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Além das palavras e dos gestos

Emerson Monteiro

Bem no horizonte do silêncio, qual nasce o Sol, logo ali de dentro vêm as
palavras e os gestos, espécies de longo rebanho de minúsculos seres em
formação perene. Tais nuvens que acordam o dia, umas sementes vivas,
elas pulam fora das inteligências e abrem portas às manhãs feitas de flores,
pássaros e os outros animais que brotam acesos da terra nua. Convulsas,
chamam a pensar, a desvendar consciências nas compreensões adormecidas
de nós, seres humanos. Crescem pelo ar dos pulmões e das redes elétricas
do cérebro, vezes até transidas ainda no frio gelado das madrugadas,
caminham lentamente à busca de interpretação na luz que ofusca os tempos
e as criaturas. Nisso, se foram milênios sem fim, noites e dias, sonhos,
dúvidas e explosões de filosofia.
Fôssemos rever, porém, os códigos abandonados das antigas civilizações,
acharíamos nossos iguais a trabalhar o esforço das bibliotecas de argila,
couro e papiro, nas grandes navegações do espírito às interrogações de
sobreviver ao infinito das esferas. O porquê de tudo isso ora esbarra nas
máquinas elétricas e nos cabos submarinos espalhados mundo afora. Olhos
postos nas letras, perguntam os humanos do jeito semelhante das cavernas
e das catedrais, donde viemos, o que aqui fazermos e aonde chegaremos
quando tudo acontecer e simplesmente desaparecer no mistério.
Na ânsia febril de reconhecer o território em que pisa e descobrir as razões
de trocar tantos sentimentos de gerações e gerações perdidas, resignamos
aos desejos de aceitar, apenas viver uma forma de seguir o que a vida
impõe, sem maiores dúvidas de que ao Nada nos conduz, a correnteza dos
acontecimentos. Admitir essa falência das ideias em nome da sobrevivência
do Ser, enquanto adormecemos sob as lâminas de aço das ilusões e sofrer
do desvario das ausências. Bom, caso outros encontrem as ruínas desta
civilização, dirão somente que houve um povo feliz vivendo no Tempo, o
solo fértil onde plantamos e, inevitavelmente, colheremos as certezas
inevitáveis do Destino para sempre.

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