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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

DEPARTAMENTO DE ARTES
CURSO DE PRODUÇÃO CULTURAL

Adonay Ferreira Guerra

O Marketing Cultural na Igreja Evangélica: estudo de


caso sobre a Igreja Batista da Lagoinha em Niterói/RJ

Niterói/RJ
2018
Adonay Ferreira Guerra

O Marketing Cultural na Igreja Evangélica: estudo de


caso sobre a Igreja Batista da Lagoinha em Niterói/RJ

Trabalho final de conclusão


do curso de Produção Cultural da
Universidade Federal Fluminense,
como requisito parcial para obtenção
do Grau de Bacharel.

Orientadora: Prof.ª Fernanda Abreu

Niterói/RJ
2018
“Se tudo mudou, eu abro as velas da embarcação
Na esperança que pela manhã
Avistarei o porto onde te encontrarei,
O porto onde te encontrarei
Lá...”

Thiago Arrais
AGRADECIMENTOS

Em primeiro lugar, gostaria de agradecer a Deus por todos os benefícios que me tem feito e
por me dar a oportunidade e o privilégio de estar contribuindo cientificamente para a vida de
outras pessoas, mesmo que de uma forma ainda pequena, mas é um começo.

Gostaria de agradecer também à minha família, meus pais Jorge e Eliete, e meu irmão
Leonardo, que sempre me ajudaram, financeiramente e espiritualmente, além de nunca me
deixarem desistir de continuar firme com meus estudos, mesmo que o ambiente não favoreça
àqueles que querem alçar voos maiores. Agradeço também minha namorada e futura esposa,
Tamirys, que esteve comigo nos momentos difíceis e auxiliou-me com a revisão do texto.

Agradeço também à minha igreja, Primeira Igreja Batista na Estrada do Engenho, da qual faço
parte há 18 anos e que me ensinou tudo o que sei sobre fazer parte e ser uma igreja. Sem
deixar de lado, claro, de todas as amizades e relacionamentos que fiz e que ainda tenho. Sou
grato a todos pela ajuda e pelo carinho para comigo.

Agradeço, por último, à toda comunidade acadêmica da UFF, todos os professores com os
quais tive oportunidade de ouvir e aprender sobre diversos e variados temas. Tenho certeza
que carregarei os ensinamentos por toda a vida. Em especial, a professora Fernanda Abreu,
que tive a honra de ser orientado por ela, sempre disposta e atenciosa a ouvir sobre minhas
dúvidas e problemas. No fim, gostaria de agradecer também a todos os alunos de Produção
Cultural, sem eles a longa caminhada teria sido um grande pesar.
RESUMO

O presente trabalho monográfico tem como objetivo analisar como o Marketing Cultural pode
servir de ferramenta para atração de fiéis em uma igreja e melhorar sua imagem frente à
comunidade onde se insere. Foi realizado um estudo de caso da Igreja Batista da Lagoinha,
situada em Charitas, Niterói, que possui uma gama de atividades e fazeres culturais em sua
programação e é referência no universo evangélico em termos de administração de igreja
protestante no Brasil. Para o estudo, serão utilizados autores que versam sobre Marketing
Cultural, Administração e alguns sobre Teologia e Protestantismo no Brasil. Procura-se, assim,
construir uma relação, uma vez observado o objeto, entre a prática do Marketing Cultural na
Igreja e o alto número de membros, fato incomum para a grande maioria das igrejas no Brasil.

Palavras-chave: Marketing Cultural; Igreja evangélica; Produção Cultural; Igreja Batista


Lagoinha.
ABSTRACT

The present monographic work aims to observe and analyze how the field of Cultural Marketing
can serve as a tool to attract the faithful in a church and improve its image in front of the
community where it is inserted. A case study will be carried out at Lagoinha Baptist Church,
located in Charitas, Niterói, which has a range of activities and cultural activities in its
programming and is a reference in the evangelical universe in terms of Protestant church
administration in Brazil. For the study, will be used authors that deal in Cultural Marketing,
Administration and some on Theology and Protestantism in Brazil. We are searching for, in this
monography, to build a relationship, once observed the object, between the practice of Cultural
Marketing in the Church and the high number of members, an unusual fact for the great majority
of the Churches in Brazil.

Keywords: Cultural Marketing; Evangelical Church; Lagoinha Baptist Church; Cultural


Production
LISTA DE FIGURAS

Figura 1: Logo Lagoinha...................................................................................................48

Figura 2: Divulgação Creative 2017.................................................................................52

Figura 3: Gravação do DVD Gabriela Rocha...................................................................53

Figura 4: Festival FoodTruck 2016..................................................................................54

Figura 5: Viradão Lagoinha Niterói 2017-18...................................................................55

Figura 6: Instagram Lagoinha Niterói..............................................................................56

Figura 7: Summer Camp – Acampamento dos jovens.....................................................58

Figura 8: Next Fantasy 2016 – Festa à fantasia................................................................58

Figura 9: Culto Next.........................................................................................................59

Figura 10: Rede Super de Televisão.................................................................................60

Figura 11: Balinha Lagoinha Niterói................................................................................63


Sumário
1. INTRODUÇÃO ...........................................................................................................11
1.1 HIPÓTESE ...............................................................................................................14
1.2 OBJETIVO GERAL .................................................................................................16
1.3 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ...................................................................................16
1.4 METODOLOGIA .....................................................................................................16
1.5 APRESENTAÇÃO DOS CAPÍTULOS....................................................................17

2. CONTEMPORANEIDADE E O SUJEITO PÓS-MODERNO ...............................18


2.1 HISTÓRICO BATISTA BRASILEIRO ..................................................................18
2.2 A FORMAÇÃO DO INDIVÍDUO ..........................................................................23
2.3 O SUJEITO RELIGIOSO NA PÓS-MODERNIDADE ..........................................26

3. MARKETING E A IGREJA .......................................................................................29


3.1 SAGRADO X ENTRENIMENTO NA ECLÉSIA ...................................................29
3.2 DEFINIÇÕES DE MARKETING E MARKETING CULTURAL .........................37
3.3 CONFLITOS E CRÍTICA À IGREJA PÓS-MODERNA .......................................41

4. ESTUDO DE CASO: IB LAGOINHA – NITERÓI/RJ ............................................47


4.1 BREVE HISTÓRICO DA IBL DE NITERÓI.........................................................47
4.2 ANÁLISE DA PROGRAMAÇÃO CULTURAL.....................................................49
4.3 CONSIDERAÇÕES....................................................................................60

5. CONCLUSÃO ...............................................................................................................64
6. ANEXOS.........................................................................................................................70
11

1 Introdução

Desde os primórdios do Marketing, como uma ciência social aplicada, ela está
conectada a um sentido de lucro, próprio de grandes empresas que visam o lado financeiro de
seus “negócios”. Em uma definição simples de Phillip Kotler, podemos analisar “Marketing é
o conjunto de atividades humanas que tem por objetivo facilitar e consumar relações de troca”
(KOTLER, 2002).

Alguns reclamam o início do conceito do que, posteriormente, se chamou de marketing,


com a invenção da prensa, com Johannes Gutenberg, que pela primeira vez possibilitava a
confecção de peças gráficas e literatura em uma grande escala e, também, viabilizava a
produção de peças de divulgação. Não como uma disciplina científica ou como método, tendo
em vista que isso só veio a acontecer nos Estados Unidos, em 1940, mas, sim, como uma ideia
que, séculos depois, veio a se tornar uma das grandes ferramentas das pequenas e grandes
corporações.

Com o avanço dos meios tecnológicos, o marketing não apenas se tornou um método de
divulgar e propagar uma marca, mas se tornou uma estratégia de diferenciação entre as
empresas. Aquelas que utilizavam o marketing para elaborar estratégias de cativar o
consumidor, ouvir suas demandas e conseguir solucionar problemas de maneira eficiente se
tornavam bem sucedidas em um mercado tão competitivo.

No século XX, o marketing, de fato, foi concebido como um campo científico e não era
apenas uma ferramenta utilizada pelas grandes empresas. O olhar para as dificuldades que o
mercado apresentava, como em relação às duas grandes guerras e a crise que se abateu nos
Estados Unidos em 1929, fez com que o mercado como um todo precisasse evoluir num sentido
de uma produção mais consciente, em que se evitasse desperdícios e concentrasse em um
público específico para uma produção mais eficaz.

Ainda hoje no século XXI, existe uma conexão imediata do emprego do marketing com
as empresas com fins lucrativos, mas assim como este trabalho busca evidenciar, o campo de
atuação é muito maior. Existe a necessidade, vista pelas organizações, de alcançarem o público
em geral. Segundo Reed Moyer, o marketing extrapola essas fronteiras e pode servir de grande
12

ferramenta para todos os tipos de instituições “Instituições que não visam lucro – Hospitais,
sindicatos, museus, partidos políticos, igrejas – compartilham com as empresas comerciais uma
comum razão de ser: servir e satisfazer as necessidades humanas” (MOYER, 1972. p.9).

Na busca desenfreada pelo lucro e a conquista da preferência do consumidor, por vezes


as empresas optam por um marketing desleal, onde o consumidor se enxerga como vítima de
um estratagema que se vale de tudo para conseguir abater as metas e fechar o ano com saldo
positivo. Utilizam-se de propagandas enganosas, preços acima da inflação e um disfarce dos
verdadeiros interesses que movem a empresa em questão.

Em um dos seus livros mais recentes, Marketing 3.0, Phillip Kotler afirma que tais
práticas abordadas no parágrafo anterior estão sendo deixadas no passado e que, apenas as
marcas autênticas e que sejam transparentes com os seus consumidores terão espaço no
mercado, uma vez que os consumidores estão tendo cada vez mais opções de compra e a
diferenciação será focada na genuinidade, tanto da marca quanto dos produtos. Kotler afirma
que:

Os consumidores estão não apenas buscando produtos e serviços que satisfaçam suas
necessidades, mas também buscando experiências e modelos de negócios que toquem
seu lado espiritual. Proporcionar significado é a futura proposição de valor do
Marketing. O modelo de negócio baseado em valores é o que há de mais inovador no
Marketing 3.0. (KOTLER; KARTAJAYA; SETIAWAN, 2010, p. 21).

O Marketing Social surge como alternativa a essas práticas, oriunda de um pensamento


de mudança social e comportamental. Como cita Moyer, com valores éticos “Solidariedade,
universalidade, humanidade”. Todas as empresas possuem algo em comum, elas têm um
produto e precisam, necessariamente, que estes cheguem ao seu público. Mas, diferente das
empresas ditas “convencionais”, as sem fins lucrativos, como já demonstrado, possuem,
expressos no discurso, outros objetivos que ultrapassam os valores financeiros, conectados a
valores humanos.

Segundo Kotler “Marketing Social é o conjunto de atividades que visam ensejar ou


aumentar a aceitação de uma ideia ou prática social no seio de um determinado segmento social,
utilizando instrumentos de Marketing como pesquisa de mercado, marketing mix e a mídia”
(KOTLER, 1988).
13

Diferentemente do que acontece com as empresas com fins lucrativos, sendo o


marketing uma área indispensável quando se pensa em qualidade e expansão de um negócio,
algo intrínseco e que o viabiliza e o mantém competitivo por longos anos, nas igrejas
evangélicas ainda é uma área vista com restrições e, para féis um tanto céticos, “o marketing
não parece ser uma prática bíblica” (BARNA, 1994, Pg. 16).

O grande desafio para o marketing, específico para as igrejas evangélicas atuais, é o


paradigma de que a igreja, a instituição, se difere em princípios e objetivos de qualquer outra
empresa e que, por este motivo, o marketing seria inútil para suas finalidades. George Barna,
grande pesquisador da relação entre o marketing e as igrejas, já, na década de 90, enfrentava as
restrições e oposições à concepção de marketing dentro das instituições religiosas. “A exemplo
do mundo dos negócios, cada igreja deve ser gerenciada com o objetividade e eficiência,
marchando rumo suas metas e finalidade” (BARNA, 1994, p. 26).

Tendo em vista a possibilidade da aplicação dos conceitos e metodologias do marketing


a uma igreja, se faz necessário entender o melhor contexto e forma para que as atividades
implementadas beneficiem tanto os fiéis quanto a organização.

Para o estudo de caso, será analisado a Igreja Batista da Lagoinha, localizada no


Município de Niterói no Rio de Janeiro. Uma igreja que pode ser considerada à frente das
demais pelo seu pensamento atual e interligado com a sociedade para ouvir e atender suas
demandas. No que tange ao marketing, serão verificados suas ações e resultados práticos.
A Lagoinha, através de práticas artísticas e culturais realiza um composto de Marketing Cultural
para alcançar seus objetivos já explicitados, mas antes, atentaremos para as definições do que
vem a ser Marketing Cultural.

Como escreve Manoel Marcondes:

Marketing Cultural é a atividade deliberada de viabilização físico-financeira de


produtos e serviços culturais, comercializados ou franqueados, que venham a atender
às demandas de fruição e enriquecimento cultural da sociedade. (MARCONDES,
2002).
14

Partindo desta premissa, de que o Marketing Cultural atende à demanda de


enriquecimento cultural, podemos afirmar que a mesma possui uma relação íntima e inseparável
do Marketing Social e que por isso tem como metas mudança social e enriquecimento do
homem enquanto ser social. As práticas artísticas são ferramentas utilizadas pelo Marketing
Cultural para alcançar o público e comunicar sua mensagem.

Neste princípio, o texto pretende realizar uma análise teórica e um estudo de caso que
examinará como o Marketing Cultural pode ser utilizado por uma igreja, uma empresa sem fins
lucrativos, e conseguir, por meio dele, alcançar seus objetivos de mudança social. Porém, mais
do que isso, a monografia abordará a relação da utilização de um Marketing Cultural bem-
sucedido com a adesão de mais fiéis à igreja, fato que é um dos grandes objetivos de qualquer
instituição religiosa pelo objetivo evangelístico e expansão da doutrina.

1.1. Hipótese

Fundada em Belo Horizonte, Minas Gerais, a Igreja Batista da Lagoinha completou no,
ano de 2017, 60 anos de existência. Hoje, possui igrejas espalhadas por todo o Brasil e inclusive
nos EUA. Segundo o site oficial, em 2012, estimava-se que possuía mais de 54.0001 mil
membros espalhados por todas as suas igrejas. Começou a ser conhecida na década de 90 pelo
seu Ministério de Louvor “Diante do Trono” (Ministérios de louvor atuam nas igrejas liderando
a parte de cantos e músicas entoadas nos cultos. Composta por músicos, instrumentistas e
solistas. No caso do Ministério “Diante do Trono”, era o grupo de louvor da Igreja da Lagoinha
que, além de atuar nos cultos da própria igreja, decidiram seguir carreira para além dos muros
da instituição) que logo em seu primeiro CD conquistou multidões e a atenção do meio
evangélico. Apesar de tanto tempo ter passado, o grupo de música, liderado por Ana Paula
Valadão, ainda faz parte do repertório da maior parte das igrejas evangélicas no cenário
nacional. Hits como “Preciso de Ti” e “Coração igual ao teu” ainda permanecem na mente dos
cristãos na atualidade e perpetuam o nome do grupo e, também, da Lagoinha.

