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Justiça Eleitoral

PJe - Processo Judicial Eletrônico

03/08/2021

Número: 0600482-53.2020.6.12.0001
Classe: AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL
Órgão julgador: 001ª ZONA ELEITORAL DE AMAMBAI MS
Última distribuição : 03/12/2020
Valor da causa: R$ 0,00
Assuntos: Abuso - De Poder Político/Autoridade
Segredo de justiça? NÃO
Justiça gratuita? NÃO
Pedido de liminar ou antecipação de tutela? NÃO
Partes Procurador/Terceiro vinculado
MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DO MATO GROSSO DO
SUL (AUTOR)
EDINALDO LUIZ DE MELO BANDEIRA (REPRESENTADO) ARY RAGHIANT NETO (ADVOGADO)
LUIZ ALBERTO FONSECA (ADVOGADO)
TEOFILO OTTONI ALVES KNOELLER (ADVOGADO)
MAITE NASCIMENTO LIMA (ADVOGADO)
LUCIA MARIA TORRES FARIAS (ADVOGADO)
MARCIO ANTONIO TORRES FILHO (ADVOGADO)
RODRIGO SELHORST (REPRESENTADO) ARY RAGHIANT NETO (ADVOGADO)
LUIZ ALBERTO FONSECA (ADVOGADO)
JAURO BITTENCOURT MORETTO (REPRESENTADO) LUIZ ALBERTO FONSECA (ADVOGADO)
ARY RAGHIANT NETO (ADVOGADO)
PROMOTOR ELEITORAL DO ESTADO DO MATO GROSSO
DO SUL (FISCAL DA LEI)
Documentos
Id. Data da Documento Tipo
Assinatura
80494 07/07/2021 12:46 Sentença Sentença
076
TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DE MATO GROSSO DO SUL
CARTÓRIO DA 001ª ZONA ELEITORAL DE AMAMBAI MS

AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL n.º 0600482-53.2020.6.12.0001


AUTOR: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL
REPRESENTADO: EDINALDO LUIZ DE MELO BANDEIRA, RODRIGO SELHORST, JAURO
BITTENCOURT MORETTO
Advogados do(a) REPRESENTADO: LUIZ ALBERTO FONSECA - MS14013, TEOFILO OTTONI
ALVES KNOELLER - MS23390, MAITE NASCIMENTO LIMA - MS22855, LUCIA MARIA
TORRES FARIAS - MS8109, MARCIO ANTONIO TORRES FILHO - MS7146, ARY RAGHIANT
NETO - MS5449
Advogados do(a) REPRESENTADO: LUIZ ALBERTO FONSECA - MS14013, ARY RAGHIANT
NETO - MS5449
Advogados do(a) REPRESENTADO: LUIZ ALBERTO FONSECA - MS14013, ARY RAGHIANT
NETO - MS5449

