Você está na página 1de 43

Revista de audiências públicas do Senado Federal Ano 2 – Nº 7 – maio de 2011

DIREITOS HUMANOS

A escravidão que
precisa ser abolida
INFORMAÇÃO PARA
A CIDADANIA
Há 15 anos o Jornal do Senado retrata, de forma
imparcial e objetiva, tudo o que acontece no
Senado. As atividades do Plenário, das comissões,
da Presidência, do Congresso, das lideranças e dos
órgãos da Casa são mostradas, em texto sucinto,
nas edições que circulam de segunda a sexta-feira e
também na internet.
É a transparência da informação que ajuda você a
exercer sua cidadania.

www.senado.gov.br/jornal
A escravidão que precisa ser abolida
Em discussão! traz nesta edição os debates realizados pela Frente Parlamentar Mista pela Erradicação do
Trabalho Escravo em 3 de fevereiro de 2011 na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH)
do Senado Federal.
Convidados:
• Maria do Rosário Nunes, ministra da Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da
República
• Vera Albuquerque, secretária de Inspeção do Trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego
• Leonardo Sakamoto, presidente da organização não governamental Repórter Brasil
• Luiz Machado, coordenador do Projeto Nacional de Combate ao Trabalho Escravo da Organização
Internacional do Trabalho
• Luis Antonio Camargo, subprocurador-geral do Trabalho
• José Nery, ex-senador e presidente de honra da frente parlamentar

J. R. Ripper / Imagens Humanas


Prezado leitor,

Em discussão! nasceu para informar o públi- não contou com a mesma profusão de informações
co sobre os debates de temas importantes para o para contextualizar o debate.
dia a dia do país que acontecem nas comissões do Afinal, diferentemente do que acontece com a
Senado. Selecionar o tema para esta edição, num aviação e a banda larga, os que trabalham em con-
momento em que a Casa inicia uma legislatura re- dições semelhantes às dos escravos não movimen-
novada pelas eleições de 2010, com as comissões tam grandes valores na economia, não têm como
permanentes com novos membros e direção, não financiar estudos e pesquisas, ainda que produzam
foi fácil. grandes riquezas com o seu suor.
Mas a audiência pública realizada pela Frente Mais que isso, o tema envolve um conceito sub-
Parlamentar Mista pela Erradicação do Trabalho jetivo: a liberdade. De acordo com o filósofo Im-
Escravo em 3 de fevereiro, logo após o início dos manuel Kant, liberdade é um conceito que “todos
trabalhos legislativos, surgiu como opção, tanto entendem, mas nenhum homem sabe explicar”.
pela importância do tema quanto pela oportuni- Ainda assim, Em discussão! faz nas próximas
dade. O debate, com a presença de militantes da páginas uma descrição tão completa quanto possí-
causa em todo o país e de 13 senadores, encerrou vel do problema e da mobilização do governo, do
a 2ª Semana Nacional de Combate ao Trabalho Congresso e da sociedade para erradicar o traba-
­Escravo. lho escravo.
Nos dois números anteriores, a revista abordou A revista também traz os argumentos de quem
discussões sobre a reorganização de grandes seto- discorda das ações e propostas em análise, apon-
res de infraestrutura (aviação civil e telecomunica- tando caminhos diferentes para erradicar esse pro-
ções). Já nesta edição, a equipe se debruçou sobre blema, como deve acontecer em qualquer debate
um fenômeno social, que acontece à margem da democrático.
lei e nas sombras da sociedade moderna que o país
tenta construir. Boa leitura,
Como resultado, em que pesem os esforços Os editores
de órgãos como o Ministério do Trabalho e Em- Obs.: Ao fotógrafo João Roberto Ripper, o agradeci-
prego e a Secretaria Especial de Direitos Huma- mento especial da equipe pela cessão das imagens, sem
nos, de ONGs e da Organização Internacional as quais esta edição perderia muito em fidelidade à con-
do Trabalho (OIT), a equipe de Em discussão! dição dos trabalhadores em situação de escravidão.
SUMÁRIO

Mesa do Senado Federal Contexto Ações de combate


Presidente: José Sarney (PMDB-AP)
1ª vice-presidente: Marta Suplicy (PT-SP)
2º vice-presidente: Wilson Santiago (PMDB-PB)
Trabalho escravo Governo precisou de
1º secretário: Cícero Lucena (PSDB-PB)
2º secretário: João Ribeiro (PR-TO)
resiste ao tempo 25 anos para agir
3º secretário: João Vicente Claudino (PTB-PI)
4º secretário: Ciro Nogueira (PP-PI)
página
7 página
32
Suplentes de Secretário: Gilvam Borges Trabalhador doméstico é um dos Apenas 50% dos casos
(PMDB-AP), João Durval (PDT-BA), Maria do
Carmo Alves (DEM-SE) e Vanessa Grazziotin
mais vulneráveis página
10 denunciados são investigados
(PCdoB-AM) página
34

J. R. Ripper/Imagens Humanas
J. R. Ripper/Imagens Humanas
Diretora-geral: Doris Peixoto Antes valiosos, os escravizados É preciso ir além da repressão e
Secretária-geral da Mesa: Claudia Lyra
de agora são descartáveis página
12 prevenir o aliciamento página
42
Expediente

Realidade brasileira Planos brasileiros de erradicação são elogiados internacionalmente


página
44
Número de escravos pode ser
Diretor: Fernando Cesar Mesquita Mesmo sendo crime previsto no Código Penal, impunidade é a regra
Diretor de Jornalismo: Davi Emerich maior do que se imagina
Veja e ouça mais em:
página
47
A revista Em discussão! é editada pela Secretaria
página
14 Senadores divergem sobre penas e atuação dos fiscais
Jornal do Senado página
49
Diretor: Eduardo Leão (61) 3303-3333
Editores: João Carlos Teixeira e Thâmara Brasil Cortes no Orçamento ameaçam estrutura de repressão
Reportagem: João Carlos Teixeira, Juliana Steck,
Silvio Burle e Thâmara Brasil
página
51
Diagramação: Bruno Bazílio e Priscilla Paz Senado e Câmara têm órgãos permanentes de combate
Arte: Cássio Costa, Diego Jimenez e Priscilla Paz
Revisão: André Falcão, Fernanda Vidigal, Pedro
Pincer e Silvio Burle J. R. Ripper/Imagens Humanas
página
58
Pesquisa de fotos: Ana Volpe, Bárbara Batista,
Braz Félix, Bruno Dantas e Leonardo Sá
Produção: Mauro Vergne
Tratamento de imagem: Edmilson Figueiredo e
Propostas no Congresso
Roberto Suguino
Circulação e atendimento ao leitor: Shirley
Velloso (61) 3303-3333
Votação da “segunda Lei
Capa: família de carvoeiros escravizados em
Áurea” sofre resistências
Minas Gerais. Foto de João Roberto Ripper Estado omisso e miséria estão na raiz do problema página
61
página
17
J. R. Ripper/Imagens Humanas

Tiragem: 1.800 exemplares Para defensores, expropriação


Trabalho escravo não se limita à região Norte significa nova abolição página
62
Site: www.senado.gov.br/emdiscussao
página
18 Ruralistas temem abusos no confisco
E-mail: jornal@senado.gov.br
Tel.: 0800 61-2211 Agronegócio concentra maioria dos casos de terras página
68
Fax: (61) 3303-3137
Praça dos Três Poderes, Ed. Anexo I
página
22
do Senado Federal, 20º andar – Perfil dos escravizados tem pobreza, analfabetismo
70165-920 – Brasília (DF)
e trabalho infantil Para saber mais
Impresso pela Secretaria Especial de
Editoração e Publicações - Seep
página
24 página
77
Contexto

Junho de 2010: trabalhadores


escravizados em fazenda de cana-
de-açúcar em Mato Grosso do Sul
recebem suas refeições
Trabalho escravo
resiste ao tempo
Embora o Brasil tenha reconhecido, em
1995, a existência do trabalho escravo
no país e prometido combatê-lo, hoje,
passados 123 anos da promulgação da Lei
Áurea, essa prática parece longe de acabar

O
termo escravidão logo em 1930, a Convenção 29, que
traz à tona a imagem pede a eliminação do trabalho
do aprisionamento forçado ou ­obrigatório.
e da venda de afri- Mais tarde, em 1957, a Con-
canos, forçados a trabalhar para venção 105 foi além, ao proibir,
seus proprietários nas lavouras nos países que assinaram o docu-
ou nas casas. Essa foi a realida- mento, “o uso de toda forma de
de do Brasil até o final do século trabalho forçado ou obrigatório
19, quando, por fim, a prática foi como meio de coerção ou de edu-
considerada ilegal pela Lei Áurea, cação política; como castigo por
de 13 de maio de 1888. expressão de opiniões políticas ou
Mais de um século depois, ideológicas; como mobilização de
­porém, o Brasil e o mundo ainda mão de obra; como medida disci-
não podem dizer que estão livres plinar no trabalho; como punição
da escravidão. A Organização In- por participação em greves; ou
ternacional do Trabalho (OIT) como medida de discriminação”.
estima que existam pelo menos O Brasil, que assina as conven-
12,3 milhões de pessoas submeti- ções, só reconheceu em 1995 que
das a trabalho forçado em todo o brasileiros ainda eram submetidos
mundo, e no mínimo 1,3 milhão a trabalho escravo. Mesmo com
na América Latina. seguidas denúncias, foi preciso
Estudos já identificaram 122 que o país fosse processado junto
produtos fabricados com o uso de à Organização dos Estados Ame-
trabalho forçado ou infantil em ricanos (OEA) para que se apare-
58 países diferentes. A OIT cal- lhasse para combater o problema.
culou em US$ 31,7 bilhões os lu- De acordo com a Comissão
cros gerados pelo produto do tra- Pastoral da Terra (CPT), entida-
balho escravo a cada ano, sendo de ligada à Conferência Nacional
que metade disso fica em países dos Bispos do Brasil (CNBB) e
ricos, industrializados. responsável pelas primeiras de-
A mobilização internacional núncias de trabalho escravo no
para denunciar e combater o tra- país, são escravizados a cada ano
balho escravo começou quatro pelo menos 25 mil trabalhadores,

J. R. Ripper/Imagens Humanas
décadas após a assinatura da Lei muitos deles crianças ou adoles-
Áurea. Com base nas observações centes. Apesar dos esforços do go-
sobre as condições de trabalho em verno e de organizações não go-
diversos ­países, a OIT aprovou, vernamentais, faltam estimativas

6 
maio de 2011 www.senado.gov.br/emdiscussao 
7
« SUMÁRIO
Contexto Contexto

Reprodução

Valter Campanato/ABr
com a participação de instituições te que o principal instrumento de em tecnologia para produzir prin-
da sociedade civil pioneiras nas dominação são as dívidas atribuí- cipalmente gado, madeira, car-
ações de combate ao trabalho es- das aos empregados pelo patrão. vão para siderúrgicas e cana-de-
cravo no país. Sem saber, o trabalhador é co- açúcar para etanol, produtos que
Em dezembro do mesmo ano, brado das despesas com o trans- atingem grande valor no mercado
o Congresso aprovou uma altera- porte ao local de trabalho, a ali- internacional.
ção no Código Penal para melhor mentação e até a hospedagem Ainda que a OIT identifique
caracterizar o crime de “reduzir durante a viagem, sempre em va- lucros bilionários obtidos em ca-
alguém a condição análoga à de lores superiores aos cobrados no deias produtivas de todo o mun-
escravo”, que passou a ser defini- mercado. do às custas de trabalho escravo,
do como aquele em que há sub- Com o tempo, os trabalhado- no Brasil já existem casos que
missão a trabalhos forçados, jor- res passam a dever mais do que começam a provar o contrário.
nada exaustiva ou condições de- os salários a receber e, por essa ra- Além de arcar com as indeniza-
gradantes, e restrição de locomo- zão, são forçados a continuar no ções trabalhistas (recolhimento
ção em razão de dívida contraída, serviço. à previdência, pagamento de sa-
a chamada servidão por dívida. Outra estratégia é a ameaça lários, férias, 13º salário etc.), os
O crime deve ser punido com constante, inclusive com o uso de “empregadores” já vêm sofrendo
prisão de dois a oito anos. A pena homens armados. Tentativas de condenações por danos causados
pode chegar a 12 anos se o crime fuga são constantemente reprimi- aos trabalhadores. Recentemente,
for cometido contra criança ou por das a bala. o Tribunal Regional do Trabalho
preconceito. A iniciativa acompa- da 8ª Região condenou uma em-
nhou a legislação internacional, Auditores assassinados presa agropecuária a pagar uma
Trabalhadores rurais em Rubiataba (GO): instalações precárias e condições de
que considera o trabalho escravo Mas os fiscais do Ministério indenização de R$ 5 milhões por vida muitas vezes sub-humanas são a marca da escravidão moderna
um crime que pode ser equiparado do Trabalho passaram a incomo- dano moral coletivo a trabalhado-
ao genocídio e julgado pelo Tribu- dar fazendeiros que não garantem res escravizados em fazendas do
nal Penal Internacional. condições dignas de trabalho. Pará. encontre trabalho escravo. Brasil, para pagar salários irri-
Em 1888, depois de longa batalha vencida pelos Porém, passados mais de seis Tanto que, em 28 de janeiro de Recentemente, imigrantes de sórios por jornadas de trabalho
abolicionistas, é promulgada a Lei Áurea. Em 1970, o anos, a legislação praticamente 2004, três auditores fiscais e seu Escravos urbanos países latino-americanos, prin- extensas, oferecendo condições
país começa a descobrir que a escravidão não acabou
não foi aplicada, deixando no ar motorista foram assassinados em Mesmo que a esmagadora cipalmente bolivianos, foram ­s ub-humanas de residência e
a sensação de impunidade, apon- Unaí (MG), em plena inspeção maioria dos casos no Brasil se encontrados trabalhando na in- ­a limentação.
mais precisas, até por se tratar de tada pela OIT como uma das de fazendas locais. concentre na zona rural, o tra- dústria têxtil, em plena São Pau- As denúncias de trabalho es-
uma atividade ilegal, criminosa. principais causas do trabalho for- O crime causou comoção na- balho escravo também tem sido lo, em condições degradantes. cravo também atingem os cami-
Sem informações exatas, o po- çado no mundo. Tanto que já há cional. Levou a Câmara a votar, descoberto nas cidades ou em ou- Os exploradores se aproveitam nhoneiros. Muitos trabalham em
der público e a sociedade organi- propostas no Congresso que au- em primeiro turno, a proposta de tras atividades. Tanto que a PEC da fragilidade desses trabalha- torno de 18 horas diárias, pressio-
zada ainda lutam para prevenir mentam a pena e tentam definir Emenda à Constituição que per- 438/01 também prevê o confisco dores, distantes de casa e, geral- nados pela exigência de produti-
e erradicar essa prática. Pior que de maneira mais precisa o crime mite o confisco das terras onde de propriedades urbanas onde se mente, em situação irregular no vidade, já que recebem por car-
isso, o país enfrenta grandes difi- da escravização contemporânea. for registrado o trabalho ­escravo ga entregue. Mais que isso, eles
culdades para punir os responsá- (PEC 438/01). geralmente fazem dívidas para
Dívidas e ameaças

Siga Bem
veis pelo trabalho escravo. O Congresso também aprovou comprar seus veículos. O nível de
Ainda assim, o Brasil avançou. Paralelamente, o aumento da indenizações às vítimas. E de- Caminhoneiros formam uma estresse desses profissionais, que
categoria considerada por
O próprio reconhecimento e a fiscalização do Ministério do Tra- terminou, em 2009, que, a cada especialistas vulnerável a condições
trabalham em meio aos perigos
consequente adoção de uma po- balho e Emprego (MTE) produ- ano, o dia 28 de janeiro seja co- de trabalho degradantes do trânsito das rodovias brasilei-
lítica pública e de ações do Esta- ziu provas oficiais das situações memorado como o Dia Nacional ras, leva constantemente a proble-
do para reprimir a ocorrência de já relatadas por entidades como a de Combate ao Trabalho Escra- mas de saúde, como hipertensão
trabalho escravo são apontados CPT. O MTE passou a publicar vo. e estafa, agravados por problemas
como exemplos pela OIT. um cadastro, a chamada “Lista No entanto, no Judiciário, a ergométricos por passarem mui-
Foram libertados 40 mil tra- Suja”, com o nome das empresas e reação ainda é lenta: até o mo- to tempo sentados, em constante
balhadores brasileiros de trabalho pessoas flagradas explorando mão mento nenhuma das nove pes- trepidação.
degradante desde a criação do de obra escrava, e a traçar o perfil soas acusadas de participação no Da mesma forma, os traba-
Grupo Especial de Fiscalização dos aliciadores e exploradores. crime foi a ­julgamento. lhadores marítimos estão entre
Móvel e do Grupo Executivo de A fiscalização resgata, em ge- A impunidade que estimula a os mais vulneráveis ao trabalho
Repressão ao Trabalho Forçado, ral, trabalhadores analfabetos em exploração do trabalho escravo escravo. A fiscalização em embar-
ambos de 1995. situação social vulnerável, de mi- faz com que os fiscais encontrem cações, principalmente em águas
Em 2003, foi lançado o Plano séria. Eles são aliciados em locais - ao invés de pessoas e empresas internacionais, praticamente ine-
Nacional para a Erradicação do pobres e levados a fazendas dis- atrasadas e desinformadas esta- xiste. Com o isolamento, os na-
Trabalho Escravo, e para o seu tantes, a maioria isolada geografi- belecidas em propriedades com vios podem ser transformados em
acompanhamento foi criada a Co- camente na vastidão da fronteira baixa produtividade -, latifúndios cativeiros, e a situação é agravada
missão Nacional de Erradicação agrícola brasileira. muito produtivos, muitos deles pela dificuldade na identificação
do Trabalho Escravo (Conatrae), Os relatos mostram claramen- com o que há de mais avançado de responsabilidades legais entre
os ­tripulantes.

8 
maio de 2011 www.senado.gov.br/emdiscussao 
9
« SUMÁRIO
Contexto

Trabalhador doméstico é Sociedade e


um dos mais vulneráveis parlamentares
O renovam

M. Fernandes/O Popular
utra categoria que sofre pela
situação vulnerável em que
se encontra: as empregadas do-
compromissos Parlamentares e militantes contra o trabalho

David Ribeiro
escravo traçam novas estratégias para o início
mésticas. Na América Latina,
de governo e de legislatura
mais de 14 milhões de mulheres
trabalham em casas de família.
Menos de um terço das domésti-
cas da região são registradas e o
percentual das que conseguem se
aposentar é ainda menor.
C om a posse de Dilma Rous-
seff como presidente da Re-
pública e de novos ministros e
das principais bandeiras do movi-
mento de erradicação do trabalho
escravo.
no país, mas hoje eles são apenas
3.032.
Não por coincidência, o nú-
“O trabalho doméstico remu- quadros no governo, os militantes A resistência a essa e outras mero de fiscalizações dos grupos
nerado é uma das atividades com que lutam pela erradicação do tra- propostas defendidas pela fren- móveis e o Orçamento da União
maior déficit de trabalho decente”, balho escravo no país renovaram te nacional, como o aumento da para o combate ao trabalho escra-
afirma relatório da OIT de 2010, este ano suas esperanças de que o pena pelo crime de exploração do vo já foram maiores (veja infográ-
que pretende adotar uma conven- Estado tenha maior eficiência no trabalho escravo, porém, é gran- fico na pág. 51).
ção para trabalhadoras domésticas. combate a essa prática. de, principalmente a da bancada Outra linha de atuação da
Elas geralmente estão distantes A Frente Nacional e a Frente ruralista (leia mais na pág. 65). frente nacional é garantir que as
de suas comunidades de origem, Parlamentar pela Erradicação do Em outro front, os membros da pessoas identificadas como explo-
Como ocorreu com essa garota levada do interior de Goiás para Goiânia, uma
“importadas” para o trabalho em vez sozinhas com os patrões, as domésticas ficam sujeitas a maus-tratos
Trabalho Escravo, em debate rea- Frente Parlamentar, por iniciativa radoras do trabalho escravo sejam
casas de pessoas de classe média. lizado no Senado em 3 de feverei- do deputado Cláudio Puty (PT- condenadas.
Assédio moral e sexual, violência, ro deste ano, com a presença, en- PA), recolheram as assinaturas “A impunidade e a omissão
trabalho forçado e pesado, jor- Um dos problemas é a difi- quistaram com a Constituição tre outras autoridades, da minis- necessárias à criação de uma co- têm se perpetuado de modo a fa-
nadas extenuantes, alimentação culdade de entrar em residências federal de 1988. Ele não tem di- tra dos Direitos Humanos, Maria missão parlamentar de inquérito zer com que os criminosos perma-
limitada, baixos salários, não pa- para checar as condições de tra- reito a jornada de trabalho fixa- do Rosário, entendem que ainda (CPI) do trabalho escravo na Câ- neçam sem julgamento apesar das
gamento de horas extras, ausência balho dessas profissionais, muitas da em lei, horas extras, adicional há um longo caminho até que o mara dos Deputados. várias ações nas varas federais”,
de contribuição à Previdência So- vezes relegadas a pequenos cubí- noturno, depósito obrigatório no país se livre do problema. Agora, começa a batalha para afirma o deputado Domingos
cial e de acesso à saúde, e até a re- culos inadequados. Fundo de Garantia do Tempo de Os participantes apostam em a instalação da comissão, que Dutra (PT-MA), secretário-geral
tenção de documentos estão entre O empregado doméstico já Serviço (FGTS) nem seguro-de- sensibilizar politicamente o novo pretende averiguar denúncias de da frente parlamentar.
os ­abusos registrados contra essas tem menor proteção legal do que semprego, entre outros benefícios governo para apoiar as iniciativas exploração de trabalhadores e Nova oportunidade de se fazer
­profissionais. os demais trabalhadores con- sociais. de combate ao trabalho escravo. propor aperfeiçoamentos na legis- justiça pode, enfim, estar chegan-
“A luta pela erradicação efe- lação, o que inclui mais um refor- do. Depois de sete anos, em 2011,
tiva do trabalho escravo deve ser ço na campanha pela aprovação finalmente, devem ir a júri os
Grande parte das mulheres da América Latina trabalha como doméstica um dos pilares do país que que- da PEC 438/01 (leia mais na pág. acusados de assassinar três audi-
remos, de tal modo que, daqui 72). tores e um motorista do Ministé-
No Brasil, cerca de 16,4% da população feminina, que é de 97,3 milhões, adotou essa profissão, de acordo com a OIT
a alguns anos, não precisemos Do ponto de vista prático, os rio do Trabalho em Unaí, Minas
mais nem de Frente Parlamentar, militantes que lutam contra o Gerais (veja mais na pág. 38).
Paraguai 20,6% - 260 mil México 10,5% - 5,5 milhões nem de subcomissão no Senado trabalho escravo querem que o Desde 2004, a sentença do juiz
Uruguai Costa Rica
ou na Câmara, nem de outros Estado continue se estruturando da Vara Federal de Belo Horizon-
18,6% - 317 mil 10,2% - 220 mil
órgãos para combater o trabalho para fazer frente ao problema. te que manda os nove acusados a
Argentina 17,3% - 3,5 milhões Equador 9,6% - 642 mil escravo”, afirmou o presidente de Segundo eles, tanto o Judiciário, julgamento vem sendo alvo de re-
honra da frente nacional, o ex- quanto o Ministério Público e o cursos especiais e embargos (ação
Brasil 16,4% - 16 milhões Guatemala 9,1% - 1,3 milhão senador José Nery, durante a au- Ministério do Trabalho precisam considerada como sendo apenas
Chile 14,3% - 1,2 milhão Nicarágua 8,9% - 246 mil diência pública. estar mais bem aparelhados para protelatória) em instâncias supe-
Além da presidente Dilma, os reprimir e punir os exploradores. riores, como o Superior Tribunal
Panamá 13,8% - 223 mil Honduras 8,4% - 338 mil membros da frente irão buscar o Atenção especial foi dada du- de Justiça (STJ).
Rep. Dominicana 13% - 667 mil El Salvador apoio do presidente da Câmara, rante a audiência pública aos Agora, a procuradora da Re-
7,7% - 261 mil
Marco Maia (PT-RS), para con- grupos móveis de fiscalização do pública Mirian Lima, responsável
Bolívia 11,6% - 567 mil Peru 7% - 1 milhão seguir a aprovação final da PEC MTE. Segundo dados apresenta- pelo caso, acredita que recursos
438/01 pelos deputados. dos pelo presidente em exercício para adiar o julgamento se esgota-
Colômbia 11,1% - 2,4 milhões Venezuela 4,3% - 596 mil A proposta, que visa a expro- da Frente Parlamentar, senador ram. Sua esperança – e das famí-
0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100 0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100 priação das terras onde for obser- Cristovam Buarque (PDT-DF), lias dos mortos – é que a Justiça
Fonte: Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal), 2009 vado o trabalho escravo, é uma já houve 3.464 fiscais do trabalho se pronuncie este ano.