Seu início foi extremamente conturbado em sua relação com a CBB (Convenção Batista
Brasileira), que é o órgão que forma as diretrizes e, de certo modo, regula as igrejas batistas em
solo brasileiro, que a excluiu da lista de igrejas filiadas pouco depois de ser fundada, com a

1
FERNANDES, Érica. Somos 50.041 membros. Lagoinha.com. 2012.
15

alcunha de praticar algumas “heresias” e que não condiziam com a teologia reformada. A
denúncia era de que a igreja, de denominação batista, estava aceitando práticas
convencionalmente pentecostais, como danças nos cultos e dons espirituais como “línguas
estranhas” (mais à frente trataremos sobre estas práticas ditas Pentecostais). Até que em 1972,
o atual pastor Márcio Valadão, assumiu o comando da igreja e deu uma nova identidade. Uma
vez fora da Convenção Batista, o foco foi em expansão e criação de uma marca única e própria.

No campo das artes, além do grupo “Diante do Trono” e dos diversos cantores oriundos
dela, possui também a “Fábrica das artes”, uma escola de formação e capacitação em vários
segmentos artísticos localizada em Belo Horizonte, o que demonstra o foco da igreja na cultura
e nas artes.

A expansão da igreja chegou em 2013 a Niterói em um novo templo. Chamativa em


alguns aspectos por seu estilo de Boate2, atraiu a atenção de todos os moradores do Bairro de
Charitas e circunvizinhanças. Depois de um ano de inauguração do novo templo, o pastor da
congregação, Filipe Valadão, deu a seguinte declaração: “Deus nos deu um lugar completo,
espaço é que não falta, tem a capacidade de 4.500 pessoas em um complexo de 10.000 m², com
estacionamento que comporta 400 carros, espaço para as crianças, 2.000 poltronas e Lounge
(sala de espera) ” (SOSSAI, 2014). O que demonstra um alto poder de investimento da igreja
e, em contrapartida, uma clara segmentação classista da membresia que faz parte da
congregação.

Além do seu espaço ser um templo maior do que a grande maioria das igrejas, o foco
sempre foi na juventude, um público-alvo muito bem definido pelos pastores e que se pôde ver
os resultados imediatos:

Há pessoas de todas as idades, e de várias cidades do entorno de Niterói. Um grande


número de jovens está na Lagoinha, que tem um culto só para eles aos sábados. “Eu
acredito que o que impulsiona o crescimento de uma igreja é a juventude”, diz o pastor
que, no último domingo, conduziu o culto das 18h por quase três horas, com gente em
pé, e onde mais de cem pessoas foram batizadas. (O DIA, 2014).

2
JORNAL O DIA. Espetáculo da fé com jeito de boate e linguagem descontraída. 2014
16

Através de uma programação extensa durante a semana e nos finais de semana, a igreja
atrai visitantes em todos os cultos. Em sua grade possuem espetáculos musicais, de dança,
gastronomia, workshops, palestras, cinema etc. A igreja promove sua marca e mantém um fluxo
contínuo de visitantes em seus cultos e atividades semanais. A hipótese é de que a igreja utilize
o Marketing Cultural, através do entretenimento e de produções artísticas, como método de
atração de fiéis e novos membros para a congregação, tendo em vista que ela abandonou um
modelo antigo de sua condução e também dos cultos e optou por uma programação mais
condizente com a atualidade e que abre um diálogo maior com o mundo jovem do cenário atual.

1.2. Objetivo Geral

 O principal objetivo desta monografia é analisar como o Marketing Cultural é


utilizado pela Igreja Batista Lagoinha, para atrair novos membros e manter a
circulação de visitantes, e se pode servir de parâmetro para outras igrejas neste
segmento que queiram abrir um diálogo maior com a cultura e as artes em seus
templos.

1.3. Objetivos específicos

 Analisar as diversas programações existentes na Igreja a fim de entender o motivo


da implementação e o engajamento dos membros e dos visitantes com os eventos.
 Verificar o planejamento estratégico da igreja para analisar a sua eficácia e sua
implementação.
 Analisar, através dos cultos e das programações, como se dá a relação entre as
atividades artísticas e culturais com o discurso religioso.

1.4. Metodologia

As duas principais fontes de informação de coleta de dados para a pesquisa desta


monografia se deram a partir da pesquisa bibliográfica, onde foram consultados livros,
periódicos, artigos científicos e notícias que remetem ao tema e embasaram a análise crítica
produzida e o próprio estudo de caso que contou com dois principais métodos de coleta de
dados.
17

Os métodos utilizados para este estudo de caso se dão em duas principais frentes, quais
são: A pesquisa de campo, com visitas realizadas aos cultos e eventos externos da igreja, que
ocorreram no período de 1 ano da formulação desta monografia, nos cultos de terças e domingos
e, esporadicamente aos sábados nos cultos Nexteen e Next (serão explicitados no estudo de
caso) e também nos eventos externos como os shows e palestras, observando como se dão as
relações entre os membros e os líderes e também coletando informações e depoimentos
pertinentes à pesquisa realizados espontaneamente com membros e visitantes da igreja, e
agendadas com líderes ministeriais; a segunda é a coleta de dados na rede através dos canais
oficiais da própria igreja e informações contidas em artigos científicos, matérias de jornais,
periódicos, websites sobre teologia.

As informações coletadas na parte da pesquisa serão fundamentais para embasar o estudo


em si, para formulação dos temas abordados e dar suporte às possíveis conclusões que
decorrerão deste estudo.

1.5 APRESENTAÇÃO DE CAPÍTULOS

Na parte teórica, serão analisados 2 pilares que irão sustentar a análise e os resultados
obtidos no estudo de caso:

 A primeira parte tratará sobre a Pós-modernidade e o sujeito contemporâneo. Serão


analisados textos de vários autores, em especial Stuart Hall e David Harvey, que
abordam, conceitualmente, a passagem da modernidade para a Pós-modernidade, suas
principais características e as mudanças ocasionadas no indivíduo, com vistas a sua
identidade cultural. Mudanças essas que podem ser analisadas e pensadas na maneira
como os fiéis hoje se relacionam com as instituições religiosas e como sua pluralidade
e descentramento dialogam com as muitas facetas da igreja contemporânea e um
rompimento dos dogmas e práticas outrora estabelecidos.

 A segunda parte será um estudo sobre o Marketing Cultural em si, suas variadas formas
e conceitos, seu diálogo com outros tipos de marketing e sua aplicação na igreja. Serão
18

analisados importantes autores como Phillip Kotler, George Barna e Manoel


Marcondes.

Importante ressaltar que a análise destes referidos autores e de suas contribuições


teóricas para este tema servirão como base para uma análise profunda do nosso estudo de caso,
a aplicação do marketing e os resultados obtidos, servindo como parâmetro, inclusive, para
outras igrejas.

2. CONTEMPORANEIDADE E O SUJEITO PÓS-MODERNO

2.1 HISTÓRICO BATISTA BRASILEIRO

A fim de que possamos fazer um estudo aprofundado sobre a aplicação do Marketing


Cultural na Igreja Batista da Lagoinha é necessário, antes, que tracemos definições sobre o que
vem a ser uma igreja e, especificamente, uma igreja batista: Seus dogmas, ritos, histórias etc.

No Brasil, existe ainda uma predominância Católica não apenas influindo na fé, mas nas
práticas do cotidiano. Trazida pelos Jesuítas Portugueses durante o período colonial em uma
missão evangelística, as raízes dessa vertente do cristianismo ainda são bem difundidas e
conhecidas pelas camadas diversas da população. Ainda que considerados cristãos, no stricto
sensu do termo, as diferenças entre católicos e protestantes não se detiveram na Reforma
iniciada por Martinho Lutero, na Alemanha. Perpetuam até os dias de hoje e se manisfestam
desde os cultos, em seus templos, até a cosmovisão de seus fiéis.

Ao longo da história brasileira, várias foram as missões e projetos evangelísticos


protestantes. Ainda no período colonial, houve o estabelecimento de missões holandesas no
Nordeste, através da Igreja Reformada Holandesa. Mais à frente, no século XIX, com a chegada
da Família Real e, também, o tratado de Comércio e Navegação possibilitou a vinda de
comerciantes e imigrantes para o país, concretizando a implantação de outras igrejas como a
Igreja Anglicana, oriunda da Inglaterra, a Igreja Luterana, trazida por imigrantes alemães e, no
que concerne a este estudo, a Igreja Batista, trazida por missionários americanos que fugiam da
Guerra de Secessão. Estabelecidos em Santa Barbara d’Oeste, em São Paulo e, em 1871,
19

fundaram a primeira Igreja Batista em solo Brasileiro.

Por definição, Igrejas Protestantes são aquelas oriundas da Reforma Luterana ou que
guardam ainda hoje os princípios estabelecidos pelos reformadores. As principais famílias
denominacionais estabelecidas aqui são: Igreja Luterana, Metodista, Presbiteriana,
Congregacional e Batista.

Pode-se definir em três pontos principais a doutrina que norteia os Protestantes:

- A Justificação Pela fé

Ao contrário de outras doutrinas Cristãs atuais, os protestantes acreditam que a fé, pura
e simplesmente, é capaz de redimir e salvar o homem, não sendo necessário obras materiais ou
algum tipo de missão que justifique a sua salvação.

- A bíblia como fonte única

Os Protestantes também primam pela autoridade da Bíblia, ao que creem ser a “Palavra
de Deus aos homens”. Acima de tradições e dogmas religiosos, a Bíblia está acima de tudo e
de todos e o homem é livre para ler e interpretar os seus escritos. A individualidade, tanto da
salvação quanto da vida religiosa em si, é algo que cabe destacar sobre a cosmovisão
protestante.

- Jesus, Único intermediário entre Deus e os Homens

O último ponto se refere ao acesso do homem até Deus. A doutrina nega que o cristão
necessite de algum santo ou de algum homem, seja ele sacerdote, pastor ou missionário para
que se tenha uma comunhão entre os homens e Deus. Através de Jesus, “aquele que morreu na
cruz”, o acesso a Deus seria novamente restaurado, salientando mais uma vez a liberdade e o
caráter personalista de homem em relação ao divino.

Em 1907, fundou-se a Convenção Batista Brasileira. órgão esse que existe ainda hoje e
que regulamenta e fundamenta as diretrizes doutrinárias das Igrejas Batistas que a ela são
filiadas. A base doutrinária Batista, além destes 3 pontos principais, é caracterizada por outros
pontos importantes para a Igreja:

1º) A aceitação das Escrituras Sagradas como única regra de fé e conduta.


20

2º) O conceito de igreja como sendo uma comunidade local democrática e autônoma, formada
de pessoas regeneradas e biblicamente batizadas

3º) A separação entre igreja e Estado.

4º) A absoluta liberdade de consciência.

5º) A responsabilidade individual diante de Deus.

6º) A autenticidade e apostolicidade das igrejas.

(Declaração Doutrinária da Convenção Batista Brasileira, convencaobatista.com.br)

Desde a criação da Convenção Batista Brasileira, a denominação vem crescendo em


número de fiéis e templos e hoje é a denominação tradicionalmente Protestante com o maior
número de fiéis.

Dos seus principais pontos destacados, retirados de sua Declaração, cabe destacar a
importância concedida pelos fiéis ao conceito de “liberdade”. Esta se manifesta de diversas
formas, como em relação ao Estado, defendendo a posição do Estado Laico e a não interferência
religiosa no ensino das escolas; liberdade em relação a Deus, tanto em questão da Livre
Agência, grande marca doutrinária, que defende livre escolha do homem em relação a sua
salvação e também de acesso ao mundo espiritual através de sacramentos e devoção
individual;( cabe destacar que, para os batistas, só existe liberdade através de Deus, e que, sem
ele, somos escravos da natureza humana) por último, liberdade em relação a igreja, que se
manifesta na forma das decisões democráticas que permeiam as escolhas feitas pelos membros
de determinada comunidade e em relação aos costumes e ritos que diferem umas das outras
igrejas, podendo haver diferenças de acordo com o bom entendimento dos membros.

Esses conceitos têm o respaldo da já citada Declaração Doutrinária da Convenção


Batista e pode ser encontrada em alguns a textos que se seguem:
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2.1. III - O Homem


1.1.1.1
Por um ato especial, o homem foi criado por Deus à Sua imagem e conforme a Sua
semelhança e disso decorrem o seu valor e dignidade.

6 - Ser pessoal e espiritual. O homem tem capacidade de perceber, conhecer e


compreender, ainda que em parte, intelectual e experimentalmente, a verdade
revelada, e tomar suas decisões em matéria religiosa, sem mediação, interferência
ou imposição de qualquer poder humano, seja civil ou religioso;

2.2. VIII - Igreja


1.1.1.2

Igreja é uma congregação local de pessoas regeneradas e batizadas após


profissão de fé. É nesse sentido que a palavra “igreja” é empregada no
maior número de vezes nos livros do Novo Testamento.

1 - Tais congregações são constituídas por livre vontade dessas pessoas


com finalidade de prestarem culto a Deus, observarem as ordenanças de
Jesus, meditarem nos ensinamentos da Bíblia para a edificação mútua e
para a propagação do evangelho;
2 - As Igrejas neotestamentárias são autônomas, têm governo
democrático, praticam a disciplina e se regem em todas as questões
espirituais e doutrinárias exclusivamente pelas palavras de Deus, sob a
orientação do Espírito Santo;

XV - Liberdade Religiosa

Deus, e somente Deus, é o Senhor da consciência.

1 - A liberdade religiosa é um dos direitos fundamentais do homem, inerente à sua


natureza moral e espiritual;
2 - Por força dessa natureza, a liberdade religiosa não deve sofrer ingerência de
qualquer poder humano;
3 - Cada pessoa tem o direito de cultuar a Deus, segundo os ditames de sua
consciência, livre de coações de qualquer espécie;
4 - A Igreja e o Estado devem estar separados por serem diferentes em sua natureza,
objetivos e funções;
5 - É dever do Estado garantir o pleno gozo e exercício da liberdade religiosa, sem
favorecimento a qualquer grupo ou credo;
6 - O Estado deve ser laico e a Igreja livre. Reconhecendo que o governo do Estado
22

é de ordenação divina para o bem-estar dos cidadãos e a ordem justa da sociedade,


é dever dos crentes orar pelas autoridades, bem como respeitar e obedecer às leis e
honrar os poderes constituídos, exceto naquilo que se oponha à vontade e à lei de
Deus;

(Declaração Doutrinária da Convenção Batista Brasileira, convencaobatista.com.br,


grifos do autor)

Não há dúvidas de que o conceito da liberdade sempre foi e ainda é bem presente na
visão Batista do mundo material e também do espiritual. Muito do que se observa hoje se vê
refletido dessa mentalidade. Existem diversas igrejas Batistas que possuem crenças
discrepantes e formas de cultos distoantes, como grupos de danças e de teatro, ou até mesmo
inserção de práticas mais atuais inseridas no contexto de culto, como recursos audiovisuais, que
no passado eram inimagináveis, dentro da própria Convenção. Não é muito difícil encontrar
igrejas, próximas em suas localidades, mas que possuem pensamentos divergentes sobre
diversos pontos.

