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SOBERANIA, DIREITOS HUMANOS E

MIGRAÇÕES INTERNACIONAIS

Rossana Rocha Reis

No dia 28 de agosto de 2001, um navio car- Tampa permaneceu no mar, vigiado pela marinha
gueiro, denominado Tampa, de bandeira norue- australiana e impedido de atracar em qualquer
guesa resgatou 438 pessoas que estavam num lugar do mundo.
barco indonésio à deriva em alto-mar. A maioria A situação desse navio serve como uma
dessas pessoas vinha do Afeganistão, mas também metáfora da questão da imigração atualmente,
havia passageiros do Sri Lanka e do Paquistão, refletindo, na figura de um navio impedido de
todos tentando chegar à Austrália. A imprensa atracar, a situação de milhões de pessoas ao redor
dividiu-se entre falar de um navio “cheio de refu- do mundo. Os dilemas e os questionamentos que
giados” ou de um navio “cheio de imigrantes ile- vieram à tona durante as negociações sobre o
gais”. A Austrália recusou-se a recebê-lo, e afirmou destino dos passageiros do Tampa sintetizam, de
que “a carga” do Tampa era responsabilidade da certa forma, uma série de problemas gerais rela-
Indonésia ou da Noruega. A Indonésia ameaçou cionados aos aspectos políticos das migrações
mandar o exército ao porto para impedir os refu- internacionais hoje. Em uma só questão: Afinal, o
giados de desembarcarem, mas depois voltou que impede um indivíduo de viajar para o exteri-
atrás, aceitando recebê-los. Os passageiros, por or ou viver em um determinado país?
sua vez, recusaram-se a voltar e resolveram fazer Levando em consideração de que é cada vez
greve de fome. Durante uma semana, o navio mais fácil, tanto em termos de custo como de tec-
nologia de transporte, se deslocar de um ponto
Artigo recebido em julho/2003 ao outro do planeta, e tendo em mente que as
Aprovado em março/2004 oportunidades econômicas são tão desigualmente

