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Estudo de Carácter Electrónico

Paio Galvão: Um Cardeal, Dois Reinos.


A carreira de um dos eclesiásticos mais ilustres dos séculos
XII-XIII.

Autor: Pedro Nuno Medeiros de Henriques


(Licenciado em História pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto)

Ano da Publicação Digital: 2021


A imagem presente na capa foi retirada a partir do seguinte endereço electrónico:
http://www.araldicavaticana.com/pelagius_galvani.htm, (05-10-2011).

1
Índice

Introdução………………………………………………………………………………………………………………………………………..3

Parte 1 - O percurso inicial de vida de Paio Galvão, desde 1165 até 1204 ………….……….....................5
Capítulo I – A versão defensora da sua origem portuguesa……………………………………………………………….6
Capítulo II- A teorização da sua naturalidade leonesa………………………………………………………………………14

Parte 2- Do anonimato para a ribalta em solo italiano e internacional (1204-1230)……………..........18

Capítulo I- Cargos eclesiásticos exercidos por Paio Galvão na Península Itálica……………………………….19

Capítulo II- Legado Pontifício com missões em inúmeros espaços…………………………………………………..24

Capítulo III- Últimos anos………………………………………………………………………………………………………………..38

Conclusão……………………………………………………………………………………………………………………………………….43

Fontes utilizadas…………………………………………………………………………………………………………………………….46

Bibliografia citada………………………………………………………………………………………………………………………….48

Endereços electrónicos consultados………………………………………………………………………………………………51

2
1- Introdução

Neste estudo, procuraremos reconstituir a vida de Paio Galvão, eclesiástico ilustre


que deixaria a sua marca na Era Medieval. A nossa missão não se adivinha fácil
visto que estamos a abordar um período muito recuado que deixou seguramente
um número bastante limitado de testemunhos escritos. Todavia, conseguimos
reunir contribuições decisivas de diversos historiadores consagrados (alguns deles
ligados à temática da História da Igreja1), permitindo assim a obtenção de outros
dados que possam estar relacionados com a personalidade em questão.
Do ponto de vista estrutural, o nosso trabalho encontra-se dividido em duas partes.
Na primeira, problematizaremos sobre os anos iniciais de vida de Paio Galvão que
são pouco conhecidos, enquanto que, na segunda, abordaremos a sua actuação
dentro da Cúria Romana bem como nos diversos espaços que visitou enquanto
legado pontifício.
Assim sendo, o nosso estudo compreende um enquadramento cronológico que se
estende desde a eventual data de nascimento desta personalidade – 11652, até ao
seu falecimento em Monte Cassino que ocorrera provavelmente a 30 de Janeiro
de 12303.

1
São os casos de Fortunato de Almeida e de Tomás da Encarnação. Mencionaremos, nas notas de rodapé
posteriores, os seus trabalhos.
2
Datação proposta por Salvador Miranda. Todavia, é praticamente impossível determinar, com segurança,
o ano de nascimento de Paio Galvão. Mesmo assim, e devido à ausência de outras sugestões, tomaremos o
mencionado ano de 1165 como uma data possível para o seu nascimento. (MIRANDA, Salvador – The
Cardinals of the Holy Roman Church. 1998-2011. Estudo digitalizado em:
http://cardinals.fiu.edu/bios1205.htm, Consultado em: 20/08/2020).
3
Esta data indicada para o falecimento de Paio Galvão foi extraída a partir dos registos de óbito presentes
na abadia de Monte Cassino. (Informação referida por: MANSILLA, Demetrio – El cardenal hispano Pelayo
Gaitán (1206-1230) in Anthologica Annua. Publicaciones del Instituto Español de Estudios Eclesiasticos.
Roma/Madrid: Iglesia Nacional Española, 1953, p. 15). Contudo, esta data não é completamente consensual
entre os diversos autores. Dentro deste contexto, Manoel Caetano de Sousa, Fortunato de Almeida e o Padre
António Ferreira Caldas situam o óbito desta personalidade no ano de 1228 (mais concretamente a 1 de
Junho). No entanto, acreditamos que existem razões suficientes (invocadas mais à frente) para estendermos
a existência de Paio Galvão até 1230. (Veja-se então: SOUSA, Manoel Caetano de – Catalogo Historico dos
Summos Pontifices, Cardeaes, Arcebispos, e Bispos Portuguezes (…) in Colecçam dos Documentos, estatutos
e memorias da Academia Real da Historia. Ordenado pelo marquês de Alegrete – Manoel Telles da Silva.
Lisboa: Pascoal da Sylva, 1725, p. 9-10; ALMEIDA, Fortunato de – História da Igreja em Portugal. Nova edição
prep. e dirigida por Damião Peres. Vol. 1. Porto/Barcelos: Portucalense Editora/Companhia Editora do
Minho, 1967, p. 256; CALDAS, António José Ferreira – Guimarães: Apontamentos para a sua História. 2º ed.
Parte I. Guimarães: CMG/ SMS, 1996, p. 152-157 – O seguinte endereço electrónico disponibilizado pela
Sociedade Martins Sarmento/Casa de Sarmento chegou a conter um excerto da obra do Padre António José
Ferreira Caldas - http://www.csarmento.uminho.pt/docs/ndat/pcaldas/PCaldas053.pdf, consultado em:

3
Metodologicamente, recorreremos a fontes portuguesas e estrangeiras. Seremos
criteriosos na sua selecção, procurando utilizar aquelas que contenham uma
credibilidade assinalável.
Como último apontamento desta introdução, é de salientar que não encontrámos
estudos recentes em Portugal sobre esta personalidade. Fortunato de Almeida terá
sido o derradeiro autor a fornecer um brevíssimo trecho biográfico de Paio Galvão4.
No plano internacional, a situação já é distinta, existindo mesmo algumas
abordagens de elevada categoria5.

25/11/2011). Também o ano de 1240 foi sugerido para situar o óbito de Paio Galvão mas tal parece
corresponder a uma possibilidade remota, visto que, não encontramos mais documentos que se refiram
concretamente à actuação daquele cardeal entre os anos de 1230 e 1240. (Esta datação hipotética pode ser
encontrada em: CHEVALIER, Ulysse – Repértoire des sources historiques du moyen age: bio-bibliographie.
Vol. 2 (J-Z). (1841-1923), p. 3563; CASTELLANOS, Basilio Sebastián – Pelagio Galvan in Biografía Eclesiástica
Completa. Tomo 17. Dir. Basílio Sebastián Castellanos. Madrid: Imprenta de D. Alejandro Gomez
Fuentenebro, 1863, p. 705-706).
4
ALMEIDA, Fortunato de – História da Igreja em Portugal. Vol. 1, p. 256.
5
Podemos destacar, como exemplo, o estudo já citado de Demetrio Mansilla que nos faculta uma biografia
bastante interessante sobre esta personagem (MANSILLA, Demetrio – El cardenal hispano Pelayo Gaitán
(1206-1230) in Anthologica Annua, p. 11-66). Também Peter Linehan procurou conhecer a carreira deste
eclesiástico (LINEHAN, Peter - The Spanish Church and the Papacy in the Thirteenth Century. Cambridge:
Cambridge University Press, 1971, p. 276-300).

4
Parte 1 - O percurso inicial de vida de Paio Galvão, desde 1165 até 1204

Nesta primeira secção abordaremos as alegadas vivências iniciais de Paio Galvão,


mesmo que as contradições verificadas em diversas fontes dificultem ao máximo este
nosso objectivo. De facto, os registos medievais relativos a esta personalidade são
escassos e nem sempre esclarecedores e, por isso, usufruímos também da consulta
de testemunhos posteriores, produzidos entre os séculos XVI-XIX.
No primeiro capítulo intitulado A versão defensora da sua origem portuguesa,
procederemos ao levantamento dos elementos que associam o nosso biografado ao
reino de Portugal, enquanto que, no segundo tópico designado A teorização da sua
origem leonesa, observaremos conteúdos que reivindicam a sua naturalidade
leonesa.
Atendendo à cronologia proposta para a sua existência (1165-1230), Paio Galvão teria
vivido cerca de 65 anos, contudo pouco ou nada sabemos sobre os seus primeiros
35/40 anos, o que não deixa de ser surpreendente, tendo em conta o prestígio
internacional que alcançaria na segunda metade da sua vida. Entre os anos de 1165
e 1204, não encontramos um documento da época que comprove cabalmente as
funções que desempenhara nesse período, nem sequer é feita alusão a qualquer
vivência. Como observaremos, é um homem que praticamente do nada, emerge junto
da Santa Sé, alcançando uma ascensão meteórica dentro da Cristandade.
No que concerne às suas origens, e como observaremos, de seguida, surgiram então
duas teorias – uma que faz dele português, enquanto outra propõe uma naturalidade
leonesa. Por isso, iremos colocar frente a frente ambas as teorias, difundindo os
argumentos apresentados.
Mais à frente, na conclusão deste trabalho, procuraremos articular os conteúdos
veiculados e levantar, a partir daí, algumas hipóteses teóricas que possam abrir novos
horizontes de investigação.

5
Capítulo I – A versão defensora da sua origem portuguesa

Entre os autores que defendem as origens portuguesas de Paio Galvão destacamos:


Tomás da Encarnação6, António Carvalho da Costa7, Basilio Sebastián Castellanos8,
Manoel Severim de Faria9, Torquato Peixoto Azevedo10, Manoel Caetano de Sousa11,
George Cardoso12, António de Macedo13, Nicolau de Santa Maria14, Ulysse
Chevalier15, António José Ferreira Caldas16, Fortunato de Almeida17, Alain Demurger18
Carlos de Ayala Martínez19, Afonso Eduardo Martins Zúquete e António Machado de
Faria20. Apesar de todos estes eruditos se terem destacado em eras completamente
distintas, partilham ainda em comum o facto de terem composto as suas obras muito
depois dos séculos XII-XIII que assistiram à afirmação da personalidade estudada.

6
ENCARNAÇÃO, Tomás da - Historia Ecclesiae Lusitanae. Per singula saecula ab Evangelio promulgato. Tomo III.
Coimbra (Colimbriae): Ex praelo Academiae Pontificiae, 1762, p. 275-277.
7
COSTA, António Carvalho da - Corografia Portugueza, e Descripçam Topografica do famoso reyno de Portugal,
com as noticias das fundações das cidades, villas e lugares que contém; varões illustres, genealogias das familias
nobres, fundações de Conventos, catalogos dos bispos, antiguidades, maravilhas da natureza, edificios, e outras
curiosas observaçoens. Tomo 1. Livro 1. Tratado I. Cap. XVIII. Lisboa: Valentim da Costa Deslandes, 1706, p. 90-
91.
8
CASTELLANOS, Basilio Sebastián – Pelagio Galvan in Biografía Eclesiástica Completa. Tomo 17, p. 705-706.
9
FARIA, Manoel Severim de – Noticias de Portugal. Lisboa: Officina Craesbeckiana, 1655, p. 261.
10
AZEVEDO, Torquato Peixoto de – Memorias Resuscitadas da Antiga Guimarães. Porto: Typographia da Revista,
1845, p. 384-386. Esta obra foi de facto editada em 1845, mas a sua existência remonta ao ano de 1692.
11
SOUSA, Manoel Caetano de - Catalogo Historico dos Summos Pontifices, Cardeaes, Arcebispos, e Bispos
Portuguezes (…) in Colecçam dos Documentos, estatutos e memorias da Academia Real da Historia, p. 9-10.
12
CARDOSO, George – Agiologo Lusitano dos Sanctos e Varoens Illustres em virtude do Reino de Portugal, e suas
conquistas. Tomo III. Lisboa: Officina Craesbeekiana, 1666, p. 483-486.
13
MACEDO, António de – Lusitania Infulata et Purpurata Sev Pontificibus et Cardinalibus Illustrata. Paris:
[Sebastianum Cramoisy, & Sebast. Mabre – Cramoisy], 1663, p. 83-93.
14
Não conseguimos aceder à Crónica dos cónegos regrantes de Santo Agostinho da autoria de Nicolau de Santa
Maria, contudo esta fonte tem de facto elementos preciosos sobre a figura em estudo, visto que são muitos os
autores que a citam. Assim sendo, este testemunho encontra-se referido nas obras de: ENCARNAÇÃO, Tomás da
- Historia Ecclesiae Lusitanae. Per singula saecula ab Evangelio promulgato. Tomo III, p. 275-277; COSTA, António
Carvalho da - Corografia Portugueza (…).Tomo 1. Livro 1. Tratado I. Cap. XVIII, p. 90-91; SOUSA, Manoel Caetano
de - Catalogo Historico dos Summos Pontifices, Cardeaes, Arcebispos, e Bispos Portuguezes (…) in Colecçam dos
Documentos, estatutos e memorias da Academia Real da Historia, p. 9-10.
15
CHEVALIER, Ulysse – Repértoire des sources historiques du moyen age: bio-bibliographie. Vol. 2, p. 3563.
16
CALDAS, António José Ferreira – Guimarães: Apontamentos para a sua História. Parte I, p. 152-157.
17
ALMEIDA, Fortunato de – História da Igreja em Portugal. Vol. 1, p. 256.
18
DEMURGER, Alain – Cruzadas: Una Historia de la Guerra Medieval. Trad. José Miguel González Marcén.
Barcelona: Ediciones Paidós Ibérica, 2009, p. 97. Efectua uma referência pontual.
19
MARTÍNEZ, Carlos de Ayala – Las Cruzadas. Madrid: Sílex Ediciones, 2004, p. 250. Efectua uma referência
pontual.
20
ZÚQUETE, Afonso Eduardo Martins; FARIA, António Machado de - Armorial Lusitano. Genealogia e Heráldica.
Lisboa: Editorial Enciclopédia Lda/Representações Zairol Lda, 1961, p. 236-237.