Vistos.
O MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL aforou ação de investigação judicial eleitoral em face de
EDINALDO LUIZ DE MELO BANDEIRA, RODRIGO SELHORST e JAURO BITTENCOURT
MORRETO, todos qualificados, alegando que, no ano eleitoral de 2020, o último representado,
em prol da candidatura dos dois primeiros, promoveu a distribuição gratuita de imóveis públicos
(lotes), tendo enviado à Câmara Municipal de Amambai um número significativo e
desproporcional de projetos de lei objetivando a distribuição de diversos terrenos, tendo sido os
projetos aprovados com celeridade ímpar, em regime de urgência. Dos 16 beneficiários
mencionados na petição inicial, dois imóveis foram efetivamente doados, no ano de 2020. em 22
de junho de 2020, fora lavrada escritura pública de doação de imóvel em favor da Igreja Deus é
Amor. Em 10 de janeiro de 2020, fora lavrada escritura pública de doação de imóvel à Igreja
Ministério Reino da Glória. As doações foram realizadas sem licitação ou procedimento de
dispensa. Os representados descumpriram a Recomendação de n. 001/2017/1ªPJAMB, expedida
nos autos do Inquérito Civil de n 11/2016, sobre a qual já tinham ciência. Não houve critérios
objetivos para as doações. Mario Edson Ricardo da Silva recebeu a promessa de doação de um
terreno no ano seguinte. Também foi doado um imóvel para a Igreja Ministério Evangélico
Saciando na Palavra. Muitos terrenos doados foram adquiridos de forma onerosa, mediante
desapropriação ou destinados ao Município para instalação de estruturas urbanas em
loteamentos. Foram adquiridos 1.390 estojos em madeira de marfim, com caneta de marfim, com
gravação a laser do nome de servidores municipais ativos, que foram distribuídos como presentes
aos servidores, em nome do representado Edinaldo, mediante entrega pelo representado Jauro.
Os materiais foram adquiridos pelo valor de R$ 69.500,00. Foram publicados agradecimentos ao
Prefeito Municipal em rede social. Eles praticaram conduta vedada prevista no art. 73, §10, da Lei
n. 9.504/97 e abuso de poder político e de autoridade. Pede que o reconhecimento da prática de
condutas vedadas e de abuso do poder político a fim de que aos representados sejam aplicadas
as sanções de multa, cassação do registro ou do diploma, inelegibilidade para as eleições que se
realizarem nos 8 anos subsequentes.
Notificados, os investigados contestaram e pugnaram pela improcedência, alegando que não
houve “caráter eleitoreiro” no proceder, tampouco intenção de prejudicar a liberdade do voto.
Praticaram atos legítimos de gestão, que não podem parar durante o pleito. A maior parte dos
atos normativos foram publicados em 2019. Houve exigência de contrapartida e condições,

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inclusive com cláusula de reversão. Os beneficiários não são eleitores e sim pessoas jurídicas.
Houve aprovação da Câmara Municipal no ano anterior ao pleito. Dos 16 atos questionados, em
apenas dois houve a entrega efetiva da escritura. Quanto à distribuição de canetas, também não
há qualquer irregularidade porque não há qualquer relação com a candidatura dos investigados.
As canetas são materiais de consumo, são de pequeno valor e o brasão do município fora
inserido para reforçar a publicidade institucional. A fixação de penalidade deve respeitar os
princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Juntam documentos.
Na instrução, foram ouvidas dez testemunhas e cinco informantes.
As partes apresentaram alegações finais, em síntese, ratificando as manifestações anteriores.
É o breve relatório. Decido.
A parte autora imputa às partes rés a suposta prática das seguintes condutas: a doação de
imóveis de forma irregular e a distribuição de canetas personalizadas a servidores públicos
municipais, ambos com o objetivo de se beneficiarem na eleição, em desconformidade com a
legislação de regência.
As imputações supostamente caracterizam abuso do poder político em razão da prática de
conduta vedada, prevista no §10 do art. 73 da Lei n. 9.504/97.
E por poder político, entenda-se, segundo Gomes:

“A palavra político deriva de polis, que significa cidade, Estado. O poder político,
consequentemente, refere-se ao poder estatal. Dada sua natureza, o Estado fala, ouve, vê e age
por intermédio de seus agentes ou presentantes, que, naturalmente, ocupam posições
destacadas na comunidade, porquanto suas atividades terminam por beneficiá-la direta ou
indiretamente. Deveras, a ação administrativa sempre carreia vantagens a considerável número
de pessoas, sobretudo quando são realizadas relevantes obras públicas ou implantadas e
desenvolvidas políticas públicas de largo alcance social.” (GOMES, José Jairo. Direito Eleitoral.
São Paulo: Atlas, 2013. p. 192)

O abuso estará caracterizado toda vez que a atuação do Poder Público estiver voltada para
atender fins outros, ilegítimos, e não o interesse público e/ou bem comum, sendo que, na seara
eleitoral, objetivar interferir no pleito.
Gomes arremata que:

“É intuitivo que a máquina administrativa não possa ser colocada a serviço de candidaturas no
processo eleitoral, já que isso desvirtuaria completamente a ação estatal, além de desequilibrar o
pleito – ferindo de morte a isonomia que deve permear as campnhas e imperar entre os
candidatos – e fustigar o princípio republicano, que repudia tratamento privilegiado a pessoas ou
classes sociais.” (p. 248)

Passo à análise das imputações.