RBCS Vol. 19 nº. 55 junho/2004


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distribuídas em termos geográficos, por que, tal, assume a forma de uma ofensa de um Estado
então, as pessoas não podem simplesmente sair ao outro, e só pode ser discutida e resolvida entre
de um lugar e ir para outro em busca de uma vida eles (Lilich, 1984).
melhor? A característica fundamental que distingue
as migrações internacionais de outros tipos de
Imigração e Estado migração é, portanto, que elas implicam uma
mudança do indivíduo entre duas entidades, entre
A resposta mais simples para essa questão é dois sistemas políticos diferentes. Nesse sentido,
a constatação imediata de que o mundo é dividi- pode-se afirmar que as migrações internacionais
do em Estados, e Estados são associações que, são não apenas um fenômeno social, mas tam-
entre outras características, possuem o monopólio bém inerentemente político, “que advém da orga-
de legitimidade da mobilidade, isto é: nização do mundo num conjunto de Estados
soberanos mutuamente exclusivos, comumente
[…] os Estados modernos e o sistema interna- chamado de sistema westphaliano” (Zolberg,
cional de Estados do qual eles são parte expro- 1999, p. 81).
priaram do indivíduo e das entidades privadas,
Reconhecer a importância do Estado nas mi-
particularmente, mas de maneira nenhuma exclu-
sivamente, os meios legítimos de movimentos
grações internacionais não significa afirmar que
através das fronteiras internacionais (Torpey, ele é necessariamente o fator mais relevante na
2000, p. 4). formação e na manutenção dos fluxos. As migra-
ções internacionais não são causadas exclusiva ou
Nenhuma pessoa hoje pode cruzar a fron- principalmente pela ação do Estado. No entanto,
teira de nenhum país sem estar munida de um ele, por meio de políticas de imigração e cidada-
passaporte, e muitas vezes também de um visto, nia, é um importante fator explicativo no proces-
a não ser nos casos em que haja acordos entre os so de formação dos fluxos e ajuda a moldar a
países como, por exemplo, entre os países mem- forma que esses fluxos adquirem.
bros da União Européia. Assim, os passageiros do Se, no caso do navio Tampa, a Austrália
Tampa não poderiam desembarcar na Austrália decidiu que não aceitaria os passageiros, o navio
sem a concordância desse país. O monopólio de deveria, então, voltar à Indonésia, de onde eles
legitimidade da mobilidade é considerado um dos tinham partido. No entanto, valendo-se do mes-
fundamentos da soberania do Estado.1 mo princípio de soberania, este país também de-
Protestos podem ser feitos, e ocorreram cidiu, num primeiro momento, não recebê-los. Os
nesse caso dentro e fora da Austrália, mas, em últi- passageiros, por sua vez, não queriam voltar a
ma instância, não existe nenhuma organização seus países de origem, e mesmo quando a In-
superior ao Estado neste aspecto específico que donésia se dispôs a recebê-los, recusaram a ofer-
possa obrigá-lo a aceitar quem quer que seja em ta. Eles alegavam estar em busca de asilo político,
seu território. A autonomia do Estado no campo e, nesse caso, as normas internacionais deter-
das migrações é uma das principais características minam que, antes de qualquer ação, deve ser jul-
do direito internacional tradicional. Dentro desse gada a pertinência do requerimento. Ao obrigá-
paradigma, o indivíduo é um não-sujeito, isto é, los a voltar, a Austrália estaria, portanto, violando
não existe. Internacionalmente, são os Estados o artigo 33 da Convenção de Genebra, a chama-
que se relacionam entre si, ou seja, não há uma da norma de non-refoulement, presente também
relação entre indivíduos de uma determinada no protocolo de Nova York, a qual regulamenta a
nacionalidade e Estados de outra. Quando por questão dos refugiados em termos do direito
ventura ocorre um conflito nesses termos, por internacional.
exemplo, se um determinado Estado ofende de A Convenção de Genebra e o protocolo de
alguma forma um cidadão de outro Estado, a Nova York representam um constrangimento
questão passa a ser tratada na esfera governamen- para a autonomia decisória do Estado no que diz
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respeito ao controle de suas fronteiras, e por isso com a perda da nacionalidade os casos de mu-
não se inserem na lógica do direito internacional dança de status, como casamento, divórcio, ado-
tradicional, que garante a soberania nacional no ção ou aquisição de outra nacionalidade.
controle dos movimentos migratórios. A legislação referente ao problema dos refu-
A Convenção Relativa ao Status de Refugiado giados e apátridas, mesmo expandida e aperfeiçoa-
foi assinada em 1951, na cidade de Genebra, e da, continua a se basear numa lógica de exceção,
tinha um âmbito bastante limitado e preciso, qual sem questionar os fundamentos do paradigma
seja, a situação das pessoas deslocadas pelos westphaliano. Em respeito à sua soberania, ne-
regimes totalitários da Europa nos anos de 1930 e nhum Estado é obrigado a acolher os refugiados,
pela Segunda Guerra Mundial. Em 1954, surgiu a apenas são proibidos de mandá-los de volta aos
Convenção Relativa aos Apátridas, que também se países acusados de perseguição (princípio de non-
referia basicamente a situações do pós-guerra. No refoulement). Também não existe nenhum organis-
entanto, com a persistência dos conflitos armados mo supranacional capaz de controlar ou de pu-
e das ditaduras nos anos subseqüentes, esses nir os Estados que infringirem a lei (Bhabha, 1998;
mecanismos foram sendo estendidos e aperfeiçoa- Mbaya, 1998).
dos para dar conta das novas situações. Em 1961, No âmbito geral dos direitos humanos, ape-
foi assinada a Convenção de Prevenção da sar de suas limitações, as convenções relativas aos
Formação de Apátridas, e, em 1967, o Protocolo de refugiados e apátridas representam um ponto de
Refugiados, em Nova York, o qual estendeu o con- inflexão no direito internacional, pois pela pri-
ceito de refugiados para outros tipos de situação. meira vez é reconhecida a existência do indivíduo
A Convenção de Genebra prevê, entre ou- no cenário internacional. Lentamente, direitos
tras coisas, que os Estados signatários têm obri- individuais universais independentes do Estado
gação de analisar os pedidos de asilo e de con- vão sendo reconhecidos, numa tendência que
ceder aos refugiados o mesmo tratamento de que vinha se acentuando desde o fim da Segunda
usufruem os cidadãos do país no que concerne à Guerra Mundial.
educação, à saúde e às condições de emprego. De fato, antes disso, a criação da Liga das
Além disso, deve-se garantir que não haja dis- Nações, da Organização Internacional do Trabalho
criminação e que não sejam penalizados mesmo e a existência de um direito internacional de guer-
os candidatos a asilo que entrarem em um país ra já revelavam uma preocupação internacional
sem autorização. A partir do Protocolo de Nova com o indivíduo. Mas é somente após a Segunda
York, a Convenção de Genebra passou a ser apli- Guerra Mundial que começa a ser criado um
cada também para casos não diretamente rela- regime internacional de direitos humanos, a partir
cionados aos eventos anteriores a 1951. da instauração do Tribunal de Nuremberg, entre
A Convenção sobre os Apátridas de 1954 1945 e 1946, para julgar os criminosos de guerra,
afirma basicamente que os indivíduos não con- e da adoção da Declaração Universal dos Diretos
siderados cidadãos nacionais por nenhum país Humanos em 1948 pela ONU.
devem ter seus direitos garantidos pelo Estado no No âmbito da imigração propriamente dito,
qual residem, o qual deve também ser responsá- cabe destacar que a Declaração garante aos indiví-
vel pela emissão de documentos de identidade, duos, no artigo 15, o direito a ter direitos, isto é, o
além de facilitar o processo de naturalização. A direito a ter uma nacionalidade, de não perdê-la e
Convenção de 1961 trata da prevenção da for- de poder trocar de nacionalidade; no artigo 14, o
mação de apátridas, comprometendo os Estados direito de procurar asilo em casos de perseguição;
signatários a concederem a nacionalidade a pes- e no artigo 13, parágrafo 2, o direito de sair, isto é,
soas que nasceram em seu território ou aqueles deixar seu país de origem, e de voltar quando tiver
nascidos em outro território, cujos pais sejam vontade. Os avanços nesse sentido não represen-
“nacionais” desse Estado, e que, de outra forma, tam, entretanto, uma ruptura com o paradigma
se tornariam apátridas; e também a não punirem anterior. A autonomia decisória do Estado a respei-
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to de quem pode entrar ou residir em seu território Imigrantes (n. 143). Essas duas convenções
permanece assegurada. O mesmo artigo 13, em recomendavam um esforço dos Estados no senti-
seu parágrafo 1, deixa claro que a liberdade de do de divulgar informações que pudessem facili-
movimento e de residência é limitada ao “interior tar o processo de imigração e procuravam garan-
das fronteiras de cada Estado”. Não existe nada tir que os imigrantes recebessem o mesmo
como um “direito de entrar” que possa ser tratamento e tivessem os mesmos direitos que os
equiparado ao direito de sair. O artigo 14 garante trabalhadores “nacionais”, independentemente de
à “vítima de perseguição […] o direito de procurar nacionalidade, raça, religião ou sexo. A segunda
e de gozar asilo em outros países”, contudo ne- incluiu artigos relacionados à questão da imi-
nhum país é obrigado a aceitá-la. gração ilegal e do tráfico de pessoas, além da
A Declaração dos Direitos Humanos, em sua inclusão de parágrafos relativos a direitos cultur-
interpretação mais tradicional, serviria para regular ais. No entanto, ambas têm uma baixa taxa de
apenas a relação entre os Estados e seus cidadãos. ratificação, sobretudo a segunda (41 países rati-
Entretanto, com o reconhecimento cada vez maior ficaram a primeira, e somente 18, a segunda). Nos
do indivíduo no campo internacional, e com o dois casos, países como a Austrália, os Estados
aumento do número de imigrantes no mundo, Unidos e a França, grandes receptores de imi-
tornou-se cada vez mais freqüente sua utilização grantes, estão ausentes. Ainda assim, a situação
como um parâmetro para regular as relações entre dos imigrantes tem atraído cada vez mais a
os Estados receptores e os imigrantes. Por exem- atenção dos organismos internacionais. Desde
plo, o artigo 16, parágrafo 3, afirma que “a família meados da década de 1970, em diversas ocasiões,
é o núcleo natural e fundamental da sociedade e e por meio de diferentes órgãos, a ONU tem se
tem o direito à proteção da sociedade e do manifestado pela necessidade de uma maior regu-
Estado”. Uma interpretação mais liberal desse arti- lamentação internacional sobre o assunto.
go dá margem a uma política de imigração que Em 1990, a ONU aprovou, em Assembléia
preveja a concessão de vistos para membros Geral, a Convenção sobre Direitos dos Imigrantes
estrangeiros de famílias de “nacionais” ou de imi- (18/12/1990), a qual exige não só o mesmo trata-
grantes legais, mesmo quando não for do inte- mento no âmbito do trabalho para cidadãos
resse do Estado receber mais imigrantes. “nacionais” e imigrantes legais, mas também que
Contudo, a maior parte dos países receptores, estes sejam informados de seus direitos numa lín-
mesmo aqueles que mantêm uma política de gua compreensível para eles, que tenham direito
reunificação familiar, reluta em aceitar esse tipo de recorrer ao judiciário em caso de deportação;
de interpretação e em reconhecer a existência for- ademais, estabelece regras para o recrutamento de
mal desse direito. Além disso, persiste a questão estrangeiros. Essa convenção conseguiu o número
de determinar quais pessoas pertencem à família, mínimo de ratificações em 14 de março de 2003, e
isto é, que tipo de laços familiares justificam a passou a vigorar em 1º de julho desse ano. Porém,
inclusão do indivíduo num programa de reunifi- os principais países receptores não a assinaram.
cação familiar. Além das convenções internacionais, exis-
Diante de situações como essa, formou-se a tem também convenções regionais e tratados
consciência de que a Declaração dos Direitos bilaterais que regulamentam situações específicas.
Humanos não era suficiente para lidar com pro- A Organização dos Estados Africanos têm con-
blemas que ocorrem na relação dos Estados com venções próprias para a situação dos refugiados,
indivíduos estrangeiros. O primeiro organismo assim como os países do Oriente Médio, a Orga-
internacional a produzir uma legislação específica nização dos Estados Americanos, o Conselho da
sobre o assunto foi a Organização Internacional Europa e a União Européia. Esta, de fato, possui
do Trabalho (OIT). Em 1949, a OIT produziu a o único mecanismo internacional de caráter vin-
Convenção de Imigração para o Trabalho (n. 97) culante, a saber, a Declaração Européia de Direi-
e, em 1975, a Convenção dos Trabalhadores tos Humanos. Além disso, os países membros
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estão trabalhando na adoção de uma política de or está em situação ilegal (1/3 do total de emi-
imigração comum, o que discutiremos com mais grantes segundo estimativas do Itamaraty). A fragi-
atenção adiante. lidade da situação legal desses imigrantes torna-os
A importância cada vez maior das migrações alvos fáceis do desrespeito aos direitos humanos.
internacionais no cenário internacional também Nesse sentido, é de fundamental importância o
pode ser medida tanto pela proliferação de reu- envolvimento do Estado de origem na questão.
niões onde esse assunto se tornou tema principal Recentemente, o Estado brasileiro tem assu-
(Seminário Internacional sobre o Diálogo Cultural mido uma posição mais ativa em relação à situação
entre Países de Origem e Destino de Trabalhado- dos imigrantes ilegais brasileiros. Em 2003, o presi-
res Imigrantes, 1989), como pelo papel de desta- dente do Brasil, em viagem a Portugal, incluiu na
que que o tema adquiriu em conferências mais agenda das conversações uma discussão sobre a
amplas, como as relacionadas à população, ao tra- situação dos imigrantes ilegais brasileiros no país.
balho e ao combate ao racismo (Conferência Estima-se que a população de brasileiros ilegais em
Mundial de Direitos Humanos, parte 2, parágrafos Portugal seja de 15.000 a 25.000 pessoas, e que
33-35; Conferência Internacional em População e 1.800 brasileiros já tenham sido deportados desde
Desenvolvimento, capítulo 10; Cúpula Mundial de que a última reforma nas leis de imigração por-
Desenvolvimento Social, cap. 3 e 4; e IV Conferên- tuguesa entrou em vigor em novembro de 2001
cia Internacional da Mulher, cap. IV. D). (Folha de S. Paulo, 09/07/2003). Em 11 de julho
Além da questão dos refugiados e dos pro- desse ano, os dois países assinaram um acordo
blemas que envolvem a reunificação familiar, um para facilitar a regularização dessa população. No
dos principais pontos no debate entre a soberania entanto, segundo a Casa do Brasil, entidade for-
do Estado e os direitos individuais no campo das mada por emigrantes brasileiros em Portugal, dos
migrações internacionais concerne ao tratamento 10.793 brasileiros que se apresentaram para o
