Você está na página 1de 14

O RETORNO DA CRIMIGRAÇÃO E O

DESVIRTUAMENTO DA LEI DE MIGRAÇÃO


BRASILEIRA

FICHAMENTO

INTRODUÇÃO
- A Lei 13.445/2017 – Lei de Migração – tem inegável CARÁTER HUMANISTA.
- Contudo, o Poder Executivo e alguns parlamentares federais têm buscado
eliminar o caráter humanista para voltar a um regime similar ao do Estatuto do
Estrangeiro.

01. A NOVA LEI DE MIGRAÇÃO E A DESPENALIZAÇÃO DA


IRREGULARIDADE MIGRATÓRIA
- O retrógrado Estatuto do Estrangeiro, derrogado pela Lei 13.445/2017, previa
a possibilidade de que o Ministro da Justiça ordenasse a detenção de um
estrangeiro que se encontrasse em processo de expulsão ou deportação.
- A Lei de Migração rompeu com o paradigma do inimigo, comum em algumas
leis migratórias, assim como adotou o PRINCÍPIO DA NÃO CRIMINALIZAÇÃO
DA IMIGRAÇÃO IRREGULAR.
- Em consequência, proibiu a prisão provisória com fins de deportação ou de
expulsão, fazendo do Brasil um país mais respeitoso às garantias e aos
standards de proteção que abrangem a população migrante.

01.1. O PRINCÍPIO DA NÃO CRIMINALIZAÇÃO DA MIGRAÇÃO NA LEI Nº


13.445 DE 2017:
- No seu art. 3º, III, a Lei de Migração consagrou o PRINCÍPIO DA NÃO
CRIMINALIZAÇÃO DA MIGRAÇÃO IRREGULAR.
- Excluiu os tipos penais previstos no Estatuto do Estrangeiro, subsistindo
aqueles contidos nos arts. 309 (identidade falsa) e 338 (regresso de
estrangeiro expulso) do Código Penal.
- Estabeleceu que aos estrangeiros em situação irregular se aplicam apenas a
pena de multa e de deportação.
- A União Europeia e os EUA adotam a ideia de crimigração.
01.2. A DEPORTAÇÃO NA NOVA LEI DE MIGRAÇÃO
- DEPORTAÇÃO = Medida resultante de procedimento administrativo que
consiste na tradição obrigatória de uma pessoa que se encontra em uma
situação migratória irregular no território nacional.
- Diferença entre REPATRIAÇÃO e DEPORTAÇÃO:
- REPATRIAÇÃO = Caso em que, apesar de estar em uma zona
fronteiriça, o indivíduo não ingressou formalmente no território nacional. Ex.:
conexão internacional no interior de aeroportos.
- DEPORTAÇÃO = Corresponde àqueles casos em que o imigrante
ingressou, de fato, no território de outro país, mas sem cumprir ou deixando de
cumprir os requisitos legais para obter a condição de migrante regular.
- A Lei 13.445/2017 estabelece GARANTIAS MÍNIMAS para aplicação da
deportação:
1. Necessidade de notificação pessoal do migrante;
2. Seja dado conhecimento do caso à Defensoria Pública Federal
(União);
3. Que seja possibilitado período para regularização da situação
irregular;
4. Manutenção em liberdade de movimentação da pessoa no território
nacional durante o procedimento;
5. Respeito aos direitos adquiridos;
6. Garantia do direito de defesa e do contraditório;
7. Direito de apelação com efeito suspensivo.

IMPORTANTE!!! A Lei de Migração proíbe que leve a cabo a deportação


quando configurados os pressupostos para uma extradição, porquanto esta
não é permitida pela lei brasileira.

