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CONSELHO PONTIFÍCIO PAR A A PROMOÇ ÃO

A PALAVRA DE DEUS EM COMUNIDADE

DA NOVA E VANGELIZ AÇ ÃO

DA PALAVR A O
O

DOMINGO
G
DE
IN
D OM

D E US
DA PALAVRA
Um subsídio precioso
DE
DEUS
para viver o Domingo SUBSÍDIO LITÚRGICO-PASTORAL 2021
«OSTENTAI A PALAVRA DA VIDA» (CF. FL 2,16)
da Palavra de Deus
com o Papa Francisco
e com toda a Igreja.
Um agradecimento especial a:
ÍNDICE GERAL
A PALAVRA DE DEUS EM COMUNIDADE 2
Doutora Elisabetta Casadei
Pontifícia Universidade Gregoriana

Doutor Guillermo Acero Alvarín


Reitor do Colégio de São João Eudes, Roma
Introdução
Introduzione3

A
LaPalavra deDio
Parola di Deus em Comunidade
in Comunità 4
© 2021 Libreria Editrice Vaticana 
00120 Città del Vaticano Algumas considerações
Alcune considerazioni práticassul
pratiche sobre a Covid-19
Covid-195
www.libreriaeditricevaticana.va 
 Rito de entronização da
di Intronizzazione Palavra
della de di
Parola Deus
Diodurante
durantealaSanta
SantaMissa
Messa7
© PERIODICI SAN PAOLO s.r.l., 2021 Via Giotto, 36 - 20145 Milano 

© EDIZIONI SAN PAOLO s.r.l., 2021

 Vésperas
Vespri perpara o Domingo
la Domenica da Parola
della Palavradide Deus
Dio9
Divina sobre
Lectio Divina Fl 2,12-18
© PAULUS Editora, 2021
su Fil 2,12-1812
Direção editorial: Tiago Melo, SSP
Revisão: André Barreira
A
LaPalavra deDio
Parola di Deus em Família
in Famiglia 17
Paginação e Capa: Victor Borba
Rito de acolhimento da
dell’accoglienza Palavra
della dediDeus
Parola em
Dio in Família
Famiglia18
Edição digital: Janeiro 2021
Propostas formativas
Proposte formative sobre
sulla a Palavra
Parola di Diode Deus
per para os jovens
i giovani20
PAULUS Editora A
LaPalavra deDio
Parola di Deus em tempos
in tempo de Covid-19
di Covid-1922
Estrada de São Paulo, 63
2680-294 Apelação
Tel. 219 488 870 A
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nella pessoal
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Leggere com
il Vangelo o Beato
con António
il Beato Chévrier
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del Comum
Tempo Ordinario28
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Pregare cona la
Palavra
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Dio?31
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Appendice:Igreja e Palavra
Chiesa e Parolade
diDeus
Dio 33
A
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Catechesi eeParola
Palavra
dide
DioDeus à luzdel
alla luce do nuovo
novo Diretório
Direttorio40
sem autorização prévia, por escrito, do editor. O Logo
Il Logo43
DA PALAVR A
GO

DE
«Ostentando a Palavra da vida»

IN
3

D OM

D E US
INTRODUÇÃO
A PALAVRA DE DEUS EM COMUNIDADE
(Fl 2,16)

A
expressão bíblica com a qual, mundo. Recorda, desde logo, a impor- como ovelhas para o meio de lobos. conversão é descrita por Agostinho nas
este ano, se pretende cele- tância que os cristãos devem atribuir ao Portanto, sede prudentes como as ser- Confissões, escrevia no seu Comentário
brar o Domingo da Palavra seu esforço da salvação, precisamente pentes e simples como as pombas.» (Mt aos Filipenses: «Glorio-me em vós por-
de Deus é tirada da Carta aos Filipenses: em virtude do acontecimento realizado 10,16) Para que isto se possa realizar, que possuís a palavra da vida, isto é, por-
«Ostentando a Palavra da vida» (Fl no Filho de Deus que Se fez homem e Se Paulo indica o caminho a seguir: os cris- que conheceis Cristo, que é a Palavra da
2,16). Como se deduz de algumas refe- entregou à violência da morte na cruz: tãos têm o dever de permanecer fiéis e vida, porque o que é feito em Cristo é vi-
rências, o apóstolo escreve a carta a par- «Trabalhai com temor e tremor para a unidos à Palavra de Deus. «Ostentando a da. Portanto, Cristo é a Palavra da vida;
tir da prisão. Representa certamente um vossa salvação.» (Fl 2,12) Nenhum cris- palavra da vida», os discípulos de Cristo com isto, percebemos como são grandes
dos textos mais importantes que a Igreja tão pode pensar que pode viver no mun- «brilham como estrelas no mundo». o lucro e a glória daqueles que supor-
tem nas mãos. O texto cristológico com do prescindindo deste acontecimento de É uma bela imagem, esta que o Apóstolo tam as almas dos outros.» O meu dese-
o qual Paulo põe em evidência a keno- amor que transformou a sua vida e to- nos deixa hoje também a todos nós. jo que se transforma em oração é este:
sis do Filho de Deus quando Se fez ho- da a História. É verdade que Paulo não Vivemos num momento dramático. no Domingo da Palavra de Deus, desco-
mem continua a ser, ao longo de toda a esquece que, por muito que os cristãos A Humanidade pensava que tinha alcan- brir a responsabilidade de trabalhar pa-
nossa história, uma espécie de ponto de se esforcem por chegar à salvação, per- çado as mais sólidas certezas da ciência ra que esta Palavra cresça no coração
referência sem retorno para compreen- manece sempre o primado da ação de e as soluções de uma economia para dos crentes e os anime de alegria pela
der o mistério da Encarnação. A liturgia Deus: «É Deus que opera em vós o que- garantir segurança de vida. Hoje vê- evangelização.
nunca deixou de rezar com este texto. rer e o agir segundo os seus desígnios de -se constrangida a verificar que nenhu-
A teologia assumiu-o como um dos con- amor.» (Fl 2,13) O conjunto destes dois ma das duas garante o futuro. Emerge  Rino Fisichella
teúdos principais para a inteligência da elementos permite compreender as pa- fortemente a desorientação e a descon-
fé. O testemunho cristão encontrou nes- lavras comprometedoras que o apósto- fiança devido à incerteza que sobreveio
tas palavras o fundamento para edifi- lo dedica agora aos cristãos de Filipos, inesperadamente. Também nestas cir-
car o serviço pleno da caridade. Se, por tendo diante dos olhos os crentes que, cunstâncias, os discípulos de Cristo têm
um lado, esta carta exprime os conteú- ao longo dos séculos, virão a ser discí- a responsabilidade de pronunciar uma
dos essenciais da pregação do apóstolo, pulos do Senhor. palavra de esperança. Poderão fazê-lo
por outro lado mostra também como a O primeiro compromisso que os cren- na medida em que permanecerem fir-
comunidade cristã precisa de crescer no tes devem assumir é a coerência de vida. memente ancorados na Palavra de Deus
conhecimento do Evangelho. O apelo a ser “irrepreensíveis” e “puros” que gera vida e se apresenta cheia de
Com o nosso versículo, o apóstolo num mundo em que, muitas vezes, pre- sentido para a existência pessoal.
pretende expor um ensinamento impor- domina a falsidade e a esperteza remete A interpretação mais autorizada des-
tante à comunidade cristã para lhe indi- para a palavra de Jesus quando convi- te versículo talvez seja a de Vitorino.
car de que modo é chamada a viver no dava os seus discípulos: «Eu vos envio Este grande orador romano, cuja
A PALAVRA DE DEUS EM COMUNIDADE

A Palavra
de Deus em
Comunidade

„„ A Sagrada Escritura ensina a con-


fiar sempre em Deus apesar dos
problemas e das adversidades que
se possam encontrar (cf. Is 26,1-6).

„„ É oportuno que a comunidade cris-


tã se reúna para venerar e procla-
mar a Palavra de Deus, bem como
para meditar e rezar com essa mes-
ma Palavra.
Algumas considerações práticas A PALAVRA DE DEUS EM COMUNIDADE 5
sobre a Covid-19

T
endo em conta a presente si- etárias, realizar um momento de ca- Para encontrar-se com a Palavra viva o seu incontestável valor cultural tem
tuação pandémica, recomen- rácter cultural, histórico e bíblico); é necessário concentrar-se sobretudo na múltiplas conotações.
da-se aos organizadores do • escolher outras pessoas adequadas preparação espiritual, pedindo a aber-
Domingo da Palavra de Deus que este- para a execução do programa; tura de coração para nós e para aque-
jam sempre atentos às normas sanitá- • orçamentar eventuais despesas; les a quem será proclamada durante o ENVOLVER OS FIÉIS
rias em vigor e que adaptem o desen- • preparar o material necessário; Domingo da Palavra de Deus. Por conse-
rolar comunitário da iniciativa a essas • publicitar as informações a respeito guinte, os preparativos para programar A informação a respeito do aconteci-
mesmas regas. deste Domingo; a iniciativa exigem que se parta da ora- mento deve ser publicitada com grande
Para viver frutuosamente o • chegar às pessoas com dificuldades ção individual e comunitária. antecedência para chegar ao maior nú-
Domingo da Palavra de Deus em comuni- (doentes, clínicas, hospitais, prisões, Pelo menos uma semana antes do mero possível de pessoas.
dade, é essencial prepará-lo com grande associações de caridade…); acontecimento, as comunidades po- Não há dúvida que o convite pessoal
antecedência. É bom que os preparativos • envolver, na medida do possível, pes- deriam incluir na oração dos fiéis é o modo mais direto para informar as
tenham o seu lado espiritual (oração pes- soas de outras religiões e confissões uma intenção pelo bom êxito do pessoas sobre a iniciativa.
soal e comunitária pelo êxito da iniciati- cristãs, bem como não crentes. acontecimento. Também se pode utilizar folhetos e
va e pela abertura de coração à Palavra Os membros do grupo responsável, desdobráveis, que podem facilmente
de Deus) e material (programação ade- bem como os catequistas, os evangeli- ser distribuídos às pessoas e afixados
quada, correspondendo à vida da comu- PREPARAR-SE ESPIRITUALMENTE zadores e outras pessoas responsáveis nos placards.
nidade de cada um). pela proclamação do Evangelho, po- As redes sociais como Facebook,
É útil recordar, em primeiro lugar, deriam organizar uma Adoração silen- Twitter e outros programas ou apps
que a Bíblia não é apenas um texto ciosa do Santíssimo Sacramento, ofe- devem ser valorizados para chegar ao
CRIAR UM GRUPO RESPONSÁVEL de alto valor cultural, moral, históri- recida pela celebração do Domingo da maior número possível de pessoas.
co, social ou artístico, capaz de inspi- Palavra de Deus.
O primeiro passo a dar é instituir um rar o pensamento do homem de hoje.
grupo de pessoas que possa organizar e A Bíblia encerra em si a Palavra de VIVER O DOMINGO
coordenar o desenrolar das iniciativas Deus que é «viva e eficaz, mais cor- PROGRAMAR O ACONTECIMENTO DA PALAVRA DE DEUS
pastorais para este Domingo. Este gru- tante que uma espada de dois gumes;
po de pessoas encarregar-se-á de: ela penetra até ao ponto de divisão da A proposta para o desenrolar da ini- É importante favorecer o encontro
alma e do espírito, das articulações ciativa deveria ser dirigida tanto às co- pessoal e comunitário com a Palavra
• rezar pelo êxito da iniciativa; e medulas, e é capaz de discernir os munidades como às pessoas indivi- viva.
• programar as várias iniciativas (apre- pensamentos e intenções do coração» dualmente, tendo sempre presente que Somos chamados a tornarmo-nos
sentar propostas para as várias faixas (Hb 4,12). a Bíblia é a Palavra viva de Deus e que instrumentos nas mãos do Senhor e a
A PALAVRA DE DEUS EM COMUNIDADE 6

ter presente que «assim como a chuva minha vontade, sem ter realizado a sua possibilidades de formação (por exem- disponibilizando uma possibilidade
e a neve que descem do céu não voltam missão» (Is 55,10-11). plo: Lectio divina semanal ou mensal, para a formação permanente dos fiéis.
para lá sem terem regado a terra, sem a grupo bíblico, etc.) onde se possa conti-
terem fecundado e feito produzir, para nuar o encontro com a Palavra de Deus, Apresentamos, em seguida,
que dê a semente ao semeador e o pão CONTINUAR A EXPERIÊNCIA algumas propostas pastorais, que po-
para comer, também a palavra que sai DA PALAVRA DE DEUS dem ajudar a sublinhar a importância do
da minha boca não volta sem ter pro- Domingo da Palavra de Deus em comu-
duzido o seu efeito, sem ter cumprido a Termina o Domingo, mas a Palavra nidade. De acordo com o con-
de Deus não deixa de agir nos nos- texto de cada comunidade,
sos corações. Seria oportuno criar podem desenvolver-se ou-
tras como: instituição
dos leitores por parte
do bispo, Lectio conti-
nua de um texto, entre-
ga da Palavra nos diversos
contextos, momentos
culturais de aprofun-
damento, audio-
dramas sobre as
personagens bí-
blicas, momen-
tos de formação,
celebração ecu-
ménica.
Rito de entronização da Palavra de Deus A PALAVRA DE DEUS EM COMUNIDADE 7
durante a Santa Missa

É desejável que o rito de entroniza- Celebra-se, hoje, em toda a Igreja, o de nós, perdoe os nossos pecados e nos ó Pai, o nosso coração!
ção tenha lugar pelo menos uma vez, Domingo da Palavra de Deus. Queremos conduza à vida eterna.
durante a celebração eucarística mais abrir o nosso coração à presença divi- R. Ámen. 1. Para que a Igreja nunca se canse de
solene no Domingo da Palavra de Deus. na nas Sagradas Escrituras e descobrir anunciar o Evangelho e de levar a
Junto do altar, ou então do ambão, o sentido do nosso tempo. Canta-se o Glória e depois dá-se Bela Notícia sobretudo às periferias
ou noutro lugar adequado para esse início à Liturgia da Palavra como de da existência humana, oremos.
efeito (uma capela), prepare-se um lu- Para podermos acolher dignamente costume. 2. Para que o Espírito Santo acompa-
gar visível por toda a assembleia, ele- a Palavra durante esta celebração, co- nhe os bispos, os presbíteros e os
vado e adornado, onde se possa colo- mecemos por pedir perdão ao Senhor. ENTRONIZAÇÃO diáconos na sua vocação, transfor-
car o texto sagrado. mando a sua vida em oferta agradá-
A Santa Missa inicia-se como ha- Para a proclamação do Evangelho vel a Deus, oremos.
bitualmente – conforme as possibili- Segue-se o ato penitencial, que po- leva-se em procissão o Evangeliário do 3. Para que os leitores, os catequistas
dades, favoreça-se a procissão solene deria ser o seguinte: altar para o ambão, onde é incensado. e todos os que espalham a Palavra
com o turíbulo, a naveta, a cruz e as C. O Senhor Jesus, que nos convida à No fim da leitura do Evangelho, o mi- de Deus em várias comunidades te-
velas, levando o Evangeliário de acor- mesa da Palavra e da Eucaristia, cha- nistro, depois de ter beijado o texto sa- nham consciência de que são chama-
do com os costumes da Igreja romana. ma-nos à conversão. Reconheçamos grado, leva-o em procissão para o trono, dos por Deus, para proclamar o seu
Depois da saudação inicial, intro- que somos pecadores e invoquemos onde é colocado, aberto e incensado. Reino no meio dos povos, oremos.
duz-se com estas palavras ou outras confiadamente a misericórdia de Deus. Segue-se a homilia e a Santa Missa, 4. Para que cada um de nós acolha o
semelhantes: C. Senhor, Vós sois o caminho que con- como é habitual. convite de Jesus à conversão e, se-
duz ao Pai, Senhor, tende piedade de Poderia utilizar-se a seguinte oração guindo a vocação de cada um, viva
«Cumpriu-se o tempo» – diz o Senhor nós. dos fiéis, modificando-a de acordo com com alegria o Evangelho, oremos.
no Evangelho. Não esperes por outro R. Senhor, tende piedade de nós. as necessidades da comunidade:
momento, não adies para o futuro a pos- C. Cristo, que tudo sustentais com o po-
sibilidade de te encontrares com Deus der da vossa Palavra, Cristo, tende pie- ORAÇÃO DOS FIÉIS C. Nós Vos abrimos o nosso coração,
na sua Palavra! «Arrepende-te e acredi- dade de nós. ó Pai, para possais vir habitar no meio
ta no Evangelho» significa: muda de vi- R. Cristo, tende piedade de nós. C. Irmãos e irmãs, escutámos a voz do de nós. Por Cristo, nosso Senhor.
da e acolhe a Boa Nova, a Palavra que C. Senhor, que fazeis passar da morte Senhor, que nos chama pelo nome e
Deus Pai nos mandou. Só assim pode- à vida quem escuta a vossa Palavra, nos pede para abrir o nosso coração R. Ámen.
rás conhecer o amor de Deus que, no seu Senhor, tende piedade de nós. ao Evangelho. Apresentemos a Deus
Filho encarnado, nos revelou o verda- R. Senhor, tende piedade de nós. Pai as nossas intenções, para acolher
deiro rosto do Pai misericordioso. C. Deus todo-poderoso tenha compaixão em nós a sua Palavra, dizendo: Abri,
A PALAVRA DE DEUS EM COMUNIDADE 8