dado aos imigrantes indocumentados. Existe mui- processo de regularização, apenas 562 con-
ta controvérsia sobre quais são as obrigações dos seguiram o visto de trabalho (até o final de feverei-
Estados para com os indivíduos que se encontram ro de 2004).
em situação irregular dentro de seu território. Em A participação do Estado brasileiro também
termos mais abstratos, trata-se de saber quais são foi importante na obtenção de um acordo para a
os direitos individuais que devem ser garantidos deportação de centenas de brasileiros que estavam
mesmo aos indivíduos que estão “fora da lei”. presos nos Estados Unidos, sob a acusação de imi-
Muitos Estados temem que uma política que con- gração ilegal. Uma comissão parlamentar negociou
ceda muitos direitos aos indocumentados possa com o governo dos Estados Unidos os termos do
servir como um estímulo para que mais pessoas acordo, com vistas a garantir, nas palavras do de-
migrem de forma ilegal. As convenções interna- putado João Magno (PT-MG), que “os repatriados
cionais têm recomendado que os Estados ajam, serão tratados como cidadãos e não como bandi-
sobretudo, no sentido de coibir o emprego de ile- dos, não virão algemados ou acorrentados, nem
gais e as redes internacionais de tráfico de pes- com roupas de prisioneiros”.3 “A ‘Operação De-
soas,2 e não os imigrantes ilegais em si. Apesar sembarque’, como foi chamada, mobilizou aproxi-
disso a imigração ilegal vem sendo cada vez mais madamente duzentas pessoas, entre policiais civis,
criminalizada na legislação doméstica dos países militares e federais, agentes da Defesa Civil, Minis-
receptores, com conseqüências nefastas para todos tério Público Federal, Itamaraty e Ministério da Jus-
os imigrantes. tiça”, mas as despesas com a viagem foram
Especificamente no caso do atual movimen- custeadas pelo governo dos Estados Unidos (Folha
to de emigração brasileiro, a questão dos indocu- de S. Paulo, 29/1/2004).
mentados é de particular importância e já começa Além dos dois casos mencionados, há rela-
a preocupar setores do governo brasileiro, pois tos de que brasileiros ilegais enfrentam problemas
grande parte dos emigrantes brasileiros no exteri- no Paraguai (segunda maior população de
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brasileiros no exterior, estimada entre 350 e 400 marinha australiana, o HMAS Manoora, e levados
mil), na Inglaterra, na Guiana Francesa, entre ou- para Nova Zelândia, Papua-Nova Guiné e Nauru
tros países. (país localizado em uma pequena ilha do Pacífico),
O problema dos indocumentados está no onde funcionários da ONU conduziriam entrevistas
centro de várias polêmicas entre países receptores para decidir seu status, e depois encaminhá-los para
e emissores. No início dos anos de 1980, nos um país receptor, tendo a Austrália se comprometi-
Estados Unidos, um dos mais importantes acon- do a receber alguns deles.
tecimentos nessa área envolveu a polêmica A situação do Tampa põe em evidência, de
aprovação, num plebiscito na Califórnia, de uma forma muito clara, a tensão entre o respeito aos
medida que pretendia excluir do ensino público direitos individuais e a soberania do Estado, um
os filhos de imigrantes ilegais. A proposição 187, dos aspectos mais importantes das políticas de
como ficou conhecida, foi revogada na Suprema imigração. No entanto, na mesma situação dos
Corte, que considerou não apenas que a educação passageiros desse navio existem milhões de pes-
é um direito inalienável de todo ser humano, mas soas4 no mundo – candidatos à reunificação fami-
também que as crianças não deveriam ser punidas liar, imigrantes ilegais e até mesmo pessoas que
pelos crimes de seus responsáveis. nasceram e sempre viveram num mesmo país,
O estudo da evolução do regime internacional mas ainda assim são consideradas imigrantes,
de direitos humanos mostra que é crescente o como é o caso de muitos países cuja base da ci-
reconhecimento do indivíduo como portador de dadania é o jus sanguini.5
direitos independentes de sua nacionalidade, mas,
ao mesmo tempo, revela que a implementação
desses direitos continua basicamente dependente Imigração, cidadania e nacionalidade
dos Estados, no caso específico das migrações inter-
nacionais, dos Estados receptores. Em relação Além de deterem o monopólio sobre a
àquele navio norueguês na costa da Austrália, por mobilidade, os Estados também detêm o controle
exemplo, não havia nem mesmo um consenso sobre sobre a própria identidade do indivíduo, sua
qual era o país responsável por fazer valer a lei. A nacionalidade. Se os indivíduos nascessem e mor-
Austrália insistia no fato de que se tratava de um ressem todos no interior de um mesmo Estado, a
problema da Noruega ou da Indonésia (bandeira dos definição de sua nacionalidade talvez fosse
navios). No entanto, a Convenção de Genebra prevê menos problemática. De fato, a nacionalidade é
que, em situação de perigo, os imigrantes devem ser quase sempre atribuída ao indivíduo, indepen-
levados para o porto mais próximo. Como os imi- dentemente de sua vontade. Ele pode até decidir
grantes foram resgatados próximos do mar da deixar o território de seu país, se encontrar algum
Austrália, as pressões internacionais recaíram sobre outro país disposto a recebê-lo, mas dificilmente
este país. O secretário geral da ONU, Kofi Annan, pode renunciar à sua nacionalidade. A imigração,
afirmou que “isto não é maneira de lidar com uma uma vez que subverte a relação povo/Estado/ter-
situação envolvendo refugiados” (New York Times, ritório obriga o Estado a formalizar, por meio de
30/8/2001); Mary Robinson, alta comissária das políticas de imigração e cidadania, as regras de
Nações Unidas para Direitos Humanos, foi mais acesso ao território e à nacionalidade.
enfática: “é muito lamentável o fato de um país com O acesso à nacionalidade é importante na
uma grande reputação como a Austrália seja incapaz medida em que a própria legitimidade da ordem
de estender a mão, nos termos apropriados, e mundial pós-Westphalia é dada pelo chamado
segundo as práticas estabelecidas, a essas pessoas” princípio de autodeterminação nacional, que
(Le Monde, 31/8/2001). Depois de uma semana que
os refugiados estavam no mar, a Austrália resolveu […] estabelece que a um povo deve ser oferecida
colaborar para a solução do caso. Os candidatos a a possibilidade de conduzir livremente a sua vida
refugiados foram transferidos para um barco da política, econômica e cultural segundo princípios
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democráticos. A condução livre de sua vida po- cada quanto a definição de nação. Não existem
lítica demanda, em primeiro lugar, que o poder critérios “lógicos” ou “naturais” para decidir sobre
político esteja sob o controle daquele povo e que a composição da nacionalidade. De um modo
tal controle seja exercido sob bases igualitárias e
geral, há duas tradições para estabelecer tais cri-
democráticas (a chamada autodeterminação inter-
térios – uma baseada no contrato político, outra,
na, equivalente à democracia) e, em segundo
lugar, que o controle seja exercido livre da inde- na cultura. Essas tradições são também conheci-
pendência de terceiros (a autodeterminação das como a francesa e a alemã, respectivamente,
externa equivalente à independência) (Ikeda, por serem historicamente identificáveis com esses
2001, p. 75). dois países, embora nenhum deles tenha políticas
que correspondam exatamente ao paradigma ao
O maior problema em relação à utilização qual emprestam o nome. A nacionalidade seria
do princípio de autodeterminação nacional como uma escolha no ponto de vista francês, e, do pon-
uma forma de definir unidades políticas é que, to de vista alemã, um destino. Segundo a tradição
“em última instância, não existe nada dentro dos republicana francesa, a nacionalidade baseia-se
limites da fórmula de autodeterminação que sirva na adesão voluntária do indivíduo à nação. A
como uma guia na definição ou concretização do constituição de 1791 atribui a cidadania francesa
que seja esse auto” (Whelan, 1994, p. 103). Esse a todos que
problema acaba por ser resolvido caso a caso, ou
seja, cada entidade política que visa a se auto- […] são nascidos na França de um pai francês,
organizar como Estado buscará afirmar sua singu- nascidos na França de um pai estrangeiro e que
laridade, sua própria versão do que seja uma fixaram residência no país, vieram a se estabele-
cer na França e prestaram o juramento civil,
nação, de modo a justificar sua existência como
nascidos de um pai estrangeiro, descendentes de
uma entidade política independente (Hobsbawn e um francês ou francesa expatriados por motivos
Ranger, 1984; Hobsbawn, 1990). religiosos, desejam se estabelecer na França e
Apesar de as soluções serem individuais, de prestam o juramento cívico.
um modo geral os defensores do princípio de
autodeterminação nacional conferem uma cono- Nesse caso, a idéia de cidadania absorve a
tação étnica ao conceito de nação, pretendendo idéia de nacionalidade. O ideal revolucionário da
com isso estabelecer entidades políticas sobera- cidadania como ato voluntário não apenas influ-
nas as mais etnicamente homogêneas possíveis. enciou todas as legislações francesas que se
Ainda que essa homogeneização não seja com- seguiram, mas também serviu de inspiração para
pleta, “o ônus da prova irá sempre ficar com outros códigos de nacionalidade pelo mundo,
aqueles que propõem um desvio do princípio de embora nenhum país, nem mesmo a França,
autodeterminação nacional, o qual permanece co- tenha retomado fielmente essa proposição
mo a pedra fundamental do sistema de Versailles” (Bernard, 1993).
(Keylor, 1995, p. 3). A tradição alemã, originada no período
A ligação entre Estado e nação, construída romântico, repousa numa concepção étnica e cul-
na modernidade, assim como o princípio de tural do povo, e considera como “nacionais” apenas
autodeterminação interna, implica na formação as pessoas que pertencem à cultura dominante do
de um laço entre nacionalidade e cidadania, isto país, cultura essa transmitida pelo sangue. A nação,
é, à medida que o Estado-nação é generalizado nesse caso, seria uma espécie de comunidade de
como a forma de organizar politicamente o mun- sangue e de idioma. Alguns dos principais teóricos
do, a cidadania passa a ser atribuída em função dessa corrente, como Herder, desenvolveram suas
da nacionalidade. Entre outras coisas, isso signifi- idéias em clara oposição aos ideais iluministas que
ca que o acesso aos direitos de cidadania está inspiraram a Revolução Francesa. Sua principal crí-
condicionado à posse da nacionalidade. tica a essas idéias, e, especificamente ao pensa-
A definição de nacionalidade é tão compli- mento de Rousseau, era a de que ele se baseava
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num conceito abstrato de humanidade, o qual não cas de nacionalidade e de imigração. Desde
encontrava eco na realidade humana (Herder, então, os principais países receptores de imigran-
1995). A essa abstração, Herder opunha o conceito tes vêm, sistematicamente, alterando suas políti-
de “enraizamento”, a idéia de que as pessoas estão cas nessa área.
inseridas em culturas, das quais são indissociáveis, As políticas de nacionalidade e imigração
e que as culturas têm raízes profundas e marcam estão intimamente ligadas. Antes de qualquer
diferenças de fato entre os indivíduos. Isso, segun- coisa, para se definir quem é o imigrante, é pre-
do a concepção alemã, é desconsiderado por filó- ciso se definir quem é o “nacional”. Além disso, o
sofos como Rousseau, quando pregam a igualdade Estado tem de definir se deseja ou não que o imi-
entre todos os homens. grante se torne um cidadão nacional, e qual tipo
Em consonância com esse conceito de cul- de imigrante estaria nessa situação, e, ainda, quais
tura, a Alemanha desenvolveu uma política de seriam os critérios adequados para esse processo.
nacionalidade que, até pouco tempo atrás, reco- Diferentes concepções de nação favorecem
nhecia somente o direito de sangue, pois a cul- diferentes políticas de nacionalidade/cidadania, e
tura seria transmitida pela família. Essa postura também de imigração. As políticas de imigração,
causou alguns problemas ao Estado alemão, sejam elas mais abertas ou mais fechadas, podem
sobretudo depois da queda do muro de Berlim, privilegiar determinado tipo de indivíduo ou deter-
pois muitos habitantes da Europa do Leste tinham minada nação, em função dessa concepção de
ascendência alemã e, portanto, direito à naciona- nacionalidade. Por exemplo, no caso do Estado de
lidade alemã, mesmo que não tivessem mais ne- Israel, que se autodefine como um Estado judeu,
nhum laço com o país. Por outro lado, os descen- os judeus de qualquer parte do mundo têm direito
dentes de turcos estabelecidos na Alemanha há à imigração, direito este negado a outras etnias. No
três gerações dificilmente conseguiam ter acesso à caso das ex-metrópoles coloniais européias,
nacionalidade alemã, formando um enclave de durante muito tempo os ex-colonos tiveram liber-
pessoas que habitavam o país, viviam como dade de circulação no território das antigas
alemães, mas não tinham os mesmos direitos que metrópoles, que os entendiam como já tendo feito
eles. A partir de 2000, uma reforma no código de parte do Estado-nação. Nos Estados Unidos, no iní-
nacionalidade alemã reconheceu a possibilidade cio do século XX, a idéia do país como uma nação
do jus soli, ou seja, a atribuição da nacionalidade de brancos protestantes teve um papel importante
baseada no local de nascimento, ainda que de na definição da política de quotas para imigração.
forma bastante restritiva. Enfim, os exemplos são os mais variados.
A atribuição da nacionalidade como um ato A forma pela qual essas políticas se modifi-
de vontade (adesão política ou escolha de local cam ao longo da história revela como o próprio
para viver) ou como um pertencimento étnico e auto-entendimento do Estado nacional se trans-
cultural está presente em todos os Estados mo- forma. Isso não equivale a dizer que essas políti-
dernos. Isso nem sempre se apresenta de forma cas sejam uma simples transposição de idéias
clara; muitas vezes ambas as tradições aparecem abstratas de nacionalidade para a realidade. De
combinadas e, freqüentemente, as diversas com- fato, as políticas de migração e nacionalidade
binações de jus soli e jus sanguini se sucedem no refletem interesses econômicos, demográficos e
tempo no interior de um mesmo Estado. Antes da conjunturas políticas. Contudo, por suas próprias
década de 1980, porém, a questão de identificar a naturezas, elas obrigam os atores sociais envolvi-
parcela da população que teria direito à naciona- dos nas suas produções a se expressarem em ter-
lidade não foi, de um modo geral, um problema mos de um discurso de nacionalidade, a tentarem
grave para os Estados. Contudo, o aumento da responder à questão “quem nós somos”, ou
imigração e a fixação dos estrangeiros no ter- “quem nós queremos ser”, e, nesse sentido, elas
ritório, que vinha ocorrendo desde a década de acabam sendo um reflexo interessante da forma
1970, geraram a necessidade de repensar as políti- como a imagem da nação é construída.
SOBERANIA, DIREITOS HUMANOS E MIGRAÇÕES… 157

