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CENTRO UNIVERSITÁRIO MAURÍCIO DE NASSAU

BACHARELADO EM DIREITO

NOME DO ALUNO

TÍTULO DO TRABALHO

TERESINA-PI
ANO
2

NOME DO ALUNO

TÍTULO DO TRABALHO

Artigo científico apresentado ao Curso de


Bacharelado em Direito da Uninassau, Unidade
FAP Teresina, como requisito parcial para
aprovação na disciplina Trabalho de Conclusão
de Curso II, sob orientação do Prof. .......

TERESINA-PI
ANO
1

ATIVISMO JUDICIAL: UMA (DES)CONSTRUÇÃO TEÓRICA À


PROBLEMÁTICA POSTA ENTRE POSIÇÕES ANTAGÔNICAS

JUDICIAL ACTIVISM: A THEORETICAL (DE)CONSTRUCTION TO


PROBLEMATIC POSITIONS BETWEEN ANTAGONIC POSITIONS

Estefânia Patrícia Pereira Oliveira1


Marcelo Leandro Pereira Lopes2

RESUMO

Este artigo trabalha o fenômeno do ativismo judicial a partir de vertentes antagônicas, a fim de
demonstrar as implicações da atuação intervencionista do Poder Judiciário em face do sistema
democrático. Nesse sentido, o objetivo geral buscou analisar as implicações da nova forma de
atuação do Poder Judiciário, denominado de ativismo judicial, em face da democracia
representativa, a partir dos principais pontos de tensão e críticas surgidas em seu embate. E
como objetivos específicos: investigar na doutrina as causas determinantes da mudança de perfil
do Poder Judiciário nos moldes concebidos atualmente; analisar se a atuação do Poder
Judiciário, especificamente do STF, no molde mais interferente, denominado de ativismo
judicial, traria conflitos ao sistema democrático ou corresponderia a uma nova forma de se
conceber a atuação do Estado; identificar, na jurisprudência do STF, a ocorrência do fenômeno
e suas repercussões para o sistema representativo democrático. Trata-se de uma pesquisa
exploratória e de campo, com base nas contribuições de Ramos (2015), Barroso (2012),
Teixeira (2012) e Streck (2015). Os dados foram coletados por meio de questionário com
perguntas abertas, a partir do método dialético e da abordagem qualitativa, realizado com três
juristas. Ficou constatado, como resultados, que o ativismo judicial traz tensão ao sistema
democrático, sobretudo em seu viés representativo, pois quando há a interferência descabida
em questões afetas a outros organismos de poder, ao se estabelecer como legislador positivo,
estaria atuando em desacordo com a própria Constituição e, portanto, contra o Direito.

Palavras-chave: Poder Judiciário. Ativismo Judicial. Democracia. Supremo Tribunal Federal.

ABSTRACT

This article deals with judicial activism phenomenon as from the opposite sides, in order to
demonstrate, according to this approach, the implications of the of the Judiciary’s

1
Graduanda em Direito pela Faculdade Maurício de Nassau, Teresina -PI. E-mail:
estefaniapatricia1211@gmail.com
2
Doutorando em Direito Constitucional pela Universidade de Fortaleza – UNIFOR. Mestre em Direito pela
Universidade Católica de Brasília – UCB. Especialista em Direito Constitucional UFPI. Bacharel em Direito
pela Universidade Federal do Piauí- UFPI. Professor pesquisador e Coordenador do Núcleo de Estudo e
Pesquisa em Política, Estado e Direito Constitucional – NEPEEDIC. E-mail: marcelolpl1@hotmail.com
2

interventionism in the face of the democratic system. The general objective that guided the
central issue of this study was to analyze the implications of the new way of acting of the
Judiciary, called judicial activism, in the face of representative democracy, based on the main
points of tension and criticism that emerged in its conflict. Therefore, the specific objectives
are: to identify, through the doctrinal study, the determinant causes of the change of profile of
the Judiciary Power in the molds currently conceived; to analyze whether the performance of
the Judiciary, specifically the Supreme Court, in the most interfering mold, called judicial
activism, would bring conflicts to the democratic system or correspond to a new way of
conceiving the State's performance; to identify in the jurisprudence of brazilian Federal
Supreme Court (STF) the occurrence of the phenomenon and its repercussions for the
representative democratic system. This is an exploratory research, which also uses the technical
bibliographical procedure, based mainly on the theoretical contributions of Ramos (2015),
Barroso (2012), Teixeira (2012) and Streck (2015), in addition, it was adopted a research using
the questionnaire with open questions, using the dialectical method and the qualitative approach
carried out with three jurists, being a magistrate and two teachers, all militants in Teresina, PI,
Brazil. As results it was observed that judicial activism is a phenomenon that brings tension to
the democratic system, especially in its representative bias, because when there is unreasonable
interference in issues affecting other bodies of power, starting to establish itself as a positive
legislator or even invalidating legifi- cant work without subordination to clear parameters of
performance, the Judiciary would be acting in disagreement with the Constitution itself and,
therefore, against the Law itself.

Keywords: Judiciary. Social Activism. Democracy. Federal Supreme Court.

1 INTRODUÇÃO

A presente pesquisa tem por objeto o tema Ativismo Judicial: uma (des)construção
teórica à problemática posta entre posições antagônicas, em que foram considerados, para fins
de desenvolvimento do estudo, o fenômeno do ativismo judicial como instrumento de
intervenção do Poder Judiciário, em especial, pelo STF, no desempenho do papel de
conformação do Estado Democrático, bem como sua relação e limites estabelecidos pelo
sistema representativo regulamentado pela Constituição Federal de 1988.
Com enfoque no ativismo judicial e na democracia, o trabalho se desenvolveu por
meio de um estudo a diferentes concepções acerca do objeto em análise, com o fim de identificar
se a atuação do STF em seu viés mais intervencionista, para fins do estudo, denominado de
ativista, traria conflitos à democracia ou apenas corresponderia a uma nova maneira de conceber
o sistema democrático. Para tanto, partiu-se do seguinte problema: a nova configuração do
Poder Judiciário, sobretudo sob o enfoque do STF, encarada em seu viés mais intervencionista,
denominado de ativismo judicial, traria tensão aos postulados democráticos sob o qual se erigiu
a democracia representativa, ou corresponderia a uma nova tônica estruturante do Estado,
necessária à efetivação dos preceitos constitucionais?
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Nesse diapasão, o presente estudo buscou identificar, a partir das perguntas de


