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sem crise

CRASE

@ogabriellago
Creio que melhor nome não pode haver para este
material.

Embora eu ainda me depare com muitas pessoas que


escorregam no emprego da crase — estudantes,
escritores, profissionais que dependem da escrita,
produtores de conteúdo, até mesmo professores —,
devo dizer que não há motivo algum para desespero:
quando compreendemos a lógica por trás do
fenômeno, torna-se facílimo aplicá-lo; é como
calcular um mais um para chegar a dois.

Sim, por incrível que pareça, a crase (salvo uma ou


outra exceção simples de entender) funciona
exclusivamente na base da lógica. Diferentemente do
que ocorre, por exemplo, à colocação pronominal ou
à flexão do infinitivo pessoal, aqui você não precisa
decorar regras e mais regras, longas listas de
princípios. Basta compreender o que dá origem à
crase e verificar, em cada caso, se seus elementos
essenciais estão presentes.

Sem demora, portanto, vamos entender o que é a


crase — e sem crise.
1. DEFINIÇÃO E LÓGICA

Se queremos definitivamente dominar, subjugar a


crase em nosso favor, importa-nos compreender em
que ela consiste.

Crase, em sentido amplo, é a fusão de duas vogais


idênticas. Em sentido mais restrito, que é o objeto
deste material, crase é a fusão de dois a, sinalizada por
meio do acento grave (`): a + a = à.

Em nosso idioma, tal contração acontece em três


ocasiões:

a) Preposição a + artigo definido a(s).

“Vou à igreja hoje.”


(ir a + a igreja)

“Agradecemos às mães que compareceram à


reunião.”
(agradecer a + as mães) (comparecer a + a reunião)

b) Preposição a + pronome demonstrativo a(s).

Como pronome demonstrativo, a equivale a aquela.

“Já que você está distribuindo flores a mulheres,


entregue uma à que está sentada naquele banco.”
(entregar a + a que)
“Não me refiro à obra que você terminou de ler.
Refiro-me à que você está lendo agora.”
(referir-se a + a que)

c) Preposição a + a de aquele(s), aquela(s), aquilo, a qual,


as quais.

“Vamos àquele restaurante novo?”


(ir a + aquele)

“Você está assistindo àquela novela que


recomendei?”
(assistir a + aquela)

“As riquezas às quais visamos podem corromper-


nos.”
(visar a + as quais)

As três hipóteses acima são a base, o fundamento, o


resumo, o grosso, a suma, a essência da crase.
Assimilando tal conceito, entendendo que a crase é
simplesmente a união de dois a e que não pode haver
crase onde não há dois a, você conseguirá escrever
com segurança e facilidade.

Eis a lógica, eis o conceito, eis a fórmula que se deve


adotar para definir quando aplicar ou não o acento
grave. Com isso resolvemos noventa por cento dos
problemas.
2. SEM CRASE

Dada a lógica da crase, poderíamos muito bem dizer


que o presente capítulo é inútil. Afinal, se sabemos
que crase é a fusão de dois a, basta verificar que não
há dois a em certa construção para estabelecer que
não existe crase aí. Simples assim.

Todavia, a fim de esgotar o assunto e assentá-lo com


firmeza, lançando fora todas as dúvidas e enganos,
trago aqui as principais situações em que você pode
ser tentado a empregar a crase — quando, em
verdade, não deve fazê-lo.

Não há crase, pois, nos seguintes casos:

2.1. TERMOS MASCULINOS

Salvo a hipótese de aquele(s), aquela(s), aquilo, que se


contraem com a preposição a independentemente do
gênero (por exemplo, “Refiro-me àquele menino”), não
ocorre crase antes de termos masculinos,
simplesmente porque termos masculinos não se
acompanham do artigo feminino a.

O princípio é muito simples! Se não há a + a, não há à.


Sem sentido, portanto, é escrever coisas como:

✘ “Vou à São Paulo.”


(São Paulo não se acompanha nem sequer do artigo masculino
o, que dirá do artigo feminino a. Dizemos “Vim de São Paulo”,
não “do São Paulo” ou “da São Paulo”.)

✘ “Estou à caminho.”
(Existe artigo feminino a antes de caminho? Caminho é palavra
feminina? “Vou seguindo minha caminho”?)

✘ “Entregue este presente à seu irmão.”


(Dizemos “Meu irmão”, sem artigo, ou “O meu irmão”, com
artigo masculino. Não cabe artigo feminino a aqui.)

Havendo artigo definido antes de palavra masculina, o


único cabível é o artigo o — jamais o artigo a, que é
feminino. Naquele caso, não ocorre crase, mas fusão
da preposição a com o artigo o, formando ao.

“Vou ao mercado.”
(ir a + o mercado)

“Entregue este presente ao seu irmão.”


(entregar a + o seu)

2.2. TERMOS EM SENTIDO GENÉRICO,


INDEFINIDO

Note a distinção de sentido entre as duas construções


seguintes.
“Academia entregou Prêmio Camões a escritor
brasileiro.”

“Academia entregou Prêmio Camões ao escritor


brasileiro.”

Percebe a diferença? No primeiro caso, a ausência do


artigo definido o torna escritor brasileiro um termo
genérico, de sorte que não sabemos que escritor é
esse; não o conhecemos, não nos foi dado seu nome.
Somente sabemos que se trata de um escritor
brasileiro. No segundo, o escritor brasileiro sugere que o
conhecemos, que seu nome foi citado em momento
anterior.

Aqui, porém, usei um termo masculino. Não obstante,


se a palavra for feminina e tiver sentido genérico, não
se acompanhará do artigo a, assim como o vocábulo
masculino não se acompanhou do artigo o. Logo, sem
artigo a, não há crase.

“Academia entregou Prêmio Camões a escritora


brasileira.”

“Academia entregou Prêmio Camões à escritora


brasileira.”