Retomando a idéia de que a cidadania, na autores consideram que o Estado está perdendo o
modernidade, está ligada à nacionalidade, os direi- controle de suas fronteiras e que estaria surgindo
tos de cidadania estão, portanto, subordinados à uma espécie de cidadania pós-nacional ou
posse da nacionalidade. O Estado tem de definir transnacional.
quais são os direitos exclusivos dos cidadãos, e de Quanto à perda de controle sobre as fron-
que forma uma pessoa pode ter acesso a eles. Na teiras, diz-se que o Estado tem sido cada vez mais
definição de suas fronteiras externas e internas,6 os constrangido a aceitar uma imigração indesejada,
Estados têm de lidar com questões como: Que tipo definida por Jopke como aquela que
de indivíduo pode entrar ou não em seu território,
e por quê? Entre os que entram, quais podem se […] não é ativamente solicitada pelos Estados,
tornar permanentes e quais não podem? Dos que como a imigração legal por quotas, característica
se tornam permanentes, quais podem se tornar das clássicas nações de povoamento. Ao con-
trário, ela é aceita passivamente pelo Estado, seja
cidadãos, e quais não podem?
por razões humanitárias e em reconhecimento
dos direitos individuais, como de buscar asilo e
de reunificação familiar de trabalhadores imi-
Cidadania pós-nacional? grantes, seja pela total incapacidade dos Estados
de manter os imigrantes fora, como na imigração
Recentemente, uma série de estudos aponta ilegal (1997, p. 266).
para uma modificação nas relações entre naciona-
lidade/cidadania e soberania/imigração. O fortale- Segundo essa linha de argumentação, a in-
cimento de um regime internacional de direitos fluência crescente e decisiva dos direitos humanos
humanos, segundo essas novas pesquisas, tem no campo das políticas de migração levou a uma
obrigado os Estados a redefinirem suas fronteiras, grande expansão de sobretudo três tipos de imi-
tanto a interna como a externa, em função da uni- gração: reunificação familiar, refugiados e ilegais.
versalidade dos direitos individuais. Esse processo As políticas de reunificação familiar assen-
possuiria duas características: de um lado, os Es- tam-se na idéia, presente em diferentes artigos das
tados estariam vendo sua soberania enfraquecida legislações internacionais, que tratam do direito de
frente ao indivíduo, de outro, os laços que ligam todo ser humano de levar uma vida familiar nor-
os direitos de cidadania à nacionalidade estariam mal; as políticas para refugiados, se assentam na
se tornando mais fracos. Isso significa, entre outras idéia de que todo homem tem o direito de fugir
coisas, que o Estado não seria mais capaz de quando sua vida está sendo ameaçada – direito
definir, em função de seus próprios interesses, reconhecido por diversos artigos e convenções
quem pode ou não entrar e se estabelecer em seu internacionais já citadas; e a imigração ilegal resul-
território, e, ainda, que cada vez mais os direitos taria em grande medida da incapacidade de o
são atribuídos em nome da dignidade inerente da Estado impor sanções contra esse tipo de imi-
pessoa humana, e não da sua nacionalidade, de gração, também em virtude do reconhecimento
modo que a própria distinção entre nacional e não dos direitos individuais dos imigrantes ilegais.
nacional estaria perdendo sua importância. A crescente influência dos direitos humanos
A criação de um regime internacional de teria gerado também o que Gary Freeman (1992)
direitos humanos estaria, pois, levando a uma chama de “norma antipopulista”, segundo a qual
perda de autonomia do Estado na tarefa de de- as elites políticas dos Estados liberais não poderiam
cidir sobre questões referentes ao direito de entra- apresentar, por conta do idioma universalista do
da, ao tipo de diferenciação entre nacionais e liberalismo, o problema da composição étnica e
estrangeiros dentro de seu território, ao direito de racial dos fluxos migratórios. Assim, os atores
residência permanente e aos critérios de naciona- sociais e políticos estariam sendo forçados a se
lização. Diante deste quadro de transferência de enquadrar ao novo paradigma.
direitos do cidadão para o indivíduo, alguns Analisando o caso específico dos Estados
158 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 19 Nº. 55

