mas um ponto muito importante precisa ficar bem entendido: todo grupo ou segmento
social, toda comunidade, nação ou etnia constrói, mantém transmite e reinventa
referências culturais baseadas em história e tradição. Essas referências balizam um
sistema simbólico compartilhado e a coesão interna do grupo. Referências culturais são,
por tanto, fundamentos de identidades perante outros coletivos humanos. O que se
pode acrescentar aos conceitos correntes para o Patrimônio Imaterial é a perspectiva
de certa tangência de referencia cultural com a ideia de communitas,74 no sentido mais
amplo de sentimento de pertencimento e participação dos indivíduos em um coletivo
(grupo, segmento, comunidade, nação); um estado de comunhão entre pessoas que
transcende as estruturas formais de regulação e coesão social externas aos grupos. Este
sentimento de pertencimento é, assim, expresso por determinadas referências culturais
- signos, símbolos, práticas, conhecimentos - potenciais objetos de patrimonialização.
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PATRIMÔNIO IMATERIAL
pela sociedade nacional. Então, como fazer? Ou como desfazer ou fazer diferente as
bases para esta relação contraditória, na perspectiva de um equilíbrio em relação a
direitos, deveres e benefícios entre as partes envolvidas. Será possível? A história dirá!
Por hora, podemos refletir sobre alguma experiência acumulada.
A história da política para o Patrimônio Cultural no Brasil mostra que a política foi
excludente, por muitas décadas, na medida em que o reconhecimento foi feito
sobretudo das expressões da cultura de matriz europeia , branca, católica, “erudita”,
em detrimento das expressões das culturas populares historicamente presentes
na constituição da sociedade nacional. Entretanto, muitas experiências já realizadas
nas últimas décadas, sobretudo a partir do Decreto n° 3551/200075, apontam outras
possibilidades com base no relativismo cultural e a proposição de a política nacional
para o Patrimônio Cultural ser inclusiva a partir do reconhecimento da diversidade
cultural do país como o patrimônio a ser preservado. E nos últimos dez anos foram
realizadas experiências no IPHAN que atestam a viabilidade de diálogo profícuo entre
Estado e Sociedade no sentido da gestão compartilhada do patrimônio. É isso que
pretendo contextualizar historicamente: essa possibilidade concreta de participação
social na execução da política de salvaguarda do Patrimônio Imaterial implementada
pelo IPHAN na última década.
E a política se faz...
A política para o Patrimônio Cultural se estabelece a partir de uma relação do Estado por
meio do IPHAN com a Sociedade, por seus segmentos, grupos, comunidades arroladas
nos processos. Uma relação; e não necessariamente um diálogo.
No Brasil o primeiro marco legal que institui política para o Patrimônio Cultural tem
como base o conceito de patrimônio histórico e artístico nacional. Trata-se do Decreto 25
75. BRASIL, 2000.
108
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
Não podemos esquecer que o contexto internacional era tenso… guerras e acirramento
de necessidade de afirmação de identidades e soberanias nacionais. O Brasil estava
na Era Vargas. A indústria cultural a todo o vapor, difundindo revistas, aparelhos de
rádio e entretenimento à massa de trabalhadores consumidores, conformando uma
cultura popular urbana hegemônica e supostamente homogeneizante, construída a
partir da estilização de expressões culturais tradicionais dos vários segmentos sociais
urbanos e rurais.
Fato é que a política para o patrimônio histórico e artístico nacional até a década de 80
do século vinte foi fundamentalmente voltada para a patrimonialização de expressões
culturais de tradição europeia, católica, colonial, bem constituídas em sua materialidade.
Isto é, a política foi construída sob uma perspectiva que privilegiou expressões de
uma cultura de segmento social hegemônico no poder e privilegiado no processo de
concentração de riqueza. Essa tendência predominou na política do IPHAN até os anos
80 – década em que os primeiros e, até hoje, poucos bens expressivos da diáspora
africana no território foram tombados, por exemplo.
Por outro lado, ao longo da primeira metade do século XX, – os estudiosos do folclore
como Silvio Romero, Amadeu Amaral, o próprio Mário de Andrade, Edison Carneiro,
entre outros, traziam à luz um Brasil de tradições culturais várias – uma riqueza fadada
ao desaparecimento completo dado o anacronismo em relação ao mundo moderno.
No final dos anos 40 houve, em consonância com o contexto internacional pós-guerra e
movimentos na mesma direção, um movimento de intelectuais, pesquisadores, artistas,
diplomatas, professores que culminou em uma instituição denominada Campanha de
Defesa do Folclore Brasileiro. O trabalho, ou a política desenvolvida pela instituição não
era a de patrimonializar, isto é, ato jurídico no qual o poder público reconhece o fato
cultural como patrimônio do município, do estado ou da federação; e passa a qualificá-
lo como bem de interesse público. Havia, sim, ações para a salvaguarda do folclore e
dos conhecimentos por meio de pesquisas, documentação, do apoio e fomento das
práticas culturais identificadas como folclore. A constituição do campo dos estudos
109
PATRIMÔNIO IMATERIAL
No final da década de 1970, décadas de 1980 e 1990, sobretudo a partir das diretrizes
apresentadas pelo então criado Centro Nacional de Referências Culturais no âmbito
do Ministério da Educação e Cultura, a política para o folclore tendeu mais ao
reconhecimento da diversidade cultural como valor a ser preservado e conhecido
por meio de pesquisas etnográficas detalhadas, ações de fomento com base em
diagnósticos, ações e projetos desenvolvidos por especialistas implementados em
grupos e comunidades, com vistas à geração de renda e continuidade das expressões
culturais por meio do mercado. As expressões tradicionais das culturas populares
não eram mais consideradas anacrônicas e descontextualizadas, mas expressões
da riqueza cultural do país… um potencial a ser tratado, adaptado e revitalizado…
incorporado como revitalizador da identidade nacional por meio de todo o aparato
moderno. A palavra folclore é praticamente banida do vocabulário das políticas
públicas, em detrimento de cultura popular. A tradição e a modernidade propulsoras
de desenvolvimento! Era um momento de “abertura política”… e os movimentos
sociais alargaram mesmo a identidade e as bases da cidadania no país.
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FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
O marco legal para uma nova perspectiva é a Constituição Brasileira de 1988 – a Constituição
Cidadã – consolidada a partir de um processo de amplo debate dos parlamentares
com a sociedade civil que revelou a diversidade cultural brasileira como um valor a
ser reconhecido e enfatizado na identidade nacional. Em seus artigos 215 e 216 ficam
definidas duas dimensões – material e imaterial – para o Patrimônio Cultural nacional.
Até 2000 aconteceram estudos, debates, foi criado um grupo de trabalho, o GTPI, para
esboçar texto do Decreto n° 3.551 de 200076 e as linhas gerais do Programa Nacional
de Patrimônio Cultural (PNPI) – primeiros passos para a regulamentação dos artigos
constitucionais. Nesse processo há um claro reconhecimento de que a política
desenvolvida até então estava sendo excludente para com vários segmentos da
população de detentores de saberes tradicionais de matrizes não europeias, católicas,
eruditas; referências e expressões culturais significativas da imensa riqueza e diversidade
cultural – fundamentais para a identidade de país diverso culturalmente – interessante
de ser cultivada naquele momento.
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PATRIMÔNIO IMATERIAL
E, desde então, vão sendo criadas as balizas conceituais, algumas instruções normativas
e procedimentos. Um ponto fundamental a ser destacado é a centralidade do conceito
antropológico de cultura como base para o conceito de identidade e Patrimônio Cultural.
Isto é, transcende-se o histórico e artístico para abarcar um universo maior de fatos da
cultura. Trata-se assim da tentativa, desde o início, de constituir uma “política inclusiva”.
Inclusão do que estava excluído do rol de referencias da identidade nacional; até então
referências das belas artes, da história colonial, católica, branca de matriz europeia.
Voltava-se então para as expressões das culturas populares de múltiplas tradições de
ocorrência no território.
A diversidade cultural passa a ser uma espécie de dogma pelo qual se deve zelar. Ponto
passivo; embora tenha sido difícil quebrar, como por encanto, uma postura secular de
uma estrutura burocrática como a do Estado Brasileiro. Entretanto, chegamos até aqui.
