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XADREZ EM SUA ESSÊNCIA: SUA HISTÓRIA, SEU CONTEXTO

Tiago Medrado1

Hoje em dia vivemos em um mundo completamente tomado por


jogos, tipos que vão de simples a complexos. Jogos esses que nos ajudam
no dia-a-dia, quer seja por divertimento, prazer, entretenimento ou
profissão. Quem, por exemplo, nunca jogou Dominó, Baralho, Resta Um,
Jogo da Memória, quebra-cabeças, futebol, vôlei, entre outros? No entanto
chamamos a atenção para um jogo muito complexo e divertido do muitos
existentes, que tem uma particularidade ímpar, e se destaca em vários
países no mundo inteiro: o Xadrez.
O xadrez é hoje um dos jogos, sendo também considerado por
muitos como um esporte, que mais beneficia seus adeptos. No entanto,
várias pessoas têm uma má impressão deste jogo, mesmo sem nunca tê-lo
experimentado por características que o mesmo possui, como, por
exemplo, o tempo de uma partida. Ou seja, quando nós, jogadores de
xadrez, ou por melhor dizer, enxadristas, falamos sobre este jogo com
alguém que nunca o jogou e não conhece nada de suas regras, logo
recebemos os seguintes comentários: “jogar xadrez é um saco, demora de
mais pra jogar!” ou “no xadrez tem que ter muita paciência pra jogar, eu
não agüento esperar 2 horas pra fazer um movimento”. E por ai vai. O que
queremos mostrar para o leitor é que este tipo de impressão relacionada ao
xadrez é um tanto exagerada. E antes de entrar em detalhes falaremos
sobre a história do xadrez, que ainda hoje não entrou em consenso sobre
seu real surgimento.
Atualmente, a teoria mais aceita é que ele se originou na Índia, por
volta do século VI d.C. Era conhecido como "o jogo do exército", ou
"Chaturanga", e podia ser jogado com dois ou mais jogadores. Graças às
viagens dos mercadores e dos comerciantes o jogo se espalhou para leste
(China) e oeste (Pérsia). Mais adiante, os árabes estudaram profundamente
o jogo e se deram conta que ele estava bastante relacionado com a

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Graduando do curso de Licenciatura plena em História pela Universidade de Pernambuco, campus
Petrolina.
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matemática. Escreveram vários tratados sobre isto e aparentemente foram
os primeiros a formalizar e escrever suas regras. Hoje o xadrez é composto
por 32 peças (4 cavalos, 4 bispos, 4 torres, 2 rainhas, 2 reis e 16 peões),
sendo 16 de cores negras e 16 de cores brancas, jogado em um tabuleiro
com 64 casas (pretas e brancas em xadrez). Na Idade Média, o xadrez se
destacou e era conhecido como “O jogo dos reis” e nos tempos atuais é
conhecido como o rei dos jogos. No Brasil o xadrez foi inserido por
intermédio de D. João VI em 1808. Porém, não queremos aprofundar na
sua origem, mas sim no seu contexto.
Muitas pessoas foram começando a jogar xadrez constantemente
desde seu desenvolvimento. Na Idade Média, por exemplo, o xadrez era
conhecido como jogo dos reis, e era freqüentemente jogado pelos mesmos.
E desde então, muitos jogadores se destacaram, conseguindo explorá-lo ao
máximo. A paixão pelo xadrez foi tanta que Grandes Mestres (GM – título
reconhecido mundialmente, dado a jogadores com habilidades
enxadrísticas altamente complexas, cujo nível do jogo supera o de qualquer
pessoa comum), passaram a viver para o xadrez. Disse Boris Spassy: “O
xadrez é como a vida”,2 elevando o grau de importância do jogo, já que o
mesmo o admirava ao extremo. E não só o russo se destacou com seu nível
e elogios ao xadrez, vários adeptos foram gradualmente descrevendo o
xadrez nas mais variadas formas. “O xadrez é um jogo pela forma, uma
arte pelo conteúdo e uma ciência pela dificuldade”.3 O xadrez foi então
tomando proporções bem expressivas, seus benefícios começaram a ser
estudados em vários países e logo comprovados em estudos e pesquisas
relacionadas com a sua inserção:

Em 1925, Djaknow, Petrowski e Rudik estudaram os


grandes mestres de xadrez para determinar quais eram os
fatores fundamentais do talento enxadrístico. Esses
pesquisadores determinaram que os grandes resultados
obtidos no xadrez estavam radicados na memória visual
excepcional, no poder combinatório, na velocidade para

2
MAZANO, Antonio López e GONZÁLES, José Mondero. O xadrez dos grandes mestres. Trad.
Abrão Aspis. Porto Alegre: Artmed, 2002.
3
TIGRAM PETROSIAN apud MAZANO, Antonio López e GONZÁLES, José Mondero, ibidem,
p.257.
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calcular, no poder de concentração e no pensamento lógico.
Vários pesquisadores mencionam que o xadrez não somente
requer essas características, mas também as desenvolve.4

O xadrez passou a ser utilizado na sociedade como ferramenta de


auxílio nas mais diversas áreas sociais e científicas. Os estudos feitos para
estabelecer e identificar os mais variados benefícios desta prática toma
cada vez mais espaço no contexto sócio educacional na busca de
ferramentas para auxílio na aprendizagem, tanto que levou muitas pessoas
a buscarem conhecimento para melhorar suas atividades pessoais e
profissionais, como, por exemplo, os psicólogos, que atribuem ao jogo à
relevância de poder ajudá-los em determinadas ocasiões em seus
trabalhos.

Apesar da grande significação da psicologia do xadrez ser


comumente enfatizada, pode-se ter a impressão de que é um
campo do qual mais falado do que deliberada e
sistematicamente feito. Similarmente, o inverso é feito, pois
há muitas possibilidades inexploradas nas pesquisas de
xadrez que poderiam ser usadas por psicólogos.5

Vem se estabelecendo, desde então, uma descaracterização da


expressão “xadrez, um jogo chato”. Chato já se percebe que não é, mas
ainda requer muita determinação, pois o fator tempo, que também o
relaciona a más impressões, talvez esteja indiretamente ligado a este
adjetivo “chato”, pois nem todas as pessoas gostam de jogar
demoradamente. É evidente que em muitos jogos precise-se de muito
tempo mesmo, mas tempo é preciso em todo e qualquer jogo; a concepção
que o mesmo demora muito, que pra se fazer um lance tem que esperar
uma eternidade, entre várias outras, vem desde a Idade Média, pois muitos
jogos duravam dias, semanas, meses, pois só eram jogados quando os reis
e membros da corte se visitavam, no entanto, às vezes, não dava pra
terminar a partida nestas visitas, levando em muitas ocasiões, até anos

4
FERGUSON apud FILGUTH, Rubens. A importância do xadrez. Porto Alegre: Artmed, 2007, p.
18.
5
PRZEWOZNIK, Jan e SOSZYNSKI, Marek. Como pensar em xadrez. Rio de Janeiro, Ciência
moderna ltda, 2004, p.243.
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para o próximo encontro e conseqüentemente a retomada do jogo. Também
posteriormente à Idade Média, o xadrez postal ajudou a promover o
estereótipo de jogo demorado, sua prática era através de cartas, pois nem
sempre era possível dois grandes jogadores estarem presentes para jogar.
O jogo decorria de forma que, quando o jogador fazia um movimento, o
enviava por carta, e assim sucessivamente, fazendo com que o jogo
demorasse em seu término.
Nos tempos de hoje, já existe uma padronização mundial de regras,
regida pela World Chess Federation (FIDE) que administra o xadrez
mundial, e dificilmente uma partida dura mais que cinco horas nos
campeonatos sob sua regência! Para a CBX (confederação Brasileira de
Xadrez), nos campeonatos nacionais, o tempo total de uma partida
dificilmente passa de quatro horas! Vale ressaltar também que pode haver
jogos com tempos delimitados por um relógio, sendo este adequado ao jogo,
com duração máxima de 10, 4 ou ate 2 minutos totais. O tempo, por sua
vez, é dividido de forma igual para os dois jogadores. Estes argumentos nos
ajudam entender que tempo e xadrez, estão diretamente ligados, no
entanto, muitos ainda não fazem idéia que jogar xadrez é uma atividade
que vai, sim, requerer paciência, e um dos muitos benefícios que o xadrez
nos condiciona é justamente o controle da paciência, do raciocínio e a
concentração!