pesquisa: os fatores determinantes ao redimensionamento do Poder Judiciário a ponto de
destaque constatado atualmente e a relação desses fatores com o ativismo judicial, bem como a
ponderação da necessidade ou prejudicialidade do fenômeno em estudo em relação aos
postulados democráticos, levando em consideração a relação deste fenômeno com uma possível
fragilidade das instituições democráticas.
Desse modo, de forma a atender à pergunta central da pesquisa, a hipótese
trabalhada foi a de que o fenômeno do ativismo judicial, posto em confronto com os parâmetros
constitucionais e democráticos, apresenta-se em descompasso com a Constituição e com o
Direito, pois implica na descaracterização da função típica do Poder Judiciário, que, atuando
por meio da legiferação positiva e do intervencionismo desmedido ao campo afeto ao
decisionismo político, ultrapassa os parâmetros necessários e permitidos de atuação deste
mesmo poder, trazendo tensão ao sistema democrático, sobretudo no tocante ao processo
legislativo ordinário, gerando, assim, além de outras implicações, a imprevisibilidade jurídica
e o desequilíbrio entre as três funções estatais.
O objetivo geral sob o qual se assentou, primeira e fundamentalmente, o objeto da
pesquisa, foi analisar as implicações da nova forma de atuação do Poder Judiciário, denominado
de ativismo judicial, em face da democracia representativa, a partir dos principais pontos de
tensão e críticas surgidas em seu embate.
Diante disso, para se alcançar esse objetivo central, foram traçados alguns objetivos
específicos, pelos quais buscaram: investigar na doutrina as causas determinantes da mudança
de perfil do Poder Judiciário nos moldes concebidos atualmente; analisar se a atuação do Poder
Judiciário, especificamente do STF, no molde mais interferente, denominado de ativismo
judicial, traria conflitos ao sistema democrático ou corresponderia a uma nova forma de se
conceber a atuação do Estado; identificar, na jurisprudência do STF, a ocorrência do fenômeno
e suas repercussões para o sistema representativo democrático.
A escolha do presente tema justifica-se pela importância de se debruçar acerca do
papel do Judiciário na conformação dos preceitos constitucionais e sua influência na construção
democrática, com vistas a compreender e refletir sobre as implicações da atuação deste poder,
sobretudo no que tange ao processo de interferência mais abrangente, comumente denominado
de ativismo judicial, a partir de um olhar a diferentes abordagens ao tema e em especial sua
repercussão em relação à democracia. Assim, a relevância do debate acerca do ativismo judicial
encontra, na complexidade do tema e de suas mais variadas formas de compreensão, a
necessidade de entender o real significado deste fenômeno, de forma a transcender a linha da
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mera crítica, fomentando o debate ao que parece ser uma nova forma de se compreender a
configuração do jogo democrático.
Quanto aos aspectos metodológicos, o método utilizado na pesquisa foi o dialético
e a abordagem qualitativa, cujo objeto de natureza exploratória permitiu à pesquisadora um
contato mais próximo com o objeto do estudo. Para o desenvolvimento do conteúdo, foi
utilizada, como procedimento técnico, a pesquisa bibliográfica e de campo, esta última
realizada com três juristas.
Como fundamentação teórica, dialogamos com os seguintes autores: Ramos (2015),
ao abordar sobre o desrespeito aos limites normativos substanciais da função jurisdicional;
Barroso (2012), ao ressaltar acerca da expansão da jurisdição constitucional, do
desenvolvimento da nova dogmática da interpretação constitucional e da superação do espaço
que antes dividiam o direito da moral; Teixeira (2012), ao alertar sobre o ativismo judicial no
que se refere aos resultados nocivos que este pode causar à democracia; e Streck (2015), ao
destacar que o regramento do tema pelo STF vai de encontro aos limites democráticos e,
portanto, contra a própria Constituição; além de contar com vasta análise a artigos e periódicos
relacionados ao tema.
Esta pesquisa desenvolveu nas seções seguintes, em primeiro momento, a análise
do processo de desenvolvimento do Poder Judiciário, essencial para a compreensão do contexto
em que se inseriu o ativismo judicial, em que foram abordados os aspectos básicos que
envolvem o tema, identificando sua origem histórica e estabelecendo seu conceito e
características. Na sequência, foram apresentadas as mais variadas formas de compreensão do
fenômeno, com a finalidade de atribuir, ao debate, arrimo teórico e, ao final, discorreu sobre
seus principais desdobramentos, dentre os quais se destaca a confrontação do ativismo judicial
em relação ao sistema democrático.

2 NOTAS INTRODUTÓRIAS SOBRE ATIVISMO JUDICIAL

Atualmente, a sociedade vive um momento de discussões acerca do papel político-


institucional da Suprema Corte, no desempenho da Jurisdição Constitucional no País. A
Constituição vigente não só atribuiu ao STF o papel de seu guardião, como também conferiu
substrato para uma maior participação nos desdobramentos da vida social e política do povo
brasileiro.
A Carta Magna brasileira de 1988, outrossim, alargou as fronteiras de atuação do
Poder Judiciário, permitindo-o intervir em questões antes reservadas ao espaço de deliberação
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política de Poder. “A Carta brasileira é analítica, ambiciosa, desconfiada do legislador.”


(BARROSO, 2012, p. 4).
A matéria-prima posta a sua disposição, por meio do fortalecimento do modelo
abstrato de controle de constitucionalidade, agora com um rol de legitimados ativos mais amplo,
e o incremento de seus mecanismos introduzidos na Carta Constitucional pelas Emendas
Constitucionais 3/1993 e 45/2004 e com as Leis 9.868/99 e 9.882/99, associado ao conteúdo
analítico da Lei Maior que lhe confere característica dirigente, permitiu que “[...] praticamente
todas as controvérsias constitucionais relevantes sejam submetidas ao STF mediante processo
de controle abstrato de normas.” (MENDES, 2005, p. 89).
O cenário em questão demonstra a atual realidade vivenciada no bojo do cenário
jurídico brasileiro. Em que pese essa realidade ser fato ao qual não se nega vigência, os próprios
desdobramentos da atuação do Poder Judiciário, na apreciação das matérias levadas ao seu
encalço, vêm gerando no seio do debate jurídico inquietações acerca dos rumos a que estes
novos desdobramentos da função judicante poderiam levar em vias de um processo
democrático.
Referido debate, portanto, direciona o olhar em relação ao protagonismo que parece
ter assumido o Poder Judiciário, desde meados do século XX, a uma nova perspectiva de
enfrentamento e que aparece na doutrina, sob um viés, por assim dizer, mais crítico, com a
nomenclatura de ativismo judicial.

3 ATIVISMO JUDICIAL: ORIGEM, CONCEITO E CARACTERÍSTICAS

O termo ativismo judicial encontra na doutrina norte-americana sua origem e


primeira aparição terminológica. Surge num primeiro momento em deferência aos ideais
conservadores que nortearam a atuação da Suprema Corte americana na década de 1920 à
invalidação de leis de caráter social, sobretudo atinente ao processo discriminatório perpetuado
pela segregação racial e àqueles referentes à intervenção econômica promovida pelo New Deal.
O quadro se inverteu na década de 1960, quando a Suprema Corte passou a adotar linha de
pensamento essencialmente progressista, passando, assim, o ativismo judicial a fazer frente aos
anseios liberais, principalmente no tocante a efetivação de direitos fundamentais (BARROSO,
2012, p. 7).

Mas foi com o historiador Arthur Schlesinger Jr., em uma matéria da revista Fortune
intitulada The Supreme Court: 1947, que o termo judicial actvism entrou no léxico
não apenas jurídico, mas sobretudo político e popular. [...] Um aspecto fundamental
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do ativismo judicial que Schlesinger detectou imediatamente foi a maleabilidade do


raciocínio jurídico em detrimento da sua cientificidade. (TEIXEIRA, 2012, p. 39).

De acordo com Koerner (2013), o fenômeno do ativismo judicial pode ser explicado
a partir de processos globais, aos quais teriam contribuído para alteração da própria estrutura
social do Estado. Dentre os fenômenos apontados pelo autor, destacam-se: as transformações
na sociedade industrial, a crise do Estado de direito liberal com uma Constituição garantista e
a passagem, pós-Segunda Guerra Mundial, ao Estado Democrático de Direito, intervencionista
e com uma Constituição dirigente, além de contar com processos mais recentes tais como a
globalização e o neoliberalismo (KOERNER, 2013, p. 71).
No Brasil, o fenômeno se destaca após a Constituição Federal de 1988, nesse
sentido destaca Rocha e Barbosa:

O protagonismo do Judiciário é favorecido pelo que se denomina de judicialização da


política, processo por meio do qual o Poder Judiciário passou a ocupar-se da tarefa de
promover a realização dos valores positivados nos princípios constitucionais e que
tem resultado em processos interpretativos cada vez mais amplos e, via de regra, uma
interpretação crescentemente mais aberta da Constituição. Esse é o contexto em que
se fortalece o chamado ativismo judicial. (ROCHA; BARBOSA, 2015, p. 120).