E podemos seguir no esforço de abrir perspectivas diferentes das estabelecidas. Não
tão rápido como deveriam, as mudanças vão sendo feitas. Não por mágica, mas por
ação reflexiva e coordenada entre os interessados.
112
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
E este é o maior cuidado que o gestor dos poderes públicos deve ter, talvez. Uma coisa é
uma perspectiva de proporcionar o reconhecimento do diverso como valor patrimonial
e o Estado promover a inclusão de várias referências culturais no rol do patrimônio
nacional, sob sua própria perspectiva na tomada de decisão ao longo da execução da
política. Outra coisa é, além de reconhecer o valor patrimonial de expressões das culturas
populares, trazer os detentores desses conhecimentos e práticas para conversar com o
Estado; convidá-los a participar da produção de conhecimento sobre o bem cultural
em questão e participar das decisões sobre como será a política; e, ainda, participar
como gestor de recurso para execução dessas decisões. E para que isso ocorra, os
pontos de vista tanto dos detentores quanto do Estado, devem ser considerados e
deve ser estabelecida uma zona de consensos em torno do que patrimonializar e o que
fazer no processo de salvaguarda.
Não se trata de um processo fácil, pois o conflito é inerente a todos os processos sociais
humanos. E como já apontado, a patrimonialização de um bem cultural é um processo
social. Portanto, a elaboração e implantação de uma política participativa passam,
acima de tudo, pelo estabelecimento de uma nova relação entre as bases sociais e o
Estado: a constituição de um diálogo. Apesar dessa nova relação não estar pautada em
iguais condições de poder, é necessário que ambos os lados reformulem suas antigas
concepções um do outro para criar laços de confiança, consenso e cooperação entre
si. Sem eles, uma política baseada na responsabilidade compartilhada e na gestão
participava não terá as condições primordiais para funcionar.
Por um lado é preciso que fique estabelecido o compromisso mínimo que o Estado
deve assumir: algum aporte financeiro e suporte técnico e operacional aos detentores
para gestão e desenvolvimento compartilhado de ações de patrimonialização;
transferência de recursos e empoderamento dos detentores, mediação de questões,
encaminhamento de demandas cabíveis à sustentabilidade do bem patrimonializado;
em contrapartida à incorporação das referências dos vários grupos, comunidades e
segmentos sociais ao rol de bens culturais reconhecidos como patrimônio e signos da
identidade nacional.
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FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
é um processo fácil, nem rápido. Cada caso é um caso. E o processo é difícil, pois o
Estado tem seus paradoxos e ao mesmo tempo em que propõe política participativa e
inclusiva, tem instrumentos e procedimentos excludentes. Por outro lado, a sociedade
civil organizada (detentores e mediadores) em instituições representativas de seus
segmentos não domina os códigos e procedimentos da burocracia estatal – o que
condiciona o desinteresse pelo assunto.
Conclusão
Nesse processo salvaguarda vai além do sentido primal da “defesa do folclore” e passa
a conter também a ideia de “protagonismo social”. Alguns processos de salvaguarda
apontam claramente para esta possibilidade tanto pela gestão direta da base social,
quanto pela gestão de instituição parceira com a participação da base social na definição
do plano de ação. Entretanto, o que se observa é que as instituições representativas das
“bases sociais dos bens registrados“ nem sempre estão dispõe dos recursos humanos,
técnicos, financeiros para a administração de projetos desta natureza. Nesse sentido
o papel dos mediadores tem sido fundamental, sobretudo no estabelecimento do
convênio. Mas também pela maior capacidade de proporcionar o envolvimento de outras
intuições parceiras e pela disponibilizarão de corpo técnico já capacitado e habituado com
os procedimentos de conveniamento. A presença de um gestor mediador indica que os
detentores não estão sozinhos com o IPHAN no desafio de executar a salvaguarda e que a
responsabilidade pela execução, contrapartida e prestação de contas, não estará recaída
117
PATRIMÔNIO IMATERIAL
Referências Bibliográficas
ALENCAR, Rivia R.B O samba de roda na gira do patrimônio. 2010. Tese (Doutorado em
Filosofia e Ciências Humanas). – Universidade Estadual de Campinas.Disponível em:
<http://www.bibliotecadigital.unicamp.br/document/?code=000783559>.
VIANNA, Leticia C. R.; SALAMA, Morena R. L. Avaliação dos planos e ações de salvaguarda
de bens culturais registrados como patrimônio imaterial brasileiro. In: CALABRE, Lia (Org.).
Políticas culturais: pesquisa e formação. São Paulo: Itaú Cultural; Rio de Janeiro: Casa
Rui Barbosa, 2012. p. 65-87. Disponível em: <http://d3nv1jy4u7zmsc.cloudfront.net/
wp-content/uploads/2013/01/Politica-Culturais-Pesquisa-e-Forma%C3%A7%C3%A3o.
pdf>.
Fórum de Discussão
O texto a seguir é a compilação dos debates realizados entre professor e alunos nos
Fóruns de discussões da plataforma de educação a distância, tendo como base o texto
autoral do professor, publicado acima, e as seguintes perguntas orientadoras:
118
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
3. Escolha uma expressão cultural de sua cidade que seja passível de reconhe-
cimento como Patrimônio Imaterial e, em função do contexto sociopolítico
em que se insere, estabeleça, hipoteticamente, um comitê gestor ideal, e
recomendações de salvaguarda tendo como princípio a gestão participativa
do patrimônio.
O tratamento para o PCI é diferenciado, pois há uma participação dos detentores nos
processos de salvaguarda e existem instrumentos como inventários, Registro, e ações
específicas voltadas para a sustentabilidade do bem cultural. Para o folclore há mais
uma ação de apoio aos eventos que não é propriamente uma salvaguarda, como
entendida pelo IPHAN. Nesse sentido, a salvaguarda do PCI é uma proposição de política
complexa que, envolve várias instâncias de ações e articulações, visando uma ação
mais sistemática, programática de longo prazo. Além disso, implicam na participação
dos detentores e poderes públicos na identificação de pontos vulneráveis que sejam
estruturais, tais como os modos de transmissão dos saberes, infraestrutura física,
material, difusão, valorização dos indivíduos, mobilização permanente, capacitação
para gestão, pesquisa adensada sobre o bem cultural e seu contexto contemporâneo,
além de articulação interinstitucional para solução de problemas que fogem ao âmbito
e governabilidade dos órgãos de cultura.
119
PATRIMÔNIO IMATERIAL
A experiência mostra o quão difícil é ter esta mobilização desde o início e mantê-la depois
do Registro, na implementação de ações de salvaguarda. É muito comum a compreensão
de que o Registro é bastante, como ato de reconhecimento. Mas o fundamental é que
os detentores estejam imbuídos desta ideia de que são detentores de um patrimônio,
principalmente num contexto em que há falta de estrutura nas três esferas de poder
para implementar e dar sustentabilidade às ações desenvolvidas na área do Patrimônio
Cultural em geral e imaterial em particular. Nesse sentido, é importante um esforço de
integração e relação de complementaridade entre as esferas de poder, federal, estadual
e municipal, os detentores, as universidades e demais parceiros.
Por outro lado, há muitas fragilidades nas relações entre as esferas de poder e as
bases sociais e o desafio é consolidar as instâncias de atuação de modo que a política
não fique tão vulnerável e dependente da vontade política de uns ou de outros
governos. Claro que cada gestão tem que ter suas diretrizes, mas a estruturação da
política e a consolidação da relação com os detentores precisam ter continuidade não
obstante as mudanças que possam ocorrer na gestão dos governos. Para tanto, uma
das condições básicas é a socialização dos objetivos e instrumentos da política, dos
conceitos e procedimentos. Pois a política participativa tem base no diálogo entre os
detentores e os gestores. É preciso, então, que os gestores conheçam minimamente
o universo simbólico e a visão de mundo dos detentores e vice e versa. É um exercício
de entendimento, superação de conflitos e construção de consenso. Trata-se de
processo social que não tem fórmula pronta, mas princípios e objetivos gerais a serem
observados na especificidade de cada caso.
120
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
reprodução das referências culturais em questão. E para isso não há resposta pronta,
tudo depende da situação.