6
No entanto, encontramos também fontes medievais que foram presumivelmente
produzidas ainda no decurso do século XIII ou em tempos subsequentes.
Referimo-nos em primeiro lugar à Crónica de Ernoul21 que discrimina a chegada do
cardeal Paio à cruzada no Egipto, sendo este oriundo de uma terra chamada
Portingal22, expressão utilizada na narração. Como observaremos, mais à frente, Paio
Galvão assumiu as funções de legado papal durante a Quinta Cruzada (1217-1221)
que se destinou àquele território.
Outro testemunho, este supostamente lavrado nas décadas, ou pelo menos, nos
séculos posteriores ao falecimento de Paio Galvão, é, sem dúvida, O Livro dos Obitos
do Mosteiro de S. Vicente por Alfabeto23. Trata-se duma fonte manuscrita em latim,
na qual poderemos observar a presença dum Pelagius Galvani - Cardinalis
Canonicus24 que é associado ao Monasterium da Costa (ou seja, ao Mosteiro de Santa
Marinha da Costa, localizado em Guimarães)25.
A terceira e última fonte que discriminamos será um outro códice que incorporava os
registos de óbito do Mosteiro de Santa Marinha da Costa. De acordo com António de
Macedo26 e Tomás da Encarnação27, este antigo códice continha também referências

21
Ernoul seria alegadamente um escudeiro de Balian de Ibelin, importante senhor e nobre cristão que se
destacara no Levante nas décadas de 1170 e 1180 e que não conseguiu evitar que Jerusalém caísse em 1187 nas
mãos do sultão aiúbida Saladino. Infelizmente, subsistem poucas informações sobre Ernoul, o principal autor
desta crónica. Outro possível redactor deste testemunho é Bernardo, O Tesoureiro que pode ter compilado a
crónica em 1232. (BARBER, Malcolm; BATE, Keith – The Templars: selected sources. Manchester: Manchester
University Press, 2002, p. 30).
22
Chronique d’Ernoul et de Bernard Le Trésorier. Ed. M. L. de Mas Latrie. Societé de L’Histoire de France. Paris,
Jules Renouard, 1871, p. 417. Como observaremos, mais à frente, Paio Galvão assumiu as funções de legado
papal durante a Quinta Cruzada (1217-1221) que se destinou ao Egipto.
23
Livro dos Obitos do Mosteiro de S. Vicente por Alfabeto, p. 117. É possível que este livro tenha sido elaborado
nos séculos XVII ou XVIII, todavia terá obviamente copiado todos os registos anteriores de óbito que remontariam
então aos séculos passados, tendo por base as fontes manuscritas desses períodos, cenário que lhe poderá
granjear dados de cronologia medieval. Este livro de óbitos encontra-se digitalmente disponibilizado pela
Biblioteca Nacional de Portugal. (Veja-se então: http://purl.pt/22268, Consultado em: 20/08/2020).
24
A última palavra encontra-se abreviada sob a forma de Can. (talvez Canonicus). Livro dos Obitos do Mosteiro
de S. Vicente por Alfabeto, p. 117.
25
Ou seja, poderemos então reter que Paio Galvão poderia ter sido eventualmente um cónego que, em algum
momento, estivera no Mosteiro de Santa Marinha da Costa, tendo ainda atingido a dignidade cardinalícia. A data
apontada, nessa fonte, para a sua morte, está incompleta pois não surge sequer menção ao ano do seu
falecimento (esta situação ocorre de forma frequente, se repararmos também nos outros registos aí existentes).
Livro dos Obitos do Mosteiro de S. Vicente por Alfabeto, p. 117. O mencionado Mosteiro de S. Vicente (de Fora)
estava situado em Lisboa, sendo um dos cenóbios medievais mais influentes.
26
MACEDO, António de – Lusitania Infulata et Purpurata Sev Pontificibus et Cardinalibus Illustrata, p. 83-93.
27
ENCARNAÇÃO, Tomás da - Historia Ecclesiae Lusitanae. Per singula saecula ab Evangelio promulgato. Tomo III,
p. 275-277.

7
a Paio Galvão. Aliás, Tomás da Encarnação avança mesmo com uma transcrição
deste curioso registo:

Pridie Idus Augusti obiit Petrus Galvanus Pater Pelagii Cardinalis Canonici hujus
Monasterii da Costa in Era MCCXVII28.

A nossa tradução:

No dia 12 de Agosto, faleceu Pedro Galvão, o pai de Paio, cardeal e cónego do


referido29 Mosteiro da Costa na era MCCXVII30.

Como podemos depreender, este registo menciona um facto ocorrido no ano de 1179
(era cristã), todavia se repararmos com atenção, Paio Galvão já surge indicado como
cardeal, posição que detém a partir de 120631. Por isso, podemos, desde logo, inferir
que este testemunho foi seguramente lavrado entre 1206 e 1663, ano em que António
de Macedo publica a sua obra, onde efectua já uma pequena referência sobre o dito
códice. Assim sendo, e apesar da alargada (e até excessiva) balização cronológica
para inserir este alegado documento, poderemos estar perante uma outra fonte
medieval, à qual não conseguimos aceder directamente. Aliás, desconhecemos se
este último testemunho resistiu ou não ao avanço dos tempos, e se o mesmo poderia
ser considerado como autêntico ou apócrifo. Por isso, pensamos que esta derradeira
fonte deve ser abordada com alguma prudência até porque desconhecemos do seu

28
ENCARNAÇÃO, Tomás da - Historia Ecclesiae Lusitanae. Per singula saecula ab Evangelio promulgato. Tomo III,
p. 275-277.
29
Nesta tradução, substituímos apenas o termo presente pelo vocábulo referido que nos parece mais adequado.
30
Reconhecemos a possibilidade desta pequena tradução poder conter algum erro, todavia fizemos o nosso
melhor para respeitar ao máximo o seu conteúdo. Relativamente ao ano apresentado na transcrição, teremos
que subtrair 38 anos visto que nos remete para a era de César. Assim sendo, o ano de 1217 nesta tipologia de
calendário romano corresponde ao ano cristão de 1179. Feita esta consideração, alertamos que a nossa principal
dúvida prende-se com a datação do falecimento de Pedro Galvão que preferencialmente optamos como tendo
ocorrido no dia 12 de Agosto de 1179 (ou, numa segunda hipótese, no dia de 31 de Julho – último dia de Agosto
ou no dia anterior ao surgimento deste mês). HENRIQUES, Pedro – Os Portugueses e as Cruzadas (séculos XII-
XIV). Orientação por Paula Maria de Carvalho Pinto Costa. Porto: Faculdade de Letras da Universidade do Porto,
2011, p. 177-178; ZÚQUETE, Afonso Eduardo Martins; FARIA, António Machado de - Armorial Lusitano.
Genealogia e Heráldica, p. 236-237.
31
Nesse ano de 1206, o Papa Inocêncio III nomeara Paio Galvão como cardeal diácono do título de Santa Maria
in Septisolio. (ALMEIDA, Fortunato de – História da Igreja em Portugal. Vol. 1, p. 256. COSTA, António Carvalho
da - Corografia Portugueza (…).Tomo 1. Livro 1. Tratado I. Cap. XVIII, p. 90-91).

8
paradeiro. Todavia, uma consulta exaustiva nos arquivos portugueses poderá trazer-
nos novidades a esse respeito.
Como observamos, existem algumas fontes que associam Paio Galvão ao reino de
Portugal. Dentro deste contexto, iremos expor agora a versão apologista dos
defensores desta tese.
Nascido em data incerta, Paio Galvão seria vimaranense (segundo a maioria dos
eruditos32) ou interamnense33 (isto é, oriundo da região de Entre-Douro-e-Minho34).
No que diz respeito às suas conexões familiares, praticamente todos os autores
defensores das origens lusitanas de Paio Galvão asseguram que esta personalidade
teria como seus progenitores – D. Pedro Galvão e D. Maria Pais35. O seu alegado pai,
Pedro Galvão, seria um homem abastado (com ligações evidentes à nobreza) que
viveria em Guimarães, pelos anos de 117036. Assim sendo, o nosso biografado era
proveniente duma família aristocrática. Aliás, os seus presumíveis pais foram
sepultados no Mosteiro de Santa Marinha da Costa, tendo estes deixado inúmeras
propriedades e alfaias à referida instituição monástica37.
Pelos anos de 1178, Paio Galvão ingressaria provavelmente no Mosteiro de Santa
Marinha da Costa (Guimarães)38, onde terá professado por alguns anos. Desde cedo,
parece demonstrar o seu talento e, por isso, consegue evidenciar-se neste seu
primeiro desafio. Não é de estranhar então o seu alegado ingresso na Universidade
de Paris, tendo aí aprendido teologia. Na sua aventura em França (ocorrida algures

32
ALMEIDA, Fortunato de – História da Igreja em Portugal. Vol. 1, p. 256; CALDAS, António José Ferreira –
Guimarães: Apontamentos para a sua História. Parte I, p. 152-157; CHEVALIER, Ulysse – Repértoire des sources
historiques du moyen age: bio-bibliographie. Vol. 2, p. 3563.
33
MACEDO, António de – Lusitania Infulata et Purpurata Sev Pontificibus et Cardinalibus Illustrata, p. 83-93;
ENCARNAÇÃO, Tomás da - Historia Ecclesiae Lusitanae. Per singula saecula ab Evangelio promulgato. Tomo III,
p. 275-277.
34
SILVA, António de Morais – Grande Dicionário da Língua Portuguesa. Vol. IV. Matosinhos: QN-Novas
Tecnologias, 2002, p. 197.
35
Vejam-se por exemplo: ALMEIDA, Fortunato de – História da Igreja em Portugal. Vol. 1, p. 256; COSTA, António
Carvalho da - Corografia Portugueza (…).Tomo 1. Livro 1. Tratado I. Cap. XVIII, p. 90-91; FARIA, Manoel Severim
de – Noticias de Portugal, p. 261.
36
ZÚQUETE, Afonso Eduardo Martins; FARIA, António Machado de - Armorial Lusitano. Genealogia e Heráldica,
p. 236-237.
37
ZÚQUETE, Afonso Eduardo Martins; FARIA, António Machado de - Armorial Lusitano. Genealogia e Heráldica,
p. 236-237
38
CALDAS, António José Ferreira – Guimarães: Apontamentos para a sua História. Parte I, p. 152-157; COSTA,
António Carvalho da - Corografia Portugueza (…).Tomo 1. Livro 1. Tratado I. Cap. XVIII, p. 90-91; FARIA, Manoel
Severim de – Noticias de Portugal, p. 261; D’AZEVEDO, Torquato Peixoto – Memorias Resuscitadas da Antiga
Guimarães, p. 384-386. NORTE, Armando José Gomes do – Letrados e Cultura Letrada em Portugal (Sécs. XII-XIII).
Dissertação de Doutoramento. Lisboa: Universidade de Lisboa, 2013, p. 172, 279.

9
entre 1184 e 119839), D. Paio Galvão parece ter obtido o grau de mestre no referido
curso de Teologia40, sendo orientado por D. Lotário (futuro pontífice Inocêncio III)41.
No entanto, realçamos a ideia de que a sua suposta passagem pela Universidade de
Paris não se encontra directamente alicerçada em manuscritos medievais,
assumindo-se como uma tradição advogada por historiadores dos séculos XVII e
XVIII.
De regresso ao reino português, terá sido nomeado mestre-escola da Colegiada de
Guimarães42. Talvez uma investigação profunda direccionada para o arquivo desta
antiga instituição poderá confirmar ou não esta última informação. Todos os
documentos terão que ser vistos com o máximo de atenção até porque cremos que a
permanência de Paio Galvão nesse espaço, caso tenha acontecido, terá sido pouco
duradoura43. Posteriormente, o nosso ilustre Paio integraria uma presumível
embaixada de obediência à Santa Sé, enviada por D. Sancho I, por volta do ano de
1198. Nesse ano, o sumo pontífice seria já Inocêncio III que recebera de braços

39
Datação proposta por Mário Sérgio Farelo. (FARELO, Mário Sérgio – Os Estudantes e Mestres Portugueses nas
Escolas de Paris durante o Período Medievo (séculos XII-XV): Elementos de História Cultural, Eclesiástica e
Económica para o seu estudo in Lusitania Sacra. 2ª Série, 13-14 (2001-2002), p. 190. Disponível electronicamente
em: https://repositorio.ucp.pt/bitstream/10400.14/4424/3/LS_S2_13-14_MarioSFarelo.pdf, (Consultado em:
20/08/2020).
40
COSTA, António Carvalho da - Corografia Portugueza (…).Tomo 1. Livro 1. Tratado I. Cap. XVIII, p. 90-91;
ENCARNAÇÃO, Tomás da - Historia Ecclesiae Lusitanae. Per singula saecula ab Evangelio promulgato. Tomo III,
p. 275-277; Existem dois autores que defendem ainda uma passagem breve pelo Mosteiro de Santa Cruz de
Coimbra, ainda antes de Paio Galvão ter entrado na Universidade de Paris. Por outras palavras, levantam a
hipótese de Paio Galvão ter deixado o Mosteiro de Santa Marinha da Costa, rumando ao referido convento de
Coimbra e depois, o mesmo deslocar-se-ia para Paris. Embora sendo uma hipótese pouco verosímil, não pode
ser de todo descartada, visto que, em 1190, os cónegos do referido Mosteiro de Santa Cruz receberiam bolsas
de estudo (aprovadas por D. Sancho I), caso frequentassem a Universidade de Paris. (SOUSA, Manoel Caetano
de - Catalogo Historico dos Summos Pontifices, Cardeaes, Arcebispos, e Bispos Portuguezes (…) in Colecçam dos
Documentos, estatutos e memorias da Academia Real da Historia, p. 9-10; ALMEIDA, Fortunato de – História da
Igreja em Portugal. Vol. 1, p. 256; AZEVEDO, Rui de; COSTA, Avelino Jesus da; PEREIRA, Marcelino Rodrigues -
Documentos de D. Sancho I (1174-1211). Vol. I. Doc. nr. 47. Coimbra: Universidade de Coimbra, 1979, p. 75.
HENRIQUES, Pedro – Os Portugueses e as Cruzadas (séculos XII-XIV), p. 88, nota de rodapé nº 379.
41
ENCARNAÇÃO, Tomás da - Historia Ecclesiae Lusitanae. Per singula saecula ab Evangelio promulgato. Tomo III,
p. 275-277; CARDOSO, George – Agiologo Lusitano dos Sanctos e Varoens Illustres em virtude do Reino de
Portugal, e suas conquistas. Tomo III, p. 483-486.
42
COSTA, António Carvalho da - Corografia Portugueza (…).Tomo 1. Livro 1. Tratado I. Cap. XVIII, p. 90-91;
CALDAS, António José Ferreira – Guimarães: Apontamentos para a sua História. Parte I, p. 152-157; ALMEIDA,
Fortunato de – História da Igreja em Portugal. Vol. 1, p. 256. NORTE, Armando José Gomes do – Letrados e
Cultura Letrada em Portugal (Sécs. XII-XIII), p. 233.
43
Por isso, a sua presença na documentação poderá ser nula ou praticamente nula. Todavia se existir, por
ventura, um ou dois registos autênticos que confirmem a sua presença naquela instituição, cremos que as
alegadas origens portuguesas de Paio Galvão seriam ainda mais reforçadas.

10
abertos o seu antigo pupilo, não estando disposto a abdicar dum elemento com um
tremendo potencial ao nível do conhecimento canónico e intelectual44.
Aproximamo-nos agora dos anos iniciais do século XIII que espelharão a sua
presença documentada em solo italiano e noutros espaços do mundo então
conhecido, momentos esses que corresponderão ao auge da sua carreira enquanto
cardeal-legado.
No entanto, e aquando da sua afirmação no topo da estrutura eclesiástica, Paio
Galvão agiu como intermediário em questões relacionadas com o reino de Portugal,
embora também o tenha feito proporcionalmente com Leão e Castela45.
Apuramos que, em 1209, o cardeal interveio nas querelas entre os cónegos regulares
e os representantes clericais da Catedral de Coimbra. De acordo com uma bula de
Honório III, estava em causa a nomeação do padre da Igreja de Santa Maria em
Montemor, a qual motivava uma divergência entre o Mosteiro de Santa Cruz de
Coimbra e a Sé desta cidade. Na qualidade de auditor, o cardeal confirmaria a
sentença previamente dada pelos juízes de Zamora46.
Em 1212, Inocêncio III emite a confirmação da bula Manifestis Probatum (outorgada
originalmente pelo Sumo Pontífice Alexandre III em 1179), a qual ratifica a dignidade
real a D. Afonso II e a seus sucessores, ameaçando com grandes castigos a quem
perturbasse as suas possessões e deixando claro que nenhum príncipe cristão
poderia ter qualquer direito às terras de Portugal47. O cardeal parece ter igualmente
estado envolvido neste momento diplomático, exercendo alguma influência nesse
sentido e ajudando a viabilizar a legitimidade política do reino. Para os soberanos de
Portugal, esta era uma oportunidade para convencer a Santa Sé de que efectivamente

44
A proximidade existente entre Paio Galvão e Lotário (Inocêncio III) pode ser observada em: COSTA, António
Carvalho da - Corografia Portugueza (…).Tomo 1. Livro 1. Tratado I. Cap. XVIII, p. 90-91.
45
BRANCO, Maria João – Os Eclesiásticos e as Questões Portuguesas junto à Cúria Romana: a influência dos
cardeais hispânicos (1213-1254) in Encontro Internacional - Carreiras Eclesiásticas no Ocidente Cristão (séc. XII-
XIV). Lisboa: Universidade Católica Portuguesa, 2007, p. 79-85.
46
BRANCO, Maria João – Os Eclesiásticos e as Questões Portuguesas junto à Cúria Romana: a influência dos
cardeais hispânicos (1213-1254) in Encontro Internacional - Carreiras Eclesiásticas no Ocidente Cristão (séc. XII-
XIV), p. 87, veja-se nota de rodapé nº 28.
47
RABELLO, David – A Bula da Santa Cruzada. Nota Preliminar. Departamento de História da UNESP — Assis.
Veja-se: https://core.ac.uk/download/pdf/268314807.pdf, (Consultado em: 16-08-2020). Veja-se neste estudo a
página 149.