Novamente, no primeiro caso, escritora brasileira é


expressão generalizante. A escritora está indefinida;
não sabemos quem é. Ali resta apenas a preposição a
(entregar algo a alguém).
Outros exemplos de palavra tomada em sentido geral,
vago — portanto sem artigo e sem crase:

“Sou muito introvertido. Nunca fui a festa


alguma.”
(ir a + festa alguma)

“Não dou moral a mulher ciumenta.”


(dar moral a + mulher ciumenta)

“Esta casa cheira a canela.”


(cheirar a + canela)

“Você não tem direito a pausa se trabalha apenas


meio período.”
(ter direito a + pausa)

Para verificar se o termo foi tomado em sentido


genérico, experimente trocá-lo por um equivalente
masculino. Se não couber ao sem prejuízo da
generalidade, isso significa que não cabe à para o
termo feminino.

“Sou muito introvertido. Nunca fui a evento


algum.”
(não ao evento)

“Não dou moral a homem ciumento.”


(não ao homem)

“Esta casa cheira a cravo.”


(não ao cravo)
“Você não tem direito a intervalo se trabalha
apenas meio período.”
(não ao intervalo)

2.3. PRONOMES PESSOAIS

Os pronomes pessoais, inclusive os de tratamento,


nunca esperam, antes de si, o fenômeno da crase —
pois que nunca esperam, antes de si, artigo definido.

Não há, portanto, crase antes de ele, ela, tu, nós, você,
mim, ti, Vossa Senhoria, Vossa Excelência etc.

O motivo é bem lógico: por acaso dizemos “Eu gosto


do ele”, “Eu gosto da ela”? Usa-se artigo com pronome
pessoal? Evidentemente não.

Logo, se não há artigo, não há crase:

“Ando pensando em dar um colar de pérolas a ela.”

“Jamais obedecerei a ti!”

“Ele referia-se a mim, não a você.”

“Dirijo-me a Vossa Excelência com respeito.”


Há, contudo, uma exceção que devo mencionar sobre
os pronomes de tratamento: admite-se crase antes dos
pronomes senhora e senhorita, uma vez que podemos
empregar o artigo feminino a: “A senhora vai bem?”.

“Não direi mais nada à senhora!”

“Entregar-me-ei à senhorita com toda a minha


paixão.”

2.4. NUMERAIS CARDINAIS SEM ARTIGO E


ARTIGOS INDEFINIDOS

Não há crase antes de numerais cardinais (um, dois,


três, dez, cem, mil, cinco mil etc.) sem artigo, tampouco
antes de artigos indefinidos (um, uma, uns, umas),
porque, mais uma vez, não há dois a que fundir.

“Entreguei panfleto a uma pessoa somente.


Ninguém mais quis receber.”

“Hoje vamos a duas praias diferentes.”

“Prefiro uma casa pequena e confortável a uma


grande e estranha.”

“O curso chegou a mil inscrições!”


A prova de que não há artigo é esta: faça uma
pergunta que exija como resposta o termo que segue
depois da preposição a. Você perceberá que não faz
sentido colocar artigo antes dele.

“Quantas pessoas receberam seus panfletos?” “Uma


somente.”
(não a uma)

“Vocês vão a quantas praias?” “Duas.”


(não as duas)

“Que tipo de casa você não deseja?” “Uma grande e


estranha.”
(não a uma)

“O curso chegou a quantas inscrições?” “Mil.”


(não as mil)

No caso dos numerais cardinais, caso haja artigo


feminino a (usado como definidor), a crase é possível.

“Hoje vamos às duas praias que você


recomendou.”

“Estes chapéus pertencem às três senhoras que


estão ali.”

“Procedamos às dez tarefas que devemos cumprir


hoje.”
Recorde-se, como restou ensinado no tópico 2.2., que
a presença ou a ausência do artigo definido pode
alterar o sentido do todo.

A construção “Hoje vamos a duas praias que você


recomendou” também é possível, mas,
diferentemente de “às duas praias”, traz um sentido
genérico, vago. Não se sabe, a princípio, que praias
são essas.

Dizendo-se “Hoje vamos a duas praias que você


recomendou”, provavelmente se esperará do ouvinte
que pergunte “Quais delas?”, pois resta subentendido
que ele recomendou mais de duas. Com “às duas
praias” isso não acontece, porquanto está claro que
essas duas praias são conhecidas na conversa.

Para prová-lo, troque o verbo ir por algum que não


exija preposição a: “Hoje visitamos duas praias que
você recomendou” é diferente de “Hoje visitamos as
duas praias que você recomendou”.

A despeito do princípio ora analisado, há dois casos —


duas exceções — que não nos devem confundir:

a) Horas.

As horas acompanham-se de artigo definido


pluralizado (as), logo é possível a crase.
“Sairei às três horas da tarde.”

“Venha às cinco. Serviremos chá.”

“A loja fica aberta das oito da manhã às seis da


tarde.”

“Retorno do almoço à uma.”

b) À uma como locução adverbial.

À uma é locução adverbial que significa ao mesmo


tempo; simultaneamente; juntamente.

“Sentaram-se todos à uma.”

“Diante do barulho que fez o caçador, à uma


fugiram todos os animais.”

“Falavam todos à uma, e ninguém ouvia ninguém.”

2.5. LOCUÇÃO COM PALAVRAS REPETIDAS

Quando uma locução de forma fixa é formada por


palavras femininas repetidas, não ocorre a crase. Há
lógica aqui: se a primeira palavra não recebe artigo,
por simetria a segunda também não deve receber.

“Os lutadores colocaram-se frente a frente.”


“Ficamos cara a cara, mas nada aconteceu.”

Basta perceber que o artigo masculino o não está


presente nas locuções de palavras masculinas
repetidas. Com as femininas, portanto, não deve
existir à.

“Trabalhava dia a dia com afinco.”


(não dia ao dia)

“Explique-me a receita passo a passo.”


(não passo ao passo)

2.6. TODA E QUALQUER PALAVRA QUE NÃO SE


ACOMPANHE DE ARTIGO

Embora os tópicos anteriores se refiram a casos


específicos, devemos lembrar, mais uma vez, que não
há crase onde não há dois a.