10 
maio de 2011 www.senado.gov.br/emdiscussao 
11
« SUMÁRIO
Contexto Contexto

LUIZ VASCONCELOS/A CRÍTICA “Se comparamos os trabalha- Brasil Colônia e do Império, pelo nizados sejam responsabilizados,
dores escravizados de hoje com os menos do ponto de vista financei- inclusive aqueles que fazem parte
escravos de antes de 13 de maio ro e operacional”. do Congresso, com denúncia no
de 1888, eles têm uma vantagem: A afirmação também se sus- Supremo Tribunal Federal pela
não são vendidos. Mas a desigual- tenta nas conclusões de estudo do prática de trabalho escravo. Não
dade entre eles e seus patrões hoje sociólogo norte-americano Kevin podemos fazer com que os imu-
é maior. O atendimento médico Bales, que, em seu livro Disposa- nizados possam se sobrepor aos
a um escravo não era muito di- ble People: New Slavery in the Glo- invisíveis”, declarou Taques.
ferente do atendimento ao dono bal Economy (Gente Descartável: Cláudio Puty denuncia que o
do escravo, porque a medicina A Nova Escravidão na Economia novo trabalho escravo é herdei-
era muito primitiva na época. As Mundial) compara a escravidão ro das relações sociais arcaicas
condições de moradia eram de- contemporânea com aquela que que somente subsistem por esta-
siguais, mas naquela época não durou até o século 19 no Brasil. rem associadas ao agronegócio
tinha ar-condicionado, as facili- “Kevin Bales demonstra que, e à ­produção de mercadorias e
dades que temos. Na capacidade atualmente, há mais crueldade do ­commodities que têm papel im-
de locomoção, antes, se andava a que havia naquela época. Hoje, o portante na pauta de exportação
pé, a cavalo, ou carregado. Hoje, trabalhador é descartável”, con- brasileira, como carne, soja, ma-
se dispõem de aviões”, avalia o se- firma o subprocurador-geral do deira ou carvão (para produção
nador Cristovam Buarque. Trabalho Luis Antonio Camargo. de ferro).
O senador Pedro Taques “Há uma relação entre formas
Mais cruel (PDT-MT) cita o professor Oscar arcaicas de servilismo, de submis-
Segundo Vera Albuquerque, Vilhena Vieira, da Fundação Ge- são, e os setores mais modernos
secretária de Inspeção do Traba- túlio Vargas, que divide os brasi- da pauta de exportação brasileira.
lho do Ministério do Trabalho e leiros em categorias como os invi- Não há justificativas em termos
A pobreza e o desemprego acabam por deixar Emprego, o escravo era uma pro- síveis e os “imunizados”. de produtividade e não há justi-
os trabalhadores sem opções, o que os impede priedade, uma ferramenta que “Os invisíveis são esses traba- ficativas no cálculo econômico
de reclamar seus direitos ou exigir dos patrões
melhores condições de trabalho
precisava de cuidado, já que sua lhadores que são escravizados, que que permitam que aceitemos essa
morte representava uma grande precisamos trazer à luz. Para isso, imoralidade chamada trabalho
perda. “Já os escravos atuais são precisamos fazer com que os imu- escravo”, alerta o deputado.
absolutamente descartáveis e a

Antes valiosos, os escravizados


escravidão é muito mais cruel”,
afirma. Nova escravidão é ainda mais perversa, diz a OIT
O deputado Cláudio Puty des-

de agora são descartáveis


taca que a libertação dos escravos Ao contrário dos antigos, valiosos para os seus senhores e por isso de alguma
atendeu aos interesses dominan- forma “bem cuidados”, os escravos de hoje são totalmente descartáveis
tes na época, que migraram para
formas mais eficientes de geração Antiga Escravidão Nova Escravidão
de riqueza. Hoje a economia, no Propriedade legal Permitida Proibida

H á mais de 200 anos, durante


a Revolução Francesa, a es-
cravidão foi considerada intolerá-
O problema já tinha aparecido
de maneira nítida em 1871, quan-
do o Congresso aprovou a Lei do
1885, com a promulgação da Lei
dos Sexagenários, que deu liber-
dade aos escravos com mais de
entanto, não mostra dificuldades
para conviver com a escravidão,
argumenta o ­deputado.
Custo de recrutamento
de mão de obra
Alto. A riqueza de uma pessoa podia ser
medida pela quantidade de escravos
Muito baixo. Não há compra e, muitas
vezes, gasta-se apenas com o transporte
Lucros Baixos. Havia altos custos com a Altos. Se alguém fica doente ou velho
vel para a Humanidade. Apenas Ventre Livre, que dava liberdade 60 anos de idade. Além de não “No século 19, falava-se da manutenção dos escravos pode ser mandado embora, sem
um século depois, o Brasil aboliu aos filhos de escravos nascidos a receber mais abrigo ou alimentos abolição do escravo como uma nenhum direito
as leis que permitiam a um ho- partir de então. O efeito da lei, de seus antigos donos, os negros, libertação da terra, do capital, de
Mão de obra Escassa. Dependia de tráfico negreiro, Descartável, dado o grande contingente
mem ser dono de outros homens. porém, foi separar as crianças velhos e enfraquecidos, já não uma forma de trabalho que não
prisão de índios ou dos novos escravos de trabalhadores desempregados
No entanto, a decisão transfor- de seus pais, que continuavam tinham o vigor necessário para servia mais aos interesses da acu- nascidos nas fazendas
mada na Lei Áurea, de 1888, em- ­escravizados. continuar trabalhando. mulação de capital. No século 21,
bora tenha significado um gigan- Afinal, os senhores de fazendas E, com a Lei Áurea, contin- temos uma expansão do trabalho Relacionamento Longo período. O dono cuidava dos Curto período. Terminado o serviço,
escravos pela vida inteira não é mais necessário prover o sustento
tesco passo na direção da justiça estavam desobrigados de prover o gentes de negros trazidos à força análogo ao escravo como forma
do empregado
social, não resolveu o problema sustento das crianças negras, que da África, ou seus descendentes, de precarização absoluta do tra-
da inserção dos escravos libertos eram abandonadas nas ruas ou, foram despejados, sem assistência balho, como fruto do neolibera- Diferenças étnicas Relevantes para a escravização Pouco relevantes. Qualquer pessoa pobre
na economia de então. quando afortunadas, recolhidas oficial, e sem que fossem inclu- lismo”, explica Puty. e miserável pode se tornar escravo,
independente da etnia
Na maioria dos casos, eles dei- por instituições religiosas. Muitas ídos no mercado de trabalho. A Confirmando essa tendência,
xaram de ser parte de um pro- delas morriam, ou se submetiam situação vulnerável em que passa- a Organização Internacional do Manutenção da ordem Ameaças, violência psicológica, Ameaças, violência psicológica,
cesso produtivo em que tinham a situações degradantes, como ram a viver os deixou expostos a Trabalho afirma em seu relatório coerção física, punições exemplares e até coerção física, punições exemplares e até
garantida a subsistência para se a prostituição e o crime, para todo tipo de exploração. E é base global de 2005 que “a nova es- assassinatos assassinatos
tornarem párias, ainda que decla- ­sobreviver. para a grande disparidade entre cravidão é tão vantajosa para os
rados livres. A mesma coisa aconteceu em ricos e pobres no Brasil de hoje. empresários quanto a da época do Extraído de Disposable People: New Slavery in the Global Economy, Kevin Bales,1993

12 
maio de 2011 www.senado.gov.br/emdiscussao 
13
« SUMÁRIO
realidade brasileira

Número de escravos
pode ser maior do
que se imagina
Dados sobre escravidão são incompletos. Mas Ministério do Trabalho, OIT e Pastoral
da Terra conhecem a dinâmica e as causas que levam brasileiros à escravidão. Casos se
concentram na fronteira agrícola, mas já surgem nos canaviais e na indústria têxtil

A
s pegadas do país do da Comissão Pastoral da Terra ainda não é tão fácil mapear o
futuro, do agronegócio (CPT), acredita que as duas hi- problema por se tratar de uma
pujante, da indústria póteses estão corretas: o proble- atividade clandestina, criminosa.
em expansão deixam ma se revela quando intensificada A falta de integração dos pla-
um rastro difícil de imaginar: o a fiscalização e se agrava com o nos de combate, ações e órgãos
crescimento do número de traba- crescimento econômico do país. nas esferas estadual e federal
lhadores brasileiros atraídos por Segundo Plassat, a discrepância também impede que dados
falsas promessas, isolados, endi- entre os dados da CPT, que desde oficiais sejam organizados.
vidados, coagidos e exauridos por os anos 1970 recebe e encami- Organizações não gover-
longos turnos de trabalho. nha denúncias, e os
Mais de 39 mil trabalhadores do MTE deve-se a
nessa situação foram resgatados um déficit na apura-
pela ação dos grupos de fiscali- ção das denúncias rece-
zação do Ministério do Trabalho bidas, o que ele chama
e Emprego (MTE) entre 1995 e de subfiscalização.
2010. Enquanto apenas 84 tra-
balhadores foram libertados em Difícil mapear
1995, o número anual cresceu Mesmo com
acentuadamente a partir de 2001, todo o histó-
chegando a quase 6 mil em 2007. rico e dados
Mas voltou a cair para 2.617 no colhidos nos
ano passado (veja infográfico na últimos
página 16 ). anos,
O aumento de casos até 2007
também se explica pelo incre-
mento da fiscalização, a partir da
mudança do Código Penal em
2003 – que passou a caracterizar
melhor o crime e a prever maior
punição –, da ação do governo e
da atuação das organizações não
governamentais (veja mais a par-
tir da pág. 32). Mas a queda do

J. R. Ripper / Imagens Humanas


número de resgatados a partir de
2007 significa que houve menos
fiscalização ou que o problema
diminuiu? Dezembro de 2001: trabalhadores
Mesmo com os poucos dados, escravizados da fazenda Tuerê, localizada
em uma vicinal da Transamazônica,
fornecidos em geral por infor- no município de Senador José Porfírio, Pará
mantes e fugitivos, Xavier Plassat,

14 
maio de 2011 
15
« SUMÁRIO
Realidade brasileira Realidade brasileira

ONGs apontam subfiscalização e cobram mais apuração


Número de resgatados cresceu principalmente porque a atividade nos canaviais exige mais trabalhadores, apontam os especialistas
Estado omisso e miséria
300
250
estão na raiz do problema
200 Denúncias
150
Operações de fiscalização
100 As disparidades sociais no Bra- Para Rodrigo Schwarz, juiz e
50 sil, históricas e atuais, associadas professor de Direito do Trabalho,
0 a uma das maiores concentrações às causas históricas e culturais
1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 de renda do mundo, se tornam somam-se problemas crônicos do
0
ainda mais gritantes para a socie- país: “A insuficiência das políti-
2.000 Trabalhadores resgatados dade quando surgem notícias de cas agrárias, a concentração de
4.000 que ainda há, além de fome e mi- renda, o uso socialmente nocivo
séria, trabalho escravo no país. da propriedade, as largas desi-
6.000 Trabalhadores envolvidos A persistência da escravidão, gualdades sociais e regionais e a
8.000 ainda que em suas formas con- consequente pobreza e exclusão
Fontes: Trabalho escravo: 25 anos de denúncia e fiscalização, Xavier Plassat, 2010 e
temporâneas, tem relações com o social e econômica de um grande
Relatórios Específicos de Fiscalização para Erradicação do Trabalho Escravo, Ministério do Trabalho e Emprego, 2010 passado, mas também com fato- número de pessoas”.
res culturais e econômicos, que se O professor vai mais além,
materializam na característica do af irmando que, “no Brasil, a
namentais (ONGs) tentam pre- Nem sempre tem contato com o trabalho forçado requerem urgen- poder público nacional de não de- transição do modo de produção
encher essas lacunas com pes- todo. Quem sabe da realidade são temente mais pesquisas e atenção, senvolver, até muito recentemente, baseado no escravismo para o
quisas próprias. Mas, segundo os gerentes ou proprietários, que para preparar o terreno para indi- políticas suficientes em favor dos modo de produção baseado no
documento da Pastoral da Terra, sempre negam”. cadores e avaliações mais precisos excluídos ou dos mais pobres. trabalho ‘livre’ sequer foi efetiva”.
“é muito difícil conseguir infor- Em 2001, a OIT já alertava e com perspectiva de gênero como Para o deputado Amauri Tei- Segundo Schwarz, as relações de
mações exatas sobre o número para a necessidade de mais infor- base para uma definição política e xeira (PT-BA), “historicamente o trabalho do Brasil contemporâ-
de peões escravizados. O peão mações e análises sobre o proble- ação futura”. Estado brasileiro não foi estrutu- neo não romperam em definitivo
fala, no máximo, do grupo que ma. Em relatório, afirmou que rado para reconhecer direitos. O com o modelo escravista, apenas
foi com ele, do local onde estava. “as formas contemporâneas de Estimativas Estado brasileiro historicamente foram reformuladas as formas de
As estimativas da Pastoral foi montado para negar os direi- produzir, sem que as regras im-
da Terra dão conta de que, para tos dos desfavorecidos”. postas a trabalhadores fossem es-
Fiscais não conseguem checar todas as denúncias cada trabalhador escravizado do O deputado Cláudio Puty sencialmente alteradas.
qual a entidade tem conhecimen- (PT-PA) também vê raízes cul- De fato, na maioria dos estu-
Em média, apenas 60% das denúncias recebidas são efetivamente investigadas to, existem outros quatro ou cin- turais no problema, agravadas dos e relatórios sobre o tema há

José Cruz
co na mesma situação. Ou seja, pelas modernas políticas econô- referências a três situações que
denúncias fiscalizações existiriam hoje no país entre 25 micas: “O trabalho escravo, ape- estariam na raiz do problema: a
Total (2003-2009): 1.788 1.108 mil e 30 mil pessoas trabalhan-
do em condições semelhantes à
sar de estar presente nas cidades,
está muito associado à expansão
concentração de terras nas mãos
de poucos, a falta de alternativas
Senador pelo Piauí, Wellington Dias sugere
educação e redução da pobreza no combate à
escravidão. Há setores que falam da fronteira. E a expansão da de renda para as pessoas, o incen- escravidão
denúncias fiscalizações em até 100 mil. fronteira não deve ser vista sim- tivo financeiro indiscriminado
Para o subprocurador do Tra- plesmente como a expansão de às empresas – independentemen- balho Escravo que a situação vem
240 2009 169 70% balho Luis Antonio Camargo, atividades consideradas arcaicas, te de como elas produzem – e a sendo contornada. E sugeriu for-
“apenas 50% das denúncias são com relações sociais arcaicas, vulnerabilidade social dos traba- mas de combater o problema.
apuradas. Então, mesmo tendo mas, sim, como relações asso- lhadores em razão da pobreza e Em Barras, disse, foram cria-
280 2008 216 77%
sido resgatados quase 38 mil (de ciadas ao agronegócio e a ciclos da baixa escolaridade. dos cerca de 70 assentamentos
1995 a 2010), há ainda um nú- de exportação de mercadorias e O senador Wellington Dias para a população local. “Com
265 2007 150 57% mero enorme de trabalhadores
aguardando pela intervenção do
commodities, que têm um papel
importante na pauta de exporta-
(PT-PI) reconheceu que a pobre-
za e baixos índices educacionais
isso, tivemos uma redução mui-
to grande no índice de trabalho
percentual poder público, aguardando pelo ção brasileira”. já fizeram do seu estado um dos escravo.” A educação, continuou,
265 2006 136 51% de denúncias
fiscalizadas resgate da cidadania”. No entanto, relatório da OIT que mais cederam pessoas para o teve papel importante nisso. “O
O senador Cristovam Buarque afirma que, embora produtores trabalho escravo. Barras (PI), in- Estado teve o maior crescimento
275 2005 161 59% (PDT-DF) alerta para os objeti-
vos anuais a serem cumpridos e a
rurais das regiões com incidência
de trabalho escravo afirmem que
formou, já foi a cidade que mais
forneceu mão de obra escrava.
no número de matrículas na pré-
escola, tem mais matriculados
dramaticidade da situação atual. esse tipo de relação de trabalho Porém, o senador, que foi gover- frequentando a escola no ensino
230 2004 126 55%
“Eu quero chamar a atenção faz parte da cultura ou tradição, nador do estado nos últimos oito fundamental no Brasil, com um
para este dado: 25 mil entram na ela é utilizada apenas por uma anos, informou aos presentes ao índice de 98,5%. Cresceu no en-
233 2003 150 64% escravidão por ano. Isso significa
que, se a gente não resgatar 25
minoria dos fazendeiros dessas
regiões.
debate da Frente Parlamentar
Mista pela Erradicação do Tra-
sino médio, no ensino superior e
no profissionalizante”, relatou.
Fonte: Trabalho escravo: 25 anos de denúncia e fiscalização, Xavier Plassat, 2010
mil, o número está aumentando”.

16 
maio de 2011 www.senado.gov.br/emdiscussao 
17
« SUMÁRIO
Realidade brasileira Realidade brasileira

Trabalho escravo não se e 20%, respectivamente. degradantes até o aprisionamen- expansão da fronteira agrícola.
O número médio de liberta- to puro e simples. Na realidade, De acordo com a Pastoral da
limita à região Norte ções aumentou 490%, mas, des-
sa vez, o maior crescimento foi
poderia se dizer que, aonde che-
ga o holofote da fiscalização, aí
Terra, na região Norte, 52% dos
casos denunciados no período
no Nordeste (830%), no Sudeste se descobre a prática do trabalho 1995-2009 deixaram de ser fisca-
(1.770%) e no Sul, que passou de degradante que caracteriza boa lizados. Esse percentual é de 37%
Pará e Mato Grosso sempre res libertados acima da média, de expansão e transformação do zero a 153 libertados. Nas demais parte das lavouras brasileiras, de no Nordeste, 22% no Centro-
lideraram as estatísticas de ex- de acordo com estudo de Xavier agronegócio. As modificações re- regiões, o incremento foi me- norte a sul”. Oeste, 8% no Sudeste, 0% no
ploração do trabalho escravo. No Plassat, da Comissão Pastoral centes nas leis e na forma como o nor: 320% no Norte e 450% no Os números apresentaram Sul, perfazendo uma média na-
entanto, dois estados produtores da Terra: Tocantins, Maranhão, governo trata o trabalho escravo ­Centro-Oeste. uma nova realidade em Goiás, cional de 44% (veja infográficos
de carvão para siderúrgicas, Mi- Bahia e Goiás. Mato Grosso do também estão na base dessa nova Entre os 15 estados com mais Bahia, Tocantins e Mato Gros- na pág. 16 ).
nas Gerais e Mato Grosso do Sul, Sul, Rio de Janeiro e Minas Ge- realidade. trabalhadores libertados entre so do Sul, que estão entre os seis
vêm se destacado nos últimos rais também têm índices elevados Ainda conforme a análise de 2003 e 2009, cinco são da Ama- primeiros colocados, ganhando “Fornecedores”
anos. (veja infográfico abaixo). Xavier Plassat, o número médio zônia Legal (PA, MT, TO, MA entre três e 12 posições em rela- Mais difícil ainda que identi-
De 2003 a 2009, além do Pará Segundo Plassat, "essa mudan- de estabelecimentos fiscalizados e RO). Seis estados tiveram suas ção ao ranking anterior. Também ficar os estados que exploram o
e Mato Grosso, quatro estados ça reflete a intensificação da fis- pelo MTE cresceu 140% entre primeiras libertações entre 2003 ganharam posições o Rio de Ja- trabalho escravo é descobrir de
tiveram número de trabalhado- calização, especialmente em regi- 2003 e 2009, se comparado ao e 2009 (GO, MS, RJ, PE, PR e neiro (+13 posições), Pernambu- onde vêm esses milhares de tra-
ões aonde ela não cos- período entre 1995 e 2002. Nas ES). co (+10), Paraná (+8) e Espírito balhadores. Leonardo Sakamoto,
tumava chegar e, mais regiões Centro-Oeste e Sul, o mi- Santo (+2). da ONG Repórter Brasil, afir-
No Pará, quase metade dos ainda, em setores de nistério praticamente triplicou as Fiscalização em canaviais A explicação para esse cresci- mou durante a audiência pública
atividades até então re- operações (170% a mais). No período entre 1995 e 2002, mento, segundo Plassat, são as no Senado que, considerando “os
municípios tem trabalho escravo servados à fiscalização Já na região Norte foram fis- somente em dez estados – seis de- operações nos canaviais, que re- números entre 2003 e 2009, o
Já Alagoas e Pernambuco são fornecedores de mão de obra trabalhista comum". calizados quase quatro vezes mais les na região Norte – foram liber- gistraram a maior proporção de Maranhão foi o estado que mais
Pará Para Plassat, a mu- estabelecimentos (aumento de tados trabalhadores. Já no perío- libertados por operação. forneceu gente para o trabalho
48% dança reflete também 280%). No Nordeste e no Sudes- do entre 2003 e 2009, 24 estados Plassat alerta ainda para o ris- escravo: 28% dos resgatados são
Mato Grosso as condições próprias te, o crescimento foi menor, 80% (exceção feita ao Amapá, à Paraí- co de interpretar as mudanças maranhenses”.
47% ba e ao Distrito Federal) registra- geográficas como um desloca- De acordo com Sakamoto, ou-
Tocantins
38% ram a libertação de pessoas. mento do trabalho escravo para tros estados em que é aliciada a
Maranhão Para Xavier Plassat, “o surgi- a região Sudeste. Ele atribui esse maioria desses trabalhadores são
Mato Grosso do Sul
33% PA e MT lideram ranking de libertados mento de novos estados nos regis- crescimento à sistematização e ao Pará, Bahia, Mato Grosso do Sul,
tros nacionais de trabalho escra- aumento da fiscalização nos ca- Piauí, Minas Gerais, Tocantins
29% Principal missão dos escravizados é desmatar para expandir fazendas
Acre vo deve ser interpretado dentro naviais do Sudeste, Centro-Oeste e Pernambuco (veja infográficos
28% do contexto de ‘descobrimento’ e Nordeste e à subfiscalização nas págs. 18 e 24). Já Amambai,
Amapá posição ranking evolução ranking que ainda está sendo feito quan- na região Norte e nos estados do em Mato Grosso do Sul, lidera o
20% 1995-2002 2003-2009 to à realidade atual do trabalho Maranhão e de Mato Grosso, tra- ranking de municípios fornece-
Goiás
16% 1º - - - - - - - - - - - Pará Pará escravo no Brasil – com modali- dicionais líderes do ranking por dores de mão de obra para o tra-
Espírito Santo Cidades que lideram as denúncias dades que vão desde as condições concentrarem a principal área de balho e­ scravo.
16% (entre 2003-2009) 2º - - - - - - Mato Grosso Mato Grosso
Rondônia
13% PA São Félix do Xingu 106 3º - - - - - - - Maranhão Goiás
Amazonas PA Marabá 88 4º - - - - - Minas Gerais Bahia Regiões de desmatamento
10% MA Açailândia 58
Piauí 5º - - - - - - - - - - Piauí Tocantins têm mais resgatados
7% PA Rondon do Pará 49 Norte
6º - - - - - - - - - - Goiás Mato Grosso do Sul Nordeste
Rio de Janeiro PA Pacajá 42
Norte e Centro-
Trabalhadores 1.595 940
7% PA Dom Eliseu 41 7º - - - - - - - São Paulo Maranhão libertados 37%
Paraná Oeste concentram a 22%
6% PA Novo Repartimento 34 8º - - - - - - - Tocantins Minas Gerais maior parte das por região
Bahia PA São Geraldo do Araguaia 32 (média anual entre
4% 9º - - - - - - - - - Alagoas Rio de Janeiro operações de fiscalização
2003-2009)
PA Água Azul do Norte 28
Santa Catarina
PA Itupiranga 30 10º - - - - - - - - Rondônia Pernambuco Centro-Oeste
4%
PA 18 11º - - - - - - - - - - - Acre Alagoas
1.222
Minas Gerais Goianésia do Pará
4% Centro- 28% Sudeste
Alagoas
TO Araguaína 16 12º - - - - - - - Amazonas Rondônia Região* Norte Oeste Nordeste Sudeste Sul Total 430
PA Rio Maria 15 10%
3%
TO 18
13º - - - - - - - - - Amapá Paraná
São Paulo
3%
Ananás
14º - - - - - - - - - - Bahia Piauí Operações 46 29 27 15 12 130
PA Paragominas 18 36% 22% 21% 11% 10% 100%
Ceará
2% GO Mineiros 10 15º - - - - - - - - - - Ceará Espírito Santo
Fonte: Trabalho escravo: 25
PA Sapucaia 9
Rio Grande do Norte
2% manteve a posição caiu ou saiu do ranking
Estabelecimentos 98 57 38 15 19 245 anos de denúncia e fiscalização,
Sul
legenda

MT Santa Rita do Trivelato 7 fiscalizados Xavier Plassat, 2010


Pernambuco
MA Bom Jardim 11 subiu ou entrou no ranking
40% 23% 16% 13% 8% 100% 153
2% *média anual entre 2003-2009
4%
Rio Grande do Sul Fonte: Trabalho escravo: 25 anos de Fonte: Trabalho escravo: 25 anos de denúncia e fiscalização, Xavier Plassat, 2010
1% denúncia e fiscalização, Xavier Plassat, 2010

18 
maio de 2011 www.senado.gov.br/emdiscussao 
19
« SUMÁRIO
Realidade brasileira

do, a situação flagrada na oficina tuada pelos fiscais. Em tudo se- idade, que costuravam das 8h às
de costura seria, para a entidade, melhante ao da Marisa, o caso 22h.
um dos motivos para a redução resultou em multa de R$ 2,2 mi- “Isso é diferente de terceirizar
drástica de empregos formais no lhões e em 43 autos de infração serviços de apoio, como limpeza
setor. por irregulariddades na contrata- ou segurança”, diz o juiz do tra-
ção e nas condições de trabalho balho Marcus Barberino.
Pernambucanas oferecidas por uma empresa ter- (Com informações da
Em março deste ano foi a vez ceirizada a 16 trabalhadores boli- ONG Repórter Brasil, que
de a rede Pernambucanas ser au- vianos, entre eles dois menores de acompanha as fiscalizações)

Maurício Hashizume/Repórter Brasil


Ação dos fiscais do trabalho de SP
que resultou na autuação da Marisa
flagrou imigrantes trabalhando em
Trabalhadores param grandes obras de infraestrutura
condições degradantes Alvo de protestos por parte de ONGs em médio ou curto prazo de incluir Algumas delas dizem respeito a con-
e representantes de comunidades in- socialmente o povo”, afirmou. dições de trabalho
dígenas e ribeirinhas, a Usina Hidre- Membros da CDH estiveram em Belo a ná loga s ao t ra- Usina de Belo Monte
létrica de Belo Monte, no rio Xingu, Monte em 16 de abril e o relatório balho escravo. Por – Com capacidade total

Imigrantes são escravizados no Pará, chamou a atenção da sena-


dora Marinor Brito (PSOL-PA) pela
da visita está sendo finalizado para
apresentação à Comissão por Mari-
conta da rebelião
dos trabalhadores,
instalada de 11.233 me-
gawatts (MW), segundo
números do governo,
na maior cidade do continente possibilidade de, indiretamente, esti- nor Brito. a s obra s f ic ara m
mular o trabalho escravo. paralisadas por se- a Usina Hidrelétrica
Violência de Belo Monte deverá
Em março, a Comissão de Direitos manas, atrasando o
ser a terceira maior do
Humanos e Legislação Participativa Situações de violência em obras se- cronograma e cau-
Em agosto de 2010, a Superin- irregulares e alojamentos inade- res, a Marisa – e outros magazines mundo, atrás apenas
(CDH) aprovou pedido da senadora melhantes já ocorreram. Operários sando ­prejuízos. de Três Gargantas, na
tendência Regional do Trabalho quados, com infiltrações, umida- do setor têxtil – já haviam assina- da usina de Jirau, no Alto Xingu, Além de Jirau, ou-
para que uma comissão visitasse a China, e da binacional
e Emprego de São Paulo flagrou de excessiva, falta de ventilação, do um termo de ajustamento de Rondônia, se rebelaram em 15 de tras grandes obras
região e ouvisse a sociedade local. Itaipu, na fronteira do
na Vila Nova Cachoeirinha, zona mau cheiro e banheiros precários. conduta (TAC) com o Ministério março, destruindo alojamentos. Cer- enfrentaram recen- Brasil com o Paraguai.
No início de abril, a Organização dos
norte da capital paulista, 17 imi- Público do Trabalho (MPT) em ca de 10 mil dos 22 mil trabalhado- temente problemas
Estados Americanos (OEA) sugeriu
grantes trabalhando em condi- Cadeia produtiva 2007, comprometendo-se a evitar que as obras de Belo Monte fossem res envolvidos na obra tiveram que por causa das condições de trabalho.
ções análogas à escravidão numa Na cadeia produtiva, uma em- ligações com oficinas com traba- paralisadas até que uma série de exi- deixar o local. Três dias depois, os É o caso das obras dos complexos
pequena confecção que fornece presa compra os tecidos, faz o pri- lho ilegal. gências, ambientais e sociais, fossem cerca de 16 mil trabalhadores que portuários de Suape (PE), Pecém
peças de roupa para a Marisa, meiro corte e subcontrata a costu- Após a fiscalização de 2010, a acatadas. constroem a usina de Santo Antônio, (CE) e Porto Açu (RJ), e da usina São
grande rede de lojas de vestuário ra; a segunda faz a costura das pe- Marisa anunciou que implantaria “Essa situação nos preocupa, porque também em Rondônia, cruzaram os Domingos (MT).
do país. ças; e uma terceira presta serviços um novo modelo de certificação não existe, até agora, anúncio do go- braços em solidariedade aos colegas Segundo as centrais sindicais e as
Nenhum dos que operavam de acabamento, revisão, arremate para combater o trabalho degra- verno sobre programas de prevenção de Jirau. construtoras, 82 mil trabalhadores de
máquinas de costura tinha car- e controle de qualidade. dante. Novo TAC foi assinado de trabalho escravo, trabalho infantil Entre as queixas dos trabalhadores, obras do Programa de Aceleração do
teira assinada. Foram apreendidas Caracterizadas pelos f iscais em setembro de 2010, responsabi- e violência sexual envolvendo as re- estão diferenças entre os benefícios Crescimento (PAC) pararam para rei-
anotações sobre cobranças de pas- como “pseudoempresas interpos- lizando a empresa por verificar as des de prostituição já denunciadas pagos pelas empresas do consórcio vindicar maiores salários e melhores
sagens da Bolívia para o Brasil e tas”, essas confecções funciona- condições e contratos de trabalho na região”, afirma Marinor. Segundo que toca a obra, maus-tratos por condições de trabalho.
outros descontos ilegais, registra- vam, na avaliação dos auditores, dos empregados de toda a sua ca- ela, a obra deve atrair cerca de 100 parte dos motoristas e seguranças, Como os projetos recebem recursos
dos com termos como “fronteira” “como verdadeiras células de pro- deia produtiva. mil trabalhadores para a área próxi- falta de plano de saúde e os altos do Banco Nacional de Desenvol-
e “documentos” – o que, segundo dução” da Marisa, encobrindo re- Entre os imigrantes libertados ma à usina. No entanto, estima-se preços dos remédios vendidos no vimento Econômico e Social (BN-
a fiscalização, consiste em “fortes lação de emprego, razão pela qual em São Paulo, 16 são bolivianos que, na construção, sejam gerados canteiro de obras. Outras reclama- DES), uma equipe do banco visitou
indícios de tráfico de pessoas”. Há o magazine foi responsabilizado – entre eles um adolescente – e apenas 20 mil empregos diretos e 23 ções dizem respeito aos baixos salá- Jirau 20 dias antes dos conflitos,
registros de salários de R$ 202 e pelas multas e acertos financeiros um peruano. A maioria dos bo- mil indiretos. rios e ao não pagamento de horas sem, no entanto, relatar qualquer
R$ 247, menos da metade do sa- com os empregados da pequena livianos vinha de El Alto, cidade De acordo com a senadora, estariam extras. ­irregularidade.
lário mínimo da época (R$ 510) confecção. vizinha à capital La Paz. Eles dis- criadas condições que podem favo-
e menos de um terço do piso da O magazine recebeu 43 au- seram terem sido atraídos pelas recer o aliciamento de mão de obra

Rian André/Rondoniagora
categoria (R$ 766) em São Paulo. tos de infração, num total de histórias de sucesso de parentes para trabalho degradante. “Na re- Operários da usina de Jirau,
As jornadas de trabalho come- R$  633,6 mil em multas, dos que vieram para o Brasil. O único gião, temos 19 mil desempregados em Rondônia, se rebelaram em
çavam às 7h e se estendiam até quais R$  394 mil se referiam à peruano disse que era de Cusco e e está sendo anunciada a geração de março de 2011, exigindo melhores
21h. As refeições eram feitas de sonegação do Fundo de Garantia não tinha o visto temporário. novos 20 mil empregos. Isso significa
condições de trabalho
modo improvisado, nos fundos do Tempo de Serviço (FGTS). Segundo o Sindicato das Cos- que mais trabalhadores se concen-
do edifício da oficina. O irmão Os auditores também exigiram tureiras de São Paulo e Osasco, o trarão para ficar em situação de vul-
do dono atuava como vigia per- que a empresa fizesse o regis- número de costureiras na região nerabilidade social. Mais trabalha-
manente dos imigrantes. Vários tro e a rescisão dos contratos de caiu de 180 mil, na década de dores se concentrarão numa região
problemas graves de saúde e segu- trabalho, e pagasse os direitos 1990, para cerca de 80 mil, em que já não tem emprego nem sanea-
rança do trabalho foram detecta- ­correspondentes. 2006. Como a demanda do setor mento básico, não tem perspectivas
dos, entre eles instalações elétricas Por conta de denúncias anterio- cresceu muito nesse mesmo perío-