Da doação de imóveis
A doação de imóveis está suficientemente comprovada pela farta prova documental que instrui a
petição inicial, especialmente as leis municipais que autorizam a doação, de iniciativa do Poder
Executivo – do investigado Edinaldo Luiz de Melo Bandeira –, as matrículas de n. 25.614, 18.981
e 24.632, e as escrituras públicas de f. 292-7 e 608-13.
Aliás, as doações foram admitidas pelos investigados. Mas, eles argumentam que não houve
“finalidade eleitoreira”, tanto que foram efetivadas no ano de 2019, e que a prática é comum na
localidade, o que, de fato, também está evidenciado de acordo com os elementos probatórios.
A prova oral também confirma a famigerada doação de imóveis. Vejamos.
A testemunha Ronaldo Carvalho Lopes disse que é pastor e solicitou um imóvel à Câmara
Municipal para utilizar em seu mister religioso. O projeto foi aprovado e foi chamado na casa de
leis para esclarecer a finalidade de uso do imóvel. Começou a construir no imóvel em meados de
maio/2020, mas tomou posse do imóvel antes. Nunca recebeu nenhuma visita do prefeito para
tratar sobre a doação do imóvel.

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O informante Caio Fachi disse que é Procurador-Geral do Município desde 2013. As doações de
imóveis para instituições sem fins lucrativos são recorrentes no Município desde sua
emancipação. Já há modelos prontos de projeto de lei. Há cláusulas de reversibilidade. Não é
feito o procedimento de dispensa de licitação, mas os documentos exigidos são os mesmos.
A testemunha Aldo Marcos Gregol disse que é diretor de patrimônio público. Há procedimentos
específicos para a doação de imóveis a depender se o donatário é pessoa jurídica com ou sem
fins lucrativos. Para as últimas, há doação direta, com cláusula de reversibilidade. Esta prática é
comum desde as gestões anteriores. Houve melhoria na inserção das cláusulas de reversão e na
exigência de documentação. Alguns imóveis foram adquiridos de forma onerosa pelo Município.
Os projetos de lei para a doação dos imóveis são de iniciativa do prefeito. Todas as doações têm
contrapartida dos donatários, quais sejam, a construção da sede e a finalidade social. Já fez a
reversão de algumas áreas.
Pelo que consta dos autos, as doações de imóveis são realizadas ao arrepio da Lei n. 8.666/93,
uma vez que não há procedimento licitatório, tampouco de dispensa.
E de fato, o proceder ilegal, per si, ainda que reprovável, não tem o condão de provar o abuso de
poder político para fins de investigação eleitoral. É imprescindível que:

“o abuso de poder seja hábil a comprometer a normalidade e a legitimidade das eleições, pois
são esses os bens jurídicos tutelados pela ação em apreço. Deve ostentar, em suma, aptidão ou
potencialidade de lesar a higidez do processo eleitoral. Por isso mesmo, há mister que as
circunstâncias do evento considerado sejam graves (LC n. 64/90, art. 22, XVI), o que não significa
devam necessariamente alterar o resultado das eleições. (…) Nessa perspectiva, ganha relevo a
relação de causalidade entre o fato imputado e a falta de higidez, anormalidade ou desequilíbrio
do pleito, impondo a presença de liame objetivo entre tais eventos. Todavia, não se faz
necessário – até porque, na prática, isso não seria possível – provar que o abuso influenciou
concretamente os eleitores, a ponto de levá-los a votar efetivamente no candidato beneficiado.
Basta que se demonstre a provável influência na consciência e vontade dos cidadãos. (GOMES,
p. 510)