Ressalvas introdutórias
121
PATRIMÔNIO IMATERIAL
Para isso, iremos estimular o tempo inteiro, a capacidade reflexiva e crítica, a fim de
compreender que devemos nos beneficiar das inúmeras possibilidades de aplicação
da legislação vigente e não tê-la como desafeta ou como um empecilho às atividades
cotidianas de preservação.
Além disso, partiremos da ideia de que a lei, tal como o bem de natureza imaterial, é
mutável. E muda de acordo com a sociedade; na verdade, de acordo com os valores da
sociedade. Um exemplo claro e oportuno disso é o nosso Código Penal de 1890, que
reservava o Capítulo XIII – Dos vadios e Capoeiras – para determinar:
Art. 402. Fazer nas ruas e praças públicas exercício de agilidade e
destreza corporal conhecida pela denominação Capoeiragem: andar
em carreiras, com armas ou instrumentos capazes de produzir lesão
corporal, provocando tumulto ou desordens, ameaçando pessoa
certa ou incerta, ou incutindo temor de algum mal. Pena – de prisão
celular por dois a seis meses.79
Atualmente, como todos sabem, a capoeira não é mais crime. Muito pelo contrário. Os
valores mudaram de tal forma que esta manifestação cultural passou a ser reconhecida
oficialmente como integrante do Patrimônio Cultural brasileiro, ao ser registrada, em
2008, de acordo com o Decreto n° 3551/2000.80
Interessante que essa “questão de valor”81 ainda pode ser encontrada na atualidade.
No Rio de Janeiro, por exemplo, do ponto de vista político-ideológico, há um embate
recente que discute, sobretudo, se o funk carioca é cultura ou crime; se deve ser
repreendido dentro de um contexto de políticas de segurança pública ou reconhecido
como uma manifestação cultural legítima.
Ademais, esperamos debater, ao longo deste curso, algo que vai além do simples
conhecimento literal da lei ou da análise dos valores que estão nela entranhados; é
indispensável termos a noção de que estamos lidando, especialmente quando se fala
de bens de natureza imaterial, com o pleno exercício dos direitos culturais, os quais foram
expressamente previstos pelo art. 215 da Constituição Federal de 198882. Como veremos
a seguir, trata-se de direitos fundamentais reconhecidos por nossa Constituição, que são
tão importantes como o direito à saúde, à educação, à moradia etc.
122
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
Entretanto, para falar em direitos culturais, principalmente para quem não é do direito83,
é necessário fazer algo que nós, juristas, não temos o costume de praticar: abrir a nossa
linguagem técnica, isto é, abolir o famoso “juridiquês”. Tarefa nada fácil, é bom lembrar.
Claro que, aqui ou acolá, pode escapar um termo em latim, um brocardo jurídico, uma
citação ipisis litteris, mas tenham certeza que evitaremos, ao máximo, esse jargão.
Data venia aos meus colegas jurisconsultos que participam deste curso, mas isso é
extremamente necessário.
No direito, a grande maioria dos estudos jurídicos brasileiros sobre Patrimônio Cultural
é efetuada pelo direito ambiental. Alguns importantes autores deste campo84 – que
chamaremos de jusambientalistas – entendem que o Patrimônio Cultural é uma
subárea do direito ambiental.85
Por outro lado, algumas poucas vozes dissonantes defendem que o Patrimônio Cultural
é um tema a ser estudado pelo direito da cultura, ramo do direito que ainda está em
fase de solidificação no Brasil86. Não pretendemos, aqui, aprofundar essa discussão
epistemológica87, mas é importante saber que há, sim, essa peleja (por mais que
prevaleça a visão ambientalista).
Francisco Humberto Cunha Filho, um dos principais teóricos sobre o direito da cultura
no Brasil, explica o contexto de criação desse novo ramo da ciência jurídica:
A [...] expressão – direito da cultura – permite vislumbrar “o” direito
que rege relações específicas e tangíveis, com base em elementos
palpáveis do universo cultural observado. Pontier, Ricci e Bourdon [...]
sustentam que o desenvolvimento de políticas públicas específicas
forjou a criação do referido direito, que passou a ser evidentemente
necessário, por pelo menos três motivos: 1) tornou-se imperioso
regulamentar os serviços públicos de cultura, que passaram a ser
ofertados; 2) a ação estatal criou o respectivo poder de polícia
cultural, exercível sob disciplina e controle; e 3) o impulso das
políticas gerou mais fluxos e relações culturais, das quais decorreu
natural crescimento quantitativo e qualitativo de litígios culturais,
que passaram a exigir parâmetros para a solução. Monnier e Forey
[...] comungam com esse entendimento e precisam que o direito
83. O campo do patrimônio pode ser considerado MIT–disciplinar, ou seja, multi-inter-transdisciplinar. Não obstante essa
diversidade de olhares é importante esclarecer que o lugar de fala do autor deste trabalho é o direito. Como consequência
disso, pretendemos auxiliar a discussão não apenas de forma instrumental – como costumeiramente é compreendida a
participação de juristas nesse debate, mas também de forma conceitual. Por que não?
84. Não podemos deixar de destacar uma grande produção teórica advinda de membros do Ministério Público, tanto estadual
como federal, os quais capitaneiam as formulações teóricas sobre Patrimônio Cultural, sob o viés ambientalista, interferindo,
inclusive, no conjunto das decisões dos tribunais sobre este tema, isto é, na jurisprudência.
85. Subárea denominada de meio ambiente cultural.
86. Como será comentado a seguir, o direito da cultura se dedica, também, ao estudo dos direitos autorais, das leis de incentivo
à cultura, das liberdades de manifestação artístico-cultural, etc. Sobre essa nova área que está surgindo, vide o número 11 da
Revista Itaú Cultural. Disponível em: <http://droitsculturels.org/wp-content/uploads/2012/08/ObservatrioIta%C3%B9Cultural.
pdf>. Acesso em: 05 mar. 2013.
87. Sobre o assunto, vide o trabalho de Carla Amado Gomes (2001).
123
PATRIMÔNIO IMATERIAL
Na verdade, isso seria simples se não fosse a polissemia da palavra cultura. Sem adentrar
a este inglório trabalho – para não dizer “armadilha” – de identificar o que é cultura,
sobretudo o que é cultura para o direito89, utilizaremos a categorização proposta por
Humberto Cunha Filho (2000), a qual sugere que o universo dos direitos culturais
seriam aqueles referentes às artes, à memória e aos repasses de saberes.
Fazendo um paralelo com um ramo do direito bastante presente no nosso dia a dia
– o direito do trabalho –, podemos fazer a seguinte analogia: o direito do trabalho
é o ramo da Ciência Jurídica que estuda as relações de emprego, ao passo que os
direitos trabalhistas são aqueles garantidos pela nossa Constituição e assegurados
pela consolidação das leis do trabalho, como por exemplo, o FGTS, 13º salário, férias,
assinatura da carteira, hora extra etc. O direito da cultura, portanto, seria o ramo do
Direito que estuda as relações da cultura, enquanto que os direitos culturais são aqueles
direitos fundamentais culturais que podemos extrair da Constituição Federal, como,
por exemplo, o direito de livre manifestação artístico-cultural, o direito de acesso aos
bens culturais, o direito de fruição e preservação do Patrimônio Cultural etc.
Resumindo: o direito do trabalho está para os direitos trabalhistas (FGTS, férias, 13º
salário), assim como o direito da cultura está para os direitos culturais (acesso à cultura,
liberdade de manifestação artística, fruição do Patrimônio Cultural).
Os principais direitos culturais que iremos investigar neste curso são os que José Afonso
da Silva (2001) identificou ao analisar o conjunto de referências constitucionais ao tema,
quais sejam: direito de acesso às fontes da cultura nacional; direito de difusão da cultura;
liberdade de formas de expressão cultural; liberdade de manifestações culturais; direito-dever
estatal de formação do Patrimônio Cultural brasileiro e de proteção dos bens de cultura.
Todos já devem ter percebido que sempre que um jurista ou especialista em patrimônio
vai argumentar ou justificar um raciocínio com um viés mais pragmático, a Constituição
Federal é citada. Aqui mesmo, no início desse texto, quando fazíamos as ressalvas
iniciais, o artigo 215 da Constituição foi mencionado. Mas qual a razão disso? Por que
os juristas sempre utilizam a Constituição Federal para embasar seus argumentos?