No fim da celebração, pode-se abençoar


o povo com a seguinte fórmula (Tempo
Comum V):

C. Deus todo-poderoso afaste de vós to-


da a adversidade e derrame sobre vós a
abundância das suas bênçãos.
R. Ámen.
C. O Senhor ilumine os vossos pensa-
mentos com a luz da palavra divina,
para que possais alcançar a felicidade
eterna.
R. Ámen.
C. Deus vos ajude a compreender o que
é bom e justo, para que, percorrendo
sempre os caminhos dos seus manda-
mentos, tomeis parte na herança dos
Santos no Céu.
R. Ámen.
C. Abençoe-vos Deus todo-poderoso,
Pai, Filho + e Espírito Santo.
R. Ámen.
Vésperas para o Domingo A PALAVRA DE DEUS EM COMUNIDADE 9
da Palavra de Deus

O Domingo da Palavra de Deus, a ce- Glória ao Pai e ao Filho Antífona 1 As vossas ordens são a minha herança
lebrar no contexto da Semana de oração e ao Espírito Santo, A vossa palavra é farol para os eterna, *
pela unidade dos cristãos, é uma ocasião como era no princípio, meus passos e luz dos meus caminhos, são elas que dão alegria ao meu coração.
propícia para nos unirmos em oração a agora e sempre. Ámen. Aleluia. aleluia. Habituei o meu coração a cumprir os
todos aqueles que partilham a Sagrada vossos decretos, *
Escritura como património comum. HINO SALMO 119 (118) Promessa de obser- até ao fim e para todo o sempre.
Os Salmos da Bíblia oferecem a todos var os mandamentos de Deus
palavras para se dirigirem a Deus num Lentamente o sol se apaga Glória ao Pai e ao Filho *
colóquio de amor para Lhe apresentar Nos campos, montes e mares, É este o meu mandamento: que vos e ao Espírito Santo,
a sua vida e deixar que seja Ele a trans- Mas deixa-nos a promessa ameis uns aos outros, como Eu vos como era no princípio, *
formá-la. O Papa Bento XVI afirmava De renascer cada dia. amei. (Jo 15,12) agora e sempre. Ámen.
que «nos Salmos encontramos articu-
lada toda a gama de sentimentos que o Em Vós, Senhor, admiramos A vossa palavra é farol para os meus Antífona 1
homem pode ter na sua própria existên- A divina providência, passos * A vossa palavra é farol para os meus
cia e que são sapientemente colocados Que tanto regula as sombras e luz para os meus caminhos. passos e luz dos meus caminhos,
diante de Deus; alegria e sofrimento, Como a luz dos tempos vários. Jurei e estou decidido * aleluia.
angústia e esperança, medo e perple- a guardar os vossos justos juízos.
xidade encontram lá a sua expressão» Cheios de fé e de esperança, Antífona 2
(Verbum Domini, 24). Caminhamos no esplendor Estou em grande aflição, Senhor, * Bem-aventurados os que têm fome e
Esta oração é um convite a «osten- Da luz que o Verbo nos trouxe fazei-me viver, segundo a vossa palavra. sede de justiça, porque serão saciados.
tar a palavra da vida» através do Sal- Da glória do eterno Pai. Senhor, aceitai os louvores da minha
mos, para que toda a atividade huma- boca * SALMO 112 (111) A felicidade do justo
na seja inspirada pelo «louvor prestado Ele é o sol infinito e dai-me a conhecer os vossos juízos.
a Deus» (Verbum Domini, 62). Que ilumina a terra inteira Procedei como filhos da luz. O fruto da
E prepara para as almas A minha vida anda em constante luz consiste na bondade, na justiça e na
INVOCAÇÃO INICIAL As alegrias eternas. perigo, * verdade. (Ef 5,8-9)
mas nunca me esqueço da vossa lei.
V. Deus, vinde em nosso auxílio. À Santíssima Trindade Embora os pecadores me armem um Feliz o homem que teme o Senhor *
R. Senhor, socorrei-nos e salvai-nos. Novo cântico se eleve, laço, * e ama ardentemente os seus preceitos.
Cada vez mais alto e puro nunca me afasto dos vossos preceitos.
Pelos séculos dos séculos. Ámen.
A PALAVRA DE DEUS EM COMUNIDADE 10

A sua descendência será poderosa Glória ao Pai e ao Filho * para que ao nome de Jesus todos palavra que em vós foi plantada e pode
sobre a terra, * e ao Espírito Santo, se ajoelhem, * salvar as vossas almas. Sede cumprido-
será abençoada a geração dos justos. como era no princípio, * no céu, na terra e nos abismos, res da palavra e não apenas ouvintes,
agora e sempre. Ámen. e toda a língua proclame que pois seria enganar-vos a vós mesmos.
Haverá em sua casa abundância e Jesus Cristo é o Senhor, * Quem ouve a palavra e não a cumpre
riqueza,* Antífona 2 para glória de Deus Pai. é como alguém que observa o seu ros-
a sua generosidade permanece para Bem-aventurados os que têm fome e to num espelho e, depois de observar
sempre. sede de justiça, porque serão saciados. Glória ao Pai e ao Filho * a própria fisionomia, vai-se embora e
Brilha aos homens retos, como luz nas e ao Espírito Santo, logo se esquece como era. Mas aquele
trevas, * Antífona 3 como era no princípio, * que se aplica atentamente a considerar
o homem misericordioso, compassivo Ao nome de Jesus, todos se ajoelhem no agora e sempre. Ámen. a lei perfeita, que é a lei da liberdade,
e justo. céu e na terra. Aleluia. e nela persevera, sem ser um ouvinte
Antífona 3 que se esquece, mas que efetivamente a
Ditoso o homem que se compadece CÂNTICO Fl 2,6-11 Cristo, servo de Ao nome de Jesus, todos se ajoelhem no cumpre, esse encontrará a felicidade no
e empresta * Deus céu e na terra. Aleluia. seu modo de viver.
e dispõe das suas coisas com justiça.
Este jamais será abalado, * Cristo Jesus, que era de condição LEITURA BREVE Tiago 1,16-25 RESPONSÓRIO BREVE
o justo deixará memória eterna. divina, *
não Se valeu da sua igualdade com Não vos deixeis enganar, caríssimos R. Deus Pai gerou-nos pela palavra da
Ele não receia más notícias, * Deus, † irmãos. Toda a boa dádiva e todo o verdade.
seu coração está firme, confiado no Senhor. mas aniquilou-Se a Si próprio. dom perfeito vêm do alto, descem do Deus Pai gerou-nos pela palavra da
O seu coração é inabalável, nada teme,* Assumindo a condição de servo, * Pai das luzes, no qual não há variação verdade.
e verá os adversários confundidos. tornou-Se semelhante aos homens. nem sombra de mudança. Foi Ele que
Aparecendo como homem, nos gerou pela palavra da verdade, para V. Ele pode salvar as nossas almas,
Reparte com largueza pelos pobres, * humilhou-Se ainda mais, * sermos como primícias das suas criatu- pela palavra da verdade.
a sua generosidade permanece para obedecendo até à morte e morte ras. Cada qual seja pronto para ouvir, Glória ao Pai e ao Filho e ao Espírito
sempre † de cruz. lento para falar e lento para se irar, Santo.
e pode levantar a cabeça com altivez. porque a ira do homem não realiza a Deus Pai gerou-nos pela palavra da
Ao vê-lo, o ímpio fica indignado, * Por isso Deus O exaltou * justiça de Deus. Por isso, renunciando verdade.
range os dentes e desfalece: † e Lhe deu o nome que está acima de a toda a imundície e a todos os vestí-
os desejos dos ímpios saem frustrados. todos os nomes, gios de maldade, acolhei docilmente a
A PALAVRA DE DEUS EM COMUNIDADE 11

Antífona do Magnificat Acolheu a Israel, seu servo, * Por Jesus Cristo, vosso Filho, vencedor Pai nosso, que estais nos céus,
Vinde comigo, diz o Senhor. Farei de lembrado da sua misericórdia, da morte e príncipe da paz, santificado seja o vosso nome;
vós pescadores de homens. como tinha prometido a nossos pais, * − livrai-nos das dúvidas e da angústia, venha a nós o vosso reino;
a Abraão e à sua descendência para para que Vos sirvamos sempre na ale- seja feita a vossa vontade
CÂNTICO DA BEM-AVENTURADA sempre. gria e no amor. assim na terra como no céu.
VIRGEM MARIA (Lc 1,46-55) A todos os que amam a justiça e por ela
A alegria da alma no Senhor Glória ao Pai e ao Filho * trabalham, O pão nosso de cada dia nos dai hoje;
e ao Espírito Santo, − ajudai-os a colaborar, com sinceri- perdoai-nos as nossas ofensas,
A minha alma glorifica ao Senhor * como era no princípio, * dade e concórdia, na edificação de um assim como nós perdoamos
e o meu espírito se alegra em Deus, meu agora e sempre. Ámen. mundo melhor. a quem nos tem ofendido;
Salvador. e não nos deixeis cair em tentação;
Antífona do Magnificat Socorrei os oprimidos, libertai os pre- mas livrai-nos do mal.
Porque pôs os olhos na humildade da Vinde comigo, diz o Senhor. Farei de sos, consolai os aflitos, dai pão aos fa-
sua serva: * vós pescadores de homens. mintos, fortalecei os fracos, ORAÇÃO
de hoje em diante me chamarão − para que em todos se manifeste o
bem-aventurada todas as gerações. PRECES triunfo da cruz. Deus todo-poderoso e eterno, dirigi a
O Todo-Poderoso fez em mim nossa vida segundo a vossa vontade, pa-
maravilhas: * V. Invoquemos a Deus nosso Pai, que Vós que ressuscitastes gloriosamente ra que mereçamos produzir abundan-
Santo é o seu nome. admiravelmente criou o mundo e de a Cristo, vosso Filho, depois da hu- tes frutos de boas obras, em nome de
modo ainda mais admirável o redimiu, milhação da morte e do túmulo, nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho.
A sua misericórdia se estende e sempre o renova no seu amor. E diga- – fazei que os nossos defuntos cheguem Ele que é Deus convosco na unidade do
de geração em geração * mos com alegre confiança: também à plenitude da vida. Espírito Santo.
sobre aqueles que O temem. R. Renovai, Senhor, as maravilhas do R. Ámen.
Manifestou o poder do seu braço * vosso amor. Podem acrescentar-se algumas in-
e dispersou os soberbos. tenções livres. V. O Senhor nos abençoe, nos livre de
Por obra do Espírito Santo e pela acei- todo o mal e nos conduza à vida eterna.
Derrubou os poderosos de seus tronos * tação da Virgem Maria, vossa Serva, fi- PAI-NOSSO R. Ámen.
e exaltou os humildes. zestes que o Verbo habitasse entre nós,
Aos famintos encheu de bens * − disponde os nossos corações para re- Concluamos a nossa oração reconhe-
e aos ricos despediu de mãos vazias. ceber a Cristo como a Virgem Maria O cendo que somos filhos do mesmo Pai.
recebeu. Digamos juntos:
Lectio Divina sobre Fl 2,12-18 A PALAVRA DE DEUS EM COMUNIDADE 12

PPREPARAÇÃO PARA A ESCUTA DA por dentro, a porta do nosso coração: tornarmos filhos de Deus e membros PROCLAMAÇÃO DA PALAVRA:
PALAVRA (STATIO) a chave do Espírito Santo. O mesmo vivos da Igreja; Vós sois Aquele que, FL 2,12-18
Espírito que a inspirou e que continua no sacramento da Confirmação, infun-
Preparar-se para escutar a Palavra a inspirá-la nos crentes. diu em nós a coragem para anunciar e Portanto, caríssimos, obedientes co-
é fazer a passagem de ouvir a escutar. Invoquemo-l’O, portanto, para que testemunhar… mo sempre tendes sido, trabalhai com
É fácil ouvir as palavras da Escritura; a Palavra que vamos escutar seja um Enchei-nos com a vossa presença e a temor e tremor para a vossa salvação,
menos fácil é escutar a Palavra que vi- encontro com o Senhor Ressuscitado. vossa força, com a vossa audácia e a vos- não só como fazíeis na minha pre-
bra nas suas páginas. As palavras po- Vinde, Espírito Santo. Vós sois Aquele sa graça. Dai-nos a graça de compreen- sença, mas agora muito mais na minha
dem irromper e quebrar silêncios; já a que consagrou Jesus com a unção, en- der que Deus continua, hoje, a chamar ausência. Na verdade, é Deus que ope-
Palavra pede “autorização”. É discreta, viando-O para levar aos pobres a ale- para o serviço da evangelização. Ajudai- ra em vós o querer e o agir segundo os
como quem nos quer bem, e só ela – pa- gre notícia; Vós sois Aquele que, com nos a participar neste serviço, vivendo-o seus desígnios de amor. Fazei tudo sem
radoxalmente! – tem a chave para abrir, o Batismo, nos destes a graça de nos na comunhão e na solidariedade. Ámen. murmurar nem discutir, para serdes ir-
repreensíveis e puros, filhos de Deus
sem mancha, no meio de uma geração
perversa e depravada, onde brilhais co-
mo estrelas no mundo, ostentando fir-
memente a palavra da vida. Será esse
o meu título de glória no dia de Cristo,
por eu não ter corrido inutilmente, nem
ter trabalhado em vão. Mas ainda que
eu tenha de derramar o meu sangue em
libação sobre o sacrifício e a oblação
da vossa fé, alegro-me e congratulo-me
com todos vós. E vós também, ale-
grai-vos e congratulai-vos comigo.
A PALAVRA DE DEUS EM COMUNIDADE 13

LEITURA ORANTE (LECTIO) própria Escritura (Catecismo da Igreja fornece-se uma explicação exegético- tinha começado muito antes, mesmo no
Católica, 112). O olhar alarga-se e torna- -espiritual do texto. início da carta. A sua tematização vem
Releiamos o texto, agora a nível pes- -se mais profundo; o coração e o mistério do início do capítulo 2 (acima referido,
soal; leiamos também o trecho anterior de Cristo tornam-se cada vez mais evi- como fundo do texto): a alegria de Paulo
– Fl 2,1-11 – porque é o contexto que dentes, próximos, luminosos. «A PALAVRA MISTURA-SE COM A e da sua comunidade. «Completai a mi-
o precede e o ilumina. Nesta releitura, HISTÓRIA E TRANSFIGURA-A COM nha alegria» (2,2) e conclui: «Alegro-me e
é bom que tenhamos à mão um lápis. UMA COMUNIDADE» congratulo-me com todos vós. E vós tam-
Sublinhemos os verbos de ação, os su- MEDITAÇÃO (MEDITATIO) bém, alegrai-vos e congratulai-vos comi-
jeitos, os substantivos, os adjetivos. Não O nosso grito go» (2,17-18) (o texto grego usa sempre
devoremos o texto com sofreguidão, mas A leitura que fala ao coração (cor ad Encontramo-nos diante de uma o mesmo termo – chara/chairo para dizer
assimilemo-lo lentamente, deixando es- cor loquitur) abre à meditação, à reflexão Palavra que se mistura com a história e alegria/alegrar-se).
correr e recorrer na mente e no coração, e às interrogações. Numa palavra: abre diante de uma história que é transfor- Nas primeiras palavras, o Apóstolo re-
como as ondas que rebentam com suavi- ao diálogo com o Senhor, animado e guar- mada e transfigurada pela Palavra. Isto corda à sua pequena comunidade o de-
dade na areia. dado pelo Espírito Santo, como nas mãos acontece, passando por uma pequena ver de obedecer a Deus «como fazíeis na
Pouco a pouco, os significados emer- de uma mãe, como sob as asas da galinha. comunidade, capaz de amar. Sim, porque minha presença». Que tinha acontecido,
gem (os sentimentos e os desejos de Pau- Que me diz o texto? Que está o Senhor «os homens fazem histórias, mas Deus então, naqueles poucos dias, entre 50 e
lo, o agir de Deus, o estilo de vida da co- a dizer-me? Reconheço que está presen- faz a História» (P. Oreste Benzi). Bem 51 d. C., quando Paulo chegou a Filipos
munidade, o perfil e o coração de Cristo te e age na minha história? Na nossa his- que precisávamos disto. Agora. Diante pela primeira vez e implantou a primeira
Jesus), mesmo sem métodos exegéticos tória? Na história da Humanidade? Que de uma história que, num instante, como Igreja na Europa?
sofisticados. Veremos, efetivamente, que está Ele a sugerir à minha comunidade? que foi entornada nas nossas mãos, por
«não é o muito saber que sacia ou satis- Que atitudes interiores deseja? Que ati- um inimigo tão pequeno – a Covid-19 – Paulo em Filipos: Deus transtorna
faz a alma, mas o sentir e saborear as coi- tudes corrigir? Que atitudes amadurecer que nem sequer o podemos ver a olho nu. e inverte todos os projetos
sas interiormente» (Inácio de Loyola). ainda mais? Que pensamentos e desejos Perdidos, impotentes, zangados. E Deus Aqueles pequenos dias, mas muito in-
Esta leitura calma não é uma canseira deseja que vivam no meu coração? Que onde está? Sim, perguntemos-Lho tam- tensos, são narrados ao pormenor em
inútil, uma perda de tempo: é o Espírito modos de agir e de falar poderiam ser re- bém a Ele: «Onde estás, ó Deus?» É o gri- At 16,6-40. Poderiam ser definidos como
que dá a volta ao trinco da nossa porta, vistos? Que irmãos feri/ferimos? Que ir- to de tantos, de muitos… de todos! um seguimento ininterrupto de contra-
para deixar entrar o grande Rei, o Esposo mãos dominei/dominámos? Que irmãos riedades e de surpresas. Paulo, acompa-
da alma e da nossa comunidade. descartei/descartámos? O fundo do texto: a alegria e a história nhado por Silas e pelo jovem Timóteo,
Terminada a leitura do texto, ler-se-ão Para promover e agilizar este diálo- O texto que acabámos de ler e reler não consegue fazer o que quer: Aquele
agora os textos paralelos, uma vez que a go com a Palavra, e fortalecer o espíri- inicia-se com um «portanto», pelo que se que «opera o querer e o agir» leva-o para
primeira chave que abre a Escritura é a to missionário da nossa comunidade, trata da conclusão de um discurso que onde ele não quer e, sobretudo, como ele
A PALAVRA DE DEUS EM COMUNIDADE 14