Como resultado de estudo [estudo feito com estudantes em


uma escola rural dos Estados Unidos da América], ficou
evidenciado que o xadrez tem impacto definido no
desenvolvimento das habilidades de memória e raciocínio
verbal [...]. 6

No Brasil o xadrez já é usado nas escolas como ferramenta de auxílio


pedagógico, ainda não foi efetivada como matéria obrigatória no currículo
escolar, mas já se sabe que sua inserção só trouxe melhorias para os
alunos. Sua implementação nas escolas vem a cada dia se destacando,
pois são muitos seus benefícios.

6
FERGUSON apud FILGUTH, Rubens, op. cit., p.20.

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O jogo de xadrez pode desenvolver mais de vinte qualidades
básicas muito úteis para a vida do ser humano: imaginação,
concentração, planificação, previsão, memória, espírito de
luta, controle nervoso, capacidade de decisão, criatividade,
autocrítica, objetividade, intuição, capacidade de cálculo,
visão espacial, sociabilidade, lógica, superação do fracasso e
vontade, dentre outros. Além disso, o xadrez é
especialmente recomendado não para os jovens, mas
também para adultos, por que mantém suas mentes
despertas e previne um dos males mais terríveis de nossa
época, o Mal de Alzeimer.7

O país vai gradativamente inserindo o xadrez no meio educacional,


procurando facilitar e promover a inclusão na educação e na sociedade.
Para Freire, “É na inclusão do ser, que se sabe como tal, que se funda a
educação como processo permanente. Mulheres e homens se tornam
educáveis na medida em que se reconhecerem inacabáveis.”8 É importante
destacar que os benefícios ligados a educação escolar que o xadrez propicia
abrangem toda a extensão social de uma comunidade. Contudo, o governo
brasileiro já dispõe de muitos programas que incentivam a prática deste
jogo. E é com base nestes possíveis benefícios que as escolas buscam, na
sua prática, uma forma de ajudar os alunos a conseguirem melhores
resultados nas matérias e na sua inclusão sócio educacional. O xadrez é
um jogo bastante complexo, como já foi dito, e é esta complexidade que o
diferencia dos demais jogos. “O jogo ajuda a construir amizades
individuais, [...]”.9 Ou seja, sua praticidade vai indiretamente contribuir
para finalidades que são postas nas escolas, pois quando os alunos se
disponibilizam para realizarem atividades que exigem regras para sua
prática, eles acabam se relacionando e interagindo freqüentemente. Nos
Estados Unidos, por exemplo, a inclusão do xadrez aos jovens é de suma
importância para sua socialização com a comunidade local.10 O xadrez tem
em si uma essência muito maior que um simples jogo; ela atrai o jogador,

7
MAZANO, Antonio López e GONZÁLES, José Mondero, op. cit., p.137.
8
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo,
Paz e terra, 1996, p. 58.
9
FILGUTH, Rubens, op. cit., p. 36.
10
MILAT, Marcel apud FILGUTH, Rubens, ibidem.