Não se admite, portanto, além dos exemplos já


citados, crase antes dos seguintes:

a) Verbos.

“E saiu o peregrino a andar e a andar…”

“O guloso pôs-se a comer como se não o fizesse


havia cinco dias.”
“Eles estão a arquitetar algum plano funesto.”

“Até cheguei a assistir ao filme, mas não me


agradou.”

b) Pronomes cujo(a)(s), quem, quanto(a)(s), algum(a)(s),


nenhum(a)(s), alguém, ninguém, todo(a)(s), esse(a)(s), este(a)
(s) etc.

“Eis aí a mulher a quem admiro!”

“A companhia a cuja peça assisti voltará a


apresentar-se em março.”

“A Argentina fica a quantas horas de viagem


daqui?”

“Não preciso explicar-me a ninguém.”

“Aspiro a essa profissão desde criança.”

c) Preposições (com, para, após, entre, ante, perante etc.).

“Venha após as duas horas.”

“Ele vai para a Espanha.”

“Obstinado, não se curvou perante a rainha.”

“Você pode ligar-nos entre as oito e as cinco


horas.”
Aqui existe, no entanto, uma exceção: a preposição até
admite depois de si a preposição a para indicar horas
ou movimento, de modo que a crase é possível caso
haja o artigo feminino a em seguida. Isso porque até a
pode funcionar como locução prepositiva com o
mesmo significado de até. Trata-se de uma presença
opcional, de sorte que se pode escrever de ambas as
maneiras.

“Funcionamos até as oito da noite.”

“Funcionamos até às oito da noite.”

“Vá até a padaria e traga cinco pães.”

“Vá até à padaria e traga cinco pães.”

d) Nomes que não se acompanham de artigo (Roma,


Curitiba, Roraima, Santa Catarina etc.).

“Cheguei a Roma.”

“Vou a Curitiba por mando de meu chefe.”

“Por incrível que pareça, prefiro São Paulo a Santa


Catarina.”

Para comprovar que o artigo feminino a não está


presente, basta imaginar um caso com outra
preposição:
“Cheguei de Roma.”
(não da Roma)

“Venho de Curitiba.”
(não da Curitiba)

“Não é de Santa Catarina que gosto mais, mas de


São Paulo.”
(não da Santa Catarina)

Uma observação: caso tais nomes sejam qualificados,


especificados, acompanhar-se-ão de artigo e, por isso,
a crase será possível.

“Vou à belíssima Curitiba a passeio.”

“Como eu gostaria de ir à Roma dos antigos!”


3. CASOS ESPECIAIS

Vista a definição da crase, sua aplicação e os casos


proibidos, importa-nos agora conhecer os casos
especiais, que nos requerem maior atenção.

3.1. CASA

O substantivo casa, quando significa lar, domicílio,


residência e não está especificado, não se acompanha
de artigo e, conseguintemente, não espera crase.

Se dizemos “Vou para casa”, e não “Vou para a casa”,


ou “Acabei de sair de casa”, e não “Acabei de sair da
casa”, o mesmo se dá com a preposição a: fica sozinha.

“Cheguei a casa.”

Obs.: De acordo com a norma culta, chega-se a um


lugar, não em um lugar. Por isso não se escreve
“Cheguei em casa”.

Havendo termo que especifique a casa, que a


qualifique, isto é, havendo o artigo definido a, a crase
é possível.

“Cheguei à casa de meus pais.”

“Estou indo à casa de Bernardo.”


É fácil verificar a presença do artigo feminino: do
mesmo modo diríamos “Vim da casa de meus pais” e
“Vim da casa de Bernardo”.

3.2. TERRA

Assim como acontece com casa, o substantivo terra, na


acepção de terra firme, chão firme, não se acompanha
de artigo — por isso não há crase.

“Depois de tanto navegar, chegamos a terra


exaustos.”

“O avião desgovernado foi a terra sem que


ninguém o pudesse impedir.”

“O capitão resolveu voltar a terra para abastecer.”

Perceba como o artigo feminino a não está presente


em exemplos como estes:

“Nossos planos caíram por terra.”


(não pela terra)

“Depois de permanecer em terra por vinte dias,


decidimos zarpar.”
(não na terra)

Noutros sentidos, terra pode levar normalmente o


artigo, o que possibilita a crase.
“Quero ir à terra de minha infância.”
(lugar; território)

“A tripulação, deixando a Lua, dirigiu-se à Terra.”


(planeta Terra)

“Os agricultores preferem a terra vermelha à terra


clara.”
(barro; solo)

3.3. À MODA DE, À MANEIRA DE

Observe os seguintes casos:

“Que vontade de comer bacalhau à Gomes de Sá!”

“O talentoso poeta escrevia à Camões.”

“Ele gosta de se vestir à Sherlock Holmes.”

Que é que faz a crase antes dos nomes masculinos?

Em tais exemplos, subentende-se a expressão à moda


de, à maneira de:

“Que vontade de comer bacalhau à moda de Gomes


de Sá!”

“O talentoso poeta escrevia à maneira de Camões.”


“Ele gosta de se vestir à moda de Sherlock Holmes.”

Assim, em verdade, não se trata de crase antes de


termo masculino, mas sim antes de um termo
feminino que está oculto, implícito. A crase, pois, é
permitida e necessária.

Mas cuidado! Não confundamos as coisas. Frango a


passarinho e bife a cavalo não levam crase porque não
está implícita aí a expressão à moda de. Não é “frango à
moda de passarinho” nem “bife à maneira de cavalo”.
Convenhamos: isso não faria sentido algum.

3.4. NOME PRÓPRIO MASCULINO COM


DENOMINAÇÃO FEMININA IMPLÍCITA

Há casos em que um nome masculino traz


evidentemente antes de si uma denominação
feminina implícita — como ocorre a ruas, lojas,
empresas, estabelecimentos etc. Nessas situações,
embora se trate de nome masculino, a crase é possível
porque sua denominação feminina está subentendida,
permitindo-se o artigo a. Vejamos:

“Farei uma visita à Unidos em Cristo.”