11
se preocupavam com o bem-estar e a prosperidade da Igreja, alcançando assim a
confiança e o apoio de Roma48.
Em 1217, Paio Galvão e Gil Torres subscrevem um privilégio pontifício que tinha sido
conferido ao Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra49.
O bispo de Lisboa, Soeiro Viegas (um dos heróis da conquista de Alcácer do Sal em
121750), terá estado com o cardeal, em 1223, depois deste ter regressado do Oriente.
O bispo português teria servido Paio Galvão enquanto conselheiro para as funções
auditoriais, talvez relacionadas com a Diocese de Lisboa, onde havia uma disputa
entre o Bispo e o Mosteiro de S. Vicente de Fora51. Por outro lado, Soeiro Viegas
aproveitou o momento para interceder igualmente pelos seus homens junto da cúria:
Estêvão Gomes, mestre-escola de Lisboa, obteria o privilégio de acumular benefícios,
enquanto o Mestre Paio Pais, ainda na qualidade de chantre do Porto, se tornaria em
breve capelão do cardeal52.
Efectivamente, o já citado Mestre Paio Pais, chantre do Porto (e mais tarde, entre
1232-1233, bispo eleito de Lisboa) e certamente uma figura próxima do rei português,
terá servido como capelão de Paio Galvão em Roma, no ano de 1226. Além da origem

48
É provável que tenha sido um dos cardeais que testemunhou a promulgação de tal célebre documento em
1212. BRANCO, Maria João – Os Eclesiásticos e as Questões Portuguesas junto à Cúria Romana: a influência dos
cardeais hispânicos (1213-1254) in Encontro Internacional - Carreiras Eclesiásticas no Ocidente Cristão (séc. XII-
XIV), p. 87-88.
49
BRANCO, Maria João – Os Eclesiásticos e as Questões Portuguesas junto à Cúria Romana: a influência dos
cardeais hispânicos (1213-1254) in Encontro Internacional - Carreiras Eclesiásticas no Ocidente Cristão (séc. XII-
XIV), p. 90.
50
HENRIQUES, Pedro – Os Portugueses e as Cruzadas. Séculos XII-XIV. Tese de Mestrado Orientada pela Dra.
Paula Pinto Costa. Porto: Faculdade de Letras da Universidade do Porto, p. 60-72.
51
D. Paio Galvão teve que dirimir um pleito entre o bispo e cabido de Lisboa, por um lado, e o Mosteiro de São
Vicente de Fora, por outro, por causa de questões relacionadas com os direitos episcopais. Após ter escutado
todos os argumentos, o cardeal procurou estabelecer uma concórdia. Vários tópicos que eram objecto de
discórdia tiveram que merecer uma atenção especial, nomeadamente: a eleição do prior e a assistência deste a
prestar ao sínodo diocesano, a recepção e os direitos do bispo, a correcção de posturas abusivas do Mosteiro, o
direito de apresentação de clérigos, os pagamentos de dízimos, a administração de sacramentos, os direitos dos
enterramentos, etc. Veja-se: MANSILLA, Demetrio - El cardenal hispano Pelayo Gaitán (1206-1230) in Anthologica
Annua, p. 61. BRANCO, Maria João – Os Eclesiásticos e as Questões Portuguesas junto à Cúria Romana: a
influência dos cardeais hispânicos (1213-1254) in Encontro Internacional - Carreiras Eclesiásticas no Ocidente
Cristão (séc. XII-XIV), p. 94-95.
52
BRANCO, Maria João – Os Eclesiásticos e as Questões Portuguesas junto à Cúria Romana: a influência dos
cardeais hispânicos (1213-1254) in Encontro Internacional - Carreiras Eclesiásticas no Ocidente Cristão (séc. XII-
XIV), p. 94-95.

12
portuguesa, o Mestre Paio Pais terá sido igualmente, ao longo da sua carreira, prior
da Colegiada de Guimarães53.
Como é evidente, estas ligações não constituem um argumento suficientemente
esclarecedor para advogar as origens portuguesas do cardeal D. Paio Galvão, todavia
é indiscutível que este chegou a dialogar e a privar com personalidades de renome da
Igreja Portuguesa, embora também o tenha feito em relação a altas figuras de Leão e
Castela54, o que torna bastante inglória a nossa missão de determinar as suas raízes.

53
BRANCO, Maria João – Os Eclesiásticos e as Questões Portuguesas junto à Cúria Romana: a influência dos
cardeais hispânicos (1213-1254) in Encontro Internacional - Carreiras Eclesiásticas no Ocidente Cristão (séc. XII-
XIV), p.91.
54
BRANCO, Maria João – Os Eclesiásticos e as Questões Portuguesas junto à Cúria Romana: a influência dos
cardeais hispânicos (1213-1254) in Encontro Internacional - Carreiras Eclesiásticas no Ocidente Cristão (séc. XII-
XIV), p. 96-97.

13
Capítulo II- A teorização da sua naturalidade leonesa

A teoria da naturalidade portuguesa é contestada por outros historiadores que


preferem alegar uma origem leonesa ou galega do cardeal Paio Galvão, sendo este
designado em alguns desses estudos de uma forma mais hispanizada como “Pelayo
Gaitán55”. De entre os eruditos que enveredam por tal perspectiva, podemos destacar
os seguintes: Demetrio Mansilla56, António Garcia y Garcia57, Peter Linehan58, Manuel
Risco59, Tomás Villacorta Rodríguez60, Werner Maleczek61, Vicente Beltrán de
Heredia62 e Maria João Branco63.
De acordo com os principais proponentes desta ordem de ideias, o cardeal teria casas
na cidade de León64, e seria ainda responsável pelo senhorio de Gusendos de León65.
A documentação medieval dá-nos conta de que teria três sobrinhos pelos quais
intercedeu junto do Papa. O primeiro deles, e talvez mais conhecido, foi Juan Galvani
(ou João Galvão), mestre-escola de León e, mais tarde, deão de Compostela. Pelayo

55
E será essa a versão nominal que adoptaremos neste capítulo em concreto.
56
MANSILLA, Demetrio – El cardenal hispano Pelayo Gaitán (1206-1230) in Anthologica Annua. Publicaciones del
Instituto Español de Estudios Eclesiasticos. Roma/Madrid: Iglesia Nacional Española, 1953, p. 11-66.
57
GARCIA Y GARCIA, António – La Canonística Ibérica (1150 – 1250) en la investigación reciente. Bulletin of
Medieval Canon Law, 1981, p. 41-76. GARCIA Y GARCIA, António - Derecho comun en España: los juristas y sus
obras. Múrcia: Secretariado de Publicações da Universidade de Múrcia, 1991, p. 59.
58
LINEHAN, Peter - The Spanish Church and the Papacy in the Thirteenth Century. Cambridge: Cambridge
University Press, 1971, p. 276-300. Podem ser visualizados alguns excertos em:
https://libro.uca.edu/scp/spc12.htm, (Consultado em: 01-08-2020).
59
RISCO, Manuel – España Sagrada. Tomo XXXV - Memorias de la Santa Iglesia esenta de Leon, concernientes a
los siglos XI, XII y XIII. Madrid: Oficina de Pedro Marin, 1786, p. 287-289.
60
VILLACORTA RODRÍGUEZ, Tomás – El Cabildo Catedral de León: estudio historico-juridico, siglos 12 – 19. León:
Centro de Estudios e Investigacion "San Isidoro", 1974, p. 42.
61
MALECZEK, Werner - Papst und Kardinalskolleg von 1191-1216. Die Kardinäle unter Coelestin III und Innocenz
III. Viena: Verlag der Österreichischen Akademie der Wissenschaften, 1984, p. 166-169.
62
HEREDIA, Vicente Beltrán – Cartulario de la Universidad de Salamanca (1218-1600). Tomo I. Salamanca:
Universidade de Salamanca, 1970, p. 78.
63
Apesar de a autora ter demonstrado na sua valiosa investigação uma certa proximidade do cardeal face aos
assuntos religiosos e políticos do reino de Portugal, a verdade é que reconhece que os argumentos favoráveis à
origem leonesa do cardeal parecem ser mais convincentes, tendo citado para esse efeito os estudos já elencados,
nas notas de rodapé anteriores, de Demetrio Mansilla e Peter Linehan. Veja-se: BRANCO, Maria João – Os
Eclesiásticos e as Questões Portuguesas junto à Cúria Romana: a influência dos cardeais hispânicos (1213-1254)
in Encontro Internacional - Carreiras Eclesiásticas no Ocidente Cristão (séc. XII-XIV). Lisboa: Universidade Católica
Portuguesa, 2007. O mencionado estudo pode ser consultado digitalmente em:
https://repositorio.ucp.pt/bitstream/10400.14/7420/1/EHR_5_MJBranco.pdf, (Consultado em: 01-08-2020).
64
MANSILLA, Demetrio - El cardenal hispano Pelayo Gaitán (1206-1230) in Anthologica Annua, p. 12-13.
65
Há autores que colocam mesmo Gusendos como um dos possíveis locais de nascimento. O pequeno povoado
receberia mesmo um privilégio da rainha D. Berenguela em 30 de Janeiro de 1226 (era de 1264), talvez devido
ao respeito que ela nutria pela autoridade do cardeal Pelayo Gaitán. RISCO, Manuel – España Sagrada. Tomo
XXXV - Memorias de la Santa Iglesia esenta de Leon, concernientes a los siglos XI, XII y XIII, p. 287-289.

14
Gaitán pediu um favor ao Sumo Pontífice Honório III para que este convencesse o rei
Afonso IX de Leão, a entregar a chancelaria do reino a este seu sobrinho, em finais
de 121666, o que acabou por não se suceder67.
Pedro Arias, deão de León, e P. Aurie, deão de Salamanca, seriam igualmente
sobrinhos do cardeal68 que também solicitou, sobretudo para este último, a dispensa
da ilegitimidade do seu nascimento, podendo assim ser promovido às ordens
sagradas e receber dignidades69.
Apesar de não termos a certeza quanto aos locais de nascimento destes três
eclesiásticos, a verdade é que, de acordo com os arguentes da teoria agora em
análise, a área de acção em que estes se movem se enquadra nos domínios de Leão
e Castela, o que pode indiciar uma determinada familiaridade do cardeal em relação
a estes territórios70. Além disso, o cardeal teria irmãos, não sendo filho único, contudo
a identidade, as origens e o papel social destes não ficariam sequer registados nos
manuscritos medievais.
Ao nível das relações com as entidades religiosas do reino leonês, e já na qualidade
de cardeal e bispo de Albano, Pelayo Gaitán foi responsável pela elaboração das
constituições capitulares que regeriam a Catedral de León. Este novo diploma
regularia os benefícios, o serviço de coro e a vida capitular, colocando, por outro lado,
barreiras aos vícios e defeitos que se alojavam naquela estrutura clerical. De acordo
com Demetrio Mansilla71, seria reconhecido ao bispo o direito de ordenador e
administrador dos benefícios eclesiásticos, enquanto que o cabido teria meios para
limitar o seu poder de decisão, reservando para si o direito de prestar consentimento,
sob pena de se inviabilizar qualquer colação beneficial. Curiosamente, o falecimento
do cardeal seria, mais tarde, consignado no obituário da catedral de León. O templo

66
MANSILLA, Demetrio - El cardenal hispano Pelayo Gaitán (1206-1230) in Anthologica Annua, p. 12-13.
67
Juan Galvani nunca chegaria a ser promovido a chanceler do rei, todavia se tornaria deão de Compostela após
o ano de 1224. BRANCO, Maria João – Os Eclesiásticos e as Questões Portuguesas junto à Cúria Romana: a
influência dos cardeais hispânicos (1213-1254) in Encontro Internacional - Carreiras Eclesiásticas no Ocidente
Cristão (séc. XII-XIV), p. 96.
68
LINEHAN, Peter - The Spanish Church and the Papacy in the Thirteenth Century, p. 291-292.
69
MANSILLA, Demetrio - El cardenal hispano Pelayo Gaitán (1206-1230) in Anthologica Annua, p. 61.
70
Todavia, este forte argumento ainda não é, a nosso ver, a prova final que atesta claramente as potenciais
origens leonesas da personalidade que é alvo do nosso estudo, visto que não conhecemos a naturalidade e
origem concretas dos seus sobrinhos, mas apenas onde estes exerceram as suas carreiras. Além disso, houve
bispos e outros clérigos portugueses que desempenharam funções em Leão e Castela. Temos o caso do bispo de
Osma (Salamanca) – D. Mendo (1210-1225) que seria aparentemente oriundo de Portugal.
71
MANSILLA, Demetrio - El cardenal hispano Pelayo Gaitán (1206-1230) in Anthologica Annua, p. 12-13, 53-55.

15
conserva ainda uma escritura de doação, pela qual o já então bispo de Albano tinha
outorgado a favor do Mosteiro de Carvajal uma herdade que presumivelmente detinha
em Vega de Infanzones.
Além destas indicações já referidas, o cardeal ainda terá presumivelmente financiado
a construção de uma das capelas da catedral de León em 1230, tendo atribuído
consideráveis quantias para esse efeito72.
Por outro lado, teorizou-se a possibilidade de Pelayo Gaitán ter sido bispo eleito da
referida catedral de León entre 1207 e 1208, contudo essa hipótese parece ser
bastante remota, tendo em conta que parecem subsistir poucas dúvidas de que o
responsável eclesiástico da referida igreja terá sido um Pelayo com o apelido de Pérez
(ou Petri), havendo clara divergência quanto ao seu derradeiro nome73.
Pelayo Gaitán desempenhou ainda um papel activo na tentativa de solução do
processo complexo de translação e definição dos limites diocesanos de Mondoñedo
que estavam, na altura, sob a influência da arquidiocese de Braga. A sede daquela
diocese passaria de Ribadeo para Mondoñedo. Por outro lado, teve ainda que mediar
as disputas entre o Bispo e alguns cónegos de Mondoñedo e o Deão e cabido de
Ribadeo por causa de algumas rendas e possessões. Para esse efeito, o cardeal
sugeriu uma concórdia em que pessoas imparciais e desinteressadas averiguariam
com precisão tudo o que foi ilegalmente arrebatado, restituindo às Igrejas de
Mondoñedo e Ribadeo o que lhes pertencesse por direito. As decisões destes
autênticos “chefes da paz” teriam de ser acatadas por ambas as partes, sob pena de
excomunhão e respectiva indemnização à facção contrária74.
O cardeal interveio igualmente no diferendo entre D. Rodrigo, Arcebispo de Toledo, e
o Bispo/Cabido de Ávila, em volta de questões relacionadas com os limites
diocesanos. Por outro lado, sabemos que Pelayo Gaitán e Gil Torres, cardeal de

72
VICTORIA HERRÁEZ, María; C. COSMEN, María e VALDÉS FERNÁNDEZ, Manuel - La catedral de León en la
transición de los siglos XII a XIII. El edificio Tardorrománico, Anuario Del Departamento De Historia Y Teoría Del
Arte, Vol. VI. Madrid: Universidade Autónoma de Madrid, 1994, p. 13. FERNÁNDEZ CATÓN, José María - Colección
documental del archivo de la Catedral de León, Vol.VI. (1188-1230), doc. 1966. León, 1991, p. 497-491. Nesta
última compilação, o cardeal surge com alguma frequência nos documentos, isto durante os seus últimos anos
de vida, o que sugere uma ligação próxima para com a catedral de León, embora isso só por si não prove de
forma inequívoca as suas origens leonesas, apesar de poder constituir um argumento válido que possa apontar
nesse sentido.
73
CAVERO, Gregoria - La mitra y el cabildo en la iglesia de León durante el siglo XIII, artigo disponível em:
https://buleria.unileon.es/bitstream/handle/10612/6804/gregoria%20cavero0001.pdf, (Consultado em 10-06-
2021).
74
MANSILLA, Demetrio - El cardenal hispano Pelayo Gaitán (1206-1230) in Anthologica Annua, p. 55-58.