02. A INCOMPATIBILIDADE DO DECRETO Nº 9.199 DE 2017 COM A LEI DE


MIGRAÇÃO
- O Decreto 9.199 de novembro de 2017, editado pelo Presidente Michel
Temer, visou regulamentar a Lei de Migração. Contudo, este decreto não só
levou a cabo o dito desenvolvimento, mas também deu o primeiro golpe contra
o caráter humanista da Lei de Migração.
- Em termos gerais, o decreto regulou importantes questões, tais como vistos
humanitários dos imigrantes fronteiriços, a concessão e manutenção de asilo, a
proteção dos apátridas, o cumprimento das decisões e a transferência de
presos, o respeito à garantia de legalidade nos processos de retiradas
obrigatórias, assim como as questões de prazos e procedimentos. Em que
pese este esforço para regulamentar aqueles temas que haviam ficado
pendentes ou inacabados na Lei de Migração, o Decreto nº 9.199/2017
também incluiu uma série de elementos que o fazem incompatível com a lei
que desenvolve e que, portanto, tornam-no ilegal.
- Talvez a principal crítica que se pode fazer tenha haver com a possibilidade
que o decreto estabelece de levar a cabo a prisão provisória das pessoas que
se encontram em uma situação de prisão irregular, somente pela própria
irregularidade de suas condições migratórias, em que pese o artigo 123 da Lei
de Migração prevê que “ninguém será privado de sua liberdade por razões
migratórias, exceto nos casos previstos nesta lei”.
- Somado ao anterior, o decreto também modifica as regras garantistas com
relação aos processos de deportação, dado que o artigo 211 estabelece que “o
delegado de polícia federal pode representar perante o Tribunal Federal para
requerer a prisão ou outra medida cautelar”. Portanto, está claro que o
mencionado decreto contraria fatalmente a Lei de Migração, já que a detenção
por irregularidades migratórias, como foi dito, é ilegal de acordo com essa lei.
- [...] Na mesma linha é importante ter em conta a Sentença do Recurso em
Habeas Corpus nº 91.785-Sp, de 16 de agosto de 2018, na qual a Sexta Turma
do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, e de acordo com a
decisão da relatora, a Ministra María Thereza de Assis Moura, reconheceu que
com a entrada em vigor da Lei de Migração, a prisão para garantir o
cumprimento do decreto de expulsão foi abolido do sistema legal brasileiro. De
igual maneira, a Sexta Turma concluiu que o Decreto nº 9.199 de 2017,
embora contenha preceito que prevê a detenção preventiva para a expulsão,
trata-se de uma medida que transcende o poder regulatório do Presidente.
- É possível mencionar que a Lei de Migração também tem sido regulada
através de outros atos administrativos, como as Portarias e as Resoluções
Normativas do Conselho Nacional de Imigração, das Portarias dos Ministérios
de Relações Exteriores e de Justiça, assim como as Portarias Interministeriais.
- A partir do exposto, podemos concluir que na realidade o Decreto nº 9.199 de
2017 significa um revés para a humanização da política migratória brasileira
pretendida com a Lei de Migração. Não obstante, esta regressividade se
agrava ainda mais ao evidenciar os efeitos de alguns projetos de lei em curso
no Senado e na Câmara dos Deputados do Brasil nos últimos tempos.

03. PROJETOS DE LEI COM O OBJETIVO DE RETOMAR A CRIMIGRAÇÃO


- O Senador Acir Gurgacz (PDT/RO) é o autor do projeto de lei nº 1.928 de
2019 (PL 1.928/19), apresentado em 4 de janeiro de 2019 com o propósito de
modificar a Lei de Migração. Entre as propostas desse projeto estava a criação
do visto de trabalho temporário simplificado para jovens imigrantes entre 18 a
29 anos.
- Chama a atenção a emenda a este PL, proposta pelo Senador Bezerra
Coelho (MDB/PE) em 04 de julho de 2019. Com ela sugeriu incluir uma
disposição que permitiria a prisão para deportação ou para expulsão, ou
alternativamente, a aplicação de medidas cautelares diversas da prisão.
- É fácil ver que este PL tinha como objetivo distorcer o caráter humanista da
Lei de Migração e, em especial, eliminar o Princípio da Não Criminalização da
irregularidade migratória. Nesse sentido, propunha que o Estado brasileiro
retomasse a política migratória que caracterizou o Estatuto do Estrangeiro.
Ademais, a emenda substitutiva sugeria incluir um novo artigo, o 62-A, na lei, o
qual se destinava a criar a possibilidade de realizar deportações sumárias.
- Por sua vez, vale a pena destacar o parágrafo quinto do artigo 62-A, no qual
se estabelecia que “a solicitação de refúgio não suspende a imposição das
medidas previstas neste artigo”. Isto significa que se tivesse sido aprovado o
PL, um imigrante poderia ser deportado sumariamente sem ter direito a solicitar
refúgio. Consequentemente, teríamos verificado uma clara violação ao DIDH,
na medida em que o Direito Humano de buscar e receber refúgio está
protegido tanto pela Declaração Universal de Direitos Humanos (DUDH), como
pela Convenção Americana sobre Direitos Humanos (CADH). Da mesma
maneira, desta forma se violaria o princípio da não devolução, assim como a
própria jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte
IDH).
- Felizmente, o PL nº 1.1928/19 foi arquivado devido a solicitação realizada elo
seu próprio autor em 20 de março de 2020.
- O PL nº 6119 de 2019, que foi apresentado para análise da Câmara em 02 de
outubro de 2019, incluiu de forma expressa, através de seu artigo 53-A, a ideia
da conveniência dos “interesses nacionais” como base para a deportação dos
imigrantes irregulares. Ademais, este PL também propõe em seu artigo 54 a
possibilidade de expulsar o “estrangeiro” que se entrega a “vagabundagem” e a
“mendicidade”. De fato, resta claro que se pretende sustentar a hipótese para a
aplicação de medidas obrigatórias de retirada baseadas num viés de
segurança total, caracterizada por uma arbitrariedade também total. No
momento, o PL nº 6119 de 2019 se encontra no aguardo do parecer do relator
na Comissão de Direitos Humanos, assim como da opinião das minorias da
Câmara dos Deputados.
- No mesmo contexto, o L nº 5.326 de 2019, também apresentado em 02 de
outubro de 2019, tem como objetivo emendar a Lei de Migração, propondo a
inclusão do artigo 45-A, no qual se estabelece que as pessoas suspeitas de
envolvimento em certos delitos serão responsabilizadas por cometer atos
contrários aos princípios e objetivos da CF. Ainda, a proposta prevista no artigo
51-A deste PL tem como objetivo estabelecer um período de 48 horas para a
defesa, e um período de 24 horas para a apelação, naqueles casos em que
são tomadas decisões de deportação.
- Este é outro caso em que o parlamento brasileiro se propõe a violar princípios
como a presunção de inocência, através da utilização da expressão
“participação presumida”. Do mesmo modo, atenta-se contra o princípio do
devido processo legal ao estipular prazos apertados para o exercício do
contraditório, da ampla defesa e do duplo grau.
- Por último, o PL 305 de 2020, apresentado em 12 de fevereiro do presente
ano, tem como objetivo instituir, entre outras questões, o encarceramento com
fins de expulsão. Segundo a nova redação proposta para seu artigo 57, um
magistrado competente pode determinar, como consequência de uma
solicitação feita pela autoridade policial, a prisão do imigrante ou do visitante, a
qualquer momento, por um período de 60 dias, que pode ser estendido
somente uma vez pelo mesmo lapso de tempo, para garantir o trâmite do
processo de expulsão ou a execução da medida. Com este tipo de iniciativas
legislativas, de fato estão intentando, mais uma vez, promover o retorno da
crimigração.
- Dessa forma, compete ao Congresso Nacional, em vista da obrigação de
ajustar às convenções internacionais (convencionalizar) a legislação do Brasil,
observar, ao analisar projetos de lei como os mencionados anteriormente, os
instrumentos internacionais para a proteção de Direitos Humanos, assim como
a jurisprudência da Corte IDH. Neste sentido, a partir de uma leitura sistemática
das obrigações internacionais do Brasil e das normas internacionais de Direitos
Humanos, espera-se que a emenda substitutória a que fizemos referência seja
rechaçada e que a legislação exerça sua função constitucional de não aprovar
leis contrárias às convenções internacionais subscritas pelo Brasil.

