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OS IPÊS DA RUA DE BAIXO

Eu te amei

Mesmo quando você não estava lá;

Era frio, úmido e branco o nosso quarto,

O lado de fora que eu sorria para o mundo

Era o meu avesso

E todo reboque da minha cara de pau

Não era gelo

Era gesso.

Na rua de baixo da nossa casa

Tem um ipê

Onde nos contávamos as folhas que caíam

As nuvens que passavam

Os passos que o Beto dava até desistir de andar na calçada

E escolher a rua,

E quanto tempo faltava para o sol

Ser expulso pela lua.

Depois da “boa tarde”, sempre vinha um “tô com fome”

Depois um “tô com sono”

Depois “ vamos dormir”

E todas as estrelas do céu

Eram plateia do teu sono febril.

Mas veio dezembro

E você se cansou dos ipês

Das nuvens

E dos passos do Beto;


Quando você disse “tô saindo”

Eu perguntei “ que horas você volta? “

E na revolta

Tua mão espalhou o copo no chão,

Derramou todos os imãs na pia

E jogou fora minhas palavras cruzadas

Meu jornal

Meus poemas

E tudo mais o que pra ti, fosse banal.

Desde então

Eu fujo

E finjo que corro,

Que não me importo

Mesmo quando me corto

Tentando pingar meu sangue

Nos cacos de vidro no chão que você espalhou

E até agora

Estão aqui.

Eu te amo

Mas preciso seguir;

Preciso conhece o mar

A areia

Tomar a saideira dessa vida mundana;

Te espero na cama

Te amando mesmo sabendo

Que você não estará lá.

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