Algumas outras igrejas Batistas, por terem crenças em pontos cruciais da fé foram
excluídas ou se retiraram voluntariamente do rol de igrejas pertencentes à Convenção. Como é
o caso da Igreja Batista do Pinheiro, localizada em Maceió-AL, que foi excluída no ano de 2016
por efetuar o batismo de membros assumidamente homossexuais3. É o caso, também, da Igreja
Batista da Lagoinha que mantém seus ensinos e dogmas básicos da doutrina fundamentalmente
protestante e tem como símbolo não apenas cultos e programações costumeiras de uma
comunidade religiosa, antes porém, focam na experiência única e sensorial que os fiéis
vivenciam, sejam nas dependências da instituição ou nas redes sociais. O grande apelo se faz
no tocante ao pertencimento a essa instituição e se perceber parte de um organismo que preza
pelo bem estar dos seus membros e na busca constante de provocar novos momentos e
sensações transcedentais.

A busca incessante do indíviduo pelo que se revela novo e pela sua liberdade de viver e
agir conforme suas concepções de mundo, marca característica de nosso Pós-modernismo, não
poderia deixar de se impor aos cristãos, mais especificamente aos Batistas. São raros os casos
de igrejas da mesma denominação que tem suas práticas e ritos iguais a outras. Cada uma, de
acordo com suas próprias interpretações da bíblia e suas vivências no cristianismo, moldam a

3
GUSTAVO, Derek. Convenção Batista exclui igreja em Maceió por batizar homossexuais. G1.com. 2016
23

comunidade e os dogmas elegidos por ela. Práticas tão comuns no passado estão sendo deixadas
de lado pelas novidades do pensamento e da tecnologia. Telões de alta resolução, instrumentos
potentes, equipamentos para transmissão para TV ou internet são requisitos para a igreja da
nova era e é preciso adaptação para a sobrevivência.

2.2 A FORMAÇÃO DO INDIVÍDUO

Segundo o censo realizado pelo IBGE no ano de 20134, o protestantismo no Brasil é o


segmento religioso que mais ganha adeptos no Brasil. Estima-se que a população evangélica
seja de 22,2 % do total de cidadãos. Um crescimento grande, em detrimento do catolicismo que
perde espaço no cenário religioso, quando o número, em 1970, era de apenas 5,2% da
população. Dados do Correio Braziliense de 20135 afirmam que 14 mil igrejas evangélicas
sejam abertas por ano no Brasil. Uma média de 12 igrejas novas por dia. De todas as
denominações, as ditas Pentecostais sãos as que se destacam com uma porcentagem de 60% do
total de evangélicos. As ditas igrejas pentecostais são oriundas de uma crença divergente da
linha tradicional evangélica, onde sua premissa parte do Dia de Pentecostes, Atos 2, e se
caracteriza por uma ênfase na atuação do Espírito Santo, o que se verifica na maior liberdade
de culto e dons espirituais como o Dom de línguas e de Revelação, doutrinas estas amplamente
criticadas pelas fileiras tradicionais dos Batistas, como analisaremos mais a frente neste estudo.

Do rol de denominações de linha pentecostal, se destacam a Igreja Assembleia de Deus


e a Igreja Universal do Reino de Deus. Por não possuírem regimentos e organizações de
controle tão rígidos como as denominações de linhas mais tradicionais como as Igrejas Batistas
e Presbiterianas, as igrejas Pentecostais e Neopentecostais crescem em número avassalador,
não apenas em número de templos, mas em participação em canais midiáticos, como a TV,
rádio e internet. Esse crescimento avassalador pode ser inferido pelo número de igrejas que são
abertas sem registro e CNPJ, muitas delas tão pequenas que se constituem em garagens e
quintais de casas.

4
AZEVEDO, Reinaldo. O IBGE e a religião. Veja Abril. 2017.
5
CORREIO BRAZILIENSE. Mercado evangélico no país faz girar R$ 15 Bilhões em vários segmentos. 2014.
24

Os dados demonstrados nesse primeiro momento indiciam um fenômeno que é uma


característica do sujeito Pós-moderno: a pluralidade.

Para este tópico, utilizaremos alguns dos conceitos do sociólogo Stuart Hall sobre a
definições do sujeito Pós-moderno e suas mudanças ao longo dos séculos.

[...] O sujeito pós-moderno, conceptualizado como não tendo uma identidade fixa,
essencial ou permanente. A identidade torna-se uma “celebração móvel”: formada e
transformada continuamente em relação às formas pelas quais somos representados
ou interpelados nos sistemas culturais que nos rodeiam. (HALL,12ª Ed. 2014)

Assim como o sujeito, na concepção de Hall, as religiões passaram por grandes


transformações em suas estruturas e cosmovisões. Para o autor, as concepções de identidade se
dividem em três ao longo da história:

 Sujeito do iluminismo;
 Sujeito sociológico;
 Sujeito pós-moderno.

Caracterizado pelas mudanças ocorridas no campo científico, pela reforma protestante,


a arte renascentista e a racionalidade iluminista, como assim já referido, o sujeito do iluminismo
centra-se em uma concepção individualizada e unificada do ser humano. O indivíduo deste
tempo foi instigado a pensar por si mesmo, ter suas próprias concepções e verdades únicas sobre
o mundo. Um dos legados da reforma protestante, o sujeito busca o conhecimento religioso por
si mesmo. Com a criação da prensa por Gutemberg e as teses de Martinho Lutero, aos poucos,
o catolicismo vigente foi sendo questionado como verdade absoluta e mais pessoas puderam ter
acesso às ditas “Sagradas Escrituras”. O pensamento instaurado pelos reformadores era de que
nenhuma tradição ou sistema religioso poderia deter a norma para interpretação da bíblia. Ela,
por si mesma, poderia ser descoberta e revelada a todos os homens, individualmente, como
formulado, “Sola Scriptura” (Declaração de Cambridge, 1996).

Outra característica importante deste sujeito era o fator da mudança nas concepções e
personalidade humana. Era preponderante que o indivíduo continuasse “essencialmente o
mesmo – contínuo ou “idêntico a ele – ao longo da existência” (HALL,12ª Ed. 2014, p. 11).
25

Em contraposição à teoria individualizada do homem, o sujeito sociológico, que adveio


da modernidade, é entendido não como um produto em si mesmo, dotado de racionalidade e
pensamento próprio, mas de uma relação em conjunto, em suma, de sua sociedade. As
características assumidas são coletivas, culturais. A teoria sociológica do sujeito entende que
não existe autossuficiência e autonomia na formação, pois o mesmo é forjado na relação com
seus pares. Como descreve Hall (12ª Ed. 2014, p. 11), “este é formado e modificado num
diálogo contínuo com os mundos culturais “exteriores” e as identidades que esses mundos
oferecem”. Os interacionistas formam a corrente filosófica que pensa o sujeito como parte de
um todo e que, portanto, pensam e agem de acordo com seu próprio meio. “Organismo e meio
exercem função recíproca” (FOSNOT, 1999).

A chave para o entendimento do sujeito Pós-moderno, protagonista ativo desta


monografia, são os deslocamentos e a fragmentação da identidade. Como afirma Hall, a
globalização e o fluxo contínuo de culturas produz um sujeito “fragmentado; composto não de
uma única, mas de várias identidades, algumas vezes contraditórias ou não-resolvidas” (HALL,
2014, p. 12). A identidade que antes era algo central, único e imutável, se transforma em
“fantasia”. A celebração, na Pós-modernidade é, justamente, o caráter efêmero e
“metamorfósico” das opiniões e crenças nas culturas.

O que dantes era predominante na Europa da Idade Média, a saber, o catolicismo


romano, que ditava as normas e regras de conduta e fé, na Pós-modernidade se dilui não apenas
em diversos credos, mas numa própria difusão de novas vertentes do cristianismo e, além, do
próprio movimento protestante, que surgiu como reforma e corrente única. O cristianismo, hoje,
assim como as igrejas, se flexibiliza cada vez mais para abarcar todas as contradições e vertentes
do “ser contemporâneo”, modificando vez após vez suas características, uma vez imutáveis,
dogmáticas e eclesiásticas. “O novo valor atribuído ao transitório, ao fugidio e ao efêmero, a
própria celebração do dinamismo, revelam um anseio por um presente estável, imaculado e não
corrompido” (HABERMAS apud HARVEY, 2007, p.291).

Ao passo do tempo, podemos analisar as diversas crenças e credos sendo criados e


reformulados em contraposição ao que já existe há séculos. No que tange ao cristianismo,
diferentes denominações são criadas, que atendem a diversos públicos diferentes, igrejas que
26

também modificam o entendimento comumente aceito de algumas passagens bíblicas para


inserir novos agentes no seio religioso, como é o caso da Igreja Contemporânea6 que entende a
homossexualidade como prática que não é condenada pela bíblia ou como a Igreja Onda Dura7
que se auto intitula “tão igreja que nem se parece com uma” pelo perfil das suas programações
e de seus adeptos.

Todas estas transformações ocorridas visam atender as demandas do sujeito pós-


moderno que é ávido pelo que é novo e inovador, o que interfere diretamente na estrutura
organizacional e doutrinária de uma igreja. A pluralidade se manifesta no poder de escolha que
está nas mãos de cada pessoa, que tem em sua frente um cartel de possibilidades e de caminhos
diferentes. A desfragmentação, de uma identidade sólida do ser, faz com que o fiel, hoje, seja
totalmente ávido por mudanças e por novidades, algo que lhes motive a permanecer na igreja.
A Lagoinha se insere nesse cenário onde a instituição e os cultos não são apenas lugares para
“adorar a Deus”, é um lugar de experiências, onde o ser é entendido em sua complexidade e
completude e que necessita ser instigado a ir mais além do que o habitual. Como o próprio
slogan da Igreja já diz, a Lagoinha se propõe a ser “um lugar de novos começos”, um lugar em
que tanto os membros como os novos visitantes irão encontrar aquilo que não encontraram até
o momento. As igrejas de hoje se atualizam e se inserem nas demandas e anseios do sujeito
pós-moderno.

2.3 O SUJEITO RELIGIOSO NA PÓS-MODERNIDADE

Um dos grandes desafios vividos pelo indivíduo religioso nos dias atuais é a grande
secularização pela qual o mundo passa. Diferentemente dos tempos onde as instituições
religiosas ditavam as regras e a cosmovisão totalitária, vivemos em um período onde as crenças
e religiões se proliferam e perdem a força de se entremear nas escolhas e modos de viver. “A
religião passa a ser moldada ao gosto dos indivíduos, diferentemente do que ocorria, uma vez
que, no passado a religião moldava o mundo – a exemplo o período medieval” (BRANDÃO,
2016, p. 70).

6
Jornal O DIA. Primeira Catedral gay do Brasil será inaugurada em Madureira.2015.
7
ARAGÃO, Jarbas. Onda Dura: a igreja que não parece igreja. Gospel Prime.2017.
27

Símbolo do sujeito pós-moderno, a pluralidade se faz presente também no campo


religioso. Ao contrário do que se pode encontrar na sociedade medieval em que o catolicismo
era preponderante, no pós-moderno os sujeitos significam e reclamam para si modelos
religiosos e sistemas de crenças que atendam suas necessidades e abarquem todas as diferenças
inerentes de sua personalidade. A religião cristã, modelo dogmático clássico, impõe suas regras
de fé e prática, que reverberam nas atitudes e condutas do ser em sociedade. Ela prega um estilo
único e singular do “Homem”, o que contrapõe o sujeito contemporâneo que possui diversas
verdades, que preza pela liberdade de conduta e não se mantém rígido a sistemas antigos e
invariáveis. O que transparece nas diversas formas de expressão religiosas e crenças místicas
atuais, como explica Eduardo Cruz: “Os nomes e tendências se multiplicam: Nova Era,
esoterismo, misticismo, autoajuda. Elas sequer aparecem claramente no senso; revelam, no
entanto muito daquilo que por vezes se chama de Pós-moderno no âmbito religioso.” (CRUZ
apud BRANDÃO, 2016, p. 70).

Ainda que estejamos vivenciando hoje um modelo de secularização da vida e


distanciamento das práticas religiosas tradicionais, crescem ainda em número significativo
adeptos de religiões ancestrais como o Cristianismo e Judaísmo. Com força e renovação da
juventude, as instituições religiosas passam por chamados “renovos” que perpassam não apenas
pela nova geração de fiéis, mas pela nova mentalidade com que ingressam nestes sistemas. O
sentimento de liberdade, de inclusão cercam e permeiam as igrejas atuais, fazendo com que
exista uma atualização nas regras e dogmas da igreja e uma reformulação nas crenças e no que
era tido como pecado para as gerações passadas.