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fascinando-o, deixando-o cada vez mais admirado: “o xadrez propicia e
facilita os estudos, tem profunda relevância nas atitudes pessoais e
profissionais, aguça o senso criativo, autocrítico entre vários.”11 O xadrez,
por sua vez, chega a ser considerado como uma arte. Arte essa que faz o
jogador elevar sua alma ao extremo para se satisfazer e sentir toda a
configuração existente no jogo. Poemas foram feitos em homenagem ao
xadrez, quadros, filmes, etc. Propagaram o xadrez, nas mais diversas
formas, e souberam admirá-las com entusiasmo. Ao conhecer o jogo, as
pessoas percebem que quando jogado por vontade própria, adquiri-se a
convicção que as expressões de que xadrez é algo chato, que o jogo demora
muito, entre vários mais, é bem relativa ao grau de envolvimento com o
jogo. Como já foi dito, hoje existe toda uma padronização de regras para o
xadrez, assim como para várias modalidades esportivas. E sua prática é
tão normal quanto qualquer outra modalidade esportiva.
Vale destacar que não é interessante, mesmo sabendo de seus
benefícios, forçar alunos ou qualquer pessoa a jogar xadrez. Sua prática
tem que partir por conta própria, para que assim possa existir a
possibilidade de o jogador querer se aprofundar no jogo e levá-lo mais
adiante de forma coerente e coesa. Em muitas ocasiões, quando levado ao
extremo, o xadrez pode trazer complicações psicológicas, afetando
diretamente no comportamento do jogador, não só perante uma partida
como também em sua vida pessoal. Não se pode pensar que se jogar de
mais e cada vez mais, e mais, iremos adquirir mais benefícios. Pelo
contrário, o efeito pode se tornar irreversível, levando às vezes ate a
loucura! Ou seja, o jogo pode sim ser elevado a graus altíssimos, mas
contanto que não afete negativamente o participante, afinal, como diz o
provérbio, “tudo de mais é veneno”, e isso serve para o xadrez também.
Toda política que trabalha com a inserção do xadrez na comunidade e nas
escolas deve atuar de forma coerente, não desviando o foco e finalidade
desta implementação, que é contribuir para a interação das pessoas

11
BLANCO, Uvêncio apud FILGUTH, Rubens, ibidem.

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perante saciedade e ajudá-las a desenvolver aptidões cognitivas para
melhor atuarem em suas vidas pessoais.

O xadrez, como todas as iniciativas educacionais, não pode


ser um substituto para as medidas da política social que
procuram, de maneira organizada, lidar com a pobreza
material da baixa renda e de um longo dia de trabalho para
muitos pais – pode, entretanto, contribuir para o
crescimento pessoal das crianças e superação das
circunstâncias.12

Na inserção do xadrez nas escolas, estabelecer medidas


contundentes para que o mesmo não venha a gerar malefícios, ou ter seu
foco desviado, é bastante salutar. “O xadrez é a pedra de toque do
intelecto.”13 Temos que saber usá-lo, para que assim possamos desfrutar
de tudo que sua prática pode nos contemplar. Não existe preconceito para
este jogo, pode ser praticado por ricos, pobres, homens, mulheres,
crianças, idosos, deficientes, em fim, qualquer um pode jogá-lo, é só
querer. A internet contribui bastante para sua prática. O xadrez não é um
jogo chato, mas sim complexo, e é essa complexidade que o faz tão
maravilhoso e benéfico ao ser humano.
Desde os 3 anos qualquer criança pode aprender a jogar xadrez, o
que a ajudará em seu desenvolvimento infantil. Conseqüentemente, as
probabilidades de a mesma obter bons resultados educacionais são
grandes, já que o jogo exige bastante aplicação e concentração para sua
atividade. Preocupemo-nos em aproveitar o xadrez na sua essência,
corroborando para seus benefícios futuros de quem o pratica. Repassar os
conhecimentos enxadrísticos também é interessante para promover a
socialização das pessoas, se cada enxadrista (jogador de xadrez)
desmistificar os conceitos equívocos, a modalidade se multiplicará e muitos
ganharão com isso!

12
Ibidem, p. 28.
13
GOETHE apud MANZANO E GONZÁLEZ, op. cit., p. 255.

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REFERÊNCIAS:

MAZANO, Antonio López e GONZÁLES, José Mondero. O xadrez dos grandes


mestres. Trad. Abrão Aspis. Porto Alegre: Artmed, 2002.
FILGUTH, Rubens. A importância do xadrez. Porto Alegre: Artmed, 2007.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática
educativa. São Paulo, Paz e terra, 1996.
PRZEWOZNIK, Jan e SOSZYNSKI, Marek. Como pensar em xadrez. Rio de
Janeiro, Ciência moderna ltda, 2004.

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