Unidos, Debra DeLaet desenvolve um argumento cidadão. Essa é a forma mais elementar segundo
próximo ao de Freeman. Segundo a autora, a qual o modelo pós-nacional difere do modelo
nacional (Soysal, 1998, p. 194).
[…] enquanto na primeira metade do século XX a
política de imigração americana era moldada por Como já afirmamos anteriormente, o surgi-
uma ampla aceitação de distinções raciais, desde mento de um regime internacional de direitos
1960 o apoio cada vez maior aos direitos civis, humanos é apontado não somente como causa da
somado à oposição crescente à discriminação
fragilidade do Estado nas decisões sobre quem
racial, estabeleceu o fundamento para a libera-
lização da política imigratória dos Estados
pode atravessar suas fronteiras e se estabelecer no
Unidos. Assim, as políticas de interesse de gru- seu território, mas também como causador de uma
pos, moldadas cada vez mais pelas normas libe- dissociação entre direitos e cidadania, isto é, em
rais nas décadas recentes, explicam em grande virtude do reconhecimento cada vez maior de
medida por que o governo americano adotou direitos universais da pessoa, os direitos exclusivos
políticas de imigração liberais apesar do amplo de cidadania estariam diminuindo. Cada vez mais
apoio público a novas restrições à imigração na
os imigrantes têm os mesmos direitos que os cida-
década de 1980. Enfim, a política interna e as
idéias liberais contribuíram significativamente
dãos, sem que, para isso, tenham de tornar-se ci-
para o aumento da imigração no país em décadas dadão, de se naturalizarem.
recentes por meio da passagem de políticas de A membership e o acesso aos direitos, que
imigração liberais (Delaet, 1998, p. 4). eram definidos pela nacionalidade, passam a ser
codificados em termos de humanidade interna-
Na mesma linha, James Hollifield argumenta cional, uma nova forma de membership que trans-
que, embora as condições econômicas e socio- cende as fronteiras do Estado-nação. Estaria
lógicas sejam importantes para a existência de havendo, portanto, uma profunda transformação
uma migração continuada, na concepção de cidadania, na sua lógica institu-
cional e na maneira como ela é legitimada. A idéia
[…] as condições fundamentais são legais e políti- de Estados como associações exclusivas vêm
cas. Nas últimas três décadas do século XX, o
sendo questionada, por exemplo, pelo reconheci-
principal fator que tem sustentado a migração
mento da possibilidade de o indivíduo ser ao
internacional (tanto sul-norte como em menor
extensão leste-oeste) é o acréscimo de direitos mesmo tempo cidadão de mais de um Estado,
para estrangeiros nas democracias liberais, ou o possuir múltiplas cidadanias (Brubaker, 1992).
que eu chamei em outro momento de liberalismo Soysal baseia sua teoria no estudo das políticas
baseado em direitos (Hollifield, 2000, p. 148). de integração dos países da Europa Ocidental, por
meio das quais os imigrantes estariam sendo incor-
Hollifield, Jopke e Freeman enfatizam os porados a vários aspectos da sociedade receptora,
mecanismos domésticos de formação das políti- como o mercado de trabalho, o sistema educacional
cas. Todos eles se baseiam em estudos realizados e outras vantagens do Estado de bem-estar social,
em países que são Estados de direito democráti- sem que, para isso, eles tenham adquirido a
cos e liberais. Já Yasemin Soysal (1998) e Saskia nacionalidade e, por conseguinte, a cidadania dos
Sassen (2000) preferem enfatizar o papel dos países receptores. Em outras palavras, eles estariam
mecanismos internacionais de proteção dos direi- tendo acesso a direitos de cidadania, sem que para
tos dos imigrantes. isso se tornem cidadãos. Para a autora, essa situação
caracteriza uma contradição entre dois aspectos cons-
Os direitos e as demandas dos indivíduos são legi-
titutivos da cidadania – identidade e direitos. “Onde
timados por ideologias baseadas na comunidade
direitos e demandas por direitos se tornam univer-
transnacional, por meio de códigos e convenções
internacionais, e em leis de direitos humanos, salizadas e abstratas, a identidade ainda é concebida
independentemente de suas cidadanias em um como particular e delimitada por características
Estado-nação. Logo, o indivíduo transcende o nacionais, étnicas ou regionais” (Soysal, 1993, p. 8).
SOBERANIA, DIREITOS HUMANOS E MIGRAÇÕES… 159