A título de exemplo, igrejas evangélicas têm crescido em nichos como os de surfistas,


skatistas, motoqueiros, tatuados etc. Na Zona Oeste do Rio de Janeiro, a Igreja Batista Betânia
possui cultos específicos para motociclistas, que adentram o templo com suas motocicletas e
fazem um culto totalmente voltado para o estilo de vida deles. Em gerações passadas, grupos
que não eram relacionados diretamente com instituições religiosas, pelo seu caráter transgressor
e libertário, ganham cada vez mais espaço e atenção dos movimentos religiosos. Numa tentativa
de não perder sua credibilidade da atuação no contemporâneo, as igrejas se renovam e buscam
se enquadrar na lógica cotidiana. Segundo Leornado Boff (2000, p. 31) “A pós-modernidade
liberou as subjetividades do enquadramento forçado em instituições totalitárias, com suas éticas
rígidas, como são, geralmente, as religiões”.
28

Com o misticismo e o sincretismo religioso, marcas não apenas do sujeito pós-moderno,


mas também parte inerente da cultura brasileira, as instituições predominantes recebem
influências e bebem da fonte de outras crenças e sistemas dogmáticos. Apesar do sujeito não
ser tão devoto de uma única religião, ainda há uma sacralização das práticas cotidianas
expressas nos jargões, ditos, ritos e expressões da vida como um todo. Pode-se dizer que não
existem, hoje, religiões que são puras e imaculadas de seus tempos de origem, pelo menos não
no Brasil. Todas elas perpassaram por alguma espécie de transformação, não apenas das
estruturas sociais e políticas, mas da experiência do indivíduo que adiciona suas verdades e sua
pluralidade de forma subjetiva e bem particular à dinâmica religiosa. Embora o sujeito religioso
do mundo pós-moderno tenha perdido uma visão unilateral e totalitária, não é possível dizer
que esse mesmo sujeito não tenha vivência com o sagrado, ainda que de forma mais ampla e
diversificada.
.
Onde pois encontramos hoje pista desta religião? Com certeza não apenas na Igreja.
Podemos encontrá-la nas colunas de aconselhamento nas revistas e ilustrações dos
personagens fictícios dos comic strips, nas páginas de horóscopo, e no vasto mercado
de livros esotéricos. Podemos encontrá-la nas artes plásticas com suas chocantes e
questionáveis obras, apontando para nossa perceptível transcendência cotidiana.
Podemos encontrá-la na terapêutica com sua oferta de vivência individual e
meditações sincréticas. Podemos encontra-la em facções políticas, que exigem
relações de inclusão social e asseguram identidades pessoais. Podemos encontra-la no
consumo, através das propagandas com promessas religiosas. Podemos encontra-la na
indústria do turismo, do culto em torno da alimentação e aos exercícios físicos, que
faz do paraíso uma promessa. (Gräb, 1995, pg. 47)

O sujeito pós-moderno, em sua essência, abandonou o sentido puro e imaculado das


religiões. Elas não possuem mais fronteiras e nem limites e estão o tempo todo em contato com
outras crenças e tendo como fonte outras expressões religiosas e culturais. E o ser humano se
coloca no centro desta questão onde as religiões aos poucos perdem suas características
fundantes e cedem aos desígnios dos seus adeptos.
29

3. O MARKETING CULTURAL E A IGREJA.

3.1 SAGRADO X ENTRETENIMENTO NA ECLÉSIA

“É que o sagrado se tornou hilário


Ascendeu em abril, se espatifou em maio
E o que é que ficou? Ficou o riso amarelo

E agora tanto faz o que é sagrado


Nada importa se isso tudo não for antes santificado. Bem no interior do meu peito
deserto.” (PALAVRANTIGA, 2012)

A Igreja, seja ela católica ou protestante, sempre teve seu respaldo e respeito pela
sociedade. Ainda que numa sociedade laica, a detenção do que é sagrado pela instituição
religiosa impõe respeito e devoção, mesmo daqueles que não professam a fé. Por definição, a
igreja possui um poder simbólico do que é sagrado “um poder de consagração ou de revelação”
(BOURDIEU, 2004: p.167).

As instituições cristãs, desde seus primórdios, sempre foram dogmáticas e imbuídas de


autoridade. Não sem propósito. A igreja é um organismo que representa o Deus na terra e,
segundo a Bíblia, requer uma vida de devoção e obediência de seus fiéis. O respeito à autoridade
da igreja remete à obediência do povo aos antigos reis autoritaristas da Europa Medieval que
propagavam seus discursos entremeados de autoridade divina e, por isso, com irrefutabilidade.

Existia um sentimento de devoção e de temor pelas autoridades religiosas e pela própria


igreja. Uma Europa cristã que propagava, através das grandes navegações e da conquista das
novas colônias, o cristianismo por todo o mundo. No interior de seus navios, homens de fé que
levavam a “nova vida” aos colonizados. A autoridade se fez presente em lugares ainda
desconhecidos no “velho continente”.

Sempre em paralelo com os poderes governamentais, a religião foi, cada vez mais,
exercendo seu poder de autoridade sobre a fé e o sagrado, ainda que, na pós-modernidade, em
separação com o Estado. Como afirma Azevedo:
30

No Brasil, ao contrário, as autoridades eclesiásticas têm um lugar de honra, ao mesmo


nível dos governantes, nas celebrações estatais, para as quais são sempre convidadas
como se representassem um dos poderes da Nação. E presidentes, governadores,
ministros, parlamentares, juízes, prefeitos municipais tomam assento nas cadeiras das
Catedrais e outros templos, como representantes dos poderes públicos por ocasião de
cerimônias religiosas promovidas pela Igreja católica e por igrejas evangélicas.
(Azevedo, 1981:p. 115).

A religião, sendo ela dotada de bens simbólicos como ritos cultualísticos e sacramentos,
teve na igreja a sua fonte primária de autoridade, tendo em vista ser um lugar ou um grupo
que alega ter o conhecimento acerca de Deus e construir uma relação de contato e intimidade
com o sagrado. Como um organismo dotado de poder, instituído inclusive pela própria Bíblia,
segundo interpretações (cabe aqui um texto que remeta a essa autoridade nas escrituras
sagradas do cristianismo: “Pois também eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra
edificarei a minha igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela”; Mateus 16:18),
ela deteve o controle sobre o acesso a esses bens simbólicos. Uma vez que a obediência e a
devoção à igreja não eram cumpridas pelo fiel, sua obtenção da comunhão com os demais
membros e o relacionamento com o próprio Deus se encontravam defasados.

O controle e o domínio sobre a vida e as práticas do cotidiano do fiel sempre estiveram


sob os olhares dos líderes e ministros religiosos que detinham em si a autoridade para cercear
a prática religiosa no que concernia a uma determinada denominação ou instituição. Através
deste domínio exercido, a igreja do passado mantinha o número de fiéis sempre em grande
quantidade em uma constante expansão do cristianismo para diversas outras regiões, como
aconteceu com o Brasil, inclusive. “Dessa maneira, a religião usa signos e elementos figurados
para exercer seu domínio coercitivo sobre os fiéis que respondem de maneira submissa e
obediente aos preceitos religiosos. ” (PEREIRA, 2008, p. 82).

Além da própria autoridade instituída da igreja como representante da religião, os líderes


religiosos também possuíam seu arbítrio sobre os fiéis por serem representantes da palavra de
Deus e por serem elegidos como guias espirituais e, dependendo das denominações, um guia
de ordem social que ditava os preceitos e regras de conduta e detinham em si um modelo para
uma vida segundo as doutrinas sagradas.
31

As ordenanças e ritos realizados pela igreja, comandados e preditos pelos líderes que,
através de conhecimento das escrituras e da doutrina denominacional, conquistaram a
obediência dos fiéis e, através do carisma, produziram a confiança na sua liderança para
exercerem seu papel de comando sobre a Eclésia. “A crença de que os bispos e padres são
homens dotados de poderes especiais que controlam a Igreja e a entrada no reino dos céus, faz
deles líderes sagrados cujas ordens devem ser obedecidas. ” (PEREIRA, 2008, p. 85).

Para além dos domínios da ordem espiritual, a igreja expandiu seu controle para a esfera
política, ditando o comportamento dos fiéis em sua relação com o Estado e com os governantes.
Uma vida íntegra e moral sempre foi uma ordenança primordial e, em relação aos governantes,
o respeito e obediência aos eleitos. Ainda que em uma condição de interiorização e pobreza, o
discurso de paz e respeito sempre foi a tônica dos discursos, o que contribuiu para a manutenção
da ordem e das estruturas vigentes e repressão à rebeldia política e o protesto contra os
escândalos do governo. “A religião cumpre uma função de conservação da ordem social
contribuindo, nos termos de sua própria linguagem, para a “legitimação” do poder dos
“dominantes” e para a “domesticação dos dominados”. (BORDIEU, 1992, p. 32).

Mostrem-me a moeda usada para pagar o imposto". Eles lhe mostraram um denário,
e ele lhes perguntou: "De quem é esta imagem e esta inscrição?" "De César",
responderam eles. E ele lhes disse: "Então, deem a César o que é de César e a Deus o
que é de Deus. (Bíblia Sagrada, Mateus 22:19,21).

Com o advento do que conceituamos como pós-modernidade, com suas novas


realidades e modos de enxergar o mundo ao redor trouxe, em si, a secularização da sociedade
onde as instituições religiosas perdem, cada vez mais, a gerência sobre o modus operandi da
vida dos fiéis e da práxis.

O sujeito da contemporaneidade é conceitualizado como “indivíduo como medida e


como fim”. (PORTELLA, 2006, p.72). O centro da ordem social que outrora era das
instituições religiosas que ditavam as regras e a moral por conterem o “poder simbólico” do
sagrado, cedem espaço à racionalização e foco no indivíduo como senhor de si e autor de suas
próprias convicções morais. A partir deste ponto, a igreja, que neste estudo representa a
religião e a fé, perde seus domínios de definição de mundo não apenas sobre o micro, que no
caso seria o cidadão, mas também no que tange à sociedade e tudo a que a circunda como “no
32

campo da cultura, do Estado, do Direito, do lazer e entretenimento, enfim, das instâncias


reguladoras do cotidiano”. (PORTELLA, 2006, p.72).

Assim como afirma Gräb, apesar das instituições religiosas serem afetadas por este
processo contínuo de secularização e laicização da sociedade, a religiosidade ainda se faz
presente no cotidiano, principalmente o brasileiro, dotado de sincretismos e “bricolagens”,
próprias de um povo constituído da junção de diversos povos e etnias com crenças diversas.
Ainda que haja uma religião predominante, o campo do sagrado é entremeado de superstições,
crenças e mitos originados em outros credos e que estão intimamente ligados à origem dos
costumes e cultura nacional e regional.

A religião, não mais entendida apenas como uma instituição, cujo símbolo maior seja
uma igreja ou templo, ainda é parte inerente da vida humana na sociedade secularizada. O
sagrado ainda se faz presente e a fé cada vez mais almejada, principalmente nestes
movimentos de fé avivada pelo qual passam a igreja católica e protestante nas últimas décadas.
A sociedade vive um tempo de menos instituição e poder de influência dos poderes
reguladores da ordem social, porém, ao mesmo tempo, vive um “boom” de movimentos
religiosos onde a fé e a experiência pessoal são a essência do sagrado, onde o indivíduo se
coloca no centro da cosmovisão religiosa.

Essa situação representa uma severa ruptura com a função tradicional da religião, que
era precisamente um conjunto integrado de definições de realidade que pudesse servir
como um universo de significado comum aos membros de uma sociedade. Restringe-
se assim o poder que a religião tinha de construir o mundo ao da construção de mundos
parciais, universos fragmentários, cuja estrutura de plausibilidade, em alguns casos,
pode não ir além do núcleo familiar. (BERGER, 2004, p. 146)

Com a significativa busca do indivíduo pós-moderno pela obtenção do sagrado, ao seu


próprio modo, e constante ressignificação das estruturas institucionais pelas quais passam as
igrejas mais tradicionais, ainda com dogmas e ritos imutáveis, precisam “lançar-se no “mercado
religioso” como uma entre outras, usando as operações da economia de mercado, adaptando-se
às demandas e, assim, tendo mesmo que modificar, no limite, certos traços seus até então
intocados”. (BERGER apud PORTELLA, 2006, p.81).
33

Esta nova forma de religião, a que se trata e se adequa às regras do mercado, se


multiplicam e dividem-se em nichos dentro da própria linha doutrinária e respondem aos
anseios complexos dos fiéis. O entretenimento religioso, uma das variadas formas de adaptação
a que as instituições se submetem, rompe com grande eficiência e conquista a “religiosa
audiência” (PATRIOTA, 2008). Em meio à fuga de uma religião ultrapassada, as variadas
comunidades se reformulam em busca de alcançar novos fiéis e a difícil missão de reinseri-los
na cosmovisão sagrada, ainda que numa sociedade laica e secularizada.

O que resta é a presença simultânea de várias agências religiosas, convivendo entre


si, acotovelando-se no mercado dos sentidos e eficácias simbólicas, num oferecimento
de seus produtos que, grosso modo, não serão mais adquiridos de forma permanente
e, quando adquiridos, sofrerão as alterações do gosto do freguês. (PORTELLA, 2006,
p. 82)

Como já dantes abordado neste estudo, os protestantes formam o grupo religioso que
mais cresce no Brasil atualmente. Estes números revelam grandes investimentos em
evangelização, em preparo dos ministros e pastores, com a criação e abertura de seminários
teológicos e cursos voltados para a capacitação do trabalho eclesiástico, além dos montantes
aplicados no grandes templos e imóveis alugados ou pertencentes aos grupos religiosos.

Em meio a tanta pluralidade, marca fundamental do indivíduo pós-moderno, o “mercado


religioso” se faz e refaz a cada dia mais competitivo e a “disputa” pelos membros se introduz
em cenários ainda não explorados como as redes sociais, os meios televisivos e o rádio. Em
marketing, há um processo de exposição pelo diferencial, de oferecer algo, como uma
experiência, um serviço inovador, que faça o indivíduo optar por determinada igreja que fará
parte a longo prazo.

O grande “serviço” de uma igreja ou templo religioso ainda são os cultos, porém, o
modo como eles são conduzidos e divulgados revela um pretensioso profissionalismo que
grande parte das igrejas ignora ou ainda julga ser um aproveitamento da fé alheia.

O entretenimento religioso surge, neste século, de modo a atrair a atenção dos fiéis,
permitindo que conceitos sagrados e ditames do dia a dia sejam mais facilitados ao
entendimento. Através de recursos multimídia e audiovisuais, produções artísticas e culturais,
34

estruturas narrativas de drama são injetadas, aos poucos, nos cultos para um público que, se a
princípio, nunca imaginou que entretenimento e o sagrado pudessem caminhar juntos, tem
como hábito corriqueiro a fruição de produtos da “indústria cultural” em outras esferas da vida.
A religião se utiliza de tais artifícios em prol da sua mensagem alcançar novos nichos e ter o
interesse constante dos seus membros.

A priori, desassociamos “entretenimento” de “religião”, afinal fomos ensinados a


perceber religião como algo “sagrado”, “separado” e contrário, portanto, às coisas
banais e corriqueiras do mundo, como a recreação, a distração e a brincadeira. [...]
Ambos se constituem como importantes fatores de desenvolvimento de vínculos
sociais e da cultura humana. (PATRIOTA,2008, p. 72).

Ao nos determos sobre os meios televisivos, teremos dados muito conclusivos de que
as igrejas evangélicas se utilizam do entretenimento e, não apenas isto, o fazem de um modo
igual ou superior a conteúdos de mídias seculares.

Grandes igrejas como a Internacional da Graça de Deus, Mundial do poder de Deus,


Assembleia de Deus Vitória em Cristo, Igreja Apostólica Plenitude do Trono de Deus, possuem
seus próprios programas televisivos, tanto na TV aberta quanto na fechada. Além de terem
líderes carismáticos como o Pastor Silas Malafaia e o Apóstolo Valdemiro Santiago, que
participam de outros programas como convidados e representantes de suas doutrinas, possuem
elementos midiáticos em seus cultos como grupos de musicais, grupos de dança, momentos de
“libertações e curas” onde a “fé e o poder de Deus” são focalizados em testemunhos de fiéis em
que, através das narrativas clássicas dramatizadas, contam a vida de pessoas que passaram por
inúmeras dificuldades durante a trajetória, mas que o encontro com a igreja mudou suas vidas.