16
origens presumivelmente castelhanas ou samoranas (Zamora), seriam intermediários
da venda da vila de Bamba, sita na diocese de Zamora, por parte do mosteiro italiano
de San Miguel de Orsara que, na altura, atravessava graves dificuldades de
subsistência. A escritura da venda seria mesmo rubricada no palácio do cardeal-bispo
de Albano ante a presença de vários procuradores e representantes clericais. Mais
tarde, o dito mosteiro de San Miguel de Orsara passaria para a Ordem de Calatrava,
a pedido da ex-rainha de Leão, D. Teresa (1190-1195)75.
Pelo que pudemos apurar por fim, os presumíveis sobrinhos do cardeal (Juan Galvani,
Pedro Arias e P. Aurie) teriam sido protegidos pela Santa Sé após a morte do seu tio
em 1230, dado que houve uma campanha interna movida por detractores de Pelayo
Gaitán. Seria o próprio Sumo Pontífice Gregório IX a denunciar a iniciativa como uma
“ingratidão odiosa”, recordando que alguns dos seus mentores chegaram a ser
protegidos do cardeal e que lhe deviam ainda respeito pelo seu nome e memória76.
Em suma, podemos concluir que a personalidade estudada teve também relações
privilegiadas com o reino de Leão a todos os níveis, cenário que nos motiva
obviamente a recorrer a uma abordagem mais prudente e cautelosa e que nos permite
auscultar todo o tipo de hipóteses naquilo que concerne às suas origens.
Felizmente, os próximos capítulos da sua vida, vislumbrados no dealbar do século
XIII, já se encontram devidamente documentados, permitindo assim a qualquer
historiador ou investigador seguir o seu rastro, alicerçando-se em factos que serão
agora praticamente indiscutíveis.

75
MANSILLA, Demetrio - El cardenal hispano Pelayo Gaitán (1206-1230) in Anthologica Annua, p. 58-59.
76
LINEHAN, Peter - The Spanish Church and the Papacy in the Thirteenth Century, p. 291-292.

17
Parte 2- Do anonimato para a ribalta em solo italiano e internacional

(1204-1230)

Após termos efectuado a devida problematização sobre as presumíveis origens de


Paio Galvão, chegou então o momento de analisarmos com atenção o seu percurso
no século XIII que atingirá vários pontos altos.
De facto, o seu trajecto enquanto dignidade eclesiástica foi, no mínimo, invejável. Por
um lado, será elevado às categorias de cardeal e de bispo de Albano77, enquanto que,
por outro, representará a Santa Sé nos mais diversos espaços estratégicos do mundo
até então conhecido.
Dentro deste contexto, importa conhecer o seu desempenho perante os desafios
tremendamente exigentes que se avizinhavam. A sua vida nunca mais será a mesma,
visto que saltará da obscuridade para um patamar de excelência, tornando-se
inclusivamente num dos homens de confiança de Inocêncio III (1198-1216), Honório
III (1216-1227) e Gregório IX (1227-1241)78. As principais questões que afectam a
Cristandade dependem agora da sua actuação!
Assim sendo, do ponto de vista metodológico e estrutural, esta segunda e derradeira
parte do estudo será composta pelos seguintes capítulos: “Cargos eclesiásticos
exercidos por Paio Galvão na Península Itálica” (Capítulo I), “Legado Pontifício
com missões em inúmeros espaços” (Capítulo II) e “Últimos Anos” (Capítulo III).
Relativamente a esta nova fase do nosso trabalho, reconhecemos que não
encontrámos muitos entraves que nos impossibilitassem de traçar as vivências de
Paio Galvão entre 1204 e 1230. Com efeito, as fontes existentes para este período
são mais abundantes e menos contraditórias, o que se traduz numa conjugação mais
favorável para os intentos de investigação.

77
A diocese de Albano encontra-se inserida na Província Eclesiástica de Roma. (Veja-se então o seguinte
endereço electrónico: http://www.diocesidialbano.it/diocesi/storia-della-diocesi/, consultado em: 30/08/2020).
78
A datação dos pontificados referidos pode ser observada em: GARCÍA-GUIJARRO RAMOS, Luis – Papado,
Cruzadas y Órdenes Militares, siglos XI-XIII. Madrid: Cátedra, 1995, p. 295-296.

18
Capítulo I- Cargos eclesiásticos exercidos por Paio Galvão na Península Itálica

Como já referimos, o século XIII assistiria ao auge da carreira eclesiástica de Paio


Galvão. Devido à forte confiança que Inocêncio III depositava nesta personalidade,
não é de estranhar que tenha acumulado diversos títulos eclesiásticos em espaço
italiano.
No ano de 1204, é nomeado vice-chanceler da Santa Sé79. Contudo, seria, em breve,
cardeal diácono de Santa Lúcia in Septisolio, algo que ocorre em 1206 e que marca
assim o seu ingresso no colégio cardinalício. A 31 de Maio de 1211, já surge na
documentação como cardeal-presbítero de Santa Cecília80. A sua ascensão continua
e, em 121381 (ou 121582 - menos provável), torna-se bispo de Albano, uma das
dioceses que constituem a província eclesiástica de Roma83. Esta última nomeação
representou um passo determinante na carreira daquele eclesiástico, visto que os
bispos suburbicários eram também cardeais e faziam parte, juntamente com outros
eclesiásticos selecionados, da assembleia, chamada a partir do século XII de “Sacrum
Collegium” que, entre as suas funções, tinha de eleger o Papa84.
Durante esta quinzena de anos bem-sucedidos, Paio Galvão teve ainda tempo para
declinar um convite efectuado pelo cabido de Antioquia que procurava nomear um
novo patriarca para suceder a Pedro de Angoulême, recentemente falecido em 120985.
Apesar da rejeição desta proposta proveniente do Oriente, a verdade é que o prestígio

79
COSTA, António Carvalho da - Corografia Portugueza (…).Tomo 1. Livro 1. Tratado I. Cap. XVIII, p. 90-91;
MIRANDA, Salvador – The Cardinals of the Holy Roman Church. 1998-2011. Estudo digitalizado em:
http://cardinals.fiu.edu/bios1205.htm, (Consultado em: 20/08/2020).
80
MANSILLA, Demetrio – El cardenal hispano Pelayo Gaitán (1206-1230) in Anthologica Annua, p. 13-14;
MACEDO, António de – Lusitania Infulata et Purpurata Sev Pontificibus et Cardinalibus Illustrata, p. 83-93.
81
Demetrio Mansilla assegura que Paio Galvão já teria subscrito, enquanto bispo de Albano, um documento a 5
de Agosto de 1213. (MANSILLA, Demetrio - El cardenal hispano Pelayo Gaitán (1206-1230) in Anthologica Annua,
p. 13-14).
82
Outros autores, tais como Fortunato de Almeida e António Carvalho da Costa, mencionam que Paio Galvão
exerceu o cargo de bispo de Albano a partir de 1215. No entanto, cremos que há informações suficientes que
nos inclinam a aceitar a versão de que teria começado as suas funções episcopais em 1213.
83
Demetrio Mansilla, El cardenal hispano Pelayo Gaitán (1206-1230) in Anthologica Annua, p. 13-14.
http://www.diocesidialbano.it/diocesi/storia-della-diocesi/, (Consultado em: 30/08/2020).
84
Vejam-se os estudos de: FALCONIERI, Tommaso di - Il clero di Roma nel medioevo. Istituzioni e politica cittadina
(secoli VIII-XIII). Roma: Viella, 2002. BAGLIANI, Agostino Paravicini - Morte e elezione del papa. Norme, riti e
conflitti. Il Medioevo. Roma: Viella, 2013.
85
MANSILLA, Demetrio - El cardenal hispano Pelayo Gaitán (1206-1230) in Anthologica Annua, p. 14.

19
de Paio Galvão já não se restringia apenas ao solo italiano, sendo o seu nome
reconhecido noutros territórios da Cristandade.
Todavia, o ponto mais alto do seu percurso eclesiástico foi indubitavelmente a sua
eleição para bispo de Albano que, como já referimos, ocorrera em 1213. Por isso,
importa conhecer a sua actuação, à frente da referida diocese, que se prolongará até
1230, presumível ano do seu falecimento.
Em primeiro lugar, devemos começar por salientar que os registos existentes para a
diocese de Albano do século XIII pecam pela sua evidente escassez86. Tal poderá
encontrar justificação no facto de Paio Galvão se encontrar habitualmente a viver em
Roma, onde teria uma casa localizada junto ao palácio pontifício87. Também o facto
de ter integrado várias missões externas, como veremos, contribuiu para que os dados
disponíveis sobre a sua gestão em Albano fossem ínfimos. Assim sendo, não será
fácil traçar o desempenho de Paio Galvão enquanto cardeal-bispo de Albano.
Mesmo assim, e usufruindo da pesquisa efectuada por Demetrio Mansilla nos arquivos
italianos, podemos adiantar que Paio terá reivindicado os direitos sobre a Igreja de
Petornella que era também disputada pelo abade de San Lorenzo. Este último alegava
que o mencionado templo não se encontrava dentro dos limites da Diocese de Albano.
A resolução da contenda acabaria por favorecer os interesses de Paio Galvão e da
sua diocese, ficando determinado que a igreja de Petornella teria de pagar os direitos
episcopais (como por exemplo: o dízimo) ao bispo de Albano88.
Das poucas informações que conseguimos levantar, temos também conhecimento de
que Paio Pais89, antigo chantre do Porto, seria nomeado capelão de Paio Galvão.
Infelizmente, não encontramos dados que permitam identificar minuciosamente a
relação mantida entre estas duas personalidades. Todavia, é provável que Paio Pais
tenha exercido o referido ofício por um ou dois anos. A confirmar-se tal cenário, a sua
estadia em Albano poderia ter começado nos finais de 1224 ou de 1225, encontrando

86
MANSILLA, Demetrio - El cardenal hispano Pelayo Gaitán (1206-1230) in Anthologica Annua, p. 12,16.
87
Demetrio Mansilla, El cardenal hispano Pelayo Gaitán (1206-1230) in Anthologica Annua, p. 12-16.
88
MANSILLA, Demetrio - El cardenal hispano Pelayo Gaitán (1206-1230) in Anthologica Annua, p. 16.
89
Paio Pais fora chantre do Porto e conselheiro de D. Afonso II, colaborando na actividade da chancelaria, onde
mantém uma presença constante entre 1215-1221. No ano de 1223, está já presente nos acordos assinados
entre D. Sancho II e Estevão Soares da Silva, arcebispo de Braga. Foi capelão de Paio Gaitán (designação utilizada
por Hermenegildo Fernandes que corresponde a Paio Galvão), cardeal-bispo de Albano. A partir de 1226, é prior
da Colegiada de Guimarães. Todavia, seria ainda bispo de Lisboa, embora por pouco tempo visto que viria a
falecer em breve. (FERNANDES, Hermenegildo – D. Sancho II. Mem Martins: Círculo de Leitores, 2006, p. 125-
126, 165, 202).

20
o seu término antes de Janeiro de 1226 (ou pelo menos, no decurso deste ano), visto
que nessa data já surge como prior da colegiada de Guimarães, cargo que conferia
um prestígio quase episcopal. Também seria bispo de Lisboa por um breve espaço
de tempo (1232-1233) devido ao seu precoce falecimento90. Todavia, não deixa de
ser estranha a promoção eclesiástica de Paio Pais que ocorre após a sua experiência
verificada em Albano e Roma. Terá Paio Galvão, como personalidade de confiança
dos pontífices da época, influenciado o trajecto daquele a partir de 1226? Será que o
cardeal poderia já conhecer o seu eventual compatriota, visto que ambos poderiam
ser oriundos da região de Entre-Douro-e-Minho (ou, pelo menos, bem conhecedores
desta zona)?
Acresce ainda o facto de Paio Pais ter ingressado como prior da Colegiada de
Guimarães, instituição que, em data imprecisa (talvez algures nas décadas de 1180
ou 1190), teria alegadamente recebido Paio Galvão (embora como mestre-escola),
aquando dos inícios da carreira deste. Fruto da coincidência ou não, a verdade é que
a carreira eclesiástica de Paio Pais atingiu os seus feitos mais marcantes, logo após
as suas vivências experienciadas em solo italiano. No entanto, teremos que analisar
estes dados com máxima prudência, visto que não encontramos evidências concretas
que permitam corroborar esta linha de raciocínio, não descartando outras explanações
que possam surgir para o efeito.
Infelizmente, os ínfimos registos existentes para actuação de Paio Galvão, enquanto
bispo de Albano, não permitem a obtenção de mais dados relevantes. Como já
disséramos anteriormente, é provável que Paio Galvão se encontrasse
frequentemente a viver em Roma91, onde faria usufruto de uma casa localizada junto
ao mencionado palácio pontifício92. Não é de estranhar que a sua presença na Cúria
Romana fosse assídua e necessária, visto que os sumos pontífices usufruíam das
suas capacidades de intermediação e resolução para as inúmeras contendas que
deflagravam entre os diversos partidos eclesiásticos, espalhados por toda a
Cristandade.
Dentro deste contexto, Paio Galvão concentraria a maior parte das suas atenções,
não na sua Diocese de Albano, mas sim nas diversas questões debatidas na Cúria

90
FERNANDES, Hermenegildo – D. Sancho II, p. 125-126, 165, 202.
91
Quando não se encontrava em Roma, provavelmente já estaria a participar numa das missões destinadas ao
Oriente.
92
MANSILLA, Demetrio - El cardenal hispano Pelayo Gaitán (1206-1230) in Anthologica Annua, p. 12-16.