(à Igreja Unidos em Cristo)

“Acabei de chegar à Brasil.”


(à Avenida Brasil)
“Enviarei meu currículo à Mundo Clássico.”
(à Editora Mundo Clássico)

Mais uma vez, a prova de que o artigo feminino está


presente:

“Você conhece a Unidos em Cristo?”

“Em meu caminho, passarei pela Brasil.”

“Este livro é da Mundo Clássico.

3.5. ATÉ A

Como mencionei no tópico 2.5., c, a preposição até,


quando em construções que indicam horas ou
movimento, deslocamento, admite consigo a
preposição a, formando a locução prepositiva até a —
o que permite, assim, a crase.

“Estarei em casa até as oito horas.”

“Estarei em casa até às oito horas.”

“Vou até a mercearia e logo volto.”

“Vou até à mercearia e logo volto.”

Como é de se esperar, caso o termo seja masculino, a


construção será até o ou até ao.
“Vou até o mercado e logo volto.”

“Vou até ao mercado e logo volto.”

“Diante do barulho, o curioso correu até o portão.”

“Diante do barulho, o curioso correu até ao


portão.”

3.6. PRONOMES POSSESSIVOS

Os pronomes possessivos (meu, minha, seu, sua, teu, tua,


nosso, nossa etc.) acompanham-se livremente dos
artigos definidos — a crase, pois, é opcional, conforme
o artigo esteja presente ou não.

Se podemos indiferentemente dizer “Meu carro” e “O


meu carro”, bem como “Minha casa” e “A minha casa”, a
crase com a preposição a ocorrerá conforme
desejemos inserir o artigo a antes do pronome
possessivo.

“Vamos a sua casa?”


(ir a + sua casa)

“Vamos à sua casa?”


(ir a + a sua casa)
“Refiro-me a tua péssima conduta.”
(referir-se a + tua)

“Refiro-me à tua péssima conduta.”


(referir-se a + a tua)

“Depois de tanto tempo noutro país, voltamos


enfim a nossa pátria.”

“Depois de tanto tempo noutro país, voltamos


enfim à nossa pátria.”

3.7. OBJETO DIRETO PREPOSICIONADO

Objeto direto é o complemento que se liga


diretamente ao verbo, isto é, sem preposição (“Amo
você”; “Comi um chocolate”; “Comprei duas blusas”),
diferentemente do objeto indireto, que se liga ao
verbo por preposição (“Gosto de você”; “Obedeça a
seu pai”).

O objeto direto, no entanto, em certos casos restritos,


pode ligar-se ao verbo por preposição, situação em
que se chama objeto direto preposicionado. Isso
significa que alguns verbos, conquanto sejam
transitivos diretos, podem acabar seguidos de crase
quando o objeto direto preposicionado liga-se àqueles
por meio da preposição a. Isso, porém, só ocorre nos
casos em que, obviamente, a crase é possível, como se
esclarecerá adiante.
Eis as hipóteses em que está presente a preposição a:

a) Pronomes oblíquos tônicos.

Os pronomes oblíquos tônicos (mim, ti, si, ele, nós, vós,


eles) sempre exigem preposição antes de si, mesmo
quando o verbo é transitivo direto.

“Não amo a ti! Meu coração é de outro.”

“Quero a ela somente.”

“A mim ninguém considera!”

No caso dos pronomes oblíquos tônicos, nunca haverá


crase, pois, como estudamos no item 2.3., os
pronomes pessoais não se acompanham de artigo
definido (o, a).

b) Clareza, evitar ambiguidade.

Considere o seguinte exemplo:

“Venceu o tigre o leão.”

Os termos da oração não se encontram na ordem


usual. Como, então, compreender seu real sentido? O
leão foi vencido do tigre? Ou o tigre foi vencido do
leão?
Em tais casos, admite-se o uso da preposição a para
indicar qual é o objeto e qual é o sujeito:

“Venceu o tigre ao leão.”


(o leão foi vencido do tigre)

“Venceu ao tigre o leão.”


(o tigre foi vencido do leão)

Aqui, havendo palavra feminina precedida do artigo a,


a crase (preposição a + artigo a) é possível.

“Venceu o leão à leoa.”


(a leoa foi vencida do leão)

“Venceu ao leão a leoa.”


(o leão foi vencido da leoa)

“À menina avistou o menino.”


(a menina foi avistada pelo menino)

“A menina avistou ao menino.”


(o menino foi avistado pela menina)

Outro exemplo em que a preposição a é bem-vinda


para dar clareza ao enunciado:

“A irmã amava o irmão tanto como a mãe.”

Que se deseja dizer aqui? “A irmã amava o irmão


tanto como ela (a irmã) amava a mãe” ou “A irmã
amava o irmão tanto como a mãe também o amava”?
O emprego da preposição a soluciona o caso:

“A irmã amava o irmão tanto como à mãe.”

Agora, resta claro que o sentido é este: “A irmã amava


o irmão tanto como ela (a irmã) amava a mãe”, ou
seja, o amor da irmã era igual para com o irmão e
para com a mãe. Sem a preposição a, o significado é
dúbio.

c) Deferência, reverência.

Admite-se o uso da preposição a com verbos


transitivos diretos quando se almeja imprimir sentido
de reverência, de maior respeito, de elevado
sentimento, enfatizando-se a pessoa que constitui o
objeto do verbo.

Sendo a pessoa do gênero feminino e havendo artigo


a, a crase é possível.

“Adore a Deus sobre todas as coisas.”

“A Cristo, somente, ame.”

“À senhorita é que admiro, e à senhorita apenas!”


d) Pronome relativo quem.

Como pronome relativo, quem é sempre precedido de


preposição, ainda que o verbo seja transitivo direto —
caso em que se usa a preposição a.