Outras igrejas possuem não apenas programas de TV, como também canais televisivos
onde conseguem apresentar ao público conteúdo inteiro relacionado a fé e a doutrina específica
da detentora da rede e, também, divulgação dos cultos e programações em suas diversas sedes.
A Igreja Adventista com a Rede Novo Tempo, A Igreja Universal do Reino de Deus com a
Rede Record e a própria Igreja Batista da Lagoinha com a Rede Super.
35

Segundo informações do website TV Foco, as igrejas evangélicas ocupam cerca de 20%


da grade de programação dos canais abertos da televisão no Brasil8. Excetuando-se o SBT,
todos os outros canais possuem programas semanais ou diários com conteúdo arrendado para
transmissão de cultos, propagandas, talk shows, de autoajuda, entre outros. O canal que
concentra em maior número de sua grade programações evangélicas é a CNT, que chega a ter
22h diárias de seu conteúdo cedido a programas religiosos, tendo como principal parceiro a
Igreja Universal do Reino de Deus, do Bispo Edir Macedo, que é CEO da Rede Record de
Televisão.

Com o avanço da crise financeira que atinge, inclusive, os meios de comunicação, as


ofertas das igrejas às emissoras que pagam por espaços nas programações semanais se tornam
irrecusáveis, tendo em vista que, para as emissoras, não existe custos de produção e nem pessoal
técnico para e realização de tais conteúdos que chegam finalizados, prontos para serem
exibidos. Soma-se isto ao público que, fidedigno a comunidades cristãs que exibem os
programas, garantem audiência para a grade que beneficia tanto ao canal quanto às igrejas que
preenchem por completo os templos em seus cultos presenciais.

Todos estes exemplos de igrejas possuem variados tipos de doutrinas e ordenanças de


cultos. São de denominações diferentes, a maior parte Neopentecostais. Porém, a grande
similaridade entre elas é a busca incessante pela midiatização de suas marcas e dos seus
“produtos”, a saber, os cultos e tudo o que deles é gerado. Em grande parte, o foco se dá no
lado espiritual e fantástico da experiência com o divino através de curas milagrosas e catarses
coletivas. Há um apelo insurgente pelas expressões culturais e artísticas como modelo de
evangelização e, ao mesmo tempo, exposição da marca. O cenário que se configura é a cultura
do espetáculo, onde os espectadores são, ao mesmo tempo, fiéis e consumidores (PATRIOTA,
2008).

O marketing cultural, a que este texto se propõe a esboçar, existe na medida em que se
infere uma demanda latente que necessita ser atendida e, portanto, gerada um produto que
satisfaça essas tais necessidades ou desejos. A juventude, o target definido pela Igreja Batista
da Lagoinha, ao longo dos anos demonstrou insatisfação que existia em relação ao cenário
religioso protestante (DOLGHIE, 2004). Décadas se passaram desde a chegada das igrejas

8
PECCOLI, Victor. Igrejas ocupam mais de 20% da programação da TV aberta. TV Foco. 2016.
36

protestantes no Brasil, e a liturgia de culto, os dogmas, as programações semanais pareciam


inalterados, seguindo um padrão normativo que datava de um outro século, uma outra sociedade
que não vivia a era da informação, da cibercultura, das pluralidades e descentramentos do ser
humano contemporâneo.

Ademais, as igrejas possuem um costume, ao menos as suburbanas ou de periferias, de


ter sua mão de obra formada basicamente por leigos, pessoas que não dispõem de
conhecimentos profissionais para exercer as funções eclesiásticas, mas, voluntariamente, se
dedicam ao trabalho (DOLGHIE, 2004).

Estas duas demandas foram captadas e analisadas. O jovem carecia de igrejas que
abarcassem a totalidade de si mesmos. Suas contradições, reflexões, desejos e anseios e, até
mesmo, seu estilo de vida. Uma igreja ultrapassada, com cânticos, estudos e pensamentos
retrógrados estava perdendo seu espaço. A secularização que a modernidade trouxe à sociedade
cooptou a igreja em trazer a cultura, costumes e estilos para dentro do seio da comunidade, a
fim de manter o jovem ativo e interessado. A TMI, ou Teologia da Missão Integral, surgiu
também, no Brasil, a fim de que as igrejas e o evangelho pregado por elas abarcassem o
indivíduo em toda sua totalidade e, não apenas, seu aspecto espiritual, mas emocional, físico,
social e cultural. Afinal, “Evangelho todo, para o homem todo, para todos os homens” (STOTT,
1984).

Do lado externo aos muros da igreja, existia bom entretenimento, boas produções
musicais e artísticas, material excelente para a captação de jovens, mas apenas do lado externo.
Dentro da igreja ainda reinava (e, na maioria, ainda reina) o amadorismo e a falta de
comprometimento com a boa execução do que era realizado em termos de liturgia e produções
de todo tipo. A juventude carecia de bons exemplos e profissionais que atuassem dentro da
Eclésia e produzissem, se não melhor, de igual modo ao que era produzido fora. Esta foi a
segunda demanda encontrada.

A insatisfação religiosa dos jovens se fez presente porque, além de não poderem
frequentar lugares comuns a outros de sua faixa etária como bares, danceterias e
shows, as igrejas protestantes não lhes ofereciam oportunidade de entretenimento.
Assim, o jovem cada vez se sentia distanciado da convivência social com grupos de
sua idade. Além disso, o estereótipo de “crente” distanciava-o das igrejas protestantes
históricas e principalmente das pentecostais clássicas, pois sua conduta não se
37

enquadrava na severidade do padrão de comportamento dessas igrejas. Em outras


palavras, para esse tipo de igreja, o roqueiro, ao se “converter” deixaria de ser roqueiro
e passaria a ser crente, cristão ou protestante. (DOLGHIE, 2004, p. 210).

Algumas igrejas no cenário brasileiro conseguiram enxergar que existia essa demanda
e reformularam suas atividades e modos litúrgicos a fim de integrar essa parcela do público em
seus templos, uma vez que não se encaixavam em outras praças. A igreja Renascer em Cristo,
que originou o grupo musical Renascer Praise, um dos percussores da música gospel, a Igreja
Batista Betania, uma das grandes defensoras da Teologia da Missão Integral no Rio de Janeiro
e outras duas mais recentes, a Igreja United e a Bola de Neve Church que adequaram totalmente,
desde seus cultos até seus templos, a fim de atrair os jovens com grande profissionalismo
artístico e programações inteiramente voltadas para este público.

Assim como existem os mercados de nichos, alguns ministros encontraram um


segmento ideal para igrejas que querem se inserir no mundo contemporâneo e encher seus
templos. O foco nos jovens como público-alvo exigiu dessas igrejas toda uma reformulação no
quadro de líderes ministeriais, nas programações pela semana, nos recursos tecnológicos e
midiáticos, com maior interação nas redes sociais, e modos diferenciados de pregar a bíblia para
as pessoas não inseridas na igreja, além de uma maior integração com outros grupos religiosos
e cristãos. Sem nenhum tipo de acanhamento, as igrejas se renderam ao marketing, em todo seu
potencial.

3.2 DEFINIÇÕES DE MARKETING E MARKETING CULTURAL.

Ainda nos dias atuais, seja no meio acadêmico ou no senso comum, ainda se tem uma
visão muito equivocada do que seja marketing. Frequentemente, é confundido com a
propaganda de um produto ou até mesmo com a promoção, que é um dos 4 P’s do marketing.
Esse erro comumente acontece devido à grande importância que é atribuída à divulgação ou
promulgação de um produto ou marca como sendo o fator diferencial para uma empresa crescer
e se destacar no meio de tantas outras. Serão necessárias algumas definições do que seja
Marketing, de acordo com especialistas no assunto, para podermos abordar suas ramificações
e sua aplicação no meio cultural:

 Marketing são as atividades sistemáticas de uma organização humana voltadas à busca


38

e realização de trocas para com o seu meio ambiente, visando benefícios específicos
(RICHERS, 1986).

 Marketing é uma função organizacional e um conjunto de processos que envolvem a


criação, a comunicação e a entrega de valor para os clientes, bem como a administração
do relacionamento com eles, de modo que beneficie a organização e seu público
interessado. (AMA - American Marketing Association - Nova definição de 2005).

 Marketing é um processo social por meio do qual pessoas e grupos de pessoas obtêm
aquilo de que necessitam e o que desejam com a criação, oferta e livre negociação de
produtos e serviços de valor com outros (KOTLER e KELLER, 2006).

Com base nestas e outra definições, podemos concluir que o Marketing vai além da
atuação em apenas uma parte do processo, qual seja a publicidade, e atua em todas as etapas do
processo no ciclo mercadológico de um produto. Desde sua concepção e criação até o retorno
do cliente sobre sua satisfação ou não, podendo colher informações úteis para um
aprimoramento futuro.

Algumas características são intrísecas à aplicação do marketing numa empresa. Ele é


baseado em relações de troca com o consumidor ou cliente. Sempre haverá um produto (seja
ele de variados tipos como serviços, eventos, expriências etc) que lhe será atribuído um valor
( seja ele financeiro, algum outro produto, um valor simbólico etc) pela empresa que o produz.
Nesta relação de troca, o consumidor é o destinatário deste produto e avalia o seu valor de
acordo com suas condições próprias e, assim, efetua ou não a troca. Para um contínuo crescente
de vendas deste referido produto, se faz necessário que a troca seja com em um cenário onde
ambas as partes tenham satisfação como resultado. Isso permitirá um feedback para o
aprimoramento do produto, também a fidelização deste cliente, podendo ser, inclusive, um
grande divulgador da empresa. Isso é fundamental para a definição de marketing, partir das
necessidades e desejos dos consumidores.

O marketing também procura alcançar objetivos específicos da empresa, seja um


aumento nas vendas, um relacionamento mais próximo com o consumidor, um recolocamento
no mercado ou simplesmente uma maior divulgação do produto. Ele sempre será aplicado na
empresa de acordo com os seus objetivos a curto e longo prazo, primando sempre por um bom
39

planejamento.

Assim como o termo Marketing já propõe, se refere a ação da empresa no mercado.


Portanto, os profissionais desta área procuram sempre alinhar sua produção com as novas
tendências, os novos hábitos de consumo, e tudo que se refere ao produto em relação ao seu
público-alvo. Ferramentas muitos eficazes são as pesquisas de público e o retorno do cliente
sobre sua experiência com a marca.

Todas estas definições e características do marketing estão presentes e podem ser


plenamente aplicadas na área da cultura, ainda que, também nesta área, existam equívocos em
relação a suas variadas formas de aplicação.

Marketing da Cultura

Assim como descrito anteriormente, o marketing pode ser aplicado em diversas formas
e modelos de negócios e com a cultura a situação não é diferente. Seja através de empresas que
o produto final esteja inserido no que podemos denominar “indústria cultural” ou as próprias
artes, seja um espetáculo de dança, um álbum de música, uma minissérie para a televisão etc.
O mesmo acontece com empresas que obtém seus lucros de outros tipos de produtos como a
indústria e o comércio e encontram na cultura um vislumbre de aumento da exposição da marca
e perspectiva de crescimento.

A percepção de que a cultura é um grande expoente da economia de um país não é mais


intangível como há muitos anos atrás. Em 2017, o Ministério da Cultura lançou um estudo
denominado “Atlas econômico da Cultura Brasileira” em que se fez uma análise de que, até o
ano de 2010, a cultura representava cerca de 4% do PIB do Brasil9. Segundo Roberto Freire,
Ministro da Cultura à época, este estudo visava alertar, não somente a população, mas,
principalmente, o governo, sobre a importância dos investimentos e de um olhar especial sobre
o desenvolvimento da cultura não apenas como dimensão simbólica de um povo, mas como
geradora de riquezas.

9
BOCCHINI, Bruno. Ministério estima que a cultura é responsável por 4% do PIB. Agência Brasil EBC. 2017.
40

O fato de termos a dimensão econômica da cultura pouco contabilizada leva a certa


descrença do próprio governo de que o setor tenha um grande impacto econômico. O
Atlas vai mostrar o quanto do que se produz de riqueza vem da área cultural, o que
levará à conscientização do governo de que, em vez de se cortar recursos da cultura
em um momento de crise, é importante fazer o contrário: investir em cultura para
movimentar a economia e fazê-la crescer.
(MASSALI, Agencia Brasil EBC, 2017)

Apesar de se verificar a importância da cultura para o desenvolvimento do país e que o


Marketing Cultural desponta como uma alternativa econômica e social viável para nossos
tempos, ainda se tem uma visão equivocada de que os investimentos em cultura e que a própria
utilização do marketing se restringiria a práticas de subvenção fiscal. Através das leis de
incentivo, sejam as do âmbito Federal, Estadual e Municipal, os pequenos produtores de cultura
e as grandes empresas interessadas em abatimento do seu imposto de renda revertido em
execução de um projeto cultural têm encontrado um caminho para alcançarem seus objetivos.
Porém, é imprenscindível que se frise que este não é o único caminho. O fato da Cultura já
representar mais de 4% do PIB é suficiente para concluirmos que existe um campo de atuação
muito mais vasto do que apenas subvenção governamental para apoio da cultura e das artes.

Com o objetivo de traçar um panorama da aplicação do Marketing Cultural no Brasil,


se faz necessário diferenciar as suas duas formas principais: Marketing Cultural de Fim e
Marketing Cultural de Meio. Para isto, usaremos aqui as definições de Manoel Marcondes em
seu livro Marketing Cultural: das práticas à teoria. (Note-se aqui que o autor aponta quatro
diferentes tipos de Marketing Cultural: Os dois acima citados, o M.C Misto e o M.C de Agente.
Apenas foram suprimidos a fim de serem atingidos os objetivos propostos pelo texto)

Marketing Cultural de Fim

A primeira instância é a da organização cuja missão ou fim seja a promoção ou a difusão


da cultura. Essa organização – pública ou privada – buscará viabilização financeira para
41

projetos artístico-culturais de diversas formas e esse processo de, por exemplo, desenvolver
uma mostra de arte, estabelecer sua forma de comercialização (que pode ser via cobrança de
ingressos ou captação de recursos de patrocínio ou, ainda, a venda ou leilão), lançá-la e divulgá-
la é um processo típico de marketing, e pelos seus fins, de marketing cultural.

Marketing Cultural de Meio

A segunda instância é a da empresa que patrocina arte e cultura, empresa cujos fins de
negócios não são a promoção ou a difusão culturais, e sim, a produção industrial, a atividade
comercial ou a prestação de serviços. Essa modalidade se dá quando essa empresa, no âmbito
da sua função marketing decide adotar a atividade de marketing cultural como meio de
promoção institucional.