20 
maio de 2011 www.senado.gov.br/emdiscussao
« SUMÁRIO
Realidade brasileira Realidade brasileira

Agronegócio concentra maioria dos casos 1980, pressionada pelos baixos


preços praticados no mercado in-
mente para São Paulo, onde são
explorados por empresários do
grandes obras financiadas pelo
governo. Têm sido encontrados
O agronegócio é o setor da seguro de vida em grupo para es- carvão para a indústria do aço. ternacional, especialmente pelos setor têxtil e de confecções (leia trabalhadores em situações pre-
economia que mais recruta pes- ses trabalhadores e aposentadoria produtos chineses. mais na pág. 17). cárias na construção de hidrelé-
soas para trabalhar em regime aos 25 anos de serviço. Cadeia produtiva Ao mesmo tempo, com a crise Além dessas atividades, o tra- tricas e de estradas, contratados
semelhante ao da escravidão. E “Só nos últimos cinco anos (de Um estudo da ONG Repórter econômica argentina, a migração balho escravo também aparece pelas empresas ganhadoras das
entre as atividades rurais com 2002 a 2007), 1.383 trabalhado- Brasil, elaborado em 2004, seguiu de cidadãos bolivianos foi redi- em um setor que deveria estar licitações ou por seus parceiros
maior número de trabalhadores res morreram na lavoura de cana os caminhos que percorria a pro- recionada para o Brasil, especial- acima de qualquer suspeita: as (leia mais na pág. 19).
resgatados, o desmatamento para e muitos deles, fatigados, tomba- dução das 96 fazendas que cons-
expansão da fronteira agrícola, es- ram em pleno canavial”, afirmou tavam da Lista Suja do Ministério Pecuária ainda concentra maior parte do trabalho escravo
pecialmente na Amazônia, figura à época o senador. do Trabalho na época. E revelou
em primeiro lugar no ranking. O PLS 226/07 está na Comis- que a carne bovina, a cana-de- Nos últimos anos, no entanto, tem sido descoberto que outras atividades fazem uso de mão de obra forçada – antes encontrada
No entanto, segundo Xavier são de Agricultura (CRA) e o se- açúcar, o café, o carvão, a soja, principalmente na Amazônia –, inclusive em grandes cidades do país
Plassat, “a expansão da cana-de- nador Ivo Cassol (PP-RO) foi de- o algodão e a pimenta-do-reino
açúcar para a produção de etanol signado relator. abasteciam 200 empresas nacio- 65%
exacerbou a prática do trabalho A partir de 2007, a proporção nais e estrangeiras, algumas delas Desmatamento e pecuária
escravo desde 2007. O crescimen- de libertados no setor canaviei- entre as maiores do país (veja in-
to do setor sucroalcooleiro e do ro aumentou até atingir quase a fográfico na página ao lado).
agronegócio de grãos no Cerrado, metade do total de trabalhadores Pelo estudo, deve ser questio-
em regiões de nova fronteira agrí- resgatados: 51% em 2007, 49% nada a lógica dessas empresas de 2%
cola, explica boa parte do aumen- em 2008 e 45% em 2009 (leia reduzir os custos de produção Trabalho escravo por Reflorestamento
to observado: metade dos liber- mais na pág. 36 ). sem levar em conta as práticas de atividade econômica
tados de 2009, assim como os de Por causa disso, afirma Plas- fornecedores, que podem estar (2003-2009)
2008 e 2007, foram encontrados sat, a região Norte, que sempre explorando trabalho escravo. 10%
em número reduzido de fazendas liderou o ranking em todas as ca- Carvão
de cana-de-açúcar”. tegorias, agora está sendo supera- Indústria têxtil
Em 2007, o senador Paulo da pelo Sudeste e pelo Nordeste A grande novidade dos últimos
Paim (PT-RS) já alertava para quanto ao número de libertados anos foi a descoberta de que seto-
a gravidade da situação. Ele pe- (veja infográfico na pág. 19). res econômicos utilizam mão de
diu ao Congresso que aprovas- Outra atividade conhecida dos obra escrava de imigrantes vindos
se projeto proposto por ele (PLS que combatem o trabalho escravo de países vizinhos da América La- 8%
226/07) que fixa jornada máxi- são as carvoarias – em geral loca- tina, como a Bolívia. Outra atividade 11%
ma de 40 horas para cortadores lizadas no interior do Maranhão, Um dos setores que mais cres- ou não informado Outras lavouras
de cana, com direito a adicional Minas Gerais, Mato Grosso do cem no Brasil, a indústria têxtil
de 20% por executarem atividade Sul e Mato Grosso –, que operam vive um ambiente extremamente
insalubre e perigosa. Além disso, entre a escravidão e o trabalho competitivo depois da liberali- 1% 3%
a proposta prevê contratação de superexplorado na produção de zação econômica da década de O trabalho escravo Extrativismo Cana-de-açúcar
produz principalmente

café Desmatamento/pecuária

Valter Campanato/ABr
3% Carvão
Em 2006, fiscais do trabalho 3%
75%
apuraram denúncias de Outras
trabalho escravo no corte da açúcar e etanol 20%
lavouras
cana, em Rubiataba (GO)
3%
Outros ou não
Trabalhadores 2%
informado
pimenta-do-reino libertados
Carvão 7%
3%
Outras lavouras 17% 30% Cana-de-açúcar
outros
3% 8%
Outros ou não informado 2% 1%
Reflorestamento 35% Extrativismo
algodão e soja
10% Desmatamento/pecuária
Fonte: Trabalho escravo: 25 anos de denúncia e fiscalização, Xavier Plassat, 2010
carne e leite
80%
Fonte: Trabalho escravo no Brasil, Organização Internacional do Trabalho, 2005
Fonte: Trabalho escravo no Brasil, Organização Internacional do Trabalho, 2005

22 
maio de 2011 www.senado.gov.br/emdiscussao 
23
« SUMÁRIO
Realidade brasileira Realidade brasileira

Perfil dos escravizados tem pobreza, acesso à educação e à informação,


mais da metade deles está em si-
analfabetismo e trabalho infantil tuação irregular no país, fáceis,
portanto, de intimidar com a
Um estudo citado pela Orga- me semelhante ao da escravidão perfaçam apenas 2,5% do contin- ameaça de serem denunciados e
nização Internacional do Traba- são homens. Do total, 40,1% são gente de resgatados. deportados.
lho (OIT), com 121 trabalha- analfabetos. Apenas 27,9% che- As poucas mulheres encon- Além disso, a maioria dos imi-
dores resgatados de quatro esta- garam a cursar os primeiros anos tradas pelos fiscais em geral tra- grantes não fala português, desco-

Bianca Pyl/Repórter Brasil


dos, principalmente Pará e Mato do ensino fundamental, sem, no balhavam como cozinheiras ou nhece a lei brasileira de proteção
Grosso, mostrou que a maioria entanto, completarem o quinto eram esposas de trabalhadores, aos trabalhadores e não mantém
Despesas de viagem e taxas
deles se desloca constantemente e ano (antiga quarta série). Outros muitas acompanhadas de crian- ilegais descontadas dos contato com sindicatos.
apenas 25% residem no estado de 21,2% prosseguiram os estudos, ças, que já ajudavam nas tarefas salários: trabalhador fica Eles ficam, portanto, à mercê
nascimento. mas sem concluírem o ensino domésticas. escravo das dívidas dos intermediários e patrões no
Quase todos começaram a tra- fundamental. que diz respeito a alimentação,
balhar antes dos 16 anos e mais A maioria dos trabalhadores Imigrantes alojamento e tratamento médico.
de um terço, antes dos 11 anos, (63%) estava entre os 18 e 34 A pobreza e baixa escolaridade
em geral para ajudar os pais nas anos no momento do resgate, ida- não explicam apenas a vulnerabi-
fazendas.
Do total de entrevistados, 40%
de em que teriam, em tese, com-
pletado os ensinos fundamental e
lidade dos trabalhadores recruta-
dos no Norte e Nordeste.
Condições de trabalho “desumanas e absurdas”, diz OIT
foram recrutados por meio de médio (veja infográfico abaixo). A Pastoral do Migrante infor- As condições impostas aos traba- vem aplicação de veneno, sem que nos acampamentos na maioria das
amigo ou conhecido e 27%, por Mas é também nessa idade que mou à relatora da ONU sobre lhadores escravizados variam entre sejam fornecidos máscaras, óculos, vezes não é potável: não há poços
meio de agente de recrutamento, estão no auge do vigor físico, ca- Formas Contemporâneas de Es- o desumano e o absurdo, segun- luvas ou qualquer equipamento de artesianos ou instalações sanitárias.
o chamado “gato”, ou diretamen- pazes de executar tarefas pesadas cravidão, Gulnara Shahinian, que do a Organização Internacional do proteção. Depois de semanas nesse Um único córrego é usado para to-
te na fazenda. e extenuantes. há 100 mil bolivianos trabalhan- Trabalho (OIT). Em seu relatório trabalho, os peões ficam com a pele mar banho, cozinhar, lavar panelas
Dados da ONG Repórter Outro dado que chama a aten- do em São Paulo, muitos em con- sobre o trabalho escravo no Brasil, carcomida pelo produto químico, e equipamentos sujos de veneno, e
Brasil informam que 95,5% das ção é o uso de adolescentes no dições análogas à de escravidão. de 2005, a entidade afirma que os com cicatrizes que não curam, além para o gado beber.
pessoas que trabalham em regi- trabalho nas fazendas, ainda que Além da falta de recursos e de piores alojamentos são oferecidos a de tonturas, enjoos e outros sinto- A violência é outro dos itens apon-
quem trabalha na derrubada de flo- mas de intoxicação. tados pela OIT. O relatório de 2005
resta nativa, em locais inacessíveis, Quanto à alimentação, segundo a afirma que, muitas vezes, quando
Vulneráveis, trabalhadores não conseguem escapar do aliciamento sem transporte para voltar à sede da OIT, os próprios peões chamam de os peões reclamam das condições
A maioria dos libertados é formada por homens entre 18 e 34 anos, já que a dureza do trabalho exige pessoas no auge da força física fazenda. Em geral são apenas barra- “cativo” o trabalhador cujas refei- ou querem deixar a fazenda, capa-
cas de lona ou de folhas de palmeira ções são descontadas do salário. O tazes armados os fazem mudar de
Estado de origem Sexo Escolaridade no meio da mata, em que o piso é a dever de honrar essa dívida ilegal ideia. Raros são os resgatados que
própria terra. com o “gato” ou o dono da fazen- não contam histórias de intimida-
Analfabeto 40,14% A assistência à saúde é quase ine- da é uma das principais maneiras de ção, ameaça, agressões e mortes
1º Maranhão 16,01%
xistente, diz o relatório. Na frontei- manter a pessoa escravizada. Já o nos locais de trabalho. Completa-se
2º Pará 10,96% Masculino 5º ano incompleto 27,99%
ra agrícola, doenças tropicais como trabalhador que tem a alimentação então o conjunto de condições que
3º Alagoas 10,39% 95,49% 5º ano completo 7,55% malária e febre amarela são endê- fornecida pelo patrão é chamado de caracteriza o trabalho escravo: en-
4º Pernambuco 10,09% 9º ano incompleto 13,69% micas. Também há alta incidência “livre”. A comida resume-se a feijão dividamento, péssimas condições de
5º Minas Gerais 9,96% Feminino 9º ano completo 3,02% de doenças raras no resto do país, e arroz. A “mistura” (carne) rara- alojamento, alimentação e trabalho,
6º Mato Grosso 7,33% 4,51% como a tuberculose. Quando sofrem mente é fornecida pelos patrões. isolamento geográfico e ameaça à
Ensino médio incompleto 1,80%
7º Bahia 7,00% acidente ou ficam doentes, os tra- A OIT narra que a água que se bebe vida do trabalhador.
Ensino médio completo 1,74% balhadores se tornam estorvo para
8º Tocantins 5,54%
Superior incompleto 0,05% “gatos” (agentes de recrutamento) e

MPF/RO
9º Paraná 3,99%
Ignorado 4,02% patrões e são deixados à própria sor-
10º Piauí 3,90% te. Alguns andam quilômetros até o Libertados em Porto Velho (RO)
trabalhavam em acampamentos
posto de saúde mais próximo. Aque-
improvisados no meio da floresta
Idade* Tempo de trabalho les em estado mais grave esperam
meses até que melhorem, apareça

3 15
alguém que possa levá-los à cidade

meses e
Até 17 anos 2,51%
ou morram. Como os índices de de-
18-24 anos 29,05% semprego são altos nessas regiões,
25-34 anos
35-44 anos 19,73%
33,24%
dias sempre há pessoas para ocupar o
vazio deixado pelos doentes.
45-54 anos 11,43% Nessa realidade, continua a OIT,
é a média de tempo trabalhado itens de segurança são raros ou com-
55 ou mais 3,94% até o momento da libertação
prados pelo próprio trabalhador. Há
Ignorado 0,10% (entre 2002 e 2009)
atividades, como eliminar a juquira
*no momento da libertação (média entre 2007 e 2009) (erva daninha rasteira), que envol-
Fonte: Repórter Brasil, 2011

24 
maio de 2011 www.senado.gov.br/emdiscussao
« SUMÁRIO
Realidade brasileira
prometido. Para começar, o
“gato” informa que eles já es-
tão devendo. O adiantamento,
o transporte e as despesas com
a viagem já foram anotados em
um caderno de dívidas, onde
serão registradas daí por diante
todas as “compras” de comida,
remédios etc, feitas no estabele-
cimento mantido pelo fazendei-
ro. Os gastos também envolvem
a construção de ­a lojamentos.
Além disso, o peão fica sa-
bendo que será cobrado pelo
uso do alojamento e que o cus-
to de todas as ferramentas de
que vai precisar para o traba-
lho – foices, facões, motosser-
ras, entre outros – corre por sua
conta, assim como botas, luvas,
chapéus e roupas, tudo anotado
no caderno a preços muito aci-
ma dos praticados no comércio.
É costume o “gato” não infor-
mar o valor dos produtos, só
anotar, deixando para informar
depois ao trabalhador o mon-
tante da dívida.
Meses se passam sem que o
trabalhador seja pago. Com a
promessa de receber tudo ao
final, ele continua a derrubar
Valter Campanato/ABr

a mata, aplicar veneno, erguer


cercas, roçar os pastos, entre
Cortador de cana de outras tarefas, sempre em situa-
Rubiataba (GO): um ções degradantes e insalubres.
dos raros que usam
equipamentos de segurança
O acordo verbal com o gato
costuma ser quebrado e o peão
recebe um valor bem menor
onde serão prestados os servi- lhadores já estão endividados e que o combinado. No dia do
Trabalho degradante + ços ou em pensões de cidades
­próximas.
devem trabalhar para pagar. pagamento, a dívida do traba-
lhador é maior que o saldo a
dívidas, isolamento e ameaças = escravidão No primeiro contato, são
simpáticos, agradáveis e ofe-
3. Paus de arara
O traslado é feito em ôni-
receber.
Depois de meses, ele con-
recem boas oportunidades de bus em péssimas condições de tinua devedor do “gato” e do
Para a OIT, “todo traba- ra, as etapas da escravização mão de obra usando os cha- trabalho, com garantia de salá- conservação ou por caminhões dono da fazenda e tem de con-
lho escravo é degradante, mas no Brasil compreendem o ali- mados “gatos”. Eles recrutam rio, alojamento e comida. Para improvisados – os paus de ara- tinuar a esforçar-se para quitar
nem todo trabalho degradante ciamento em região distante, o os trabalhadores e servem de seduzir o trabalhador, oferecem ra – sem qualquer segurança. a dívida.
é considerado escravo. O que pagamento antecipado de gas- fachada para que os fazendei- “adiantamentos” para a família Como a f iscalização tem
diferencia um do outro é a pri- tos pelo trabalhador (transpor- ros não sejam responsabilizados e transporte gratuito até o local aumentado, hoje os “gatos” 5. Sem alternativas
vação da liberdade”.São basica- te, alojamento, alimentação) pelo crime. A estratégia se re- do trabalho. emprestam o dinheiro para as Em razão dos laços que man-
mente três os fatores que levam e o transporte até a frente de pete também para os imigran- Há ainda os “peões do tre- passagens, chegando até a alu- têm com os “gatos”, da mobili-
as pessoas a permanecerem tra- ­trabalho. tes: intermediários contratados cho”, que não têm residência gar ônibus de turismo, para dade e da falta de alternativas
balhando como escravos: o en- A instituição registra rela- por empresários brasileiros são fixa, passando de uma frente não serem descobertos. O des- de subsistência, é muito difícil
dividamento (servidão por dí- tos de trabalhadores resgatados enviados a comunidades boli- de trabalho para outra. Nos tino principal são as regiões de que os resgatados deixem em
vida), o isolamento geográfico pela fiscalização sobre o que vianas pobres e recrutam traba- chamados “hotéis peoneiros”, expansão agrícola. definitivo esse tipo de relação
e a ameaça à vida. Não se trata, acontece desde suas cidades até lhadores por meio de anúncios, onde se hospedam à espera de de trabalho degradante.
portanto, de simples descum- as frentes de trabalho: inclusive nas rádios. serviço, são encontrados pelos 4. Servidão por dívida Eles tendem a voltar à mes-
primento das leis trabalhistas, “gatos”, que “compram” suas Ao chegarem ao local do ma situação pela falta de solu-
mas de um conjunto de condi- 1. Terceirização 2. Falsas promessas dívidas (fazem um refinancia- serviço, os trabalhadores são ções a longo prazo, que acenem
ções degradantes. Os empregadores em geral Já os “gatos” buscam ­pessoas mento informal) e os levam às surpreendidos com situações com novas possibilidades de ga-
Segundo a Pastoral da Ter- terceirizam a contratação de em regiões distantes do local fazendas. A partir daí, os traba- completamente diferentes do nhar a vida com dignidade.

26 
maio de 2011 www.senado.gov.br/emdiscussao 
27
« SUMÁRIO
Realidade brasileira

Zé Pereira: 14 anos
em busca de reparação
Em novembro de 2003, terminou com um acordo his- zenda, que lhe deram um tiro na cabeça pelas costas.
tórico o processo de José Pereira Ferreira, o peão que Sangrando, Pereira fingiu-se de morto e foi jogado
foi baleado e quase morto por fugir de uma fazenda em uma fazenda vizinha junto com seu companheiro
no Pará, onde trabalhava como escravo. de fuga, o Paraná, morto na mesma emboscada pelos
O caso foi denunciado pelas organizações não gover- jagunços. Atingido em um dos olhos, caminhou até a
namentais Americas Watch e Centro pela Justiça e o sede da propriedade e pediu socorro. Em Belém, capi-
Direito Internacional (Cejil) à Comissão Interamerica- tal do estado, denunciou as condições de trabalho na
na de Direitos Humanos, da Organização dos Estados fazenda à Polícia Federal. Sem resposta efetiva das
­Americanos (OEA). autoridades, levou o caso às ONGs, que decidiram
No decorrer do processo, em 1995, o Brasil reconhe- apresentar a denúncia à OEA.
ceu pela primeira vez sua responsabilidade pela exis- No acordo que pôs fim ao processo, o Brasil também
tência de trabalho escravo no país e se comprometeu prometeu reparar financeiramente os danos causados
a julgar e punir os responsáveis e a adotar medidas a Zé Pereira, que, 14 anos depois de fugir, recebeu
para prevenir outros casos. a primeira indenização paga pelo Estado brasileiro a
Nascido em São Miguel do Araguaia (GO), Zé Pereira um cidadão por ter
foi para o Pará aos 8 anos, na companhia do pai, que trabalhado em regi-
também trabalhava em fazendas. me de escravidão, no
Ele chegou à Fazenda Espírito Santo, em Sapucaia, no valor de R$ 52 mil. A
Pará, onde trabalhou em condições semelhantes às indenização foi apro-

Adam Zwerner/CC
de escravidão. Em setembro de 1989, com 17 anos, vada pelo Congresso
fugiu dos maus-tratos e caiu em uma emboscada pre- ( n o S e n a d o, P LC
parada pelo “gato” e outros três funcionários da fa- 23/03).
Canteiro de obra em Nanjing, China,
onde lei não reconhece que adulto
Os relatos de Zé Pereira... seja vítima de trabalho escravo

Em tudo semelhante às dos demais resgatados, a história contada por Escravidão resiste e até cresce com
esse goiano, à época com 17 anos, mostra a violência e o isolamento a
que são submetidos os escravizados na fronteira agrícola do país a globalização e a modernidade
Processo na OEA levou Benjamin Skinner, jorna- cipais formas assumidas pela jolos, as minas de carvão e a
A gente trabalhava com eles vigiando nós, armados com espingarda cali- Brasil a decisão histórica: lista e autor do livro A crime escravidão contemporânea são construção civil. A legislação
bre 20. A gente dormia fechado, trancado, trabalhava a semana toda... reconhecer a existência de so monstrous: face-to-face with a prostituição e o trabalho for- chinesa não reconhece homens
Eles não deixavam a gente andar muito, então eu só conhecia o que fazia trabalho escravo no país
modern-day slavery (Um crime çados, este caracterizado como como vítimas de tráfico ou
os que estavam no barraco com a gente. monstruoso: face a face com a servidão por dívida. adultos como vítimas de traba-
moderna escravidão), afirma A escravidão também des- lho escravo. Além disso, a polí-
que o sul da Ásia, em geral, e conhece fronteiras. Segundo a tica de limitação da natalidade,
O “gato” já dizia que nós estávamos devendo muito. A gente trabalhava e eles não falavam o preço
a Índia, em particular, possuem OIT, há escravidão de nativos juntamente com a preferência
que iam pagar pra gente, nem das coisas que a gente comprava deles, nem nada. E aí, nós fugimos de
mais escravos do que todas as e também de estrangeiros em cultural por filhos homens,
madrugada, numa folga que o “gato” deu. Andamos o dia todo dentro da fazenda. Ela era grande.
nações do mundo somadas. quase todos os países. Mulhe- contribui para levar mulheres
Mas a fazenda tinha duas estradas, e nós só sabia de uma. Nessa, que nós ia, eles não passavam. Mas
Segundo Skinner, também res, crianças, indígenas e mi- e crianças ao casamento força-
eles já tinham rodeado pela outra e tinha botado trincheira na frente, tocaia, né. Nós não sabia... Mais
há centenas de milhares, talvez grantes sem documentos são do, o que as deixa vulneráveis
de cinco horas passamos na estrada, perto da mata. E quando nós saímos da mata, fomos surpreendi-
milhões, de escravos na Amé- os principais alvos em todo o à servidão doméstica ou à ex-
dos pelo Chico, que é o “gato”, e mais três, que atiraram no Paraná, nas curvas dele, e ele caiu mor-
rica Latina. O Haiti teria cerca mundo, pela vulnerabilidade ploração sexual. Há evidências
rendo. Eles foram, buscaram uma caminhonete com uma lona e forraram a carroceria. Aí colocaram ele
de 300 mil crianças escravas. social em que se encontram. Os de trabalho infantil forçado em
de bruços e mandaram eu andar. Eu andei uns dez metros e ele atirou em mim.
Elas são oferecidas em troca migrantes que entram de for- fábricas e fazendas, sob pretex-
Pegou por trás. Aí eu caí de bruços e fingi de morto. Eles me pegaram também e me arrastaram, me
de US$  50 nas ruas de Porto ma legal muitas vezes têm seus to de formação profissional. A
colocaram de bruços, junto com o Paraná, me enrolaram na lona. Entraram na caminhonete, andaram
­Príncipe. passaportes confiscados pelos extensão do trabalho escravo
uns 20 quilômetros e jogaram nós na [rodovia] PA-150 em frente da [fazenda] Brasil Verde.
Dezenas de milhares de pes- exploradores. na China não é clara, em parte
soas são traficadas da América Veja as peculiaridades do tra- porque o governo limita a di-
Se eu for submetido a trabalho escravo, eu denuncio tudo de novo. E as pes- Central e do México. Nos Esta- balho escravo em alguns países, vulgação de informações.
soas que forem submetidas a trabalho escravo, acho que não devem se intimi- dos Unidos, a maior parte dos descritas pela OIT.
escravos é mexicana ou lá chega Índia
dar não. A pessoa tem que procurar as autoridades, o sindicato, a CPT, o Mi-
por meio do México. China Milhões de indianos vivem
José Pereira não nistério do Trabalho e denunciar o trabalho escravo, pois isso não pode existir.
se deixa fotografar De acordo com o relatório As atividades econômicas em condição de servidão por
por temer por sua Fonte: Trechos da entrevista concedida por Zé Pereira a Leonardo Sakamoto, global da Organização Inter- que mais utilizam mão de obra dívida. Eles estão em olarias,
segurança da ONG Repórter Brasil. nacional do Trabalho, as prin- forçada são a indústria de ti- moinhos de arroz e na agricul-

28 
maio de 2011 www.senado.gov.br/emdiscussao 
29
« SUMÁRIO
Realidade brasileira Realidade brasileira
Os casos de escravidão na In- crianças de rua, que fre-
glaterra são relatados pela orga- quentemente são força-
nização não governamental Anti- das a trabalhar na pros-
Slavery International, de 1839, tituição ou no crime. A
uma das mais antigas organiza- limitada capacidade das
ções abolicionistas do mundo. instituições do país para
responder à escravidão
México foi ainda mais enfraque-
A maioria das vítimas estran- cida pelos danos do gran-
geiras é proveniente da América de terremoto de janeiro
Central. Além de cartéis de dro- de 2010, que deixou mais
gas mexicanos, redes de crime or- de 200 mil mortos e 1
ganizado de todo o mundo esta- milhão de ­desabrigados.
riam envolvidas em escravidão no
México. Em 2007, o país criou lei Mianmar (antiga
para proibir todas as formas de Birmânia)
escravidão, com penas de prisão Um dos países mais
de seis a 12 anos. Quando a ví- pobres do sudeste asiá-
tima for criança ou mentalmente tico, Mianmar é isolado
incapaz, as penas podem chegar a do Ocidente e limita a
18 anos de prisão. movimentação das pes-
soas. O governo confisca
Estados Unidos terrenos e dinheiro, apre-
O trabalho forçado acontece ende alimentos e proprie-

Courtney Sargent/Cronkite News Service


em serviços domésticos, agricul- dades e persegue religio-
tura, indústria e construção civil. sos. Homens e mulheres
Há casos em que trabalhadores da etnia cristã Chin são

L.A.Sancho/CC
são vítimas recrutadas em outros frequentemente usados
países, principalmente da Amé- para limpar campos mi-
rica Latina, e pagam para obter nados. Em certas áre-
Milhares de sudaneses fugidos da guerra civil, da violência e da escravidão se abrigaram na vizinha República Centro-Africana emprego nos EUA, o que os torna as, o exército construiu
vulneráveis à servidão por dívi- templos usando trabalho
tura. Crianças são submetidas a lado a diversas milícias armadas vezes por ano. A legislação anties- da. Entre os norte-americanos, o ­forçado.
trabalho forçado como operárias, no sul do Sudão. Contudo, o go- cravidão do país, de 2002, proíbe trabalho degradante ocorre mais Migrantes atravessam a
empregadas domésticas, trabalha- verno não reconhece que trabalho trabalho escravo tanto para explo- sob a forma de escravidão sexual fronteira do México para os
dores agrícolas ou mendigos. Há ou prostituição forçados existam ração sexual como para trabalho do que de trabalho forçado. O Casal fabrica biscoitos de EUA, onde ficam expostos a
barro, gordura e sal em trabalhos forçados
leis proibindo o tráfico sexual, o no país. forçado, e prevê penas de dois a país, no entanto, proíbe todas as Cité Soleil, bairro pobre de
trabalho forçado e o trabalho in- dez anos de prisão. formas de escravidão por meio Porto Príncipe, Haiti
fantil, com penas que vão de sete Suécia de leis aprovadas há quase
anos de reclusão à prisão perpé- É destino e país de trânsito Reino Unido 150 anos. As penas hoje
tua. Mas condenações por traba- para mulheres e crianças vítimas Todas as formas de escravidão variam de cinco anos de
lho escravo são raras, em razão de de tráfico de pessoas, principal- são proibidas, com penas que po- reclusão à prisão perpétua.
tribunais sobrecarregados e falta mente para prostituição forçada. dem chegar a 14 anos de prisão. Apesar da proteção federal
de comprometimento de autori- Em muitos casos, as vítimas pen- Ainda assim, crianças britâni- às vítimas, apenas nove
dades locais. sam que trabalharão como dan- cas são escravizadas no país para dos 50 estados oferecem
çarinas, por exemplo, mas depois prostituição e estrangeiros são benefícios públicos às víti-
Sudão seus documentos são confiscados obrigados a mendigar ou rou- mas de escravidão.
Milhares de sudaneses foram e sofrem ameaças de abuso sexu- bar. Migrantes são submetidos a
sequestrados e escravizados du- al para que aceitem se prostituir. trabalhos forçados na agricultu- Haiti
rante a última guerra civil no O país tem também casos de ho- ra, construção civil, indústria de A maioria dos casos de
país. Trabalho forçado doméstico, mens, mulheres e crianças traba- alimentos e serviços domésticos. escravidão é encontrada
na agricultura e na pecuária foi lhando de maneira forçada em Crianças vietnamitas e chinesas entre os cerca de 225 mil
o destino de crianças, homens e serviços domésticos, restaurantes, são envolvidas em servidão por restavecs (do francês rester
mulheres, as quais também foram estradas, construção e jardina- dívida pelo crime organizado e avec, “ficar com”) – fi-
submetidas à exploração sexual. gem. Pessoas do leste europeu obrigadas a trabalhar no cultivo lhos de pais pobres entre-

Alexandre Girão/Senado Federal


Adultos e, principalmente, crian- também são encontradas mendi- de Cannabis. gues a famílias mais ricas.
ças foram recrutados à força, por gando ou roubando na Suécia a O governo, no entanto, adota Existem ainda cerca de 3
praticamente todos os grupos ar- mando de máfias. Turismo sexual política de não penalizar vítimas mil restavecs haitianos na
mados envolvidos no conflito, in- é outro grande problema: estima- de escravização ou tráfico huma- vizinha República Domi-
clusive as forças governamentais. se que os suecos que viajam ao es- no, já que muitas delas continu- nicana. Restavecs fugitivos
Um número estimado de 10 mil trangeiro compram serviços sexu- am a ser processadas por crimes compõem proporção sig-
crianças ainda se encontra vincu- ais de crianças entre 4 mil e 5 mil de imigração. nificativa da população de

30 
maio de 2011 www.senado.gov.br/emdiscussao 
31
« SUMÁRIO
Ações de combate

J. R. Ripper/Imagens Humanas
Dezembro de 2001:
Polícia Federal acompanha
fiscalização e liberta
escravizados da fazenda
Tuerê, em Senador José
Porfírio, Pará

Governo precisou O
Estado brasileiro só Na iminência de receber uma instituiu o Grupo Especial de Fis-
se moveu para com- sanção internacional por conta do calização Móvel (GEFM), que se
bater o trabalho es- caso Zé Pereira (leia mais na pág. transformou no mais importante
cravo empurrado pela 28), o Estado finalmente acor- instrumento de repressão aos es-

de 25 anos para agir


sociedade civil. Entre as primeiras dou. Em 1995, o então presidente cravagistas. Hoje, o país chega a
denúncias feitas por dom Pedro Fernando Henrique Cardoso re- ser referência para o mundo nesse
Casaldáliga, então bispo de São conheceu oficialmente o proble- combate.
Félix do Araguaia (MT) – em ma e tomou as providências para Jamais a sociedade civil esteve
meio à ditadura militar, no início a criação de uma estrutura que, longe desse processo. Por meio de
da década de 1970 – e o compro- com ajustes e avanços alcançados entidades como a Comissão Pas-
Mesmo confrontado pelas denúncias, que misso com a Comissão Intera- no governo Lula, se mantém na toral da Terra (CPT) e a ONG
começaram na década de 1970, o país só mericana de Direitos Humanos linha de frente no combate à es- Repórter Brasil, colaborou ativa-
(CIDH) da Organização dos Es- cravização da mão de obra. mente para os resultados que o
reconheceu o problema em 1995, perante a OEA tados Americanos (OEA) – em Para planejar as ações, Fernan- país começou a colher. E como
que o país reconheceu a existên- do Henrique criou o Grupo Exe- ficou claro na audiência pública
cia da escravidão no seu territó- cutivo de Repressão ao Trabalho no Senado, continua sendo fun-
rio, em meados dos anos 1990 –, Forçado (Gertraf ), substituído damental para cobrar iniciativas
passaram-se quase 25 anos de si- em 2003 pela Comissão Nacio- do governo. Afinal, para eliminar
lêncio e omissão por parte de go- nal para a Erradicação do Traba- o trabalho escravo, o Brasil ainda
vernos e poderes públicos. lho Escravo (Conatrae). Também tem muito o que fazer.