04. AS PORTARIAS 666/2019 E 770/2020 E A IMPOSSIBILIDADE DA


PRISÃO PARA FINS DE DEPORTAÇÃO
- Por último, encontramos outra intenção de distorcer o caráter humanista da
Lei de Migração quando o Poder Executivo, através do Ministério da Justiça e
Segurança Pública (MJSP), emitiu a Portaria nª 666 de 2019. Nesta norma,
antecipou-se os eventuais resultados do processo legislativo do PL nº
1.928/19, MJSP pôs em marcha uma política que impede a qualquer migrante
irregular de exercer seu direito ao refúgio. Vejamos com mais detalhe o alcance
e as implicações dessa portaria.
- O MJSP emitiu a Portaria nº 666 em 25 de julho de 2019 com o propósito de
regular algumas disposições das leis de Migração (nº 13.445/2017) e de
Refúgio (nº 9.474/1997), assim como do Decreto nº 9.199/2017. No entanto,
essa Portaria se ocupou de temas como o impedimento de entrada, repatriação
e a deportação sumária das pessoas perigosas ou daquelas que tivessem
realizado um ato contrário aos princípios e objetivos estabelecidos na CF de
1988.
- A Portaria nº 666/2019, em seu artigo 2º, considerou como “pessoas que são
perigosas ou que cometeram ato contrário aos princípios e objetivos
estabelecidos na CF” para aqueles que são suspeitos de estar envolvidos em
terrorismo; que pertencem a uma organização criminosa, ou a uma associação
criminosa armada ou com disponibilidade de armas; para aqueles relacionados
com o tráfico de drogas, de pessoas ou de armas de fogo, com a pornografia
infantil ou com a exploração sexual; e, finalmente, para aqueles que
possivelmente estejam vinculados a histórico de problemas de violência de
torcidas nos estádios.
- Também há que apontar que o referido ato normativo fez referência aos
“suspeitos de participação”. Como se pode ver, trata-se de uma expressão
excessivamente vaga que está sujeita a uma ampla discricionariedade das
autoridades migratórias e que, portanto, poderá dar lugar a ações e decisões
arbitrárias, tal e como ocorria com frequência durante a vigência do Estatuto do
Estrangeiro.
- Por outro lado, no § 1º do mesmo artigo 2º da Portaria nº 666/2019 se
estabelece que as hipóteses antes mencionadas podem ser conhecidas e
avaliadas pela autoridade migratória com base na difusão ou informação oficial
que tenha sido obtida no âmbito de uma ação de cooperação internacional; por
uma lista de restrições emitidas por ordem judicial, ou por um compromisso
adotado pela República Federativa do Brasil perante um organismo
internacional ou Estado estrangeiro; por informação das autoridade brasileiras
ou estrangeiras de inteligência; por uma investigação criminal em curso; ou
ainda por uma sentença penal condenatória.
- De fato, talvez as disposições mais questionáveis da Portaria que viemos
comentando estejam contidas nos incisos IV e V do § 1º de seu artigo 2º. Ao
referir-se à “investigação penal em curso” à “sentença penal condenatória”
como motivos para que uma pessoa seja considerada perigosa ou tenha
atuado contra contrariamente os princípios e objetivos estabelecidos na CF de
88; a Portaria nº 666/19 ignora os princípios da presunção de inocência e da
dupla instância. Isso significa que se for reconhecida a compatibilidade dessas
disposições com o sistema legal, é possível proibir a um imigrante de ingressar
no Brasil, ou inclusive deportá-lo sumariamente, apenas por ser investigado, ou
por estar condenando em um processo penal, inclusive se a sentença tiver sido
submetida a uma segunda instância.
- De igual forma, o artigo 2º, em seu § 4º, estipula que, aos efeitos da aplicação
das disposições do § 2º, do artigo 7º da Lei de Refugiados, considera-se
perigosa para a segurança do Brasil a pessoa que se encaixe no listado do
caput do artigo referido. Nesse contexto, o artigo 7º da Lei de Refugiados
estabelece que “qualquer estrangeiro que chegue ao território nacional pode
expressar seu desejo de solicitar o reconhecimento como refugiado a qualquer
autoridade migratória na fronteira. No entanto, nesse mesmo § 2º do artigo 7º
se estabelece que “o benefício previsto neste artigo não será invocado por um
refugiado considerado perigoso para a segurança do Brasil”.
- Dada a disposição contida no § 4º do mesmo artigo 2º da Portaria nº 666/19,
é possível que seja impedida de solicitar o reconhecimento do estado de
refugiado a qualquer pessoa que seja suspeita de estar envolvida em qualquer
das hipóteses que falamos, inclusive quando este simplesmente sendo
“investigada”. Consequentemente, essa disposição viola claramente o direito
humanos de solicitar asilo, segundo previsto em vários instrumentos
internacionais, como o artigo 14.1 da DUDH e o artigo 22 da CADH, e a própria