“O sujeito a quem prenderam escapou da cadeia.”


(quem = o qual)

“Aquela é a moça a quem amo.”


(quem = a qual)

Como vimos, porém, no tópico 2.6., b, a crase antes de


quem é impossível, pois quem jamais é precedido do
artigo definido a.

e) Certos pronomes indefinidos ou demonstrativos.

Há pronomes que admitem — de maneira facultativa


— o emprego da preposição a antes de si, mesmo em
casos nos quais o verbo é transitivo direto. É o caso de
uns, outros, todos, quantos, este, esse, aquele etc.

“Todos parecem bons, mas quero a este.”

“Amai-vos uns aos outros.”

“Odiava a todos os que estavam no salão.”

“A quantos venceste no jogo?”


3.8. NOMES PRÓPRIOS

Nomes próprios de pessoas e alguns topônimos


(nomes próprios geográficos) admitem livremente o
uso do artigo, de sorte que, nesses casos, havendo
preposição a, a crase pode ocorrer, desde que presente
o artigo feminino a.

Há quem diga somente Fernanda; outros, a Fernanda.


Uns, Maria; outros, a Maria.

Ao mesmo tempo, topônimos como França podem-se


acompanhar facultativamente de artigo (França ou a
França; “Vim de França” ou “Vim da França”; “Vou a
França” ou “Vou à França”). Outros casos semelhantes:
África, a África; Espanha, a Espanha; Inglaterra, a
Inglaterra; Itália, a Itália.

“Ganhei uma viagem a França.”

“Ganhei uma viagem à França.”

“Entregue este pacote a Helena.”

“Entregue este pacote à Helena.”

“Diga a Lurdes que cheguei.”

“Diga à Lurdes que cheguei.”


3.9. LOCUÇÕES ADVERBIAIS, PREPOSITIVAS,
CONJUNTIVAS OU ADJETIVAS

No início, afirmei que não pode haver crase (à) onde


não há dois a. Pois bem, aqui (e apenas aqui) se deve
esquecer tal princípio. Trata-se de caso complexo, um
tanto polêmico (isto é, não consensual entre
gramáticos), mas que não nos deve enganar.

Nas maioria das expressões fixas femininas que


consistem em locuções adverbiais, prepositivas,
conjuntivas ou adjetivas — isto é, grupos de duas ou
mais palavras que exercem, juntas, função de
advérbio, preposição, conjunção ou adjetivo —, usa-se
a crase não porque haja dois a, mas porque o sinal do
acento grave desfaz eventual ambiguidade, e assim
seguiu a tradição, o uso.

Em locuções como à deriva, à noite, à toa, à vontade, à


bala, à moda de, à custa de, à medida que, o à não indica a
presença de dois a. A crase, aqui, é artifício
empregado para deixar explícito que se trata de uma
locução.

Pensemos, por exemplo, na seguinte construção:


“Paguei a vista”. Soa ambígua, não? O a é preposição
ou artigo? Paguei a vista no sentido de de uma só vez,
oposto a a prazo, ou paguei a própria vista, entreguei
minha visão como pagamento?
Emprega-se, pois, o acento grave para dirimir a
ambiguidade e bem explicitar o sentido. “Paguei à
vista”: paguei de uma só vez; não parcelei.

Alguns gramáticos, demais, recomendam que, no caso


de a distância, empregue-se o acento grave apenas
quando a distância é especificada, ou seja, quando se
trata de à distância de: “À distância de dois metros”, “À
distância de um tiro de arco” etc. Quando a distância
aparece sozinha, no sentido de ao longe, tais
gramáticos recomendam que não se empregue o
acento: “Viu-o a distância”, “Ensino a distância” etc.

Também há discussão quanto às locuções que


indicam meio, instrumento: a lenha, a gasolina, a mão, a
paulada. Como seus equivalentes masculinos não se
acompanham de artigo (a óleo, a gás, a álcool, a lápis
etc., e não ao óleo, ao gás, ao álcool, ao lápis), há
gramáticos contrários ao emprego do acento grave.
Aqui, no entanto, também não há consenso.

A única situação em que há consenso é o caso das


locuções femininas no plural com o artigo as: às
pressas, às vezes, às ocultas, às cegas, às claras, às escuras
etc. O s em às indica que o artigo feminino no plural
(as) está presente com a preposição a, pois, caso não
estivesse, obviamente restaria apenas a. Tais locuções,
portanto, sempre se acompanham do acento grave
(às).
Quanto às locuções femininas no singular, como
mencionei, não há conclusão pacífica, e nossos
melhores autores divergem em seu uso. Ainda assim,
é notório que a maioria dos escritores e gramáticos
prefere empregar o acento grave naquelas expressões,
mesmo quando não há ambiguidade: à vista, à escuta, à
capucha, à socapa, à revelia, à larga, à toa, à distância, à
tarde…

Resumindo, enfim, não incorrerá em erro quem optar


por escrever com o acento grave:

“Paguei à vista.”

“Ele saiu à noite.”

“Dou aulas à distância.”

“A pizzaria conta com um forno à lenha.”

“Andava sempre à toa.”

Apenas não esqueçamos que a questão se refere às


locuções femininas. As masculinas, como bem
sabemos, jamais se acompanham de crase.
3.10. SIMETRIA, PARALELISMO

Um cuidado que se exige no emprego da crase é a


atenção à simetria, ao paralelismo. Vejamos:

“Regularmente, trabalho de segunda a sexta.”

“Esta semana, trabalharei do domingo à sexta-


feira.”

No primeiro caso, não se empregou o artigo a antes de


segunda — conseguintemente, também não se
empregou o artigo a antes de sexta. Já no segundo
caso, domingo acompanha-se do respectivo artigo (o),
de modo que sexta-feira também leva o artigo
feminino a.

Trata-se de respeitar a simetria entre os termos da


oração ou do período. Se o primeiro traz artigo,
recomenda-se que os demais também o tragam;
igualmente, se o primeiro não leva artigo, os demais
não devem levar.