não teria imaginado nem, muito menos, dado muitas vergastadas, meteram-nos na prisão, «por volta da meia noite, em ora- Deseja partilhar com ela as vicissitu-
escolhido fazer. cadeia» (vv. 22-23). ção, entoava louvores a Deus» (v. 25), mas des que fizeram avançar o Evangelho,
Por duas vezes, de facto, o Espírito Perguntemo-nos: que terão pensado que também tinha visto todos os seus pla- que constituem toda a sua alegria (cf.
obstrui o “seu” caminho; depois, fá-lo ou- Paulo e os seus companheiros, a não ser: nos irem por água abaixo, a sua liberdade 1,18); reconhece que será salvo «graças
vir o grito de quem tinha necessidade ur- “Missão fracassada!”? a ser limitada e a expirar por entre pers- às vossas orações» (1,19); e depois vem o
gente do anúncio do Evangelho: «Passa à Mas precisamente «no calaboiço in- petivas estreitas e amargas. Os mesmos grito do seu íntimo, o miolo da sua vida,
Macedónia e vem ajudar-nos!» suplica-lhe terior da prisão» (v. 24), no ponto mais sentimentos que habitam hoje nos nos- a alma da sua alma: «para mim viver é
um macedónio (vv. 6-10). baixo em que podia cair a dignidade de sos corações diante da pandemia. Cristo»! (1,21).
Chegado a Filipos, primeira cida- um cidadão romano, terminam as “histó- Por este motivo, exorta a permane-
de macedónia da fronteira europeia (cf. rias dos homens” e começa a manifestar- Os Filipenses: a Esposa evangelizadora cer «firmes no mesmo espírito, comba-
v. 12), colónia de militares romanos na re- -se a “História de Deus”: aquele carcerei- Tinham passado poucos anos, quan- tendo juntos e numa só alma pela fé do
serva, procura encontrar-se com os pou- ro, que devia estar bem atento, ajuda-os do o judeu de Tarso, a partir de outra Evangelho, sem vos deixardes atemorizar
cos judeus reunidos em oração em dia a sair (!), lava-lhes as feridas e não pede prisão, dirige a esta pequena comunida- […], travando o mesmo combate que me
de sábado. Mas quem encontra nas mar- para salvar a pele, mas para salvar a vi- de, certamente já mais crescida a todos vistes sustentar e, como ouvis dizer, sus-
gens do rio Gangites? Não pios judeus da, com toda a sua família (cf. vv. 30-34); os níveis, uma carta, conhecida como a tento ainda» (1,27-30).
dados à leitura da Torah, mas mulheres, aqueles magistrados, que deviam conde- «carta da alegria e da amizade». Nela, já
que talvez estivessem a lavar roupa. Uma ná-los, de improviso dispõem a sua liber- não transparece o Apóstolo dos gentios, Hino à beleza da Esposa
delas, Lídia, a quem «o Senhor abriu o tação, «ficaram muito assustados e foram rude e impetuoso, mas o pai; mais ain- A este ponto da carta, o coração de
coração», «obrigou-os» a ficar na sua casa pedir-lhes desculpa» (vv. 35.38-39). da, quase o perfil do esposo: «Trago-vos Paulo derrete-se, abre-se e expande-se
(vv. 14-15): uma mulher abastada (e bas- Bem, através de duas mulheres, uma no coração […]. Deus é testemunha de num hino solene, amoroso e desejoso
tante insistente!), juntamente com a sua rica obstinada e uma jovem escrava, e por que vos amo a todos no coração de Cristo da beleza desta “sua” Igreja-esposa, que
família, tornam-se assim os primeiros meio da infame sede de lucro de quem ti- Jesus» (1,7-8); «meus amados e queridos pode enchê-lo, saciá-lo de alegria: «Se
cristãos europeus, batizados por Paulo. rava partido dela, o Espírito Santo muda irmãos, minha alegria e minha coroa» há em Cristo alguma consolação, se há
Como se os extravios não fossem já a história da Europa: a Palavra de Deus (4,1). – traduzimos com os exegetas – algum
suficientes, outra mulher, uma jovem es- como que fez cair as muralhas romanas Agradece a Deus e reza «sempre por conforto na caridade, se existe alguma
crava, que era adivinha de profissão, fá-lo aos pés – incrédulos – dos apóstolos! todos com alegria», porque sente que par- comunhão no Espírito, alguns senti-
perder a paciência («já agastado», v. 18); Este é o primeiro núcleo da comunida- ticipam «na causa do Evangelho» e «na mentos de ternura e misericórdia, então
mas o estouro ficou-lhe caro: sob pres- de de Filipos: a família de um carcereiro graça» que lhe foi concedida (1,5.7), qua- completai a minha alegria, tendo entre
são de quem a explorava, «os magistrados e de uma comerciante de púrpura. se que podemos dizer, tal como uma espo- vós os mesmos sentimentos e a mes-
mandaram que lhes arrancassem as ves- Foram eles que «obedeceram» à história sa, que sente que está ao seu lado, íntima ma caridade, numa só alma e num só
tes e os açoitassem e, depois de lhes terem de Deus, juntamente com Paulo, que na e fiel, na missão que lhe foi confiada. coração» (2,1-2).
A PALAVRA DE DEUS EM COMUNIDADE 15

Traços de beleza espiritual que Paulo Corpo eclesial (e a forma como volta a que entrar na sua história salvífica uni- luminosa, bela «sem mancha, nem ruga»
deseja ardentemente, mas que só pode- viver e a dar-Se em cada Eucaristia). versal, numa compenetração entre o agir (Ef 5,27; 1,4), esplendente como estrelas
rão ser impressos no rosto desta Esposa, Agindo deste modo, a primeira comu- humano – o querer interior e atuar exte- na noite do mundo (cf. Ef 5,8-4; Mt 5,14),
se os seus membros souberem renunciar nidade de Filipos – como dirá este texto – rior – e o trinitário. Por outras palavras, ou seja, no meio daqueles que se opõem
à avidez do “próprio eu” (superioridade, pode ser uma esposa fecunda: não apenas Paulo pede a esta Igreja-esposa um amor à história de Deus, «geração iníqua e de-
estima, interesses), despojar-se de si mes- como destinatária, mas sobretudo como profundo: a docilitas amoris (docilidade pravada» (cf. Dt 32,5).
mos (da sua vontade própria), desarmar- participante «na causa do Evangelho» no amor). E desfia as suas exigências, que É com esta beleza “teofânica” que a
-se uns diante dos outros (dos juízos e e «na graça» concedida ao Apóstolo de perfuram a alma até à carne viva: Igreja-esposa evangeliza: como lâmpa-
falatórios) e ficar no degrau mais baixo – anunciar o Evangelho. Por outras pala- «Fazei tudo – mesmo tudo! – sem mur- da colocada no alto, espalha a «palavra
como aquele em que está Paulo, ainda na vras, ser colaboradora na obra do anúncio murar»: não com «murmuraram» os is- que dá vida» e torna-se assim Esposa
prisão por causa do Evangelho (cf. 1,3-4). (espiritual e materialmente, cf. 4,15-18), raelitas no deserto, contra Moisés, com fecunda.
Numa Palavra, «tende em vós os mes- fazendo com que a Palavra seja “viva”, saudades da barriga cheia (cf. Ex 15,24; É a alegria e o orgulho de Paulo!
mos sentimentos que havia em Cristo eficaz, portadora de vida às “histórias dos 16,2; 17,3) e opondo-se assim ao “bené- A alegria da fecundidade do Apóstolo, pai
Jesus» (2,5), o qual não ficou agarra- homens”, isto é, introduzindo-as na “His- volo desígnio” da sua libertação e à Obra e esposo incansável (2,16); uma alegria
do às suas prerrogativas divinas, mas tória salvífica de Deus”, para serem trans- que Deus estava a realizar a favor deles e devido à qual – tinha acabado de escre-
despojou-Se e humilhou-Se a Si mes- figuradas, como aconteceu com Paulo, de toda a Humanidade. ver – «morrer» podia deixar de ser «um
mo, fazendo-Se obediente até ao extre- com Lídia, com o carcereiro e com as fa- «Fazei tudo – mesmo tudo! – sem dis- lucro» (1,21-26). Poder oferecer a Deus
mo. Uma obediência que foi, contudo, mílias deles. Mas avancemos por níveis. cutir», ou seja, sem fazer polémicas, sem uma fé tão vivida pela sua comunidade,
a porta real para entrar na sua “exalta- Paulo exorta com força os seus ama- contestar com vaidade, insinuar, descon- de facto, não tem preço, a não ser o do
ção” de Senhor da História (cf. 2,6-11). dos a entrarem na forma de “obedecer” fiar, contradizer, duvidar, criticar – tudo seu sangue; que Paulo, já acorrentado,
e “sentir” de Cristo, ou seja, a «trabalhar isto é fruto da malícia que sai do coração derramaria de bom grado por uma ofer-
A beleza da Esposa evangelizadora com temor e tremor para a vossa salvação» do homem (cf. Mt 15,19). ta do género, à maneira do seu Senhor,
Paulo exorta «portanto» a pequena co- (2,12), uma vez que “urge” à evangeliza- Enfim, Paulo pede à Esposa de Cristo verdadeiro e único Esposo, a quem a pro-
munidade a entrar nas atitudes de Cristo, ção. Com um temor filial, confiante (cf. que “morra por dentro” (de facto, é no meteu (cf. Ef 5,25-27; 2Cor 11,2).
na forma como Ele “sente” e “obedece”, não 1Cor 2,3; Ef 6,5), mas também solícito, coração que se consuma a indocilidade
apenas como indivíduos, mas também uma vez que a aposta é mesmo alta! Com a Deus!), que não se perca com “tantas A pergunta incómoda e a resposta da
como comunidade (cf. 2,5.12). A maneira efeito, na medida em que a pequena a co- histórias de homens”, que mate aquele “fraternidade”
como Cristo “sente”, “obedece” e “é exal- munidade se dá conta do apelo e da res- pecado pessoal e intracomunitário que Voltemos agora à pergunta ini-
tado” não é apenas um acontecimento ponsabilidade de Deus, «é Deus que ope- impede que Deus realize a “sua história cial: «Onde estás, ó Deus?» A Palavra
do passado, mas é ainda o modo como ra nela o querer e o agir, segundo os seus salvífica”. “Morrer por dentro”, como o anunciou-nos que Cristo é o Senhor
o Ressuscitado vive, diante do Pai, no seu desígnios de amor»: chama-a e fá-la como seu Esposo (2,7-8), para poder ser pura, da História e a “história de Deus” não
A PALAVRA DE DEUS EM COMUNIDADE 16

chegou ao fim, porque «Deus quer que do “cuidado” e não do descarte, da “gra- então, para confiar a Deus uma pessoa, É esta alegria totalmente interior, calma e
todos os homens se salvem» (cf. 1Tm 2,4): tuidade” e não do domínio. um grupo, um compromisso, uma obra. efusiva, que encorajou os grandes santos a
ela continua a realizar-se nas “histórias Por isso, conclui Paulo aos seus ama- Depois de ser expressa, a oração dis- realizar obras extraordinárias ou as obras
dos homens”, que hoje combatem tantas dos: «Alegrai-vos sempre no Senhor. cursiva para, cala-se e abre-se à con- ordinárias de modo extraordinário.
batalhas, entre as quais o ataque dissi- Novamente vos digo: alegrai-vos. templação, ou seja, torna-se olhar sim- Abre-se, então, a última fase, aquela
mulado da pandemia. O Senhor está próximo!» (4,4-5). ples com o Senhor Jesus e com o Pai, ao em que se discerne sobre “o que fazer”
Mesmo o grito do Apóstolo às suas jeito das crianças, dos namorados, das pelo Senhor, com o Senhor e no Senhor.
comunidades não ficou adormecido, mães. É um momento muito delicado,
mas continua a ecoar, desfiando – tam- ORAÇÃO (ORATIO E CONTEMPLATIO) em que a ação de Deus predomina sobre
bém para nós, indivíduos e pequenas o esforço humano de compreender e de DISCERNIMENTO E AÇÃO
comunidades – as exigências para ser Iluminados pelo esplendor da Palavra, falar. Mais que “olhar para Deus”, é “ser (DELIBERATIO E ACTIO)
colaboradores dóceis no anúncio, luzes podemos agora saborear a paz do cora- olhados” por Ele; é saborear a forma
da Palavra que dá vida. Uma voz que gri- ção, que sente que habita na verdade de como olha para a nossa vida e para a Por impulso da Palavra escutada e
ta: «Irmãos todos»! Deus. Abrimo-nos, então, à gratidão, ao nossa humanidade. como resposta a ela, que se torna “viva”
Sim, «todos», escreve o Papa louvor; mas também podemos ajoelhar- A este ponto, o coração “aquece”, por- por meio da ação do Espírito, aflora na
Francisco: todos procurem o bem do -nos, em arrependimento e com o desejo que experimenta a alegria evangélica, o alma o desejo, se não mesmo a urgên-
outro, todos pensem de acordo com o sincero e profundo de obter o perdão de sabor da verdade, da bondade de Deus e cia de uma determinada ação ou de um
“nós”, todos tenham um sentir solidário Deus e dos irmãos. de “ser do Senhor” (precisamente, cris- conjunto de ações. Percebe-se com uma
(como ecoa em Fl 2,2-4 e em tantos ou- A oração pode ser também invocação, tãos!). Dispõe-se a acolher as emoções, os certa clareza e segurança para onde se
tros passos da carta), construindo uma um pedido ao Pai para ajudar com o ne- toques e as luzes do Espírito Santo, que in- quer conduzir o Espírito: por exemplo, o
“cultura do encontro” e não do conflito, cessário para viver a Palavra escutada; ou cita a viver a medida alta da vida cristã. encontro com uma pessoa; a correção de
certas atitudes, de um modo de fazer ou
de falar; a iniciativa de uma boa obra ou
a renúncia a alguma ação, etc.
A contraposição entre oração e ação
desaparece. Nasce a ação contemplativa,
exercida na luz e com a força do Espírito
de Cristo.
A PALAVRA DE DEUS EM FAMÍLIA

A Palavra de
Deus em Família
„„ «Tua esposa será como videira fecun-
da, no íntimo do teu lar; teus filhos se-
rão como ramos de oliveira, ao redor
da tua mesa.» (Sl 128,3)

„„ Olhar para uma família à volta da


mesa é uma ocasião para descobrir
a história de amor que se construiu
entre eles. Uma história que, animada
pela Palavra de Deus, deve crescer e
ganhar força.

„„ Esta Palavra pode ser também «uma


companheira de viagem, mesmo pa-
ra as famílias que estão em crise ou
imersas em alguma tribulação, mos-
trando-lhes a meta do caminho»
(Amoris Laetitia, 22).