32 
maio de 2011 www.senado.gov.br/emdiscussao 
33
« SUMÁRIO
Ações de combate

Apenas 50% dos casos garantir que pessoas e comunida-


des sem ­condição de pagar advo-
gados tenham acesso à Justiça.

denunciados são investigados Papel dos parceiros


Responsável pelas operações de
campo destinadas a resgatar tra-

N o centro do combate à es-


cravização da mão de obra
no Brasil está o Grupo Especial
O MTE conta com cerca de
3 mil auditores para fiscalizar as
relações de trabalho, no campo
va para dar apoio aos auditores”,
contou.
No MPT, a história é um
balhadores escravos, o Grupo Es-
pecial de Fiscalização Móvel nor-
malmente parte de denúncias que
de Fiscalização Móvel (GEFM), e na cidade, em todo o Brasil. ­pouco difere­nte. Nos últimos cin- chegam às delegacias regionais do
ligado à Secretaria de Inspeção Desse total, apenas 25 pessoas es- co anos, foram preenchidos por trabalho, à polícia ou a entidades
do Trabalho (SIT) do Ministério tão diretamente envolvidas com concursos públicos 300 cargos da sociedade civil (veja infográfico
do Trabalho e Emprego (MTE). a ação das cinco equipes móveis de procurador do trabalho, o que ao lado). O planejamento e a sur-

Renato Alves/MTE
Ele é formado por auditores fis- que compõem o GEFM. Há tam- praticamente dobrou o tamanho presa são fatores decisivos para o Auditores do MTE evitam ser
identificados em fotos: eles
cais do trabalho – que coorde- bém equipes como essas nas supe- da categoria. Atualmente, o MPT sucesso das ações. temem por sua segurança
nam as operações de campo –, rintendências regionais do MTE conta com 735 procuradores do Cada integrante das equipes
policiais federais e procuradores nos estados onde historicamente trabalho em todo o país, lotados móveis tem um papel específico.
do Ministério Público do Traba- é maior a incidência do trabalho na Procuradoria-Geral (Brasília), Os auditores fiscais do trabalho
lho (MPT). escravo. em 24 procuradorias regionais coordenam as ações e se encar-
Criado em 1995, o grupo foi Segundo o ministério, hou- instaladas em capitais e em cem regam dos autos de infração – Grupo móvel de fiscalização atua a partir de denúncias
essencial para que a OIT reco- ve ao longo dos anos um cresci- procuradorias em ­municípios. ­documentos oficiais que geram,
A maior parte delas é feita por familiares dos trabalhadores
nhecesse o Brasil como referên- mento no número de auditores Em cada procuradoria regio- por exemplo, indenizações ime-
cia na luta contra a exploração da destacados para o combate a esse nal, há coordenações dedicadas diatas para os trabalhadores e escravizados e por aqueles que conseguiram escapar
mão de obra escrava (leia mais na tipo de crime. Mas a opinião não exclusivamente aos casos de tra- processos administrativos para in-
pág. 45). é compartilhada pelo Sindicato balho escravo, com dois procu- clusão dos infratores na Lista Suja Denúncias
No entanto, depois de quase Nacional dos Auditores Fiscais do radores em cada núcleo. Ou seja, do trabalho escravo (leia mais na
40 mil trabalhadores libertados Trabalho (­ Sinait). são 48 procuradores do trabalho pág. 40). Aos procuradores do Quem denuncia Quem recebe as denúncias
em 16 anos de atuação, o GEFM “O número de fiscais do traba- debruçados sobre a questão. Mas trabalho cabe o apoio aos audito- • Vítimas • Delegacias do Trabalho e suas unidades no interior
tem hoje uma estrutura ainda pe- lho já foi de 3.464. As equipes de assim como o MTE, o MPT ain- res fiscais e, posteriormente, o en- • Familiares • Secretaria de Inspeção do Trabalho (SIT) – Brasília
quena comparada ao tamanho do trabalho escravo já foram nove”, da precisa melhorar muito sua es- caminhamento de ações civis pú- • Comissão Pastoral da Terra • Polícia Federal
problema. lamentou o senador Cristovam trutura administrativa. “Um dos blicas à Justiça trabalhista, com o • Entidades sindicais e ONGs • Comissão de Direitos Humanos da Câmara
Buarque (PDT-DF), destacando problemas mais graves é o déficit objetivo de obter o pagamento de dos Deputados
na audiência pública as preocu- de servidores em relação ao nú- multas e novas indenizações. • Secretaria Nacional de Direitos Humanos
SINAIT

pações do sindicato. “Os grupos mero de procuradores do traba- Os policiais federais garantem • Meios de comunicação
móveis hoje organizados não dão lho”, explica Débora Tito, que di- a segurança das equipes e atuam
conta. Apenas 50% das denúncias rige a Coordenadoria Nacional de como polícia judiciária, colhendo Apuração
são apuradas”, estimou o subpro- Erradicação do Trabalho Escravo provas para o Ministério Público
curador-geral do Trabalho Luis (Conaete), órgão do MPT. Federal (MPF), responsável por Quem apura O que é apurado
Antonio Camargo de Melo, que Na audiência, o deputado mover ações penais contra os em- • Ministério do Trabalho e Emprego e Polícia • Condições gerais, inclusive para apuração de crime pela
representou o Ministério Público Amauri Teixeira também des- pregadores. A Polícia Rodoviária Federal, no âmbito de suas competências Polícia Federal
do Trabalho no encontro (veja os tacou a importância de tornar Federal também é parceira cons- • Ministério Público do Trabalho • Relações de trabalho
dados na pág. 16). a Defensoria Pública da União tante do GEFM na segurança dos • Ministério Público Federal • Condições de segurança e saúde
Ampliando as reivindicações (DPU) mais presente nas ques- fiscais. Eventualmente, integran- • Trabalho de crianças e adolescentes
do Sinait, o deputado Amauri tões relativas ao trabalho escravo. tes de outros órgãos públicos são
Teixeira (PT-BA) pediu o fortale- “Nós temos que entender que não convidados para essas ações.
cimento da estrutura do MTE. é possível garantir a dignidade Uma operação da equipe móvel Ações
“Não adianta aumentar apenas da pessoa humana sem fortale- pode durar dias. O grupo só dei- Providências imediatas Desdobramentos
o quadro de auditores fiscais. Eu cer a Defensoria Pública”, disse. xa a propriedade depois de apurar
conversei recentemente com a su- A DPU tem hoje 57 unidades no todas as irregularidades e de se- • Lavratura de autos de infração, interdição e O relatório da operação é encaminhado para:
perintendente do Ministério do país – mais de uma sede por es- rem pagas as indenizações traba- notificação • Ministério Público Federal
Trabalho na Bahia e ela me dizia tado –, 477 defensores públicos lhistas. O trabalhador tem seus • Regularização da situação trabalhista • Ministério Público do Trabalho
que o seu quadro administrativo federais e 978 servidores. Não há direitos registrados em carteira e, (pagamento de todas as obrigações) • Incra
está se esvaziando, que ela não uma coordenação nacional do ór- se não possuir o documento, ele • Retirada dos trabalhadores que quiserem sair • Polícia Federal
tem musculatura administrati- gão para atuação sobre o trabalho é providenciado no local. A ação • Prisão, quando for o caso, do proprietário, • Delegacia regional do Trabalho onde a ação foi realizada
escravo, mas intervenções pon- no campo se encerra com o ca- gerente ou aliciador • Denunciante
Sindicato dos auditores do trabalho tuais em alguns estados. A De- dastramento e o transporte dos
participa do esforço para aumentar o Fonte: Ministério do Trabalho e Emprego
percentual de denúncias apuradas
fensoria foi criada em 1995 para trabalhadores para seus locais de
origem (leia mais na pág. 42).

34 
maio de 2011 www.senado.gov.br/emdiscussao 
35
« SUMÁRIO
Ações de combate Ações de combate

Flexa Ribeiro (esq.), Jarbas Vasconcelos,

Caso Pagrisa testou os


Cícero Lucena, Kátia Abreu e Romeu Tuma
visitaram instalações da Pagrisa em 2007

limites da fiscalização
E m junho de 2007, no que foi
o mais rumoroso e controver-
tido trabalho de um grupo móvel
ção encontrada entre 28 de junho
e 8 de julho de 2007.
O documento afirma que “a
e os alojamentos também eram
­precários.
A fiscalização constatou ainda
de fiscalização do Ministério do empresa não garantia o salário que os funcionários trabalhavam
Trabalho e Emprego, foram fla- mínimo aos empregados que re- sem equipamentos de proteção,
grados, segundo os fiscais, 1.064 cebiam por produtividade. Tal como óculos e luvas. E recebeu
trabalhadores em condições se- fato, somado aos descontos de denúncias dos trabalhadores de
melhantes à da escravidão na em- alimentação e de medicamentos que, no dia da chegada dos fis-
presa Pará Pastoril e que os empregados consumiam, cais, a empresa distribuíra rapida-
A principal Agrícola (Pagrisa), fazia com que, em muitos casos, mente equipamentos de proteção.
atividade da em Ulianópolis (PA). empregados recebessem apenas Também foi registrado no relató-

MTE
fazenda Pagrisa, A empresa foi au- o suficiente para pagar seus gas- rio que a maioria dos funcioná-
com 17 mil tuada e os trabalha- tos. Não eram raros os casos de rios tinha infecções intestinais em
hectares, é o dores, libertados. obreiros que não produziram o razão de alimentos deteriorados. cionalmente e os proprietários sou os senadores da comissão es- Federal do Pará instaurou proces-
cultivo de cana. Ela A ação foi execu- suficiente para custear as despesas A própria empresa teria admi- da Pagrisa reclamaram do que pecial de “desqualificar, de ­forma so criminal contra a empresa.
produzia à época
tada por auditores de alimentação, o que levou a em- tido que “o ambulatório médico ­c onsideraram excessos cometi- preliminar, o trabalho realizado O então presidente da comis-
das autuações 300
mil litros de álcool
fiscais do trabalho, presa a criar a rubrica crédito de registrou 38 casos de sintomas dos pela fiscalização. E refutaram pelo grupo móvel” e, em nota, são externa, senador Jarbas Vas-
por dia, vendidos à acompanhados pela complementação de salário, para de diarréia que poderiam estar as informações do relatório do de estarem “alinhados aos inte- concelos (PMDB-PE), anunciou a
Petrobras e a outras Polícia Federal e pelo que os holerites não gerassem va- relacionados à alimentação”. Os MTE. Além disso, argumentaram resses da empresa”. Flexa Ribeiro realização de audiências públicas
empresas. Ministério Público lor negativo de salário", diz o re- alojamentos foram considerados que os trabalhadores recebiam respondeu que a comissão era su- para ouvir testemunhas e desta-
do Trabalho. latório. superlotados. “Em lugares com seus salários normalmente e que prapartidária e que os integrantes cou que os documentos apresen-
O relatório do Os créditos eram desconta- capacidade para 30 trabalhadores, o grupo móvel se ateve a detalhes, só estavam comprometidos com a tados por Lupi seriam analisados.
MTE sobre as condições de tra- dos no mês seguinte. Além disso, foram alojados 50 obreiros.” como erros em contracheques, apuração da verdade.
balho na Pagrisa descreve a situa- acrescenta o relatório, a higiene O fato repercutiu interna- para embasar as acusações. Por sua vez, o então senador Paralisação
Jefferson Péres e o senador Edu- A necessidade da retomada dos
Auditoria em xeque ardo Suplicy (PT-SP) disseram trabalhos, paralisados pela Secre-
MTE

A queixa levou um grupo de que a fiscalização foi feita por 13 taria de Inspeção do Trabalho do
Fotos do relatório dos
auditores do trabalho senadores, liderados por Flexa Ri- agentes públicos, inclusive um re- MTE por conta de “interferências
mostram situação dos beiro (PSDB-PA), a criarem em presentante do Ministério Público políticas”, levou José Nery e ou-
trabalhadores na Pagrisa agosto de 2007 uma comissão do Trabalho, dois meses antes da tros cinco senadores a um encon-
especial para investigar o caso. O visita dos senadores da comissão tro com Lupi e outras autoridades
então senador Romeu Tuma e ou- especial, que podem ter encon- da área. O ministro afirmou que
tros quatro senadores da comissão trado a situação já regularizada e, as ações do grupo se basearam na
que visitaram a usina decidiram por isso, sem problemas. legislação e não em conveniências
pedir abertura de inquérito na Po- Cristovam Buarque observou políticas e criticou a “tentativa de
lícia Federal para apurar o proce- que os fiscais documentaram o desqualificar o trabalho”.
dimento dos inspetores do MTE. trabalho na usina, mostrando A fiscalização lavrou 23 autos
A senadora K át ia A breu que, de acordo com a folha de de infração e obrigou a Pagrisa a
(DEM-TO), então relatora da co- pagamento da Pagrisa, os empre- pagar R$ 1,15 milhão em direitos
missão, informou que, após a visi- gados da empresa não recebiam trabalhistas devidos. A empresa
ta, os senadores deveriam realizar mais do que R$ 175,68 mensais. foi também incluída no Cadas-
audiências com as partes envolvi- Em 27 de setembro de 2007, tro de Empregadores que tenham
das, uma vez que não ficaram evi- o próprio ministro do Trabalho mantido trabalhadores em con-
dentes sinais de trabalho análogo e Emprego, Carlos Lupi, esteve dição análoga à de escravo (Lis-
à escravidão. “Ao contrário, a em- na Subcomissão Temporária de ta Suja), mas recorreu à Justiça
presa é muito bem administrada e Combate ao Trabalho Escravo, da punição. Em maio de 2009,
forma uma comunidade de traba- da Comissão de Direitos Huma- o Superior Tribunal de Justiça
lhadores rurais”, disse. nos (CDH), para apresentar do- (STJ) negou, por unanimidade, o
O então senador e presidente cumentos, fotos e depoimentos mandado de segurança impetrado
da Subcomissão do Trabalho Es- incluídos no relatório da fiscaliza- pela empresa e manteve a Pagrisa
cravo do Senado, José Nery, acu- ção. Segundo o ministro, a Justiça na Lista Suja.

36 
maio de 2011 www.senado.gov.br/emdiscussao 
37
« SUMÁRIO
Ações de combate Ações de combate

Sete anos depois, assassinos de

Agência Brasil
cebido R$ 50 mil do empresário,
que teve como intermediário José

fiscais ainda não foram julgados Alberto de Castro, empregado de


Pimenta.
Atualmente, apenas estes cin-
co estão presos em uma peniten-

E mboscados em uma estrada


da zona rural de Unaí (cida-
de mineira a 200 quilômetros do
Gerais, foram mortos com tiros
na cabeça, em uma ação rápida,
profissional.
rio, eleito prefeito de Unaí pela
primeira vez no mesmo ano da
chacina, hoje exerce seu segundo
ciária na região metropolitana de
Belo Horizonte. Os outros quatro
envolvidos – Pimenta, os irmãos
Distrito Federal) por volta das O crime ocorreu em 28 de ja- mandato. Mânica e Humberto R ibeiro
8h, os auditores fiscais do traba- neiro de 2004, mas, até hoje, os O delegado da Polícia Fede- dos Santos –, acusados de serem
lho Eratóstenes de Almeida Gon- envolvidos na chacina de Unaí ral Antônio Celso, responsável mandantes, estão em liberdade.
çalves, de 42 anos, João Batista não foram a julgamento, ape- pelas investigações, revelou seis De acordo com Francisco Pinhei-
Soares Lage, 50, Nelson José da sar de, apenas seis meses depois, meses depois do assassinato que ro, Norberto Mânica seria credor
Silva, 52, e o motorista Ailton nove pessoas já estarem indicia- o crime fora negociado pelo em- de uma dívida de Hugo Pimenta
Pereira de Oliveira, 52, servido- das, sendo dois deles grandes presário Hugo Alves Pimenta. Os no valor de R$ 180 milhões.
res do Ministério do Trabalho e fazendeiros da região: os irmãos ­e xecutores, Francisco Elder Pi-
Confissão Então presidente da República em
Emprego que investigavam de- Antério e Norberto Mânica. Eles nheiro, de 68 anos, Erinaldo Sil- exercício, José Alencar assina a Lei
núncias de trabalho escravo na negam qualquer relação com va, 41, Rogério Alan Rios, 24, e Os executores confessaram o 12.064/09, que criou o Dia Nacional de
zona rural do noroeste de Minas a morte dos servidores. Anté- William Miranda, 22, teriam re- crime após serem detidos na Su- Combate ao Trabalho Escravo
perintendência da Polícia Federal,
em Brasília, em julho de 2004,
durante operação para desmontar direito de aguardar o julgamento agora não há mais possibilidade
uma quadrilha de roubo de car- em liberdade. Pimenta e Norber- de recurso aos tribunais superio-
Policiais rebocam picape em que gas no município goiano de For- to Mânica ainda chegaram a ser res para os acusados. Nossa prin-
morreram três auditores do trabalho e o
motorista, numa emboscada preparada
mosa. Quando foram presos, um presos novamente em 2006 acu- cipal cobrança é que o processo
por fazendeiros, segundo o MP deles portava o relógio e o celular sados de tentar comprar o silêncio retorne o mais rápido possível
de uma das vítimas da chacina de dos pistoleiros e de testemunhas. para Belo Horizonte, e que o jul-
Unaí. Eles contaram que, no dia No entanto, voltaram a ser soltos gamento ocorra lá”, afirmou.
do crime, pararam o carro para por força de habeas corpus.
pedir informações e, em seguida, “Esperamos um julgamento Indenização
anunciaram um assalto e dispara- mais célere desse caso, grave, que Além de acompanhar o crime
ram contra as vítimas. representou um ataque ao Estado e o processo na Justiça, Câmara
Pelos depoimentos, apenas de direito, contra fiscais no exer- e Senado aprovaram, em 2005,
Nelson José da Silva deveria ter cício de suas funções, com grande auxílio financeiro às famílias dos
sido assassinado, por ser um fis- repercussão internacional. O Mi- três auditores fiscais e do moto-
cal rigoroso, que aplicava muitas nistério Público, desde a decisão rista do Ministério do Trabalho
multas. Em relatório de 2003, do juiz federal, em dezembro de proposta pelo governo federal
Nelson informou ter sido amea- 2004, não interpôs qualquer re- (Lei 11.263/06). A União pagou
çado por Norberto Mânica. curso desse tipo”, afirmou a Em R$ 200 mil por servidor, divi-
Segundo a denúncia feita em discussão! a procuradora da Re- dido entre seus dependentes, e
2006 pela Procuradoria da Re- pública em Minas Gerais, Mirian bolsa de R$ 400 aos dependentes
pública, “Norberto, sentindo-se Lima, responsável pelo caso. que forem estudantes.
prejudicado pela ação da fiscali- Segundo ela, não há recursos Em 29 de outubro de 2009, o
zação trabalhista em suas fazen- ou embargos pendentes de julga- projeto de lei (PLS 571/07) do
das, prometeu matar o fiscal do mento. Agora, ela espera que os então senador José Nery que ins-
trabalho Nelson”. autos do processo retornem à 9ª titui o dia 28 de janeiro como o
Em dezembro de 2004, o juiz Vara federal, em Belo Horizonte, Dia Nacional de Combate ao Tra-
federal da 9ª Vara de Belo Hori- para a realização do julgamento. balho Escravo foi sancionado pelo
zonte desmembrou o processo de A presidente do Sindicato Na- ex-vice-presidente José Alencar. A
Antério Mânica, por ser prefeito cional dos Auditores Fiscais do Lei 12.064/09 também criou a
e ter direito a julgamento em foro Trabalho, Rosângela Rassy, em Semana Nacional de Combate ao
especial, e decretou a prisão pre- entrevista à ONG Repórter Bra- Trabalho Escravo, que incluirá o
ventiva dos réus, que devem ir a sil, disse que, agora, está otimis- dia 28 de janeiro. Desde então, já
Ivaldo Cavalcante

júri popular. Mânica somente será ta. “Na nossa mais recente mani- foram realizadas duas edições do
julgado depois dos demais réus. festação, usamos balões brancos. evento, a última encerrada com a
Os acusados de serem os man- Antes, só usávamos balões pretos audiência pública que deu origem
dantes, porém, conseguiram o porque não víamos caminhos. E a esta revista.

38 
maio de 2011 www.senado.gov.br/emdiscussao 
39
« SUMÁRIO
Ações de combate Ações de combate

J. Freitas
Lista Suja é pedagógica, diz MPT
Luiz Machado, da
OIT: pessoas e
empresas compram,
sem saber, daqueles
que exploram o
trabalho escravo

A o lado das operações de cam-


po coordenadas pelo Grupo
Especial de Fiscalização Móvel,
contra o trabalho escravo”, afirma
a procuradora do Ministério Pú-
blico do Trabalho (MPT) Débo-
quem figura na relação. Tudo
começou com a pesquisa sobre
a Cadeia Produtiva do Trabalho
o Estado brasileiro conta com ra Tito. Segundo ela, a Lista Suja Escravo, realizada em parceria
outra arma poderosa no combate impõe prejuízos financeiros e de pela ONG Repórter Brasil e pelo
ao trabalho escravo: o Cadastro imagem às empresas, que bus- escritório da OIT no país, tendo
de Empregadores flagrados utili- cavam justamente baratear seus a Lista Suja como base.
zando mão de obra em condições custos de produção ao escravizar “Depois desse estudo, verifi- Marca do Pacto Nacional: em 2008,
análogas à escravidão. Também a mão de obra. “A empresa perde camos que grandes empresas que acordo reunia um quinto do PIB
conhecido como Lista Suja, o ca- investimentos e o direito a finan- estão na outra ponta da cadeia –
dastro, mantido pelo Ministério ciamentos públicos. A portaria varejistas, distribuidores de com- Rural (SNCR) a pessoas ou em- irregular pelo menos 55 emprés- nais O Estado de S. Paulo e Folha
do Trabalho e Emprego (MTE), 540 não obriga os bancos a não bustíveis, multinacionais – com- presas inscritas na Lista Suja. timos, no valor total de R$ 8 mi- de S. Paulo no início de abril.
relaciona no momento 210 pesso- financiarem [os infratores], mas a pravam do trabalho escravo, às lhões, a 18 propriedades rurais
as físicas e jurídicas de 17 estados repercussão social acaba fazendo vezes até sem saber”, disse Luiz Contrassenso no Pará – quatro delas com casos Maranhão
(veja infográfico na pág. 41). efeito”. Machado, representante da OIT, A existência do cadastro e a de trabalho análogo à escravidão. Um dos maiores fornecedores
Embora não tenha sido cria- Débora Tito ressalta que a in- na audiência pública. norma baixada pelo CMN tor- Em outra ação, o Ministério Pú- de mão de obra escrava do Bra-
do por uma lei, mas pela porta- clusão de um empresário ou pro- Com base nos resultados da nam ainda mais surpreendente o blico denuncia 37 financiamentos sil, o Maranhão tem desde 2007
ria 540 do MTE, de outubro de prietário no cadastro é feita de pesquisa, OIT e Instituto Ethos fato de o Ministério Público Fe- liberados pelo Banco da Amazô- a Lei 8.566, que impõe diver-
2004, o instrumento visa impe- maneira responsável. Cada auto de Empresas e Responsabilidade deral no Pará estar processando nia no valor de R$ 18 milhões. sas sanções a empresas incluídas
dir que os proprietários incluídos de infração expedido nas opera- Social entraram em contato com o Banco do Brasil, o Banco da O Incra também é acusado de na Lista Suja do Ministério do
na lista recebam financiamentos ções das equipes móveis dá início diversas companhias alertando Amazônia e o Incra por conta ineficiência na emissão do Cer- Trabalho. Os infratores não po-
­públicos. a um processo administrativo no para a existência de trabalho es- de financiamentos concedidos a tificado de Cadastro de Imóvel dem, por exemplo, participar de li-
Também mancha a credibili- Ministério do Trabalho com di- cravo em sua cadeia de abasteci- proprietários rurais supostamente Rural (CCIR), um dos documen- citações da administração estadu-
dade das empresas e produtores reito a contraditório, ampla defe- mento. com diversas irregularidades no tos exigidos pelo Banco Central al, nem receber benefícios fiscais
cujos nomes ficam estampados na sa e duplo grau de recurso para o Assim, surgiu em maio de currículo – desmatamento ilegal e e pelo Conselho Monetário Na- do governo do estado. As penali-
relação, que pode ser acessada no empregador. 2005 o Pacto Nacional pela Erra- trabalho escravo entre elas. cional para liberação de financia- dades têm duração de cinco anos,
site do MTE, junto com os CPFs Vencidos os recursos, o nome dicação do Trabalho Escravo. O O MPF acusa o Banco do mentos a propriedades rurais. a partir da inclusão do emprega-
e CNPJs dos infratores, além do do infrator é lançado no cadastro, acordo envolve compromissos por Brasil de ter concedido de forma O caso foi noticiado pelos jor- dor no cadastro.
número de trabalhadores resgata- onde fica por pelo menos dois parte das empresas signatárias,
dos em cada propriedade. anos, período em que é monitora- que incorporam exigências contra
“É a melhor sanção ­pedagógica do pelo MTE. Se ao final desses o trabalho forçado em seus con- Cadastro de infratores, criado em 2004, reúne 210 nomes de 17 estados
dois anos, o empresário ou produ- tratos de compra e venda.
tor cumprir suas obrigações e não Segundo o relatório global da O Pará segue sendo o estado com o maior número de empregadores na lista, assim como o de trabalhadores resgatados
Ádria de Souza/Pref.Olinda

reincidir, ele sai do cadastro. OIT O Custo da Coerção, de


A atualização da lista é feita 2009, o pacto reunia em julho de
semestralmente pelo MTE. Na 2008 mais de 180 integrantes, en-
última, em dezembro de 2010, 14 tre “grandes cadeias de supermer-
nomes foram retirados por terem cados, grupos industriais e finan- 1 60
preenchido os requisitos neces- ceiros, totalizando um quinto do 21 5
sários e um deixou a relação por produto interno bruto do Brasil”. 10
1
força de liminar da Justiça. O cumprimento do acordo é A Lista Suja é atualizada semestralmente
Ao mesmo tempo, outro pro- acompanhado permanentemen- 2
prietário foi reincluído por conta te por entidades como o Institu- 21 10
19 A inclusão do nome do infrator ocorre após decisão administrativa
da suspensão de sua liminar e 88 to Ethos. Há inclusive o caso de do MTE, da qual cabe recurso também administrativo
15
novos empregadores ingressaram uma companhia excluída da lista
no cadastro. O estado com maior de signatários em julho de 2008 5 Podem ser excluídos os nomes daqueles que, ao longo de dois anos,
Total por região: 20
número de nomes é o Pará, com por utilizar trabalho forçado e de- não reincidirem e corrigirem os problemas encontrados pelos fiscais
Norte: 84 2
60. Dos 210 que hoje integram a
lista, 22 estão lá desde 2004, ano
gradante.
Outro desdobramento impor- Nordeste: 47 .
Centro-Oeste: 54 6
Em geral, os infratores permanecem na lista porque:
em que ela foi criada. tante do Cadastro de Empregado- • não quitam as multas impostas
De acordo com o MTE, além res partiu do Conselho Monetário Sudeste: 7
Sul: 18 8 • reincidem na exploração do trabalho escravo
de barrar os financiamentos pú- Nacional (CMN) que, em junho 4
de 2010, vedou a concessão de Total: 210 infratores
blicos, a lista é utilizada por
Débora Tito ressalta que a inclusão de grandes empreendedores nacio- financiamentos pelas instituições
pessoa ou empresa na Lista Suja é feita nais, que não comercializam com do Sistema Nacional de Crédito Fonte: Ministério do Trabalho e Emprego
de modo responsável

40 
maio de 2011 www.senado.gov.br/emdiscussao 
41
« SUMÁRIO
Ações de combate Ações de combate

É preciso ir além da repressão como incidência de trabalho es-


cravo e presença, nos municípios,
de unidades do Sistema Nacional
O ministério também reali-
za, desde 2009, programa-piloto
de qualificação e reinserção de
Existem ainda outras iniciativas
tocadas em parceria ou exclusiva-
mente por organizações da socie-

e prevenir o aliciamento de Emprego (Sine). trabalhadores no Mato Grosso. dade civil (leia mais na pág. 54).