As discussões referentes ao tema normalmente sustentam a tese de que o STF, “[...]


mediante uma postura ativista, vem redefinindo os limites de sua própria competência
jurisdicional, alçando áreas e temas que talvez não se contivessem no traçado original da
Constituição, alterando, assim, seu próprio peso no concerto político da relação entre os
poderes.” (VALLE, 2009, p. 40).
O ativismo, por ser termo multifacetado, pode assumir diferentes vertentes, a
depender do enfoque teórico que lhe é direcionado. Em que pese não haver na dogmática
jurídica um consenso acerca da definição de ativismo, o fenômeno é comumente tratado
segundo a linha de entendimento de Ramos (2015, p. 131):

pelo próprio ordenamento que incumbe, institucionalmente, ao Poder Judiciário fazer


atuar Por ativismo judicial deve-se entender o exercício da função jurisdicional para
além dos limites impostos, resolvendo litígios de feições subjetivas (conflitos de
interesse) e controvérsias jurídicas de natureza objetiva (conflitos normativos).

Na seara do que explica o autor, o ativismo judicial verifica-se quando há “[...] o


desrespeito aos limites normativos substanciais da função jurisdicional” (RAMOS, 2015, p.
141). Desse modo, “[...] há um núcleo a ser respeitado dentro dos parâmetros do Direito
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positivo, bem como limites subjacentes à própria natureza da função judicial, os quais o
ativismo acaba por fazer eclodir” (FERREIRA, 2014, p. 69).
Dentro de um quadro que aponta inexoravelmente a constatação da atividade
ativista desempenhada pelo Poder Judiciário, há que se destacar que o tema não é pacífico no
cenário brasileiro, ao revés da imprecisão quanto à carga valorativa conferida a expressão,
ensejando, no seio do debate jurídico, polos distintos de opiniões, entre aqueles que advogam
ser o ativismo judicial um fenômeno deletério à democracia, subitamente por afrontar o
princípio da separação dos poderes e adentrar na seara latente aos organismos políticos, e
aqueles que enxergam, na atitude afirmativa do Judiciário, resposta à inércia legislativa e ao
uso excessivo do poder entre as outras instâncias de atuação de Governo.

4 (DES) CONSTRUÇÃO DA TEMÁTICA POSTA ENTRE POSIÇÕES


ANTAGÔNICAS

Para Rocha e Barbosa (2015), existem três posições no Brasil sobre o ativismo
judicial. Conforme a primeira vertente, cuja linha de defesa é encampada no Brasil, entre outros,
por doutrinadores na lavra de Ramos (2015) e Streck (2014), o ativismo judicial vulnera o
regime democrático por múltiplos fatores. Todavia adverte o primeiro autor:

Não há, pois, necessariamente, um sentido negativo na expressão “ativismo”, com


alusão a uma certa prática de jurisdição. Ao contrário, invariavelmente o ativismo é
elogiado por proporcionar a adaptação do direito diante de novas exigências sociais e
de novas pautas axiológicas, em contraposição ao “passivismo”, que, guiado pelo
propósito de respeitar as opções do legislador ou dos precedentes passados, conduziria
a estratificação dos padrões de conduta normativamente consagrados. (RAMOS,
2015, p. 112).

Para essa linha de doutrinadores, consoante o molde delineado por Ramos (2015),
as críticas ao ativismo judicial não se justificam na necessidade de um apego dogmático à
formulação da separação dos poderes tal como concebida pela doutrina setencista, ou mesmo
na negação de qualquer forma criativa a ser utilizada pelo intérprete no processo de
amadurecimento das normas constitucionais, mas, sim, ao manejo desmedido e desempregado
de parâmetros claros, da matéria-prima posta à sua disposição, constituindo em desvio de
competência e extravasamento dos parâmetros constitucionalmente definidos a atividade
jurisdicional.
O ativismo na concepção defendida por esta gama de estudiosos encontra-se
claramente exemplificado no julgamento da fidelidade partidária. Por nove votos a dois, o STF
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se pronunciou declarando que a vaga no Congresso Nacional pertence ao Partido Político. Essa
decisão inaugurou uma nova hipótese de perda de mandato parlamentar, não obstante as já
traçadas expressamente na Constituição Federal, que já regulamentava de forma objetiva a
matéria.
As críticas subjacentes ao enfrentamento deste tema, como também de tantos outros
levados à apreciação do STF, sustentam que a Suprema Corte, ao inaugurar uma proibição não
contemplada na lei, ou em qualquer instrumento normativo, estaria ultrapassando os limites de
sua atuação, passando, assim, a se efetivar como verdadeiro legislador positivo, ou até mesmo
como constituinte concorrente.
A visão encampada pelos autores já mencionados encontra seu contraponto
naqueles que propugnam pela superação do paradigma do Direito Constitucional moderno pelo
qual terminou por culminar em uma mudança na própria base do Direito Constitucional, tanto
sob o aspecto da hermenêutica jurídica como também do próprio sistema institucional, o que
justificaria as posturas daqueles que a crítica denomina de ativistas judiciais.
De certa maneira, essa linha de pensamento encontra guarida nas teorias
neoconstitucionais, mesmo que para muitos de seus defensores a expressão não seja utilizada
como argumento a sua tese; assim, “[...] o reconhecimento de força normativa à Constituição;
a expansão da jurisdição constitucional; o desenvolvimento de uma nova dogmática da
interpretação constitucional” e a superação do espaço que antes dividiam o direito da moral,
contribuíram para a mudança da estrutura do próprio Direito Constitucional (BARROSO, 2007,
p. 134).
Com essa mudança de perspectiva, foi delegado ao Poder Judiciário papel efetivo
na promoção dos direitos herdados de uma geração de direitos fundamentais, o qual, na
conjuntura de valorização dos princípios como normas jurídicas, assumiu papel de principal
tradutor de seus axiomas. Dessa forma:

Estas observações permitem concluir que os autores desta vertente do Direito


Constitucional, o deslocamento ao Poder Judiciário de questões fundamentais que
dizem respeito ao projeto político da nação, o implemento de políticas públicas e à
interpretação e tradução dos diversos axiomas presentes na Constituição, não se
constituiria em distorção ao princípio da separação dos poderes, ou mesmo em
ativismo judicial, adotando aqui carga pejorativa do termo, mas sim uma nova
realidade jurídico-constitucional. (FERREIRA, 2014, p. 81).

Segundo a terceira vertente, que invoca a necessidade do ativismo judicial para fins
de efetivação de direitos fundamentais, a atividade proativa do Poder Judiciário estaria
justificada nos desdobramentos do poder-dever dos juízes de não só interpretarem a
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Constituição como também de torná-la efetiva. Essa atuação mais ativa passa a ser exigida em
maior relevo diante da inércia dos outros dois poderes, sobretudo da omissão na apreciação de
determinadas matérias pelo Poder Legislativo.
A apontada fuga do Poder Legiferante na deliberação de questões que lhe cabem
pelo recorte constitucional, seja em decorrência de sua inércia e muitas vezes falta de vontade
política, terminou por culminar no alavancamento do Poder Judiciário a ponto de destaque na
balança dos poderes. É nesse aspecto que se observa, portanto, o principal fator de
desencadeamento do ativismo judicial.
É com arrimo nesses argumentos que questões como pesquisas de célula-tronco,
casamento homoafetivo, entre outros, são costumeiramente levados à apreciação do STF. Para
aqueles que propugnam por uma intervenção do Judiciário, justificam sob o argumento de
tratarem de direitos constitucionalmente garantidos, cuja emergencialidade de concretização
exige adoção de medidas emergenciais, mesmo que, para tanto, o órgão julgador tenha que se
afastar do que estabelece expressamente a própria Constituição, como no caso da união civil
homoafetiva, ou se fundar em justificativas desprovidas de qualquer previsão Constitucional ou
infraconstitucional, como no caso das pesquisas com células-tronco.
Rocha e Barbosa (2015) identificam um ponto comum nas três vertentes que se
invocam no debate do ativismo judicial, segundo os autores, para todas elas, a postura ativista
compromete o ideal de segurança jurídica a que deve se pautar todas as decisões judiciais.
É importante ressaltar, ainda, que mesmo para os defensores de uma visão do
fenômeno sob dois aspectos, positivo e negativo, o ativismo judicial pode representar uma
ameaça ao sistema jurídico. Para seus defensores, o ativismo judicial, mesmo assumindo por
vezes uma conotação positiva, deve ser utilizado não como regra, mas apenas como via de
exceção.
Desse modo, se esta divergência no debate se mostra presente no contexto das
relações judiciárias, cabe saber se este caminho que tem tomado o Poder Judiciário na tomada
de decisões, que muitas vezes ultrapassam seu campo de atuação, mostra-se deletério aos
cânones da democracia, pilar fundamental do Estado, e mesmo ao próprio desenvolvimento da
atividade jurisdicional.