„„ Por isso, convém que a Palavra de


Deus seja acolhida em cada famí-
lia de modo que cada um dos seus
membros a conheça, a compreenda
e se sinta encorajado por ela.
Rito de acolhimento A PALAVRA DE DEUS EM FAMÍLIA 18
da Palavra de Deus em Família

N
o seguimento do Sínodo sobre Durante o Domingo da Palavra de Todos respondem: sessenta; outras, trinta por um. Quem
a Palavra de Deus foi publica- Deus, toda a família se reúne à volta da Ámen. tem ouvidos, oiça.”»
da a Exortação Apostólica Pós- mesa principal da sua casa, onde se co-
-sinodal Verbum Domini, na qual se lê: loca o crucifixo, uma imagem de Nossa Um membro da família toma a Todos os membros da família bei-
Senhora, uma vela e a Bíblia. Bíblia, abre-a, e começa a ler o seguin- jam o Livro da Sagrada Escritura.
«Do grande mistério nupcial deri- Um dos membros da família acende te texto: Mateus 13,1-9 (a parábola do Segue-se um momento de silêncio,
va uma imprescindível responsabilida- a vela e diz: semeador) de meditação sobre o texto escutado e
de dos pais em relação aos seus filhos. A luz de Cristo. de oração pessoal.
De facto, são próprios da autêntica pa- Todos respondem: Depois disso, uma pessoa lê o se-
ternidade e maternidade a comunica- Graças a Deus. AESCUTAI A PALAVRA DO SENHOR, guinte comentário:
ção e o testemunho do sentido da vi- DO EVANGELHO SEGUNDO SÃO
da em Cristo: através da fidelidade e De seguida, outra pessoa (também se MATEUS: Jesus conta à grande multidão a
unidade da vida familiar, os esposos pode dividir o texto por várias pessoas) parábola – bem conhecida de todos
são, para os seus filhos, os primei- recita a seguinte oração: «Naquele dia, Jesus saiu de casa e – do semeador, que lança a semente
ros anunciadores da Palavra de Deus. foi sentar-Se à beira-mar. Reuniu-se à em quatro diferentes tipos de terreno.
A comunidade eclesial deve ampará- Vem, ó Espírito Santo, entra em mim, sua volta tão grande multidão que teve A Palavra de Deus, simbolizada pe-
-los e ajudá-los a desenvolver a ora- no meu coração e na minha inteligência. de subir para um barco e sentar-Se, en- las sementes, não é uma Palavra ab-
ção em família, a escuta da Palavra, o Concede-me a tua inteligência, para quanto a multidão ficava na margem. strata, mas é o próprio Cristo, o Verbo
conhecimento da Bíblia. Por isso, que, meditando a Palavra do Evangelho, Disse muitas coisas em parábolas, nes- do Pai que encarnou no seio de Maria.
o Sínodo deseja que cada casa tenha a eu possa conhecer o Pai. tes termos: “Saiu o semeador a semear. Por isso, acolher a Palavra de Deus
sua Bíblia e a conserve em lugar digno Concede-me o teu amor, para que, Quando semeava, caíram algumas se- quer dizer acolher a pessoa de Cristo, o
para poder lê-la e utilizá-la na oração. exortado pela tua Palavra, também hoje, mentes ao longo do caminho: vieram próprio Cristo.
A ajuda necessária pode ser fornecida Te procure nos acontecimentos e nas as aves e comeram-nas. Outras caíram Há diversos modos de receber a
por sacerdotes, diáconos e leigos bem pessoas que fui encontrando. em sítios pedregosos, onde não havia Palavra de Deus. Podemos fazê-lo como
preparados. O Sínodo recomendou Concede-me a tua sabedoria, para muita terra, e logo nasceram, porque a um caminho, onde os pássaros vêm logo
também a formação de pequenas co- que eu saiba reviver e julgar, à luz da terra era pouco profunda; mas depois comer as sementes. Seria a distração,
munidades entre famílias, onde se cul- tua Palavra, aquilo que hoje fui vivendo. de nascer o sol, queimaram-se e seca- um grande perigo do nosso tempo.
tive a oração e a meditação em comum Concede-me a perseverança, para ram, por não terem raiz. Outras caíram Atormentados com tantos falatórios,
de trechos apropriados da Sagrada que, com paciência, eu entre na mensa- entre espinhos e os espinhos cresceram com tantas ideologias, pelas contín-
Escritura.» gem de Deus no Evangelho. e afogaram-nas. Outras caíram em boa uas possibilidades de nos distrairmos
(Verbum Domini, 85) São Tomás de Aquino terra e deram fruto: umas, cem; outras, dentro e fora de casa, pode-se perder o
A PALAVRA DE DEUS EM FAMÍLIA 19

gosto pelo silêncio, pelo recolhimento, Por fim – a quarta possibilidade – interesses, demasiadas solicitações, e Apaga-se a vela, dizendo:
pelo diálogo com o Senhor, a ponto de podemos acolhê-la como o terreno entre tantas vozes e tantas palavras é
correr o risco de perder a fé, de não bom. Aqui, e só aqui, a semente deita difícil distinguir a do Senhor, a única Fica connosco, Senhor, agora e por
acolher a Palavra de Deus. Estamos a raízes e dá fruto. A semente que caiu que nos torna livres. Por isso, é impor- toda a eternidade. Ámen.
ver tudo, distraídos com tudo, com as neste terreno fértil representa aqueles tante habituarmo-nos a ouvir a Palavra
coisas do mundo. que escutam a Palavra, acolhem-na, de Deus, a lê-la. Uma vez mais, repito
Outra possibilidade: podemos guardam-na no coração e põem-na em este conselho: tende sempre convosco
acolher a Palavra de Deus como um prática na vida de cada dia. um pequeno Evangelho, uma edição
terreno pedregoso, com pouca terra. Esta parábola do semeador é uma de bolso do Evangelho, no bolso, na
Aí, a semente desponta rapidamente, espécie de “mãe” de todas as paráb- mala... E assim, lede todos os dias um
mas também seca rapidamente, por- olas, porque fala da escuta da Palavra. bocadinho, para vos habituardes a ler a
que não consegue deitar raízes profun- Lembra-nos que ela é uma semente fe- Palavra de Deus e a compreender bem
das. É a imagem daqueles que acolhem cunda e eficaz; e Deus espalha-a por qual é a semente que Deus vos oferece
a Palavra de Deus com entusiasmo mo- toda a parte com generosidade, sem se e a pensar com que terra eu a recebo.
mentâneo, mas que permanece super- preocupar com o desperdício. Assim é o A Virgem Maria, modelo perfeito de
ficial, não assimila a Palavra de Deus. coração de Deus! Cada um de nós é um terra boa e fértil, nos ajude, com a sua
E assim, diante da primeira dificul- terreno onde cai a semente da Palavra, oração, a tornar-nos terreno disponível
dade – pensemos num sofrimento ou sem excluir ninguém! A Palavra é dada sem espinhos nem pedras, para poder-
numa inquietação da vida –, aquela fé a cada um de nós. Podemos pergun- mos dar bons frutos para nós e para os
ainda débil dissolve-se, como seca a se- tar-nos: que tipo de terreno sou eu? nossos irmãos.
mente caída entre as pedras. Pareço-me com o caminho, com o lu- Papa Francisco, Angelus,
Podemos, ainda – é a terceira possi- gar pedregoso, com as silvas? Se qui- 12 de julho de 2020
bilidade avançada por Jesus –, acolher sermos, com a graça de Deus, podemos
a Palavra de Deus como um terreno tornar-nos terreno fértil, lavrado e cul- Depois do comentário todos recitam
onde crescem as silvas. E os espinhos tivado com cuidado, para fazer com juntos a oração de Jesus:
são o engano da riqueza, do sucesso, que a semente da Palavra amadu- Pai nosso…
das preocupações mundanas... Aí, a reça. Ela já está presente no nosso co-
Palavra cresce um pouco, mas fica su- ração, mas fazê-la frutificar depende No fim da oração, a pessoa que acen-
focada, não é forte, morre ou então não de nós, depende do acolhimento que deu a vela toma a Bíblia e faz com ela o
dá fruto. dispensamos a esta semente. Muitas sinal da cruz, abençoando toda a famí-
vezes distraímo-nos com demasiados lia com a Sagrada Escritura.
Propostas formativas sobre A PALAVRA DE DEUS EM FAMÍLIA 20
a Palavra de Deus para os jovens

São Jerónimo garante que a Bíblia é o trecho bíblico encontrado, meditado e inglês, português e italiano) que, se- • http://www.knowhowsphere.net/
instrumento «com o qual, todos os dias, representado de forma inédita. Deste guindo as linhas-mestras do Papa e dos Bases2.aspx
Deus fala aos fiéis» (Carta CXXXIII, 13). modo, associa interiormente aspetos de bispos, desejam difundir o Evangelho • https://feyvida.org/wp-content/uplo-
Na Carta Scripturae Sacrae affectus, o si mesmo e da sua vida, exprimindo li- a exemplo de Ramon Pané, uma das ads/2019/10/feyvida-volantedeprogra-
Papa Francisco insiste na necessidade vremente aquilo que sente no grupo. As maiores figuras da Evangelização masbiblicos-v12.pdf
de compreender as palavras contidas ressonâncias profundas de cada jovem na América. Para se tornarem um • https://www.youtube.com/
na Sagrada Escritura para fazer ex- são partilhadas através de diversas lin- criston@uta, podem ir ao site: watch?v=Upk_3nGTP2g
periência do amor de Deus, que «não guagens: a partilha verbal-emocional, https://www.cristonautas.com/
tem preço» e é capaz de transformar a a gráfico-pictórica, a foto-linguagem,
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A PALAVRA DE DEUS EM FAMÍLIA 21

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• A Bíblia toca a vida das pessoas de


muitos modos. Descubram alguns
testemunhos.
• https://www.youtube.com/watch?-
v=EM70gegk-a8 (testemunho de
Giacomo Poretti)
• https://www.youtube.com/watch?v=-
zeC_Ez6cY7w (testemunho de alguns
católicos na Argentina)

Nota: Quem organiza o Domingo deve-


ria procurar algum testemunho na sua
língua.
A Palavra de Deus A PALAVRA DE DEUS EM FAMÍLIA 22
em tempos de Covid-19

A VIDA DOMÉSTICA, TERRENO a missão doméstica. Particularmente, assembleia litúrgica ou de comunhão (1Rs 17,8-24), casais sem filhos como
FÉRTIL PARA A SEMENTE DA o envio dos 72 discípulos por parte de fraterna, mas não exprimem a nossa re- Áquila e Priscila (At 18,2-3), as irmãs
PALAVRA DE DEUS Jesus: «Quando entrardes nalguma alidade individual ou familiar tão facil- Marta e Maria (Lc 10,38-42), ou pesso-
casa, dizei primeiro: “Paz a esta casa.” mente como uma casa ou uma sala. Uma as sozinhas, como Elias ou João Batista,
«Fique em casa» é o slogan que se tem E se lá houver gente de paz, a vossa paz casa da antiguidade (hebraico: bayit; gre- que vivem no deserto (1Rs 19,1-18;
repetido ao longo da pandemia. Este repousará sobre eles; senão, ficará con- go: oikía/oikós; latim: domus) não tem o Mc 1,4-6). Também Jesus entra na ca-
convite colocou à prova o nosso sentido vosco. Ficai nessa casa, comei e bebei mesmo valor sociológico das casas urba- sa de Simão Pedro, em Cafarnaum,
de solidariedade e de disciplina cívica. do que tiverem, que o trabalhador mere- nas de hoje. As nossas casas podem ser num sábado, cura a sua sogra que está
Foi também uma ocasião propícia pa- ce o seu salário. Não andeis de casa em mais variadas e complexas. São sobretu- doente, come com eles e dali dirige-Se
ra desenvolver a criatividade, para ex- casa. Quando entrardes nalguma cidade do espaços habitáveis, representam a in- em direção à porta da cidade (Mc 1,29-
plorar novas dimensões de convivência e vos receberem, comei do que vos servi- timidade das pessoas. São habitadas por 31). Pedro, seguindo docilmente a voz
familiar e para redescobrir a casa como rem, curai os enfermos que nela houver indivíduos ou por pequenos grupos de de Deus, supera toda a apreensão e en-
espaço de oração e de comunhão de fé. e dizei-lhes: “Está perto de vós o reino de amigos, casais ou famílias com poucos tra na casa de um importante oficial do
Nós, discípulos missionários de Jesus, Deus.”» (Lc 10,5-9) filhos. As casas da cidade foram concebi- exército romano, Cornélio, anuncia o
temos vivido esta oportunidade como Nestas palavras de Jesus é percetível das mais como um espaço onde a liberda- Evangelho, batiza todos em casa e fica
uma escola de escuta da Palavra de Deus todo um itinerário de evangelização: en- de pessoal é protegida e defendida e não com eles (At 10,1-48). Em todas estas re-
e de discernimento que nos tem levado trar na casa, habitar nela e a partir de- como uma plataforma para as relações alidades, Deus entra para anunciar uma
a fazer experiência da nossa comunhão la evangelizar a cidade. Os textos para- comunitárias. Não é estranho que os vi- boa notícia, para transformar as realida-
eclesial para lá de algumas práticas re- lelos de Mateus (10,11-14) e de Marcos zinhos não se conheçam e que a própria des, para propor novos inícios.
ligiosas e da nossa presença nas igrejas. (6,10-11) confirmam esta dinâmica. Com ideia da integração seja incómoda para a À luz destes testemunhos, pergunte-
A presente proposta pretende susci- efeito, a prática habitual de Jesus é teste- maioria. Não é fácil abater os muros do mo-nos:
tar um discernimento à luz do projeto munhada através do seu discurso e tor- preconceito ou construir pontes para fa-
evangelizador que nos é sugerido por na-se um paradigma para os discípulos vorecer uma cultura do encontro, muito • Quem vive na minha casa?
Jesus no Novo Testamento, para que que O seguem. embora seja apenas uma frágil parede de • Se Jesus entrasse na minha casa, que
possamos fazer uma avaliação do nosso poucos centímetros a separar-nos. encontraria?
processo de fé e de evangelização vivido Se bem que, na maioria das vezes, • Que Lhe pediria para me (nos) fazer?
na Igreja doméstica, como membros de ENTRAR NA REALIDADE os modelos domésticos apresentados • Como vivemos a nossa fé em casa?
uma família e como missionários cha- DE CADA CASA pela Bíblia sejam tendencialmente de • Estive em contacto com a comuni-
mados a anunciar a todos a Boa Nova. famílias numerosas, como a de Jacob dade paroquial ou com o grupo de
Nos Evangelhos sinóticos encontramos Os lugares de encontro comuni- (Gn 46,1-27), são bem variados: uma apostolado durante a pandemia?
algumas instruções de Jesus para viver tário favorecem a expressão de uma viúva de Sarepta com o seu filho único Senti-os próximos?
A PALAVRA DE DEUS EM FAMÍLIA 23

HABITAR A REALIDADE DA CASA nosso coração e nos permita continuar a dos seus discípulos (Mc 3,20.31-35). Avaliemos:
explorar outros aspetos que precisam de A casa de Pedro tornou-se a casa de
A realidade de cada casa tende a ser ser curados e transformados. E não há Jesus e dos seus discípulos; pode dizer- • Sente-se a presença de Deus na mi-
única, se bem que haja situações seme- nada de mais natural e encorajante para -se o mesmo da sua barca (cf. Lc 5,1-11). nha casa?
lhantes. A primeira coisa que Jesus nos o fazer que os ritos domésticos, também A mudança de nome de Simão para • De que modo favoreço um ambiente
sugere é saudar a família que pede a paz da partilha da mesa. Mas, antes de mais, Pedro reflete também esta profun- espiritual?
para aquela casa. É um costume típi- devemos deixar para trás tantas distra- da transformação na vida do apóstolo. • Para mim (nós) é importante ler e es-
co no Médio Oriente: em hebraico e em ções que impedem o diálogo e, depois, Podemos imaginá-lo a falar de Jesus cutar a Palavra de Deus?
árabe invoca-se a paz na saudação. Jesus devemos encorajar as pessoas a reapro- com palavras semelhantes às de Paulo, • Que faço para melhorar as minhas
ressuscitado faz isso com os seus discí- ximar-se. recordando até que ponto a sua vida deu relações em casa? Passo tempo com
pulos em contextos de medo e de insegu- As redes sociais, por exemplo, têm si- uma reviravolta: «Já não sou eu que vivo, os outros?
rança (Jo 20,19-23.26) e come com eles do grandes aliados para superar a dor mas é Cristo que vive em mim.» (Gl 2,20) • A Igreja aproximou-se verdadeira-
enquanto anuncia a Boa Nova da Páscoa causada pelo isolamento, instrumentos Paulo foi uma testemunha privilegia- mente da realidade da minha famí-
(Lc 24,36-53). Paulo faz o mesmo quan- para o estudo e para o trabalho, instru- da desta experiência. O seu testemunho lia com o seu modo de evangelizar?
do saúda as suas comunidades: «A graça mentos que permitem o acompanha- de Jesus Cristo teve um grande impacto • Dou-me conta de que as famílias
e a paz de Deus, nosso Pai, e do Senhor mento espiritual. Mas, ao mesmo tem- na vida de muitas pessoas que, dando- constituem uma prioridade para o
Jesus Cristo estejam convosco. Dou gra- po, podem “narcotizar-nos” e fazer-nos -lhe guarida, abriram as portas de casa cuidado pastoral da paróquia?
ças ao meu Deus, todas as vezes que me viver um mundo virtual paralelo junto também ao Mestre para que viesse ha-
lembro de vós, e em todas as minhas ora- de pessoas reais que evitamos e que pre- bitar nelas com os seus discípulos. Em
ções peço sempre por todos com alegria, cisam de nós. latim, estas casas chamam-se Domus EVANGELIZAR A PARTIR DA
recordando-me da parte que tomastes na A visita de Jesus à casa de Simão Ecclesiae. Paulo saúda-as com grande REALIDADE DA CASA
causa do Evangelho, desde o primeiro dia Pedro tornou-se tão regular, a ponto de afeto nas suas cartas: Áquila e Priscila
até ao presente. Tenho plena confiança de o evangelista situar aí outros momentos (1Cor 16,19; Rm 16,3-5); Estéfanes de Em dois dos passos antes menciona-
que Aquele que começou em vós tão boa da vida e do ensinamento de Jesus, co- Corinto (1Cor 1,16; 16,15); Filémon dos sobre a atividade de Jesus em casa
obra há de levá-la a bom termo até ao dia mo quando a casa estava tão cheia que (Fm 1,2); Ninfa (Cl 4, 15); Onesíforo de Pedro, apercebemo-nos que as pa-
de Cristo Jesus.» (Fl 1,2-6) tiveram de remover parte do telhado pa- (2Tm 1,16). Com efeito, este toque fa- redes ou o telhado de casa deviam de-
Neste período de pandemia, o nos- ra que Jesus pudesse curar um paralíti- miliar das primeiras comunidades cris- saparecer para integrar os outros nesta
so coração tem sido habitado por mui- co (Mc 2,1-12) ou quando a família de tãs é percetível nos seus conflitos (cf. nova realidade da família dos discípul-
tos medos que se espalham por todos os Jesus O procurava e estava à espera que 1Cor 1,11; 5,1; 7,1-17; Ef 5,22–6,4) e no os de Jesus (cf. Mc 2,1-12; 3,20.31-35).
cantos da casa. Portanto, o ponto de par- Ele saísse de casa, mas Ele convidava-os modo como Paulo se dirige a elas (cf. Parece que nestes casos se verificou a
tida é acolher a paz de modo que abra o a entrar para fazer parte da nova família Gl 4,19; 1Cor 4,15). parábola do grão de mostarda: «Sendo
A PALAVRA DE DEUS EM FAMÍLIA 24