S e as iniciativas de repressão ao
trabalho escravo do governo
brasileiro são uma referência in-
para diminuir a vulnerabilidade
da força de trabalho.
“O trabalhador sem qualifi-
por meio de parcerias com insti-
tuições públicas e privadas.
O Maranhão, por ser o estado
Coletes do IBGE foram feitos por escravizados
ternacional, as ações para preve- cação é uma presa fácil”, diz o com o maior número de traba-
nir o problema e reinserir os tra- subprocurador-geral do Trabalho lhadores resgatados no período Em agosto de 2010, auditores da
balhadores resgatados precisam Luis Antonio Camargo, do MPT. entre 2005 e 2010, será o primei- Superintendência Regional do Traba-
melhorar muito. Ele lembra de um caso, no Pará, ro a receber o programa – que lho e Emprego de São Paulo (SRTE/
O número de campanhas de em que o mesmo trabalhador foi deveria começar ainda em abril. SP), ligada ao MTE, constataram
conscientização e programas es- resgatado três vezes. A meta é chegar aos demais es- condições análogas às de trabalho
pecíficos para requalificação da “Temos tentado ir além da tados onde o trabalho escravo é escravo em uma oficina de costura
mão de obra libertada é conside- repressão”, afirma a procurado- mais frequente. que confeccionou coletes para os
rado pequeno diante da gravida- ra do trabalho Débora Tito, que Já o MTE tomou a iniciativa pesquisadores do Censo 2010, do
de da situação. comanda a Coordenadoria Na- de intermediar a oferta de mão Instituto Brasileiro de Geografia e
Nesse cenário, ganham impor- cional de Erradicação do Traba- de obra no meio rural, com o Estatística (IBGE).
tância ações mais gerais, como lho Escravo (Conaete), órgão do programa Marco Zero. Lançado Segundo a Folha de S. Paulo, que
o programa Bolsa Família e o MPT. no final de 2008, o projeto tem publicou a notícia em 20 de outubro,
seguro-desemprego. Além disso, Ela informou que o Ministério como parceiros os governos de a F.G. Indústria e Comércio de Uni-
segundo o Instituto de Pesqui- Público do Trabalho está lançan- Mato Grosso, Maranhão, Piauí, formes e Tecidos Ltda., com sede em
sa Econômica Aplicada (Ipea), do o projeto Resgatando a Cida- Pará e Minas Gerais. O objetivo Londrina (PR), venceu licitação no
do governo federal, a geração de dania, para capacitar trabalha- é evitar o aliciamento de traba- valor de R$ 4,3 milhões para entre-
milhões de empregos formais no dores libertados através de cursos lhadores pelos “gatos”. A seleção gar 230 mil coletes aos recenseado-
país desde 2003 tem contribuído profissionalizantes financiados dos estados atendeu a critérios res do IBGE. Com esse objetivo – de
acordo com outra matéria publicada
em outubro, no site da ONG Repór-
J. Freitas

ter Brasil –, a F.G. subcontratou cinco


O subprocurador-geral do Trabalho empresas: uma no Paraná, outra na
Luis Antonio Camargo destaca que
falta de qualificação deixa trabalhador
Paraíba e três em São Paulo.
vulnerável à sedução de aliciadores Uma delas, a Milton Borges Fer-
reira – Confecções EPP, de Guarulhos
Sem checar toda a cadeia
(SP), recebeu da F.G. a tarefa de pro-
produtiva, até órgãos públicos,
duzir 51 mil coletes e também fez a como o IBGE, podem comprar

ADJORISC
subcontratação desses serviços. Entre do trabalho escravo
os subcontratados, estava a confec-
ção do boliviano Willy Perez Mama-
ni, que funcionava em condições pre- autorizada a terceirizar mão de obra. tência para fiscalizar o cumprimento
cárias em um prédio repleto de ofici- A empresa recorreu e diz que sua si- da legislação trabalhista. No entanto,
nas de costura, no bairro Casa Verde tuação é regular. a Justiça do Trabalho tem decidido
Alta, zona norte de São Paulo. Já o IBGE também foi notificado pela responsabilidade subsidiária das
Foi ali, na oficina de Mamani, para interromper pagamentos que empresas ou órgãos públicos nesses
que os auditores do trabalho encon- ainda estivessem pendentes com a casos.
traram 15 imigrantes da Bolívia – to- companhia enquanto ela não regu- Quanto aos 15 bolivianos e suas
dos ilegais no país –, trabalhando e larizasse sua situação e a das outras famílias, não foi possível retirá-los da
vivendo com familiares, inclusive duas confecções que se envolveram oficina, como acontece nas ações de
crianças, em situação degradante. no problema. Mas o órgão informou fiscalização no meio rural.
Condições precárias de higiene, de que já havia repassado os recursos. Segundo apurou a Repórter Bra-
espaço, jornadas exaustivas de tra- Além disso, de acordo com a Repór- sil, não há procedimento definido
balho, não cumprimento de obriga- ter Brasil, o IBGE teria de assumir a para a libertação de trabalhadores
ções trabalhistas e previdenciárias, dívida da F.G. caso ela não pagasse escravos em ambiente urbano, nos
entre outras irregularidades, resul- as obrigações com os empregados. episódios que envolvam estrangei-
taram em 30 autos de infração, no A defesa do instituto alegou que ros, nem tampouco estrutura pública
valor de R$ 512 mil, para a F.G.. Pelo o contrato obedecera à Lei de Licita- de abrigo provisório para acolher as
contrato com o IBGE, ela não estava ções e que o órgão não tem compe- famílias.

42 
maio de 2011 www.senado.gov.br/emdiscussao 
43
« SUMÁRIO
Ações de combate Ações de combate

Brasil, para capacitação de pro- Planos estaduais


fessores e lideranças populares; e Além dos planos nacionais,
da implantação de agências locais dois estados apresentam agenda
do Sistema Nacional de Emprego regional do trabalho decente.
(Sine) nos municípios onde há A Bahia lançou a sua em de-
mais aliciamento de mão de obra zembro de 2007, com a colabora-
(leia mais na pág. 42). ção de entidades como a OIT.
Na luta contra a impunidade, Essa iniciativa é considerada
o documento propõe também a pioneira no mundo em nível sub-
alteração do artigo 149 do Códi- nacional. O documento relaciona
go Penal, elevando de dois para sete linhas temáticas e 80 ações.
quatro anos a pena mínima de Já a agenda de Mato Grosso é
reclusão para o crime de sujeitar de 2008. O estado conta, inclusi-
trabalhador à condição análoga à ve, em sua estrutura administra-
de escravo (leia mais sobre as pro- tiva, com o Comitê Estadual do
postas no Congresso a partir da pág. Trabalho Decente e a Comissão
60). Estadual para a Erradicação do
O plano também prevê inves- Trabalho Escravo (Coetrae).
timento em infraestrutura e na Alguns municípios também
realização de concursos para os planejam suas agendas. Um
órgãos que atuam na fiscalização. exemplo é São Bernardo do Cam-
Foi anunciado ainda que a pró- po, no ABC paulista, que deu iní-
xima edição da Lista Suja do tra- cio às discussões sobre o tema em
balho escravo, atualizada a cada maio de 2010.
seis meses, passará a ter caráter Além disso, Curitiba fez o lan- Ao lado de Mato Grosso,
a Bahia já tem seu próprio
Reunião da Conatrae, comissão criada interministerial, com a inclusão çamento da sua estratégia de er- plano de erradicação do

Conatrae
pelo governo para planejar as políticas e da Secretaria de Direitos Huma- radicação do trabalho escravo em trabalho forçado
ações de combate ao trabalho escravo
nos da Presidência da República. 30 de março de 2011.

Planos brasileiros de erradicação Para a OIT, Brasil é referência no


são elogiados internacionalmente combate ao trabalho escravo
Apesar de não haver nin- são alguns dos motivos que fa-

J unto com o Grupo Especial de


Fiscalização Móvel, o outro pi-
lar que sustenta a política do Bra-
avaliação realizada cinco anos de-
pois pela Organização Internacio-
nal do Trabalho (OIT).
emprego e reforma agrária nas
regiões fornecedoras de mão de
obra escrava. Consequentemente,
guém preso no Brasil pela práti-
ca de trabalho escravo, e mesmo
com uma estrutura ainda insufi-
zem a OIT tomar o Brasil como
exemplo.
Ao lado do Peru, o país é
sil contra a escravização de traba- No entanto, o então ministro o novo plano concentra esforços ciente para combater o problema elogiado no relatório global O
lhadores é a Comissão Nacional da SDH, Paulo Vannuchi, deixou nessas duas áreas”. em um território de dimensão Custo da Coerção, de 2009, por
para a Erradicação do Trabalho claro que é preciso avançar mais O documento de 2008 apre- continental, há anos o país vem ter ajudado a melhorar a percep-
Escravo (Conatrae), vinculada no combate à impunidade e na senta 66 propostas divididas em sendo apontado pela Organiza- ção da sociedade em relação ao
à Secretaria de Direitos Huma- reinserção de trabalhadores. ações gerais; enfrentamento e re- ção Internacional do Trabalho trabalho forçado contemporâ-
nos da Presidência da República “Num balanço geral, constata- pressão; reinserção e prevenção; (OIT) como referência na toma- neo e suas causas. “Alguns dos
(SDH) e integrada por represen- se que o Brasil caminhou de for- informação e capacitação; e re- da de decisões que visam erradi- melhores exemplos de planos de
tantes de ministérios, entidades ma mais palpável no que se refere pressão econômica. car definitivamente a prática da ação contra o trabalho forçado
de classe e organizações não go- à fiscalização e à capacitação de A primeira avaliação desse se- escravidão. são originários da América Lati-
vernamentais. atores para o combate ao trabalho gundo plano foi feita no final de Reconhecimento oficial do na. O primeiro plano de ação do
Sua principal tarefa é a elabo- escravo, bem como na conscienti- 2010 pela SDH. A secretaria afir- problema, fiscalização móvel, Brasil sobre o trabalho escravo
ração e o monitoramento dos pla- zação dos trabalhadores sobre os ma que mais de 50% das metas já Lista Suja, planos nacionais, pa- foi adotado em 2003, fornecen-
nos nacionais para a erradicação seus direitos”, escreveu o minis- foram alcançadas total ou parcial- gamento de seguro-desemprego do a base para uma forte coor-
do trabalho escravo. tro na apresentação do segundo mente. Para as ações de prevenção aos trabalhadores liber tados, denação interministerial”, diz o
O primeiro desses planos foi plano nacional, de 2008. “Mas e reinserção, foram destacadas 16 parceria entre governo e socie- documento.
lançado em 2003 e teve quase avançou menos no que diz respei- iniciativas. dade civil, além de esforços para País se destaca entre a maioria das
70% de seus 75 objetivos total ou to às medidas para a diminuição É o caso do programa Escravo tornar a legislação mais rígida nações, que sequer reconhecem a
parcialmente atingidos segundo da impunidade e para garantir nem Pensar, da ONG Repórter existência do problema

44 
maio de 2011 www.senado.gov.br/emdiscussao 
45
« SUMÁRIO
Ações de combate Ações de combate

Cristovam e Suplicy apostam Mesmo com crime previsto no


em educação e renda mínima Código Penal, impunidade é a regra
N as operações das equipes ma, cerca de um terço do total
N o Brasil, não faltam leis para

Geraldo Magela

José Varella
móveis, a primeira preocu- de resgatados nesse período. Um punir a prática de trabalho Pedro Taques defende, além
da aprovação da PEC 438/01,
pação, depois de verificar as con- dos principais motivos para que escravo. A Constituição federal e a imediata aplicação das leis
dições de saúde dos trabalhado- os outros dois terços não tenham a legislação ordinária já preveem vigentes: "O Direito Penal no
res e apurar as infrações contra a sido incluídos no Bolsa Família a repressão aos infratores. Brasil tem que sair da senzala e
dignidade do trabalho, é garantir é a inconsistência dos endereços O Código Penal estabelece, entrar na casa grande"
uma renda imediata aos liberta- fornecidos aos fiscais do trabalho inclusive, penas que podem che-
dos. Caso contrário, eles perma- nas operações de resgate. gar a oito anos de reclusão, e até
necem vulneráveis ao aliciamento Na audiência pública da frente maiores, dependendo do agravan-
feito pelos “gatos”. Com isso, a parlamentar, o senador Eduardo te (veja infográfico na pág. 48).
providência inicial é cobrar dos Suplicy (PT-SP) defendeu ainda a No entanto, há poucas decisões
empregadores, durante a ação, o adoção daquela que é uma de suas definitivas na esfera criminal. E
que é devido em salários, férias principais bandeiras: a renda bási- ninguém preso.
e outros direitos trabalhistas e ca de cidadania. “É muito impor- “Só se conhece uma condena-
previdenciários. tante que se coloque em prática ção criminal que tivesse envolvi-
Em seguida, faz-se um cadas- aquilo que já é lei, aprovada por do uma sentença de prisão”, diz o
tro dos trabalhadores que, desde todos os partidos no Congresso Qualificação profissional relatório global da OIT de 2009:
reduziria vulnerabilidade,
dezembro de 2002, com a publi- Nacional”, disse. defende Cristovam
em maio de 2008, o Tribunal Re-
cação da Lei 10.608, têm direito Em janeiro de 2004, a Lei gional Federal da 1ª Região sen-
ao seguro-desemprego especial, 10.835, proposta por Suplicy e tenciou Gilberto Andrade a 14
no valor de um salário mínimo, aprovada pelo Congresso, foi san- anos de prisão, 11 dos quais pelo
por três meses, independente- cionada, instituindo a renda bási- formais entre 2003 e 2010. Mas crime de exploração de trabalho
mente da idade. Desde 2005, o ca de cidadania. De acordo com faz uma ressalva: “Quanto ao escravo no Maranhão.
cadastro também é enviado ao a lei, todos os brasileiros e estran- grau de instrução, verifica-se que- O senador Pedro Taques
Ministério do Desenvolvimento geiros residentes há pelo menos da do emprego para os vínculos (PDT-MT) defende a aprovação
Social e Combate à Fome (MDS) cinco anos no país devem receber empregatícios situados nos níveis
para que eles tenham preferência um benefício monetário suficien- com menor grau de escolaridade,
na inclusão no Bolsa Família. te para atender às despesas míni- até o ensino fundamental incom-
Atualmente, segundo o Mi- mas com alimentação, educação e pleto, e aumento para os demais,
nistério do Trabalho e Emprego
(MTE), 5.838 trabalhadores li-
saúde. O programa Bolsa Família
é considerado pelo senador como
a partir do ensino fundamental
completo, abrangendo ambos os
Ministério Público comemora condenação por
bertados fazem parte do progra- um dos passos necessários para sexos. Destaca-se que o maior au- dano moral em tribunal superior
alcançar esse objetivo. mento percentual concentrou-se
No Brasil, o município de San- nos níveis de escolaridade de en-
to Antônio do Pinhal (SP) se pre- sino médio completo, o que con- Em agosto do ano passado, a 1ª tamanho da indenização e pelo fato milhões, que corresponderia a 40%
para para implantar o programa, firma que os novos postos de tra- Turma do Tribunal Superior do Tra- de o processo ter chegado a um tri- do patrimônio das duas proprieda-
que é lei municipal desde 2009. balho estão sendo ocupados por balho (TST) confirmou decisão do bunal superior. des onde foi constatado trabalho
O Instituto pela Revitalização da trabalhadores mais escolarizados Tribunal Regional do Trabalho (TRT) “Esse precedente é importante forçado. No TRT, a indenização ficou
Cidadania (Recivitas) também e mais qualificados.” da 8ª Região e mandou a empre- porque, em geral, as ações ficam no definida em R$ 5 milhões.
trabalha para criar um fundo Análises como essa reforçam sa Lima Araújo Agropecuária pagar tribunal inferior”, conta a coordena- Apesar dos bons resultados, o
permanente de cidadania para os a posição de Cristovam Buarque R$ 5 milhões de indenização por dora nacional de Erradicação do Tra- MPT ainda não dispõe de números
cerca de 1.400 habitantes da Vila (PDT-DF). Para ele, resgatar os ter reduzido 180 pessoas, entre elas balho Escravo do MPT, Débora Tito. gerais sobre o pagamento de multas
Paranapiacaba, no município de trabalhadores da condição de es- nove adolescentes e uma criança, à Segundo ela, normalmente os infra- e indenizações na Justiça relativas a
Santo André (SP). cravos implica também o resgate condição de escravas. tores se apressam em firmar acordos trabalho escravo. Os mais de R$ 62
da educação. “A chave para resol- O crime ocorreu em duas fazen- nas instâncias inferiores e, assim, en- milhões em indenizações, que apa-
Educação ver o problema da escravidão está das no município de Piçarra, no sul cerram o processo e o debate. recem nas estatísticas do Ministério
Por sua vez, no estudo Avanços na educação igual para todos. As- do Pará. A empresa, com sede em As propriedades rurais da Lima do Trabalho e Emprego, de 1995
na Agenda Nacional do Trabalho sim, haverá renda maior e renda Alagoas, recorreu ao STF. Mas o Araújo Agropecuária haviam sido a 2010, referem-se a saldos de salá-
Decente, de agosto do ano passa- menor, mas certamente não ha- caso já é comemorado pelo Ministé- autuadas três vezes pela fiscalização. rios, férias e 13º salário, por exem-
Geraldo Magela

Suplicy: com renda mínima, do, o Ipea comemora a geração verá mais trabalho escravo”, disse rio Público do Trabalho (MPT) como As constantes reincidências levaram plo, que são apurados e pagos
trabalhador poderia dizer um marco na luta que se trava na o Ministério Público do Trabalho a durante as operações das equipes
não aos aliciadores
de quase 14 milhões de empregos ele durante o debate.
Justiça brasileira. Isso em função do mover uma ação no valor de R$ 85 móveis do MTE.

46 
maio de 2011 www.senado.gov.br/emdiscussao 
47
« SUMÁRIO
Ações de combate Ações de combate

da PEC 438/01, mas alerta para


a necessidade de aplicação das
leis que já existem. “Temos que
núncias criminais por trabalho
escravo. “Não consegui nenhuma
condenação”. Outra dificuldade,
O ministro do Tribunal Su-
perior do Trabalho (TST) Lélio
Bentes também entende que a le-
Senadores divergem sobre
fazer com que o Direito Penal,
no Brasil, saia da senzala e possa
penetrar na casa grande”, disse
disse, é que, no Brasil, um pro-
cesso leva em média 12 anos para
ser concluído, enquanto no Chile
gislação atual já é suficiente e que
algumas medidas administrativas
do Executivo e do Judiciário po-
penas e atuação dos fiscais
o parlamentar por Mato Grosso demora apenas oito meses. deriam ajudar. Como exemplo,
durante o encontro realizado em ele cita a Justiça itinerante.
Competências
A

José Cruz
fevereiro. No entanto, Lélio Bentes criti- s opiniões dos senadores so-
Pedro Taques acredita que, Há ainda quem argumente que ca a falta de unidade do processo bre o endurecimento da le-
sem repressão adequada, a PEC até mesmo o confisco das terras judicial. Enquanto a Justiça do gislação contra o trabalho escravo
também teria problemas para se de quem patrocina o trabalho es- Trabalho fica com as infrações à – principalmente as alterações na
transformar em realidade. A fu- cravo – intuito da PEC – já seja legislação trabalhista, ainda há Constituição (leia mais a partir
tura emenda à Constituição daria possível com as regras em vigor. dúvida se a condenação criminal da pág. 62) – e a atuação dos au-
origem a ações judiciais questio- Isso porque a Constituição prevê cabe à Justiça Federal ou ao Judi- ditores fiscais do MTE e dos pro-
nando as expropriações e os pro- que as terras precisam cumprir ciário dos estados. curadores do MPT estão longe do
cessos poderiam se arrastar por sua “função social”. Assim, um Essa definição está com o Su- consenso.
anos a fio sem decisão. imóvel rural que patrocine a es- premo Tribunal Federal (STF), “A pretexto de se fazer cumprir
O senador contou ainda que, cravidão automaticamente estaria que, em 2008, julgando um caso, a lei, abusos têm sido cometidos.
como procurador da República ferindo esse princípio, já que, ao decidiu pela competência da Jus- Fiscais do Ministério do Trabalho
em Mato Grosso, durante dez invés de beneficiar, estaria preju- tiça estadual. Mas ainda não fir- e Emprego têm realizado diligên-
anos ofereceu mais de cem de- dicando a sociedade. mou jurisprudência sobre o tema. cias em propriedades rurais de
maneira ostensiva e intimidató-
ria, com efetivo policial exibindo
armamento pesado e com a pre-
sença de membros da imprensa e
Já existem leis para coibir o trabalho escravo de pessoas estranhas à atividade
rural, o que constrange não só Para João Ribeiro, "o Congresso
os proprietários e seus familiares, tem de definir direito o que é
trabalho escravo", para coibir
A Constituição protege os traba- no local de trabalho ou se apodera ou contratuais. como também os próprios traba- interpretações equivocadas que
lhadores. E o Código Penal, em três de documentos ou objetos pessoais § 2º - A pena é aumentada de um lhadores rurais”, disse em agosto levem a abusos e injustiças
artigos, trata especificamente do do trabalhador, com o fim de retê-lo sexto a um terço se a vítima é menor de 2004, o então senador pelo
trabalho escravo e da punição aos no local de trabalho. de dezoito anos, idosa, gestante, in- PMDB de Tocantins, Leomar
escravagistas. Veja: § 2o - A pena é aumentada de meta- dígena ou portadora de deficiência Quintanilha.
de, se o crime é cometido: física ou mental. Para ele, a interpretação equi- pode levar os fiscais a considera- lho e Emprego a Portaria 540/04,
Art. 149 - Reduzir I - contra criança ou adolescente; vocada da legislação trabalhista rem como trabalho escravo ativi- que criou a lista e o mecanismo
alguém a condição II - por motivo de preconceito de Ar t. 207 - Aliciar dades próprias do meio rural. para incluir na relação os nomes
análoga à de escra- raça, cor, etnia, religião ou origem. trabalhadores, com “Essa interpretação impõe ao de produtores autuados pelos fis-
vo, quer submeten- o fim de levá-los de produtor, àquele que pagou pela cais do Ministério do Trabalho.
Leomar Quintanilha

José Cruz
do-o a trabalhos Art. 203 - Frustrar, uma para outra lo- afirma que os fiscais propriedade, que paga imposto “Isso é um tribunal de exce-
forçados ou a jor- mediante fraude ou calidade do territó- do trabalho têm e que emprega, humilhações que ção”, afirmou a senadora, em
nada exaustiva, quer sujeitando-o violência, direito as- rio nacional:
cometido abusos chegam a assustar”, disse o sena- Plenário, em julho de 2007. Ela
e intimidado dor em discurso no plenário em condenou o fato de a Lista Suja
a condições degradantes de traba- segurado pela legis- produtores
lho, quer restringindo, por qualquer lação do trabalho: Pena - detenção, de um a três junho de 2004. ser composta a partir de proces-
meio, sua locomoção em razão de anos, e multa. A mesma opinião foi exposta sos administrativos do ministério,
dívida contraída com o empregador Pena - detenção, de um ano a § 1º - Incorre na mesma pena quem por seu companheiro do Tocan- sem decisão judicial. Dois anos
ou preposto: dois anos, e multa, além da pena recrutar trabalhadores fora da locali- tins João Ribeiro, do então PFL antes, o então senador Jonas Pi-
correspondente à violência. dade de execução do trabalho, den- e hoje no PR. “O Congresso tem nheiro (PFL-MT) já havia se pro-
Pena - reclusão, de dois a oito § 1º - Na mesma pena incorre quem: tro do território nacional, mediante de definir direito o que é trabalho nunciado contra a lista.
anos, e multa, além da pena corres- I - obriga ou coage alguém a usar fraude ou cobrança de qualquer escravo”, sustentou. Kátia Abreu avalia que as ati-
pondente à violência. mercadorias de determinado estabe- quantia do trabalhador, ou, ainda, vidades no campo são, de modo
§ 1o - Nas mesmas penas incorre lecimento, para impossibilitar o des- não assegurar condições do seu re-
Lista Suja geral, difíceis. E defende um ca-
quem: ligamento do serviço em virtude de torno ao local de origem. Já a presidente da Confedera- minho harmônico para os pro-
I - cerceia o uso de qualquer dívida; § 2º - A pena é aumentada de um ção da Agricultura e Pecuária do blemas existentes. Para a sena-
meio de transporte por parte do tra- II - impede alguém de se desligar sexto a um terço se a vítima é menor Brasil (CNA), a senadora Kátia dora, “exageros na tentativa de
balhador, com o fim de retê-lo no lo- de serviços de qualquer natureza, de dezoito anos, idosa, gestante, in- Abreu (DEM-TO), critica a cha- proteger o trabalhador podem
cal de trabalho; mediante coação ou por meio da re- dígena ou portadora de deficiência mada Lista Suja (leia mais na pág. levar ao desamparo”, na forma de
II - mantém vigilância ostensiva tenção de seus documentos pessoais física ou mental. 40). Ela considera um excesso co- desemprego.
metido pelo Ministério do Traba- (Com Agência Senado)

48 
maio de 2011 www.senado.gov.br/emdiscussao 
49
« SUMÁRIO
Ações de combate Ações de combate

Em Açailândia (MA), segundo o MP, dois operários


foram mortos porque cobravam salários Cortes no Orçamento ameaçam
estrutura de repressão
Os cortes no Orçamento da
União anunciados no início do
ano pelo governo federal lança- Nem todo o dinheiro tem sido investido
ram uma sombra de incerteza
sobre ações e programas destina- Verbas são repassadas à Secretaria Especial de Direitos Humanos,
dos ao combate ao trabalho es- ao Ministério do Trabalho e ao Ministério Público da União
cravo em 2011. Na Secretaria de 15Mi 15,3 15,3
Inspeção do Trabalho (SIT), do Orçamento autorizado1 (milhões)
Ministério do Trabalho e Empre- 13,1
Gasto efetivo (milhões) 12,4
go, por exemplo, as despesas com
diárias e transporte de pessoal fo- 10Mi
10,7
10,3
ram limitadas a R$ 11,9 milhões, 8,9
9,4
8,6
enquanto a previsão inicial era de 7,7
R$ 23,5 milhões. 6,3
6,0
“É um baque grande, pois 5Mi 5,3 5,3
80% do total das despesas são 3,9
relativos a passagens e diárias de

Fernando Cunha/CC
auditores fiscais do trabalho em 1,42
fiscalizações rurais, combate a 0
trabalho escravo etc”, analisa a 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011
presidente do sindicato nacional
1
Recursos autorizados pelos orçamentos da União e pelas leis que abrem créditos especiais ou extraordinários
da categoria (Sinait), Rosangela
2
Valor estimado até março de 2011
Rassy. “A SIT afirma que vai fa- Fontes: Subsecretaria de Apoio Técnico/ Siga Brasil e
Consultoria de Orçamento do Senado Federal
zer de tudo para não diminuir o
Impunidade: acusados foram libertados, obrigando número de ações fiscais, mas te-
advogado a esconder-se com a família memos pelo sacrifício do planeja-

SINAIT
mento e pelo comprometimento
Rosangela Rassy, do Sindicato
dos resultados”, diz. Nacional dos Auditores
Segundo a ONG Repórter Brasil, de Segurança Pública do estado, a foice em 2008, em uma fazenda no O MTE explica que o con- Fiscais do Trabalho, adverte
entre 2001 e 2007, foram registradas polícia esperava uma autorização ju- município de Centro Novo do Ma- tingenciamento não signif ica, que cortes em passagens e
142 denúncias de trabalho escravo dicial para prender mais dez compar- ranhão (MA) que era, na época dos necessariamente, corte orçamen- diárias, principais despesas dos
auditores, podem comprometer
no Maranhão, envolvendo cerca de sas do fazendeiro. “Acreditamos que crimes, de propriedade de Adelson tário. A qualquer momento, novo a fiscalização
3 mil trabalhadores. Recentemente, a prisão de apenas um membro da Araújo. As ossadas foram identifica- decreto do governo poderá alte-
um caso acontecido em Açailândia, quadrilha complicaria a apuração do das como sendo de Gilberto Ribeiro rar os limites ou mesmo cancelar
no oeste maranhense, ficou conhe- crime em si”, explicou o secretário, Lima e Vanderlei Meireles. a medida imposta. Além disso, a
cido nacionalmente: o lavrador Gil- Aluísio Mendes. O secretário executivo da frente Lei Orçamentária de 2011 reserva
berto Ribeiro Lima, de 27 anos, seis Depois da reportagem do Fan- parlamentar, deputado federal Do- R$ 5,3 milhões especificamente
filhos, foi assassinado em junho de tástico, 14 mandados de prisão fo- mingos Dutra (PT-MA), registrou para a fiscalização destinada a
2008 na cidade. Segundo a família, ram expedidos e cinco foram execu- que, por conta da denúncia, o ad- erradicar o trabalho escravo, sob
Gilberto não recebia salários e co- tados rapidamente. Adelson Araújo, vogado maranhense Antonio José responsabilidade da SIT – prati-
brava a dívida de R$ 700 pelo servi- de 67 anos, e dois filhos dele, Fran- Ferreira Lima, membro do Centro de camente o mesmo valor do ano
ço de escavação de poços feito para cisco Maciel Silva Araújo e Marcone Defesa da Vida de Açailândia, está passado.
o patrão, Adelson Veras Araújo, um Silva Araújo, foram presos em 28 de ameaçado de morte. “Ele está fora De todo modo, indepen-
conhecido fazendeiro da cidade. janeiro. Eles também são acusados do seu domicílio, com a família, fora- dentemente dos cortes que o
Em abril de 2009, a Justiça de- de envolvimento no assassinato de gido desde a matéria do Fantástico”. governo venha a fazer, os va-
cretou a prisão de Araújo, suspeito outro funcionário da família, Van- Em 16 de março, segundo repor- lores gastos pelo Ministério
de ser o mandante do crime. Em derlei Ferreira de Meireles, que te- tagem do Jornal Pequeno, de São do Traba l ho, pela Secreta-
janeiro deste ano, uma equipe do ria acompanhado Gilberto Lima na Luís, a Primeira Câmara Criminal do ria de Direitos Humanos da
programa Fantástico, da TV Globo, ­cobrança. Tribunal de Justiça do Maranhão, por Presidência da República e pelo
esteve em Açailândia e mostrou que Em 31 de janeiro de 2011, a po- unanimidade, concedeu habeas cor- Ministério Público da União
a ordem de prisão ainda não havia lícia localizou as ossadas de dois la- pus a Adelson Araújo e seus filhos, para enfrentar o problema têm
sido cumprida. Segundo a secretaria vradores mortos a tiros e golpes de que foram soltos no dia seguinte. sofrido redução desde 2008,
quando alcançaram seu maior
patamar (veja infográfico acima).