5 A PROBLEMÁTICA ENTRE ATIVISMO JUDICIAL E DEMOCRACIA

O Sistema democrático brasileiro encontra-se fundado, dentre tantos outros


consectários, no princípio da democracia representativa, por meio deste, o povo, soberano de
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todo o Poder, exerce-o diretamente ou por meio de seus representantes eleitos por meio do voto
popular.
Com vistas a garantir a plena participação da sociedade na consecução dos fins
maiores estabelecidos pela Constituição, a própria Lei Maior garante, por meio do processo
democrático, a observância de procedimentos que garantam a proteção à democracia
procedimentalista, de forma a facilitar as vias de acesso às discussões de cunho político a
participação popular.
Fundamento basilar do Estado Democrático de Direito, o princípio da separação
dos poderes estabelece o dever de harmonia entre as três funções de Estado. Nesse sentido, a
interferência de um órgão sobre outro somente é permitido para assegurar direitos
fundamentais, coibindo abusos e violações a própria Constituição. Quando há o extravasamento
dessas fronteiras demarcatórias de atuação do Poder exercido pelo Judiciário invadindo as
funções de outros organismos do Estado, observa-se caracterizado o ativismo judicial.
Desse modo, o ponto nevrálgico sob o qual se dividem os debates acerca da relação
entre ativismo e democracia identificam, em um possível extravasamento dos limites
subjacentes, a atuação do poder judiciário “[...] quando as Cortes Constitucionais assumem a
tarefa de interpretação e propriamente da construção do significado, do adensamento, dos
postulados de conteúdo aberto, nos quais repousam as questões fundamentais da sociedade.”
(FERREIRA, 2014, p. 117) e no afastamento da população a questões cujo conteúdo exige
participação popular por meio de processo político, o principal ponto de tensão existente entre
ativismo e democracia, vez que o elevado grau de abstratividade dos preceitos constitucionais
termina por deslocar ao espaço restrito do Poder Judiciário, em se comparando ao alcance do
sufrágio, a maturação de questões fundamentais de toda a sociedade.
Em que pese os argumentos que sustentam a legitimidade do Poder Judiciário, na
tratativa de questões das mais variadas conotações, seja pela amplitude de seus espaços, por
vias de acesso a canais de televisão, audiências públicas, amcus curie, ou mesmo pela
capacidade institucional da Corte em razão da racionalidade jurídica e do elevado grau de
dialética que deve acompanhar seu desempenho, o que se questiona é o campo de abrangência
no tocante ao alcance popular na abarricada por tomada de decisões, que, muitas vezes, são
justificadas através de uma norma com elevado grau de abstração, pautado em valores e
moralismos jurídicos cujo modo de enfrentamento, muitas vezes, não alcança os níveis de
entendimento popular. Dessa maneira:
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[...] uma atuação do Poder Judiciário afeta, ou altera substancialmente a lógica de um


processo democrático quando esta função do poder passa a navegar por campos cujas
balizas ultrapassam os limites do ordenamento e do decidido por meio do processo
legislativo, substituindo as próprias escolhas tomadas de forma democrática, ou ainda,
avançando em relação a escolhas e adensamento de temas que, mais cedo ou mais
tarde, seriam objeto de discussão na sociedade. (FERREIRA, 2014, p. 121-122).

O debate divide ainda espaço entre duas teorias do Direito Constitucional, a


primeira, que invoca razões substancialistas, defende que o princípio majoritário, por si só, não
mais corresponde à realidade das democracias contemporâneas; assim, não se deve fincar o
processo de deliberação de questões elementares à sociedade ao espaço exclusivo da vontade
da maioria, mas deve privilegiar a participação igualitária de toda a sociedade no processo de
tomada de decisão.
Por meio desse argumento, invoca-se a maior intervenção do Poder Judiciário na
implementação de políticas públicas, mesmo que se faça sem a observância de limites regrados
pela Carta Constitucional, em prol da efetivação de direitos fundamentais, privilegiando-se,
assim, a teoria substancialista em detrimento da teoria procedimentalista, que privilegia a
proteção do processo democrático a partir da preservação de seus princípios fundamentais, tais
como o princípio da separação dos poderes.
A linha de debate que defende a teoria substancialista é prontamente identificada
no enfrentamento do tema das uniões homoafetivas pelo STF. Barroso (2015), ao se debruçar
sobre esse exemplo, sustentou, em defesa da solução adotada pelo Supremo, argumentos que
muito se assemelham ao que fora defendido por essa corrente de teóricos. Ressalta o autor que
o regramento do caso foi revestido de intensas polêmicas não por se fazerem seus opositores
contrários ao mérito da questão, mas por considerarem a via eleita inadequada, por trata-se de
matéria eminentemente de competência do Legislativo e não do Poder Judiciário.
Em nome dos direitos fundamentais que regem o tema, tais como a igualdade e a
dignidade da pessoa humana, conforme adverte, considerou que reservar exclusivamente a
apreciação da matéria ao Poder Legislativo, negando-a ao STF, não seria a melhor posição a
ser adotada, pois se outra fosse a solução adotada pelo STF se estaria colocando o procedimento
acima do resultado, o que, segundo aduz, não seria um bom critério.
Tomando-se por base o mesmo exemplo, Streck (2009-2014) tece considerações
em sentido oposto. Para o autor, o regramento do tema pelo STF vai em desacordo com os
limites democráticos e, portanto, contra a própria Constituição. E explica que a Constituição
Federal, ao se apresentar como uma Carta que aduz um pré-compromisso firmado por toda a
sociedade, exige de todos os que a manuseiam tem o dever de deferência aos seus postulados.
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Desse modo, o autor invoca algumas principais críticas ao enfrentamento do tema


pela Corte Constitucional e aduz que admitir a regulação das uniões homoafetivas pelo espaço
judicial e não pelo legislador implica em transformar “[...] o Tribunal em um órgão com poderes
permanentes de alteração da Constituição [...] que funcionaria, na verdade, como um verdadeiro
processo de alteração formal da Constituição (Verfassungsanderung), reservado ao espaço do
Poder Constituinte derivado pela via de processo de emenda Constitucional.” (STRECK, 2009,
p. 6).
Sob essa esteira, invocar a manta da mutação constitucional, sob a justificativa de
uma inadequação da norma à realidade, mesmo que seja admitido, não se faz autorizado como
exemplo nessa hipótese, vez que a interpretação conforme deve ser pautada na parametricidade
constitucional, já que os limites de sua inferência não possuem o condão de modificar o texto
da norma, mas permite a criação desta. E salienta que somente na parametricidade com o texto
da Constituição é que pode justificar a mutação constitucional, caso contrário “[...] teríamos
algo inusitado: quando nem a lei ordinária e nem a Constituição explicitam um determinado
direito, ‘faz-se’ uma interpretação conforme..., embora não se indique de que forma ocorre a
incidência da paramitricidade constitucional.” (STRECK, 2009, p. 7).
Essa medida implicaria, portanto, segundo afirma, na ruptura do próprio sistema
Constitucional, já que corresponderia à alteração formal do texto, processo que cabe
exclusivamente, pelo que estabelece a Constituição Federal, ao legislador ordinário.
Ao final, aduz, como faz estudiosos do tema que endossam tese similar, que a crítica
ao uso de ativismos não se faz a uma imposição de limites desarrazoados ao Poder Judiciário.
A atuação da Jurisdição Constitucional é antes de tudo necessária para a própria manutenção
do Estado Democrático de Direito. Aliás, o Poder Judiciário quando provocado a se manifestar
deve-o fazer, até porque, uma vez dispostos na Carta Constitucional, os direitos se tornam
pretensões jurídicas passíveis de inferência judicial. O que não se deve admitir, segundo o autor,
é que:

Em nome do direito não podemos fragilizar o direto. Não se pode confundir a


jurisdição constitucional, absolutamente necessária para concretizar direitos previstos
na Constituição, com um apelo indevido à jurisdição para que atue nas hipóteses que
não estão previstas na Constituição [...]. (STRECK, 2009, p. 14).