21
Romana. Através da sua presença neste prestigiado espaço, podemos observar a sua
intervenção na mediação e resolução de litígios de foro eclesiástico que afectavam
variados espaços localizados na Península Itálica, no Sacro Império Romano-
Germânico, no Levante ou até mesmo na Hispânia93.
Em 1227, Paio Galvão receberia, já na fase final da sua vida, o cargo de deão do
Colégio Cardinalício94.
Segundo Salvador Miranda e Demetrio Mansilla, autores que efectuaram pesquisa
nos arquivos italianos, Paio terá subscrito vários documentos pontifícios o que reforça
ainda mais a sua influência em redor da Santa Sé.
Por fim, sabemos ainda que Paio Galvão terá redigido três obras. Por um lado, temos
as mencionadas Constituições destinadas ao cabido de León, atribuídas por Honório
III em 25 de Maio de 1224, embora inspiradas pelo cardeal. Por outro lado, temos
também outros dois trabalhos da sua autoria: “Glosas soltas ao Decreto de
Graciano95” e “Glosas à Compilação I antiga”. Esta última obra parece também conter
alegações da autoria de Vicente Hispano96, um erudito, de nascimento alegadamente
português, que terá estudado e leccionado em Bolonha, nos inícios do século XIII. A
suposta formação universitária de Paio Galvão sai então reforçada, tendo em conta
todos os elementos já discriminados neste capítulo.
Em suma, Paio privilegiaria uma forte intervenção nos diferendos que eram remetidos
para a Cúria Romana, sendo os mesmos provenientes de todas as partes da
Cristandade. Os projectos que presumivelmente teria para a sua diocese de Albano
não deveriam ser os mais prioritários. Como se não bastasse, o cardeal integraria
legacias de extrema importância destinadas ao Oriente, o que tornou mais visível o
seu distanciamento em relação à diocese que lhe tinha sido confiada.

93
Vários dos casos que lhe foram confiados podem ser observados em: MANSILLA, Demetrio - El cardenal hispano
Pelayo Gaitán (1206-1230) in Anthologica Annua, p. 11-66.
94
MIRANDA, Salvador – The Cardinals of the Holy Roman Church. 1998-2011. Estudo digitalizado em:
http://cardinals.fiu.edu/bios1205.htm, (Consultado em: 20/08/2020).
95
Provável autoria.
96
Vicente Hispano, legista e canonista, seria alegadamente originário de Portugal. Por volta de 1200, está a
estudar em Bolonha, sendo orientado por Silvestre Godinho (natural de Braga e futuro arcebispo da respectiva
diocese), Lorenzo ou Lourenço Hispano (proveniente da Península Ibérica, mestre-escola e bispo de Orense entre
1218-1248) e Juan Galense (erudito presumivelmente oriundo de Volterra). Entre 1210-1215, Vicente é professor
na Universidade bolonhesa. Muito provavelmente trata-se do mesmo Vicente que seria, mais tarde, bispo da
Guarda (1226-1248) e chanceler/conselheiro régio de D. Sancho II de Portugal. Em termos culturais, foi ainda um
exímio comentador do Decreto de Graciano, das compilações antigas e das decretais de Gregório IX. Faleceria a
21 de Setembro de 1248. (GARCIA Y GARCIA, Antonio – Derecho Comum en España. Los juristas y sus obras, p.
59-61).

22
No próximo capítulo, iremos abordar essas missões de alta exigência que lhe seriam
confiadas pela Santa Sé, as quais tiveram lugar em territórios primordiais tais como
Constantinopla, Egipto e outros espaços estrategicamente decisivos do mundo então
conhecido.

23
Capítulo II- Legado Pontifício com missões em inúmeros espaços

1 – Em Constantinopla (1213-1214/1215):

Como já mencionámos nos capítulos anteriores, Paio Galvão encabeçaria legacias,


isto é, embaixadas enviadas pelos Sumos Pontífices ao Oriente. A primeira das quais
destinou-se a Constantinopla, tendo sido iniciada em 121397.
Os únicos relatos existentes sobre as incidências desta embaixada foram concebidos
por dois eruditos gregos do século XIII: George Akropolites98 e Nicolas Mesarites99.
Para a missão ser bem-sucedida, Paio Galvão teria que cumprir três objectivos que
lhe tinham sido confiados por Inocêncio III:

1. Estabelecer a paz entre latinos e gregos. O Papa desejava a recuperação da


Terra Santa mas para atingir essa finalidade era necessário assegurar a paz
entre os diversos príncipes cristãos.
2. Unificar a Igreja Ocidental e a Oriental, Latina e Grega respectivamente.
3. Impor a primazia romana100.

A tarefa estava longe de ser fácil, tendo em conta a diversidade de culturas existentes
naquela região bem como o contexto precedente que não era animador101. De facto,
a Quarta Cruzada (1202-1204) abriria feridas profundas entre gregos e latinos. A
expedição lançada por Inocêncio III tinha consistido inicialmente num ataque ao
Egipto, mas a mesma seria desviada pelos venezianos (liderados por Enrico Dandolo),

97
MACEDO, António de – Lusitania Infulata et Purpurata Sev Pontificibus et Cardinalibus Illustrata, p. 83-93.
98
George Akropolites (1217-1282) foi um historiador, teólogo e estadista bizantino. Através das suas crónicas,
relatou alguns dos momentos mais importantes do Império Bizantino durante o século XIII. Os seus diversos
testemunhos podem ser consultados em: AKROPOLITES, George – George Akropolites: the history. Ed. Ruth
Macrides. Oxford: Oxford University Press, 2007.
99
Nicolas (ou Nicholas) Mesarites (1163-após 1216) foi um metropolita ortodoxo de Éfeso (estatuto similar ao
de arcebispo, embora na versão ortodoxa), sendo que nunca digeriu bem a queda de Constantinopla em 1204,
recusando qualquer subordinação ao clero latino. Não conseguimos aceder aos seus escritos originais, contudo
a sua versão dos acontecimentos é citada por: MANSILLA, Demetrio - El cardenal hispano Pelayo Gaitán (1206-
1230) in Anthologica Annua, p. 19-24.
100
MANSILLA, Demetrio - El cardenal hispano Pelayo Gaitán (1206-1230) in Anthologica Annua, p. 16-24.
101
MANSILLA, Demetrio - El cardenal hispano Pelayo Gaitán (1206-1230) in Anthologica Annua, p. 16-18.

24
culminando no saque de Constantinopla (12 a 15 de Abril de 1204) e na criação dum
Império Latino102.
Os gregos sentiam-se revoltados com estas ocorrências e repudiavam os novos
ocupantes latinos. Dentro deste contexto, procurarão expulsar os ocidentais, de forma
a reconstituir o Império Bizantino, entretanto desfeito. O seu principal líder era Teodoro
Láscaris que reivindicava ser o único imperador bizantino legítimo, desafiando assim
o soberano (agora latino) de Constantinopla – Henrique de Flandres (1206-1216).
Todavia, a pressão ameaçadora dos turcos seljúcidas fará com que Teodoro altere os
seus planos, procurando agora a paz com o Império Latino. Por seu turno, os latinos
não estavam predispostos a encetar negociações com o seu principal inimigo na
região. Assim sendo, Teodoro Láscaris apela, em último recurso, à intervenção do
Papa Inocêncio III que, por sua vez, se compromete a enviar um legado para restaurar
a paz, de forma a enfrentar eficazmente o adversário muçulmano103.
A escolha do Sumo Pontífice recairia então em Paio Galvão que tinha uma missão
tremendamente exigente e quase impossível de ser concretizada na perfeição. Com
o intuito de atingir os objectivos já enunciados, Paio encetará conversações com os
representantes dos dois partidos. As negociações serão longas, com avanços e
recuos, e nem sempre produzirão os resultados mais desejados.
No que diz respeito ao primeiro objectivo (instauração da paz entre gregos e latinos),
é provável que o cardeal-legado tenha desempenhado um papel influente e decisivo
que resultará no estabelecimento da paz entre as duas facções, formalizada em
1214104.
Todavia, Paio Galvão fracassaria nos restantes propósitos, falhando a unificação da
Igreja Grega e Latina e a imposição da primazia romana. Nestes dois pontos, os
gregos sempre manifestaram pouca vontade em fazer cedências, procurando assim
preservar a sua liberdade religiosa. Também os efeitos nefastos da Quarta Cruzada
eram ainda bem visíveis, cenário que concorreu inevitavelmente para este desfecho.
O legado pontifício entrou em diálogo com Nicolas Mesarites (arcebispo ortodoxo de
Éfeso) em Novembro de 1214. Contudo, as conversações não começariam da melhor
forma, tendo Mesarites demonstrado o seu desapontamento por ter sido alvo duma

102
RUNCIMAN, Steven – História das Cruzadas. 2º ed. Vol. III. Lisboa: Livros Horizonte, 1992, p. 91-107.
103
MANSILLA, Demetrio - El cardenal hispano Pelayo Gaitán (1206-1230) in Anthologica Annua, p. 17-18.
104
MANSILLA, Demetrio - El cardenal hispano Pelayo Gaitán (1206-1230) in Anthologica Annua, p. 18-19.

25
recepção pouco honrosa por parte daquele a quem o designa como bispo da diminuta
diocese de Albano105. As negociações acabariam com resultados praticamente nulos,
visto que os gregos desejavam permanecer fiéis ao seu patriarca e às suas
instituições.
Entretanto, rebentariam algumas rebeliões que tornariam o ambiente mais tenso,
dificultando ainda mais os intentos da embaixada enviada por Inocêncio III. Em jeito
de reacção, Paio Galvão teve que adoptar medidas mais drásticas, seguindo uma
postura mais dura que merecerá uma crítica severa por parte de George
Akropolites106. De acordo com este cronista grego, Paio terá ordenado a detenção de
alguns monges e padres ortodoxos bem como ameaçaria colocar em prática a pena
de morte. Estes procedimentos mais autoritários não surtiriam os efeitos desejados e
apenas gerariam mais ódios. A presença do cardeal-legado era vista como incómoda
pela população de Constantinopla (uma grande parte desta era ainda constituída por
gregos).
Assim sendo, os habitantes gregos desta enorme cidade dirigem-se imediatamente
ao imperador latino Henrique nos seguintes termos:

“Somos um povo de outra raça e temos um outro líder para a nossa igreja; nós
submetemo-nos ao vosso poder, podendo vós assenhorear-se dos nossos corpos,
mas não dos nossos corações e almas; enquanto nós devemos lutar em seu nome na
guerra, nós achamos impossível, no entanto, abandonar os nossos ritos e práticas
religiosas”107.

105
As negociações tiveram inicialmente lugar em Constantinopla. Nicolas Mesarites acusou Paio Galvão de, logo
no primeiro contacto, não ter saído do seu trono no preciso momento em que o referido arcebispo de Éfeso
tinha entrado na sala de reuniões. O cardeal retorquiu e tentou demonstrar a superioridade dos legados de Roma
sobre os restantes eclesiásticos, recordando que a cor púrpura e encarnada dos sapatos constituíam uma prova
inequívoca da autoridade cedida outrora pelo Imperador Constantino. Mesarites também mostrou o seu próprio
calçado, de feição similar, alegando que poderia utilizar o mesmo na qualidade de plenipotenciário do Imperador
Bizantino, mas que, como seguidor de Jesus Cristo, tinha a obrigação de ocultar o calçado e aparecer
humildemente como servo. Por outro lado, é de salientar que Teodoro Irenikos, Arcebispo grego de Niceia,
estava igualmente disposto a sabotar ou repudiar qualquer tipo de reconhecimento ou obediência ao primado
romano. Ou seja, do lado helénico, não havia grande flexibilidade para negociações nos temas de âmbito
religioso. MANSILLA, Demetrio - El cardenal hispano Pelayo Gaitán (1206-1230) in Anthologica Annua, p. 19-24.
106
MANSILLA, Demetrio - El cardenal hispano Pelayo Gaitán (1206-1230) in Anthologica Annua, p. 19-24.
107
AKROPOLITES, George – George Akropolites: the history, p. 154-156; SETTON, Kenneth M. – The Papacy and
the Levant (1204-1571). Vol. 1. Filadélfia: The American Philosophical Society, 1976, p. 42.

26
Temendo que a fidelidade do seu povo fosse colocada em causa, o soberano teve
que ceder às reivindicações, ordenando a libertação de padres e monges que tinham
sido detidos durante os momentos mais tensos108. Esta decisão imperial contrariava
as intenções do legado papal que estava agora impedido de conseguir os avanços
necessários.
Assim sendo, a missão de Paio Galvão em Constantinopla estava a chegar ao fim. Os
resultados obtidos, não sendo os melhores, foram os possíveis, tendo em conta a
conjuntura problemática que incidiu sobre esta primeira aventura do cardeal em
espaços orientais.

2- No Egipto, durante a 5ª Cruzada (1217-1221)

Alguns anos após ter estado em Constantinopla, Paio Galvão seria nomeado legado
pelo Papa Honório III para uma nova missão – a Quinta Cruzada (decorrida entre
1217-1221).
Os testemunhos existentes na época que referem, de forma directa ou indirecta, a
participação do cardeal neste movimento, são fornecidos pelo cronista germânico
Oliver de Paderborn109, pelos autores da Crónica de Ernoul110 e por alguns
historiadores muçulmanos111.

108
AKROPOLITES, George – George Akropolites: the history, p. 154-156; HENRIQUES, Pedro – Os Portugueses e
as Cruzadas. Séculos XII-XIV, p. 86, nota de rodapé nº 368.
109
Oliver de Paderborn (falecido em 1227) foi um eclesiástico germânico que teve inicialmente ligações ao
Arcebispado de Colónia. Chegaria a pregar a cruzada em inícios do século XIII, acabando por integrar, em 1217,
a Quinta Cruzada que decorreria no Egipto. Depois desta expedição, viria a ser bispo de Paderborn (eleição após
um período episcopal vacante, a qual viria a ser confirmada por Paio Galvão, apesar do cronista ter sido algo
crítico com algumas decisões tomadas pelo legado papal) e ainda cardeal da Igreja Católica. Veja-se: PADEBORN,
Oliver de – The Capture of Damietta in Christian Society and the Crusades, 1198-1229. Ed. Edward Peters. Trad.
Joseph Gavigan. Filadélfia: University of Pennsylvania Press, 1971. MANSILLA, Demetrio - El cardenal hispano
Pelayo Gaitán (1206-1230) in Anthologica Annua, p. 63.
110
Sobre a identidade de Ernoul, subsistem ainda muitas dúvidas, como já referimos anteriormente. Tem sido
apontado como um escudeiro de Balian de Ibelin, nobre que assumiu, sem sucesso, a missão de defesa de
Jerusalém perante a ofensiva de Saladino em 1187. Quanto a Bernardo, o segundo cronista, que terá completado
a crónica no século XIII, terá sido alegadamente tesoureiro na abadia de Corbie (França). (Chronique d'Ernoul et
de Bernard le Trésorier. Coord. M. L. de Mas Latrie. Paris: Libraria da Sociedade de História de França, 1871. Obra
digitalizada em: https://gallica.bnf.fr/ark:/12148/bpt6k29427p/f3.image, consultada em: 01-07-2020).
111
Nas crónicas árabes de Ibn al-Athîr e Ibn Wasil não encontramos qualquer expressão que mencione
directamente o nome de Paio Galvão, todavia existem referências sobre um legado papal que, muito
provavelmente, será o cardeal hispano-português. (GABRIELI, Francesco – Chroniques arabes des Croisades. 4º
Ed. Coord. Francesco Gabrieli. Trad. Viviana Pâques. Turim: Sindbad & Actes Sud, 1996, p. 282-292).