50 
maio de 2011 www.senado.gov.br/emdiscussao 
51
« SUMÁRIO
Ações de combate

desafio dos remanescentes é a O evento foi aberto com o lan- Para tentar a aprovação da
recomposição do grupo por meio çamento do Atlas Político-Jurídico PEC 438/01 e de outras propos-
da adesão de mais deputados e do Trabalho Escravo Contemporâ- tas de combate ao trabalho escra-
senadores. neo no Maranhão, elaborado pelo vo, os parlamentares e os militan-
Com novos membros, será Centro de Defesa da Vida e dos tes querem se reunir com o presi-
preciso eleger a nova direção da Direitos Humanos (CDVDH) de dente da Câmara, deputado Mar-
frente, o que, segundo o secretá- Açailândia (leia mais na pág. 56). co Maia, para pedir a inclusão da
rio executivo do órgão, deputado Em Minas Gerais, o Sindicato PEC na pauta de discussão.
Domingos Dutra (PT-MA), seria Nacional dos Auditores Fiscais As frentes querem o aval da
feito em abril de 2011. Dutra é do Trabalho (Sinait) realizou presidente Dilma Rousseff e do
cotado para assumir a presidência uma manifestação para lembrar ministro da Secretaria de Relações
da frente. os sete anos dos assassinatos em Institucionais da Presidência da
Unaí (MG). República, Luiz Sérgio, para in-
Agenda cheia Um seminário, em Belém centivar a aprovação de punições
As frentes têm promovido (PA), discutiu propostas para a mais fortes, como aquelas que a
e apoiado uma série de eventos erradicação do crime naquele es- PEC propõe.
para divulgar e discutir o proble- tado, enquanto que, no Piauí, o E já marcaram data para lan-
ma com a sociedade. Fórum Estadual de Combate ao çar uma nova ofensiva na Câma-
No encerramento do 1º En- Trabalho Escravo entregou às au- ra: 13 de maio, quando se com-
contro Nacional pela Erradica- toridades um manifesto sobre o pletam 123 anos da promulgação
ção do Trabalho Escravo, em 27 problema. da Lei Áurea.
de maio de 2010, com o apoio da Na Superintendência Regional As frentes também estão preo-
frente parlamentar, foram coloca- do Trabalho e Emprego de São cupadas com o fortalecimento da
das 161 cruzes em frente ao Con- Paulo, uma audiência pública estrutura de fiscalização do Mi-

Moreira Mariz
O “núcleo” da frente parlamentar: deputado Cláudio Puty, gresso Nacional, representando debateu o trabalho escravo ur- nistério do Trabalho e Emprego.
senadores Paulo Paim e Cristovam Buarque, deputado as vítimas dos vários conf litos bano, sobretudo na indústria do Para isso, querem garantir, na
Domingos Dutra e o ex-senador José Nery
de terras no Brasil, entre eles os vestuário. Por fim, em Cuiabá, Lei de Diretrizes Orçamentárias,
três auditores fiscais do trabalho foi realizado culto ecumênico no no Plano Plurianual e também
que foram assassinados em Unaí Sindicato dos Trabalhadores no no Orçamento de 2012, recursos
(MG), em 2004 (leia mais na Ensino Público (Sintep-MT). para contratação de servidores

Frentes Parlamentar e pág. 38).


Na véspera da manifestação,
José Nery entregou ao então
Metas para 2011
Durante a audiência pública
como auditores fiscais e defenso-
res públicos.
Na lista de planos para o fu-

Nacional lutam para presidente da Câmara, o ex-de-


putado e hoje vice-presidente da
República, Michel Temer, um
que realizaram no Senado, no en-
cerramento da Semana Nacional
pela Erradicação do Trabalho Es-
turo, estão a instalação de uma
CPI do Trabalho Escravo na Câ-
mara dos Deputados (leia mais na

erradicar trabalho escravo abaixo-assinado com 280.404 as-


sinaturas pedindo a aprovação da
PEC 438/01.
cravo, as frentes aprovaram uma
série de iniciativas para articular
governo, sociedade civil, Parla-
pág. 72) e a realização da primeira
conferência internacional pela er-
radicação de todas as formas con-
O documento ainda pode ser mento e Judiciário. temporâneas de trabalho escravo.

P ara que o combate ao traba-


lho escravo não fique circuns-
crito à atuação das autoridades,
das frentes, que lutam pela vota-
ção de outras propostas legislati-
vas que possam contribuir para o
total de 56 entidades da sociedade
civil.
Já a frente parlamentar foi
assinado pela internet, no site
www.trabalhoescravo.org.br/abai-
xo-assinado.
Abaixo-assinado
na internet pela
nos corredores do Executivo e do combate ao trabalho escravo (leia criada em maio de 2010, após O ministro do Trabalho, Car- aprovação da PEC
Judiciário, duas entidades nacio- mais nas págs. 74 e 75). a 1ª Semana de Combate ao Tra- los Lupi, o então secretário espe- 438/01 teve quase
nais tratam de trazer o tema para As entidades também chamam balho Escravo e o Dia Nacional cial de Direitos Humanos, Paulo 300 mil nomes
e ainda pode ser
o dia a dia da sociedade: a Frente a atenção para as dificuldades en- de Combate ao Trabalho Escra- Vannuchi, a relatora especial da assinado
Nacional e a Frente Parlamentar frentadas pelos órgãos do Execu- vo (28 de janeiro), com o apoio ONU sobre Formas Contempo-
Mista pela Erradicação do Traba- tivo, do Ministério Público e da de 195 deputados e 55 senadores. râneas de Escravidão, Gulnara
lho Escravo no Brasil. Justiça encarregados de executar Hoje, tanto a Câmara quanto o Shahinian, e os atores Wagner
E s s a s or g a n i z a ç õ e s pro - as ações a cargo do Estado. Senado já criaram subcomissões Moura e Sérgio Mamberti, entre
movem todos os a nos uma A frente nacional foi criada específicas para acompanhar o outros, participaram do evento.
gra nde agenda de ma nifes- em 4 de junho de 2008 e, além combate ao trabalho escravo (leia Este ano, as frentes parlamen-
tações para compartilhar in- de deputados e senadores, é in- mais nas págs. 58 e 59). tar nacional promoveram a 2ª
formações, sensibilizar a po- tegrada por órgãos públicos, or- Depois das últimas eleições, Semana Nacional pela Erradica-
pulação e aumentar a pressão so- ganizações não governamentais apenas 95 deputados e 21 sena- ção do Trabalho Escravo (de 28
cial por soluções. e associações de magistrados, dores da composição original de janeiro a 3 de fevereiro), com
A aprovação da PEC 438/01 procuradores, artistas, atletas, da frente parlamentar continu- eventos em várias cidades.
é uma das principais bandeiras trabalhadores e sindicatos, num aram no Congresso. Agora, o

52 
maio de 2011 www.senado.gov.br/emdiscussao 
53
« SUMÁRIO
Ações de combate Ações de combate

Sociedade começou legislação trabalhista. Para isso, o


ICC realiza auditorias nas carvo-
arias do Maranhão, Pará, Tocan-
tudos Socioeconômicos (Dieese),
e da Rede Interuniversitária de
Estudos e Pesquisas sobre o Tra-
do trabalho escravo. Em 2008 e
2009, o tema da campanha insti-
tucional do Sinait foi “Quem pro-

reação brasileira contra tins e Piauí, oferecendo os dados


recolhidos ao governo e a institui-
ções que qualificam as condições
balho (Unitrabalho). cura trabalho não pode encontrar
escravidão”, esforço dedicado ao
Grupo Especial de Fiscalização

a nova escravidão de produção e trabalho.


O carvão vegetal é matéria-
prima para produção do aço e do
Móvel (GEFM).

minério de ferro, que representam


17,5% de tudo que o Brasil ex- Pacto Nacional
portou no ano passado. pela Erradicação do

“À s entidades da sociedade
civil se deve muito o suces-
so da luta, dos enfrentamentos,
trabalhadores do campo. É uma
das principais fontes de dados
sobre trabalho escravo no país.
Trabalho Escravo
O Ethos, o IOS e a ONG Re-
pórter Brasil elaboraram e man-
das batalhas que temos travado”. Suas reportagens, investigações têm o Pacto Nacional pela Er-
O reconhecimento feito pelo ex- jornalísticas, pesquisas e metodo- radicação do Trabalho Escravo.
senador José Nery, presidente de Comissão Pastoral logias têm sido usadas pelo poder O pacto, de 2005, é um acordo Confederação da Agricultura
honra da frente parlamentar, na da Terra (CPT) público, empresas, organizações Instituto Ethos de Empresas entre empresas e entidades priva- e Pecuária do Brasil (CNA)
reunião de fevereiro deste ano, Foi fundada em junho de 1975 internacionais e da sociedade civil e Responsabilidade Social das para afastar qualquer possibi- A Confederação da Agri-
mostra que o combate à escravi- sob o patrocínio da Conferência como instrumentos para comba- O trabalho escravo também é lidade de uso de mão de obra es- cultura e Pecuária do Brasil
dão contemporânea no Brasil teve Nacional dos Bispos do Brasil ter a escravidão contemporânea. combatido pelo Instituto Ethos crava na cadeia produtiva de seus (CNA), que representa os pro-
início com a mobilização e a in- (CNBB) para tratar da situação A ONG é membro da Comis- de Empresas e Responsabilida- produtos e serviços. O pacto visa dutores rurais brasileiros, criou o
dignação da sociedade, muito an- dos trabalhadores rurais e dos são Nacional para a Erradicação de Social, que busca sensibilizar à formalização das relações de programa Mãos que Trabalham
tes de qualquer ação por parte do conf litos no campo, sobretudo do Trabalho Escravo (Conatrae) as empresas para a necessidade de trabalho de todos os fornecedores com o objetivo de corrigir as dis-
governo. na Amazônia. Foi por meio da e responsável por projetos em uma gestão socialmente responsá- das empresas signatárias, o que torções nas relações entre patrão
Desde a década de 70, em ple- CNBB e de dom Pedro Casaldá- convênio com instituições públi- vel. O instituto verifica a origem implica o cumprimento das obri- e empregados no meio rural. O
na ditadura militar, as primeiras liga que as primeiras denúncias de cas e internacionais, como a OIT. da matéria-prima ou dos produ- gações previdenciárias, assistência Instituto CNA capacita monito-
vozes vieram a público narrar que escravidão rural contemporânea Presidente da ONG, o jornalista tos que a empresa filiada adquire, à saúde e garantias de segurança res do programa para atuarem em
trabalhadores eram submetidos no Brasil ganharam notoriedade, Leonardo Moretti Sakamoto é para saber se são originários de ao trabalhador. seis estados: Goiás, Mato Grosso,
a condições degradantes, nada na década de 1970. referência no assunto e também fornecedores que estão na Lista A adesão de uma empresa ao Mato Grosso do Sul, Maranhão,
condizentes com as relações so- A CPT busca qualificar e as esteve no debate promovido pelas Suja do trabalho escravo, ou que pacto é voluntária e amplamente Pará e Tocantins. O instrutor do
ciais esperadas para o século XX. denúncias, garantindo a credibi- frentes Nacional e Parlamentar de desmatam ou poluem. divulgada. Porém, empresas que Instituto CNA analisa as condi-
Diversas entidades começaram a lidade dos fatos, para acionar as Combate ao Trabalho Escravo em descumprem requisitos são tam- ções de trabalho e aponta even-
se organizar para dar assistência autoridades (Ministério Público, fevereiro passado. bém publicamente afastadas. As tuais correções necessárias, retor-
às vítimas, divulgar informações Conselho de Defesa dos Direitos empresas do pacto também de- nando 45 dias depois para verifi-
para prevenir o trabalho escravo, da Pessoa Humana) ou organis- vem, em caso de identificação de car se houve adequação às exigên-
reunir dados e pressionar o gover- mos internacionais (OIT, OEA, fornecedores e pessoas que utili- cias da legislação.
no a reprimir aqueles que subme- ONU). Para isso, também mo- zem trabalho escravo em sua ca-
tiam outras pessoas à escravidão. biliza parlamentares e os leva a Instituto Observatório Social deia produtiva, aplicar restrições
Cada uma dessas organiza- locais onde há relatos de escravi- O Instituto Observatório So- comerciais.
ções se especializou em ativida- zação de pessoas, como em 1992, cial é uma organização que ana-
des como fazer e investigar as em Rio Maria, no Pará (veja mais lisa como as empresas se compor-
denúncias, divulgar nomes de na pág. 57). tam com relação aos direitos dos
exploradores e de produtos que Instituto Carvão Cidadão trabalhadores. O instituto toma
usam mão de obra escrava, edu- Um exemplo de como as em- como base convenções da OIT
car e informar os trabalhadores presas podem se preocupar com para observar quesitos como li-
sobre seus direitos e sobre como as condições de trabalho que ofe- berdade sindical, negociações co- Sindicato Nacional dos
se proteger contra os aliciadores, recem e com sua própria imagem letivas, trabalho infantil, trabalho Auditores Fiscais do
entre outras ações essencialmente é o Instituto Carvão Cidadão, forçado, discriminação de gênero Trabalho (Sinait)
ligadas à luta pelo respeito aos di- ONG sediada em Imperatriz e raça, meio ambiente, saúde e A principal meta do Sindicato Confederação Nacional
reitos humanos. Repórter Brasil (MA) e fundada pelas siderúrgi- segurança, além do impacto das Nacional dos Auditores Fiscais dos Trabalhadores na
Uma mostra de como as ONGs Organização não governamen- cas do Polo Industrial do Ferro relações comerciais brasileiras no do Trabalho (Sinait) e das dele- Agricultura (Contag)
dessa área têm o seu trabalho res- tal criada em 2001 por jorna- Gusa da Região de Carajás. mercado de trabalho. Ligado à gacias sindicais nos estados é in- A atuação da Confederação
peitado é o fato de participarem listas, cientistas sociais e educa- As siderúrgicas são orientadas Central Única dos Trabalhado- vestir na melhoria das condições Nacional dos Trabalhadores na
da Comissão Nacional para Er- dores, a Repórter Brasil apura, pelo instituto a só comprar carvão res (CUT), conta com o apoio para a fiscalização do trabalho, Agricultura (Contag), em con-
radicação do Trabalho Escravo organiza e dissemina informações vegetal – insumo fundamental do Centro de Estudos de Cultura assim como do desempenho pro- junto com o Movimento Sindical
(Conatrae). para fomentar a reflexão e a ação para a produção do aço – de for- Contemporânea (Cedec), do De- fissional dos auditores, condição de Trabalhadores e Trabalhado-
Veja como algumas dessas en- contra a violação aos direitos dos necedores que cumpram à risca a partamento Intersindical de Es- fundamental para a erradicação ras Rurais é, sobretudo, preventi-
tidades se destacam:

54 
maio de 2011 www.senado.gov.br/emdiscussao 
55
« SUMÁRIO
Ações de combate

Rio Maria ficou marcada pela violência no campo


Membro da diocese de Concei- os escravizados não tinham vínculos Souza, em 2 de fevereiro de 1992.
ção do Araguaia, o padre Ricardo com as comunidades locais e sim- Anunciado como uma possibilidade
Rezende, da Comissão Pastoral da plesmente desapareciam nas fazen- em diversas publicações estrangeiras
Terra, militou 20 anos na região. das, em cemitérios clandestinos. pouco tempo antes, o assassinato de
Constantemente ameaçado, contou Buscando mobilizar autoridades e Expedito causou grande comoção no
que houve pelo menos 200 mortes parlamentares, o padre Rezende con- exterior e, em seguida, no Brasil. Na
de trabalhadores rurais, quase meta- vidou, em 1992, um grupo de con- audiência pública de fevereiro, o se-
de escravizada, assassinados ao fugir gressistas a visitar Rio Maria. A visita nador Eduardo Suplicy (PT-SP) falou
das fazendas onde eram explorados. se seguiu à morte do ex-presidente sobre os relatos que ouviu dos traba-
Mas o número de vítimas pode ser do Sindicato dos Trabalhadores Ru- lhadores da região, quase todos se-
muito maior porque, segundo ele, rais de Rio Maria Expedito Ribeiro de melhantes às ilustrações a seguir:

Atrizes Lucélia Santos e


Luiz Cruvinel/CD

Dira Paes com os deputados


Paulo Rocha e João Paulo
Cunha (à esq.): apoio à PEC

va. As entidades promovem cursos diretores de TV, músicos, cineas- plo) e os apoia, por meio da sua
e seminários para conscientizar e tas, escritores e fotógrafos, entre assessoria jurídica, nas ações de
capacitar os trabalhadores rurais outros artistas. Eles produzem reparação de dano moral movi-
quanto aos seus direitos. O traba- campanhas (com vídeos e impres- das por eles. O centro também
lho envolve as federações dos tra- sos) alertando para a existência de acompanha as investigações poli-
balhadores na agricultura dos es- trabalho escravo, urbano e rural. ciais e a acusação pelo Ministério
tados, os sindicatos de trabalhado- Veículos de comunicação e asso- Público.
res rurais e entidades parceiras. A ciações profissionais também par- A instituição ainda compila
Contag também recebe denúncias ticipam das campanhas. informações, entre elas as que fo- “Sobe nesse caminhão. A fazenda é uns 500 km daqui. Praquele lado de lá” “Tô precisando de gente pra cortar a floresta, roçar a terra e plantar. Pago bem”
de prática de trabalho escravo e as ram publicadas em janeiro passa-
encaminha às delegacias regionais do no livro Atlas Político-Jurídico
do Trabalho. do Trabalho Escravo Contemporâ-
neo no Maranhão.
Em maio de 2006, o Centro
de Defesa da Vida criou a Co-
operativa para Dignidade do
Ma ra nhão (Codigma), que
apoia cerca de 100 pessoas de
famílias afetadas pelo trabalho
Ordem dos Advogados Centro de Defesa da escravo ou sob risco de serem ví-
do Brasil (OAB) Vida e dos Direitos timas desse crime.
A Ordem dos Advogados do Humanos de Açailândia A cooperativa oferece alterna-
Brasil (OAB) coordena a comis- O Centro de Defesa da Vida tivas de renda e inclusão social,
são jurídica da Conatrae e repre- e dos Direitos Humanos de por meio de aulas de marcenaria,
senta a Conatrae junto ao Supre- Açailândia (CDVDH) foi cria- alfabetização, cooperativismo e “Não tá na hora de receber? Já trabalhei um bocado e preciso mandar dinheiro “Como é que eu vou pagar se você é que está devendo?! Comprou comida e
mo Tribunal Federal, ao Con- do em 1996 e acolhe trabalhado- noções de cidadania. pra minha família” bebida na venda mais do que tem direito a receber!”
gresso Nacional e a instituições res explorados que fogem de fa-
governamentais e não governa- zendas e conseguem chegar a sua
mentais. A comissão jurídica mo- sede, em Açailândia (MA). Até a Outros parceiros no combate
nitora as ações judiciais por crime equipe de fiscalização chegar, o ao trabalho escravo: Associação
de trabalho escravo que trami- trabalhador é protegido, enquan- Nacional dos Magistrados da
tam na Justiça. Em 2007, a OAB to presta depoimento para ser en- Justiça do Trabalho (Anamatra)
criou a Coordenação de Combate viado à Secretaria de Inspeção do e as suas congêneres nos estados
ao Trabalho Escravo, vinculada à Trabalho (SIT), em Brasília. Ao (Amatras), Associação Nacional
Comissão Nacional de Direitos lado da polícia, o trabalhador, dos Procuradores da República
Humanos da entidade. então, participa da diligência na (ANPR), Associação Nacional
fazenda orientando os fiscais a dos Defensores Públicos (Ana-
Movimento Humanos encontrar o local. dep), Associação dos Juízes Fede-
Direitos (MHuD) O CDVDH informa os tra- rais do Brasil (Ajufe) e Associa-
O Movimento Humanos Di- balhadores sobre seus direitos ção Nacional dos Procuradores
reitos (MHuD) reúne atores, (seguro desemprego, por exem- do Trabalho (ANPT).
“Como estou devendo? Se for assim, então, vou embora!” “Muitos levaram tiros...”
“Se quiser ir embora vai levar um tiro!”
56 
maio de 2011 www.senado.gov.br/emdiscussao 
57
« SUMÁRIO
Ações de combate Ações de combate

Senado e Câmara têm órgãos sobre o 2º Plano Nacional para a


Erradicação do Trabalho Escravo,
divulgado em setembro daquele
nacional que deu origem a esta
revista.
ram indicados pelos partidos.
Desde a sua criação até janeiro
passado, a subcomissão foi pre-

permanentes de combate ano.


Em fevereiro de 2010, a subco-
missão participou da organização
Na Câmara
Na Câmara dos Deputados, a
criação da Subcomissão de Com-
sidida pelo ex-deputado Paulo
Rocha (PT-PA), autor da pri-
meira proposta (PEC 232/95),
da sessão especial do Senado que bate ao Trabalho Escravo, Degra- que prevê a expropriação da terra
marcou a Semana Nacional de dante e Infantil, na Comissão de em que for constatada a prática

A Subcomissão Permanente de
Combate ao Trabalho Escra-
vo e Acompanhamento da Regu-
tratem do combate ao trabalho
escravo.
Em maio de 2009, a subcomis-
ano, com nova composição.
No primeiro ano de trabalho,
a subcomissão se concentrou na
Combate ao Trabalho Escravo,
requerida por Nery. E, este ano,
voltou a participar da programa-
Trabalho, Administração e Servi-
ço Público, foi aprovada em 24 de
outubro de 2007.
do trabalho escravo, hoje apen-
sada à PEC 438/01. O deputado
propôs a criação da subcomissão na
larização Fundiária da Amazônia são foi tornada permanente, ape- análise do Plano Nacional para a ção, que culminou com a reunião Ela só foi instalada no ano se- Câmara como reação ao caso
Legal, vinculada à Comissão de sar de seus integrantes esperarem Erradicação do Trabalho Escravo da frente parlamentar e da frente guinte, quando os membros fo- Pagrisa.
Direitos Humanos e Legislação que o trabalho escravo seja algo e nas denúncias de existência de
Participativa (CDH), é o órgão transitório no Brasil. trabalho escravo na empresa Pa-
do Senado responsável por fiscali- “O sonho de amanhã é estar grisa, no Pará (leia mais na pág.
zar e apoiar as ações nessa área. numa reunião para dizer que está 36 ). Os senadores também es-
O colegiado foi criado em mar-
ço de 2007, em caráter temporá-
extinta a Subcomissão de Com-
bate ao Trabalho Escravo por não
tiveram duas vezes no Pará e no
Maranhão para apurar denúncias
Ex-senador José Nery é presidente de
rio, por iniciativa do presidente existir mais essa prática”, disse de trabalho escravo. honra da Frente Parlamentar
da CDH, senador Paulo Paim Paim à época. Em 2008, promoveu o Ato
(PT-RS). Nessa subcomissão, os O então senador José Nery Nacional Contra o Trabalho Es-
O ex-senador José Nery foi esco- 12.064/09, que instituiu o Dia (28 1993 a 1995, foi diretor do Sindicato
senadores acompanham as inicia- (PSOL-PA) foi o primeiro presi- cravo, que recolheu assinaturas
lhido como presidente de honra da de janeiro) e a Semana Nacional de dos Empregados em Atividades Cul-
tivas do Executivo e os processos dente da subcomissão, que che- para abaixo-assinado pedindo a
Frente Parlamentar Mista de Erradi- Combate ao Trabalho Escravo. turais Recreativas e de Assistência
no Judiciário, e procuram acelerar fiou até janeiro passado. O co- aprovação da PEC 438/01. Re-
cação do Trabalho Escravo, na reu- Cearense, José Nery chegou ao Social do Pará. Nery exerceu ainda
a aprovação de projetos de lei que legiado ainda será instalado este alizou ainda audiência pública
nião de encerramento da programa- Senado em 2007, representando o três mandatos de vereador em Aba-
ção da 2ª Semana Nacional de Erra- Pará – estado onde vive e trabalha etetuba (de 1997 a 2005 pelo PT, e,
dicação do Trabalho Escravo, em três desde 1985. Ele assumiu o cargo até 2007, pelo PSOL).
Senadores Suplicy, Cristovam,
de fevereiro. como suplente de Ana Júlia Carepa Na despedida do Senado, deixou
Paim e Nery (ao fundo) na Nery, que foi o presidente de (PT), eleita em 2006 para o governo claro que vai persistir no seu traba-
instalação da Subcomissão fato da frente até janeiro, agradeceu do estado. lho: “volto a minha querida Abaete-
Permanente de Combate ao a homenagem recebida dos colegas Fundador da Central Única dos tuba, para ali continuar o sonho e a
Trabalho Escravo, em 2009
e revelou que seu sonho é ver pro- Trabalhadores (CUT), Nery apoiou luta de ajudar a construir um Brasil
mulgada a PEC 438/01 ainda este e assessorou atividades de formação justo, honesto, onde todos tenham
ano, no mesmo dia em que foi san- sindical no Pará, em especial das en- pão, justiça e liberdade. É essa a mis-
cionada a Lei Áurea, 13 de maio. tidades da região de Guajarina. De são a que nos dedicamos”.
“Foi o senador José Nery quem
nos juntou, quem está por trás de
tudo isso e quem vai continuar tendo Nery participa de
um papel fundamental, mesmo sem manifestação para
pedir a aprovação
ser senador. Lembro que Joaquim
da PEC 438/01 pela
Nabuco, durante a luta pela aboli- Câmara dos Deputados
ção, chegou a perder a eleição para
deputado em Pernambuco e isso
não significou que ele tenha parado
a luta e não tenha se transformado
no grande patrono da primeira abo-
lição, enquanto esperamos a segun-
da”, disse Cristovam, vice-presidente
da frente parlamentar.
Na presidência da Subcomissão
de Combate ao Trabalho Escravo,
Nery foi um dos articuladores da
criação da Frente Parlamentar Mista

Geraldo Magela
pela Erradicação do Trabalho Escra-
vo, em 2010.
O ex-senador foi ainda o au-
tor do projeto que deu origem à Lei
José Cruz

58 
maio de 2011 www.senado.gov.br/emdiscussao 
59
« SUMÁRIO
Propostas

Votação da
Maio de 2002: João Batista Alves trabalha
à semelhança dos escravos na fazenda
Sapucaia, município de Xinguara, Pará

“segunda Lei Áurea”


sofre resistências

U
Emenda à ma da s principa is 150 deputados. E seus argumen-
Constituição é vista b a n d e i r a s d a qu e - tos não são poucos (leia mais na
les que combatem o pág. 68).
como chance de punir trabalho escravo é a A aprovação na Câmara em
criminosos, mas espera aprovação da proposta de emenda 2004, com 326 votos favoráveis
votação há sete anos à Constituição (PEC) que permi- (apenas dez contrários e oito abs-
te a expropriação das terras onde tenções), garantiu pouco mais
sejam encontrados trabalhadores que o mínimo necessário, mesmo
em condições de escravidão. Já com a votação acontecendo após
aprovada no Senado e na Câmara o assassinato dos auditores fiscais
em primeiro turno, a PEC espera do trabalho em Unaí, no interior
a votação final (segundo turno) mineiro (leia mais na pág. 38). A
pelos deputados desde 2004 (veja comoção do momento fez com
nas páginas 66 e 67 a tramitação que a Câmara oferecesse a PEC
da proposta, que já dura 16 anos). como resposta à sociedade, como
Mas qual a razão para tanta costuma acontecer quando ocor-
demora? Em primeiro lugar, uma rem crimes hediondos no país.
PEC precisa de grande número Se, por um lado, a Frente Par-
de votos para ser aprovada (308 lamentar Mista pela Erradicação
deputados). Basta que um grupo, do Trabalho Escravo e a Organi-
mesmo que minoritário, não com- zação Internacional do Trabalho
pareça à votação para que ela seja (OIT), entre outros, consideram
considerada rejeitada, ainda que a PEC uma “Segunda Lei Áurea”,
tenha obtido 307 votos favoráveis já que oferece punição severa para
e nenhum contrário. Quando isso quem patrocina a escravidão, os
acontece, todas as votações favo- opositores da proposta temem que
ráveis, inclusive no Senado, são a expropriação de terras seja apli-
prejudicadas e o processo legisla- cada de forma arbitrária, prejudi-
tivo tem que começar do zero. cando não apenas o proprietário,
Para dificultar ainda mais, en- mas toda a sua família.