Pois bem. Pelo menos três doações (matrículas de n. 25.614, 18.981 e 24.632) foram
perfectibilizadas no ano eleitoral, 2020, subsumindo-se perfeitamente à vedação constante do
§10 do art. 73 da Lei n. 9.504/97.
O objetivo da referida vedação legal é assegurar a igualdade de condições entre os(a)
candidatos(a) durante o pleito.
A caracterização não é tão simples porque o funcionamento da máquina administrativa não pode
parar em razão das eleições. Mas, também não se pode olvidar que a administração pública
somente pode fazer o que a lei expressamente autoriza ou determina (legalidade estrita).
E, no caso, conforme já dito alhures, o proceder dos réus, no particular, foi ilegal. E mais, eles
sabiam da vedação de proibição de distribuição de bens em ano eleitoral.
A alegação de que a exigência de contraprestação do(a) donatário(a) afasta a gratuidade da
doação e, por conseguinte, a finalidade “eleitoreira” não merece guarida. Isso porque, uma vez
perfectibilizada a doação irregular em período eleitoral, o bem jurídico tutelado pela norma já
estaria vulnerado, independente de eventual reversão ulterior.
É certo que nem todas as autorizações legislativas para a doação de imóveis foram levadas a
efeito por registro público no ano eleitoral, o que não constitui justificativa bastante para afastar a
ilegalidade do proceder, uma vez que para caracterizar o abuso do poder político “os fatos
debatidos na demanda tanto podem ter ocorrido antes como depois do início do processo
eleitoral”. (GOMES, p. 511). E o calendário eleitoral é previamente conhecido por todos.
Desse modo, suficientemente provada a doação ilegal de imóveis, o acolhimento do pleito autoral
é medida que se impõe.
Da distribuição de canetas
Em relação à famigerada distribuição de canetas personalizadas a servidores públicos
municipais, também está suficientemente comprovada a prática.