27
Por outro lado, também não podíamos descartar a utilização duma excelente fonte
secundária – o “Agiologo Lusitano dos Sanctos e Varoens Illustres em virtude do Reino
de Portugal, e suas conquistas” da autoria de George Cardoso112. Trata-se dum
extenso relato que chega a revelar uma pormenorização adequada das incidências
que rodearam este fenómeno.
No entanto, e com o intuito de compreendermos melhor a participação de Paio Galvão
na Quinta Cruzada, importa conhecer o devido contexto que envolverá este
empreendimento.
A queda do reino cristão de Jerusalém em 1187 às mãos do sultão Saladino
representou um duro golpe nas aspirações cristãs relativas ao Levante. De imediato,
foram lançadas a Terceira (1189-1192) e a Quarta Cruzadas (1202-1204) que, apesar
de um ou outro feito significativo, não conseguiram recuperar a Cidade Santa113.
Inocêncio III preparava, desde 1213, um novo movimento e, assim sendo, o concílio
de Latrão (realizado em 1215) mobilizará todo o Ocidente para visar a recuperação
da Terra Santa que era agora essencialmente dominada pelos muçulmanos. De
acordo com Alain Demurger, a campanha principal iria decorrer no Egipto, alvo que
seria encarado como a chave de Jerusalém114. Por outras palavras, os líderes cristãos
acreditavam que a conquista da Cidade Santa seria mais facilitada, caso se
apoderassem previamente do território egípcio, cujo sultão representava uma séria
ameaça às intenções dos estados latinos do Oriente115. Aliás, a dinastia aiúbida era,
desde 1187, responsável pela gestão e administração de Jerusalém.
Antes do início das hostilidades em terras faraónicas, os cruzados tinham já
participado em duas campanhas decorridas praticamente em simultâneo, embora em
cenários distintos. Em 18 de Outubro de 1217, as forças lideradas por Guilherme,
conde da Holanda, e Jorge, conde da Frísia, ajudaram as tropas portuguesas,
encabeçadas por Soeiro Viegas (bispo de Lisboa), a tomar finalmente a praça de

112
CARDOSO, George – Agiologo Lusitano dos Sanctos e Varoens Illustres em virtude do Reino de Portugal, e suas
conquistas. Tomo III, p. 483-486.
113
DEMURGER, Alan – La croisade au Moyen Âge. Paris: Éditions Nathan, 1998, p. 7-8.
114
DEMURGER, Alan – La croisade au Moyen Âge, p. 8.
115
CARDOSO, George – Agiologo Lusitano dos Sanctos e Varoens Illustres em virtude do Reino de Portugal, e suas
conquistas. Tomo III, p. 483-486; HARPUR, James – The Crusades. The two hundred years war. The clash between
the Cross and the Crescent in Middle East 1096-1291. Nova Iorque: The Rosen Publishing Group, 2008, p. 85-86.

28
Alcácer do Sal116. A outra expedição ocorreria na Palestina, tendo sido iniciada em
Novembro de 1217. Os contingentes cristãos chefiados então por João de Brienne,
rei de Jerusalém, apenas conquistaram a pequena cidade de Beisan, falhando a
captura da fortaleza muçulmana do Monte Tabor117.
Entretanto, os reis André II da Hungria e Hugo I do Chipre, apesar de terem tomado a
Cruz, não participariam na Cruzada do Egipto, tendo o primeiro decidido abandonar a
empresa, enquanto que, o segundo acabaria por falecer em Tripoli, isto nos inícios de
1218.
A Cruzada destinada ao Egipto seria então inicialmente comandada por João de
Brienne, rei nominal de Jerusalém118, e por Leopoldo VI, duque da Áustria119.
Dentro deste contexto, começam então a chegar as primeiras frotas cristãs ao Egipto,
durante o mês de Maio de 1218120. Segundo Ibn al-Athîr121, os cruzados
desembarcam em al-Giza face a Damieta que estava protegida pelo rio Nilo, sendo
que este constituía então o principal obstáculo físico que separava inicialmente os
francos de Damieta. Desde logo, começam as hostilidades contra esta cidade
estratégica que seria o primeiro alvo dos ocidentais no Egipto. Por seu turno, al-Kâmil
(filho do ainda sultão egípcio al-Adil) está com as suas tropas num acampamento
localizado em al-Adiliyya (próximo de Damieta), procurando prestar apoio militar à
urbe ameaçada pelos cristãos122. Durante os próximos meses, os combates travados
serão ferozes e impiedosos. Entretanto, os cruzados alcançam um importante

116
Crónica de Portugal de 1419. Ed. Adelino de Almeida Calado. Aveiro: Universidade de Aveiro, 1998, p. 106-
113; BRANDÃO, António – Monarquia Lusitana. Parte IV. Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 1974, p. 264
(verso)-267(verso). Contém ainda uma tradução da autoria do Dr. Santos Alves nas notas finais anexadas à obra.
117
HARPUR, James – The Crusades. The two hundred years war. The clash between the Cross and the Crescent in
Middle East 1096-1291, p. 85.
118
Nestes tempos, o que restava do reino cristão de Jerusalém resumia-se praticamente a São João de Acre, sua
capital, e a mais alguns bastiões. Todavia, não englobava a Cidade Santa que estava então nas mãos dos
muçulmanos. A Quinta Cruzada procuraria alterar esta realidade adversa, tentando devolver Jerusalém aos
cristãos.
119
PADEBORN, Oliver de – The Capture of Damietta in Christian Society and the Crusades, 1198-1229. Ed. Edward
Peters. Trad. Joseph Gavigan, p. 56 (veja-se também nesta página as notas de rodapé nº 1 e 2); HARPUR, James
– The Crusades. The two hundred years war. The clash between the Cross and the Crescent in Middle East 1096-
1291, p. 85-86.
120
PADEBORN, Oliver de – The Capture of Damietta in Christian Society and the Crusades, 1198-1229. Ed. Edward
Peters. Trad. Joseph Gavigan, p. 61-62; CARDOSO, George – Agiologo Lusitano dos Sanctos e Varoens Illustres em
virtude do Reino de Portugal, e suas conquistas. Tomo III, p. 483-486.
121
Ibn Athîr foi um historiador e cronista árabe que viveu entre 1160 e 1233. Estudou em Mossul, e chegou várias
vezes a visitar Bagdade, epicentro cultural do Oriente. Também viveria em Alepo e Damasco. (Veja-se:
https://www.britannica.com/biography/Ibn-al-Athir, consultado em 25-06-2020).
122
GABRIELI, Francesco – Chroniques arabes des Croisades. Cap. 18, p. 282-283.

29
progresso em 24 de Agosto de 1218, data da conquista duma torre fortemente
guarnecida que, apesar de se localizar numa ilhota, garantia, em grande parte, a
protecção exterior de Damieta. Praticamente em simultâneo, al-Adil, sultão do Egipto,
falece devido a uma crise cardíaca, desmoralizando ainda mais os combatentes
sarracenos que tentavam resistir ao assédio123. Todavia, a cidade de Damieta
permaneceria ainda nas mãos dos defensores.
Entretanto, no mês de Setembro, chega ao Egipto o exército do Papa, liderado por
Paio Galvão (também designado habitualmente pelo nome de Pelágio)124.
A sua chegada a terras faraónicas é reportada por Oliver de Paderborn125 e pela
crónica de Ernoul, sendo que esta última é digna da seguinte citação:

“[O Papa] enviou dois cardeais ao cerco de Damieta, o cardeal Robert que era inglês
e o cardeal Paio que era oriundo de “Portingal”. O cardeal Robert morreu, e Paio viveu,
o que foi uma grande pena porque ele fez muito mal126.”

Apesar da dura crítica efectuada por parte do autor deste testemunho documental
(que antecipa, desde já, o desfecho trágico da cruzada), a verdade é que Paio Galvão
procurou um fim glorioso para a causa cristã. O padre António Carvalho da Costa tenta
justificar a nomeação do cardeal-bispo de Albano para esta missão através das
seguintes palavras:

“Huma das cousas principaes, que o novo Papa Honorio Terceiro intentou fazer no
principio de seu governo, foy a conquista da Terra Santa de Jerusalém (…) e para
esta empreza nomeou por seu Legado Apostolico ao nosso cardeal Dom Payo, por
conhecer nelle hum desejo ardente de recuperar aquella Santa Cidade127.”

123
PADEBORN, Oliver de – The Capture of Damietta in Christian Society and the Crusades, 1198-1229. Ed. Edward
Peters. Trad. Joseph Gavigan, p. 63-68; GABRIELI, Francesco – Chroniques arabes des Croisades. Cap. 18, p. 284;
HARPUR, James – The Crusades. The two hundred years war. The clash between the Cross and the Crescent in
Middle East 1096-1291, p. 86; MAALOUF, Amin – As Cruzadas vistas pelos árabes. 15º ed. Trad. de G. Cascais
Franco. Lisboa: DIFEL, 2008, p. 263-264.
124
HENRIQUES, Pedro – Os Portugueses e as Cruzadas. Séculos XII-XIV, p. 88.
125
PADEBORN, Oliver de – The Capture of Damietta in Christian Society and the Crusades, 1198-1229. Ed. Edward
Peters. Trad. Joseph Gavigan, p. 68.
126
Chronique d’Ernoul et de Bernard Le Trésorier, p. 417. De facto, o cardeal inglês Robert de Courçon (ou
Courson) acabaria por falecer muito em breve, sobrando então Paio Galvão que assumiria um grande
protagonismo na referida campanha.
127
COSTA, António Carvalho da - Corografia Portugueza (…).Tomo 1. Livro 1. Tratado I. Cap. XVIII, p. 91.

30
Os planos de conquista do Egipto e de Jerusalém estavam incluídos entre as
prioridades da Santa Sé que tinha depositado, mais uma vez, a sua confiança neste
cardeal de origens ibéricas para enfrentar este tremendo desafio. Como representante
dos interesses pontifícios, Paio procuraria então dar continuidade aos últimos avanços
alcançados no cerco de Damieta. Todavia, a resistência levada a cabo pelos
sarracenos retardará o progresso dos cruzados em torno daquela urbe.
Como se não bastasse, surgiria uma terrível tempestade que causaria danos
irreparáveis no acampamento cristão. A ocorrência de inundações bem como a
difusão de surtos de peste constituíram as principais consequências deste cataclismo
que desmoralizou as hostes cruzadas128.
Assistindo a todas estas contrariedades, Paio Galvão recorreu à Misericórdia Divina,
mandando jejuar três dias e fazer públicas penitências para a aplacar [a
tempestade]129. Coincidência ou não, certo é que melhores tempos se avizinhariam
para o lado cristão…
Em Fevereiro de 1219, os cruzados conseguem reforçar as suas posições, montando
agora um cerco completo à cidade130. Este novo desenvolvimento deveu-se, em
muito, às desavenças vividas no acampamento muçulmano, tendo al-Kâmil (filho do
sultão recentemente falecido - al-Adil) que se retirar quando temia ser assassinado
por eventuais conspiradores que estariam no seu meio131. Os cruzados atravessam o
rio e chegam à sua margem oriental, logrando ocupar as posições que haviam sido
abandonadas pelo exército muçulmano e cortando assim todas as vias de
abastecimento da cidade. Além disso, as forças cristãs apoderam-se de vários bens
que os militares de al-Kâmil haviam deixado para trás, depois de uma retirada
intempestiva e descontrolada132.
A eventual conquista de Damieta por parte dos cristãos ganhava então contornos mais
evidentes, visto que a vantagem estava, mais do que nunca, do lado dos ocidentais.

128
HENRIQUES, Pedro – Os Portugueses e as Cruzadas. Séculos XII-XIV, p. 89.
129
CARDOSO, George – Agiologo Lusitano dos Sanctos e Varoens Illustres em virtude do Reino de Portugal, e suas
conquistas. Tomo III, p. 483-486.
130
HENRIQUES, Pedro – Os Portugueses e as Cruzadas. Séculos XII-XIV, p. 89.
131
GABRIELI, Francesco – Chroniques arabes des Croisades. Cap. 18, p. 284; PADEBORN, Oliver de – The Capture
of Damietta in Christian Society and the Crusades, 1198-1229. Ed. Edward Peters. Trad. Joseph Gavigan, p. 74;
Chronique d’Ernoul et de Bernard Le Trésorier, p. 419.
132
MAYER, Hans Eberhard – Historia de las Cruzadas. Trad. Jesús Espino Nuño. Madrid: ISTMO, 2001, p. 293-298.

31
No lado muçulmano, as sabotagens e intrigas internas haviam rebentado. O recém-
entronizado sultão al-Kâmil está disposto a planear uma fuga para o Iémen133, mas a
chegada do seu irmão al-Muazzam, então proveniente da Síria, acalmará os ânimos
e fará com que o emir conspirador al-Mâshtub seja expulso do Egipto, passando a
servir na Síria134.
Será neste preciso contexto que al-Kâmil irá oferecer uma saída diplomática aos
líderes cristãos da Quinta Cruzada. O sultão egípcio está disposto a devolver as terras
do antigo reino de Jerusalém (nomeadamente a tão ambicionada Cidade Santa)135,
embora excluindo a região da Transjordânia, e a pagar ainda uma compensação de
30 mil bizantinos (ou besantes). Em troca, os cruzados deveriam abandonar a invasão
do Egipto e aceitar uma duradoura trégua. Apesar de ligeiras modificações posteriores
(onde os muçulmanos chegaram a demonstrar a intenção de também devolver a Vera
Cruz), esta proposta seria apresentada num total de três vezes, no decurso deste
conflito militar136.
João de Brienne, rei (nominal) de Jerusalém, queria aceitar a proposta, contudo Paio
Galvão, enquanto responsável espiritual do empreendimento, recusaria qualquer
cedência, fazendo valer a sua posição. O legado papal seria apoiado pelas Ordens
Militares que alegavam ser praticamente impossível defender Jerusalém sem a
cedência da Transjordânia. Além disso, muitos insinuavam que a célebre relíquia da
Vera Cruz, apreendida na malograda batalha de Hattin, já estaria desaparecida137.
Entretanto, em Maio de 1219, o duque Leopoldo VI da Áustria que tinha até então
dado várias provas da sua valentia no palco de batalha teve que regressar à sua
pátria, apesar das insistências do cardeal Paio Galvão para que pudesse ficar. Mesmo
perante algum sentimento de desânimo, o legado papal não baixou os braços e
ordenou ataques violentos contra as muralhas de Damieta, no decurso dos meses de
Julho e Agosto. A guarnição da praça ainda consegue resistir, mas a realidade no

133
MAYER, Hans Eberhard – Historia de las Cruzadas, p. 298.
134
GABRIELI, Francesco – Chroniques arabes des Croisades. Cap. 18, p. 285.
135
Essas terras seriam as seguintes: Jerusalém (a Cidade Santa), Ascalona, Tiberíades, Sidon, Lataquia bem como
outras localidades tomadas nos tempos de Saladino. (GABRIELI, Francesco – Chroniques arabes des Croisades.
Cap. 18, p. 288).
136
MAYER, Hans Eberhard – Historia de las Cruzadas, p. 298-303. AYALA MARTÍNEZ, Carlos de – Las Cruzadas, p.
250-252.
137
MAYER, Hans Eberhard – Historia de las Cruzadas, p. 299.