Lei de Refugiados. Portanto, é também um dispositivo inconvencional, além de
ilegal.
- Com respeito ao procedimento para a adoção da medida de “deportação
sumária”, o artigo 3º da Portaria estabelece que a pessoa “será notificada
pessoalmente para apresentar uma defesa ou abandonar o país
voluntariamente, dentro das 48 horas posteriores a notificação”. Ademais, “na
ausência de um defensor público constituído, será notificada a Defensoria
pública, preferivelmente por meios eletrônicos, para uma declaração dentro do
período mencionado no caput”. Finalmente, “depois da data limite para
apresentar a defesa, a ausência de uma declaração do deportado ou seu
defensor não impedirá a implementação da medida de deportação”.
- Observa-se que há certa falta de coerência entre o artigo 3º da Portaria nº
666/19 e o artigo 50 da Lei de Migração, dado que neste último não se prevê
nenhuma possibilidade de efetivar uma “deportação sumária”. E mais, o
parágrafo 1º deste mesmo artigo 50 estipula que “a deportação será precedida
de uma notificação pessoal ao deportado, indicando expressamente as
eventuais irregularidades verificadas, e estabelecendo uma data limite para a
regularização, com um prazo não inferior a 60 dias”. Enquanto que o parágrafo
3º deste mesmo artigo 50 da Lei de Migração ratifica que apenas depois de
que haja expirado o período de 60 dias sem que se tenha sido regularizada a
situação migratória, poder-se-á executar a deportação.
- De qualquer forma, e inclusive em vista da possibilidade de reduzir o prazo
previsto no § 6º do artigo 50 da Lei de Migração, o lapso de 48 horas
estabelecido na Portaria 666/19 para definir uma deportação segue sendo
completamente desproporcional. Se imaginarmos a situação de um imigrante
vulnerável, vítima, por exemplo, de um conflito armado, que não fala o idioma
nacional, o que teve que emigrar de maneira forçada e sem recursos
financeiros, como poderá ter uma defesa efetiva e substancial num laspo de 48
horas? Não terá! Portanto, está claro que este curto período para a defesa viola
os princípios da proporcionalidade, o devido processo legal substantivo e as
garantias judiciais, como as previstas no artigo 8º, numeral 2º, letra c da CADH.
Este mesmo raciocínio deve ser aplicado ao considerar o período de 24 horas
para a apelação, previsto no artigo 4º da mesma Portaria.
- Embora as causas pelas quais um indivíduo pode ser considerado perigoso,
ou considerado responsável de haver cometido algum ato contrário aos
princípios e objetivos estabelecidos na CF de 1988, pela simples inclusão em
investigação criminal, os prazos apertados e o caráter “sumário” da deportação,
talvez a maior “fragilidade”, ou possivelmente a incompatibilidade mas evidente
da Portaria nº 666/19 está no disposto no seu artigo 5º. Segundo este “a
autoridade da polícia federal pode representar perante o tribunal federal pela
prisão ou qualquer outra medida de precaução em qualquer etapa do processo
de deportação disciplinado nesta Portaria”. Ademais, estabelece que “a
autoridade policial informará a prisão do deportado à missão diplomática de
seu país de nacionalidade ou, em sua falta, ao Ministério de Relações
Exteriores em um prazo máximo de quarenta e oito horas”.
- Como já se mencionou, a Lei de Migração adotou o Princípio da Não
Criminalização da migração. De acordo com esse princípio, o artigo 123
estabelece que “ninguém será privado de sua liberdade por razões migratórias,
salvo o disposto nesta lei”. Portanto, no sentido formal apenas por meio de lei
se poderia, em tese, estabelecer a possibilidade de encarceramento de
imigrantes em uma situação de migração irregular. Nessa medida, pode-se ver
que a Portaria nº 666/19 é claramente ilegal, já que o MJSP extrapola sua
competência ao promulgar um ato normativo que inova ilegalmente. Fica claro
pois, segundo a Lei de Migração e os compromissos internacionais assumidos
pelo Estado brasileiro, que a detenção administrativa com fins de deportação
ainda está proibida em nosso sistema legal.
- Por outra parte, o artigo 8º da Portaria nº 666/19 estabelece que “os
procedimentos a que se refere esta Portaria serão instituídos e decididos pelo
chefe da unidade respectiva da polícia federal, por ato motivado”. No entanto,
deve se ter em conta que também determina que o delegado da polícia federal
concentrará todas as etapas do procedimento de “deportação sumária”, já que
é ele, segundo a mesma Portaria, quem é responsável de instituir, decidir e
executar a medida. Essa concentração de atos leva a possibilidade de uma
conduta parcial e, inclusive, arbitrária.