Diante dessas posições antagônicas, é preciso estabelecer um ponto de equilíbrio


para manutenção do sistema democrático, a ponto de conciliar os princípios caros à
Constituição Federal com o que demanda as necessidades da sociedade. Assim, deve-se garantir
13

a observância ao direito com a indispensável liberdade de julgar dos magistrados, de forma a


não provocar instabilidades institucionais.

6 ATIVISMO JUDICIAL: UMA (DES) COSTRUÇÃO TEÓRICA À PROBLEMÁTICA


POSTA ENTRE POSIÇÕES ANTAGÔNICAS: ASPECTOS METODOLÓGICOS,
ANÁLISE E DISCUSSÃO DE DADOS

Para alcançar os objetivos pretendidos com o estudo, a presente pesquisa foi


realizada com o intuito de identificar, a partir da análise às diferentes formas de compreensão
do mesmo fenômeno, as implicações do ativismo judicial no contexto do Estado Democrático;
assim, optou-se, neste estudo, pela pesquisa de campo, para analisar os possíveis pontos de
tensão que o fenômeno ativismo judicial pode despertar no contexto do sistema democrático.
O método dialético adotado nesta pesquisa partiu da consideração de que um
fenômeno deve ser interpretado de forma dinâmica em um contexto integrado, tendo em vista
não ser o conhecimento um processo pronto e acabado, mas fruto de constantes alterações.
No tocante aos objetivos, este projeto se valeu da pesquisa exploratória como meio
de investigação salutar a contribuir com a perquirição do tema a partir de sua percepção por
diferentes ângulos e aspectos, uma vez que a pesquisa exploratória permite àquele que dela se
vale, a possibilidade de obter “[...] maior familiaridade com o problema, com vistas a torná-lo
mais explícito ou a construir hipóteses” (GIL, 2010, p. 41).
Quanto ao procedimento técnico, esta pesquisa é bibliográfica, vez que foi realizada
com arrimo em material já elaborado sobre o assunto, a partir da análise de doutrinas, artigos e
periódicos particulares ao tema.
No presente estudo, foi adotada uma abordagem qualitativa, pois está relacionada à
compreensão do fenômeno estudado, partindo-se da interpretação dispensada aos diferentes
significados e características apresentados pelos sujeitos da pesquisa, com a finalidade de que
“[...] o investigador entra em contato direto e prolongado com o indivíduo ou grupos humanos,
com o ambiente e a situação que está sendo investigada, permitindo um contato de perto ou
com mais informações”. (MARCONI; LAKATOS, 2013, p. 56).

6.1 ANÁLISE DE DADOS: QUESTIONAMENTOS AOS JURISTAS

Os dados apresentados na presente pesquisa foram colhidos por meio de um


questionário com perguntas abertas aplicado a três juristas nos meses de abril e maio de 2018,
14

sendo um magistrado e dois professores do curso de Bacharelado em Direito, com atuação


profissional também na área da advocacia jurídica, todos de Teresina – PI.
As respostas obtidas por meio das sete perguntas direcionadas aos entrevistados
permitiram à pesquisadora a obtenção de dados que demonstraram de forma mais próxima a
realidade em que está inserida, as diferentes formas de concepção acerca do objeto de estudo a
partir da ponderação às diferentes perspectivas verificadas por meio da ótica de diferentes atores
do âmbito do Direito. Para fins de distribuição e análise das respostas obtidas, os sujeitos da
pesquisa foram denominados de Juiz, Professor e Professora.
Diante das respostas, foram verificados aspectos semelhantes e divergentes com
relação à matéria estudada. O fenômeno do ativismo judicial, conforme abordado no presente
trabalho constitui tema de vasta amplitude e de considerável complexidade, vez que não se tem,
mesmo com o vasto estudo jurídico, conformidade de opiniões a seu respeito.
O termo por si guarda infinidade de significações. Nesse sentido, a problemática,
quanto a seu estudo, vai além, compreende também o conjunto de inconveniências que são
associadas à desenvoltura do tema, sobretudo quando confrontado com os padrões
democráticos que instituem e dão sustentabilidade às sociedades contemporâneas, cada vez
mais complexas.
Diante disso, com vistas a esclarecer o fenômeno estudado, os entrevistados foram
questionados a respeito da indefinição que acompanha o rótulo ativismo judicial, bem como da
problemática que compreende seu conteúdo, da seguinte maneira: Vossa senhoria reconhece a
existência do ativismo judicial no atual cenário jurídico brasileiro? Como o define? Em que
situações entende que o ativismo judicial se manifesta? E foram obtidas as seguintes respostas:

JUIZ: Sim. Desmedido e temerário. Em casos de mora do Legislativo.

PROFESSOR: Sim, há ativismo. Eu pessoalmente prefiro fazer distinção entre


ativismo e judicialização da política. Nesse sentido, considero a judicialização como
a interferência do Poder Judiciário em um campo que não o ocupa, mas que, todavia,
compreende sua possibilidade de atuação por constituir-se o fenômeno como
consequência do próprio sistema jurídico. Explico, quando se pondera que os juízes
são obrigados a aplicar a Constituição para resolver os casos a eles submetidos e, se a
Constituição brasileira é extremamente principiológica com infinidade de direitos não
autoaplicáveis o Juiz é, por conseguinte, obrigado a julgar quando chamado, mas o
deve fazer de acordo com os ditames Constitucionais. Já o que eu chamo de ativismo
refere-se à atitude do juiz quando este vai além disso, quando ele vai além do que a
Constituição disse que poderia fazer, por exemplo, no episódio da União homoafetiva,
veja que a Constituição e a norma infraconstitucional não abrem à subjetividade, ao
revés, dizem expressamente o que queria, o próprio STF mantém por quase trinta anos
a mesma ideia, e de repente, quase que da noite para o dia, muda-se tudo, isso me
parece que é ativismo .
15

PROFESSORA: Reconheço a existência do ativismo judicial, já que a perseguição à


justiça, ou a fazer justiça, muitas vezes leva o julgador a esquecer em interpretar
extensivamente o texto legal. Entendo que ele se manifesta mais nas causas de cunho
social e nos direitos difusos.

Com as respostas obtidas, constatou-se que todos os entrevistados compartilham o


ideário de que o ativismo judicial é um fenômeno presente na atual realidade institucional
brasileira. Todavia, os mesmos demonstraram, quando da busca por uma definição do
fenômeno trabalhado, certa preocupação, ao estabelecerem, não de forma única na organização
de suas ideias, mas de forma semelhante na compreensão do sentido, que o ativismo judicial
corresponde em um agir do Poder Judiciário para além do que se estabelece o texto normativo,
em especial o texto da Constituição.
Em relação aos critérios ou situações em que se identificam o fenômeno, os juristas
entrevistados responderam de forma distinta, elencando cada um momentos em que
compreendem manifestarem o ativismo judicial. Conforme salientado, a atitude ativista ora fora
identificada nas situações em que há atuação do Poder Judiciário por haver mora do legislativo,
segundo entendimento do magistrado, cuja linha de raciocínio é compartilhada por Barroso
(2015), que entende estar compreendido na crise de representatividade política um dos
principais fatores que enseja a prática de atividade ativista.
A exemplo do enfrentamento do casamento homoafetivo, pelo STF, segundo o
Professor, que embora considerado por Barroso (2015) como alteração benéfica ao sistema, em
razão de se tratar de caso em que há flagrante incidência do princípio da dignidade da pessoa
humana, o que, segundo o autor, justifica o enfrentamento do problema pelo Judiciário que não
correspondia à instância legítima para alteração nessas proporções. Desse modo, é ponderado
por Streck (2014) como evidente desrespeito ao sistema constitucional, já que é inequívoca a
intenção do constituinte originário em regular apenas as situações que estavam compreendidas
na Constituição.
Como ainda, de forma mais abrangente em causas de cunho social e nos direitos
difusos, como aponta a Professora e é defendido por Barroso (2015) como hipótese autorizativa
da prática da atividade ativista, vez que considera como papel da Constituição, e, portanto, de
uma Corte constitucional, a efetivação de direitos fundamentais e a proteção a Supremacia
Constitucional.
Ademais, é importante ressaltar que a opinião dos três entrevistados encontra
arrimo nos estudos de grande parcela da doutrina trabalhada na presente pesquisa,
principalmente no tocante à definição do ativismo judicial, conforme se denota dos
16