Um conjunto de instrumentos legais, tendo nia significa, acima de tudo, igualdade perante a
por base o discurso dos direitos humanos, estaria, lei e igualdade de acesso aos direitos, e, definiti-
pois, se desenvolvendo e atuando como “diretrizes vamente, não há, sob esses aspectos, nenhuma
para a administração dos assuntos migratórios na identidade entre imigrantes e cidadãos “nacio-
legislação nacional, padronizando e racionalizando nais”. O fato de os estrangeiros gozarem de um
a categoria e o status de migrantes internacionais” maior número de direitos hoje não modifica a
(Soysal, 1998, p. 200). Segundo Soysal, essa novas natureza da cidadania. O estrangeiro continua nu-
diretrizes obrigam os Estados-nações a concede- ma situação precária em relação ao cidadão.
rem aos indivíduos, independentemente da nacio-
nalidade, direitos civis, sociais e políticos. Em su- Somente os cidadãos gozam de um direito
ma, o Estado estaria perdendo o controle sobre incondicional de permanência e residência no
suas fronteiras, tanto as externas, territoriais, como território, e podem planejar suas vidas de acordo
as internas, de cidadania, e com isso estaria per- com esses direitos. A entrada e a residência de
não-cidadãos nunca é incondicional. Alguns não-
dendo parte importante de sua soberania.
cidadãos, os que entraram clandestinamente, por
No entanto, o estudo da evolução do regime exemplo, ou pessoas no final do seu período de
internacional de direitos humanos nos mostra que, residência legal, não têm esses direitos. Mas
apesar do crescente reconhecimento do indivíduo mesmo não-cidadãos privilegiados, aqueles
como portador de direitos independentes de sua aceitos formalmente como imigrantes ou colonos,
nacionalidade, a implementação desses direitos continuam residentes probatórios, suscetíveis à
continua basicamente dependente do Estado, e, exclusão ou à deportação em certas circunstân-
no caso específico das migrações internacionais, cias (Brubaker, 1992, p. 24).
do Estado receptor. Vale dizer que o direito de ir
e vir no âmbito internacional – o direito de imigrar Tão importante quanto a ausência do direi-
– não é reconhecido como um direito humano. A to de residir é o fato de os estrangeiros não par-
maior parte da legislação internacional diz ticiparem nas decisões a respeito de sua própria
respeito somente a situações concretas, em que o situação, não terem direitos políticos. De um mo-
imigrante já existe. Não é à toa que normalmente do geral, independentemente de quais sejam os
as convenções se referem aos direitos dos traba- direitos acordados aos cidadãos, todas as demo-
lhadores imigrantes, e não a um direito de imi- cracias modernas definem a exclusão sobretudo
gração. Na realidade, este só existe em casos de em relação aos direitos políticos. Estes, definidos
“temor justificado”, previsto nas convenções relati- por Marshall como “o direito de participar no
vas ao refúgio e ao asilo político, mas, mesmo nes- exercício do poder político, como membro do
ses casos, a última palavra é do Estado, e a ausên- corpo investido de autoridade política, ou como
cia de um organismo internacional com capacidade eleitor dos membros de tal corpo” (Marshall,
de coerção para verificar se os Estados estão 1998, p. 94), são componentes fundamentais da
cumprindo a lei é bastante significativa. idéia de cidadania, de modo que não é possível
Com respeito à relação entre cidadania e defini-la excluindo esse aspecto.
direitos, a crítica a essa interpretação considera A participação política é fundamental na
que a cidadania não se define a partir de seu con- definição da nacionalidade/cidadania e vice-versa,
teúdo, afinal o conteúdo da cidadania nunca foi e é por isso que, ao longo da história, sempre
fixo: “sociedades diferentes atribuirão direitos e houve tanta disputa para decidir quem fazia parte
deveres diferentes ao status de cidadão, pois que da pólis. Definir quem pode ser um cidadão é
não existe qualquer princípio universal que deter- uma das questões mais importantes para a vida
mine os direitos e os deveres inalienáveis da política de um país. Em se tratando de países que
cidadania em geral” (Barbalet, 1989, p. 18). Há se pretendem democráticos, a decisão é ainda
cinqüenta anos, por exemplo, os direitos culturais mais importante, porque define quem vai partici-
nem mesmo eram considerados direitos. Cidada- par do processo político. Sendo também uma
160 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 19 Nº. 55