- Cabe apontar que alguns órgãos já expressaram sua opinião sobre os vícios
e erros da Portaria nº 666/19. Inicialmente, em 26 de julho de 2019, a DPU
emitiu a Nota Técnica nº 6 – DPGU/SGAI DPGU/GTMR, na qual aponta como
críticas principais que: a) a Portaria adota, em geral, um paradigma de
securitização da migração, que foi superado pela Lei de Migração; b) essa
Portaria viola o devido processo legal de migração; c) cria conceitos jurídicos
indeterminados e extremamente abertos, como “pessoas perigosas suspeitas”;
d) não há possibilidade de prisão devido a irregularidades migratórias; e) a
menção de “presumíveis pessoas perigosas” viola os princípios do devido
processo legal e a presunção de inocência; f) a menção do uso de “informação
de autoridades de inteligência brasileiras ou estrangeiras” não está sujeita ao
controle judicial; g) viola o princípio da publicidade quando a Portaria
estabelece que será restrito o acesso e a divulgação dos motivos da imposição
de medidas para evitar a entrada e a deportação sumária; h) a criação da figura
da “deportação sumária” por ordem ministerial é ilegal; i) a Portaria não pode
inovar no sistema legal nem contradizer a lei; j) a deportação apenas é possível
diante da irregularidade migratória (sem permissão de residência ou
permanecer mais tempo que o período do visto) e não porque um imigrante
seja considerado uma “pessoa perigosa”; k) a Portaria não pode estender as
hipóteses de deportação previstas na Lei de Migração; l) a deportação sumária
viola as garantias e direitos previstos nessa lei; m) o Brasil, ao praticar a
deportação sumária (ilícita), pode ser responsabilizado internacionalmente; n) é
totalmente inabitável, por falta de previsão legal, a detenção preventiva para
deportação; o) a privação de liberdade, de conformidade com o artigo 7.2 da
CADH, apenas pode decorrer de lei em sentido formal; q) o artigo 8º da
Portaria nº 666/19, ao concentrar os atos de estabelecimento, decisão e
execução de deportação sumária nas atribuições do Delegado de Polícia
Federal, conduz a um viés indevido na prática dos atos; e, finalmente, que,
como foi exposto, r) a Portaria viola a CF, a Lei de Migração e a Lei nº 9.474/97
(Ley de Refúgio).
- Mais adiante, em 1º de agosto de 2019, o MPF, através da Procuradoria
Federal do Direitos do Cidadão (PFDC) e do Grupo de Trabalho sobre
Migração e Refugiados, emitiram a Recomendação nº 09/2019/PFDC/MPF,
dirigida diretamente ao (agora ex) Ministro da Justiça e Segurança Pública,
Sérgio Moro. Resumidamente, esta recomendação apontou várias
incompatibilidades da Portaria nº 666/19 com os instrumentos internacionais de
direitos humanos, com a CF, assim como com a Lei de Migração e a Lei de
Refúgio. Neste contexto, o MPF recomendou a suspensão imediata dos efeitos
da Portaria em revisão e sua conseguinte derrogação.
- Ainda que vários argumentos sobre a invalidade da Portaria 666/19 já foram
destacados na Nota Técnica 6- DPGU/SGAI DPGU/GTMR, da análise da
Recomendação nº 09/2019/PFDC/MPF ressaltam os seguintes pontos: a) os
direitos e garantias fundamentais da CF se aplicam aos migrantes; b)segundo
disposto na CADH, os direito essências da pessoa humana não derivam do
status nacional; c) o parágrafo 2º do artigo 7º da Lei de Refúgio, que a Portaria
pretende regular, não se ajusta à Convenção sobre o Estatuto dos Refugiados
de 1951, já que as razões de segurança nacional ou de ordem pública não
justificam a perda do status de refugiado, nem impedem o exame da solicitação
de reconhecimento dessa condição por parte do organismo competente; d) o
artigo 45 da Lei de Migração não estabelece a hipótese genérica de
impedimento de entrada para uma pessoa perigosa para a segurança do Brasil,
assim como, por ouro lado, é utilizada pela Portaria em seus comentários
fundamentais; e) a expressão “suspeito de implicação” prevista no título do
artigo 2º da Portaria nº 666/19 viola o princípio de presunção de inocência; f) a
Portaria é, também, ilegal já que estabelece razões imprecisas (razões de
ordem públicas e de segurança nacional) para a deportação, assim como para
negar solicitações de refúgio; g) não existe uma disposição legal para sustentar
o procedimento de “deportação sumária”; h) a Portaria, ao inovar no sistema
legal, é manifestamente ilegal; i) o estabelecimento de um período mais curto
que o previsto na Lei de Migração para o procedimento de deportação está
sujeito ao cumprimento do princípio da legalidade. Embora não exista um limite
estabelecido pela Lei de Migração, o prazo de cinco dias, previsto no artigo 24
da Lei nº 9.784/99, deve ser observado. Portanto, é ilegal estabelecer um limite