124
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
Isso significa dizer que dentro de uma hierarquização das normas jurídicas, não há
Lei mais importante que a Constituição. É ela que rege todo o ordenamento jurídico
brasileiro. Se pensarmos num sistema piramidal, a Constituição Federal de 1988 estaria
no topo. Abaixo dela, no meio da pirâmide, estariam as leis91 e, na base, estariam os
decretos e as portarias. A figura abaixo pode ajudar na visualização:
Esse escalonamento foi criado por Hans Kelsen, um importante jurista austríaco do século
XX e embasa, até os dias de hoje, todo o nosso sistema jurídico. Ele é muito importante para
nós, pois demonstra que uma norma hierarquicamente inferior, não pode contrariar uma
norma superior e nenhuma, repito, nenhuma norma pode ferir a Constituição Federal.
Quando isso acontece – uma norma ferir a Constituição Federal – é o que chamamos
de inconstitucionalidade!
Por exemplo, eu não posso criar uma lei – infraconstitucional, portanto – que diga que,
a partir de agora, no Brasil, só poderão ser compostas e executadas publicamente as
músicas já existentes relacionadas ao samba, pois essa lei fere, além do princípio da
diversidade cultural, o direito à liberdade de manifestação artístico-cultural, que está
disposto no inciso IX do art. 5º da CF/8892.
Além disso, é a nossa Constituição que vai estruturar o que cada ente federativo –
União, Estados, Distrito Federal e Municípios – pode fazer em relação ao patrimônio
cultural. Noutras palavras, é a CF/88 que vai estabelecer as chamadas competências93.
Afinal, quem tem competência para legislar sobre Patrimônio Cultural? Quem tem
competência para preservar o Patrimônio Cultural?
125
PATRIMÔNIO IMATERIAL
Comecemos pela competência legislativa: quem – dos entes federativos – pode criar
leis sobre Patrimônio Cultural? A CF/88 trata desse assunto no seu art. 24, o qual
transcrevemos a seguir:
Art. 24 – Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar,
concorrentemente sobre:
[...]
VII – Proteção ao patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico e
paisagístico;
[...] (grifo nosso)95
O leitor mais atento logo percebe que a CF/88, no citado art. 24, excluiu o Município do
rol dos legitimados para criar leis que versem sobre o Patrimônio Cultural, atribuindo
essa competência legislativa somente à União, aos Estados e ao Distrito Federal, o que
gera, inevitavelmente, a pergunta: o Município, então, não pode criar leis em matéria
de Patrimônio Cultural?
Pode sim!
Apesar de, durante muito tempo, ter ecoado esta dúvida, ocupando os teóricos do
Direito por longos anos, atualmente isso é matéria ultrapassada. Na verdade, o art. 30 da
CF/88 permite que o Município legisle sobre Patrimônio Cultural. É que a Constituição
Federal não pode ser interpretada isoladamente, artigo por artigo. Há de se utilizar o
que os juristas chamam de interpretação sistemática, como se a Constituição fosse
um conjunto de mecanismos que se integram de forma lógica e harmônica. Nesse
raciocínio, o referido art. 30 viria a preencher a lacuna que o art. 24 deixou, integrando,
desta forma, o Município no rol dos legitimados, quando se referir aos assuntos de
interesse local, a criarem leis sobre Patrimônio Cultural. Assim dispõe o art. 30 da CF/88:
Art. 30 – Compete aos Municípios:
I – legislar sobre assuntos de interesse local;
II – suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;
[...]
126
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
E o art. 30, como pode ser vislumbrado, além de criar a possibilidade de o Município
legislar em matéria de interesse local, já vem trazendo a previsão de como compatibilizar
essa competência com a dos outros entes federativos, ou seja, considerando que a
competência legislativa é de todos os entes federativos – da União, dos Estados, do
Distrito Federal e também dos Municípios – como fazer essa compatibilização?
Humberto Cunha Filho (2010, p. 78) nos ensina:
Para evitar essa balbúrdia algumas regras são constitucionalmente
estabelecidas. Em termos de competência legislativa, a União edita
apenas as normas gerais, ou seja, aquelas que podem e devem ser
aplicadas em todo o país; Os Estados, normas no mesmo sentido,
mas limitadas ao seu território; os Municípios ficam com as normas
de aplicabilidade local.
127
PATRIMÔNIO IMATERIAL
A CF/88, portanto, determina que todos os entes federativos – União, Estados, Distrito
Federal e Municípios – são competentes, de forma comum, para aplicar as leis de
patrimônio.
E mais: não cabe somente aos referidos entes federativos esta competência, tal como
apontou o art. 23, III e IV da CF/88. O famigerado art. 216, §1º da Constituição Federal,
determina que “o Poder Público, com a colaboração da comunidade, promoverá e protegerá
o Patrimônio Cultural brasileiro [...]”, ou seja, essa competência, que já era comum entre os
entes federativos, agora também deverá ser compartilhada com os cidadãos.
Ora, se todos os entes têm o poder-dever de aplicar as leis de patrimônio, isto é, empre-
ender políticas voltadas à preservação do Patrimônio Cultural, além da colaboração da
própria população, como fica isso na prática? Como compatibilizar essa competência
que é comum, ou seja, de todos? Quem vai determinar como a União, Estados, Distrito
Federal e Municípios irão agir em prol do Patrimônio Cultural? Como a sociedade civil
será integrada nessas ações? Como isso será estruturado na prática?
128
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
O SNC congrega diversos subsistemas (de museus, de patrimônio, de artes etc.) e foi
recentemente promulgado pelo Congresso, por meio da Emenda Constitucional nº
71/2012, que acrescentou à CF/88 o art. 216-A, com o seguinte caput:
Art. 216-A. O Sistema Nacional de Cultura, organizado em regime
de colaboração, de forma descentralizada e participativa, institui
um processo de gestão e promoção conjunta de políticas públicas
de cultura, democráticas e permanentes, pactuadas entre os
entes da Federação e a sociedade, tendo por objetivo promover o
desenvolvimento humano, social e econômico com pleno exercício
dos direitos culturais. (grifo nosso).98
Notemos a menção ao pleno exercício dos direitos culturais que se tornou uma condi-
cionante à consecução dos objetivos do SNC, ou seja, o desenvolvimento humano,
social e econômico só será alcançado mediante o pleno exercício dos direitos culturais.
O §1º do mencionado art. 216-A estabelece, ainda, os princípios que regem o SNC,
dentre os quais destacamos aqueles que se referem à setorial do Patrimônio Cultural:
§ 1º O Sistema Nacional de Cultura [...] rege-se pelos seguintes
princípios:
I – diversidade das expressões culturais;
II – universalização do acesso aos bens e serviços culturais;
III – fomento à produção, difusão e circulação de conhecimento e bens
culturais;
IV – cooperação entre os entes federados, os agentes públicos e
privados atuantes na área cultural;
V – integração e interação na execução das políticas, programas,
projetos e ações desenvolvidas;
VI – complementaridade nos papéis dos agentes culturais;
VII – transversalidade das políticas culturais;
VIII – autonomia dos entes federados e das instituições da sociedade
civil;
IX – transparência e compartilhamento das informações;
129
PATRIMÔNIO IMATERIAL
Para usar outros termos, poderíamos dizer que a política cultural é o pensamento
da estratégia e a gestão cuida de sua execução, apesar de esta gestão também ser
pensada pela política. Recorrendo a Certeau [...] a política cultural lida com o “campo de
possibilidades estratégicas”; ela especifica objetivos “mediante a análise das situações”
e insere “alguns lugares cujos critérios sejam definíveis, onde intervenções possam
efetivamente corrigir ou modificar o processo em curso”. Por sua vez, as decisões
indicadas por uma estratégia de política cultural colocam em ação determinada
organização de poderes que só se manifesta por meio de uma análise política.100
Entendemos que, se for bem concebido, o SNPC pode intervir e auxiliar, sobremaneira,
a otimização das já existentes políticas culturais preservacionistas. Trata-se, na verdade,
99. Idem.
100. BARBALHO, 2008, p. 21-22.
130
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
É, portanto, aí que o estudo jurídico deve se aliar aos estudos de políticas culturais,
pois em nada adianta leis criativas e bem elaboradas se não há políticas públicas
comprometidas para aplicá-las, no intuito de criar garantias aos direitos culturais.