a menor de todas as sementes, depois de A fé de uma família que vive a Boa «Não posso reduzir a minha vida autêntico, que ajuda a crescer, e as
crescer, é a maior de todas as plantas da Nova de Jesus Ressuscitado torna-se à relação com um pequeno grupo, formas mais nobres de amizade ha-
horta e torna-se árvore, de modo que as fermento que «uma mulher toma e mi- nem mesmo à minha própria famí- bitam em corações que se deixam
aves do céu vêm abrigar-se nos seus ra- stura em três medidas de farinha, até fi- lia, porque é impossível compreen- completar. O vínculo de casal e de
mos.» (Mt 13,32) car tudo levedado» (Mt 13,33). A par- der-me a mim mesmo sem uma teia amizade está orientado para abrir o
A casa transformada pela presença te desta nova perspetiva muda também mais ampla de relações. […] A mi- coração em redor, para nos tornar
de Jesus é chamada a crescer, a vida e o nosso modo de ver o mundo. Todo nha relação com uma pessoa, que capazes de sair de nós mesmos até
a esperança florescem dentro dela, tor- o planeta é visto como a nossa «casa estimo, não pode ignorar que es- acolher a todos.» (Fratelli tutti, 89)
na-se uma explosão de alegria contagio- comum» (Laudato Si’, nn. 1, 13 e 232) ta pessoa não vive só para a sua re-
sa como a daquela pobre mulher aflita e a humanidade como uma «grande lação comigo, nem eu vivo apenas Avaliemos:
que encontra a moeda perdida: «Quando família» (Fratelli Tutti, nn. 26 e 62). relacionando-me com ela. A nos-
a encontra, chama as amigas e vizinhas e O Papa Francisco di-lo claramente com sa relação, se é sadia e autêntica, • As paredes da minha casa são um li-
diz-lhes: “Alegrai-vos comigo, porque en- estas palavras: abre-nos aos outros que nos fazem mite para os meus sonhos e para a
contrei a dracma perdida.”» (Lc 15,9) crescer e enriquecem. […] O amor minha vocação?
• Senti-me chamado a cuidar dos ou-
tros fora do meu círculo familiar ou
de amigos?
• Tenho feito ou procurado fazer algo
desinteressadamente por alguém du-
rante esta pandemia?
• Tenho experimentado a alegria de
dar generosamente (cf. At 20,35)?
• Tenho visto a Igreja a ajudar-me,
a ser mais solidária?
• Vivo no mundo como numa casa co-
mum?
• Sinto-me parte da grande família
humana?
A Palavra de
Deus na oração
pessoal

„„ «A vossa palavra é farol para os


meus passos e luz para os meus
caminhos.» (Sl 119,105)

„„ Tal como num caminho escuro


procuramos uma luz que nos ilu-
mine para não cair, também de-
vemos procurar na Palavra de
Deus a luz para a nossa vida.

„„ Aproveitemos os vários métodos


que a Igreja coloca ao dispor dos
seus filhos, «para que a Palavra
de Deus possa tornar-se cada
vez mais o [seu] alimento espiri-
tual» (Comissão Bíblica Pontifícia,
A interpretação da Bíblia na Igreja,
Introdução, B).
Ler o Evangelho com A PALAVRA DE DEUS NA ORAÇÃO PESSOAL 26
o Beato António Chévrier

N
a noite de Natal de 1856, na O caminho proposto pelo Beato A. c. Conhecer Jesus Cristo nas suas ESCOLHA DO TEXTO
paróquia de Saint-André de Chévrier para se aproximar de Jesus foi diferentes presenças: o Estudo de
La Guillotière, o padre Antó- por ele denominado Estudo do Evange- Jesus Cristo nas Escrituras permi- A leitura parte sempre de um texto
nio Chévrier, sacerdote da diocese de lho e pode ser feito de forma pessoal, te reconhecê-l’O nos acontecimen- da Escritura, especialmente do Evan-
Lyon, na França, teve uma intuição: mas também em família, em grupo ou tos da vida; é precisamente neles gelho, conforme o aspeto que se de-
apercebeu-se que os aspetos princi- numa pequena comunidade, tendo em que se deve descobrir a novidade sejar aprofundar. Também é possível
pais das atitudes de Cristo, Salvador do vista os seguintes objetivos a alcançar da sua Pessoa, tal como se revelou escolher alguns textos sugeridos pe-
mundo, não são apenas uma realidade por parte de quem o pratica, seguindo nas Escrituras. la própria Liturgia do dia, para seguir
a contemplar, mas sobretudo um mo- os passos descritos aqui de seguida3: d. Tornar-se testemunhas de Jesus de modo sistemático a Palavra de Deus
delo ao qual conformar-se. Para expri- Cristo: trata-se de um Estudo que ordenada e proposta pela Igreja nos
mir os sentimentos que lhe iam na al- a. Deixar-se conhecer e amar pe- torna a pessoa idónea para falar Lecionários Dominical e Ferial.
ma depois daquela noite de luz, disse lo Pai: a iniciativa é sempre do como testemunha de Jesus Cristo, Fazer a leitura do Evangelho comuni-
ele: «Decidi que vou seguir Jesus mais Pai. É Ele que atrai todos para o cheia de alegria, audácia e parrésia. tariamente permite descobrir a riqueza
de perto.»1 Filho; são também iniciativa sua e. Ser servos dos pobres: o Estudo com que a Palavra ressoa no coração
Seguir Jesus, conformar-se às suas o desejo e a alegria de O conhecer, da Palavra que Se fez carne leva o humano, tornando presente a expe-
atitudes e permanecer verdadeiramen- amar e servir. No Estudo fazemos discípulo a abraçar n’Ele e como riência pessoal de cada um e iluminan-
te unidos a Ele no amor deveriam ser a experiência de ser gerados pela Ele a pobreza para servir os po- do as situações particulares da sua vi-
os objetivos de todo o cristão, mas, para graça e de viver um acontecimen- bres relegados para o último lugar. da. Neste caso, o texto é escolhido por
os alcançar, é necessário conhecê-l’O. to de graça. Este Estudo permite que a pessoa um ou por todos os membros do grupo.
O conhecimento de Jesus não é apenas b. Estar cheios do Espírito Santo pa- contemple os pobres no mistério
contemplativo, mas também em ordem ra caminhar no Espírito: no Estu- de Cristo e, ao mesmo tempo, in-
à ação. Se se investigar o Evangelho, vê- do, o discípulo deixa-se guiar pelo troduz no mistério do pobre. Só o ORAÇÃO INICIAL
-se que Jesus não quis apenas dar exem- Espírito de Jesus Cristo em direção conhecimento de Jesus Cristo dá
plos, mas também diretrizes para a à verdade plena, para viver dela e ao discípulo a capacidade de com- A leitura começa com um momen-
ação, porque Ele é «Mestre e Modelo»2. para a testemunhar no mundo. preender os pobres, de procurar to de silêncio e de oração, pedindo ao
os meios para transformar a sua Espírito Santo o dom do conhecimento
vida e acompanhá-los em direção de Jesus Cristo.
1
  Cf. Alfred Ancel, Lo Studio del Vangelo in Seguire
3
  Cf. Consiglio Generale del Prado, «Fa’, o Cristo, che à liberdade do amor.
Cristo più da vicino a cura del Prado Italiano. N. 5-6 ti conosca»: Lo Studio del Vangelo al Prado. Documen-
– Settembre – Dicembre 2004. p. 63. to a conclusione della Sessione Formativa dell’estate
2009 dedicata allo Studio del Vangelo. Ottobre 2010.
  Cf. Ibidem.
2
pp. 14-20. 38-39.
A PALAVRA DE DEUS NA ORAÇÃO PESSOAL 27

PROCLAMAÇÃO DO TEXTO seus ensinamentos à realidade e ao ORAÇÃO CONCLUSIVA No caso da leitura feita a nível comuni-
contexto em que vivo? tário, alguns ou todos podem tomar a
Depois, lê-se ou proclama-se o texto • Qual deveria ser a minha resposta à Depois de um tempo de silêncio, faz- palavra para dizer uma oração que faça
escolhido, com calma e com voz firme Palavra escutada e aprofundada? se uma oração de agradecimento a Deus eco daquilo que foi partilhado no mo-
conforme os casos. • Como é que esta Palavra ilumina e por aquilo que, com esta leitura, permi- mento anterior.
guia agora a minha vida, a vida da tiu que ficássemos a saber sobre Jesus.
minha família, a vida de quem me
REFLEXÃO, ESTUDO PESSOAL rodeia (amigos, colegas, vizinhos) e
E ATUALIZAÇÃO DO TEXTO a vida da Igreja?

Segue-se um tempo de reflexão e de Só através de uma relação de reci-


estudo pessoal sobre o texto proposto. procidade entre Jesus e a pessoa será
A escuta, a reflexão e a contemplação possível descobrir a novidade da sua
concentram-se antes de mais nas ações, Palavra nas vicissitudes da própria vi-
nos gestos, nas palavras e nas atitudes da. Sugere-se que cada um escreva os
de Jesus Cristo. Deve prestar-se atenção seus comentários e propósitos, de mo-
também aos outros personagens, na do que possam ser seguidos pessoal-
medida em que permitir conhecer mente ou partilhados com outras pes-
melhor Jesus Cristo. Também se po- soas, no caso de se fazer a leitura a nível
de fazer referência aos textos paralelos comunitário.
da Escritura ou aos comentários dos
Santos Padres da Igreja ou do próprio
Magistério para obter um maior conhe- PARTILHA
cimento e objetividade na leitura.
A nível pessoal, de modo a fazer a Se se fizer a leitura a nível comuni-
atualização do texto, é oportuno per- tário, este é o momento de comunicar
guntar-se: aos outros o fruto do trabalho feito.
Trata-se de uma partilha teologal e de
• Como é que o Espírito Santo me aju- fé que se faz com naturalidade e simpli-
da a descobrir a atualidade da pessoa cidade, sem discussões nem dialética.
do Senhor Jesus hoje e a aplicar os
Meditar o Evangelho do A PALAVRA DE DEUS NA ORAÇÃO PESSOAL 28
III Domingo do Tempo Comum

O Evangelho de Marcos conduz o atual. Estruturado em duas partes prin- sujeito ao sofrimento (Mc 8,31; 9,31; De seguida, sugere-se que se medite no
ciclo litúrgico B. Este Evangelho, redi- cipais (Mc 1,14–8,30; 8,31–16,8), ante- 10,33-34), e «Filho de Deus», de con- texto de Marcos 1,14-20 (O chamamento
gido com um vocabulário pobre e um cedidas por um Prólogo (Mc 1,1-13) e dição divina e sujeito à glorificação dos primeiros discípulos), segundo a me-
estilo simples, manifesta uma esplênd- seguidas de um Apêndice (Mc 16,9-20), (Mc 1,1; 15,39; 16,19). Por sua vez, o todologia proposta pelo Beato António
ida correspondência entra a mensagem nele o evangelista propõe-se revelar pro- discípulo é chamado a estar com Jesus, Chévrier.
de Jesus e os problemas e interesses gressivamente a identidade de Jesus a acompanhá-l’O de perto, a escutar os
das pessoas do tempo em que foi escri- e a identidade do discípulo. Jesus é o seus ensinamentos e a contemplar as
to. Podemos, certamente, afirmar que Messias esperado (Mc 8,27-30), «Filho suas maravilhas; a conhecê-l’O e a com- ORAÇÃO INICIAL
esta correspondência se mantém ainda do homem», de condição humana e preendê-l’O em profundidade; a entrar
em comunhão com Ele; a continuar a Começa-se com a invocação da pre-
sua missão, exercendo o ministério da sença das Pessoas Divinas ou de uma
Palavra, comunicando o seu Mistério e d’Elas em particular, usando as próprias
confirmando essa pregação com as suas palavras ou uma oração como esta aqui
obras (Mc 3,14-15).4 em baixo:
Apresentando o chamamento de
Jesus aos primeiros discípulos, nas mar- Ó Verbo! Ó Cristo!
gens do mar da Galileia – acontecimen- Como és belo! Como és grande!
to que, para eles, marcou o início de um Quem poderá conhecer-Te?
novo caminho de união pessoal com Quem poderá compreender-Te?
Jesus para lhes revelar o mistério do seu Ó Cristo, faz com que eu Te conheça e
ser –, o III Domingo do Tempo Comum Te ame!
constitui uma oportunidade para cada Porque Tu és a luz, lança sobre mim um
cristão renovar o seu compromisso de pequeno raio desta luz divina,
seguir Jesus e dar testemunho d’Ele, para que eu possa ver-Te
apesar das suas fragilidades. Deixa-te e compreender-Te.
provocar pela sua Palavra. Dá-me uma grande fé em Ti,
para que cada uma das tuas palavras
seja luz que me ilumina
e me faça ir para junto de Ti e seguir-Te
4
  Cf. Francisco Pérez Herrero, Evangelio según San
Marcos, La Casa de la Biblia. Salamanca, 1989. pp.
pelos caminhos da justiça e da verdade.
13-18. Ó Cristo! Ó Verbo!
A PALAVRA DE DEUS NA ORAÇÃO PESSOAL 29

u és o meu Senhor e o meu único


T Eles deixaram logo as redes e segui- TEXTOS PARALELOS, COMENTÁRIOS outros. Tiveram medo e foram-se em-
Mestre. ram Jesus. Um pouco mais adian- DOS PAPAS OU DO MAGISTÉRIO bora, abandonaram o Senhor.
Fala, que eu quero escutar-Te e pôr em te, viu Tiago, filho de Zebedeu, e seu DA IGREJA Ana, a segunda mulher de Elcana
prática a tua palavra, irmão João, que estavam no barco a (cf. 1Sm 1,1-8), era estéril, chorava
porque sei que ela vem do Céu. consertar as redes; e chamou-os. Eles Confronta os teus comentários quando a outra mulher, Fenena, que
Quero escutá-la, meditá-la, pô-la em deixaram logo seu pai Zebedeu no pessoais com o comentário do Papa tinha filhos, a ridiculizava. Mas no
prática, barco com os assalariados e seguiram Francisco a este texto. pranto de Ana estava a preparação
porque, na tua palavra, está a vida,
 Jesus.» para o nascimento do grande Samuel.
a alegria, a paz e a felicidade. «Depois de João ter sido preso, É assim que o Senhor nos prepara de-
Fala, Senhor, Jesus vai para a Galileia (1,14-20) e sde há tantas gerações. E quando as
Tu és o meu Senhor e o meu Mestre, COMENTÁRIOS PESSOAIS proclama o Evangelho com as me- coisas não correm bem, Ele mistu-
só a Ti quero escutar. smas palavras de João: cumpriu-se o ra-Se na história e põe-na em ordem.
Ámen. As perguntas seguintes podem aju- tempo, o reino de Deus está próximo, Até na genealogia de Jesus há pe-
Beato António Chévrier dar-te a aprofundar o texto: convertei-vos. cadores e pecadoras. Mas como
João tinha preparado o caminho a fez o Senhor? Misturou-Se; corri-
• Quais as ações realizadas por Jesus? Jesus. E Jesus segue por esse caminho. giu o caminho; endireitou as coisas.
PPROCLAMAÇÃO DO TEXTO (presta atenção aos verbos) Preparar os caminhos, também pre- Pensemos no grande David, gran-
(MC 1,14-20 – O CHAMAMENTO • Quais as palavras pronunciadas por parar as nossas vidas, é próprio de de pecador e, depois, grande santo.
DOS PRIMEIROS DISCÍPULOS) Jesus? Deus, do amor de Deus por cada um O Senhor sabe. Quando o Senhor
• Que atitudes descobres em Jesus? de nós. Ele não nos faz cristãos por nos diz: “amei-te com amor eterno”,
«Depois de João ter sido preso, Jesus • Quais as ações realizadas pelos dis- geração espontânea. Há muito que está a referir-Se a isto. Há tantas ge-
partiu para a Galileia e começou a pro- cípulos? (presta atenção aos verbos) Ele prepara o nosso caminho, pre- rações que o Senhor pensou em nós.
clamar o Evangelho de Deus, dizen- • Quais são as atitudes dos discípulos? para a nossa vida. Parece que aqui Acompanha-nos, experimentando os
do: “Cumpriu-se o tempo e está próxi- Simão, André, Tiago e João foram nossos próprios sentimentos, quan-
mo o reino de Deus. Arrependei-vos e escolhidos definitivamente; mas isto do nos aproximamos do matrimónio,
acreditai no Evangelho.” Caminhando Não te esqueças de tomar nota daquilo não significa que, a partir deste mo- quando esperamos um filho: em ca-
junto ao mar da Galileia, viu Simão e que descobres ou que te chama a mento, também tenham sido “defini- da momento da nossa história, espera
seu irmão André, que lançavam as re- atenção. tivamente fiéis”. Na verdade, mesmo por nós e acompanha-nos.
des ao mar, porque eram pescadores. eles cometem erros: fazem propostas Este é o amor eterno do Senhor.
Disse-lhes Jesus: “Vinde comigo e fa- não cristãs ao Senhor, efetivamente, Eterno, mas concreto. Um amor tam-
rei de vós pescadores de homens.” renegam-n’O. E Pedro mais do que os bém artesanal, porque Ele vai fazendo
A PALAVRA DE DEUS NA ORAÇÃO PESSOAL 30