ensinamentos de Ramos (2015), para quem a expressão ativismo judicial possui carga
valorativa negativa por associar-se à ideia de uso desenfreado da competência que estabelece a
Constituição Federal ao exercício da Jurisdição Constitucional.
Da mesma forma, para grande maioria dos estudiosos elencados no presente estudo,
com exceção de Lewandowski (2009), cujo periódico intitulado: O Protagonismo do Poder
Judiciário não trabalha a ideia de ativismo, pois não o reconhece no cenário brasileiro, há
constatado no sistema jurídico pátrio a presença do ativismo judicial como fenômeno existente
no processo de interferência do Poder Judiciário em campos correlatos à atuação de outros
poderes, mesmo que, para cada um deles, ele se manifeste ou se caracterize de forma particular.
Ressalta-se ainda a distinção conceitual a qual se propôs o Professor, sendo o único
dos entrevistados a caminhar por esse critério, definindo, em linha semelhante a Barroso (2012),
a distinção entre ativismo judicial e judicialização, conceituando a judicialização como instituto
normal ao ideário jurídico brasileiro e o ativismo judicial como um ato do Poder Judiciário que
escolhe interferir, e, conforme estabelece, interfere de maneira desmedida em campos cuja
participação foge ao que lhe cabe pelo processo democrático.
Verificados a existência do ativismo judicial, suas definições e as situações em que
se estabelece, buscou-se dos juristas respostas quanto à verificação de aspectos positivos e
negativos atribuíveis ao fenômeno. Confrontados acerca disso, os entrevistados responderam:

JUIZ: Reconheço aspectos positivos no que concerne a regulamentação do direito de


greve dos trabalhadores do setor público (por meio de mandado de injunção) e às
ações afirmativas, conferindo eficácia ao artigo terceiro inciso três da Constituição
Federal. Como aspectos negativos, verifico certos comandos de órgãos do judiciário
que substituem a atuação administrativa do Estado, inclusive quanto à repartição
orçamentária.

PROFESSOR: Outra vez fazendo distinção entre ativismo e judicialização verifico no


ativismo judicial aspectos negativos porquanto o judiciário age interferindo em
questões das quais não era necessária sua participação. Já na judicialização vislumbro
aspectos positivos. A judicialização, portanto se afigura, ao contrário do ativismo
judicial como efetivadora de direitos, direitos estes previstos na Constituição Federal.

PROFESSORA: O fato de o ativismo judicial ser uma maneira diferente de olhar o


que seria mais justo em algumas situações lhe confere um certo aspecto positivo, mas
a falta de segurança jurídica que ele ocasiona suplanta qualquer ponto positivo que
venha a ter.

Com relação à definição de aspectos positivos e negativos acerca do ativismo


judicial dos três entrevistados, apenas o Juiz considera o ativismo judicial em certo ponto
benéfico ao sistema jurídico, nas hipóteses de supressão de carências deixadas pelo próprio
legislador.
17

Pondera-se, em contrapartida ao que defende o magistrado, a opinião dos


professores entrevistados, vez que, do confronto ao tema, não identificaram quaisquer aspectos
positivos ao fenômeno em pauta, o que se constata, na resposta do Professor, que apenas declina
aspectos positivos à judicialização, vez que a considera como instituto pertencente à ordem
institucional e, na constatação da Professora, que repele quaisquer aspectos positivos por
considerar que o mal maior ocasionado pela atuação ativista, qual seja, o comprometimento do
princípio da segurança jurídica, afasta a sua possibilidade de incidência.
A respeito destas constatações, verifica-se nos ensinamentos de Barroso (2012)
arrimo ao que defende o magistrado, pois o doutrinador também enxerga no ativismo judicial
aspectos positivos e negativos. Dessa maneira:

O fenômeno tem uma face positiva: o Judiciário está atendendo a demandas da


sociedade que não puderam ser satisfeitas pelo parlamento, em temas como greve no
serviço público, eliminação do nepotismo ou regras eleitorais. O aspecto negativo é
que ele exibe as dificuldades enfrentadas pelo Poder Legislativo – e isso não se passa
apenas no Brasil – na atual quadra histórica. A adiada reforma política é uma
necessidade dramática do país, para fomentar autenticidade partidária, estimular
vocações e reaproximar a classe política da sociedade civil. Decisões ativistas devem
ser eventuais, em momentos históricos determinados. (BARROSO, 2012, p. 9-10).

Nesse sentido, verifica-se que, mesmo considerando aspectos positivos ao ativismo


judicial, Barroso (2012) demonstra preocupação quanto às decisões obtidas no bojo de seu
exercício, vez que, entre outras razões, utilizar-se de decisão judicial em hipóteses em que a
melhor solução estaria na atuação de outros poderes, poderia afastar a atenção ao que realmente
é urgente para manutenção do equilíbrio do sistema democrático, a reforma política.
O ativismo judicial como fenômeno multifacetado carrega consigo aspectos
valorativos que lhe confere diferentes formas de percepção, a depender da forma como o
observador enxerga seu objeto. Nesse sentido, depois de verificadas as respostas dos
entrevistados acerca dos aspectos que envolvem o ativismo judicial, estes foram indagados
acerca dos riscos que entendem passíveis de ser verificados com o fenômeno, a partir da
ponderação sob os efeitos negativos em relação à democracia. Seguem as respostas:

JUIZ: Vislumbro que o ativismo judicial vulnera o regime democrático quando atende
a demandas que compõem matéria de deliberação legislativa (como, “verbi gratia”, a
união civil homoafetiva equiparada ao casamento, sem edição de Emenda
Constitucional).

PROFESSOR: O ativismo judicial oferece riscos, todavia podem ser suplantados pela
própria atividade do legislador, quando edita emenda constitucional.
18

PROFESSORA: A falta de segurança jurídica ou a negativa ao princípio da segurança


jurídica é um risco à democracia, à medida que deixa ao arbítrio do julgador o direito
de pessoas.

Com relação às respostas obtidas, observa-se que todos os entrevistados


identificaram riscos aos quais são possíveis atribuir ao ativismo judicial. De certa forma, as
respostas obtidas não foram idênticas, todavia demonstraram-se semelhantes no que tange ao
conjunto considerado.
Conforme o exposto, é possível encontrar, nos ensinamentos de Teixeira (2012), a
confluência de todas as repostas apresentadas, vez que, segundo o autor, o ativismo judicial
pode resultar em práticas nocivas à democracia quando: o Poder Judiciário, no exercício de sua
atividade de fiscalização da ordem constitucional, invalida atos oriundos de outros poderes,
mesmo quando estes apresentem-se em plena conformidade com a Constituição Federal.
Na mesma linha, verifica-se a nocividade na atuação do Poder Judiciário quando há
a desconsideração em suas decisões da aplicação de precedentes, o que compromete, à sua
maneira, a própria ideia de certeza jurídica, essencial ao Estado Democrático de Direito e à
credibilidade dispensada à ordem jurídica interna, vez que quando há, na atividade do intérprete,
atuação como legislador positivo estar-se-ia, de acordo com autor, fragilizando a estabilidade
do próprio sistema constitucional. Sob esse aspecto, a Professora identifica, em afronta ao
princípio da segurança jurídica, risco de elevada gravidade à ordem jurídica nacional.
Por fim, acrescenta Teixeira (2012), ao que considera ser o maior risco passível de
verificação com o ativismo judicial, qual seja, julgamentos predeterminados a fins específicos,
verificados quando o julgador, atendendo a interesses eminentemente políticos, desconsidera
as razões legítimas para julgar de acordo com necessidades outras, mesmo que, para tanto,
profira decisão contra legem ou extra petita se valendo de argumentos que em nada guardam
relação com a racionalidade do direito.
Da mesma maneira que a ascensão do Poder Judiciário não decorreu de um processo
isolado, o ativismo judicial também teve seu processo de verificação construído a partir de um
conjunto sequencial de fatores. A respeito disso, foram indagados os juristas, obtendo-se as
seguintes respostas:
JUIZ: Considero o ativismo judicial como decorrência de fatores de ordem cultural e
conjunturais (reconhecimento da incapacidade do parlamento atualizar a legislação e
adequá-la). Percebo uma tendência globalizante não apenas no Brasil, mas em vários
países o ativismo judicial recrudesce.