questão de distribuição de direitos, a definição de imigração e os imigrantes põem em risco a segu-


cidadania envolve uma luta política em torno de rança e a integridade do Estado, e que são, portan-
objetivos bastante concretos. No episódio da to, um problema de segurança nacional. Grande
proposição 187 da Califórnia, por exemplo, o go- parte da população dos países receptores, motiva-
verno desse estado tinha o maior interesse em que da seja pela crise econômica, seja pela ameaça do
a educação fosse considerada um privilégio da terrorismo ou do narcotráfico, seja simplesmente
cidadania, ou pelo menos dos imigrantes legais, pela xenofobia, pressiona esses governos no senti-
pois de acordo com ele, os custos da política fe- do de fechar as portas para a imigração. A existên-
deral liberal em relação aos imigrantes acabavam cia de grupos de pressão com interesses tão dís-
recaindo sobre o estado, que é o responsável pe- pares, aliados a interesses econômicos e políticos
las despesas da área de educação. Já os fazendei- de outras naturezas, contribuiu para a formulação
ros da Califórnia preferem uma política mais rela- de políticas de imigração e nacionalidade com-
xada em relação aos ilegais, que são mão-de-obra plexas e, muitas vezes, incoerentes, que acabam
fundamental para a indústria agronômica, pelo não satisfazendo a nenhum dos lados e sendo taxa-
menos da forma como ela é estruturada. Como das de ineficazes, tanto pelos que defendem um
reconheceu, em documento recente, uma organi- fechamento maior, como pelos que defendem uma
zação antiimigração norte-americana: “Residência maior liberalização das fronteiras.
nos Estados Unidos é um dos mais valiosos pri- O que a literatura estudada considera uma
vilégios mundiais” (Symcox, 1997). limitação do papel do Estado seria, na verdade,
Na disputa por esse privilégio, diferentes apenas um reflexo do fato de que não existe um
grupos de interesse defendem diferentes concep- ator único – o Estado –, cuja vontade seja clara e
ções de nação para justificar suas escolhas políti- indivisível. As políticas de migração refletem o dis-
cas, razão pela qual é tão difícil atribuir a uma senso dos diferentes atores políticos, dentro e fora
única concepção de nação o papel determinante do Estado, sobre a construção de suas fronteiras. A
na formulação das políticas de nacionalidade e suposta ineficácia das políticas de imigração e
imigração. A legislação de cidadania acaba sendo nacionalidade não é resultado da perda de sobera-
o resultado de um processo de acomodação de nia do Estado em função do desenvolvimento da
interesses contraditórios, que se articulam em tor- economia ou da evolução dos direitos humanos,
no de diferentes discursos. mas, sim, um espelho das dificuldades de se che-
Levando-se em consideração que as socie- gar a um consenso quando se trata de delimitar as
dades, sobretudo as sociedades receptoras de imi- fronteiras do Estado. Quando se alinha a opinião
grantes, caracterizam-se cada vez mais pela plurali- pública ao lado dos restricionistas e alega-se que a
dade, é evidente que as concepções de nação defesa dos direitos humanos dos imigrantes não
também se diversificam, isto é, diferentes grupos possui bases sociais, não se leva em conta que
com concepções de nação diversas tentam impor existem também defensores dos direitos dos imi-
sua visão de nação ao processo de construção das grantes e que, mesmo entre os que preferem
fronteiras por meio das políticas de migração e reduzir o nível da imigração, é muito difícil para as
nacionalidade. A pluralidade de opiniões e a com- pesquisas de opinião captarem quais seriam as pri-
plexidade do processo de elaboração das políticas oridades dessas pessoas, isto é, se elas aceitariam
de imigração e nacionalidade refletem-se na forma uma restrição de direitos em nome de uma restri-
final das legislações sobre essas questões. De fato, ção no número de imigrantes.
tais políticas não são fruto da ação de uma entidade Contudo, apesar de tanta divergência, a
abstrata, o “Estado”, mas da luta e da acomodação existência das fronteiras estatais é tratada pela le-
de interesses divergentes na sociedade e dentro do gislação internacional como algo evidente, e a
próprio Estado, sobretudo em democracias liberais. autonomia dos Estados nas decisões sobre suas
Paralelamente ao fortalecimento do discurso fronteiras é incontestada. Discute-se muito sobre
dos direitos, difundiu-se também a idéia de que a como e onde construir essas fronteiras, mas não
SOBERANIA, DIREITOS HUMANOS E MIGRAÇÕES… 161