de tempo de até 48 horas para responder a notificação; j) o artigo 4º da
Portaria limita excessivamente os prazos para o procedimento de deportação,
ao estabelecer um prazo de até 24 horas para apresentar uma apelação. Esse
período não deve ser inferior a dez dias, segundo o disposto no artigo 59 da Lei
nº 9.784/99; e, finalmente, k) o artigo 5º da Portaria, ao considerar a
possibilidade de prisão preventiva com fins de deportação, viola a Lei de
Migração, já que está proibido de forma explícita restringir a liberdade por
razões migratórias, em conformidade com seus artigos 3º, III e 123.
- Por último, o CNDH emitiu a Recomendação nº 16, de agosto de 2019,
solicitando a suspensão imediata dos efeitos da Portaria nº 666/2019, baseada,
resumidamente, nos seguintes argumentos: a) essa Portaria pretende criar
uma nova modalidade de “deportação sumária” sem contar com suporte
legislativo para fazê-lo; b) essa modalidade contraria o texto de normas
superiores, particularmente as Leis 13.445/2017 e 9.474/97, a CF, assim como
os tratados internacionais ratificados pelo Brasil; c) a Portaria em questão
outorga poder excessivo às autoridades migratórias; d) tal e como foi apontado,
a Portaria que se está comentando é absolutamente contrária aos princípios
que expressam e que fundamentam a nova Lei de Migração do Brasil; e) a
aplicação da Portaria em questão, já que é contrária aos princípios básicos do
direito internacional , entre os quais cabe destacar o princípio da não
devolução, pode dar ocasionar a responsabilização internacional do Brasil; e,
finalmente, f) a Portaria carece de convencionalidade, de constitucionalidade e
de legalidade.
- Como se vê, a DPU, o MPF e o CNDH concordam o apontar, com razão, os
diversos defeitos da Portaria nº 666/2019. Particularmente, destacam o que
respeita a sua inconvencionalidade, assim como a inconstitucionalidade e a
ilegalidade da detenção preventiva com fins de deportação.
- Além das manifestações mencionadas, vale a pena destacar que o I Forúm
de Direitos Humanos de I AJUFE (I FONADIRH) declarou, através de sua
Declaração nº 2, que “a prisão não está permitida para deportação ou
expulsão, já que não há disposições na Lei de Migração e o decreto não está
adequado para esse propósito”.
- Enquanto o PL nº 1.928/2019 estava em processamento, em 30 de julho de
2019, em vista do disposto no artigo 49, V da CF de 1988, o Deputado Federal
José Guimarães (PT-CE) apresentou o Projeto de Decreto Legislativo nº
493/2019, cujo objetivo é neutralizar os efeitos da Portaria nº 666/2019. Esse
PDL, na atualidade, está à espera do parecer do relator na Comissão de
Assuntos Exteriores e Defesa Nacional (CREDN). Nessa medida, espera-se
que o Congresso aprove esse último projeto para fazer frente ao poderes
exorbitantes que exerceu o MJSP ao emitir a Portaria discutida.
- Finalmente, tendo em vista a negativa do MJSP para cumprir a
Recomendação nº 09/2019/PFDC/MPF, a Procuradoria Geral da República
(PGR) propôs, em 12 de setembro de 2019, uma Arguição de Descumprimento
de Preceito Fundamental, número 619 (ADPF 619).
- Na ADPF 619, cuja relatora é aa Ministra Rosa Weber, a PGR solicitou a
concessão, por decisão monocrática e imediata, de medida cautelar para
suspender a eficácia da Portaria nº 666/2019 e, no mérito, que essa Portaria
seja declarada inconstitucional.
- A respeito da petição inicial da ADPF comentada, a PGR apresentou os
argumentos que já foram discutidos nesse artigo. No entanto, destaca-se a
inclusão do item III.7, que trata sobre “a violação dos compromissos
internacionais e o papel da jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos
Humanos”. De fato, em sua argumentação, a PGR aborda questões essenciais
para a concretização dos direitos humanos dos migrantes, tais como o uso do
controle de convencionalidade, assim como o dever de ter em conta o caráter
materialmente constitucional dos tratados internacionais de direitos humanos.
De forma adicional, também são mencionados alguns precedentes da Corte
IDH que tratam da proteção dos direitos humanos dos migrantes. Portanto, é
digno de elogio que a máxima autoridade do MPF reconheça o dever de
dialogar com as decisões da Corte Interamericana, de exercer o controle de
convencionalidade e de promover a aplicabilidade dos tratados internacionais
de direitos humanos.
- Apesar de todo o mencionado, a discussão sobre a volta da crimigração
tomou novas formas com a promulgação, por parte do MJSP, da Portaria nº
770 de 11 de outubro de 2019 (770/2019), que prevê o impedimento do
ingresso no país, assim como proíbe a repatriação e a deportação de “pessoa