PROFESSOR: Verifico na ineficiência do legislativo fator a ser considerado como


determinante ao desencadeamento do ativismo judicial, ,pois quanto mais omissos o
legislativo e Executivo, mais o Poder Judiciário será chamado a se manifestar.
19

PROFESSORA: A busca incessante de justiça, na sua expressão mais literal


contribuiu para o desenvolvimento do ativismo judicial. A lei é feita para compor
conflitos, mas não necessariamente para fazer justiça.

Diante das respostas dos juristas, verifica-se que o Juiz e o Professor coadunam
com o mesmo entendimento, pois ambos enxergam no déficit do legislativo fator substancial
ao surgimento e desenvolvimento do ativismo judicial, conforme já trabalhado em outro
momento neste estudo. A Professora, por sua vez, entende estar compreendido, na perquirição
à justiça, fator determinante ao surgimento do fenômeno estudado.
A respeito dessa constatação, verifica-se, nos apontamentos de Barroso (2015),
linha de pensamento similar, já que o autor acredita que o processo de redemocratização,
verificado com a promulgação da Constituição de 1988, levou à sociedade vasto conhecimento
dos direitos que a tutelavam, culminando no aumento da procura ao Judiciário com demandas
objetivando a efetivação desses direitos.
O debate sobre o ativismo judicial, antes de qualquer coisa, deve partir
necessariamente do questionamento acerca do papel do Poder Judiciário na conformação do
Estado Democrático. Sob essa perspectiva, os juristas foram indagados, quanto ao seu critério,
qual seria o papel de uma Corte Constitucional na interpretação da Constituição e sua relação
com os demais poderes? E se obteve como respostas:

JUIZ: Sigo Pontes de Miranda. A Constituição deve ser interpretada e aplicada como
foi elaborada, e não como deveria ter sido elaborada. Cabe a uma Corte
Constitucional, como de resto a todo órgão Judiciário aplicar o direito “de lege lata”
e não “de lege ferenda”. O papel de uma Corte Constitucional na interpretação da
norma ápice deve adstringir-se a cotejar a legislação infraconstitucional com os
princípios e preceitos inseridos pelo legislador constituinte na ordem jurídica, sem
desbordar para substituir o parlamento nem a administração pública.

PROFESSOR: Filio-me à ideia de Bruce Ackerman, em que a Corte Constitucional


deve corresponder a um guarda de fronteira, ou seja, sua função é dizer não. A
Constituição por representar a voz do Povo, assim como a lei também corresponde ao
que defende a maioria, é exigido do STF, em uma democracia, a responsabilidade de
fazer valer a vontade majoritária, ou seja, deve ser aquele que vai assegurar a vontade
do Povo, desde que não esteja violando a Constituição. Nesse diapasão, para se ter
mudanças no texto da Constituição, mesmo que sejam necessárias, é essencial que se
aprove uma emenda constitucional. Se for para mudar que o povo dê seu
consentimento através de seus representantes eleitos ou que se firme uma nova
constituinte e se crie uma Constituição. Nesse sentido, entendo ser o STF, guardião
dos valores, mas não dos valores de uma sociedade em geral e sim dos valores do
Constituinte Originário.

PROFESSORA: A Corte Constitucional se molda a determinado papel, a começar


pelas pessoas que a compõem. Não no caso de ser mais de direita ou de esquerda, mas
que tenha competência para interpretar o real significado do texto constitucional.
20

Destarte, ser este o ponto crucial sob o qual se considera o tema estudado, os três
juristas, quando confrontados acerca da temática, responderam de maneira similar, ressaltando-
se as particularidades, o que pode ser resumido em poucas palavras: deve o Poder Judiciário,
em sua representação maior, qual seja, o STF, agir em deferência à Constituição Federal,
assegurando sua Supremacia e os valores consagrados no corpo de seu texto.
Ademais, porque a Constituição, na esteia do que afirma Streck (2009), é um ato de
pré-compromisso firmado por toda a sociedade como garantia à limitação do poder e
observância dos direitos e garantias fundamentais. Nesse sentido, violar seus preceitos, mesmo
que sob a justificativa de uma alteração apenas formal de seu texto, sem, todavia, encontrar
sustentabilidade na Carta Maior, implicaria transgredir os próprios limites democráticos.
Sob essa linha, a interpretação, para além do que a lei paradigma permite, resulta
na ruptura do sistema e não em mutação constitucional, e está aí o arrimo em que repousam
parcela dos estudiosos sobre ativismo para justificar a insustentabilidade de manutenção de
decisões sob este signo.
Nesse sentido, Nery Júnior (2009, p. 95), informa:

A modificação forçada não se caracteriza como mutação constitucional, mas sim


como ruptura do sistema. [...] quando se anuncia ou prenuncia que determinada
circunstância está sendo modificada pelo tribunal constitucional porque se trataria de
mutação constitucional, na verdade está ocorrendo ruptura do sistema, com ofensa
flagrante ao texto e ao espírito da Constituição, porque o anunciador ou pronunciador
está demonstrando à evidência sua intenção de modificar a Constituição sem o due
process legislativo.

O ativismo judicial, observado sob a ótica de quem o considera prejudicial ao


âmbito jurídico, é comumente associado à ideia de extravasamento a limites de competência
definidos pela Lei Maior. Assim, considerando o fenômeno em tela como possível deletério à
própria noção de democracia, os entrevistados foram indagados acerca de possíveis
mecanismos de combate, obtendo-se como respostas:

JUIZ: Identifico mecanismos de combate mediante a fixação de limites de


competência para os órgãos do judiciário, inclusive para a Suprema Corte brasileira.
PROFESSOR: Acho que já temos, seria a possibilidade de aprovação de uma lei ou
aprovação de uma Emenda Constitucional, já que há momentos em que se decide
aplicando a Constituição sob o argumento de que não há lei no caso concreto para
regular determinadas situações.