J. R. Ripper/Imagens Humanas
tre os grupos interessados em que Há ainda quem argumente que
a PEC não seja transformada em a legislação atual já é suficiente
Emenda Constitucional está um para coibir o crime. Com tan-
dos mais poderosos e bem orga- tos percalços, o capítulo final da
nizados do Congresso: a bancada PEC 438/01 ainda deve demorar
ruralista, que congrega mais de a ser escrito.

maio de 2011 www.senado.gov.br/emdiscussao 


61
« SUMÁRIO
Propostas Propostas

Para defensores, expropriação de suas fazendas a outras pessoas


e não se preocupam ou se respon-
sabilizam pelas condições de tra-
impunidade (leia mais na pág.
47). Em grande parte dos casos, é
comum que o crime – cujo julga-
será uma demonstração à comu-
nidade mundial de que o país não
tolera essa prática”, disse o relator

significa nova abolição balho oferecidas aos empregados.


Se houver a hipótese da perda da
propriedade, porém, esse artifí-
mento pode chegar a quatro ins-
tâncias da Justiça, até o Supremo
– prescreva.
da PEC, o ex-deputado Tarcísio
Zimmermann (PT), hoje prefeito
de Novo Hamburgo (RS).
cio não poderá mais ser usado e Por isso, argumentam os que No Congresso, a ex-oficial na-

O apoio à PEC que expropria


o imóvel de quem explorar
trabalho escravo é grande. Além
meio da perda de grande parte do
seu poder econômico, ou seja, o
imóvel, rural ou urbano, onde o
As palavras desapropriação,
expropriação e confisco não
são sinônimos.
o dono das terras terá que buscar
alternativas para adequar-se às leis
trabalhistas do país.
combatem o trabalho escravo, a
reincidência é comum entre os
que cometem esse crime. “É um
cional do Projeto de Combate ao
Trabalho Escravo, da Organiza-
ção Internacional do Trabalho
dos mais de cem parlamentares crime aconteceu. A expropriação é a tomada da Outro problema identificado na indício de que a punição atual não (OIT), Patrícia Audi registrou
que apelam pela aprovação da Por conta disso, o presidente propriedade, que admite duas legislação atual, especialmente na assusta muito”, afirma o editor da que a proposta é reconhecida in-
proposta, a ministra dos Direitos de honra da Frente Parlamentar, hipóteses: a desapropriação aplicação da pena a quem pratica organização não governamental ternacionalmente pela entidade
Humanos, o ministro do Traba- o ex-senador José Nery (PSOL- (expropriação com indenização, o crime de trabalho escravo pre- Repórter Brasil Maurício Hashi- como um avanço no combate a
lho, a Organização Internacional PA), considera que a aprovação da com base em necessidade, vista no Código Penal (Decreto- zume. Na mesma linha, o juiz do esse crime.
do Trabalho e mais de 50 entida- PEC corresponderá a uma nova utilidade pública ou interesse Lei 2848/40), é que a punição, de Trabalho no Distrito Federal e
des reunidas na Frente Nacional abolição – neste caso, da escravi- social) e o confisco (expropriação fato, acontece muito raramente. ex-presidente da Associação Na- Drogas e escravidão
pela Erradicação do Trabalho dão contemporânea. O confisco sem indenização, como sanção Quando há uma condenação, ge- cional dos Magistrados da Justiça Os defensores da PEC argu-
Escravo reforçam a necessidade do bem é considerado uma pu- por um ato ilícito). ralmente a pena de dois a oito anos do Trabalho (Anamatra), Grijalbo mentam ainda que o próprio arti-
da medida, lamentando a demora nição mais efetiva, que pode ser de reclusão é convertida em presta- Fernandes Coutinho, entende que go da Constituição a ser alterado
da Câmara em dar a sua palavra aplicada rapidamente, e, assim, ção de trabalhos comunitários. a PEC pode ter efeitos rápidos e já prevê a possibilidade de expro-
final. inibir quem pretende submeter 438/01, o ex-deputado Paulo A lentidão da Justiça brasileira eficazes, já que os “escravocratas priar terras usadas para crimes.
Os argumentos usados são outras pessoas às diversas formas Rocha (PT-PA) explica que, atu- e o próprio conflito de competên- modernos” temem um tratamento “Se uma área destinada às dro-
fartos. O principal deles é que a de escravidão. almente, proprietários de terras, cia para julgar esse tipo de crime, penal mais rigoroso. gas pode ser expropriada, o mes-
PEC vai aumentar a punição para Autor de um dos textos que para evitar problemas com a Jus- atualmente em discussão no STF, O subprocurador-geral do Tra- mo deve acontecer com uma área
quem patrocina a escravidão, por tramitam juntamente com a PEC tiça, transferem a administração também alimentam a crença na balho, Luis Antonio Camargo, usada para a escravização”, argu-
também avalia que a PEC seria
uma forma de dar à sociedade

Daniel Castellano/AGP

Célio Azevedo/Agência Senado


uma demonstração de que o país
está disposto a erradicar o traba-
Plantação de maconha lho escravo. “Para que não tenha-
descoberta pela polícia em São mos que explicar a cada momento
José dos Pinhais, na grande
Curitiba: Constituição já prevê
o porquê de tanta impunidade”,
expropriação para esse crime afirmou no debate realizado no
Senado.
“Estamos tentando traduzir
esse grito no Congresso, espe-
rando que não haja mais motivo
para protelar a decisão de afir-
mar, em alto e bom tom, que a
propriedade não vale mais que a
dignidade. Que, se o instrumen-
to do crime, a terra, a proprie-
dade, priva milhares de traba-
lhadores da sua dignidade e da
sua liberdade, então tem que ser
confiscado, porque não cumpre
sua função social”, afirmou a de-
putados e senadores o frei Xavier
Plassat, da Comissão Pastoral da
Terra (CPT).
Da mesma forma, a reação da
comunidade internacional, que
seria muito favorável, é usada
como argumento para sensibilizar
deputados para a necessidade de
aprovar a PEC.
“A PEC proporciona um ins-
Ex-oficial nacional do Projeto de Combate ao
trumento mais efetivo de punição Trabalho Escravo, da OIT, Patrícia Audi entende
aos poucos criminosos que explo- que a PEC seria avanço reconhecido no exterior
ram o trabalho escravo. Aprová-la

maio de 2011 
63
« SUMÁRIO
Propostas Propostas

Wilson Dias/ABr
menta o juiz Grijalbo Coutinho.
Esse raciocínio foi utilizado
também pela ministra dos Direi- Veja os argumentos a favor
tos Humanos, Maria do Rosário,
na audiência da frente parlamen- e contra a PEC 438/01
tar. “Precisamos avançar numa
legislação que iguale, do ponto
de vista da propriedade da ter-
ra, o trabalho escravo ao plantio Favoráveis Contrários
de entorpecentes. Temos de estar
preocupados com o ser humano, Prevê alternativa, além da A falta de uma definição
tanto quanto com a droga, por- prisão, para punir quem clara sobre o que é
que o trabalho escravo destrói a patrocina o trabalho trabalho escravo pode
sociedade, destrói vidas”, disse. escravo, com forte efeito levar ao confisco arbitrário
O que os militantes pelo fim econômico para o criminoso de imóveis produtivos
do trabalho escravo esperam é
que as mudanças na lei não sejam, Ministra Maria do Rosário defende a expropriação de terras onde houver A punição pode ser aplicada A avaliação subjetiva
mais uma vez, uma reação tardia trabalho escravo, como acontece onde há cultivo de plantas psicotrópicas com maior celeridade dos fiscais do Trabalho
do Congresso Nacional à violên- pode ser determinante no
cia contra trabalhadores e contra O ex-presidente do Sindicato história se constrói com sangue”. processo de expropriação
os que combatem a escravidão no Nacional dos Auditores Fiscais do “Não deveríamos aguardar ou-
Brasil, como em 2004, quando Trabalho (Sinait) Fahid Tahan tra série de assassinatos para re- A perda das terras torna O trabalho agrícola é “mais
a votação da PEC se deu em se- Sab lamenta que a aceleração tomar o tema”, sugeriu Zimmer- inócuo o artifício do dono rústico” e não pode ser
guida ao assassinato dos auditores da tramitação da PEC naquele mann. de transferir a propriedade comparado àquele feito em
fiscais em Unaí (MG). ano tenha demonstrado que “a (Com Agência Câmara) para outra pessoa, que fábricas e em zonas urbanas
age como “laranja”

A pena prevista no Código Há excesso de regras

Perda da propriedade que explora Penal raramente é aplicada,


pois, quando não se perde
trabalhistas, o que gera
insegurança jurídica e faz
trabalho escravo é objetivo da proposta na lentidão da Justiça,
geralmente é convertida
com que uma fazenda seja
acusada indevidamente
em trabalhos comunitários de usar trabalho escravo
A PEC 438/01 prevê a expropria- (DEM-TO), na época deputada fede- dependentes químicos, fiscalização
ção das terras onde houver trabalho ral. A proposta, apoiada pela Frente do cultivo de plantas psicotrópicas e Dá à sociedade uma A sazonalidade da produção
escravo, sem direito a qualquer inde- Parlamentar da Agropecuária (FPA), do trabalho escravo ou, ainda, para demonstração de que o país agrícola e as diferenças
nização. Para isso, pretende alterar permite o confisco também de imó- melhorar as condições de moradia está disposto a erradicar regionais dificultam a
o artigo 243 da Constituição da Re- veis urbanos como punição para o dos trabalhadores libertados. o trabalho escravo aplicação de uma legislação
pública, que já estabelece o confisco trabalho escravo nas cidades para todos os casos
Gilberto Nascimento/CD

de terras em que forem encontradas Foi acrescent ado à PEC que


culturas de plantas usadas para pro- “serão também expropriados, sem Reação positiva da As leis em vigor já são
duzir drogas, como maconha, haxixe qualquer indenização, os imóveis ur- comunidade internacional, suficientes para punir quem
e cocaína. banos, assim como todo e qualquer inclusive com relação aos patrocina o trabalho escravo
Apresentada pelo então senador bem de valor econômico apreendi- produtos brasileiros
Ademir Andrade (PSB-PA) em 1999 do em decorrência da exploração do
(veja cronologia da tramitação nas trabalho escravo”. Com a mudança, Elimina a identificação do A expropriação pune não
páginas 66 e 67), a proposta foi também passariam a ser passíveis de setor primário brasileiro apenas o dono das terras,
aprovada definitivamente pelo Sena- expropriação casas e apartamentos com a prática da violação mas todos os familiares,
do e em primeiro turno pela Câmara. urbanos onde houver cultura ilegal dos direitos humanos mesmo os que não têm
Os deputados anexaram o texto do de plantas psicotrópicas ou explora- conhecimento do crime
Senado a outras propostas, como a ção do trabalho escravo.
PEC 232/95, do ex-deputado Paulo O texto prevê ainda que os bens Aprovação não deve A possibilidade de confisco
Rocha (PT-PA), alterando o original. confiscados, quando convertidos em esperar mais assassinatos e pode levar a uma onda
A aprovação na Câmara, há sete recursos, serão destinados a um fun-

J. R. Ripper/Imagens Humanas
comoção, como aconteceu de invasões de sem-
anos, só foi possível depois de am- do especial a ser regulamentado em após a morte dos fiscais do terra, que acusariam
plas negociações com a bancada lei própria. Antes de ganhar essa re- Trabalho em Unaí (MG) injustamente a existência
ruralista. Para viabilizar um acordo, dação, outras propostas sugeriam a de trabalho escravo em Dezembro de 2001: trabalhador
Relator da PEC até 2007, o
o relator, o então deputado Tarcísio aplicação dos recursos em programas ex-deputado Tarcísio Zimmermann terras produtivas e que escravizado na fazenda Tuerê,
Zimmermann (PT-RS), acolheu uma de habitação popular, assentamentos incluiu imóveis urbanos no texto em Senador José Porfírio, Pará
cumprem sua função social
emenda da senadora Kátia Abreu para reforma agrária, recuperação de aprovado pela Câmara em 2004

64 
maio de 2011 www.senado.gov.br/emdiscussao 
65
« SUMÁRIO
Propostas Propostas

Proposta de confisco de terras onde houver trabalho escravo foi apresentada em 1995
Câmara não conseguiu votar, em quase 16 anos, a PEC que o Senado aprovou em três

José Cruz
Brasil assina acordo junto à Comissão de Constituição, Justiça Senado aprova a PEC em segundo Presidente
18 de setembro

15 de junho

31 de outubro

18 de setembro
Comissão Interamericana de e Cidadania (CCJ) do Senado turno, com 55 votos favoráveis, do TST pede
Direitos Humanos da OEA em que aprova parecer favorável à PEC, nenhum contrário e nenhuma votação da PEC
reconhece a existência de trabalho apresentado pelo então senador abstenção ao presidente
escravo no território nacional Romeu Tuma (PTB-SP) da Câmara

1995 1999 2001 2002


O então deputado Paulo Rocha (PT-PA) apresenta a O então senador Ademir Senado aprova a A PEC chega
11 de outubro

18 de junho

17 de outubro

5 de novembro
PEC 232/95, que prevê a expropriação das terras de Andrade (PSB-PA) apresenta a PEC em primeiro à Câmara dos
quem patrocina o trabalho escravo. A tramitação da PEC 57/99, que, na Câmara, se turno, com 62 Deputados,
proposta, porém, só deslancha na Câmara quando transforma na PEC 438/01 votos favoráveis, onde ganha
o Senado aprova, em 2001, a PEC 438/01 e a envia nenhum contrário o número
para análise dos deputados e nenhuma 438/01
abstenção
Janine Moraes/CD

Luiz Cruvinel/CD

Gustavo Bezerra/CD

Diógenis Santos/CD
Câmara aprova a É lançada a Frente

11 de agosto

4 de junho
CCJ da Câmara Artistas da ONG Humanos Comissão de Trabalho, de
5 de maio

24 de outubro
11 de fevereiro

PEC em primeiro Nacional Contra o


aprova parecer Direitos, entre eles a atriz Letícia turno com 326 Administração e Serviço Público Trabalho Escravo, que
favorável à Sabatella, pedem a aprovação votos favoráveis, da Câmara cria a Subcomissão tem como um dos seus
PEC da PEC ao então presidente da 10 contrários e Temporária de Combate ao Trabalho objetivos a aprovação
Câmara, João Paulo Cunha 8 abstenções Escravo, Degradante e Infantil da PEC 438/01

2004 2007 2008


Três auditores fiscais e um motorista Presidência da Na véspera do aniversário PEC aguarda na pauta Comissão de Direitos Movimento PEC volta a aparecer
Diógenis Santos/CD
2 de março

12 de maio

14 de dezembro

1º de março

12 de março

13 de agosto
28 de janeiro

José Cruz
Márcia Kalume
são assassinados em Unaí (MG). Câmara constitui da Lei Áurea, comissão da Câmara para votação Humanos e Legislação Nacional pela na pauta da Câmara.
A tragédia faz com que a Câmara se comissão especial da Câmara aprova em segundo turno até Participativa (CDH) do Aprovação Porém, até 2009, não
mobilize para votar a PEC especial para parecer do relator, deputado a última sessão do ano. Senado cria a Subcomissão da PEC chega a ser sequer
analisar a PEC Tarcísio Zimmermann Depois disso, sai da Temporária de Combate ao 438 realiza discutida em segundo
Ivaldo Cavalcante

(PT-RS), favorável à PEC, pauta Trabalho Escravo. O senador manifestação turno


com emenda José Nery (PSOL-PA) é eleito no Senado
presidente do colegiado
Geraldo Magela

Criada a Frente Parlamentar Manifestantes colocam


10 de março

27 de maio

pela Erradicação do Trabalho cruzes no gramado em frente


Escravo. O então senador ao Congresso Nacional em
José Nery (PSOL-PA) é homenagem às vítimas dos
eleito presidente conflitos de terras no Brasil

2009 2010 2011

J. R. Ripper/Imagens Humanas
Luiz Cruvinel/CD

Subcomissão da Senado realiza A Frente Nacional Contra o Fórum de Assuntos Fundiários A deputada Andreia Zito O deputado Cláudio Puty (PT-PA)
8 de abril

10 de fevereiro

26 de maio

11 de setembro

17 de março

7 de abril
CDH do Senado sessão especial Trabalho Escravo entrega do Conselho Nacional de Justiça (PSDB-RJ) apresenta protocola no Plenário da Câmara dos
passa a ser para discutir para o então presidente (CNJ) encaminha ofício ao requerimento que pede Deputados requerimento com mais
permanente. combate ao da Câmara, Michel Temer, Congresso Nacional solicitando a inclusão da PEC na de 180 assinaturas para instalação de
José Nery é eleito trabalho 280.404 assinaturas em a aprovação da PEC pauta da Câmara uma CPI do Trabalho Escravo
presidente escravo apoio à aprovação da PEC

66 
maio de 2011 www.senado.gov.br/emdiscussao 
67
« SUMÁRIO
Propostas Propostas

ma Kátia Abreu, apesar de me- que até mesmo o confisco das ter-
ramente burocráticas, são mui- ras de quem patrocina o trabalho
to caras e alheias à realidade do escravo, intuito da PEC, já po-
campo. Para ela, cobrar que haja deria acontecer com as regras em
distância exata entre camas, es- vigor. Isso porque a Constituição
pessura mínima de colchões ou prevê que as terras precisam cum-
dimensões de mesas para refeições prir sua “função social”. Assim,
é exorbitante. Pior que isso, a se- um imóvel rural que patrocine a
nadora considera que esse cenário escravidão, automaticamente, es-
Rodolfo Stuckert/CD

Muito organizada, bancada ruralista leva a uma situação de inseguran- taria ferindo esse princípio.
oferece apoio para escolha do ça jurídica, já que qualquer desli-
deputado Marco Maia (de barba) à Escravidão urbana

Paulo H.Carvalho
Presidência da Câmara, na véspera da
ze pode levar a grandes dificulda-
eleição de 1º de fevereiro des – e pesados estigmas – para os Uma forma de proteger o setor
empregadores. agropecuário durante a discussão
Já a deputada Elcione Barbalho da PEC 438/01 na Câmara foi
(PMDB-PA) alerta para as pecu- a emenda apresentada por Kátia

Ruralistas temem abusos


Para Kátia Abreu, fiscais do trabalho podem
liaridades regionais das ativida- Abreu quando era deputada, que errar ao identificar o trabalho escravo, conceito
des rurais. “Na região Norte, por estende a punição de perda da subjetivo, prejudicando os proprietários
exemplo, o produtor tem que cor- propriedade aos donos de imóveis

no confisco de terras rer contra o tempo para adequar


sua produção ao clima, e não dá
para ter vínculo empregatício com
urbanos que explorem trabalho
escravo. A proposta foi acusada
na época de ser uma manobra
“Há uma falta de respeito muito
grande com esses profissionais,
mas as pessoas só acham que exis-
pessoas que só vão trabalhar du- para retardar a votação da PEC. te trabalho escravo no campo”,

D esde que a PEC que visa


expropriar a terra de quem
explora o trabalho escravo en-
A Frente Parlamentar pela Erra-
dicação do Trabalho Escravo, por
exemplo, entende a escravidão
dos abusos de fiscais do Trabalho
(leia mais na pág. 36).
rante o período da safra. Por isso
a terceirização da mão de obra é
importante”, afirma.
Em defesa da emenda, Kátia
Abreu citou os relatórios das pró-
prias ONGs que combatem o tra-
destaca a deputada pelo Pará.
A emenda da senadora foi in-
corporada ao texto, o que viabi-
controu dificuldades para a sua atual como trabalho degradante Normas em excesso O excesso de normas também balho escravo e da OIT, que ates- lizou a aprovação da PEC pela
aprovação na Câmara, a chama- aliado ao cerceamento da liberda- As características do trabalho é usado como argumento contra a tam também haver trabalho es- Câmara em primeiro turno. Por
da bancada ruralista é aponta- de, enquanto a OIT, como “tra- rural e o excesso de regras a serem necessidade de novas regras, como cravo urbano no país, inclusive na outro lado, há quem entenda que
da como a principal resistência à balho forçado ou obrigatório” sob cumpridas, na opinião de Colat- as sugeridas na PEC 438/01. Val- indústria e no comércio. Segundo a modificação pode até fazer jus-
transformação da proposta em lei. ameaça de sanção, com exceções to, também deixam o setor agro- dir Collato entende que já existe ela, ao ignorar os problemas nas tiça, mas dificulta, e muito, a fu-
Integrantes da Frente Parla- para militares. pecuário mais exposto a punições legislação suficiente, “rigorosa- cidades, a PEC discriminava as tura aplicação da nova norma.
mentar da Agropecuária (FPA Na falta de uma definição mais com base nas leis trabalhistas. mente elaborada para castigar relações de trabalho no campo. O fato de a expropriação das
– nome oficial da bancada rura- objetiva, o deputado Valdir Co- Para ele, é preciso que a sociedade alguém que pratique trabalho es- Assim como Kátia Abreu, El- terras afetar não apenas o cri-
lista) temem a falta de uma defi- latto (PMDB-SC), vice-presiden- reconheça que o trabalho agríco- cravo”. E, por isso, argumenta que cione Barbalho cita as condições minoso, mas toda a sua família,
nição clara de trabalho escravo, te da FPA, teme que o encami- la é “mais rústico” e não pode ser não há motivo para o Congresso de trabalho das empregadas do- também incomoda os defensores
para que, então, a Justiça possa nhamento do pedido de confisco comparado àquele desenvolvido dar prioridade à PEC. Se a legis- mésticas, muitas confinadas a da propriedade rural. Para Valdir
determinar o confisco de terras de terras fique a cargo dos fiscais nas fábricas. lação não é aplicada, continua, o “cubículos” nos apartamentos, e Colatto, qualquer sanção deveria
ou de outros imóveis dos culpa- do Ministério do Trabalho e que “Não pode ser classif icado problema estaria no Judiciário. dos estrangeiros contratados espe- ser aplicada somente ao proprietá-
dos por esse crime. a avaliação dos agentes públicos como escravidão, por exemplo, o E há ainda quem argumente cialmente para a indústria têxtil. rio do imóvel que mantenha tra-
“É claro que todos somos con- envolvidos no combate ao crime fato de o trabalhador não ter um balhadores em situação degradan-
tra o trabalho escravo, mas algu- seja determinante no processo. banheiro com azulejos, no meio te. “Quem pratica o crime deve

SRTE-SP
mas coisas precisam ser esclareci- “Deve haver um conceito para da lavoura. Na fábrica tem ba- ser preso, mas tomar a proprieda-
das na PEC. Como votar algo no que se possa dar segurança às nheiro, tem restaurante azulejado, de afeta outras pessoas, a família
escuro? Ainda existe uma dúvida pessoas, que não sejam enqua- isso não acontece na agricultura.” do proprietário, todos os seus her-
da sociedade porque esse assun- dradas ou perseguidas por um Nessa linha, Kátia Abreu afir- deiros”, argumenta.
to é bastante complexo, tanto do fiscal qualquer do Ministério do ma que fazendeiros muitas ve- Os produtores também ima-
ponto de vista conceitual quan- Trabalho ou outra entidade que zes são acusados de promover o ginam que, com a PEC, os mo-
to do prático”, afirma a senado- se julgue no direito de decidir trabalho escravo apenas por não vimentos de trabalhadores rurais
ra Kátia Abreu (DEM-TO), que pela vida das pessoas. [O traba- cumprir à risca normas para segu- sem-terra acusem a existência de
também é presidente da Confede- lho escravo] é aquele em que a rança e saúde baixadas em 2005 trabalho escravo em alguma pro-
ração Nacional da Agricultura e pessoa não pode ir e vir? Aquele pelo Ministério do Trabalho para priedade apenas para, em seguida,
Pecuária do Brasil (CNA). [em que o trabalhador] está pre- atividades rurais (Norma Regula- invadi-la e exigir sua expropria-
A senadora entende que, da so realmente? Ou aquele que tem mentadora 31). Segundo a sena- ção. Segundo Colatto, já se regis-
forma como está no Código Pe- algum tipo de trabalho que não dora, são 252 itens que precisam traram invasões em propriedades
nal, o crime é definido de forma seja dentro das características e ser observados pelo empregador, produtivas que, embora cumprin-
muito subjetiva quando prevê pe- das exigências do Ministério do que incluem condições de higiene do a função social, foram acusa-
nas para quem reduzir alguém à Trabalho?”, questiona Colatto, e conforto para os trabalhadores. Em 2010, fiscalização trabalhista encontrou duas costureiras bolivianas submetidas das de latifúndios improdutivos.
condição “análoga à de escravo”. que lembra que já foram registra- Muitas dessas exigências, afir- a violência física e moral prestando serviços para apenas uma marca de roupas (Com Agência Câmara)

68 
maio de 2011 www.senado.gov.br/emdiscussao 
69
« SUMÁRIO
Propostas Propostas

foi relator da CPI da Terra, rea- ção com crimes no campo para demos apresentar, para o mundo,
lizada em 2004 no Congresso: evitar que os produtos agrícolas o trabalho escravo como algo que