Como nosso objeto de estudo, as igrejas evangélicas, mais especificamente a Igreja


Batista da Lagoinha, realizam, através de seus cultos e suas programações semanais estes dois
tipos de Marketing Cultural. Além da própria instituição ser uma difusora de cultura, tendo em
vista que a religião é parte constituinte de qualquer cultura, ela também incentiva, seja dentro
de seu templo ou em outros espaços pela cidade, projetos e programações culturais. Cabe
destacar que, como salientado anteriormente, a Igreja não se utiliza de leis de incentivo a cultura
com a Lei Rouanet ou a Lei do Audivisual, ambas da esfera Federal, mas possui benefício fiscal
pelo fato de ser uma igreja. Além de colocar como medida de parâmetro para outras igrejas que
desejam realizar atividades-fim desse mesmo segmento, ela serve como um modelo de
gerenciamento da marca e de seu marketing para outras empresas.

3.3 Conflitos e Crítica à Igreja Pós-moderna

Antes que façamos introdução ao estudo de caso da Igreja da Lagoinha, de fato,


necessitamos, por caráter de análise, verificar algumas críticas que são direcionadas, não apenas
a esta igreja, mas a qualquer outra, que estejam aderindo à prática do Marketing e quebrando
paradigmas da liturgia convencional e introduzindo práticas culturais e artísticas, muito
relacionadas ao entretenimento e ao espetáculo, gerando, assim, cismas relacionais dentro da
42

própria doutrina e no seio evangélico. Embora muitas destas práticas não estejam esboçadas no
escopo doutrinário que rege as denominações, qualquer prática de culto que se aproxime mais
do entretenimento e se distancie do “sagrado” acaba por ser rejeitado pelas alas mais
tradicionalistas da fé, no qual se encontram os batistas.

Tais críticas, porém, não serão de cunho teológico, haja vista que não é o objetivo central
deste estudo analisar se o marketing ou a produção cultural tem respaldo nas sagradas escrituras
para que sejam, legitimamente, aceitas e integradas ao contexto religioso. Tende-se, porém, a
uma certa noção de que determinadas crenças são apenas costumes e que podem variar de
acordo com o lugar ou o tempo onde a comunidade religiosa se insere. O tipo de vestimenta, os
horários, as programações extras, os cargos ministeriais e etc, nada destas e outras práticas tem
suas informações contidas e exemplificadas no texto bíblico e, portanto, se detém ao encargo
de seus fiéis decidirem sobre isto.

3.3.1 “O marketing não parece ser uma prática bíblica” (BARNA, 1994)

Como já exposto neste texto, um dos maiores motivos pelos quais a igreja ainda se vê
distante de qualquer profissionalização de seus esforços ministeriais seja a de que o marketing,
enquanto método, não seria válido para a igreja, tendo em vista que se aplica ao mundo dos
negócios, com a prática do lucro e estratagemas para atrair o “cliente”.

George Barna, já na década de 90, recebia essas indagações e críticas pelo seu ofício. O
fato, precisamente, de auxiliar a igreja em seu crescimento e expansão utilizando ferramentas e
técnicas de marketing beirava à “blasfêmia” (BARNA, 1994). Como observado em algumas
igrejas, alguns destes conceitos já foram ultrapassados, pelo menos em uma pequena parcela
que já tem um nível de profissionalização maior. Possuem departamentos de marketing e de
produção que auxiliam no planejamento estratégico e em todas as ferramentas e recursos que
ajudarão na expansão e promoção da igreja. Muitas são as que produzem conteúdo para internet,
para televisão, rádio, jornal, revista, e que possuem entendimento que a expansão não se
concretiza a não ser através do marketing.

Barna esclarece, portanto, em primeiro lugar que é necessário entender a igreja como
sendo um negócio:
43

Ora, o pastor comum é preparado somente em matéria relacionadas com a religião; no


entanto, ao assumir a direção de uma igreja, está sendo chamado a dirigir um negócio!
É bem verdade que esse negócio se trata de uma organização com fins não lucrativos,
mas nem por isso deixa de ser um negócio. O negócio a que a igreja se dedica é o
ministério: buscar pessoas que necessitam do dom de aceitação, perdão e vida eterna,
dispostas a conhecer Jesus Cristo. E para que cada igreja local seja um negócio bem
sucedido, ela tem que causar impacto sobre um segmento cada vez maior da sua área
de mercado. (BARNA, 1994, p.14).

O autor também se debruça sobre o fato de que, ainda que a igreja acredite que o
marketing não seja uma disciplina válida para as questões do sagrado e da religião, ela, mesmo
sem se aperceber disto, realiza ações de marketing:

Pense por um minuto na sua experiência. Quando você compartilha a sua fé com quem
não crê, está, na verdade, fazendo marketing da igreja. Quando anuncia ou informa às
pessoas sobre as atividades da sua igreja, está praticando marketing da igreja. Se na
frente da sua igreja há um aviso indicando o horário dos cultos, da escola dominical,
ou o título do próximo sermão, você está sendo alcançado pelo marketing. Toda vez
que o seu pastor aceita um convite para dar benção numa reunião pública, embora
tenha sido convidado dentro dos propósitos do ministério, sua presença e desempenho
ali representam uma atividade de marketing. (BARNA 1994, p. 16).

Martin Lindstrom, em seu livro “Brand Sense”, retrata também, agora em uma crítica
com um lugar de fala externo à igreja, como se percebe o marketing dentro de uma instituição
religiosa:

Nosso estudo também buscou determinar até que ponto o fator religioso (fé, crença,
pertencimento e comunidade) pode servir para orientar o futuro do branding. À
primeira vista, religião e marcas podem parecer distantes, quase a ponto do insulto.
Mas serão mesmo? Visite qualquer igreja e, mesmo antes de entrar, a primeira coisa
que você vai ver é um ataque sensorial de corpo inteiro. (LINDSTROM, 2012, p. 5-
6).

3.3.2 “É hora do show”


44

Uma outra crítica comum à utilização do marketing cultural dentro das igrejas é a de
que o culto ou as programações religiosas estejam dando espaço ao entretenimento puro e
simples e a mensagem tenha sido renegada em favor do meio. Diferente da utilização dos meios
tecnológicos e das práticas artísticas como a ênfase na música, no teatro e programações extras
para se veicular a mensagem da bíblia e “evangelizar”, a rejeição a esses métodos estejam,
talvez, no fato de que a igreja tenha se tornado uma “casa de espetáculos”, como afirma Patriota:

Recursos comuns aos espetáculos são usados para tornar a mensagem religiosa mais
atrativa e, consequentemente, mais superficial, ilustradas com histórias de vida e
testemunhos emocionais permeados de elementos cinematográficos e novelescos que
objetivam a construção de novas perspectivas para a antiga mensagem: é a hora do
entretenimento. (PATRIOTA, 2008, Pg. 72).

Segundo Patriota, as igrejas de hoje que se utilizam dos meios de comunicação e mídia
transformaram seus cultos e eventos em shows e espetáculos e que, embora haja um
distanciamento histórico entre o que é sagrado do entretenimento, a tendência é que esses
fatores cada vez mais se atravessem e formem um novo gênero de experiência religiosa.

A transformação que estas agências religiosas executam em converter “fiéis em


consumidores” (PATRIOTA, 2008) é a mais contundente. Para ela, o discurso religioso,
entremeado da caracterização espetacular da mensagem torna o conteúdo superficial e de fácil
digestão, desprezando, assim, uma marca fundamental das igrejas que é o estudo aprofundado
da bíblia e dos textos religiosos e um pensamento crítico a respeito da vida espiritual e sua
relação com o mundo como um todo:

Com efeito, na gangorra oscilante dos níveis do Ibope, vão se apartando da mensagem
religiosa ícones até então intocáveis, como a teologia. A superficialidade agora é o
principal tempero do discurso religioso espetacular, como qualquer discurso ficcional
divertido. Afinal, como a teologia é algo racional, que exige reflexão intelectual, não
se ajusta no entretenimento. As pessoas buscam na religião a experiência religiosa, o
transe, o êxtase, o espetáculo e não a doutrina. (PATRIOTA, 2008, p.80).
45

3.3.3 “Faça-se tudo decentemente e com ordem” (Jornal Batista, 20 de


novembro de 1958 apud MOREIRA, 2016, p. 50).

Para finalizar, a terceira e última crítica realizada se detém sobre o aspecto doutrinário
em que se insere a Igreja Batista da Lagoinha. Ainda que distante das outras igrejas da mesma
ordem doutrinária, ela se insere em um cenário Batista que preza por certos costumes e
tradicionalismos que são, por caráter reflexivo, deixados de lado em prol de uma ótica bíblica
diferente das demais.

As igrejas batistas em cenário brasileiro são comumente conhecidas pelo seu apreço à
história de seus fundadores, sua doutrina reta e baseada apenas nas escrituras e pelo seu zelo na
leitura da bíblia. Por ser uma organização histórica “pode-se inferir que a tradição é de suma
importância para setores batistas, por invocarem para si e tomarem como sua a herança da igreja
primitiva. ” (MOREIRA, 2016, p. 44).

Diferentemente das igrejas batistas que prezam pela sua tradição, existem aquelas que
passam por renovações em sua doutrina e na liturgia, como é o caso da Lagoinha. Assim como
qualquer outra, ela sofre duras críticas por se identificar como pertencente à ordem batista, mas
seguir interpretações da bíblia e inserir dentro de seus cultos e missões práticas totalmente
diferentes do usual, tornando-a um símbolo de um movimento batista carismático.

Para os Batistas tradicionais, tudo deve ser feito com “ordem e decência”, como já
aponta o texto bíblico (1 Coríntios 14:40). A racionalidade e o domínio próprio são marcas
características desta doutrina e são cultivadas em seus membros. A crítica realizada a esse
movimento de renovação é a de “darem primazia à experiência religiosa em vez da fidelidade
doutrinária, aqueles devolvem a acusação alegando que a falta dessa experiência afeta os
resultados da leitura da bíblia” (MENDONÇA; VELAZQUES FILHO, apud MOREIRA, 2016,
p. 46).

Em suma, a crítica se dá no ponto em que as igrejas pós-modernas têm posto a doutrina


e os ensinos bíblicos em segundo plano e colocado ênfase no ser humano, em suas escolhas e
experiências próprias, objetivando uma comunhão com o transcendental mais sobrenatural e
menos dogmática e racionalizada. O apelo se faz ao sensorial e à integralização do ser humano
46

por completo, em todas as suas esferas. Não se tarda a criticar a igreja como antropocêntrica ao
destacar o humano como o centro da fé.

Para finalizar, cabe aqui uma inserção de um trecho de um texto, de mesmo nome que
este tópico, escrito para Jornal Batista, datado de 20 de novembro de 1958 em que o escritor
Francisco Souza tecia duras críticas ao movimento carismático que se proliferava já naquela
época:

As suas reuniões se caracterizavam pela serenidade – nada de balbúrdia, chiliques,


pulos, confissões de pecados, abraços, apertos de mão, choro, risos, e cânticos ao
mesmo tempo {...}
Dizer-se que não há limites para a manifestação do Espírito Santo, é proclamar uma
verdade que todos nós conhecemos e aceitamos, mas que são gritarias as modalidades
de sua manifestação e aceitamos, mas que são reverência, de vez que a perturbação
nunca foi o meio usado por Deus para Sua operança. Isso é próprio do baixo
espiritismo, com seus espíritos baixando em sessões; do pentecostismo, com suas
confusões de línguas; do candoblecismo, com seus pais de santos e suas mães de
terreiros. Com o cristianismo nunca, Nunca!
{...} é lamentável tal emocionalismo! Pretender alguém aproximar-se de Deus por
meio de batuques e de algazarras, é não respeitar a santidade daquele que é o supremo
Ser espiritual. É faltar-lhe com as devidas honras. É assemelhá-lo a qualquer pecador
porque só entre os pecadores há falta de serenidade e de paz. Posso calcular a ira de
Deus por tão vultosas afrontas. Mas Ele é excessivamente bondoso para perdoar aos
que não sabem o que fazem. As igrejas batistas devem estar alerta com essa nova
modalidade de avivamentos, que não é outra coisa senão uma confirmação e
continuação dos princípios da Assembleia de Deus com uma boa dose de espiritismo.
(SOUZA, 1958, apud MOREIRA, 2016, Pg. 50).

Este trecho retrata bem a mentalidade rigorosa com a ordem e discriminatória deste setor com
relação a outras manifestações religiosas em meados do Século XX. Apesar desta mentalidade,
no geral, ter se modificado ao longo dos anos e ter-se aberto ao diálogo com outros organismos
religiosos, este fundamentalismo religioso e severo com o ritual de culto ainda permanecem.
47

4 ESTUDO DE CASO: IGREJA BATISTA LAGOINHA – NITERÓI/RJ.

4.1 BREVE HISTÓRICO DA IBL DE NITERÓI.

Em julho do ano de 2013, nascia, formalmente, a Igreja Batista da Lagoinha em Niterói


(que daqui por diante será descrita pela sigla IBL), que, até aquele momento, era a primeira
filial da igreja a ser erigida fora de Belo Horizonte, em Minas Gerais. O que havia começado
em reuniões semanais na casa dos líderes, os pastores Felippe Valadão e Mariana Valadão, aos
poucos se tornou pequeno para abrigar tantas pessoas que se aglomeravam em busca de um
outro modelo doutrinário. Não por um acaso. A Pastora Mariana Valadão, filha do líder da IBL
Pastor Márcio Valadão e irmã de Ana Paula Valadão e André Valadão, cantores do movimento
gospel e fundadores do “Ministério Diante do trono”, já era, naquele momento, conhecida
nacionalmente, assim como seu esposo, que recebera o sobrenome da família.

Inaugurada na Rua Miguel de Frias, em Icaraí, a IBL de Niterói já demonstrava quais


seriam as suas marcas ao longo de sua pequena história em território fluminense. Em dois cultos
inaugurais, ambos com lotação máxima, a igreja iniciou seus trabalhos já com sua visão
estabelecida, como afirmou o Pastor Felippe: “Quebrei tudo, pintei de preto… eu já queria fazer
algo diferente; Sou muito influenciado por igrejas americanas e nos Estados Unidos elas são
assim para tirar aquela aparência de templo. A gente não tem uma estética religiosa.”. Além da
estética definida, Felippe também disse qual seria o foco principal da evangelização “Eu
acredito que o que impulsiona o crescimento de uma igreja é a juventude”. Esta afirmação será
de extrema importância para analisar o perfil do público alvo ao qual o marketing cultural,
adotado pela igreja, será direcionado, através de sua ênfase na cultura “gospel jovem”.

Um ano após sua inauguração, a IBL mudou-se novamente. Localizada, agora, em


Charitas, o espaço comporta 2.000 pessoas sentadas, estacionamento, prédio anexo para
atividades infantis e reuniões, lounge e toda tecnologia disponível em som e imagem para os
frequentadores10. Construída onde antes funcionaram duas famosas boates da cidade, a igreja
estampou os jornais e revistas de toda a cidade pelo seu caráter festivo e com “jeito de boate”,
revisitando seus antigos domínios. Sempre com grandes eventos como shows, conferências,
palestras e cultos temáticos, a IBL foi se tornando conhecida e expandindo a marca pelo Estado

10
SOSSAI, Raissa. Lagoinha Niterói comemora um ano em novo templo. Lagoinha.com.2014.
48

do Rio de Janeiro que hoje conta com filiais em Cabo Frio, Teresópolis e na cidade do Rio, na
Barra da Tijuca.