a história e vai preparando o caminho ATUALIZAÇÃO DO TEXTO • Que deves mudar em ti para seres ca- ORAÇÃO CONCLUSIVA
para cada um de nós. Este é o amor da vez mais fiel ao chamamento que re-
de Deus. […] Ele é o Senhor da pre- Para fazeres teus os ensinamentos cebeste e à missão que te foi confiada? Pode-se concluir este momento
paração, que nos ama desde sempre do texto: de aproximação à Palavra com uma
e nunca nos abandona. Talvez seja Não te esqueças de colocar por oração saída do coração ou com esta
um ato de fé; não é fácil acreditar ni- • Recorda o momento em que o Senhor escrito os teus pensamentos e os teus que aqui se sugere:
sto, é verdade. Porque o nosso racio- veio ao teu encontro para te chamar a propósitos.
nalismo nos leva a dizer: mas porque ser seu discípulo missionário. Senhor Jesus, eis-me aqui, Tu me
é que o Senhor, com tantas pessoas • Esta escolha fez-te sentir o seu amor, convidas a deixar as minhas redes e a
com quem Se relaciona, vai pensar ajuda-te a ser feliz? PARTILHA seguir-Te. Há milhões de pessoas que
em mim? Mesmo assim, Ele prepa- • Como preparou este momento? (lugar, precisam de escutar a tua Palavra. Tu
rou o caminho para mim, com as nos- tempo, idade) Se a meditação do Evangelho for fei- me convidas a ser um pescador de ho-
sas mães, as nossas avós, os nossos • Quem interveio para o tornar possí- ta a nível comunitário, este é o momen- mens, com criatividade e entusiasmo,
pais, os nossos avós, e os bisavós, to- vel? to para partilhar com os outros as coi- com iniciativa e risco, com coragem e
dos: é assim que o Senhor faz. E este • Com que atitude respondeste? sas sobre as quais se refletiu. audácia.
é o seu amor: concreto, eterno e tam- • Como poderias colaborar para que o Reconheço que nem sempre me de-
bém artesanal.» Senhor Se encontre com outras pes- cidi a deixar aquilo que é um obstácu-
(Meditação, Domus Sanctae soas e as chame também para o seu lo para Te seguir com disponibilidade
Marthae, 13 de janeiro de 2014) serviço? total. No entanto, estou-Te infinitamen-
te grato pelo teu chamamento. Desejo
conhecer-Te cada vez mais, para que os
teus critérios possam iluminar e guiar
os meus pensamentos, as minhas in-
tenções e as minhas ações.
Dá-me a paixão de que preciso para
Te dar a conhecer a todos aqueles com
quem, todos os dias, eu contacto. Gos-
taria apenas que, quando os outros me
veem ou me escutam, pudessem desco-
brir-Te a ti, ó Jesus, incansável pescador
de homens. Ámen.
Rezar com a Palavra de Deus? A PALAVRA DE DEUS NA ORAÇÃO PESSOAL 31

«Senhor, ensina-nos a rezar!» (Cf. Lc O apelo dos discípulos sobre a impor- Shelomoh, foi interrogado por um seu é causa de admiração. O extraordinário
11,1) Hoje, mais do que nunca, é visí- tância de aprender a rezar traduz-se, discípulo: «Mestre, porque é que Deus é percetível na essencialidade da dinâmi-
vel no coração dos crentes o desejo de neste sentido, na necessidade que cada não escutou os meus pedidos? Falei com ca relacional estabelecida entre o Mestre
aprender a rezar. Ao longo dos séculos, pessoa sente de colmatar o abismo que a Ele longamente e, durante várias horas, e os seus interlocutores. É paradigmá-
os grandes mestres da espiritualidade separa de Deus, permitindo que Ele entre expus-Lhe insistentemente as minhas tico o episódio de Zaqueu. O efeito da
oriental e ocidental encontraram e suge- no seu coração. Ele, invisível e aparente- necessidades.» A resposta do rabino não conversão realiza-se no gesto simples,
riram métodos, definindo técnicas mais mente silencioso, manifesta-Se no diálo- se fez esperar: «Porque não permitiste essencial, extraordinariamente profun-
ou menos eficazes para aprofundar a go que desabrocha no coração do homem que Ele falasse.» Uma breve história que, do de quando o seu nome é pronuncia-
arte da oração. (cor ad cor loquitur). Um diálogo que, em no entanto, coloca em evidência a verda- do. Um homem com mil rótulos: e Deus
Nos últimos anos registou-se um cres- muitas ocasiões, corre o risco de passar deira condição que predispõe o crente recorda-se dele com o seu nome verda-
cimento exponencial no número das esco- de “piedosa oração” a um monólogo em para alcançar a eficácia na oração. deiro. Isto transforma-se em celebração
las de oração no âmbito pastoral, como que o homem desafoga os seus desejos A Palavra de Deus representa o iní- da salvação.
proposta educativa eficaz para a valoriza- mais despropositados, relegando o par- cio da história da salvação que Ele cons- A oração é essencialmente um desejo
ção humana e espiritual das comunidades ceiro divino para a condição de alguém trói connosco e ilumina os passos da de sentir que Deus nos ama, Se recorda
cristãs, evidenciando nessa perspetiva o obrigado a escutar em silêncio. O eco do vida humana. Aprender a rezar com a de nós, pronuncia o nosso nome. A leitu-
desejo ardente do coração humano que se nosso “eu” que sentimos nas nossas invo- Palavra divina significa assumir profun- ra dos textos sagrados sugere no coração
dá conta da necessidade de se encontrar cações é sinal claro do mutismo divino. damente na própria vida o mistério de do homem as palavras que se tornam res-
com o coração de Deus através da oração. O caminho para voltar a caminhar Deus que ilumina e patenteia o mistério posta ao apelo divino. É nesta dimensão
Por isso, é necessário perguntar-se qual a precedidos e acompanhados pelo agir do homem. Seguir os sinais divinos que orante que poderíamos interpretar o epi-
tipologia mais adequada para cumprir a de Deus é o da escuta da sua Palavra. À vamos descobrindo na sua Palavra aco- sódio da visita de Jesus à casa de Betânia.
tarefa de uma boa oração. pergunta sobre se é possível rezar com lhida, meditada e saboreada no espaço da As duas irmãs de Lázaro, Marta e Maria,
O substantivo precarius (pobre, pre- a Palavra de Deus, respondemos com oração pessoal introduz a nossa vida na são o reflexo de duas atitudes paradig-
cário), de onde deriva o verbo latino pre- extrema clareza: ela é a fonte da ora- dinâmica sapiencial de caminhar orien- máticas para a vida espiritual: a primei-
care (fazer preces, rezar), predispõe as ção. O primeiro lugar compete à voz de tados por uma presença consoladora que ra, atarefada com mil serviços, predispõe
nossas sensibilidades para a compreen- Deus, seguindo-se depois, num segundo patenteia a beleza e o bem da vida crente. o seu coração para o acolhimento do
são de um elemento essencial de onde momento, a escuta do homem, uma vez A Palava divina lança os alicerces que Divino Mestre com a certeza insipiente
partir, ou seja, o da pobreza da nature- que «a fé vem da escuta» (cf. Rm 10,17). sustentam a casa da oração, onde se de quem tenta criar espaço para Deus
za humana. A oração nasce de um dese- Há uma história ao estilo hebrai- deve acolher Deus e celebrar o memo- com o coração já ocupado; a segunda é
jo de colmatar uma necessidade de algo co que ajuda a esclarecer a importân- rial da salvação. Refletir sobre a metodo- o protótipo do crente que se deixa envol-
que nos faz falta e que se pode obter ape- cia da Palavra no âmbito da oração. Um logia com que Jesus “chama”, de que o ver e acolher pelo mistério divino des-
nas pedindo-o. velho rabino, mestre de oração, o rabino Evangelho faz eco em múltiplos passos, cobrindo nele a fisionomia do seu ser.
A PALAVRA DE DEUS NA ORAÇÃO PESSOAL 32

«A parte melhor» torna-se, assim, a con- a Palavra se torne oração por meio da referência e a fonte de onde tirar água • Encontra um passo específico da
dição necessária para viver uma oração pobreza do nosso coração enriqueci- pura e cristalina da Sabedoria divina. Sagrada Escritura sobre o qual rezar.
de diálogo eficaz entre o homem e Deus. do pela presença de Deus. A oração da Mas para que tudo isto se realize é neces- • Dá-te conta de estar na presença da
A Palavra suscita também o desejo de Palavra e a Palavra rezada criam as con- sário rezar, e rezar bem, não com as pala- Palavra Viva.
rezar pelos outros que partilham a nos- dições necessárias para acolher e sentir a vras, mas com a Palavra! • É necessário leres o passo escolhido
sa condição humana. Esta tarefa mede- presença real de Deus. com atenção, em voz baixa ou alta,
-se diretamente com o progresso pessoal A Igreja que proclama, conserva e tendo consciência de não estares
no caminho de fé porque «um cego não transmite a Palavra divina deve ser con- PROPOSTA DE ORAÇÃO PESSOAL diante de um jornal.
pode guiar outro cego» (cf. Lc 6,42). Um siderada uma escola de oração, onde se • Depois de teres lido, sublinha as pala-
exemplo significativo que encontramos pode aprender a rezar. Nela, é necessá- • Invoca o Espírito Santo… Veni vras que te suscitam maior interesse.
na Bíblia é o Livro dos Salmos. É um ria a presença de valorosos mestres de Sancte Spiritus… • Reflete sobre as palavras sublinha-
livro de oração em que as palavras huma- oração que ajudem a mostrar a direção a • Cria o ambiente adequado para das. O que significam? Que sugerem
nas, inspiradas pelo Espírito Santo, se seguir para um caminho de progressiva manter uma boa concentração: evita à vida? A quem se dirige essa frase?
tornam Palavra de Deus. É possível rezar aprendizagem da arte de saber rezar que lugares ruidosos, espaços demasiado • Em que medida a Palavra escutada
com a Palavra e também é possível que encontra na Palavra de Deus a principal amplos. O quarto é uma sugestão. tem que ver com a minha vida pes-
soal, com a condição em que me
encontro?
• Pensa em fazer perguntas, pedidos
dirigidos a Deus, não te esquecendo
de envolver os outros.
• Reflete sobre o que Deus deseja de ti.
• Reza com a Palavra: deixa que a vida
seja penetrada pela Palavra escutada.
• Dá graças a Deus e, com esse agrade-
cimento, conclui o momento de ora-
ção pessoal.
Apêndice:

Igreja e Palavra
de Deus

„„ «O afeto pela Sagrada Escritura,


um terno e vivo amor à Palavra
de Deus escrita é a herança» que
os Santos Padres e os Papas dei-
xaram à Igreja através da sua vi-
da e das suas obras. Alguns de-
les consagraram as suas «forças
a tornar as palavras divinas cada
vez mais acessíveis aos outros»,
como fez São Jerónimo. Deixe-
mo-nos guiar pelos seus ensi-
namentos para nos enamorar-
mos cada vez mais da «carne da
Escritura» que é Cristo (cf. Scrip-
ture Sacrae affectus).
A Voz dos Padres da Igreja IGREJA E PALAVRA DE DEUS 34

A
celebração do Domingo da Pala- fecha, que fecha e ninguém abre (Ap Evangelho (verificou-se tudo o que antes da chegada do Salvador, não
vra de Deus deste ano dá voz a 3,7), para que nos abra o caminho foi escrito), mas para poder subir havia naquela região nada de eleva-
São Jerónimo, Padre e Doutor recôndito do Evangelho, e também gradualmente em direção às coi- do, mas, pelo contrário, tudo se pre-
da Igreja, cujo XVI centenário da morte nós possamos dizer juntamente com sas mais elevadas. «Depois de João cipitava para baixo: alastrava-se a
foi recordado pelo Papa Francisco com David: «Mostra-Te diante dos meus ter sido preso, Jesus voltou para a luxúria, a abjeção, a impudicícia e os
a Carta Apostólica Scripturae Sacrae af- olhos e eu contemplarei as maravi- Galileia.» No domingo passado, dis- homens estavam reféns dos vícios e
fectus, promulgada a 30 de setembro de lhas da tua lei.» (Sl 118,18). Às mul- semos que João é a lei e que Jesus é dos prazeres animalescos.
2020. tidões o Senhor falava em parábolas, o Evangelho. De facto, João diz: «Vai
e falava exteriormente. Não falava chegar depois de mim Alguém que é «Pregando a boa nova do reino
no íntimo, isto é, no espírito; fala- mais forte do que eu e eu não sou de Deus.» (Mc 1,14)
COMENTÁRIO EXEGÉTICO va com a linguagem exterior, confor- digno de me inclinar para desatar
A MC 1,14-20 me a letra. Rezemos ao Senhor, para as correias das suas sandálias.» (Mc Tanto quanto posso recordar,
que nos introduza nos seus misté- 1,7) E noutro lugar: «Ele deve crescer nunca ouvi falar do reino dos céus
Ao comentar o Evangelho deste Do- rios, nos faça entrar nos seus apo- e eu diminuir.» (Jo 3,30) A compara- na Lei, nos profetas ou nos salmos,
mingo, São Jerónimo concentra-se sentos secretos e que também nós ção entre João e Jesus é a compara- mas somente no Evangelho. O reino
em dois aspetos: depois de João Bati- possamos dizer, juntamente com a ção entre a lei e o Evangelho. João diz de Deus foi-nos aberto depois de ter
sta ter sido preso, Jesus, em vez de ir esposa do Cântico dos Cânticos: «O ainda: «Eu batizo na água» – é a lei – e vindo Aquele que disse: «O reino de
a Jerusalém, centro do poder político rei fez-me entrar nos seus aposen- «Ele batizar-vos-á no Espírito Santo» Deus está no meio de vós» (Lc 17,21),
e religioso, dirige-se para a região da tos.» (Ct 1,4) O apóstolo diz que foi (Mc 1,8) – é o Evangelho. Portanto, que o reino de Deus está aberto dian-
Galileia, uma periferia, e partindo daí colocado um véu a cobrir os olhos de Jesus volta, porque João foi preso te de nós. De facto, Jesus chegou,
anuncia a boa notícia do Reino de Deus. Moisés (2Cor 3,13). Eu digo que não na cadeia. A lei foi aprisionada, dei- pregando a boa nova do reino de
só no caso da lei, mas também no do xou de ter a liberdade do passado: Deus. «Desde os dias de João Batista,
«Depois de João ter sido preso, Evangelho, um véu cobre os olhos mas da lei passamos ao Evangelho. o reino dos céus tem sido objeto de
Jesus voltou para a Galileia.» de quem não sabe. O judeu escutou- Estai atentos àquilo que Marcos diz: violência e os violentos apoderam-
(Mc 1,14) -o, mas não o compreendeu: para ele «Depois de João ter sido preso, Jesus -se dele» (Mt 11,12): antes da vinda
o Evangelho estava velado. Os gen- voltou para a Galileia.» Não foi para a do Salvador e da luz do Evangelho,
Este relato é conhecido e parece tios escutam, escutam os hereges, Judeia, nem para Jerusalém, mas para antes que Cristo, com o ladrão,
ser claro para quem o escuta, mesmo mas também para eles está velado. a Galileia dos gentios. Enfim, Jesus abrisse a porta do paraíso, todas as
sem a nossa explicação. No entanto, Abandonemos a letra com os judeus regressa à Galileia: na nossa língua, almas dos santos eram conduzidas
rezemos Àquele que tem a chave de e sigamos o espírito com Jesus: e não Galileia traduz o termo grego kata- aos infernos. Jacob diz: «Chorando
David, Àquele que abre e ninguém porque devamos condenar a letra do kyliste («que foi baixada»). Porque, e gemendo descerei aos infernos.»
IGREJA E PALAVRA DE DEUS 35