perigosa”, ou que tenha realizado ato contrário aos princípios e objetivos
estabelecidos na CF. Com esse ato, o MJSP, diante das numerosas críticas
recebidas, decidiu substituir a Portaria 666/2019, que foi, para evitar dúvidas,
revogada expressamente pela Portaria 770/2019.
- Ao comparar o conteúdo das Portarias em revisão, pode-se chegar a pensar
que existem algumas diferenças. No entanto, essas são mais formais e
obedecem mais a alterações de redação que de fundo. Por exemplo, e em
primeiro lugar, observa-se o artigo 2º da Portaria 666/2019 diz que “os
suspeitos de estar envolvidos são considerados pessoas perigosas ou aqueles
que tenha cometido atos contrários aos princípios e objetivos estabelecidos na
Constituição Federal” na prática de certos delitos. Por outro lado, o artigo 2º da
Portaria 770/2019 estabelece que “uma pessoa que cometeu um ato contrário
aos princípios e objetivos estabelecidos na Constituição Federal é considerada
uma pessoa que tem razões sérias que indicam sua participação em alguns
delitos”. No entanto, uma leitura cuidadosa mostra que o MJSP apenas
substituiu a expressão “aqueles suspeitos de participação” por “aqueles que
com razões sérias que indicam participação”.
- Enquanto a lista de delitos que ensejam a deportação sumária, prevista no
artigo 2º, a Portaria 770/19 apenas excluiu a participação de “fanáticos com
antecedentes de violência nos estádios”, que estava prevista na Portaria
666/2019, precisamente no artigo 2º, V.
- De fato, outros temas ainda necessitam ser discutidos. A Portaria 666/2019,
no mencionado artigo 2º, § 3º, estabelece que “a pessoa que praticam os tipos
previstos neste artigo não podem ingressar no país e estão sujeitos à
repatriação e deportação sumária”. Com uma ligeira diferença, o § 5º do artigo
2º da Portaria 770/19 estabelece que “a pessoa considerada neste artigo não
pode ingressar no país e está sujeita a repatriação e a deportação”, Observa-
se que a única diferença se refere à exclusão da palavra “sumária”.
- A respeito do procedimento de aplicação das medidas obrigatórias de
retirada, mencionado nos atos normativos em estudo, o artigo 3º da Portaria
666/2019 estabelece o prazo de até 48 horas para que o imigrante apresente
sua defesa ou abandone o país. Para afastar a clara violação ao devido
processo legal, o MJSP, no artigo 6º da Portaria 770/2019, aumentou o prazo
até cinco dias.
- Como última distinção de maior importância se pode apontar que enquanto a
Portaria 666/2019 estipulou o período de 24 horas para apresentar uma
apelação, segundo o disposto no artigo 4º, a Portaria 770/2019 outorgou um
período de até cinco dias, em conformidade com seu artigo 6º, § 5º.
- Por último, pode-se destacar como uma lamentável similaridade, de
demonstra um padrão de ilegalidade na determinação dos atos normativos que
tratam das medidas obrigatórias de retirada, que o artigo 7º da Portaria
770/2019 manteve a mesma disposição do artigo 5º da Portaria 666/2019. Em
ambas Portarias é dada via livre para a possibilidade de que um delegado da
Polícia Federal solicite perante o Tribunal Federal a prisão ou outra medida
cautelar, em qualquer etapa do processo de deportação regulamentada nessa
Portaria.
- Em razão das poucas alterações introduzidas, e diante da continuidade da
possibilidade de encarceramento de quem vá ser deportado, conclui-se que
com a promulgação da Portaria 770/2019 e dá, mais uma vez, uma intenção
ilegal de voltar para a crimigração e distorcer o caráter humanista da Lei de
Migração.
- O MPF, através da PGR também deve discutir os vícios existentes no Decreto
9.199/2017 e na Portaria nº 770/2019, particularmente e especialmente em
relação ao propósito de justificar a detenção preventiva de um imigrante em
situação migratória irregular. Nesse sentido, Loretta Ortíz Ahlf aponta que “a
problemática da imigração irregular exige ser resolvida de maneira justa, para o
qual se deve garantir o goze e exercício efetivo do direitos humanos do
imigrantes, sem limitar esses direitos de maneira arbitrária por carecer de uma
instância legal no país”.
- Nesse sentido, uma vez provocado, caberá ao STF a concretização dos
direitos humanos dos migrantes, invalidando os atos normativos mencionados,
já que são ilegais, inconvencionais e inconstitucionais. Com esse fim, esse
Supremo Tribunal nunca deve deixar de aplicar os tratados internacionais,
assim como realizar diálogo com a Corte IDH. No entanto, somente atuando
dessa maneira, o STF e os outros tribunais brasileiros podem, como afirma Iker
Barbero, contribuir ao “reconhecimento pleno dos direitos sem distinção de
origem, nacionalidade ou situação jurídico-administrativa”.

