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A parede trombe não ventilada na Casa Solar Passiva de Vale Rosal

Fausto Simões
arquitecologia.org

Contextualização da parede trombe no projecto Vale Rosal

A Casa Solar Passiva de Vale Rosal (CSPVR) incorpora três sistemas solar-passivos (SSP).
O ganho directo e as duas principais modalidades de ganho indirecto: a estufa e a parede trombe
não ventilada (PTnv) em três linhas de aberturas solares correspondentes a três graus de privacidade
(Fausto Simões, 1988).

As três linhas de aberturas solares segundo os três graus de privacidade da Casa Solar Passiva de Vale Rosal

Os sistemas solar-passivos são incorporados na CSPVR de acordo com o seu comportamento


termofísico peculiar.
A estufa foi uma pretensão dos proprietários; está termicamente acoplada à sala comum e foi
desenhada considerando as potencialidades termofísicas e espaciais, mas também os inconvenientes
da ligação ao exterior que caracterizam as estufas. Ela constitui assim a entrada principal da casa,
um espaço intermédio, de passagem mas também um local de permanência quando se revela
apetecível, sem nunca prejudicar o conforto da sala nem a segurança da habitação em geral.
O ganho directo é extensivamente integrado nas zonas mais utilizadas durante o dia e também nos
quartos, atendendo à resposta imediata e eficiente que caracteriza este sistema solar-passivo e dado
que se conjuga com o disfruto da luz natural e o contacto com o exterior em envidraçados correntes.
A parede trombe é aplicada num compartimento de utilização nocturna, um quarto, tirando partido
da inércia da parede. O atraso na transmissão do calor através da parede associado ao ciclo diário
da radiação solar incidente na “abertura solar”, permite situar o pico da onda de calor na face
interior da parede dentro do período de utilização do quarto que é durante a noite.
No caso vertente, a parede trombe (PTnv) aproveita não só a radiação solar mas também o calor dos
gases de escape da lareira pois, estando a parede na prumada da lareira, ela é atravessada pela fuga.

Conjugação da parede trombe com a fuga da lareira na Casa Solar Passiva de Vale Rosal (Gonçalves, 1997)

Constituição da parede trombe (Simões, 1986)

Conjugando conveniências construtivas e termo físicas, a parede tem 400 mm de espessura e é


constituída por um material estrutural e de elevada efusividade: o betão armado.
O revestimento negro-selectivo visa melhorar a sua eficiência pois devido à sua baixa emitância
(cerca de 10%) reduz as perdas nocturnas dispensando a contingente manobra diária de estores para
protecção nocturna. Tendo em consideração a aplicação do revestimento negro-selectivo usou-se
vidro simples na abertura solar, o qual está separado da parede por uma caixa de ar de 50 mm.

Colocação do filme negro selectivo na face exterior da parede trombe

A parede trombe sombreada pelo toldo (à direita) num dia de primavera

A protecção solar da parede trombe combina a fiada de colectores solares para AQS com um toldo
de projectar motorizado, recolhido ao abrigo dos colectores na estação fria e aberto no resto do ano.
Comportamento térmico da parede trombe

Qual a contribuição da parede trombe para o conforto térmico?


Comparando o registo das temperaturas da sala de estar com as do quarto com parede trombe, no
mesmo período de inverno, verifica-se que, como seria de esperar, o quarto tem uma maior
estabilidade térmica ao longo do dia do que a sala de estar que tem maior ganho directo e ainda a
contribuição da lareira. As temperaturas na sala de estar são geralmente mais baixas durante a noite
o que não acontece no quarto com parede trombe.

Folha de registo do termo-higrógrafo instalado na sala de estar no período de 9 a 15 de Janeiro de 1988

As temperaturas do quarto que não tem nenhuma fonte da aquecimento auxiliar, são relativamente
baixas para os padrões de conforto mecânico. Mas não tanto segundo os padrões do conforto
adaptativo.

Folha de registo do termo-higrógrafo instalado no quarto da parede trombe no período de 9 a 15 de Janeiro de 1988
Dados da experiência do Casal do Cónego (Simões, 1984)
Por outro lado, experiência anterior levada a cabo na Casa Solar Passiva de Casal do Cónego
(CSPCC) levou a admitir que o efeito mais significativo da parede trombe (PTnv) no conforto se
deve ao efeito radiativo de uma grande superfície com temperaturas nocturnas superiores à
temperatura do ar interior. No Caso da CSPVR este efeito é acentuado pelos ganhos recebidos da
lareira através da fuga, dado que as maiores temperaturas superficiais da parede se registam nas
imediações da fuga durante a noite, depois do funcionamento diário da lareira no inverno.
O efeito radiativo da PTnv transparece nos andamento das temperaturas do ar e das superfícies
registadas na seguinte monitorização da CSPCC durante um dia:

Esta monitorização visava comparar o andamento das temperaturas nas superfícies da parede
trombe (PTnv) e da massa térmica de um tecto do recanto à lareira, em que as pessoas permanecem
reclinadas, bem como e para referência, num espaço não aquecido e sem ganhos solares, a casa de
banho. A PTnv do quarto e o tecto do recanto da lareira vão assinalados nos dois cortes seguintes

Massas térmicas especiais na Casa Solar Passiva do Casal do Cónego

No caso da CSPCC a parede trombe (PTnv) foi construída com tijolo burro a uma vez, a superfície
exterior foi pintada com tinta água de cor preta (“flat-black”) e o envidraçado é materializado em
vidro duplo, protegido por estores exteriores e uma latada.
Em complemento destes cortes, as seguintes vistas da Casa Solar Passiva do Casal do Cónego
visam dar a entender melhor a integração estética e prática da parede trombe no edifício em geral e
na abertura solar em particular, bem como fazer a comparação com a correspondente incorporação
da parede trombe na Casa Solar Passiva de Vale Rosal

Vista de SW da Casa Solar Passiva de Casal do Cónego durante a obra

Vista de SW da Casa Solar Passiva de Casal do Cónego no final da obra

Conclusão

A incorporação da parede trombe em particular e dos sistemas solares passivos em geral, nos
pequenos edifícios de habitação, visando o conforto térmico dos utilizadores face ás condições de
radiação e clima prevalecentes na maior parte do território português, requer uma íntima ligação
entre a arquitectura e a termofísica. Foi abordada neste trabalho a conjugação de aspectos práticos e
estéticos que se julga merecer uma atenção que não tem tido por parte dos arquitectos portugueses.

Bibliografia

-Simões, F. (1988). Vale Rosal Passive Solar House – An Experience in Process. Proceedings of
the 6º International PLEA Conference. Porto
-Gonçalves, Helder e all (1997). Edifícios Solares Passivos em Portugal. INETI, Lisboa
-Simões, F. (1986). Vale Rosal Passive Solar House - Project and Construction. International
Symposium of Passive Solar Technics for Energy Conservation in Buildings. LNEC, Lisboa
-Simões, F. (1984). Casal do Cónego – uma Casa Solar Passiva – Previsões e Resultados. 1.as
Jornadas de Física e Tecnologia dos Edifícios. IST, Lisboa

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