(Gn 37,35) Quem não irá para os nos infernos: e quando morreu, não se abrirá o reino de Deus; por A primeira coisa que deve aprender
infernos, se Abraão está nos infer- desceu aos infernos para libertar esta razão, agora está próximo, mas é o Saltério; os Salmos devem fazê-la
nos? De facto, na Lei, Abraão vai para as almas que aí estavam prisionei- não está aqui, porque ainda não sofri esquecer as cançonetas. Depois, dos
os infernos; no Evangelho, o ladrão ras. «Pregando a boa nova do rei- a paixão. «Arrependei-vos e acreditai Provérbios de Salomão tire as nor-
vai para o paraíso. Não desdenha- no de Deus e dizendo: cumpriu-se» na Boa Nova» (Mc 1,15): acreditai, mas para a vida. Com o Eclesiastes
mos Abraão, em cujo seio todos dese- o tempo da lei, chegou o princípio não já na Lei, mas no Evangelho, ou deve habituar-se a considerar as coi-
jamos descansar, mas preferimos do Evangelho, «está próximo o rei- melhor, acreditai no Evangelho por sas do mundo como nada. No Livro
Cristo a Abraão, o Evangelho à Lei. no de Deus» (Mc 1,14-15). Não disse: meio da Lei, tal como está escrito: de Job deve procurar imitar os exem-
Lemos que, depois da Ressurreição já chegou o reino de Deus; mas dis- «Da fé para a fé.» (Rm 1,17). A fé na plos de fortaleza e de paciência.
de Cristo, muitos santos apareceram se que o reino estava próximo. Quer Lei fortalece a fé no Evangelho. Depois, passe para os Evangelhos,
na cidade santa. O nosso Senhor e dizer: antes de eu sofrer a paixão, São Jerónimo, Comentário que as suas mãos nunca deveriam
Salvador pregou na terra e também antes de eu derramar o meu sangue, ao Evangelho de Marco, pousar. Com todo o desejo do seu
1-2 (Homilia 76) coração, mate a sede nos Atos dos
Apóstolos e nas Cartas.»
São Jerónimo, Carta CVII, 12
A PALAVRA DE DEUS
NA EDUCAÇÃO DOS FILHOS «Com exemplo, habitue-a a levan-
tar-se de noite para a oração e o can-
São Jerónimo dá alguns conselhos a to dos Salmos, para cantar os hinos
Leta, uma mulher nobre romana, para até à aurora… Assim deve passar o
a educação da sua filha Paula. Exorta-a dia, e a noite deve encontrá-la nesta
a ensinar a sua filha a valorizar, conhe- atividade. Depois da oração deve vir
cer e rezar com a Sagrada Escritura. a leitura [dos livros divinos]; depois
da leitura a oração.»
«Ame os livros divinos em vez São Jerónimo, Carta CVII, 9
das pedras preciosas e dos vestidos
de seda; neles, porém, não se delei- «A sua língua, enquanto ainda é
te com as miniaturas de ouro ou de tenra, deve impregnar-se da suavida-
couro da Babilónia, mas em repro- de dos Salmos.»
duzir sabiamente a sua redação com São Jerónimo, Carta CVII, 4
sinais diacríticos no texto original.
A Voz dos Papas IGREJA E PALAVRA DE DEUS 36

HOMILIA NO DOMINGO DA Se posicionar em relação a nós. Ora, Então, compreendemos o convite como a carta de amor que escreveu
PALAVRA DE DEUS DE 2020 Jesus diz-nos que o reino dos céus está direto de Jesus: «convertei-vos», isto é, para ti, para te fazer sentir que Ele está
próximo, que Deus está próximo. Aqui «mudai de vida». Mudai de vida, por- junto de ti. A sua Palavra consola-nos
Comentando na Basílica de São está a novidade, a primeira mensagem: que começou um modo novo de viver: e encoraja-nos. Ao mesmo tempo, pro-
Pedro os textos da liturgia do dia, em Deus não está longe, Aquele que habita acabou o tempo de viver para nós mes- voca a conversão, sacode-nos, liberta-
que se celebrava pela primeira vez o nos céus desceu à terra, fez-Se homem. mos, começou o tempo de viver com -nos da paralisia do egoísmo. Porque
Domingo a Palavra de Deus, o Papa Removeu as barreiras, eliminou as dis- Deus e para Deus, com os outros e para a sua Palavra tem este poder: o poder
Francisco convidou todos a acolher tâncias. Não é mérito nosso: Ele des- os outros, com amor e por amor. Hoje, de mudar a vida, de transferir da escu-
sempre com amor o dom da Palavra ceu, veio ao nosso encontro. E esta Jesus repete também a ti: «Coragem, ridão para a luz. Esta é a força da sua
divina, contida na Sagrada Escritura, proximidade do seu povo é um hábito estou próximo de ti, arranja espaço Palavra.
no fundo do coração. Esta foi a reflexão de Deus, desde o princípio, mesmo do para Mim e a tua vida mudará!» Jesus 2. Se virmos bem onde é que Jesus
do Santo Padre. Antigo Testamento. Dizia Ele ao povo: bate à porta. É para isto que o Senhor começou a pregar, descobrimos que o
«Jesus começou a pregar» (Mt 4,17): «Pensa bem! Que povo tem os seus te dá a sua Palavra: para que a recebas fez precisamente a partir das regiões
é assim que o evangelista Mateus deuses tão próximos, como Eu estou
introduz o ministério de Jesus. Ele, próximo de ti?» (Cf. Dt 4,7) E esta pro-
que é a Palavra de Deus, veio para nos ximidade fez-se carne em Jesus.
falar, com as suas palavras e a sua vida. É uma mensagem de alegria: Deus
Neste primeiro Domingo da Palavra de veio pessoalmente visitar-nos, fazen-
Deus, vamos às origens da sua pre- do-Se homem. Não tomou a nossa
gação, às fontes da Palavra de vida. condição humana por um sentido de
Ajuda-nos o Evangelho de hoje (Mt responsabilidade – Não! – mas por
4,12-23), que nos diz como, onde e a amor. Por amor assumiu a nossa
quem Jesus começou a pregar. humanidade, porque se assume aqui-
1. Como iniciou? Com uma frase lo que se ama. E Deus assumiu a nossa
muito simples: «Convertei-vos, porque humanidade, porque nos ama e, gra-
está próximo o reino dos céus.» (4,17) tuitamente, quer dar-nos a salvação
Esta é a base de todos os seus discur- que, sozinhos, não poderíamos obter.
sos: dizer-nos que o reino dos céus Deseja estar connosco, dar-nos a bele-
está próximo. E que significa isto? Por za de viver, a paz do coração, a alegria
reino dos céus entende-se o reino de de ser perdoados e de nos sentirmos
Deus, ou seja, o seu modo de reinar, de amados.
IGREJA E PALAVRA DE DEUS 37

então consideradas «tenebrosas». os lugares onde pensamos que Ele não


De facto, a Primeira Leitura e o chega. Quantas vezes, porém, somos
Evangelho falam-nos daqueles que nós que fechamos a porta, preferin-
jaziam «na sombria região da mor- do manter escondidas as nossas con-
te»: são os habitantes da «terra de fusões, opacidades e duplicidades.
Zabulão e Neftali, caminho do mar, Selamo-las dentro de nós, enquanto
região de além do Jordão, Galileia dos vamos ter com o Senhor com alguma
gentios» (Mt 4,15-16; cf. Is 8,23–9,1). oração formal, tendo cuidado para
Galileia dos gentios: assim se chama- que a sua verdade não nos abale inti-
va a região onde Jesus começou a pre- mamente. Isto, porém, é uma hipo-
gar, porque era habitada por pessoas crisia escondida. Mas, como diz o
muito diferentes entre si formando Evangelho de hoje, Jesus «começou
uma verdadeira amálgama de povos, a percorrer toda a Galileia, […] pro-
línguas e culturas. De facto, era aí clamando o Evangelho do Reino e
o caminho do mar, que constituía curando entre o povo todas as doen-
uma encruzilhada. Aí viviam pesca- ças e enfermidades» (v. 23): começou
dores, comerciantes e estrangeiros: a atravessar toda aquela região multi-
não era, certamente, o lugar onde se forme e complexa. Do mesmo modo,
encontrava a pureza religiosa do povo não tem medo de explorar os nos-
eleito. E, no entanto, Jesus começou sos corações, os nossos lugares mais
por lá: não pelo átrio do templo de ásperos e difíceis. Jesus sabe que só o
Jerusalém, mas pelo lado oposto do seu perdão nos cura, só a sua presença
país, pela Galileia dos gentios, por um nos transforma, só a sua Palavra nos
lugar de fronteira. Começou a partir renova. A Ele que percorreu o cami-
de uma periferia. nho do mar, abramos os nossos cami-
Disto mesmo podemos tirar uma nhos mais tortuosos – os que temos
lição: a Palavra que salva não procu- no nosso interior e não queremos ver
ra lugares resguardados, esteriliza- ou ocultamos –, deixemos entrar em
dos, seguros. Vem às complicações nós a sua Palavra, que é «viva, eficaz;
dos nossos dias, às nossas escuridões. […] discerne os sentimentos e inten-
Hoje, como então, Deus deseja visitar ções do coração» (Hb 4,12).
IGREJA E PALAVRA DE DEUS 38

3. Por fim, a quem começou Jesus chamamento. Só Ele, que nos conhe- da Igreja, o Papa Bento XVI publicou momento da oração (oratio), que
a falar? O Evangelho diz que, «cami- ce e nos ama profundamente, nos a Exortação Apostólica Pós-sinodal supõe a pergunta: que dizemos ao
nhando ao longo do mar da Galileia, leva a fazer-nos ao largo no mar da Verbum Domini. Aí se explica como se Senhor, em resposta à sua Palavra?
[Jesus] viu dois irmãos […] que lança- vida. Tal como fez com aqueles discí- deveria realizar uma Lectio divina, ou A oração enquanto pedido, inter-
vam as redes ao mar, pois eram pesca- pulos que O escutaram. seja, uma “leitura orante” das Sagradas cessão, ação de graças e louvor é o
dores. Disse-lhes: “Vinde comigo e Eu Por isso, precisamos da sua Palavra: Escrituras. primeiro modo como a Palavra nos
farei de vós pescadores de homens.”» de escutar, no meio dos milhares de transforma. Finalmente, a lectio
(Mt 4,18-19) Os primeiros destinatá- palavras de cada dia, a única Palavra «A lectio divina “é verdadeiramen- divina conclui-se com a contempla-
rios do chamamento foram alguns pes- que não nos fala de coisas, mas que te capaz não só de desvendar ao fiel ção (contemplatio), durante a qual
cadores: não pessoas cuidadosamente nos fala de vida. o tesouro da Palavra de Deus, mas assumimos como dom de Deus o seu
selecionadas com base nas suas capa- Queridos irmãos e irmãs, dêmos também de criar o encontro com próprio olhar, ao julgar a realidade, e
cidades, nem homens piedosos que espaço no nosso interior à Palavra de Cristo, Palavra divina viva”. Quero interrogamo-nos: qual é a conversão
estavam no templo a rezar, mas pes- Deus! Leiamos diariamente algum aqui lembrar, brevemente, os seus da mente, do coração e da vida que o
soas comuns que estavam a trabalhar. versículo da Bíblia. Comecemos pelo passos fundamentais: começa com Senhor nos pede? São Paulo, na Carta
Vejamos o que Jesus lhes disse: Evangelho: tê-lo aberto na mesinha de a leitura (lectio) do texto, que susci- aos Romanos, afirma: “Não vos con-
farei de vós pescadores de homens. cabeceira, em casa, trazê-lo connosco ta a interrogação sobre um autênti- formeis com este mundo, mas trans-
Fala a pescadores e usa uma lingua- no bolso ou na pasta, vê-lo no telemó- co conhecimento do seu conteúdo: formai-vos pela renovação da vossa
gem que eles são capazes de com- vel, deixar que nos inspire todos os o que diz o texto bíblico em si? Sem mente, a fim de conhecerdes a von-
preender. Atrai-os a partir da sua dias. Descobriremos que Deus está este momento, corre-se o risco de o tade de Deus: o que é bom, o que
própria vida: chama-os ali mesmo, no perto de nós, que ilumina as nossas texto se tornar apenas um pretexto Lhe é agradável e o que é perfeito.”
lugar onde estão e tal como são, para trevas e que nos conduz amorosamen- para nunca ir além dos nossos pen- (12,2) De facto, a contemplação ten-
os envolver na sua própria missão. «E te pelo alto-mar da nossa vida. samentos. Segue-se, depois, a medi- de a criar em nós uma visão sapien-
eles deixaram as redes imediatamente Francisco, Homilia, tação (meditatio), durante a qual cial da realidade segundo Deus e a
e seguiram-n’O.» (v. 20) Porquê ime- 26 de janeiro de 2020 nos perguntamos: que nos diz o tex- formar em nós “o pensamento de
diatamente? Simplesmente porque se to bíblico? Aqui cada um, pessoal- Cristo” (1Cor 2,16). Aqui a Palavra
sentiram atraídos. Não foram rápi- mente, mas também como realidade de Deus apresenta-se como critério
dos e despachados por terem rece- LINHAS-MESTRAS PARA REALIZAR comunitária, deve deixar-se sensibi- de discernimento: ela é “viva, eficaz
bido uma ordem, mas porque foram A LECTIO DIVINA lizar e pôr em questão, porque não e mais penetrante que uma espa-
atraídos pelo amor. Para seguir se trata de considerar palavras pro- da de dois gumes; penetra até divi-
Jesus não bastam bons propósitos; Como conclusão do Sínodo sobre nunciadas no passado, mas no pre- dir a alma e o corpo, as junturas e as
é preciso ouvir todos os dias o seu a Palavra de Deus na vida e na missão sente. Sucessivamente, chega-se ao medulas e discerne os pensamentos
IGREJA E PALAVRA DE DEUS 39

e intenções do coração” (Hb 4,12). Paulo II sublinhou a importância da A encíclica Providentissimus Deus docilmente esta luz, pedir o amor,
Há que recordar ainda que a lectio oração na leitura e na interpretação dos recordava, a este propósito, o carác- o único que nos torna capazes de
divina não está concluída, na sua textos bíblicos. ter particular dos Livros Sagrados e compreender a linguagem de Deus,
dinâmica, enquanto não chegar à a exigência que daí resulta para a sua que “é amor” (1Jo 4,8.16). Durante o
ação (actio), que impele a existência «Para respeitar a coerência da interpretação: “Os Livros Sagrados – próprio trabalho de interpretação, é
crente a fazer dom para os outros na fé da Igreja e da inspiração da declarava ela – não podem ser com- necessário manter-se o máximo pos-
caridade. Escritura, a exegese católica deve parados aos escritos ordinários mas, sível na presença de Deus.
Encontramos estes passos sinteti- estar atenta a não se limitar aos uma vez que foram ditados pelo pró- (João Paulo II, Do Discurso sobre
zados e resumidos, de forma sublime, aspetos humanos dos textos bíbli- prio Espírito Santo e têm um conteú- a interpretação da Bíblia na Igreja,
na figura da Mãe de Deus. Modelo cos. É preciso que ela, também e do de extrema gravidade, misterioso 23 de abril de 1993)
para todo o fiel de acolhimento dócil sobretudo, ajude o povo cristão a e difícil sob muitos aspetos, para
da Palavra divina, ela “conservava perceber mais nitidamente nestes os compreender e explicar, precisa-
todas estas coisas, ponderando-as textos a Palavra de Deus, de modo a mos sempre da vinda deste mesmo
no seu coração” (L c 2,19; cf. 2,51), e acolhê-la melhor, para viverem ple- Espírito Santo, ou seja, da sua luz e
sabia encontrar o nexo profundo que namente em comunhão com Deus. da sua graça, que evidentemente é
une os acontecimentos, os atos e as Para este fim, é evidentemente necessário pedir através de uma ora-
coisas, aparentemente desconexos, necessário que o próprio exegeta per- ção humilde e conservar mediante
no grande desígnio divino.» ceba nos textos a palavra divina, e uma vida santificada.” (Enchiridon
(Bento XVI, Verbum Domini, 87) isto não lhe é possível a não ser se o Biblicum, 89) Numa fórmula mais
seu trabalho intelectual for suporta- breve, tirada de Santo Agostinho,
do por um impulso de vida espiritual. a Divino afflante Spiritu exprimia a
A IMPORTÂNCIA DA ORAÇÃO NA Se faltar este suporte, a investiga- mesma exigência: “Orent ut intelle-
LEITURA E NA INTERPRETAÇÃO DOS ção exegética fica incompleta; perde gant!” (“Rezem para compreender”:
TEXTOS BÍBLICOS de vista a sua finalidade principal e Enchiridon Biblicum, 569).
fica-se por tarefas secundárias. Pode Sim, para chegar a uma interpre-
No discurso proferido que pro- até tornar-se uma espécie de evasão. tação plenamente válida das palavras
feriu durante a audiência comemo- O estudo científico apenas dos aspe- inspiradas pelo Espírito Santo, deve-
rativa do centenário da Encíclica tos humanos dos textos pode levar a mos nós mesmos ser guiados pelo
Providentissimus Deus, de Leão XIII, e esquecer que a Palavra de Deus con- Espírito Santo e, para isso, é preciso
do cinquentenário da Encíclica Divino vida cada um a sair de si mesmo para rezar, rezar muito, pedir na oração
afflante Spiritu, de Pio XII, São João viver na fé e na caridade. a luz interior do Espírito e acolher
Catequese e Palavra de Deus IGREJA E PALAVRA DE DEUS 40
à luz do novo Diretório