Tal princípio, é claro, determinará a ocorrência da


crase.

“A pai e a mãe é devido respeito.”

“Ao pai e à mãe é devido respeito.”


“Visa o homem a sossego e a paz.”

“Visa o homem ao sossego e à paz.”

“Os empregados têm direito a intervalo e a férias.”

“Os empregados têm direito ao intervalo e às


férias.”

Outra questão que se levanta é a repetição do artigo


quando os elementos estão coordenados: também
em atenção ao paralelismo, recomenda-se que, se o
primeiro elemento é acompanhado de preposição e
artigo, os próximos sejam acompanhados de artigo
somente se houver preposição — ou, caso prefira o
autor, que remova tanto a preposição como o artigo
dos seguintes, mas jamais deixe apenas o artigo.

“Os empregados têm direito a intervalo e férias.”

“Os empregados têm direito ao intervalo e férias.”

“Os empregados têm direito a intervalo e a férias.”

“Os empregados têm direito ao intervalo e às


férias.”
As quatro alternativas acima são válidas. Jamais, no
entanto, seja escrito:

✘ “Os empregados têm direito ao intervalo e as


férias.”

✘ “Os empregados têm direito a intervalo e às


férias.”

Em suma, se o primeiro elemento não leva artigo, os


demais não devem levá-lo. Se o primeiro elemento
leva artigo, os demais podem levá-lo igualmente, mas
com a repetição da preposição inicial.
4. REGÊNCIA: PRINCIPAIS VERBOS E
NOMES QUE DEMANDAM A
PREPOSIÇÃO A

Regência diz respeito a estudar a conexão entre o


termo regente e o termo regido. Regência verbal,
assim, é estudar como certo verbo liga-se a seu
complemento; regência nominal, por sua vez, é
investigar como certo nome (substantivo, adjetivo,
advérbio) liga-se a seu complemento.

Como tais conexões se fazem por meio das


preposições, podemos dizer que regência é verificar
qual a preposição exigida pelo verbo ou pelo nome —
se é que se exige alguma.

Assim, por exemplo, quanto ao verbo gostar, a


regência nos dirá que este espera a preposição de para
ligar-se a seu complemento, pois dizemos “Eu gosto
de alguma coisa”, e não “Eu gosto alguma coisa”, ou
“Eu gosto em alguma coisa”, ou “Eu gosto a alguma
coisa”. Não se usa nenhuma destas últimas
preposições, mas apenas de. Essa é a regência do verbo
gostar.

O mesmo se aplica aos nomes: enquanto medo liga-se


a seu complemento por meio da preposição de (medo
de alguma coisa; medo de alguém), favorável liga-se a
seu complemento por intermédio da preposição a
(favorável a alguma coisa).
Interessa-nos, no presente material, saber quais são os
verbos e nomes que exigem a preposição a para ligar-
se aos respectivos complementos, pois é em tais casos
que poderá haver crase.

Listarei, portanto, os principais.

4.1. REGÊNCIA VERBAL

Aqui vão os verbos mais comuns que esperam a


preposição a.

AGRADECER

Agradece-se alguma coisa a alguém.

Pode-se, também, omitir ora o objeto direto (a coisa),


ora o objeto indireto (a pessoa): “Agradeço isso”;
“Agradeço a você”.

“A moça agradeceu o favor ao rapaz.”

“Recebi o presente e prontamente agradeci a ela.”

“Agradeceu à estranha as esmolas que recebeu.”


ASPIRAR

No sentido de pretender, desejar, almejar, o verbo aspirar


exige a preposição a. Aspira-se a alguma coisa.

“O estagiário aspirava a um alto cargo na


empresa.”

“Sonhador, aspirava aos amores da menina.”

“Os heróis aspiram à glória.”

Noutros sentidos, como respirar, sorver, absorver, tragar,


o verbo liga-se ao complemento diretamente, sem
preposição.

“Aspire o pó de casa.”

ASSISTIR

No sentido de estar presente, presenciar, ver, testemunhar,


observar, demanda a preposição a. Assiste-se a alguma
coisa.

“Fomos ao teatro assistir à apresentação.”

“Sim, assisti ao filme que você recomendou, porém


não me agradou muito.”

“A que você está assistindo?”


Na acepção de prestar assistência, ajudar, o verbo é
transitivo direto: sem preposição.

“O médico assistiu o acidentado”.

ATENDER

Embora não haja consenso entre gramáticos a respeito


da regência desse verbo, preferem-se as seguintes
construções:

No sentido de acolher, receber alguém, bem como


deferir, acatar, é verbo transitivo direto: não há
preposição.

“O presidente atendeu a imprensa.”

“Depois de muita insistência, ele atendeu o meu


pedido.”

No sentido de prestar atenção a, ouvir alguém, levar em


consideração, atentar a, considerar, satisfazer, é transitivo
indireto e espera a preposição a.

“Sua proposta não atende às necessidades desta


empresa.”

“A polícia demorou demais para atender ao


chamado.”
Não obstante, como mencionei, não há consenso, de
sorte que há quem admita a preposição no primeiro
caso e também admita a transitividade direta no
segundo.

CHEGAR

Chegar é verbo intransitivo, ou seja, não demanda


complemento. Simplesmente se chega. Admite-se, no
entanto, o adjunto adverbial de lugar, o qual é ligado
ao verbo por meio da preposição a.

Pela norma culta, não se emprega a preposição em,


embora seja muito comum na linguagem cotidiana.

“Chegamos à praia depois de dez horas de viagem


ininterrupta.”

“Cheguei a casa.”
(Aqui, o a é preposição, pois, como já sabemos, casa no sentido
de lar, quando não está especificada, não recebe artigo
feminino a)

“Cheguei à casa de meus pais.”

“Ele havia chegado cedo ao trabalho, mas acabou


descobrindo que era feriado.”
COMPARECER

Emprega-se com as preposições a e em: pode-se


comparecer a um lugar ou em um lugar.