PROFESSORA: O próprio Judiciário deve ser o combatente direito do ativismo


judicial.
21

Diante das constatações dos juristas, observa-se que cada qual ao seu modo atribuiu,
a partir de aspectos distintos, mecanismos de restrição ao ativismo judicial. O Juiz se valeu da
imposição de limites de competência mais rigorosos ao Poder Judiciário, como forma de
combate ao fenômeno em estudo.
O Professor, por sua vez, identificou na própria atuação do Legislativo,
especificamente na edição de leis ou emendas constitucionais, o meio pelo qual se lançaria
freios a atuação exacerbada do Poder Judiciário, vez que, quando da edição normativa, o
Legislativo imporia sua própria solução à matéria antes regulamentada pelo Judiciário. Já a
Professora considera ser o próprio Poder Judiciário o responsável para combater a prática do
ativismo.
Ressalta-se que, a respeito dos mecanismos de combate ao ativismo judicial, a
doutrina especializada trabalha como primordial à reforma política. Conforme constatado no
presente trabalho e até mesmo com as respostas dos juristas, sobretudo com os argumentos
utilizados pelo Professor, há necessidade de se olhar para além do presente, pois o ativismo
judicial é um problema que se alimenta sobretudo da crise de representatividade que aflige o
País, somado a característica da Constituição Federal de 1988 que, por ter sido projetada com
largo alcance principiológico e imprecisão de seus preceitos, além de gozar de um sistema de
controle de constitucionalidade bastante instrumentalizado, permite ao STF interferir em quase
todas as relações deduzidas e dispostas a seu enfrentamento, o que, conforme se retira da
entrevista com o Professor, não está errado, quando se faz diante dos limites do texto
Constitucional, pois se estaria diante do fenômeno da Judicialização da Política, essencial à
democracia, pois é utilizado para concretizar ações ou suplantar omissões deixadas pelos outros
poderes.
Sendo o órgão de cúpula do Poder Judiciário, o STF, esse como intérprete final da
Constituição e guardião da Lei Maior, muitas vezes é instado a se manifestar em questões da
mais variada monta, o que demonstra quão vasto pode ser seu campo de interferência. A respeito
da constatação e atribuição ao Supremo de práticas ativistas, perguntou-se aos juristas: o
ativismo judicial, no atual contexto em que está inserido, pode ser considerado um instituto
jurídico ou um fenômeno passageiro?
JUIZ: Fenômeno passageiro, porquanto desatende à concepção republicana de
Montesquieu e ao regime democrático.

PROFESSOR: Quanto ao ativismo, eu acho que é fenômeno passageiro, mas a


judicialização não.

PROFESSORA: Não o considero instituto e sim um fenômeno, mas não passageiro.


Entendo que haverá um aprimoramento na sua utilização.
22

Há uma semelhança nas respostas dos entrevistados, pois todos concordam que o
ativismo judicial é apenas fenômeno e não instituto jurídico. Todavia, denota-se da comparação
entre as constatações dos juristas que há divergência quanto à durabilidade do fenômeno, pois
o Juiz e o Professor o identificam como fenômeno passageiro, ao passo que a Professora o
considera de durabilidade indeterminada.
Constata-se, portanto, do enfrentamento do tema que, embora haja juristas que
identifiquem o ativismo judicial conforme uma linha específica de raciocínio, seja para
classificá-lo como desdobramento positivo ou negativo da atividade julgadora. Há para outros,
como na esteia de Barroso (2015) e Teixeira (2012), a verificação do fenômeno a partir de uma
visão amplamente considerada, que pode representar tanto benefícios quanto malefícios, a
depender de como utilizado.
Ressalta-se, todavia, que, mesmo que para estes estudiosos o ativismo judicial possa
representar uma atitude benéfica, por vezes deve ser utilizado de forma comedida por não
constituir o caminho mais indicado para a solução de determinados assuntos, já que, em que
pese considerarem o fenômeno como Teixeira (2012) denomina de Patologia Constitucional
necessária, em razão de sua aparente necessidade, deve ser utilizado conforme adverte o autor
em vias de exceção.
E, conforme essa constatação denota-se o porquê do ativismo judicial não ser
considerado instituto jurídico, existindo, portanto, segundo se interpreta dos ensinamentos de
Barroso (2015) e Teixeira (2012), apenas enquanto houver espaços vazios pendentes de
regulamentação ou controle deixados pelos organismos políticos do Estado.

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este estudo analisou o fenômeno do ativismo judicial a partir de considerações


delineadas por meio de ideias apresentadas entre posições antagônicas com a finalidade de
perquirir resposta à temática posta em problema: a nova configuração do Poder Judiciário,
sobretudo sob o enfoque do STF, encarada em seu viés mais intervencionista, denominado de
ativismo judicial, traria tensão aos postulados democráticos sob o qual se erigiu a democracia
representativa, ou, em verdade, corresponderia a uma nova tônica estruturante do Estado,
necessária à efetivação dos preceitos constitucionais?
Dentro do recorte adotado neste estudo, constatou-se que o avanço do Poder
Judiciário até o que ficou conhecido como ativismo judicial, em grande medida, decorreu dos
23

avanços sustentados com a Constituição Federal de 1988, delimitado o fenômeno à experiência


brasileira. Desse modo, a partir da investigação à doutrina acerca das causas determinantes à
mudança de perfil do Poder Judiciário nos moldes concebidos atualmente, ficou estabelecido
que o fenômeno, dentre outras causas, tem seu surgimento permitido por dois fatores, a
instrumentalização do sistema de controle de constitucionalidade e a característica dirigente da
Constituição Federal brasileira, que mudaram significativamente a atuação do Poder Judiciário,
passando este a assumir novas vestes.
A partir da verificação a atuação do Poder Judiciário, especificamente do STF, no
molde mais interferente, denominado de ativismo judicial, buscou-se investigar se esta atuação
traria conflitos ao Sistema Democrático ou corresponderia a uma nova forma de se conceber a
atuação do Estado. Desse modo, foi permitido identificar que o próprio modelo de jurisdição
constitucional adotado no sistema brasileiro subverte ao Poder Judiciário papel efetivo na
participação da concretização de direitos estabelecidos em seu texto. Assim, a participação
proativa do Poder Judiciário em questões que outrora não lhe cabiam por força do recorte
constitucional, passou a ser consequência inevitável da própria mudança na estrutura da
jurisdição constitucional no País.
Sob esse jaez, restou constatado que o desempenho mais ativo e interferente do
Poder Judiciário é, sim, consequência de uma nova maneira de se conceber as funções desse
poder. Todavia, conforme o conceito vestibulado neste estudo, o ativismo judicial como um
fenômeno que identifica a ultrapassagem de limites, limites estes impostos pelo próprio texto
constitucional, seja por previsão expressa, seja pela falta de clareza de seus preceitos, deve ser
comedido de limitações. Não se pode defender, mesmo que não se negue o papel fundamental
do STF de guardião da Constituição, de forma cética e liberal o desempenho de atividade
ativista nesses moldes, pois ir além do que a muito se estabeleceu como parâmetro maior é um
risco ao qual o tempo pode mostrar de dificultosa superação. Em contrapartida, invocar a
bandeira da abstenção a toda e qualquer matéria que seja controvertida e levada à apreciação
do Poder Judiciário, iria gerar à população que anseia por justiça, e pela efetivação de seus
direitos, sentimento de descaso, de abandono, o que, consequentemente, provocaria
perecimento de seus direitos fundamentais.
Assim, enquanto houver direitos pendentes de mecanismos que permitam sua
concretização e dessa mesma maneira se perceba que os fundamentos da Constituição não estão
sendo satisfeitos, a atuação mais ativa e diligente do Poder Judiciário se faz como medida
essencial, todavia esta não pode vir a desconsiderar a atuação dos outros poderes.
24

Não se deve delegar ao poder Judiciário o papel de único responsável na


manutenção do sistema jurídico, político e social de um país, fazendo-se necessária uma
dialogicidade entre as três funções de poder. Assim, a partir da busca à jurisprudência do STF
para identificação da ocorrência do fenômeno do ativismo judicial e suas repercussões para o
sistema representativo democrático, ficou constatado que há o desempenho de atividade ativista
exercido no bojo de sua instituição, destacando-se, nesse sentido, as diferentes posições que
(des)constroem o tema, subsidiando o trabalho com diferentes acepções do mesmo fenômeno.

REFERÊNCIAS

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Brasileira de Políticas Públicas, Brasília, v. 5, Número Especial, 2015. Disponível em:
http://dx.doi.org/10.5102/rbpp.v5i2.3180. Acesso em: 25 out. 2017.

BARROSO, Luís Roberto. Judicialização, ativismo judicial e legitimidade democrática.


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http://www.ie.urfj.br/intranet/ie/userintranet/hpp/arquivos/251020155550te2textos.pdf.
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BARROSO, Luís Roberto. Neoconstitucionalismo e constitucionalização do direito (O triunfo


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FERREIRA, Eber de Meira. Poder judiciário, ativismo judicial e democracia. Mestrado


(Mestrado em Direito) – Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, São Paulo,
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