No dia 25 de junho de 2020, o que percorre transversalmente todo o pregação; a leitura orante, também nascendo da Palavra e com base nela,
Pontifício Conselho para a Promoção Diretório e como que constitui a sua sob a forma de lectio divina; a piedade deseja essencialmente manifestar o
da Nova Evangelização apresentou o alma. À luz deste binómio é possível popular; o apostolado bíblico; o ensi- querigma, o «fogo do Espírito» que faz
Diretório para a Catequese, aprovado reler todo o documento. no da teologia; o ensino da religião nas acreditar em Jesus Cristo e comunica a
pelo Papa Francisco a 23 de março, dia Tomando como ponto de partida escolas; estudos e encontros que colo- misericórdia do Pai (DC 57-60).
em que a Igreja celebra a memória de o desígnio providencial de Deus, que cam em relação a Palavra de Deus e a É a partir desta consideração que
São Turíbio de Mogrovejo, fiel e apai- revela aos homens o seu mistério de cultura contemporânea, também num a comunidade cristã deve verificar em
xonado anunciador do Evangelho na amor, o Diretório afirma: «O Espírito confronto inter-religioso e intercultu- que medida a sua ação catequética é
América do Sul do século xvi. Santo continua a fecundar a Igreja que ral» (DC 37). capaz de perseguir concretamente o
Seguindo a direção dos anteriores vive da Palavra de Deus e sempre a faz No coração do verbo grego katechein, objetivo de colocar os seus filhos em
Diretórios catequéticos, de 1971 e de crescer na compreensão do Evangelho, do qual deriva a palavra «catequese», é contacto existencial com o núcleo da fé,
1997, o novo documento tem a finali- enviando-a e apoiando-a na obra de possível reconhecer a referência essen- contido nas Sagradas Escrituras e cele-
dade de sustentar e relançar a missão evangelização do mundo. O próprio cial à Palavra de Deus que ressoa na brado nos Sacramentos. Com efeito, no
evangelizadora de toda a Igreja e, par- Espírito, a partir do coração da huma- Igreja e no coração das pessoas, como tempo da nova evangelização, a cate-
ticularmente, o serviço da catequese, em nidade, semeia a semente da Palavra; eco atual de um anúncio de vida que quese é chamada a valorizar com mais
relação à sensibilidade e às circunstân- suscita desejo e obras de bem; prepara já venceu a morte para sempre. Talvez audácia a força da Palavra, fazendo com
cias de hoje. Com efeito, como recor- o acolhimento do Evangelho e concede se pudesse afirmar com toda a certe- que cada fiel tenha à disposição o tesou-
da a exortação apostólica Evangelii a fé, para que, através do testemunho da za que cada tipo de catequese – inde- ro precioso da Escritura, que permite
gaudium do Santo Padre, uma tarefa Igreja, os homens possam reconhecer a pendentemente de ser um primeiro encontrar-se com o Senhor da vida e
peculiar do tempo que estamos a viver presença e a comunicação amorosa de anúncio do Evangelho, um itinerário de permanecer em comunhão com Ele.
é levar a cabo, em todos os campos da Deus.» A Igreja, que tem a alegria de iniciação cristã ou um percurso de for- Talvez seja precisamente a simplici-
dinâmica eclesial, uma corajosa «con- guardar e transmitir a Palavra de vida mação permanente, de se dirigir a crian- dade desta consideração que, por assim
versão missionária», que faça com que que recebeu como dom, fá-lo por meio ças e adolescentes ou a jovens e adultos dizer, leva a aliviar a catequese daquilo
todas as coisas se tornem «um canal da Tradição e da Sagrada Escritura (DC – é sempre um anúncio da Palavra de que, ao longo dos tempos, a foi tornan-
adequado à evangelização do mundo 23-30). Deus, que revela a força do amor mise- do pesada, reduzindo-a não raras vezes
atual» (EG 27). Não há dúvida que a catequese ocu- ricordioso de Deus. a um mero “ensino da fé”, desligado de
Entre a Igreja, que «existe para evan- pa um lugar de importância vital entre Recordando as indicações já expres- uma experiência viva dessa mesma fé,
gelizar» (EN 14), e a Palavra de Deus, as numerosas “formas” através das sas na Evangelii gaudium, tudo isto é ou a uma “exposição moralista”, longe
que é o núcleo profundo da evangeli- quais se realiza o «serviço da Palavra», indicado no novo Diretório para a cate- de um encontro com o Senhor que, pelo
zação, há um vínculo de necessidade ou seja, «o primeiro anúncio; as várias quese com o nome de «catequese que- contrário, liberta e renova interiormen-
vital e urgente (DC 283-289), vínculo tipologias de catequese; a homilia e a rigmática», isto é, uma catequese que, te o coração da pessoa humana. O Papa
IGREJA E PALAVRA DE DEUS 41

Francisco ilustra este perigo com estas


palavras: «Por vezes, mesmo ouvin-
do uma linguagem totalmente ortodo-
xa, aquilo que os fiéis recebem, devido
à linguagem que eles mesmos utilizam
e compreendem, é algo que não cor-
responde ao verdadeiro Evangelho de
Jesus Cristo. Com a santa intenção de
lhes comunicar a verdade sobre Deus
e o ser humano, em algumas ocasiões,
damos-lhes um falso deus ou um ideal
humano que não é verdadeiramente
cristão. Deste modo, somos fiéis a uma
formulação, mas não transmitimos a
substância.» (EG 41)
Para que a proposta catequética seja
um autêntico serviço ao Evangelho, o
Diretório identifica alguns «critérios
para o anúncio da mensagem evan-
gélica» que permitem que a cateque-
se continue firmemente inspirada
na pedagogia de Deus, narrada nas
Sagradas Escrituras.

• Critério trinitário e cristológico:


dever-se-á, antes de mais, colocar
em evidência o carácter trinitário e
cristocêntrico da fé: «O anúncio do
Evangelho é apresentar Cristo e tudo
o resto por referência a Ele.» (DC
168-170)
IGREJA E PALAVRA DE DEUS 42

• Critério histórico-salvífico: «A eco- mais do que nunca, urgente colocar em A este propósito, o novo Diretório de Jesus, narrada nos Evangelhos, e
nomia da salvação tem um carácter campo todo o esforço possível para que reconhece que o «ministério da cate- nos relatos dos inícios da Igreja.» (DC
histórico, uma vez que se realiza no a catequese se refira à Palavra de Deus quese» é uma forma particularmen- 207) Num clima cultural em que as
tempo. A Igreja, ao transmitir hoje como a sua fonte essencial. Na verdade, te significativa de serviço à Palavra de novas gerações estão expostas quase
a mensagem cristã a partir da viva mesmo as outras fontes da catequese – Deus, necessário para o crescimento exclusivamente às narrações ditadas
consciência que tem desta mensa- o Magistério, a liturgia, o testemunho na fé e para a edificação da Igreja (DC pelas redes sociais, a narração bíblica
gem, recorda constantemente os dos santos e dos mártires, a teologia, 110-113). A presença de numerosos(as) mediada pela catequese – ou melhor,
acontecimentos salvíficos do passa- a cultura cristã, a beleza – «remetem catequistas na pastoral ordinária da uma catequese que faz da narração um
do, narrando-os.» (DC 171-173) para a Palavra de Deus, da qual são comunidade cristã exige, por isso, que dos seus pontos fortes – permite levar a
• Critério do primado da graça e da expressão» (DC 90-109). se dê uma atenção adequada à sua for- cabo «uma interligação profunda entre
beleza: a catequese que tem a Palavra O processo de renovação da cate- mação. Na dimensão formativa relati- a história de Jesus, a fé da Igreja e a
de Deus como fundamento deve ser quese não será possível senão a par- va ao ser do catequista (DC 139-142), é vida daqueles que a contam e a escu-
«uma catequese da graça», capaz tir de uma renovada disponibilidade preciso velar para que ele cresça como tam» (DC 208).
de mostrar «a beleza do Evangelho por parte da comunidade eclesial para «guardião da memória de Deus», acom- No fundo, a redescoberta da dimen-
que nos lábios de Jesus ressoou para se colocar a «escutar religiosamente panhando-o no seu itinerário espiri- são bíblica da catequese é animada
todos» (DC 174-175). a Palavra de Deus» (DV 1), sendo ela tual pessoal à luz da Palavra. Além pelo desejo de ajudar cada destinatá-
• Critério da eclesialidade: «Quando a mesma a ser a primeira a redescobrir o disso, não se deve descurar a dimen- rio a encontrar nas páginas da Sagrada
catequese transmite o mistério de Evangelho que anuncia: «o novo anún- são do saber, que amadurece, antes de Escritura Aquele que é a Palavra viva,
Cristo, na sua mensagem ressoa a fé cio do Evangelho pede à Igreja uma escu- mais, com a familiaridade e o estudo da rocha no meio das canseiras da vida,
de todo o Povo de Deus ao longo do ta renovada do Evangelho, juntamente Sagrada Escritura (DC 143-144). sobre a qual construir uma casa que
curso da história.» (DC 176) com os seus interlocutores» (DC 59). Desejando, por fim, identificar algu- permanece firme.
Na linha desta sugestão, não é inútil mas linhas metodológicas que ajudem
Juntando estes critérios, as diversas reiterar que aqueles que na comunida- os evangelizadores a encontrar percur-
propostas catequéticas, adaptadas às de são escolhidos para exercer ativa- sos para o anúncio da Palavra na reali-
situações e aos interlocutores, pode- mente um serviço para o anúncio do dade atual, o Diretório sugere a via da
rão evidenciar que a Palavra é uma for- Evangelho – ministros ordenados, reli- linguagem narrativa: «A comunidade
ça viva que, como uma espada afiada, giosos, leigos – devem ser os primeiros eclesial toma cada vez mais consciência
entra no íntimo da pessoa humana (cf. a sentir que são convidados a alimen- da identidade narrativa da própria fé,
Hb 4,12), aquecendo (cf. Lc 24, 32), e tar-se do pão de cada dia da Palavra, como testemunha a Sagrada Escritura
como uma lâmpada acompanha o seu para que o anúncio floresça com natu- nos grandes relatos das origens, dos
caminho (cf. Sl 119,105). Portanto, é, ralidade da abundância do seu coração. patriarcas e do povo eleito, na história
O Logo IGREJA E PALAVRA DE DEUS 43

O Logo do Domingo da Palavra de o Rebento de David, alcançou a vitória;

PA L A
Deus inspira-se no passo evangélico dos Ele abrirá o livro e os seus sete selos.»

DA VR A discípulos de Emaús (cf. Lc 24,13-33)


e coloca em evidência o tema da rela-
(Ap 5,5) «Começando por Moisés e pas-
sando pelos Profetas, explicou-lhes em

G O ção entre os viandantes, expresso atra-


vés de olhares, gestos e palavras. Jesus
é figurado como Aquele que «se aproxi-
todas as Escrituras o que Lhe dizia res-
peito.» (Lc 24,27)
A familiaridade com a Palavra de

DE
IN

ma e caminha com» a humanidade (Lc Deus nasce da relação, da procura do


24,15), «habitando no meio» (Jo 1,14). rosto de Deus nas Páginas Sagradas.
D OM

D EU
N’Ele «não há judeu nem grego, não há A Escritura não nos oferece concei-
escravo nem livre, não há homem nem tos, mas experiências, não nos imer-
mulher; todos somos um só em Cristo ge apenas num texto, mas abre-nos ao
Jesus» (Gl 3,28). encontro com o Verbo da vida, decisivo
Caminhando entre os seus, Ele dá «para ensinar, persuadir, corrigir e for-

S
novo vigor aos seus passos, indicando mar segundo a justiça, de modo que o
os horizontes da evangelização, simbo- homem de Deus seja perfeito, bem pre-
lizados no logo com a estrela: «Ele cha- parado para todas as boas obras» (2Tm
ma as suas ovelhas, cada uma delas pelo 3,16).
seu nome, e leva-as para fora. Depois de Como fundo, há uma grande luz:
ter feito sair todas as que Lhe perten- há quem veja um pôr do sol, evocan-
cem, caminha à sua frente e as ovelhas do Lucas 24,29; nós preferimos ver o
seguem-n’O, porque conhecem a sua «sol nascente» (Lc 1,78) que, em Cristo
voz.» (Jo 10,3-4) ressuscitado, anuncia a aurora de
As suas palavras formam um todo uma nova missão destinada a todos os
com aquelas que estão contidas no rolo povos: « Ide por todo o mundo e pro-
que Ele tem nas mãos: «Quem é dig- clamai o Evangelho a toda a criatura.»
no de abrir o livro e quebrar os seus (Mc 16,15)
selos?» (Ap 5,2) Se, diante dos mis-
térios da história, os dois discípulos
estão confusos, logo recebem ânimo:
«Não choreis! O leão da tribo de Judá,
IGREJA E PALAVRA DE DEUS 44

Os discípulos
«Dois dos discípulos de Jesus iam a caminho.» Cristo ressuscitado
(Lc 24,13) Nos dois discípulos, Lucas vê o rosto de Com discrição, Jesus coloca-Se O Logo cruza dois filões artístico-expressivos: o da iconógrafa Ir. Marie-Paul
todos os crentes. A atenção à reciprocidade entre no nosso caminho, «põe-Se no
masculino e feminino levou alguns exegetas a ver meio», habitando a nossa
Farran e o do artista contemporâneo Giordano Redaelli.
nestes dois discípulos um casal, identificando história, as nossas dúvidas.
o discípulo anónimo com a mulher de Cléofas. Ele interpela e escuta quem as
guarda no silêncio do coração:
«Jesus aproximou-Se deles e
pôs-Se com eles a caminho.»
Irmã Marie-Paul Farran Giordano Redaelli
A luz (Lc 24,15) Nasce a 10 de novembro de 1930 no Depois de uma formação profis-
Quando o sol já se encaminha
para o ocaso, há outra luz Cairo, no Egito. Em 1955, depois de uma sional na Escola Gráfica Salesiana de
que aquece o coração dos
discípulos: a luz da Palavra.
A estrela peregrinação à Terra Santa, profunda- Milão, Giordano especializa-se em
Apontada por Cristo Ressuscitado,
No gesto eucarístico, ela é o sinal da Evangelização: «Eles mente marcada pela experiência vivi- gráfica publicitária e artes visuais na
encontrará a sua plenitude, contaram o que tinha acontecido
plenificando a comunhão com da, entra no mosteiro das Beneditinas Escola Superior de Artes de Castello.
no caminho e como O tinham
o Mestre: «Nesse momento
abriram-se os seus olhos
reconhecido ao partir de Nossa Senhora do Calvário, em Depois da experiência como paginador
o pão.» (Lc 24,35)
e reconheceram-n’O.» Jerusalém, no Monte das Oliveiras. gráfico e como diretor artístico da revis-
(Lc 24,29)
Em 1960, o Ir. Henry Corta, dos ta semanal Sorrisi e Canzoni TV, fun-
Irmãozinhos de Charles de Foucauld, da o estúdio gráfico Giordano Redaelli,
inicia as irmãs à escritura dos ícones: em Milão, e a sociedade Methodus, em
não se limita a ensinar as habilidades Giussano, trabalhando em vários âmbi-
O rolo
No diálogo entre técnicas, mas aprofunda o sentido de tos da comunicação. No setor edito-
o Antigo e o Novo cada fase do trabalho, ilustrando-a rial colaborou com importantes casas
Testamento,
desvela-se o mistério através das páginas da Bíblia e da expe- editoriais. Para as Edições San Paolo
da salvação. «Começando
por Moisés e passando pelos riência dos seus protagonistas. A “esco- paginou vários volumes de arte, entre
Profetas, explicou-lhes em la” do Ir. Corta encanta a Ir. Marie-Paul os quais se destacam o Nuovo Vangelo
todas as Escrituras o que Lhe
dizia respeito.» de tal modo que a escritura dos ícones d’arte e o Evangeliário da Misericórdia
(Lc 24,27)
passa a ser a sua missão. Ela gostava de para o Jubileu da Misericórdia. A expe-
O cajado dar este testemunho: «Escrever um íco- riência adquirida no setor gráfico abre-
Os pés Franzino e incerto, como
Jesus Ressuscitado junta os seus passos aos todas as realidades humanas, ne faz-me mergulhar em Deus e, quan- -lhe caminho para uma exploração na
passos do homem e o poder da sua Palavra
- exprime a fragilidade dos do “escrevo Deus”, sinto-me tão imersa arte contemporânea: de há alguns anos
sabe orientá-los na direção certa, porque «a discípulos que «pararam, com
tua palavra é farol para os meus passos e luz ar muito triste» (Lc 24,17). n’Ele que vivo experiências dificilmente a esta parte tem vindo a expor os seus
para os meus caminhos» (SL 119,105). Por Jesus Ressuscitado dá-lhes
isso, eles «partiram imediatamente de regresso força com a Palavra «viva e exprimíveis por palavras.» A Ir. Marie- trabalhos artísticos em várias expo-
a Jerusalém» (Lc 24,33). eficaz, mais cortante que uma -Paul escreveu ícones até 8 de maio de sições nas mais importantes cidades
espada de dois gumes, […]
que é capaz de discernir os 2019, dia em que Deus a levou a con- europeias.
pensamentos e as intenções
do coração» (HB 4,12). templar a luminosidade do seu rosto.
90
O A PALAVRA DE DEUS EM COMUNIDADE

DOMINGO
DAPALAVRA
DE
DEUS

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