Referências Bibliográficas
BRASIL. Decreto n° 841, de 11 de outubro de 1890. Promulga o Código Penal. Diário Oficial da
União. Rio de Janeiro, 12 out. 1890. Disponível em: <http://legis.senado.gov.br/legislacao/
ListaNormas.action?numero=847&tipo_norma=DEC&data=18901011&link=s>.
CAVALCANTI, Maria Laura Viveiros de Castro; FONSECA, Maria Cecília Londres. Patrimônio
imaterial no Brasil. Brasília: UNESCO, Educarte, 2008.
131
PATRIMÔNIO IMATERIAL
CUNHA FILHO, Francisco Humberto. Direitos culturais no Brasil. Revista Observatório Itaú
Cultural. São Paulo, n. 11, jan./abr, 2011.
NETO, José Olímpio Ferreira; CUNHA FILHO, Francisco Humberto. Capoeira, patrimônio
cultural imaterial: críticas e reflexões. Políticas Culturais em Revista, v. 1, n. 6, p. 6-21, 2013.
SILVA, José Afonso da. Ordenação constitucional da cultura. São Paulo: Malheiros, 2001.
Fórum de Discussão
O texto a seguir é a compilação dos debates realizados entre professor e alunos nos
Fóruns de discussões da plataforma de educação a distância, tendo como base o texto
autoral do professor, publicado acima, e as seguintes perguntas orientadoras:
Uma das discussões realizadas na disciplina diz respeito à relação estabelecida entre
a construção do Sistema Nacional de Patrimônio Cultural (SNPC) e o pleno exercício
dos direitos culturais. Nesse sentido, acordou-se que mais importante que reconhecer
os direitos culturais, é efetivá-los. E essa efetivação se dá por meio das garantias. Nessa
medida, o SNPC vem contribuir para tirar do papel esses direitos culturais que já foram
identificados.
132
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
O estabelecimento desse Sistema, bem como as deliberações que seu texto apresenta,
nos possibilita pensar e vivenciar os bens culturais de forma mais profissionalizada,
competente e cuidadosa. Nesse sentido, é essencial em tempos de investimento do
próprio Ministério da Cultura em organizar, conhecer, preservar e divulgar as matrizes
culturais brasileiras a partir de suas peculiaridades locais e regionais e, em especial, em
parceria com seus agentes.
133
PATRIMÔNIO IMATERIAL
De acordo com os debates realizados, foi possível perceber que há, ainda, grande
disparidade entre Estados e entre Municípios com relação à implantação de um
arcabouço jurídico que promova a salvaguarda dos bens de natureza imaterial. Por um
lado, há aqueles que têm desenvolvido políticas bem estruturadas, enquanto outros
não ainda não estabeleceram. No caso dos municípios, essa situação é ainda mais
grave, isto porque ainda que o processo de constituição dos conselhos municipais de
cultura esteja acontecendo de maneira mais ou menos generalizada, este processo
administrativo não tem sido acompanhado da elaboração e promulgação de legislações
específicas.
Ementa: Natureza dinâmica dos bens de natureza imaterial e ameaças; Como identi-
ficar e mensurar riscos/conflitos; Patrimônio Imaterial e desafios colocados pelo
desenvolvimento. Sociedade globalizada e patrimônios locais. Interfaces entre
ameaças “ambientais” e Patrimônio Imaterial.
134
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
Introdução
Neste texto, vamos tratar das múltiplas interfaces do Patrimônio Cultural com outras
políticas públicas, enfocando especialmente as relações entre Patrimônio Cultural,
meio ambiente, minorias étnicas, povos e comunidades tradicionais e desenvolvimento
sustentável. Na primeira parte, vamos tratar da proteção constitucional integrada ao
meio ambiente e à cultura, e das interfaces entre diversidade biológica e cultural, como
fundamentos para a adoção de políticas públicas integradas e complementares.
135
PATRIMÔNIO IMATERIAL
(MINC, IPHAN etc.). As políticas e ações transversais da cultura devem estar presentes
em todos os planos e ações estratégicos do governo e do estado brasileiro.
O capítulo sobre o meio ambiente (artigo 225 e seus diversos incisos e parágrafos) da
Constituição assegura a todos o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado,
bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo ao
Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes
e as futuras gerações. Foi a primeira vez, na história brasileira, que uma Constituição
brasileira dedicou todo um capítulo ao meio ambiente, fundamentado no princípio
do desenvolvimento sustentável – conceito desenvolvido a partir do relatório da
Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento das Nações Unidas, intitulado
“Nosso Futuro Comum”, coordenado pela então primeira-ministra da Noruega, Gro
Brundtland. Segundo tal conceito, o desenvolvimento sustentável é “aquele que
satisfaz as necessidades das gerações atuais sem comprometer a capacidade das
gerações futuras de satisfazer as suas próprias necessidades”. Tal conceito passou a
permear todo o texto constitucional e as leis brasileiras.
136
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
O acesso aos bens ambientais, naturais e culturais, deve ser também equitativo, e
baseado nos princípios da inclusão e da justiça social. As políticas públicas socioambi-
entais devem incluir e envolver as comunidades locais.
137
PATRIMÔNIO IMATERIAL
Já o capítulo da Constituição que trata da cultura (artigo 215 e seguintes, que foram
parcialmente alterados pelas Emendas Constitucionais nº 42/2003, 48/2005 e 71/1912),
estabelece que o Sistema Nacional de Cultura deva reger-se pelos seguintes princípios:
diversidade das expressões culturais, transversalidade das políticas culturais, integração
e interação na execução das políticas, programas, projetos e ações desenvolvidas, e
democratização dos processos decisórios com participação e controle social.
Utilizando as palavras de Antônio Carlos Diegues, Geraldo Andrello e Márcia Nunes (2001):
“a diversidade de espécies, de ecossistemas e genética não é somente um fenômeno
natural, mas também cultural”. A biodiversidade, portanto, “não se traduz apenas em
longas listas de espécies de plantas e animais, descontextualizadas do domínio cultural”,
mas trata-se de um conceito “construído e apropriado material e simbolicamente pelas
populações humanas”. A biodiversidade resulta de contribuições culturais de povos e
comunidades que desenvolvem uma relação de estreita dependência do meio natural,
138
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
A Constituição assegura ainda direitos territoriais especiais aos povos indígenas (artigos
231 e 232) e aos quilombolas (artigo 68 do ADCT). As demais populações tradicionais
(seringueiros, castanheiros, pescadores artesanais, agricultores locais etc.) não têm
direitos territoriais especiais assegurados pela Constituição, e algumas populações
tradicionais vivem em unidades de conservação ambiental (reservas extrativistas,
reservas de desenvolvimento sustentável etc.), e outras não. O decreto de 27 de
dezembro de 2004 criou a Comissão Nacional de Desenvolvimento Sustentável das
Comunidades Tradicionais, e o decreto de 13 de julho de 2006 alterou a referida
denominação para Comissão Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e
Comunidades Tradicionais, fazendo também alterações em sua composição.
139
PATRIMÔNIO IMATERIAL
dos povos tradicionais que interagem nos diferentes biomas e ecossistemas, sejam em
áreas rurais ou urbanas.106
140
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
A referida norma determina ainda que o estudo de impacto ambiental deverá apontar
ainda “a distribuição dos ônus e benefícios sociais” da obra, empreendimento ou atividade
que se pretende licenciar.
141
PATRIMÔNIO IMATERIAL
142
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
Importante destacar, entretanto, que todos os bens culturais acautelados pelo IPHAN
devem ser avaliados (em relação aos possíveis impactos de obras e empreendimentos),
o que inclui os bens culturais materiais e imateriais. Isso quer dizer que não apenas
os sítios arqueológicos e bens culturais tombados pelo IPHAN devem ser objeto de
avaliação e de medidas de mitigação e de controle dos impactos, mas também os bens
culturais imateriais, que são objeto de ações de salvaguarda do IPHAN, por meio de
inventários, registros e outras formas de acautelamento e preservação.
Deve ser destacado ainda, que embora a Portaria n° 419/2011 só faça referência
expressa aos territórios indígenas e de quilombolas, é fundamental que seja feita
também a avaliação dos impactos de obras e empreendimentos sobre outros povos
e comunidades tradicionais (seringueiros, castanheiros, extrativistas, geraezeiros,
varzanteiros, pescadores etc.), no âmbito de procedimentos de licenciamento ambiental.