“Muitíssimas pessoas compareceram ao velório.”

“Muitíssimas pessoas compareceram no velório.”

“Poucos compareceram à celebração.”

“Poucos compareceram na celebração.”

COMUNICAR

No sentido de fazer saber, comunica-se alguma coisa a


alguém.

“O governo comunicou à população a crise de


energia.”

“O diretor comunicou ao pai que o filho deste fora


suspenso.”

ENSINAR

Ensina-se alguma coisa.

“Ensino Língua Portuguesa.”


Ensina-se alguma coisa a alguém.

“Ensino Língua Portuguesa aos alunos do


cursinho.”

“Vou ensinar caligrafia às crianças.”

Ensina-se alguém a alguma ação (verbo no infinitivo).

“Ensinarei você a ler melhor.”

“O professor ensinou-a a escrever bem.”

INFORMAR

Admite dupla construção: pode-se informar alguém


de alguma coisa (informá-lo de) ou informar alguma
coisa a alguém (informar-lhe que).

“O empregado informou a madame de que as


visitas haviam chegado.”

“Informou-a de que as visitas haviam chegado.”

“O empregado informou à madame que as visitas


haviam chegado.”

“Informou-lhe que as visitas haviam chegado.”


INTERESSAR

Na acepção de dizer respeito a alguém, ser proveitoso a


alguém, ser do interesse de alguém, é transitivo indireto e
pede a preposição a.

“A arrecadação do imposto de renda muito


interessa ao Governo.”

“Preste atenção! Este assunto lhe interessa.”

“A solteirice do rapaz interessava à menina.”

IR

Assim como chegar, o verbo ir é intransitivo, mas


admite o adjunto adverbial de lugar, ao qual se liga
pela preposição a.

Pode admitir a preposição para quando se trata de


deslocamento permanente, ou seja, ir e ficar, ou ir e
demorar-se.

“Vou ao mercado.”

“Estou indo à universidade. Devo voltar à noite.”

“Planejo ir para a Inglaterra. Não tenho intenção de


retornar.”
OBEDECER

É verbo transitivo indireto e liga-se ao complemento


por intermédio da preposição a. Obedece-se a
alguém.

“Obedeça a seus pais.”

“Obedeça-lhes.”

“Você precisa comportar-se e obedecer à


professora.”

PAGAR

Quando se trata de coisa, é transitivo direto: paga-se


alguma coisa.

Quando se trata de pessoa, é transitivo indireto: paga-


se a alguém.

Vale dizer: paga-se alguma coisa a alguém.

“Ainda não paguei os boletos.”

“Ainda não paguei ao agiota.”

“Pagou à costureira, e só depois percebeu que as


calças não haviam sido remendadas.”
“O chefe esqueceu-se de pagar o salário ao
funcionário.”

PEDIR

Conquanto seja comumente usada a construção “pedir


para alguém fazer alguma coisa” no dia a dia, a norma
culta não a abona.

Pede-se algo a alguém. Pede-se a alguém que faça


algo.

Admite-se a preposição para apenas no sentido de


pedir licença para alguma coisa: “Pediu para ir ao
banheiro”.

“Peça a Robertinho que venha aqui.”

“O pobre menino pediu uma moeda ao


transeunte.”

“Sua mãe pediu que você não chegue tarde.”

“Criou coragem e pediu à moça um beijo.”


PERDOAR

Como ocorre a pagar, também perdoar tem


complemento direto de coisa e complemento indireto
de pessoa.

Perdoa-se algo a alguém.

“Perdoou as faltas à namorada.”

“Você lhe perdoa?”

“Deus perdoa aos pecadores arrependidos.”

“Perdoe a seu irmão; façam as pazes.”

PREFERIR

Sabemos que, coloquialmente, costuma-se dizer


“Prefiro isso do que aquilo”, “Prefiro isso mais que
aquilo”. Tais construções, no entanto, são condenadas
pelo registro culto.

Prefere-se uma coisa a outra.

“O pai preferia o filho mais velho ao mais novo.”

“Prefiro rosas a tulipas.”


“Prefiro esta camisa preta àquela cinza.”

“Prefiro as manhãs frescas às tardes quentes.”

PROCEDER

No sentido de iniciar, realizar, executar alguma coisa, é


verbo transitivo indireto e demanda a preposição a:
procede-se a alguma coisa.

“Que o advogado, agora, proceda à defesa do réu.”

“Proceda, por favor, à leitura em voz alta.”

“O delegado não esperou e logo procedeu ao


interrogatório.”

RENUNCIAR

Embora se admita a transitividade direta, isto é, sem


preposição (renunciar algo), a regência tradicional e
ainda prevalente é com a preposição a: renunciar a
algo.

“Diante da derrota, o rei renunciou ao trono.”

“Não renunciaremos às nossas requisições!”


“Não renunciaremos a nossas requisições!”

“Povo que vota errado renuncia a seus direitos.”

RESPONDER

A resposta oferecida é objeto direto: responde-se


alguma coisa.

“Respondi que não.”

“Ele respondeu alguma coisa que não entendi.”

A questão, a pergunta, a convocação a que se responde


é objeto indireto: responde-se a alguma coisa.

“Não havia estudado, então respondeu


rapidamente às questões da prova e logo foi
embora.”

“Responda à pergunta!”

“Respondeu alegre ao bilhete que recebera.”

A pessoa a quem se responde também é objeto


indireto: responde-se algo a alguém.

“Seu pai está falando com você. Responda a ele!”

“Respondeu à mãe que voltaria em breve.”


VIR

Comporta-se da mesma maneira que chegar e ir. É


intransitivo, mas admite adjunto adverbial de lugar,
ao qual se conecta pela preposição a. Vem-se a um
lugar.

“Meus pais vieram à cidade.”

“Vim a você para pedir um favor.”

VISAR

No sentido de mirar ou colocar o visto em algo, é


transitivo direto: visa-se alguma coisa.

“A águia visou a lebre ao longe.”