32
interior deteriora-se. A fome e a doença instalam-se, e os produtos que já escasseiam
passarão a ter um valor inflacionado138.
Num certo momento, chegará igualmente ao Egipto uma das personalidades mais
marcantes da Idade Média – São Francisco de Assis (1182-1226), o célebre fundador
da Ordem Franciscana consagrada aos ideais de pobreza material, humildade e
devoção total. O cardeal Paio Galvão teve conhecimento da chegada deste homem
que não estava ali para subjugar o adversário através das armas, preferindo tentar a
conversão pelo dom da palavra. São Francisco de Assis que vinha acompanhado por
outro monge do seu movimento conseguiria pouco tempo depois uma audiência com
al-Kâmil, tentando a conversão deste sultão ao Cristianismo. O responsável aiúbida
recusou naturalmente a proposta de Francisco de Assis, mas admirou a sua coragem
e eloquência, tendo cedido a este uma autorização especial para que pudesse realizar
missões de pregação na Palestina e na Terra Santa139. No entanto, esta conversação
não teria qualquer impacto directo no rumo dos acontecimentos então observados no
Egipto, pelo que a batalha pela conquista de Damieta prosseguiria.
Agastada pelos sucessivos bombardeamentos, a guarnição da cidade já admite o
cenário de derrota. O mês de Outubro tinha sido já terrível em termos de confrontos.
Dentro deste contexto, no dia 5 de Novembro de 1219, os cruzados constataram que
alguns sectores das muralhas já se achavam livres, pelo que puderam finalmente
entrar na cidade, sendo que, desta feita, enfrentariam pouca resistência. A população
da cidade foi expulsa ou reduzida à escravatura, excepção feita às crianças que foram
baptizadas por Jacobo de Vitry, bispo de São João de Acre. A mesquita principal de
Damieta tornar-se-ia agora numa Igreja ou Catedral140. Não subsistem dúvidas de que
o mérito desta conquista é essencialmente de Paio Galvão visto que havia insistido
incondicionalmente na captura da cidade.
Por outro lado, as consequências são nefastas para al-Kâmil. Muitos egípcios
abandonam o seu país, receando o pior cenário. A descrença chega a alguns sectores
do exército, registando-se deserções. Contudo, o sultão procura reagir, intensificando

138
Por exemplo, um cão custava 30 dinares e uma vaca 800 dinares. O açúcar já era tão raro como as jóias.
(MAYER, Hans Eberhard – Historia de las Cruzadas, p. 298-299).
139
MAYER, Hans Eberhard – Historia de las Cruzadas, p. 299-300. AYALA MARTÍNEZ, Carlos de – Las Cruzadas, p.
250-252.
140
MAYER, Hans Eberhard – Historia de las Cruzadas, p. 300. PERRY, Guy - The Fifth Crusade in John of Brienne:
King of Jerusalem, Emperor of Constantinople, c.1175–1237. Cambridge: Cambridge University Press, 2013, p.
110.

33
a correspondência com os seus dois irmãos: al-Muazzam, senhor de Damasco, e al-
Ashraf, senhor de Jazira, da Arménia e de outras terras. Al-Kâmil exorta-os a
comparecerem com as suas forças. Após suprirem algumas rebeliões internas, ambos
os irmãos acabariam, mais tarde ou mais cedo, por aderir ao apelo de combater os
cruzados141. Enquanto esperava pela chegada destes reforços, al-Kâmil prepararia já
a defesa do Cairo, certificando-se de que os invasores teriam pela frente uma marcha
penosa na eventualidade de decidirem atacar a capital142.
Durante o ano de 1220 e o primeiro semestre de 1221, os cruzados estabeleceram-
se em Damieta, embora tenham concretizado algumas expedições punitivas na região
em redor. Sabemos que, numa dessas iniciativas, os cristãos tomaram a cidade de
Tinnis143. Todavia, as divergências rebentariam novamente no seio das facções
cruzadas. O rei nominal de Jerusalém, João de Brienne, e o legado apostólico, Paio
Galvão, estão outra vez no epicentro do conflito. João de Brienne reivindicaria a cidade
conquistada de Damieta para si e mandou até cunhar moedas que o apresentavam
como soberano da praça, contudo o cardeal repudiaria as suas ambições,
argumentando que a cidade pertencia ao comum dos cruzados, cuja representação
só poderia corresponder à Igreja. Sentindo-se desautorizado e desgostoso com este
episódio, João de Brienne embarcou de regresso a São João de Acre, deixando, ainda
que temporariamente, o Egipto144.
A morosidade e a indefinição do cenário militar durante cerca de um ano e meio
prejudicou ainda mais os almejos de coesão das hostes cristãs. Relatos de
enfrentamentos armados entre destacamentos de diversas nacionalidades
começaram a ser recorrentes, pelo que os contingentes tiveram de ser distribuídos de
forma separada pelos bairros de Damieta, de forma a reduzirem-se as escaramuças.
Paio Galvão sente-se isolado e tem dificuldades em assegurar o controlo dos
acontecimentos, embora ainda tenha o apoio de uma parte do exército. É o caso dos
combatentes italianos que tinham sido beneficiados na última repartição dos despojos
capturados145.

141
GABRIELI, Francesco – Chroniques arabes des Croisades. Cap. 18, p. 286-288.
142
MAYER, Hans Eberhard – Historia de las Cruzadas, p. 300.
143
HENRIQUES, Pedro – Os Portugueses e as Cruzadas. Séculos XII-XIV, p. 90.
144
MAYER, Hans Eberhard – Historia de las Cruzadas, p. 300.
145
MAYER, Hans Eberhard – Historia de las Cruzadas, p. 301.

34
Entretanto, os factores da superstição e das visões apocalípticas, bastante presentes
e enraizados na Época Medieval, imprimiriam um papel determinante no desenrolar
da expedição. Por conseguinte, ecoariam profecias que garantiam a vitória final dos
cristãos. Paio Galvão teve acesso aos textos das mesmas, durante a sua estadia em
Damieta, e até mandou utilizá-las para levantar o moral das tropas. A mais importante
e difundida de todas elas era a “Profecia de Hannan, fils de Isaac”, alegadamente
escrita por um médico e tradutor persa nestoriano que muitos julgavam ter vivido no
século IX. No entanto, e apesar da previsão efectivamente ter saído dos círculos
nestorianos, a verdade é que o texto havia sido escrito entre 1219 e 1220, ou seja, já
durante o processo de conquista de Damieta, embora esta cronologia real não fosse
do conhecimento comum. Assim sendo, e sem qualquer surpresa, a pseudo-profecia
mencionava a história exacta da tomada de Damieta pelos cristãos, descrevendo os
sucessos de um “homem delgado e grande”, características que poderiam ser
imputadas a Paio Galvão, o principal impulsionador desta acção bélica. Seria ainda
detalhado que, em breve, dois grandes reis viriam em socorro dos cristãos, de forma
a subjugar por completo o inimigo. Um desses soberanos poderia ser o imperador
germânico Frederico II que havia já tomado o voto de cruzada e que poderia chegar,
muito em breve, a terras faraónicas. O outro seria um “Rei David” ou um “Rei da
Abissínia” que conquistaria várias terras basilares aos muçulmanos no Oriente,
aludindo assim à lenda já conhecida do Preste João. Ambos os reis, tanto o
proveniente do Ocidente como o do Oriente, juntar-se-iam triunfalmente em
Jerusalém146.
Desconhecendo possivelmente a verdadeira datação da profecia (que era afinal do
seu tempo, e não do século IX!), Paio Galvão deixou influenciar-se por aqueles textos
e procurou que outros também acreditassem no seu teor. Ainda assim, e tratando-se
de um homem instruído, há uma pergunta que ficará sempre por responder – será que
o bispo-cardeal acreditava mesmo que lhe estava reservado profeticamente um
grande papel em prol da Cristandade, ou apenas dissimulou a sua crença nos seus
conteúdos, embora tenha considerado que os textos seriam fundamentais para
motivar um exército cada vez mais fragmentado e desorientado?!

146
AYALA MARTÍNEZ, Carlos de – Las Cruzadas, p. 250-252. MAYER, Hans Eberhard – Historia de las Cruzadas, p.
301.

35
A verdade é que Paio Galvão não irá esperar mais tempo, mesmo quando se
mentaliza de que o imperador germânico Frederico II147 não deverá vir acudi-lo em
breve. Ainda assim, o soberano tinha enviado em sua representação 500 cavaleiros
sob a liderança do duque Luís da Baviera. O cardeal Paio Galvão ordena, por
conseguinte, uma marcha pela rota rumo ao Cairo, uma decisão imprudente e
insensata que viria a custar caro às forças cristãs. Inequivocamente, os cruzados já
não dispunham de um exército de grande envergadura muito devido às baixas sofridas
e deserções. Pressionado pelo Papa, João de Brienne, rei (nominal) de Jerusalém,
regressou a Damieta a 7 de Julho de 1221, e tenta opor-se às determinações do
legado pontifício mas não consegue demovê-lo. Assim sendo, a 17 de Julho de 1221,
os cruzados iniciam o projecto ambicioso de conquista do restante território do
Egipto148.
O exército aiúbida estava agora mais unido e preparado para enfrentar esta nova
ofensiva. O sultão al-Kâmil já podia contar com o apoio dos seus irmãos al-Aschraf e
al-Muazzam. Além disso, os muçulmanos conhecem bem o rio Nilo (e os seus
caudais) e jogarão com isso a seu favor. Por conseguinte, os seus soldados irão abrir
os diques, inundando as posições cristãs e fazendo atolar várias das suas máquinas,
durante o mês de Agosto149. Desesperadamente, os cruzados tentam encontrar uma
saída que lhes permitisse a retirada daquele meio pantanoso (onde até a água e os
lamaçais limitavam os seus movimentos) e o regresso a Damieta, contudo as forças
aiúbidas conseguem cercá-los, lançando flechas e cargas que infernizariam as suas
defesas150. Resignados, os cristãos tiveram que pedir a rendição em finais de Agosto
de 1221. Os seus líderes, entre os quais, Paio Galvão e João de Brienne, tiveram que
aceitar uma trégua de oito anos e a devolução de Damieta às tropas aiúbidas, de
modo a garantirem a sua liberdade através de um salvo-conduto que lhes permitiria
sair daquele território. Como é lógico, a Cidade Santa de Jerusalém já não estaria

147
Como observaremos mais à frente, o imperador alemão só virá a ter um papel activo na Sexta Cruzada (1228-
1229), que culminará num tratado diplomático com al-Kâmil, sultão do Egipto, e que permitirá a devolução de
Jerusalém à Cristandade.
148
MAYER, Hans Eberhard – Historia de las Cruzadas, p. 301.
149
MAYER, Hans Eberhard – Historia de las Cruzadas, p. 302.
150
GABRIELI, Francesco – Chroniques arabes des Croisades. Cap. 18, p. 289.

36
incluída nas negociações, dado que os francos acabavam de ser derrotados, ficando
numa posição frágil e inglória151.
Paio Galvão, legado papal, João de Brienne, rei de Jerusalém (embora com um
estatuto mais nominal dado que a urbe sagrada não seria recuperada), Luís, duque
da Baviera, e mais 20 barões cristãos ficaram como garantias do acordo de rendição
e da devolução de Damieta, sendo depois libertados após o cumprimento das
cláusulas estipuladas152.
O rescaldo da Quinta Cruzada convergiria assim para um fiasco. A intransigência e a
presunção de Paio Galvão viriam a ser denunciadas por muitos dos seus detractores
que não lhe perdoariam a sua ingerência em questões militares e o facto de ter
recusado, por três vezes, as ofertas diplomáticas de al-Kâmil que estava disposto a
abdicar de Jerusalém. O trovador normando Guillaume Le Clerc escreveu mesmo o
seguinte na sua sátira “Le Besant de Dieu”:

“Perdemos a cidade por culpa de pecadores e insensatos, por culpa do legado que
mandava nos cristãos (…) pois certamente é contrário ao direito que os clérigos
mandem nos cavaleiros: o religioso deve recitar a sua Bíblia e os salmos, e deixar que
o cavaleiro vá para o campo de batalha153”.

Apesar do vendaval de críticas, Honório III não terá punido Paio Galvão pelo fracasso
da Quinta Cruzada, pelo menos, não encontrámos qualquer evidência nesse sentido
durante a nossa investigação. No entanto, o Sumo Pontífice terá procurado
responsabilizar Frederico II, imperador germânico, por não ter comparecido com o seu
exército como era expectável na altura154.

151
HENRIQUES, Pedro – Os Portugueses e as Cruzadas. Séculos XII-XIV, p. 92. MAYER, Hans Eberhard – Historia
de las Cruzadas, p. 302.
152
GABRIELI, Francesco – Chroniques arabes des Croisades. Cap. 18, p. 290-291.
153
Guillaume Le Clerc, poeta normando que viveu entre 1210 e 1238. Citado por: MAYER, Hans Eberhard –
Historia de las Cruzadas, p. 302-303.
154
MAYER, Hans Eberhard – Historia de las Cruzadas, p. 303.

37
Capítulo III - Últimos Anos

Apesar do desastre no Egipto, Paio Galvão não regressou imediatamente à Península


Itálica visto que seria ainda encarregue por parte da Santa Sé de resolver alguns
diferendos religiosos e políticos. O cardeal chegou, por exemplo, a solucionar um
litígio em São João de Acre entre o bispo (acompanhado do restante cabido) e os
hospitalários por causa dos dízimos e direitos paroquiais. Dentro deste contexto, foi
estabelecida uma concórdia em que os hospitalários poderiam predicar, administrar
sacramentos e receber legados, mas teriam ainda assim de pagar os dízimos ao bispo
pelas possessões disputadas. Por outro lado, houve igualmente um pleito entre o
Cabido da Igreja do Santo Sepulcro e os hospitalários de Tiro, tendo sido adjudicada
a cada uma das partes contenciosas a metade da terra que era objecto de
discussão155.
Durante a sua curta estadia em São João de Acre em 1222, o bispo-cardeal confirmou
a venda feita por D. Simón, Arcebispo de Tiro, ao Arcebispo de Nicósia, de um casal
(propriedade) chamado “Livada”, situado na ilha do Chipre. Naquela praça que era,
na altura, a capital real do fragmentado reino de Jerusalém156, Paio Galvão assistiu
igualmente à forte concorrência de pisanos e genoveses que disputavam
acerrimamente os seus interesses sobre a mesma. O cardeal procurou por confiar a
solução a uma terceira potência: os venezianos157.
No desenrolar da Quinta Cruzada, o legado papal ainda foi chamado a intervir no
conflito que rebentaria no Principado de Antioquia. Raymond Rupen (1196-1222), filho
de Raimundo IV de Trípoli (o qual por seu turno era o filho mais velho de Boemundo
III de Antioquia) e de Alice (sobrinha de Leon I, rei da Cilícia – Arménia Menor), e
Boemundo IV, conde de Trípoli, lutavam pelo poder no principado. O primeiro era
apoiado pelos hospitalários, enquanto o segundo era secundado pelos templários. O
Papa Honório III e Paio Galvão tomarão o partido de Raymond Rupen, o qual era visto
como um cruzado valente e fiel aos desígnios da Igreja. Em 1216, Raymond, com o

155
MANSILLA, Demetrio - El cardenal hispano Pelayo Gaitán (1206-1230) in Anthologica Annua, p. 46-47.
156
Após a perda de Jerusalém às mãos de Saladino em 1187, São João de Acre, reconquistada na Terceira
Cruzada, tornou-se na nova capital do Estado Cruzado. (http://fortalezas.org/?ct=fortaleza&id_fortaleza=1855,
Consultado em: 07/08/2020).
157
MANSILLA, Demetrio - El cardenal hispano Pelayo Gaitán (1206-1230) in Anthologica Annua, p. 46-47.