Afinal, o Decreto n° 6.040/2007, que instituiu a Política Nacional de Desenvolvimento
Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais (já citado acima) é muito claro
quando estabelece que um dos princípios desta política seja justamente promover
o desenvolvimento sustentável, como promoção da melhoria da
qualidade de vida dos povos e comunidades tradicionais nas gerações
atuais, garantindo às mesmas possibilidades para as gerações futuras
e respeitando os seus modos de vida e as suas tradições.115
143
PATRIMÔNIO IMATERIAL
No mesmo sentido, o Ministério Público Federal, por meio de sua 4ª. Câmara de Coorde-
nação e Revisão (especializada em Meio Ambiente e Patrimônio Cultural) produziu, em
2004, um manual intitulado “Deficiências em estudos de impacto ambiental”, a fim de
subsidiar a atuação de seus membros e técnicos. Entre as principais falhas apontadas
em estudos de impacto ambiental, estão:
144
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
145
PATRIMÔNIO IMATERIAL
das coletividades. Cabe observar que os estudos ainda não dispensam atenção
a todo um amplo debate contemporâneo sobre o valor dos “conhecimentos
tradicionais associados à biodiversidade”, tendo em vista os casos em que pode
ser possível a desestruturação das condições e dos processos sociais em que
são produzidos, recriados, ensinados, intercambiados.
1. O ofício das paneleiras de Goiabeiras (ES) foi registrado como bem cultural
imaterial no Livro de Registro dos Saberes em 2002. O saber envolvido
na fabricação artesanal de panelas de barro no bairro de Goiabeiras, em
Vitória, no Espírito Santo, emprega técnicas tradicionais e matérias-primas
provenientes do meio natural. Fruto de um conjunto de saberes, a panela
de barro, constitui suporte indispensável para o preparo da típica moqueca
capixaba. O plano de salvaguarda prevê o apoio e o fomento a ações que
favorecem a valorização dessas trabalhadoras e a manutenção das condições
objetivas para a prática de sua atividade. O ofício das paneleiras constitui um
saber repassado de mãe para filha por sucessivas gerações, no âmbito familiar
e comunitário, em uma tradição de mais de 400 anos. A técnica cerâmica
utilizada é de origem indígena, caracterizada por modelagem manual, queima
a céu aberto e a aplicação de tintura de tanino. Hoje cerca de 250 pessoas
de Vitória (ES), em sua grande maioria mulheres, produzem panelas de barro
com essa técnica tradicional (IPHAN, 2002). Apesar do reconhecimento e
146
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
147
PATRIMÔNIO IMATERIAL
uma Instrução Normativa (nº 57/2011) que, embora permita que os queijos
artesanais tradicionalmente elaborados a partir do leite cru sejam maturados
por um período inferior a 60 dias (como o são os queijos artesanais), exige
estudos técnico-científicos que comprovem que não há comprometimento
da qualidade e inocuidade do produto. Assim, a referida Instrução Normativa
não solucionou o problema dos produtores de queijo minas artesanal, que
têm sofrido, frequentemente, a imposição de multas e a apreensão de seus
produtos por fiscais do Mapa. O que ocorre com os queijos artesanais mineiros
é paradigmático das dificuldades enfrentadas por muitos outros produtos
agroalimentares locais e tradicionais, que não conseguem preencher os
requisitos de uma legislação desenvolvida para uma produção industrial e
de larga escala de alimentos. As normas sanitárias tendem a promover uma
excessiva homogeneização e industrialização dos produtos, em detrimento
de sua identidade e tipicidade. As normas sanitárias devem procurar um
equilíbrio entre a saúde e segurança dos alimentos e a valorização de práticas
locais e tradicionais relevantes à biodiversidade e à diversidade sociocultural,
o que não tem ocorrido até o momento.
148
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
149
PATRIMÔNIO IMATERIAL
150
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
Conclusão
151
PATRIMÔNIO IMATERIAL
Referência Bibliográfica
BRASIL. Lei Complementar nº 140, de 8 de dezembro de 2011. Fixa normas, nos termos
dos incisos III, VI e VII do caput e do parágrafo único do art. 23 da Constituição Federal,
para a cooperação entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios nas
ações administrativas decorrentes do exercício da competência comum relativas à
proteção das paisagens naturais notáveis, à proteção do meio ambiente, ao combate à
152
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
153
PATRIMÔNIO IMATERIAL
DIEGUES, Antonio Carlos (Org.). Povos e águas. São Paulo: Núcleo de Apoio à Pesquisa
sobre Populações Humanas e Áreas Úmidas Brasileiras, USP, 2002.
IPHAN. Portaria n° 203, de 17 de dezembro de 2002. Brasília, 2002. Disponível em: <http://
portal.iphan.gov.br/portal/baixaFcdAnexo.do?id=337>.
IPHAN. Banco de dados. Bens culturais imateriais registrados. Brasília, [s.d.]. Disponível
em: <http://portal.iphan.gov.br/bcrE/pages/indexE.jsf>. Acesso em: 20 fev. 2013.
SERTÃOBRAS. Audiência pública cria comissão para regulamentar nova lei dos queijos
artesanais. [s.d.]. Disponível em: <http://www.sertaobras.org.br/queijo-2/audiencia-
publica-cria-comissao-para-regulamentar-nova-lei-dos-queijos-artesanais/>. Acesso
em: 04 abr. 2013.
WEISSHEIMER, Maria Regina; VIEIRA FILHO, Dalmo (Orgs.). Patrimônio Naval Brasileiro.
Brasília: IPHAN, 2009.
154
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
Fórum de Discussão
O texto a seguir é a compilação dos debates realizados entre professor e alunos nos
Fóruns de discussões da plataforma de educação a distância, tendo como base o texto
autoral do professor, publicado acima, e as seguintes perguntas orientadoras:
4. Na sua opinião, quais são os principais desafios e barreiras para que as políticas
culturais se tornem efetivamente transversais e sejam incorporadas a todos os
planos e ações estratégicos do governo e do estado brasileiro?
Um dos principais desafios discutidos neste fórum foi o estabelecimento de uma política
pública compartilhada, que seja capaz de garantir o envolvimento dos detentores dos
Patrimônios Cultural e Imaterial e que viabilize condições de formação e informação
educacional levando em conta toda a diversidade cultural existente no país. Esta
política deve promover o dialogo entre os três poderes, entre os gestores e entidades
que tratam de patrimônio, entre a comunidade, empresas privadas responsáveis
pela implantação de grandes empreendimentos. É preciso constituir planos e ações
estratégicas do governo e do estado brasileiro, ações estas que não podem ser
realizadas de forma fragmentada e compartimentalizada, ou estar restritas aos órgãos
públicos especificamente encarregados das políticas culturais (MINC, IPHAN etc.). Elas
devem permear todo o conjunto das políticas públicas brasileiras, nas mais diferentes
áreas. De fato, a construção de políticas culturais “de baixo para cima”, ou seja, com a
participação das comunidades locais na sua concepção, elaboração e implementação,
é uma questão essencial, pois diz respeito à legitimidade social destas políticas, que
não podem ser impostas. Por fim, o desafio é estabelecer uma práxis que começa com
os agentes técnicos, profissionais, que dominam esta discussão e compreendem estas
questões. A sua atuação deve ser irradiadora, deve contagiar as pessoas envolvidas,
155
PATRIMÔNIO IMATERIAL
Nesse sentido, a implantação do Sistema Nacional de Cultura (SNC), que está em curso,
constitui uma poderosa ferramenta de integração das políticas culturais entre os entes
federativos, visto que os conflitos de interesses entre esses diferentes entes são um
grande empecilho, frequentemente, para que as políticas cheguem até a população.
Entretanto, as ferramentas legais do SNC precisam ser apropriadas pelos gestores
públicos, sociedade civil e setor privado. Ainda há uma grande distância entre a criação
“formal” de alguns instrumentos e a sua implementação prática.