Tendo como logo uma pomba (conforme pode ser visto na Figura 1 abaixo), que
representa a descida do espírito santo sobre os homens e com o nome “Lagoinha” (que remete
ao bairro de Lagoinha, em Belo Horizonte, onde foi fundada a sede) sendo utilizado com uma
tipografia escrita à mão, que remete a uma história sendo escrita, a IBL de Niterói tem como
slogan “Um lugar de novos começos”. Novos começos que remetem, principalmente, a pessoas
que estavam inseridas em alguma igreja ou instituição religiosa e, que por alguma razão,
abandonaram esse lugar. Para estas pessoas, seria uma nova chance de recomeçar do zero.

No que se refere ao marketing, a igreja se antecipa a qualquer estereotipização e histórias


que possam, eventualmente, ser anexadas a sua marca. Ela mesma, através de seus canais
midiáticos e os discursos de seus líderes, formula sua própria história e seus mitos que serão
repassados através de seus membros para quaisquer outros que tenham o intuito de conhecê-la.
Esta prática evita que falsas histórias e uma impressão equivocada da marca seja perpetuada, o
que forçaria a igreja a envidar esforços para contestar as narrativas.

Figura 1 – Logo Lagoinha


Fonte: (http://jornal-rioniteroinoticias.blogspot.com.br/2013/12/domingo-tem-santa-ceia-na-igreja.html).
Acessado em: 12 de Jun. 2018.
49

.
A IBL de Niterói também tem esboçado qual a sua missão como igreja11:

 Um lugar de novos começos


 Alcançar a todos, independentemente de raça, cor, religião, classe social
 Ser uma porta aberta ao pecador e capacitar o cristão para fluir em seu dom,
chamado e encontrar seu propósito
 Causar relevância e impacto na sociedade

A partir destes pilares estabelecidos pela igreja, há de se considerar os esforços


envidados por ela no intuito de resgatar e incluir o máximo possível de pessoas em seu templo
e suas atividades, sendo o seu target jovens de até 25 anos, de classe média alta, fato notável
pelo lugar no qual a igreja se insere. Além das atividades, que serão mais à frente elencadas e
examinadas, existe uma programação semanal fixa de reuniões e encontros, tanto dentro quanto
fora da igreja:

Cultos e Reuniões

DOMINGO
 10H30
 18H
 20H30

TERÇA
 20H – Culto Fé

QUARTA
 PRAY – 20H (Culto de oração)

QUINTA

11
Lagoinha.com.2014
50

 CULTO PINK (Cultos voltados às mulheres que acontecem uma vez ao mês).

SEXTA
 GC A PARTIR DAS 20H (Grupos de Células, reúnem-se em casas).

SÁBADO
 NEXTEEN (Culto de Adolescentes) – 19H
 NEXT (Culto da Juventude) – 20H

4.2 ANÁLISE DA PROGRAMAÇÃO CULTURAL

Em consonância com o seu tempo, a IBL tem por propósito criar um novo formato de
cultura gospel existente hoje no Brasil. Baseado no que se conhece pelo termo “evangélico” na
atualidade, a igreja tenta transgredir com os estereótipos e padronizações, como o Pastor
Felippe Valadão prega.

O que se conhece por membros de igrejas evangélicas hoje se refere a não liberdade de
conhecer e apreciar os prazeres seculares, se abdicar de certos eventos e dedicar-se inteiramente
à instituição, que vai inteiramente na contramão do sujeito contemporâneo esboçado no capítulo
2, no qual a liberdade de agir e a constante mudança de opiniões e atitudes não se encaixa mais
nesse padrão de cristianismo e, a IBL tem, por princípio, ultrapassar todas estas barreiras
impostas pelo próprio meio evangélico como também fazem outras igrejas, como as já citadas,
todas elas a seu modo e perfil de atuação.

A IBL de Niterói expande seus conceitos de liberdade e do que é ser evangélico e leva,
para dentro do seu templo, atividades que antes eram analisadas pelo prisma da secularização,
marca, já destacada neste texto, da relação entre o indivíduo e a religiosidade, A igreja entendeu
que, no mundo pós-moderno e plural, não existe a possibilidade de enxergar a cultura gospel
de uma só maneira e, sim, de múltiplas formas e ela provoca e propõe a seus membros que
invistam em sua diversidade e a não restrição de suas vontades por um julgamento do meio.

Tendo na produção cultural uma maneira de solucionar estes entraves de caráter


sociológico, mais do que doutrinário, a IBL de Niterói produz e recebe eventos que ampliem os
51

horizontes de seus fiéis e lhes proporcione novos modos de vivenciar a fé cristã. Ao mesmo
passo que, por se distanciar, positivamente, de outras instituições de mesmo viés doutrinário,
ela se destaca e atrai seguidores de diversas denominações. Abaixo, seguem alguns de seus
eventos e produções culturais:

Conferência Creative

A conferência estreia sua segunda edição no ano de 2018, em dois dias de junho,
trazendo uma programação extensa com palestras e workshops com grandes nomes da indústria
da economia criativa tais como a música, teatro, fotografia, cinema etc.

A conferência alterna momentos de palestras, onde os profissionais partilham das suas


experiências em diversas áreas da indústria criativa como as dificuldades de inserção, a relação
entre a fé e o trabalho e instruções para se ter uma carreira bem sucedida, com momentos de
workshops onde os palestrantes podem partilhar, mais particularmente, suas experiências e
aprendizado com os participantes, compostos majoritariamente por adolescentes e jovens até
25 anos que ainda buscam sua inserção no mercado de trabalho e têm dúvidas sobre qual
carreira seguir e os entraves decorridos dessas escolhas.

A primeira edição, gratuita, reuniu centenas de pessoas do Brasil inteiro em um único


dia no templo da IBL. Nesta segunda, foram programados dois dias tendo mais atrações e nomes
da criatividade, sendo o evento, neste ano, pago.

O grande diferencial dessa conferência é a reunião de grandes profissionais da indústria


criativa, com carreiras de sucesso, que partilham da mesma fé que os membros da igreja, aliando
assim carreira profissional e religião.
52

Figura 2 – Divulgação Creative 2017.


Fonte: (https://allevents.in/niter%C3%B3i/creative-17/1708168545868968). Acessado em 12 de Jun. 2018.

Shows e gravações de DVD’s

A IBL tem também uma estreita relação com o cenário da música gospel, não apenas
nacional, como também internacional. Em seu púlpito, diversos cantores e músicos já puderam
se apresentar e, inclusive, gravar seus DVD’s, como o caso dos cantores Thalles Roberto,
Anderson Freire, Gabriela Rocha e tantos outros.

Não apenas em seu templo, a igreja também aluga espaços como bares e restaurantes
pela cidade onde os cantores podem se apresentar e alcançar camadas da população que
geralmente não têm o hábito de frequentar cultos, como o caso do cantor Marcus Almeida que
se apresentou em um famoso bar na praia de São Francisco, em Niterói. Esta estratégia se torna
eficaz pelo fato de alcançar, não apenas pessoas que já são cristãs e tem o hábito de frequentar
igrejas, mas também, pessoas que estejam nesses locais por outros motivos e sejam alcançadas
por estes eventos e atraídas a visitar o templo da IBL.

Pelo fato de a IBL ter se popularizado entre os cristãos pelo seu viés artístico e musical,
tendo em vista o Ministério “Diante do trono”, a comunidade se tornou referência nesse campo
e possui grande influência entre as gravadoras e os próprios cantores, tendo facilitado a
53

produção destes grandes eventos que em geral, com suas pequenas exceções, são gratuitas ao
público.

Figura 3 – Gravação do DVD Gabriela Rocha para mais de 2 mil pessoas.


Fonte: (https://allevents.in/niter%C3%B3i/creative-17/1708168545868968). Acessado em 12 de Jun. 2018.

Festival de FoodTruck

Seguindo o conceito da Teologia da Missão Integral, defendido pela igreja, a IBL


recorrentemente apoia e produz eventos que, em princípio, não tem uma conexão rápida com a
doutrina cristã ou evangelismo propriamente. Estes eventos têm o intuito de proporcionar lazer
e entretenimento para os seus membros além de fazer uma segmentação de mercado para atrair
diversos perfis de possíveis membros. O objetivo é proporcionar uma alternativa para os jovens,
da região de Charitas e outros bairros próximos, e que não possuem o hábito de frequentar
cultos de igrejas evangélicas, aumentando assim o poder de atração da sua marca, através da
diferenciação de outras igrejas com o que é ofertado ao público, além de adentrar camadas
diversas da população jovem.

Através da gastronomia, a IBL reúne centenas de pessoas, todos os anos, no espaço do


estacionamento, podendo proporcionar alta gastronomia e uma vista privilegiada da praia de
54

Charitas. Cabe ressaltar que a IBL produziu o primeiro festival de food truck da cidade de
Niterói, com entrada totalmente gratuita.

Figura 4 – Festival FoodTruck 2016.


Fonte:(https://www.facebook.com/LagoinhaNiteroi/photos/gm.570576713093315/439559206168711/?type=3&t
heater). Acessado em 12 de Jun. 2018.

Viradão de Ano novo

Como por costume, as igrejas evangélicas, e insere-se aqui a referência maior aos
batistas, costumam festejar a virada de cada ano em suas igrejas com programas que começam
antes da meia noite e terminam durante a madrugada. Nestes cultos, são realizados diversos
batismos, inclusive de pessoas que não pertencem a igreja, a santa ceia é celebrada e no final
do culto, normalmente, há uma ceia para todos os membros e visitantes participarem juntos,
além de uma festa de encerramento.

Desde seu início, a IBL se programou para estar sempre inovando em seus cultos de
Reveillon, que já teve sua edição dentro de seu templo, uma outra realizada na praia de Icaraí,
onde houve shows de diversos cantores gospel como Eli Soares e a banda Preto no Branco,
tendo seu término com queima de fogos de artifício. No ano passado, a comemoração foi
produzida no Ginásio Caio Martins em Santa Rosa, Niterói, onde, além das atrações de outros
“viradões”, houve também um festival de food truck antes do início do culto. Segundo
55

informações da Prefeitura de Niterói12, o ginásio comportou, nesta festa, 6.000 pessoas e que
ele não apresentava estes números há 30 anos. E o objetivo da igreja é estar sempre fazendo
festas e comemorações ainda maiores. Assim como na realização das feiras gastronômicas, a
festa de Reveillon da IBL de Niterói já faz parte do calendário anual da cidade e é uma
alternativa cultural, mais até do que religiosa, para a população, que permite uma divulgação
de seus cultos durante estes eventos.

Figura 5 – Viradão Lagoinha Niterói 2017-18.


Fonte:(https://www.facebook.com/LagoinhaNiteroi/photos/a.233720070085960.1073741826.233713473419953/
810398105751484/?type=3&theater). Acessado em 12 de Jun. 2018.

Conferências e palestras

A exemplo da Conferência Creative, a IBL tem, no calendário de programações anuais,


diversas conferências e palestras, nos quais são abordados temas referentes a pontos religiosos
ou espirituais como questões relacionados a vida cotidiana como família, trabalho, sexualidade
entre outros.

12
Facebook Lagoinha Niterói. 2018.
56

Um grande objetivo da Lagoinha é poder produzir, e ter em suas programações, eventos


que possam trabalhar o ser humano por completo e que os seus membros consigam, através da
igreja, obter todas as fontes de informação e entretenimento, não necessitando de recursos
externos à igreja, demonstrando assim, a capacidade do movimento gospel de produzir, não
apenas, conteúdo religioso, mas também, entretenimento e conteúdo intelectual, sempre
alinhado com a doutrina cristã.

Redes Sociais

Assim como qualquer empresa que quer expandir os seus negócios e criar um veículo
de comunicação mais próximo com seus clientes, além de propagar a sua marca, a IBL faz uso
de diversas redes sociais, onde comunica sobre os seus eventos futuros, publica fotos dos seus
cultos e programações externas, além de efetuar a venda de tickets para seus eventos pagos.

Além desta comunicação efetiva com seus membros e visitantes, a IBL utiliza as redes
sociais como meio de produção de conteúdo audiovisual, gráfico e fotográfico. Através das suas
contas no Instagram e no Facebook, o material é publicado, demonstrando um minucioso
trabalho de seleção e produção desses conteúdos, trabalho realizado pelo Departamento de
Produção da IBL que além das redes sociais, faz a produção dos eventos e dos cultos.
57

Figura 6 – Instagram Lagoinha Niterói.


Fonte: (https://www.instagram.com/igrejalagoinhaniteroi/?hl=pt-br). Acessado em 15 de Jun. 2018.

Next e Nexteen

Praticamente, todas as igrejas evangélicas de médio a grande porte possuem ministérios


de jovens e de adolescentes. Com a IBL de Niterói, não poderia ser de outra maneira, tendo em
vista que esse público é o maior foco de evangelismo e de força motriz da igreja.

Respectivamente, o Next (Ministério de jovens) e Nexteen (ministério de adolescentes)


possuem seus cultos aos sábados, como consta na programação divulgada da igreja, e se reúnem
em “Grupos de Células” (são chamados assim os pequenos grupos, compostos de membros da
igreja e visitantes, que se reúnem em casas para realizarem cultos com as pessoas que moram
em residências próximas. Essa reuniões costumam ter o foco evangelístico, para atrair futuros
membros que ainda não decidiram visitar o templo da igreja, e também de comunhão entre os
já membros, tendo em vista que a IBL possui centenas de fiéis) durante a semana para
realizarem seus cultos juntos e se conhecerem melhor.

A IBL é reconhecida por ser uma igreja onde os jovens têm a possibilidade de atuar em
diversas áreas e isso é bem notável nos cultos e nas programações, onde podem ser observados
jovens em praticamente todos os departamentos, tornando tanto a linguagem como o formato
dos eventos bem mais despojado e moderno (ou pós-moderno, se é que cabe).

Além de atuarem em diversos cargos e departamentos da igreja, esses ministérios atuam


na produção e realização de diversos eventos da IBL como shows, acampamentos, festas, peças
teatrais e musicais, sessões de cinema, conteúdo audiovisual e muitos outros. Como o enfoque
da IBL desde o início é na juventude, os jovens e adolescentes aparecem como a “comissão de
frente” da igreja, ditando o ritmo e a linguagem adotados em seus eventos.
58

Figura 7 – Summer Camp – Acampamento dos jovens.


Fonte: (https://www.youtube.com/watch?v=F-0Bkj-rIPE). Acessado em 15 de Jun. 2018.

Figura 8 – Next Fantasy 2016 – Festa à fantasia com músicos e DJs.