38
apoio do rei da Arménia – Leon I (Leão I), tornou-se mesmo príncipe de Antioquia.
Desde logo, o novo senhor procurará obter o reconhecimento e protecção papais.
Todavia, o relacionamento entre Raymond Rupen e o rei arménio, seu aliado, irá
azedar, dado que o príncipe de Antioquia ambicionava igualmente ser o herdeiro
legítimo do trono arménio, desejo que Leon I não queria satisfazer. Raymond irá
mesmo solicitar ao Papa para que, através do cardeal Paio Galvão, fosse coroado rei
da Arménia. Contudo, Honório III não se quis comprometer com esta reivindicação. A
verdade é que a evolução dos acontecimentos não iria favorecer o protegido da Santa
Sé. Em 1219, ocorre um grande levantamento em Antioquia, o que culminará na fuga
de Raymond Rupen, permitindo assim que o poder fosse agora assumido pelo seu
rival Boemundo IV. O príncipe deposto ainda tentará a sua reivindicação ao trono
arménio, mas será capturado pelo regente Constantino, tendo morrido na prisão
pouco tempo depois (talvez entre os anos de 1221-1222). Por seu turno, Boemundo
IV ao tornar-se senhor de Antioquia trouxe consigo um sentimento de rancor e
vingança, perseguindo os hospitalários que tinham apoiado Raymond Rupen. Vários
bens desta ordem religiosa-militar serão arrestados, tendo sido depois entregues aos
templários que seriam então recompensados pelo apoio a Boemundo IV. Foi o que
aconteceu com a vila de Giblet que deixou de ser administrada pelos hospitalários e
que passaria agora para o domínio dos templários. No meio de todo este enredo de
violência, Boemundo IV chegou a ser excomungado (com a pena a ser lançada pelo
cardeal Paio Galvão), contudo tal procedimento não travou a sua fúria. O legado e
bispo de Albano ainda tentou interceder, sugerindo a divisão equitativa de Giblet entre
hospitalários e templários, e incentivou a uma posição conciliadora e dialogante entre
ambas as ordens. Contudo, Boemundo IV voltaria à carga, chegando ao ponto de
tomar, de forma intempestiva, o castelo de Antioquia aos hospitalários, cujo direito
destes à fortaleza era reconhecida pelo próprio cardeal em nome da Igreja Romana158.
Em Outubro ou Novembro de 1222, Paio Galvão retorna a Roma, tendo
desembarcado previamente no porto de Brindisi (região da Apúlia). O contexto era
agora outro. A Santa Sé intensificava as negociações para que Frederico II, imperador
germânico, cumprisse o voto de cruzada e marchasse em direcção à Terra Santa.

158
Sobre a disputa política e militar interna do Principado de Antioquia, consulte-se: MACEVITT, Christopher –
Raymond-Rupen of Antioch [d.1222] in The Crusades: an Encyclopedia. Ed. Alan Murray. Vol IV, Santa Barbara:
ABC-CLIO, 2006, p. 1011. MANSILLA, Demetrio - El cardenal hispano Pelayo Gaitán (1206-1230) in Anthologica
Annua, p. 47-50.

39
Organizaram-se inclusivamente preparativos para uma reunião em Verona, ainda no
final do ano de 1222, que juntaria as principais personalidades políticas e religiosas
da Cristandade, porém a assembleia prevista só se realizaria dois anos e meio depois,
entre os dias 22 e 25 de Julho de 1225, na cidade de San Germano (hoje conhecida
como cidade de Cassino). Nesta iniciativa, estaria igualmente presente o cardeal e
bispo de Albano, D. Paio Galvão, acompanhado de outras figuras eminentes da Igreja.
De acordo com o tratado firmado, o imperador germânico Frederico II comprometeu-
se a cumprir o seu voto de cruzada, dentro de um prazo de dois anos, o qual expiraria
em Agosto de 1227. Frederico ficava obrigado a sustentar financeiramente mil
cruzados na Palestina durante dois anos e a enviar entretanto dois mil soldados e uma
considerável quantidade de dinheiro. Por causa de ter demorado a cumprir a
promessa dentro do tempo estabelecido, Frederico II foi excomungado pelo novo
Papa Gregório IX159, em 10 de Outubro de 1227. O novo sumo pontífice era menos
condescendente face ao seu antecessor, tendo o soberano alemão agilizado a
expedição rumo ao Oriente, mesmo com as divergências já evidentes com a Santa
Sé160. Por outro lado, é provável que o Imperador procurasse um êxito no Oriente, de
forma a aumentar o seu prestígio e poder no Ocidente, competindo assim com os
desígnios universais da Igreja que não tinha autorizado a sua expedição após a
excomunhão161.
Dentro deste contexto, foi colocada em prática a Sexta Cruzada (1228-1229),
empreendimento que curiosamente não proporcionaria qualquer batalha entre
cristãos e muçulmanos, dado que Frederico II, Sacro Imperador Romano-Germânico,
soube tirar partido da aproximação política e diplomática relativamente ao sultão
egípcio al-Kâmil, com o qual soube trocar correspondência e dialogar de forma
amistosa. A imensa capacidade cultural de Frederico II, o qual sabia falar muitos
idiomas e se interessava bastante pela filosofia, ciência e música, surpreendeu pela
positiva os responsáveis muçulmanos. Al-Kâmil que já estivera disposto a ceder
Jerusalém no decurso da Quinta Cruzada (quando os acontecimentos não favoreciam

159
O Papa Gregório IX (Ugolini de Segni) foi eleito Papa em 19 de Março de 1227. No âmbito desse procedimento,
Paio Galvão tinha já assumido o posto de decano do Colégio dos Cardeais (isto é, presidiu a esta sonante
estrutura), durante o conclave. (Sobre este ponto em concreto, veja-se: https://peoplepill.com/people/pelagio-
galvani/, Consultado em: 07/08/2020).
160
MANSILLA, Demetrio - El cardenal hispano Pelayo Gaitán (1206-1230) in Anthologica Annua, p. 51-52.
161
MAYER, Hans Eberhard – Historia de las Cruzadas, p. 312-313.

40
as suas intenções), irá agora chegar a um acordo com o imperador germânico. O novo
tratado firmado assegurou a devolução de localidades santas para os cristãos,
nomeadamente Jerusalém, Belém e Nazaré. Por seu turno, Frederico jurou respeitar
a liberdade de culto desses lugares que seria permitida tanto a cristãos como a
muçulmanos, e firmou uma trégua de dez anos com o sultão162.
Todavia, o êxito da Sexta Cruzada não se traduziu na resolução do diferendo
verificado entre a Santa Sé e Frederico II. Pelo contrário, a excomunhão seria
renovada em contornos pouco elucidativos163. Roma provavelmente havia
considerado como uma provocação o facto daquele soberano ter partido para o
Oriente sem a bênção e a autorização pontifícias, lamentando ainda que a campanha
não tenha atendido aos moldes da Guerra Santa164.
Como consequência inevitável, a Santa Sé e o Império Sacro Romano Germânico
voltaram a experienciar um período conflituoso. A guerra era uma questão de pouco
tempo. Três exércitos papais seriam constituídos, sendo um deles confiado
directamente ao cardeal Paio Galvão. Estes destacamentos seriam incumbidos de
combaterem, no sul de Itália, os grupos ou contingentes partidários do Imperador. As
tropas pontifícias seriam inicialmente bem-sucedidas, conseguindo avanços
relevantes nos meses de Março e Abril de 1229. No entanto, o regresso do Imperador
Frederico II, em Junho de 1229, depois da sua estadia na Palestina, mudaria os
acontecimentos. O exército imperial, agora reforçado e totalmente focado na
campanha, irá começar a causar sérios retrocessos às tropas que representavam os
desígnios do Papa Gregório IX165.
Paio Galvão teve mesmo que se refugiar em Monte Cassino, onde obteve guarida e
protecção no dito mosteiro beneditino ali localizado. Por sua vez, a Santa Sé não teve
outra hipótese senão tentar um acordo com Frederico II, de modo a colocar um ponto
final num conflito marcado por muitos abusos e actos de violência cometidos por

162
AYALA MARTÍNEZ, Carlos de – Las Cruzadas, p. 258-259. MAYER, Hans Eberhard – Historia de las Cruzadas, p.
313-315. MAALOUF, Amin – As Cruzadas vistas pelos Árabes. 15ª ed. Trad. G. Cascais Franco. Lisboa: DIFEL, 2008,
p. 267-270.
163
MANSILLA, Demetrio - El cardenal hispano Pelayo Gaitán (1206-1230) in Anthologica Annua, p. 52.
164
O Papa e o Patriarca de Jerusalém condenaram o acordo feito com os muçulmanos. Frederico II coroou-se a
si mesmo como rei de Jerusalém, numa cerimónia que foi rodeada de muita polémica. MAYER, Hans Eberhard –
Historia de las Cruzadas, p. 315-317.
165
MANSILLA, Demetrio - El cardenal hispano Pelayo Gaitán (1206-1230) in Anthologica Annua, p. 52.

41
ambas as partes. As negociações de paz iniciaram-se em Novembro de 1229 e
culminarão numa trégua, embora frágil, firmada em 23 de Julho de 1230166.
O cardeal e outros refugiados em Monte Cassino chegariam a obter, durante as
conversações (ainda antes do acordo final), o perdão do Imperador, contudo Paio
Galvão já não sairia dali, tendo falecido, no dia 30 de Janeiro de 1230, naquele célebre
cenóbio fundado outrora por Bento de Núrsia (480-543). Terá sido igualmente
sepultado no mosteiro167.

166
MANSILLA, Demetrio - El cardenal hispano Pelayo Gaitán (1206-1230) in Anthologica Annua, p. 52-53.
167
MANSILLA, Demetrio - El cardenal hispano Pelayo Gaitán (1206-1230) in Anthologica Annua, p. 52-53.

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Conclusão

Paio Galvão ou Pelayo Gaitán (1165-1230) foi inequivocamente uma das


personalidades mais poderosas e influentes do seu tempo. Foi homem de confiança
dos Papas Inocêncio III, Honório III e Gregório IX, e o seu campo de actuação foi
abrangente, tendo chegado a quase toda a Cristandade. Neste estudo, pretendíamos
realizar um esboço biográfico, tarefa que não se antevia como acessível, muito devido
à problemática relacionada com as suas origens.
É necessário ter em conta que, naqueles tempos recuados, ser designado “espanhol”
era o mesmo que ser ibérico ou hispânico. A Espanha ainda não existia como entidade
política unificada, e encontrava-se assim dividida por vários reinos. Qualquer
personalidade que surgisse designada na documentação medieval como “espanhol”
poderia ser portuguesa, leonesa, aragonesa, castelhana… Além disso, naqueles
tempos, o assunto das origens específicas em torno das personalidades de cada um
destes reinos cristãos não era encarado da mesma forma relevante como é hoje e,
por conseguinte, devemos aceitar como naturais as omissões.
Efectivamente, ninguém pode determinar, com a precisão necessária, o local de
nascimento e o início da carreira religiosa do futuro cardeal de Santa Lúcia e bispo de
Albano. Assim sendo, Paio Galvão poderá ter nascido no reino de Portugal tal como
poderia ser oriundo do reino vizinho de Leão. A favor da naturalidade portuguesa,
parece-nos que a Crónica de Ernoul, redigida numa cronologia próxima ou até mesmo
contemporânea ao cardeal, é a fonte que mais alimenta as suas origens lusas. O
melhor argumento da teoria leonesa prende-se com o facto de ter três sobrinhos
destacados em dioceses ou entidades eclesiásticas leonesas.
Curiosamente, a Catedral de León e o Mosteiro de São Vicente de Fora de Lisboa
reivindicam o seu registo de óbito. O primeiro alude-nos à importância do cardeal que
ali atribuiu constituições capitulares, enquanto o segundo, embora já numa publicação
posterior (apesar de acreditarmos que se baseava em registos anteriores), associa o
cardeal ao Mosteiro de Santa Marinha da Costa em Guimarães.
No entanto, a verdade é que até ao ano de 1204 não sabemos praticamente nada
sobre o percurso de Paio Galvão, isto se tivermos em conta a documentação dos
séculos XII e XIII. Sabemos sim certamente a partir do momento em que se tornou

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vice-chanceler da Santa Sé (1204), cardeal de Santa Lúcia (1206), bispo de Albano
(1213) e legado papal em diversas missões.
Independentemente das suas origens (e neste ponto, constatamos que há um
potencial enorme para aflorar várias teorias ou hipóteses168), a verdade é que este
cardeal teve um papel fundamental em resolver diferendos religiosos nos reinos de
Portugal e Leão, e favoreceu os desígnios das suas coroas junto da Santa Sé. Daí a
designação do título deste estudo – “Paio Galvão: Um Cardeal, Dois Reinos”.
Auditor em vários casos, Paio Galvão parece que, no prisma interno, soube mediar as
querelas eclesiásticas, procurando adoptar decisões salomónicas. Nesta vertente,
parece ter sido, no geral, bem-sucedido e daí os sucessivos pontífices confiarem
permanentemente nas suas decisões.
O mesmo não podemos dizer das legações que rumaram ao exterior, mas a verdade
é que todas elas eram, à partida, inglórias e praticamente impossíveis de concretizar.
A primeira, ocorrida em Bizâncio (1213-1215), assentava na utopia de que era
possível unir as Igrejas de Roma e do Oriente, depois de uma Quarta Cruzada que
deixou feridas profundas e insanáveis. A segunda, a Quinta Cruzada desenrolada no
Egipto (1217-1221), e não obstante alguma prepotência do cardeal que poderia ter
aceite a proposta generosa de al-Kâmil e que não o fez (talvez influenciado por
directivas de Roma que não autorizavam qualquer negociação com o lado
muçulmano), a verdade é que as forças cristãs foram logo acometidas por divisões e
deserções, situação que foi agravada com o passar do tempo e que ainda se
deteriorou com o imperador germânico Frederico II a não intervir prontamente no
empreendimento como era aguardado. A terceira legação (1229-1230) envolveu uma
contenda acérrima entre o Papa Gregório IX e Frederico II, sendo que o cardeal liderou
um dos exércitos papais, contudo quando o imperador regressou depois da Sexta
Cruzada, reuniu as suas poderosas tropas, contra as quais o cardeal e bispo de

168
Algumas interrogações ou hipóteses que podem ser colocadas: Pertenceria Paio Galvão a uma família
importante com ligações íntimas aos dois reinos? Terá nascido em solo português (com, pelo menos, um dos
seus progenitores a ser também português) enquanto outros dos seus familiares eram leoneses? Ou seria
proveniente de uma família que inicialmente localizada em Portugal depois se mudou para Leão, onde
sobressairiam mais tarde os seus sobrinhos bem colocados na estrutura clerical? Ou seria leonês e teria iniciado
a sua carreira eclesiástica em Portugal? Ou será que sempre estivera apenas no reino de Leão antes de almejar
o topo da carreira em inícios do século XIII? Em suma, Paio Galvão poderá ser português (Guimarães?) ou leonês
(Gusendos de León?).

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Albano pouco podia fazer, tendo mesmo que se refugiar em Monte Cassino, onde viria
a falecer.
Em suma, uma carreira pautada por inúmeros momentos marcantes e intensos em
que o mérito e o conhecimento ímpar da personalidade estudada não podem ser
escamoteados, mesmo quando alguns dos seus desafios foram sentenciados com
dissabores. O cardeal ficaria assim para a história como um dos vultos sonantes do
seu tempo.

45
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