CONCLUSÃO
- As linhas anteriores demonstraram que existe uma clara intenção de
desvirtuar o caráter humanista da Lei de Migração para regressar para a
política de criminalização que caracterizava o Estatuto do Estrangeiro.
- Nesse contexto, o Decreto nº 9.199/2017 apresenta várias dificuldades. No
âmbito do que nos interessa nesse trabalho, a principal preocupação gira em
torno do fato da autoridade policial poder realizar a representação no âmbito
das prisões preventivas das pessoas em situação de migração irregular, uma
vez que decorre de uma medida ilegal e inconvencional. Neste sentido, existe a
imperiosa necessidade de que o Congresso Nacional suspenda esse decreto,
no que diz respeito às disposições que são incompatíveis com a Lei de
Migração e a DIDH.
- A respeito do PL 1.928/19 e ao outros analisados, além de ressaltar a
intenção de retomar o viés da crimigração, também devemos destacar sua
incompatibilidade com a CF e a DIDH, particularmente, com os precedentes
desenvolvidos pela jurisprudência da Corte IDH. Portanto, devemos advertir
que o Congresso Nacional tem o dever de analisar a convencionalidade dos
projetos de lei antes de aprová-los.
- Finalmente, com relação às Portarias 666/2019 e 770/2019 há que apontar
que retomam a doutrina da segurança nacional que foi impugnada e rejeitada
tantas vezes, ao se guiar por um critério baseado em um “direito de imigração
do inimigo”. Consequentemente, essas Portarias contêm numerosos vícios, na
medida em que são inconvencionais, inconstitucionais e ilegais. De fato, é
surpreendente ver como esses atos administrativos podem ter tantas
inconsistências ao mesmo tempo. Principalmente, destacam-se as seguintes:
a) não são convencionais porque a possibilidade de deportação sumária de um
solicitante de refúgio viola o princípio da não devolução; b)são
inconstitucionais, já que o prazo para apresentar defesa por parte do deportado
é desproporcional e viola diretamente o devido processo legal substantivo e o
princípio da proporcionalidade, como a segregação preventiva, quando
utilizada unicamente para obrigar a expulsão do deportado; c) são ilegais, pois
ao estabelecer o processo de deportação sumária e conter disposições para a
prisão do deportado, violam o Princípio da Não Criminalização da Migração,
assim como a regra de que ninguém será privado da liberdade por razões
migratórias; e, finalmente, d) violam a Lei 9.784/99, particularmente a respeito
das garantias processuais administrativas.
- Se o Congresso Nacional omite o dever constitucional de suspender parte do
Decreto nº 9.199/2017, praticamente todo o conteúdo da Portaria 770/2019 em
si, além de aprovar leis claramente inconvencionais, o Poder Judiciário
brasileiro, no seu exercício de seu dever de garantir os direitos humanos dos
migrantes, pode atuar diligentemente e invalidar as disposições do decreto e da
Portaria, já que, como foi dito, são inconvencionais, inconstitucionais e ilegais.
- Para finalizar, espera-se que o STF, ao julgar a ADPF 619 e outras ações
similares, aplique o conteúdo das normas internacionais de direitos humanos,
para dialogar com a jurisprudência da Corte IDH, assim como para concretizar
os direitos humanos dos migrantes, independentemente de sua situação
migratória.

Você também pode gostar