há praticamente ninguém que defenda sua extin- mento desses mesmos direitos na legislação
ção ou que considere que a decisão sobre elas doméstica dos países receptores. O não-reconhe-
não deveria ser tomada pelo Estado. A questão da cimento de um direito de imigração e a autono-
imigração continua a ser regulamentada basica- mia do Estado na decisão de quem faz parte da
mente pelo Estado, além de ser tratada, na maio- sua população sustentam a divisão do mundo em
ria das vezes, como um problema de segurança Estados como associações de membership. A ex-
pública e uma questão de polícia. Como vimos, a clusão do imigrante dos processos decisórios que
Austrália tratou o problema do navio Tampa como afetam sua própria situação garante a continuida-
uma questão de segurança nacional desde o co- de dessa situação. Recentemente tivemos uma cla-
meço, convocando a Força Aérea para interceptar ra demonstração desse ponto quando da restrição
o navio e obrigá-lo a voltar para águas interna- dos direitos civis de estrangeiros nos Estados Uni-
cionais. A União Européia, por sua vez, discute dos depois dos atentados terroristas de 11 de se-
uma política de imigração comum no mesmo tembro de 2001.
grupo de trabalho que discute terrorismo, nar-
cotráfico e questões relacionadas à segurança
interna. Nos Estados Unidos, sobretudo após os NOTAS
atentados de 11 de setembro de 2001, a questão
da imigração também é considerada sobretudo um 1 A exigência de autorização não significa que
problema de segurança nacional. ninguém consiga cruzar a fronteira sem o con-
sentimento do Estado. Não existe, nem nunca
Direitos e identidade permanecem, assim,
existiu, um Estado que tivesse fronteiras imper-
fundamentalmente interligados. A definição de
meáveis, ou absoluto controle sobre quem entra
quem faz parte dos “nós”, de quem é nacional e, e sai do país.
portanto, cidadão, é fundamental para a atribui-
ção de determinados direitos. Até o momento, é 2 Em novembro de 2000, a ONU aprovou dois proto-
colos referentes ao problema do tráfico de ilegais, a
fundamentalmente o próprio “nós” quem define
saber, Protocolo Contra o Tráfico de Pessoas e
sua natureza.
Protocolo Contra o Smuggling de Imigrantes. Tráfi-
O que o argumento em torno da cidadania co refere-se a um processo de imigração que envol-
mundial e da perda do controle das fronteiras ve coerção, e smuggling diz respeito à facilitação
pelo Estado afirma é que, diante do novo contex- do movimento ilegal de pessoas pelas fronteiras.
to internacional, o “nós” estaria perdendo essa
3 Cf. site (http://www.consciencia.net/2004/mes/01/
capacidade de decidir sobre as identidades e os
eua-brasil.html).
direitos relacionados a elas. Ou seja, não só o
Estado estaria se tornando impotente diante da 4 De acordo com a ONU, em 2001 existiam 150 mi-
circulação de indivíduos entre fronteiras, como lhões de pessoas vivendo fora de seus países de
origem. Desse total, estima-se que entre 80 e 97 mi-
também a identidade nacional estaria perdendo a
lhões sejam de trabalhadores e suas famílias, e 12
centralidade como fonte do reconhecimento de
milhões, refugiados (ILO,OIM, OHCRH, 2001).
direitos de cidadania. Afirma-se que a decisão
sobre as fronteiras não é mais uma decisão políti- 5 Segundo o jus sanguini, a nacionalidade é transmi-
ca, mas que as fronteiras são estabelecidas por tida por descendência. A outra modalidade mais
comum de atribuição de nacionalidade é o jus soli,
convenções, tratados e legislações internacionais
quando a nacionalidade é atribuída em função do
de acordo com critérios relacionados aos direitos
local de nascimento.
individuais universais.
As fronteiras continuam existindo, tanto as 6 A distinção entre fronteira interna e fronteira exter-
territoriais, como as de membership, e, mais do na é de autoria de Rogers Brubaker (1992). Fronteira
interna é definida por direitos e diz respeito à
que isso, elas continuam a ter um significado
cidadania; fronteira externa é a territorial.
importante apesar de toda a evolução do regime
internacional de direitos humanos e o reconheci-
162 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 19 Nº. 55

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RESUMOS / ABSTRACTS / RÉSUMÉS

SOBERANIA, SOVEREIGNTY, HUMAN RIGHTS, SOUVERAINETÉ, DROITS DE


DIREITOS HUMANOS E AND INTERNATIONAL L’HOMME ET MIGRATIONS
MIGRAÇÕES INTERNACIONAIS MIGRATIONS INTERNATIONALES

Rossana Rocha Reis Rossana Rocha Reis Rossana Rocha Reis

Palavras-chave Key words Mots-clés


Direitos humanos; Política de imi- Human rights; Immigration policy; Droits de l’homme; Politique d’im-
gração; Soberania; Nacionalidade; Sovereignty; Nationality; Refugees. migration; Souveraineté; Nationalité;
Refugiados. Réfugiés.

This article discusses the relations- Cet article analyse la relation entre la
O presente artigo discute a relação hip between sovereignty and human souveraineté et les droits de l’hom-
entre soberania e direitos humanos rights concerning the elaboration of me dans le contexte de l’élaboration
no contexto da elaboração das polí- immigration policies. It deals with des politiques de migration. Il abor-
ticas migratórias. Trata do papel dos the role of the State in international de le rôle des États dans les migra-
Estados nas migrações internacio- migrations, the effects of the deve- tions internationales, les effets de la
nais e dos efeitos da construção de lopment of an international human construction d’un système internatio-
um sistema internacional de prote- rights legislation over the immigra- nal de protection des droits de
ção aos direitos humanos sobre a tion question, and finally discusses l’homme sur la question de la migra-
questão migratória. Por fim, discute the idea that the increasing interna- tion, et discute, en conclusion, l’idée
a idéia de que o crescimento das mi- tional migration is leading the State selon laquelle la croissance des mi-
grações internacionais estaria levan- to lose control over its population grations internationales entraînerait,
do o Estado à perda do controle so- and territory, two central features of actuellement, une perte du contrôle
bre a sua população e seu território, the sovereignty concept. de l´État sur les deux éléments cen-
dois elementos centrais do próprio traux du concept de souveraineté: sa
conceito de soberania. population et son territoire.

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