Marcos Vergueiro/Secom-MT
“Os exploradores de trabalho es- nacionais enfrentem dificuldades marque a produção do setor. O
cravo representam a minoria dos no mercado externo. agronegócio deve estar conosco
fazendeiros, mas são protegidos e “No Congresso, há uma força à frente dessa bandeira, para que
apoiados por nomes expressivos que resiste e que tem impedido possam separar o setor primário
da bancada ruralista, em atitude esse avanço. Acho que o principal brasileiro das condições de servi-
corporativista”. empecilho é certa mentalidade dão, de escravidão e da violação
Dessa forma, Cristovam suge- escravagista ainda presente em se- dos direitos humanos”, afirmou.
re que a Frente consiga sensibili- tores que compõem o Parlamento
zar “o resto do setor empresarial brasileiro, especialmente a Câ- Otimismo
rural chamado agrobusiness, que mara. O trabalho da Frente será O secretário-executivo da fren-
é moderno, já cumpre as leis tra- combinar convencimento, diá- te parlamentar, deputado Do-
balhistas e não tem trabalhador logo e a legítima pressão moral, mingos Dutra (PT-MA), acredita
informal”. libertadora, para acordar aqueles que o novo governo, com novos
Argumentos para isso não que menosprezam essa realidade ministros, e o novo Congresso,
faltam. O jornalista Leonardo e acham até normal que um tra- com novos parlamentares, tra-
Sakamoto, da ONG Repórter balhador seja tratado como escra- zem um novo quadro político em
Brasil, acredita que seja vantajoso vo em pleno século 21”, afirma o 2011 que pode ajudar a aprova-
para o agronegócio brasileiro se ex-senador. ção da PEC este ano.
livrar daqueles que ainda tratam O diálogo foi o caminho Ainda assim, ele considera que
mal os trabalhadores em suas apontado também pela ministra é preciso obter o apoio de par-
propriedades. “É uma minoria de dos Direitos Humanos, Maria do te da bancada ruralista que não
produtores que emprega traba- Rosário. “Setores vinculados ao quer associar sua imagem ao tra-
lho escravo para estabelecer uma agronegócio são fundamentais e balho escravo.
concorrência desleal”, avaliou. devem enxergar o enfrentamento “Não é possível que empresá-
Para o presidente de honra da ao trabalho escravo como parte rios sérios, que pagam seus im-
Colheita de soja em Primavera
frente parlamentar e ex-senador de sua agenda, para que se afir- postos, estejam misturados com
do Leste (MT): meta de quem José Nery, os produtores rurais mem como setores produtivos criminosos”, afirmou Dutra.
quer aprovar a PEC é procurar deveriam apoiar a aprovação da atentos à legislação e às necessi- O deputado está empenhado
apoio dos produtores PEC e eliminar qualquer associa- dades dos trabalhadores. Não po- em, juntamente com o senador
que cumprem as leis trabalhistas

Frente quer apoio do PEC não é a proposta mais dura

Elton Bomfim/CD
"agronegócio moderno" No debate realizado pela Frente
Parlamentar Mista pela Erradicação
do Trabalho Escravo, o senador Cris-
podem garantir a aposentadoria e
auxílios em caso de doença ou inva-
lidez, por exemplo. A falta de paga-
tovam Buarque (PDT-DF) e o depu- mento desses direitos, na opinião de
tado Amauri Teixeira (PT-BA) foram Amauri Teixeira, também deveria ser

R euniões com a presidente


Dilma Rousseff, com o presi-
dente da Câmara, deputado Mar-
que, “enquanto houver resistên-
cia ativa da bancada ruralista e
de setores que se aliam a ela, o
belecendo um antagonismo claro
entre o trabalho escravo e a pauta
do agronegócio, e, assim, quebrar
além do que propõe a PEC 438/01.
Para eles, a punição para quem ex-
punida com a perda da propriedade.
“Não é possível que latifundiá-
plora o trabalho escravo pode ser rio não recolha. Ele se nega a reco-
co Maia (PT-RS), eventos nos es- tema não será votado, ou então, o que seus membros consideram
ainda maior. nhecer o direito previdenciário, nega
tados. A Frente Parlamentar Mis- a proposta não será aprovada”. uma atitude corporativista da
“Acho que a PEC é moderada. esse direito aos trabalhadores. Temos
ta pela Erradicação do Trabalho Apesar da avaliação da senadora bancada ruralista também nesse
Ao invés de desapropriar a terra, de- que ter também, como mecanismo
Escravo já definiu sua agenda de Kátia Abreu (DEM-TO) de que tema.
via impedir, para sempre, que a pes- de perda de propriedade, o não re-
pressão para conseguir a aprova- a bancada ruralista é minoritária O vice-presidente da frente Amauri Teixeira considera a PEC moderada: "Quem
soa tivesse terra. Devia ser a lei de colhimento, o não cadastramento
ção da PEC 438/01 em 2011. Pa- e “não tem tanta força” para im- parlamentar, senador Cristovam explora escravizados devia ser proibido de ter terras"
banimento da propriedade de terra”, dos trabalhadores no sistema previ-
ralelamente, diversos integrantes pedir a votação, uma PEC preci- Buarque (PDT-DF), avalia que a
afirmou o senador. denciário. A questão previdenciária,
da Frente já sugerem que parla- sa do apoio também das minorias identidade de interesses leva pro-
Já o deputado, que é auditor da principalmente dos trabalhadores “Em um país em que existe trabalho
mentares ligados ao agronegócio para conseguir os votos de 308 dutores rurais que cumprem as
Receita Federal e foi superintenden- rurais, tem que ser levada em conta escravo, não podemos aceitar a de-
sejam procurados para conversar deputados na Câmara. leis a, indiretamente, auxiliar os
te do Instituto Nacional do Seguro como elemento de erradicação do soneração da folha completamente,
sobre a aprovação da proposta. Para obter tanto apoio, a Fren- que estão à margem da lei, adian-
Social (INSS) na Bahia, constata que trabalho escravo”, afirmou. porque se estaria apagando a me-
O relator da PEC, o ex-de- te Parlamentar já entende que do a aprovação da PEC. A análi-
é muito comum que os grandes pro- Ele aproveitou a reunião da Fren- mória do vínculo entre o trabalhador
putado Tarcísio Zimmermann terá que convencer deputados li- se coincide com a do ex-deputado
prietários de terras não recolham as te para condenar as propostas de e os empregadores que lhe devem a
(PT-RS), já havia diagnosticado gados aos produtores rurais, esta- João Alfredo (PSOL-CE), que
contribuições previdenciárias, que desoneração da folha de pagamento. previdência”, avaliou.

70 
maio de 2011 www.senado.gov.br/emdiscussao 
71
« SUMÁRIO
Propostas Propostas

Projeto aumenta pena

Leonardo Prado/CD
Cristovam, conseguir a inclusão PEC não sai de onde está”, afir-
da PEC na pauta de votações mou o deputado.
junto ao presidente da Câmara,
Marco Maia. Dutra também en-
tende que o apoio do Palácio do
Embora a aprovação da PEC
este ano ainda pareça um sonho,
houve, na audiência de fevereiro,
contra trabalho escravo
Planalto é fundamental e, para até sugestão de uma data para se

Ricardo Stuckert/PR
isso, vai tentar reunir o maior promulgar a emenda. “Espero que, ouco mais de sete anos depois
número possível de parlamenta- até 13 de maio de 2011, quando se de publicada a Lei 10.803, Em 2003, o ministro da
res para uma reunião com a pre- completam 123 anos da primeira de 11 de dezembro de 2003, que Justiça, Márcio Thomaz
sidente Dilma Rousseff. Abolição, possamos, o Congresso, tipificou e definiu a pena para o Bastos, e o presidente Lula
“Se o Palácio do Planalto não o governo e a sociedade, assinar, crime de trabalho escravo (artigo promulgaram a lei que
alterou o Código Penal
se comprometer, sabemos que a juntos, a segunda Lei Áurea, a se- 149 do Código Penal), o Con-
PEC não destrava, não sai desse gunda libertação dos escravos, re- gresso já se mobiliza para aumen-
gancho infernal que segura essa presentada pela aprovação da PEC tar a punição. A proposta de ele-
votação em segundo turno. Ou 438”, afirmou, esperançoso, o ex- var a pena mínima de dois para,
Domingos Dutra acredita que, sem apoio
o governo da presidente Dilma senador José Nery. pelo menos, quatro anos conta
do Planalto, as chances de aprovação da encampa essa bandeira, ou essa (Com Agência Câmara) com o apoio do governo – no 2º
PEC ficam muito reduzidas Plano Nacional para a Erradica-
ção do Trabalho Escravo – e das
frentes nacional e parlamentar
que tratam do assunto. O prin-
cipal objetivo é, aumentando o
tempo mínimo de cadeia, impe-
Câmara vai criar CPI do Trabalho Escravo neste semestre dir que se converta a punição em
pena alternativa.
O deputado federal Cláudio Puty dar um novo impulso à PEC 438/01. contrar o reforço institucional e a Há um projeto – PLS 208/03,
(PT-PA), acompanhado de deputa- O pedido para abertura da CPI modernização necessários para com- aprovado pelo Senado (PL os criminosos sejam efetivamente lhadores a comprar mercadorias
dos e senadores da Frente Parlamen- teve o apoio da bancada do PT na bater o problema de maneira mais 5.016/05 na Câmara) – que de- condenados no Judiciário. nos armazéns do estabelecimento;
tar pela Erradicação do Trabalho Es- Câmara, única investigação parla- eficaz”, afirmou Puty. fine mais objetivamente o que é De acordo com a proposta, a fizerem descontos ilegais no salá-
cravo, entregou na primeira semana mentar patrocinada pelo partido no Na opinião do ex-senador José trabalho escravo e torna mais se- pena pode ser agravada de um sex- rio; retiverem documentos; e não
de abril o requerimento com 184 as- primeiro ano do governo da presi- Nery, a criação da comissão pode vero o tempo de reclusão: cinco a to a um terço se houver coação ou pagarem débitos trabalhistas.
sinaturas (13 a mais que o mínimo de dente Dilma Rousseff. fazer com que o trabalho escravo dez anos. O texto, do ex-senador retenção de salários, servidão por Assim como em outras propos-
um terço da composição da Câmara) Além do PT, outros partidos da passe a integrar definitivamente a Tasso Jereissati (PSDB-CE), foi dívida, e se a vítima for menor de tas em tramitação no Congresso,
que criou a Comissão Parlamentar de base aliada do governo, como PSB e agenda política do Congresso e da enviado para a Câmara em 2005. 18 anos, idosa, gestante, indíge- o fazendeiro em cujas terras for
Inquérito (CPI) do Trabalho Escravo. PCdoB, estão entre os que mais ce- imprensa. Desde então, o projeto está para- na ou deficiente física ou mental. flagrada a existência de trabalho
A CPI vai investigar denúncias deram apoios à CPI. Para garantir a instalação da CPI, do na Comissão de Agricultura, O projeto também prevê a puni- escravo perde direito a financia-
sobre essa prática país afora. Além “Precisamos investigar, a partir Puty postou na internet um abaixo- onde o relator é o deputado Rei- ção para o aliciamento de traba- mentos públicos, de participar de
de apurar responsabilidades, a co- do Parlamento, as características e assinado de apoio à comissão que naldo Azambuja (PSDB-MS). lhadores, com pena de um a três licitações e pode ter equipamen-
missão também deve propor aperfei- as formas de combate ao trabalho pode ser encontrado em http://mi- O projeto é amplo e altera dis- anos de prisão e multa, agravada tos e instrumentos de sua proprie-
çoamentos na legislação, o que pode escravo. Com a CPI, é possível en- gre.me/4fOcg. positivos não apenas do Código de um sexto a um terço quando dade apreendidos (leia mais na
Penal, mas também da Conso- o recrutamento, aliciamento ou pág. 74).
lidação das Leis do Trabalho transporte do trabalhador for fei- A perda dos bens utilizados por
Leonardo Prado/CD

(CLT) e da lei que regula o traba- to mediante fraude ou cobrança quem patrocinar o trabalho escra-
lho rural (Lei 5.889/73). de qualquer quantia, e quando vo também está prevista em pro-
Os defensores da proposta re- não for assegurado ao trabalhador jeto (PL 8.015/10) do deputado
petem os argumentos usados em condições de transporte para que Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP).
2003, quando foi analisada pelo possa deixar o local de trabalho. Pela proposta, todos os instru-
Congresso a alteração no Código Ficarão ainda sujeitos ao paga- mentos, máquinas, ferramentas
Penal (PLS 161/02, do então se- mento de multa de R$ 2.500, a ou matérias-primas apreendi-
nador Waldeck Ornelas): a me- ser aplicada pelo delegado regional dos serão revertidos em favor da
lhor caracterização do crime de do trabalho, empregadores rurais União. Isso valeria, segundo o
trabalho escravo permitirá que ou seus prepostos que recrutarem deputado, para as máquinas de
policiais e fiscais do trabalho for- trabalhadores fora da localidade costura e insumos de empresários
neçam ao Ministério Público e à de execução do trabalho median- da indústria têxtil que empregam
Justiça elementos suficientes para te fraude ou cobrança de qualquer trabalhadores de outros países de
a acusação e posterior punição dívida; não assegurarem o retor- forma irregular.
dos responsáveis. Porém, o novo no ao local de origem; venderem Hoje, pelo Código Penal, a
Para Cláudio Puty, falta de leis rigorosas projeto não aponta meios de fa- mercadorias a preços superiores perda de bens só ocorre quando
faz com que trabalho escravo seja bom zer com que, aprovada a nova lei, aos de custo; coagirem os traba- são obtidos de forma ilícita.
negócio para empresários inescrupulosos

72 
maio de 2011 www.senado.gov.br/emdiscussao 
73
« SUMÁRIO
Propostas Propostas

Frente parlamentar defende Responsabilização das siderúrgicas


por trabalho em carvoarias
aprovação de outros projetos O deputado Rubens Bueno
(PPS-PR) apresentou projeto (PL
mais nas págs. 40 e 55).
“Não é possível dissociar a
dos donos das carvoarias “testas
de ferro”. “Nada mais justo, por-
603/11) que responsabiliza as in- questão do meio ambiente dos tanto, que as empresas compra-
dústrias que consomem carvão problemas sociais e sanitários doras do carvão produzido, como

A lém da PEC 438/01, a frente parlamentar defende a aprovação de uma


lista de propostas legislativas que tramitam no Congresso. A aprovação
delas também é recomendada pelo 2º Plano Nacional para a Erradicação do
vegetal pela exploração de traba-
lho escravo em carvoarias da sua
cadeia produtiva.
jungidos às condições de trabalho
no elo desta cadeia produtiva”,
afirma o deputado, que lamenta
empregadoras de fato, venham a
assumir as obrigações decorrentes
dos contratos de trabalho firma-
Trabalho Escravo, de 2008. Assim como aconteceu com a PEC, os projetos A proposta segue a lógica da que a siderurgia, responsável por dos nas carvoarias”, afirma Bue-
geralmente conseguem o apoio dos senadores, mas demoram a ser aprovados responsabilidade solidária, ou 17,5% das exportações do Brasil no. O PL também prevê que as
na Câmara. Conheça alguns deles: seja, uma empresa não pode ig- em 2010, tenha um grande passi- carvoarias forneçam aos trabalha-
norar como um fornecedor se re- vo ambiental e social. dores banheiros adequados, água
laciona com seus trabalhadores, Para a reduzir custos, afirma o potável, acesso a primeiros socor-
base do Pacto Nacional pela Erra- deputado, elas terceirizam a pro- ros, local de descanso e equipa-
Proibido financiamento do governo

Cristina Gallo
dicação do Trabalho Escravo (leia dução do carvão vegetal, fazendo mentos de proteção individual.
para empresa com trabalho escravo
O Projeto de Lei 2.022/96, proposta altera a Lei de Licitações Lista Suja com status de lei
do ex-deputado Eduardo Jorge, (Lei 8.666/93) e coloca um novo

J. Freitas
proíbe empresas que utilizem, requisito para as empresas que Projeto (PLS 25/05) do sena- inclusão do nome do infrator no
direta ou indiretamente, traba- desejam obter financiamentos ou dor Pedro Simon (PMDB-RS) cadastro ocorrerá após decisão
lho escravo na produção de bens contratos públicos: a apresenta- transforma em lei a Lista Suja do administrativa final, a partir do
e serviços de tomar financiamen- ção de certificado de regularidade trabalho escravo, hoje prevista na auto de infração do fiscal do Tra-
tos da União, fazer contratos com expedido pelo Ministério do Portaria 540, de 2004, do Mi- balho. Para o empregador ter seu
órgãos públicos e de participar de Trabalho e Emprego. nistério do Trabalho (MTE). A nome excluído da lista, será pre-
licitações públicas. Outro projeto (PLS 487/03), portaria determina a publicação ciso que não haja reincidência por
Já aprovada pelos senadores do senador Paulo Paim (PT-RS), semestral da lista das pessoas e dois anos. Além disso, ele deverá
(na forma do PL 1.292/95, do está no Senado e tem objetivo empresas flagradas na exploração pagar as multas resultantes da fis-
então senador Lauro Campos), a semelhante. Paulo Paim: requisito em licitações de trabalhadores em condições calização, débitos trabalhistas e
análogas à escravidão. O cadas- previdenciários.
tro é referência para impedir que A conversão em lei afastaria
esses empregadores contratem questionamentos de que a porta-
Restrições a estrangeiros que empréstimos ou tenham qualquer ria do MTE invade a competên-
vinculação com órgãos públicos. cia do Legislativo. Arquivada no
exploram trabalho degradante A proposta de Simon tem re- final de janeiro, a proposta pode
José Cruz
gras parecidas com as da porta- voltar à pauta do Senado a pedido
A Comissão de Direitos Hu- A proposta evita o chamado ria do MTE. Estabelece que a da frente parlamentar. Simon: regras semelhantes às do MTE
manos e Legislação Participativa dumping social, que dribla o ri-
(CDH) aprovou, em 24 de março gor da legislação interna através
deste ano, projeto que proíbe en- da contratação de fornecedores
Condenados não poderão dar

Márcia Kalume
tidades ou empresas brasileiras ou e empresas no exterior que não
com representação no Brasil de estão sujeitos às mesmas leis e re-
firmarem contratos com empresas gras de proteção ao trabalho em nome a ruas e monumentos
que explorem trabalho degradan- seus países.
te em outros países. O projeto ainda será analisado Pelo Projeto de Lei do Senado nado. Depois disso, ainda precisa
O projeto (PLC 169/09) de- pela Comissão de Relações Exte- (PLS) 377/05, de Marcelo Cri- ser votada pelos deputados.
fine como forma degradante de riores e Defesa Nacional (CRE) vella (PRB-RJ), bens da União ou Crivella é autor de outro projeto
trabalho a que viola a dignidade antes de ser votado pela Co- entidades da administração indi- (PLS 9/04), que classifica a sub-
da pessoa humana nos termos dos missão de Constituição, Justiça reta federal não poderão receber o missão de uma pessoa à condição
tratados internacionais ratificados e Cidadania (CCJ). nome de pessoa ou figura históri- de escravo como crime hediondo.
pelo Brasil, como os trabalhos es- Já aprovado pela Câmara, o ca condenada pela exploração de Porém, essa proposta, que já tinha
cravo e infantil, e cuja apuração texto original foi apresentado pelo mão de obra escrava. A proposta parecer favorável da CCJ do Sena-
tenha sido feita por organismos senador Walter Pinheiro (PT-BA) Pinheiro apresentou o texto original
já tem parecer aprovado pela CCJ do, foi arquivada no final de janei-
internacionais. quando era deputado. e aguarda votação final na Co- ro e ainda espera pedido para que
missão de Educação (CE) do Se- volte à pauta da CE. Para Crivella, escravizar é crime hediondo

74 
maio de 2011 www.senado.gov.br/emdiscussao 
75
« SUMÁRIO
Para saber mais Para saber mais

Para saber mais


João Anselmo, 51 anos, cortador de cana, e
Olga Maria Martins,67, cega pelo trabalho
nas carvoarias. No momento da libertação,
ambos estavam a seis anos sem receber
salário, trabalhando em troca de comida

A audiência pública de 3 de fevereiro de 2011, promo-


vida pela Frente Nacional e pela Frente Parlamentar
Mista pela Erradicação do Trabalho Escravo, foi o ponto
• Plano Nacional de Trabalho Decente, Ministério do Tra-
balho e Emprego, 2010. http://migre.me/4emEz
As ações do Ministério do Trabalho e Emprego, princi-
de partida para a produção desta revista. O encontro, com pal responsável pela repressão e prevenção ao trabalho es-
quase quatro horas de duração, trouxe dados sobre o pro- cravo, estão registradas nos documentos abaixo.
blema no Brasil e carências do sistema de combate a esse • Relatório de Fiscalização – Ação de Combate ao Trabalho
crime, além de sugestões para alterar a legislação de forma Escravo. Pagrisa S.A. – Ulianópolis (PA). Grupo Especial
a tornar a resposta do Estado mais eficiente. Especialistas, de Fiscalização Móvel, Secretaria de Inspeção do Traba-
13 senadores e dezenas de deputados estiveram presentes lho, Ministério do Trabalho e Emprego, 2007. http://
ao debate e forneceram grande parte das informações pu- migre.me/4emFb
blicadas nesta edição. • A Experiência do Grupo Especial de Fiscalização Móvel,
• Notas taquigráficas do debate. http://migre.me/4eZnm 2001. http://migre.me/4emFH

Como nas edições passadas, os registros feitos pelas agên- Outros órgãos públicos também mantêm atividades
cias de notícias do Senado e da Câmara dos Deputados fo- relacionadas à agenda de combate ao trabalho escravo e
ram a base a partir da qual Em discussão! traça o histórico constituíram importantes fontes de consulta.
da atuação do Congresso nessa área, especialmente no que • Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à
diz respeito às investigações parlamentares e às propostas de Fome (MDS). http://www.mds.gov.br
novas leis de combate ao trabalho escravo. • Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão
• Agência Senado. http://www.senado.gov.br/noticias (MPOG). http://www.planejamento.gov.br
• Agência Câmara. http://www2.camara.gov.br/agencia • Ministério Público do Trabalho (MPT). http://portal.
mpt.gov.br
As análises realizadas pela Organização Internacional do • Supremo Tribunal Federal (STF). http://www.stf.jus.br
Trabalho (OIT) oferecem uma observação credenciada pe- • Tribunal Superior do Trabalho (TST). http://www.tst.
las Nações Unidas sobre o problema, tanto no Brasil quan- gov.br
to no mundo. Foram usadas tanto como ponto de partida • Defensoria Pública da União (DPU). http://www.dpu.
como de apoio para a elaboração de cada capítulo. gov.br
• Não ao Trabalho Forçado. Relatório global do diretor- • Relatório de Gestão do Exercício de 2009, Incra, Ministé-
geral da OIT, 2001. http://migre.me/4emv9 rio do Desenvolvimento Agrário. http://migre.me/4emJU
• Trabalho Escravo no Brasil do Século XXI, 2005. http://
migre.me/4i9zQ As pesquisas e dados de organizações não governamen-
• Uma Aliança Global Contra o Trabalho Forçado. Relató- tais que atuam nessa área, pioneiras na denúncia e na apu-
rio global do diretor-geral da OIT, 2005. http://migre. ração de informações sobre o trabalho escravo no Brasil,
me/4emwi são fundamentais para qualquer análise sobre o tema.
• O Custo da Coerção. Relatório Global do diretor-geral • Conflitos no Campo Brasil 2009, Comissão Pastoral da
da OIT, 2009. http://migre.me/4emwQ Terra, 2010. http://migre.me/4emLH
• As Boas Práticas da Inspeção do Trabalho no Brasil, OIT, • Trabalho Escravo: 25 Anos de Denúncia e Fiscalização,
2010. http://migre.me/4fcPQ Xavier Plassat, 2010.
• Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo,
Outra fonte recente, também da ONU, traz dados e Instituto Ethos. http://migre.me/4fdq7
descreve a escravidão contemporânea: o relatório da rela- • Frente Nacional Contra o Trabalho Escravo e pela
tora especial sobre direitos humanos, Gulnara Shahinian, Aprovação da PEC 438. http://migre.me/4emKg
que visitou o Brasil e o Senado em 2010. • Comissão Pastoral da Terra (CPT). http://migre.
• Relatório da relatora especial sobre Formas Contem- me/4emKM
porâneas de Escravidão, incluindo suas causas e conse- • Centro de Defesa da Vida e dos Direitos Humanos de
quências, sobre sua visita ao Brasil, 2010. http://migre. Açailândia (MA). http://www.cdvdhacai.org.br
me/4emyw • Repórter Brasil. http://www.reporterbrasil.org.br
• Anti-Slavery International (http://www.antislavery.org),
As iniciativas do governo no combate ao trabalho escra- que mantém o site http://productsofslavery.org, com in-
J. R. Ripper / Imagens Humanas

vo e na promoção do trabalho decente são desenvolvidas formações sobre a escravidão em outros países.
em diversos órgãos e estão previstas nos planos nacionais, • Instituto Carvão Cidadão. http://www.carvaocidadao.
publicados em 2003, 2008 e 2010. org.br
• Plano Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo, • Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social.
Presidência da República, 2003. http://migre.me/4emDl http://www.ethos.org.br
• 2º Plano Nacional para a Erradicação do Trabalho Es- • Instituto Observatório Social. http://www.observatorio-
cravo, Presidência da República, 2008. http://migre. social.org.br
me/4emDL

76 
maio de 2011 www.senado.gov.br/emdiscussao 
77
« SUMÁRIO
Para saber mais

• Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil Security and Co-operation in Europe (OSCE), 2010.
(CNA). http://www.canaldoprodutor.com.br http://migre.me/4eoso
• Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricul- • Notas OIT – O Trabalho Doméstico Remunerado na
tura (Contag). http://www.contag.org.br América Latina, 2010. http://migre.me/4emx8
• Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). http://www.
oab.org.br Por fim, as fotos que melhor retratam o drama do tra-
• Movimento Humanos Direitos (MHuD). http://www. balho escravo, por sua precisão e contundência, do fotó-
humanosdireitos.org grafo João Roberto Ripper, estão no site a seguir.
• Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Tra- • Imagens Humanas. http://www.imagenshumanas.com.br
balho (Anamatra). http://www.anamatra.org.br
Outras fontes e trabalhos pesquisados.
Entre as análises acadêmicas consultadas por Em Dis- • Programa Nacional de Direitos Humanos 3, Secretaria
cussão!, está o estudo do sociólogo norte-americano Ke- de Direitos Humanos (SDH) da Presidência da Repú-
vin Bales, que, em seu livro Disposable People: New Slavery blica, 2010. http://migre.me/4en8j
in the Global Economy (Gente Descartável: A Nova Escravi- • Agenda Bahia do Trabalho Decente, Secretaria do Traba-
dão na Economia Mundial), compara a escravidão contem- lho, Emprego, Renda e Esporte do governo da Bahia,
porânea àquela que durou até o século 19 no Brasil. 2007. http://migre.me/4en4S
• Disposable People, Kevin Bales, • Trabalho Decente em Mato Grosso – Uma Agenda Re-
1999. http://migre.me/4emQc gional, governo de Mato Grosso, 2009. http://migre.
• Avanços na Agenda Nacional do me/4emGx
Trabalho Decente, revista Mercado • Chacina de Unaí faz sete anos sem julgamento dos réus,
de Trabalho – Conjuntura e Análise, Ministério Público Federal (MPF), Procuradoria da
nº 44, Instituto de Pesquisa Econô- República em Minas Gerais (PRMG), 28/01/2011.
mica Aplicada (Ipea), Ministério do http://migre.me/4en5D
Trabalho e Emprego, agosto 2010, • Observatório Social em Revista, nº 6, Instituto Obser-
págs. 26-33. http://migre.me/4emR3 vatório Social da Central Única dos Trabalhadores
• A Violência no Campo, Atlas (CUT), junho
da Questão Agrária Brasileira, Edu- 2004. http://migre.
ardo Paulon Giradi, Faculdade de me/4en7U
Ciências e Tecnologia (FCT) da • Trafficking in Per-
Universidade Estadual Paulista sons Report. United
Júlio de Mesquita Filho (Unesp), States Government,
2008. http://migre.me/4emRk 2010. http://migre.
me/4fdCv
A legislação atual sobre o tema foi consultada em di- • J o r n a l P e q u e -
versas fontes, como os bancos de dados da Presidência da no. http://migre.
República e do Senado. Estudo do consultor legislativo da me/4en5l
Câmara dos Deputados Eliézer de Queiroz Noleto tam- • Comissão Intera-
bém traz um apanhado completo das normas sobre o as- mericana de Direi-
sunto. tos Humanos, da
• Trabalho Escravo x Trabalho Decente, Eliézer de Queiroz Organização dos
Noleto, maio de 2009. Consultoria Legislativa da Câ- Estados America-
mara dos Deputados. http://migre.me/4emUh nos (OEA). http://migre.me/4en78
• Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho
Para os dados orçamentários, foi essencial o apoio da (Sinait). http://migre.me/4en61
Subsecretaria de Apoio Técnico da Consultoria de Orça- • Confederação Nacional dos Trabalhadores em Segu-
mentos, Fiscalização e Controle do Senado Federal, com ridade Social, da Central Única dos Trabalhadores
informações do sistema Siga Brasil. (CUT). http://migre.me/4en6x
• Siga Brasil do Senado Federal. http://migre.me/4emVl
O leitor de Em Discussão! pode também ver e ouvir
Sobre o trabalho infantil e adolescente. os programas da TV Senado e da Rádio Senado sobre o
• Plano Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho tema, acessando, pelo celular, o QR Code abaixo.
Infantil e Proteção ao Trabalhador Adolescente, MTE,
2004. http://migre.me/4en1w
• Mapa de Indicativos do Trabalho da Criança e do Adoles-
cente, MTE, 2005. http://migre.me/4en2i

Sobre o trabalho doméstico.


• Unprotected Work, Invisible Exploitation: Trafficking
for the Purpose of Domestic Servitude, Organization for

78 
maio de 2011

« SUMÁRIO

Você também pode gostar