Atualmente, estamos num contexto em que as políticas públicas ainda são muito
fragmentadas, setorializadas e se comunicam pouco entre si, o que dificulta a essencial
transversalidade das políticas culturais. Afinal, o componente cultural deve estar
presente em todos os planos e programas governamentais, em articulação com a
sociedade civil e com o setor privado. Nesse sentido, um dos desafios mais significativos
para a implantação de uma política pública no setor de Patrimônio Cultural está no
fato de que para que atinja maiores resultados efetivos é necessário que as principais
questões do setor – salvaguarda, fomento e promoção – façam parte de uma ação
única, dividindo responsabilidades, atuações e resultados com outras áreas da gestão
pública, tais como: ambientais, sociais ou econômicas. Acabar com a tendência de
isolamento dos setores fazendo-os entender que são parte de um todo e que a falta de
ação em um setor pode prejudicar o trabalho em outro.
156
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
Parece ser também uma constatação geral de que há uma grande distância entre a
legislação socioambiental avançada e a prática, motivada por interesses políticos
e econômicos contrários à preservação do Patrimônio Cultural. Como superar esta
situação, e fazer com que a legislação ambiental e de preservação do patrimônio
cultural sejam mais respeitadas não só por empreendedores, mas também pelos
órgãos públicos. O caminho correto seria investir mais em educação patrimonial, desde
a infância, para uma maior conscientização dos cidadãos, ou investir mais em punição
e repressão aos danos contra o nosso patrimônio, agravando as multas e sanções e
dando melhor estrutura aos órgãos de controle e fiscalização? Ou ambos?
157
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
3. Avaliações e considerações
sobre o Curso
Assim, para empreender a análise do cumprimento dos objetivos do curso, foi feito,
durante o curso, um levantamento de informações sobre os alunos, tais como:
profissão, área/instituição de atuação, local de residência, tipo de acesso à internet e
de suas avalições parciais e finais sobre o desenvolvimento e qualidade do curso. Estas
informações foram fundamentais para a avaliação do curso, tanto no que diz respeito
ao seu alcance quanto aos conteúdos e didáticas utilizados.
159
PATRIMÔNIO IMATERIAL
A fim de caracterizar os alunos do curso, para fins desta publicação foram escolhidos
os seguintes aspectos: local de residência, formação, nível de especialização e vínculo
institucional, uma vez que permitem analisar o cumprimento dos objetivos básicos do
curso. Estes resultados são apresentados por meio de gráficos, a seguir:
Distribuição geográfica
Para a compreensão do perfil dos alunos, um número de 418, um dos critérios que
nortearam a seleção dos candidatos foi relativa à proporcionalidade por região do
país (sendo Norte – 25%, Nordeste – 25%, Centro-Oeste – 20%, Sudeste – 15% e Sul
– 15%). Assim, mesmo havendo uma grande quantidade de inscrições da região
sudeste e nordeste (este último concentrado em alguns estados), foi possível manter
esta proporcionalidade nas duas turmas, que mantivesse o conceito original de
descentralizar ao máximo a oferta de vagas para o curso e garantir ampla participação
dos gestores culturais, conforme será tratado a seguir.
49
60 Norte Norte
Nordeste Nordeste
75
Centro-Oeste Centro-Oeste
Sudeste Sudeste
58
33 52 Sul Sul
17
40
35
30
25
20
15
10
0
Acre
Alagoas
Amapá
Amazonas
Bahia
Ceará
Distrito Federal
Espírito Santo
Goiás
Maranhão
Mato Grosso
Mato Grosso do Sul
Minas Gerais
Pará
Paraíba
Paraná
Pernambuco
Piauí
Rio de Janeiro
Rio Grande do Norte
Rio Grande do Sul
Rondônia
Roraima
Santa Catarina
São Paulo
Sergipe
Tocantins
160
Alunos por Estado – Turma 2
40
Mato Gros
Tocanti
Pernambu
Maranh
Para
Santa Catari
Distrito Fede
Ama
Paraí
Sergi
Rio de Jane
Minas Ger
Go
Rio Grande do No
A
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São Pa
Espírito Sa
Alag
Amazo
Mato Grosso do
Rio Grande do
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
35
30
25
20
15
10
0
Acre
Alagoas
Amapá
Amazonas
Bahia
Ceará
Distrito Federal
Espírito Santo
Goiás
Maranhão
Mato Grosso
Mato Grosso do Sul
Minas Gerais
Pará
Paraíba
Paraná
Pernambuco
Piauí
Rio de Janeiro
Rio Grande do Norte
Rio Grande do Sul
Rondônia
Roraima
Santa Catarina
São Paulo
Sergipe
Tocantins
A análise do número de inscritos na turma 1 e 2, permite observar que aqueles estados
em que houve maior número de alunos são aqueles em que a política de patrimônio
imaterial está mais desenvolvida, seja por ações dos órgãos estaduais de patrimônio,
seja em função da atuação do IPHAN nestas regiões.
A partir dos critérios expostos houve, de fato, um esforço pela garantia de uma
participação equitativa de cada um dos estados. E ao ver os dados desses gráficos que
nos trazem o mapeamento dos alunos por região e por estado, temos a convicção da
importância da educação a distância (EAD) na capacidade de abrangência formativa
diante da extensão territorial brasileira.
Sexo
Também no que diz respeito à questão de gênero, foi possível manter certa equidade
entre homens e mulheres, tanto na primeira turma quanto na segunda. Este tipo de
equilíbrio foi importante para a fins de favorecer diferentes perfis e tipos de atuação.
161
PATRIMÔNIO IMATERIAL
Formação
Neste quadro, nos chamam a atenção três pontos que valem ser destacados: 42 pessoas
formadas em História pela turma 1 e 40 pessoas formadas pela turma 2, número
significativo que se justifica por ser a área de formação associada diretamente à própria
natureza do tema Patrimônio Cultural. No caso da turma 1, outro ponto é o número
quase equivalente de 41 pessoas agrupada em outros, que corresponde a cursos
diversos que aparecem uma única vez ou deixaram branco, a saber: Sustentabilidade
e Gestão da Inovação para o Terceiro Setor; Engenharia de produção; Técnico em
Logística; Produção Cultural; Educação Artística; Agroecologia; Tecnólogo em processos
gerências; Administração das Artes; Plantas Medicinais; Etnodesenvolvimento; Cultura
e Sociedade; Sustentabilidade e Gestão da Inovação para o Terceiro Setor; Gestão de
Turismo; Gestão Escolar; Antropologia; Ciências; Normal Superior. No caso da turma 2,
esse número caiu bastante, pois houve um maior número de pessoas com as mesmas
áreas de formação.
Turma 1
40
35
30
25
20
15
10
0
Arquitetura e urbanismo
Direito
História
Pedagogia
Artes
Não possui
Comunicação Social
Filosofia
Ciências Sociais
Geografia
Turismo
Serviço Social
Museologia
Administração
Publicidade e propaganda
Letras
Biblioteconomia
Teatro
Economia
Outros
162
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
40
35
30
25
20
15
10
0
Administração de Empresas
Agronomia
Antropologia
Arquitetura e Urbanismo
Artes Cênicas
Artes Cênicas e Economia
Artes Visuais
Bens Culturais e Projetos Sociais
Biblioteconomia
Biologia
Ciência da Computação
Ciência da Religião
Ciências Contábeis
Ciências da Informação
Ciências Sociais
Comunicação Social
Comunicação, Linguagem e Cultura
Desenvolvimento Rural
Direito
Economia
Educação
Educação Física
Filosofia
Filosofia e Biologia
Formação de Professor
Geografia
Geologia
Gestão Ambiental
Gestão Cultural
Gestão Pública
História
História e Museologia
História/Turismo e Gestão Pública
Jornalismo
Jornalismo e Direito
Letras
Letras e Direito
Matemática
Museologia
Música e Jornalismo
Patrimônio Imaterial
Pedagogia
Perícia e Conservação
Produção Cultural
Psicologia
Química e Pedagogia
Relações Internacionais
Segurança no Trabalho
Serviço Social
Turismo
Não Respondeu
Por último, 17 pessoas que afirmaram, na turma 1, não possuir nenhuma formação de nível
superior, o que no campo de atuação profissional na área de patrimônio imaterial não
significa um impedimento, ao contrário, deixa clara a característica de participação social
e de envolvimento das comunidades no processo de salvaguarda desses bens, tendo em
vista que parte destes gestores são também os detentores das manifestações. No caso da
turma 2, 10 pessoas afirmam não possuir nenhuma formação de nível superior, diminui
o número de profissionais sem formação, justificado pelo próprio critério de seleção que
abre para a segunda turma a possibilidade de perfis de alunos mais diversificados com
relação aos segmentos de atuação em comparação à primeira turma.