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A testemunha Sérgio Oliveira Nunes disse que recebeu uma caneta de presente da prefeitura.
Quem lhe entregou foi o prefeito. O expediente já havia encerrado. Foi rápido e estava sozinho.
Nada lhe foi dito na ocasião, tampouco solicitada qualquer coisa. Utiliza a caneta para trabalhar e
faz uso do objeto diariamente.
A testemunha Vilmar Rodrigues Cubas disse que foi secretário municipal por dois anos. Recebeu
da prefeitura uma caneta em data próxima a seu aniversário.
A testemunha Manoel Cubas Filho disse que é servidor público municipal há 31 anos, na função
de vigia. Recebeu uma caneta de presente da prefeitura, em data que não se recorda, mas
próxima ao seu aniversário. A caneta lhe fora entregue por Jauro. Nada lhe foi dito. Levou a
caneta para a casa. Seu filho Vilmar foi secretário municipal e atualmente exerce outra função.
A testemunha Geverson Vicentim disse que tomou conhecimento em uma rede social sobre a
doação de canetas para servidores públicos. Solicitou informações sobre a licitação e constatou
que estava formalmente correta, acompanhada da resposta de que as canetas seriam para uso
contínuo. Não sabe se as canetas eram para brindes ou uso contínuo. Não conhece nenhum dos
beneficiários.
A testemunha Claudinei Duarte de Almeida disse que é gari da prefeitura. Recebeu uma caneta
de presente de aniversário da prefeitura. Foi o prefeito quem fez a entrega. Faz aniversário em
janeiro e recebeu a caneta um pouco depois, entre fevereiro e abril. Nunca havia recebido
nenhum presente de aniversário da prefeitura. Sentiu-se valorizado. Recebeu do próprio prefeito.
Havia outras pessoas recebendo o brinde.
A testemunha Sulmara Aparecida Giacomete Alves disse que é servidora pública municipal e
recebeu uma caneta personalizada da prefeitura em março/2020. Soube que era em razão de seu
aniversário, que havia sido em fevereiro. A caneta lhe foi entregue por Jauro, em nome do
prefeito. Assinou o recebimento da caneta. Foi um presente pessoal para levar para casa. Deixa a
caneta em casa como decoração porque é um objeto muito bonito. Usa apenas quando
necessário. Fez a postagem porque nunca havia ganho nada da prefeitura em seu aniversário.
Sentiu-se feliz e grata por ter ganho.
A informante Thaynara Nogueira disse que recebeu uma caneta da prefeitura, que lhe fora
entregue por uma servidora da secretaria de gestão. A caneta lhe fora entregue como material de
expediente. Utiliza a caneta no trabalho. Faz aniversário em julho e recebeu a caneta no início de
abril. Já viu alguns colegas com a caneta na mesa. Nunca viu o prefeito entregando a caneta.
Seu nome estava gravado na caneta. Trabalha no departamento de compras. Não participou da
aquisição das canetas.
A informante Zita Centenaro disse que é servidora pública municipal, na função de secretária de
educação. Faz aniversário em 1º de abril. Não recebeu presente de aniversário. A secretária de
educação recebeu um lote de canetas para todos os servidores, inclusive para a depoente. As
canetas vieram com outros materiais de expediente, tais como papéis sulfites e outros materiais
de uso diário. Foi doadora da campanha do réu.
A informante Neyva Magda disse que é servidora pública municipal desde 2014. Não recebeu
nenhuma caneta de presente. Soube da distribuição de canetas como material de expediente.
A informante Jucelia Barros Rodrigues disse que é servidora pública municipal. Faz aniversário
no dia 26 de setembro. Não recebeu qualquer presente de aniversário do prefeito. Não ganhou
qualquer caneta da administração pública municipal. Viu alguns colegas com canetas. Foi
doadora da campanha do réu.
O informante Caio Fachi disse que é Procurador-Geral do Município desde 2013. Faz aniversário
no dia 21 de agosto e não recebeu nenhum presente do prefeito. O Município adquiriu canetas
personalizadas por iniciativa da secretaria municipal de gestão. As canetas foram adquiridas para
uso no trabalho, como material durável, com base na justificativa constante do processo licitatório.
Viu servidores utilizando as canetas. Faz orientações jurídicas aos investigados. Apenas analisou
o processo licitatório quando fora solicitada cópia pelo Ministério Público. O procedimento
licitatório foi na modalidade carta-convite. A caneta era personalizada com o brasão do Município
e com o nome do servidor.
Os réus alegam que referidos objetos são bens de uso contínuo e que, nesta qualidade, foram

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adquiridos e distribuídos. Mas, a justificativa não merece acolhida.
As fotografias que constam dos autos demonstram a singularidade do objeto, que destoa muito
das canetas corriqueiramente utilizadas no serviço público. Além da beleza e de ter qualidade
superior ao padrão ordinário, elas ainda foram gravadas com o nome do destinatário e o brasão
do Município. Um item deveras singular.
Ainda que seja louvável o gesto de reconhecimento do maior patrimônio imaterial do serviço
público – os(a) servidores, o ideal é que isso seja decorrente de uma política interna de gestão
por competências, e não mediante a distribuição de itens personalizados, custeados com o
dinheiro público e em ano eleitoral. A delicadeza da conduta e/ou eventual boa intenção do
agente não afasta a vedação eleitoral, que tem por objetivo a manutenção da igualdade no pleito,
que fica, sem dúvida, prejudicada porque coloca os réus em uma posição mais confortável e
vantajosa em relação aos demais candidatos(a), especialmente ao considerar que a cortesia foi
inédita no Município, como evidenciou a prova oral.
Tanto isso é verdade que alguns servidores externalizaram publicamente apreço pelo gesto dos
réus, conforme “prints” de postagem de redes sociais constantes dos autos. E ainda, podemos
citar como exemplo a testemunha Claudinei Duarte de Almeida, que com toda simplicidade,
externalizou genuíno sentimento de gratidão ao gestor, ora réu.
É indiscutível, portanto, que a conduta vulnerou o bem jurídico tutelado pela norma em questão –
a isonomia – e merece repreensão.
Das penalidades
Restando, portanto, caracterizada a infração à legislação eleitoral, pelo abuso do poder político,
mediante a prática de condutas vedadas, a aplicação de sanção é medida que se impõe.
Conforme arts. 73, §§4º, 5º e 8º, da Lei n. 9.504/97 e 22, XIV, da Lei Complementar n. 64/90, a
consequência da procedência é a aplicação de multa de 5 a 100 mil UFIR, a cassação do registro
ou diploma e inelegibilidade por 8 anos subsequentes.
E, segundo Rodrigo Lópes Zilio:

“havendo adequação típica ocorrerá, de regra, o sancionamento respectivo, o qual deverá


observar o princípio da proporcionalidade, ou seja, no caso concreto e com base na prova colhida
na instrução processual, o juízo, sempre que possível, velará pela aplicação da sanção, mas com
a proibição do excesso sancionatório. Dito de outro modo, a sanção a ser aplicada deve guardar
razoabilidade com o ato praticado e com a quebra do bem jurídico tutelado; logo, sendo suficiente
a imposição da multa para a reposição do status violado pela conduta vedada, é inadequada a
cassação do registro ou do diploma do candidato.” (Direito Eleitoral. 5º Ed., Verbo Jurídico, p.
589).

Os bens jurídicos tutelados pela AIJE e pela representação por conduta vedada são distintos.
Naquela, tutela-se a normalidade e a legitimidade das eleições, enquanto nesta, a isonomia. É
óbvio que uma mesma conduta pode ofender ambos, como defende o Parquet, no caso.
Para a caracterização do abuso do poder político e a incidência de todas as gravosas sanções
previstas na AIJE, notadamente a cassação do registro/diploma e a inelegibilidade, a conduta
deve se revestir de gravidade ou potencialidade lesiva apta a comprometer a legitimidade do
pleito, o que, ao considerar as peculiaridades do caso (doação de imóveis já praticada antes
mesmo das eleições; transcrição no registro imobiliário de apenas três imóveis no ano de 2020;
regularidade na aquisição das canetas), não se faz presente. Mas, é indiscutível que estas
mesmas circunstâncias, embora não autorizem a mitigação da vontade popular, configuram
conduta vedada que vulneram a igualdade no pleito e não podem ser chanceladas pela Justiça
Eleitoral.
Diante da tais premissas, por proporcionalidade, a multa mostra-se como penalidade mais
adequada. E quanto ao valor, embora fixado em UFIR, em razão de seu caráter pedagógico,
nada obsta e tudo recomenda que guarde relação com o valor dos imóveis transferidos (matrícula
de n. 25.614 – R$ 111.705,90; matrícula de n. 18.981 – R$ 9.234,40; matrícula de n. 24.632 – R$
151.047,66) e do procedimento licitatório para a aquisição das canetas (R$ 75.522,87),

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apresentando-se como conveniente a quantia de 8500 UFERMS, a ser convertida pelo último
valor do indexador
Ante o exposto, julgo parcialmente procedente os pedidos iniciais para aplicar aos
representados multa de 8500 UFERMS, resolvendo o mérito do processo, nos termos do art. 487,
inciso I, do Código de Processo Civil.
P. R. I.
Oportunamente, arquivem-se, com as cautelas de praxe.
Amambai (MS), 22 de junho de 2021.

Thielly Dias de Alencar Pitthan


Juíza Eleitoral

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