Fonte:(http://boadiversao.com.br/guia/riodejaneiro/shows/evento/id/32246/next_fantasy). Acessado 15 de Jun.
2018
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Figura 9 – Culto Next.


Fonte:(https://www.facebook.com/LagoinhaNiteroi/photos/pcb.680183418772954/680183308772965/?type=3&
theater). Acessado em 16 de Jun. de 2018.

Rede Super de Tv

Assim como as grandes igrejas no Brasil como a Universal do Reino de Deus e a Igreja
Internacional da Graça de Deus, a IBL também possui seu próprio canal de televisão a cabo.

Com sede em Belo Horizonte, Minas Gerais, a televisão foi fundada em 1997 como uma
rede comunitária de TV e no ano de 2000 passou a operar via satélite em rede fechada. Com a
maior parte do seu conteúdo sendo voltado para o público cristão, a emissora se auto intitula o
maior canal de conteúdo evangélico do Brasil. Sendo administrada pela família Valadão,
presidente das igrejas IBL espalhadas pelo mundo, a emissora transmite conteúdos infantis,
documentários, filmes, talks shows e, além disto, transmite os eventos das suas igrejas como as
conferências, seminários, shows e seus cultos semanais.

O canal, além de produzir e disseminar conteúdo voltado para o público evangélico,


também auxilia na divulgação da marca IBL que cresce mais a cada ano, contando, hoje, com
igrejas na Europa e na Ásia. Além da emissora de TV, a Lagoinha possui uma emissora de
rádio, a Rádio Super, que opera na frequência 90,3 em Minas Gerais.
60

Figura 10 – Rede Super de Televisão com André Valadão.


Fonte: (http://plantaoadt.blogspot.com.br/2010/05/novo-tempo-nova-tv.html). Acessado em 16 de Jun. 2018.

4.3 CONSIDERAÇÕES

Durante o período de pesquisa, pôde-se observar o nível de engajamento e


comprometimento da igreja, como um todo, com suas programações e eventos. A IBL enxerga
todas essas iniciativas como um método de atrair novos membros e tornar o nome da instituição
conhecido. Isso pode ser constatado através da quantidade de trabalhos desenvolvidos em um
curto espaço de tempo, o envolvimento com relação aos dízimos e ofertas destinados a
manutenção das dependências do templo e investimento em novas frentes de atuação e no
discurso dos líderes de que não pode acomodar-se com o número atual de frequentadores, sendo
instigados a manter o fluxo sempre constante.

Através das ações da igreja, consegue-se ter um diagnóstico de marketing completo em


termos de resultados e eficácia do que é feito. A IBL definiu bem seu target, seu posicionamento
é claro através da estética, discursos, eventos e outras características e existe um retorno, através
das redes sociais e durante os cultos sobre o que pode ser melhorado e implementado para gerar
um maior impacto e retorno, lembrando que a Lagoinha é uma instituição sem fins lucrativos,
ou seja, tudo que é angariado, retorna em forma de investimento próprio, além de manter as
despesas com a manutenção das dependência e salários dos funcionários e líderes da igreja.
61

Como já exposto anteriormente, A IBL de Niterói pode ser entendida como uma
empresa que promove marketing cultural em suas duas tipologias, definidas pelo autor Manoel
Marcondes, quais sejam a de Meio e a de Fim.

A religião ou um segmento de caráter espiritualista pode ser entendido como um bem


cultural, produzido e fruído pela própria população que define e a redefine a todo instante,
sempre em constante volatilidade, como próprio de qualquer fazer cultural. Isto definiria a
Lagoinha como uma empresa cujo seu fim é a produção cultural e todos os seus projetos e
eventos seriam de caráter cultural, sempre aliados ao seu viés doutrinário que lhe é próprio.

Ao mesmo tempo, a igreja apoia e incentiva produções como shows, eventos esportivos
e gastronômicos, ultrapassando os limites do seu templo e de sua finalidade com o propósito
(Meio) de expandir a sua marca e torná-la reconhecida e referência na cidade de Niterói. A IBL
já se faz um modelo padrão de organização religiosa e de produção cultural de excelente
qualidade.

Diferentemente do que acontece, hoje, no cenário da produção cultural, onde existe uma
dependência exacerbada das empresas e produtoras em relação as leis de incentivo para a
cultura, a IBL conta apenas com a verba angariada pelos seus fiéis, através dos dízimos e
ofertas, entregues nos cultos. O resultado das produções retorna para a própria igreja. Uma vez
que o visitante ou não fiel visita alguma programação da igreja e se torna membro efetivo da
IBL, consegue-se o retorno do investimento realizado e aumenta o valor para as próximas
produções, sempre com o pensamento de realizar eventos maiores e em quantidade maior.

Além destes atributos, a IBL alia o fazer religioso com o entretenimento, característica
quase indissociável da produção cultural, nos dias de hoje.

Assim como afirma ANDRADE (2013), os novos meios de comunicação hoje existentes
possuem seu valor aumentado quando conseguem ofertar múltiplas funções, além do seu
original. Como exemplo didático, uma televisão valerá o tanto de arranjos midiáticos que
conseguir conter em si, ao poder acessar internet (computador), ouvir transmissões de jogos
(rádio), conexão para entrada de videogames (monitor) entre outras funções. Quanto mais
funções midiáticas a televisão possuir, mais valiosa ela será, o que não inaugura novos formas
de comunicação, apenas aglutina em um só meio.
62

Isso pode ser transpassado para o modo como hoje as igrejas são pensadas e geridas.
Aquelas com maior número de membros e em maior evidência são aquelas que conseguem, em
suas programações e eventos, implementar diversos arranjos, que façam com que a instituição
deixe de ter apenas um caráter religioso, mas que gere entretenimento. A igreja valerá mais
quanto menos “pura” ela for (ANDRADE, 2013). Ou seja, assim como uma televisão vale mais
quando deixa de apenas transmitir canais da TV aberta e fechada e vai além, ofertando diversas
conteúdos e funcionalidades, assim funcionam as instituições religiosas hoje que precisam
oferecer mais ao público do que apenas cultos e liderança espiritual. Isto significa que ela
necessita ofertar múltiplas opções em seu leque de atividades para que consiga chamar a atenção
e captar o maior número possível de pessoas. Todos os elementos implementados são bem
pensados para que gerem divertimento, alegria, prazer e satisfação de estarem naquele
ambiente, o qual pode ser notado nas grandes programações da IBL.

As empresas e marcas se deram conta de que agora, quando a maioria de


consumidores nutridos pela cultura de massa demanda o entretenimento como uma
expressão permanente nas práticas comunicacionais e sociais, não basta oferecer
produtos ou serviços de qualidade, é preciso informar e divertir, gerar experiências
que ativem diferentes sentidos, de forma lúdica e alegre. Como se todos estivessem
viciados e demandassem cada vez mais diversão e prazer, quase todas as esferas da
sociedade recorrem ao entretenimento de diferentes modos para compor seus
discursos. (ANDRADE, 2013, p. 10).

Como já exposto, a Lagoinha de Niterói possui seu foco em jovens e isto interfere na
forma de comunicação exercida por seus preletores e os meios em que a igreja se comunica.
Através de festas à fantasia, pastores que se expressam e se vestem de forma despojada,
utilização da linguagem das redes sociais, inclusive durante o culto com a transmissão de fotos
e vídeos do youtube, a IBL está na vanguarda de um movimento que já se espalhou por todas
as esferas do mercado e da publicidade onde o entretenimento é utilizado, não apenas como
meio, mas também, como mensagem.

Uma das características primordiais da linguagem do entretenimento, segundo Andrade


(2013), é a multissensorialidade, no qual a expressão ativa diversos sentidos do ser humano que
o faz ter prazer naquilo e estar dependente daquele sentimento. Assim como o rádio ativa a
audição, o cinema com a visão e audição, as marcas quando se utilizam do entretenimento como
63

linguagem necessitam ativar os sentidos para que, quando forem ativados, eles retornem em
forma de recordação daquela marca. Isso, além de criar uma conexão profunda com os
consumidores, no caso das igrejas com os fiéis, os sentidos imprimem o conteúdo da marca nas
pessoas. Com a IBL, pode-se inferir que ela esforça-se por ativar todos os sentidos em seus
membros, como a visão através dos cultos presenciais e as fotos que revisitam os eventos
passados; a audição com as música e hinos, com os videoclipes, com os sermões; o tato através
dos momentos de comunhão com os outros membros e visitantes da igreja, que são impelidos
a ofertar apertos de mão e abraços; o olfato que pode ser percebido através dos eventos
gastronômicos e seus cultos que acontecem no templo da igreja; e o paladar, em especial, pode
ser associado à bala que é oferecida na entrada da igreja, em todos os cultos, como uma forma
de lembrança, além de ter, na embalagem, a marca da igreja, como mostra a imagem.

Figura 11 – Balinha Lagoinha Niterói.


Fonte: (https://www.facebook.com/LagoinhaNiteroi/videos/838285539629407/). Acessado em 18 de Jun. 2018.

Não basta agora a mensagem ser audiovisual, deve ser multissensorial. Envolver, para
além da visão e da audição, o tato, o olfato e até o paladar, se possível. Martin
Lindstrom descreve os enormes esforços envidados por grandes marcas em busca de
expressões multissensoriais, capazes de identificarem e traduzirem para os públicos
suas presenças através de diferentes plataformas sensoriais. É o caso, por exemplo, da
Coca-Cola, que através do formato da sua garrafa conquistou uma expressão tátil
única para a sua marca. Os computadores da Apple ou os PCs que usam processadores
Intel, celulares de marcas distintas, todos possuem breves melodias associadas ao
comando “ligar”, que funcionam como logos sonoras para estas marcas. A Singapore
Airlines desenvolveu uma fragrância própria que pode ser sentida quando se entra nos
seus aviões e ao abrir a caixinha do “kit viagem” ofertada aos seus passageiros. Em
todos esses casos as marcas estão em busca de conquista de plataformas sensoriais
64

distintas para melhor serem percebidas e se afirmarem juntos aos seus públicos
(LINDSTROM, 2007). (ANDRADE PEREIRA, 2013, p.13).

5 Conclusão

Apesar de ser uma instituição de grande porte, a pesquisa e a coleta de dados, tanto na
igreja como na rede, foi muito facilitada pelo fato do grande número de material disponível
para consulta e a grande receptividade dos membros da igreja, sempre buscando divulgar para
o maior número possível de pessoas o perfil da igreja e a sua missão como agência religiosa.

Ainda pelo fato da igreja possuir um grande número de jovens e adolescentes


participando dos cultos e dos eventos, a proximidade de faixa etária facilitou a empatia e o
contato para a escrita desta monografia, podendo compartilhar, sem dificuldades, todas as
hipóteses e anseios desta pesquisa, confirmando os objetivos e proposições iniciais.

Analisando todas as teorias e conceitos abordados a respeito do sujeito pós-moderno e


o indivíduo religioso, ao longo do texto, infere-se que não apenas existe um aumento de
números de fiéis na Igreja da Lagoinha de Niterói, como a igreja se estruturou desta forma e
carrega este “estilo” como um estandarte para atração de jovens, em sua maioria até 25 anos e
que já tenham uma vivencia com a fé evangélica e que querem e precisam vivenciar um novo
modo de praticar a fé, não só dentro dos templos, mas na vida cotidiana.

Como afirma Kotler (2010), os consumidores, na atualidade, buscam marcas que


enfoquem na experiência e toquem em seu lado espiritual. Esta abordagem se torna
fundamental, também, para organizações religiosas que estão em um “mercado” altamente
competitivo, no qual em cada esquina se inicia uma igreja nova e que, por isto, precisam
provocar nas pessoas experiências e sensações que em nenhuma outra isso possa ter ocorrido.
Obviamente, o produto final sempre é o mesmo, o evangelho, a palavra de Deus ou, até mesmo,
um contato maior com o transcendente, mas o foco principal é no meio, em como essa
mensagem e estilo de vida é anunciado e ensinado.

Existem diversas seitas, cultos, igrejas, comunidades evangélicas hoje no Brasil. Todas
elas possuem algo de diferente umas das outras. Algumas delas optam por cultos mais
tradicionais, centrados na leitura de passagens bíblicas e cantam hinos históricos. Outras optam
65

pela sensorialidade e contato extremo com o mundo espiritual como expulsão de demônios e
seres malignos conjuntamente com realização de curas físicas. Mais recentes, frutos do
Neopentecostalismo, algumas delas são adeptas da “Teologia da Prosperidade” e esperam
bênçãos e dádivas divinas materiais, em uma relação de troca onde o culto é ofertado a Deus
com um retorno de bens e posses. As Igrejas Batistas da Lagoinha, assim como outras também
batistas, são adeptas de um pensamento de que o indivíduo é um ser cultural e que, por isso, ele
deve ser compreendido em todas as suas esferas e, não apenas, em seu lado espiritual. Desse
modo, a igreja pretende, através da cultura, adentrar em todas as esferas da vida humana e
quebrar os paradigmas que separam a vida secular da vida religiosa.

Uma nova cultura gospel tem surgido dentro do cenário cristão no Brasil que leva para
os templos e igrejas expressões artísticas e culturais que apenas eram vistas em centros e
equipamentos culturais a fim, não apenas, de superlotar os cultos e eventos, de dar publicidade
a uma marca específica de um segmento, mas tem o objetivo de mudar radicalmente a maneira
como estas instituições são, desde muito tempo, geridas, onde não havia espaço para o novo,
para o diferente e para o que era especificamente da ordem do secular ou do profano. O modo
de se gerir uma igreja no século 21 começa por entender que os membros das igrejas e os não
fiéis são formados da mesma matéria e possuem os mesmos desejos e ambições. O trabalho de
como lidar com estas questões e não deixar o cristianismo de lado resta à igreja.

Para futuros estudos, uma proposição que precisa ser mais estudada é a questão do poder
socializador, presente tanto no discurso como nas vivências proporcionadas pela igreja, não
apenas na IBL, mas nas igrejas evangélicas no geral. Muitas daquelas pessoas, frutos de uma
sociedade individualizada e secularizada procuram nas igrejas um ambiente de maior contato
com outras pessoas, transformando essas comunidades, não apenas em ambientes religiosos,
mas grandes locais de coletivização, da formação de amizades e laços de companheirismo. Isto,
talvez, reflita em um futuro, em um foco maior das igrejas em proporcionar aos membros e
visitantes mais do que um local de busca espiritual, mas de desenvolvimento coletivo e de
irmandade.
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SOSSAI, Raissa. Lagoinha Niterói um ano em novo templo. Lagoinha. Com. 2014. Disponível
em: < https://www.lagoinha.com/ibl-noticia/lagoinha-niteroi-comemora-um-ano-em-novo-
templo/ >. Acessado em: < 14/02/2018 >.

STOTT, John. O pacto de Lausanne. Belo Horizonte: Visão Mundial, 1984.


70

ANEXO A – Autorização para divulgação da monografia

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