Nível de especialização
Turma 1 Turma 2
11 8 1
4 8 10 23
23 Ensino fundamental completo 44 Ensino fundamental completo
28
Ensino médio completo Ensino médio completo
71 Superior incompleto Superior incompleto
54
Superior completo Superior completo
53
77 Especialização
Mestrado
Associando aos que têm somente curso de graduação, na Turma 1 temos um índice
elevado de 78% de alunos que têm nível superior atuando na área de Patrimônio
Imaterial, embora menor, mas ainda considerado alto, na Turma 2 temos um índice de
64% dos alunos.
163
PATRIMÔNIO IMATERIAL
Desta forma, somando o percentual das duas turmas, temos um número significativo de
profissionais graduados e com especializações atuando na área de Patrimônio Imaterial.
Vinculação institucional
No caso da vinculação institucional dos alunos como critério de seleção deve ser
levado em consideração, inclusive na diferenciação do perfil dos alunos das duas
turmas, pois a proporcionalidade por segmento (Gestores Públicos – 25%, Gestores
Detentores – 25%, Professores – 15%, Pesquisadores – 15%, Gestores Privados – 10%,
Alunos – 5%, Outros interessados – 5%) foi muito mais evidente para a primeira turma.
Este fato deveu-se à definição de se fechar esta primeira turma somente com gestores
da área da cultura e detentores, com vistas a manter o enfoque na temática da
gestão e, sobretudo, da gestão pública daqueles locais em que a institucionalização
das políticas de Patrimônio Imaterial encontram-se mais fragilizadas, como forma de
fortalecer o Sistema Nacional.
Turma 1 Turma 2
34 15
133 39
4
18
Municipal Setor público
Estadual Setor privado
36
Federal 25 Terceiro setor
Sociedade civil organizada 2
Instituição de ensino
15
Sistema S
164
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
Turma 1
Grau
Grau de
de dificuldade
dificuldade encontrado
encontrado no
no trabalho
trabalho com
com o
o Patrimônio
Patrimônio Imaterial
Imaterial
100 101 95
90
85
77 79 78
80 76 75
75 71 100 101 69
70 100 101 95
95 63
65
90 58 60 58
60
90
85
77 79
79 51 78
55
85
77 71 76
76 75 78
75
80
50
69
80
75
71 40 40 69 39
45
75
70 38 63
40
70
58 60 58 63
60
65
35
65
60 58 58
30
60
55
23 23 51
51
25
55
50 18 24
20
50
45 14 40 38 40 13 39
15
45
40
10
40 38 40 39 9
5
40
35
5
35 2 3 2 2 3
23 23
30
23 23
0
30
25
25 18
18 24
24
14
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Turma 2
82
90
85 81
80 76
75
68 69
70
63 64 64
65
60
82
90
60
90
81
81 51 82
76 52
85
55
85
49 48 76 48 46
80
50
69
80
68
75
45
41 68 69
35 64
75
70
63 64 64
63 31 64
40
70
65
35
65
60
60
60
30
60
49 48 52 51
51
52 48
55
25
55
50
17 49 48 19 48 46
46
20
50
45
41 14 21 18
15
45
10 35 41 8 6
40
3 35 31
10
40
35
5
35
30 2 31 2 2 2 2
0
30
25
17 19
19 21
25
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mm
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ruru
stst
InIn
165
PATRIMÔNIO IMATERIAL
Destaca-se que em todos os itens, nas duas turmas, foi levantada a existência de um
grau elevado de dificuldades apontado pelos alunos.
Por outro lado, a gestão e a obtenção de informações gerais sobre o tema aparecem
como itens mais fáceis de serem trabalhados pelos profissionais do setor. Neste caso,
podemos considerar que a área de trabalho voltada para Patrimônio Imaterial tem sido,
de alguma forma contemplada em discussões públicas como maior possibilidade de
acesso.
No caso da segunda turma, a gestão continua sendo considerada um item fácil (60%),
seguido do item obtenção de informações gerais com 46%. Por outro lado, uma das
principais ferramentas de gestão, o planejamento, é considerada um item difícil por 64%
dos alunos e 49% muito difícil, ponto que deve ser considerado para análises futuras.
Chama também a atenção neste item, o grau difícil para o item comunicação, 81%.
Avaliação
Como forma de análise dos resultados obtidos com a realização das duas turmas deste
curso, foi solicitado aos alunos que realizassem uma avaliação dos resultados, bem
como conteúdos e atuação de cada um dos professores e equipe de coordenação e
monitoria do curso. A seguir, é apresentada uma síntese dessas avaliações.
Turma 1
As avaliações dos alunos em relação aos módulos do curso foram bastante positivas,
sendo que a grande maioria considerou os aspectos constituintes do curso como ótimo
e bom. Foram avaliados os seguintes aspectos: texto base, materiais complementares,
participação dos professores, debates propostos e contribuições para a atuação
profissional. Um aspecto importante a ressaltar, no caso desta turma, é retorno dado por
vários alunos no sentido de que haviam formado grupos de estudo em seus locais com
os textos base do curso, uma vez que nem todos haviam sido aceitos para participarem
do curso. Isso implica dizer, que este material foi acessado por um número maior de
profissionais.
166
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
Ótimo Ótimo
Bom Bom
40 33
Regular Regular
53
Ruim Ruim
65
3% 2%
26% Ótimo
Bom
Regular
Ruim
69%
Participar de
Participar de um curso livre
um curso livre presencial
semipresencial com 2 meses
com 2 meses de duração
de duração 3%
8%
Outra
2%
Participar de um curso livre
totalmente a distância
com 2 meses de duração
19% 167
PATRIMÔNIO IMATERIAL 3% 2%
26% Ótimo
Bom
Regular
Ruim
Agora que você já 69%
tem a experiência de participar deste curso, se você fosse
participar de um curso com o mesmo conteúdo, qual seria sua opção:
Participar de
Participar de um curso livre
um curso livre presencial
semipresencial com 2 meses
com 2 meses de duração
de duração 3%
8%
Outra
2%
Participar de um curso livre
totalmente a distância
com 2 meses de duração
19%
Participar de
Participar de um curso de um curso livre
pós graduação presencial totalmente
7% a distância
Participar de 46%
um curso de
pós graduação
semi-presencial
15%
Turma 2
As avaliações dos alunos em relação aos módulos do curso foram bastante positivas,
sendo que a grande maioria considerou os aspectos constituintes do curso como ótimo
e bom. Foram avaliados os seguintes aspectos: texto base, materiais complementares,
participação dos professores, debates propostos e contribuições para a atuação
profissional.
168
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
32% 28%
Ótimo Ótimo
Bom Bom
Regular Regular
curso de
pós graduação
semi-presencial
35%
169
PATRIMÔNIO IMATERIAL
Recomendações
170
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
Considerações Finais
Nas duas turmas, o tema da continuidade de realização de cursos específicos para a área
de Patrimônio Cultural no Brasil foi uma demanda constante e, consequentemente,
essa publicação e outras de temas afins deverão ampliar a capacidade de abrangência
da produção teórica para um número maior de profissionais que, nem sempre, têm
acesso às grandes discussões de âmbito nacional e internacional.
<https://www.facebook.com/groups/572209176122711/?fref=ts>.
171
FORTALECENDO O SISTEMA NACIONAL
4 Ficha técnica
Curso
Patrimônio Imaterial: Fortalecendo o Sistema Nacional – Turmas 1 e 2
Realização
Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN)
Representação da UNESCO no Brasil
Professores:
Juliana Santilli
Letícia Vianna
Lucas dos Santos Roque
Maria Elizabeth Costa
Mario Pragmácio
Márcia Sant’anna
Mônia Silvestrin
Patricia Faria
Rívia Bandeira
173
PATRIMÔNIO IMATERIAL
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Pa t r i m ô n i o I m a t e r i a l
f o rta l e c e n d o o s i st e m a n a c i o n a l
S i st e m at i z a ç ã o d o c u r s o