“O soldado visava o alvo com cautela.”

No sentido de almejar, ter em vista, pretender, ter como


objetivo, é transitivo indireto. Espera a preposição a.

“Ele só visa ao lucro.”

“Estou visando à posição de gerente.”

Neste último sentido, admite-se a omissão da


preposição quando o complemento é verbo no
infinitivo.
“Viso conquistá-la.”

“Viso crescer espiritualmente.”

Além disso, embora não seja consenso, alguns


gramáticos já admitem a transitividade direta no
último sentido (“Ele só visa o lucro”). Prefira, porém,
seguir o uso com a preposição a.

4.2. REGÊNCIA NOMINAL

Agora, os nomes — substantivos, adjetivos, advérbios


— que esperam a preposição a.

ACOSTUMADO

Admite tanto a preposição com como a preposição a.

“Vim do Canadá; não estou acostumado com todo


este calor.”

“Vim do Canadá; não estou acostumado a todo este


calor.”

“Era mimado, não acostumado às dificuldades da


vida.”
AFEIÇÃO

Acompanha-se das preposições a ou por.

“Tenho muita afeição por ela!”

“Tenho muita afeição a ela!”

“Quanta afeição às quinquilharias…”

“Quanta afeição pelas quinquilharias…”

ALHEIO

Admite as preposições a e de.

“Você parece viver numa bolha: sempre alheio a


tudo!”

“Você parece viver numa bolha: sempre alheio de


tudo!”

“Ando um tanto alheio às notícias.”

AMOR

Costumamos usar por, porém admite-se também a e


de.
Especialmente quanto à preposição de, deve-se cuidar
da ambiguidade.

“Quanto amor tinha pela moça!”

“Quanto amor tinha à moça!”

“Quanto amor tinha da moça!”

“Mantenha vivo seu amor por Deus.”

“Mantenha vivo seu amor a Deus.”

“Mantenha vivo seu amor de Deus.”

CULTO

Usa-se o substantivo culto (no sentido de adoração)


com as preposições a, de e por. Logo, com a preposição
a, pode haver crase.

“O culto às deusas da fertilidade era comum


naquela nação.”

“O culto das deusas da fertilidade era comum


naquela nação.”

“O culto pelas deusas da fertilidade era comum


naquela nação.”
FAVORÁVEL

Usa-se com a preposição a. É-se favorável a alguma


coisa.

“Sou favorável a que você receba um salário


maior.”

“O sujeito consciente é favorável à vida desde a


concepção.”

GRATIDÃO

Pode-se ter gratidão a ou para com alguém.

“Tenho muita gratidão a ti.”

“Tenho muita gratidão para contigo.”

“Que gratidão nutro às freiras que me ajudaram!”

HORROR

Sente-se horror a, de, por alguma coisa.

“Não o assuste. Ele tem horror a aranhas.”

“Passei a ter horror às atitudes mesquinhas de meu


pai.”
OBEDIÊNCIA

Assim como se obedece a alguém, também se tem


obediência a alguém.

“A obediência aos pais é essencial.”

“Não mostrarei obediência às autoridades


corruptas deste país.”

ÓDIO

Como é comum aos substantivos que expressam


sentimentos, afeições, inclinações, pode-se empregar
a preposição a — além, aqui, de contra, de, para com,
por.

“O ódio a quem discorda de você é a razão de sua


conduta detestável.”

“Tenho profundo ódio às raposas que devastaram


nosso galinheiro.”

PAIXÃO

Usa-se com as preposições a, de, por.

“A paixão às riquezas é a raiz de todo mal.”


“A paixão das riquezas é a raiz de todo mal.”

“A paixão pelas riquezas é a raiz de todo mal.”

PARALELO

Usa-se o adjetivo paralelo (o que segue na mesma direção)


com a preposição a.

“Esta linha é paralela àquela.”

“Construa seu muro paralelo ao meu.”

PRESTES

Também se emprega com a preposição a o adjetivo


prestes no sentido de iminente, próximo. No entanto,
como em tal acepção é acompanhado de verbo no
infinitivo, não deve haver crase.

“Estou prestes a sair de casa.”

“A chuva está prestes a cair.”

PRÓXIMO

Usam-se as preposições de e a. Uma coisa está


próxima de ou a outra.
“O mercado fica próximo ao shopping.”

“O mercado fica próximo do shopping.”

“Caminhe próximo à guia.”

“Caminhe próximo da guia.”

RELATIVO

Uma coisa é relativa (referente) a outra.

“A cobrança relativa à compra de janeiro será


realizada em fevereiro.”

“Esta reunião é relativa aos problemas pelos quais


nossa empresa tem passado.”

RESPEITO

Admite várias preposições: a, por, para com etc.

“O respeito às autoridades é fundamental.”

“Onde está o respeito à sua mãe? E o respeito ao


seu pai?”
TENDÊNCIA

O substantivo tendência admite as preposições a, para,


de.

“A tendência ao tabagismo é genética.”

“A tendência à depressão também é genética.”


5. NA LITERATURA

Como sempre afirmo, é por meio da boa literatura de


língua portuguesa que vemos a norma aplicada e o
excelente uso dos recursos de nosso idioma, que são
amplíssimos. Trago de nossos melhores autores, pois,
alguns exemplos de emprego da crase (ou de sua
omissão), com breve explicação abaixo.

“As irmãs temiam-no, tirante Rita, a mais nova, com


quem ele brincava puerilmente, e a quem obedecia, se
ela lhe pedia…”
(Amor de perdição, Camilo Castelo Branco)

De acordo com a regência verbal, o verbo obedecer


liga-se a seu complemento por meio da preposição
a: “Obedeço a alguém”.

O pronome relativo quem, no entanto, jamais se


acompanha de artigo feminino, como já vimos, de
sorte que não ocorre o fenômeno da crase.

Quem, aliás, retoma Rita: a personagem descrita


obedecia à Rita.

“Realmente estava em falta para com a família, que


apenas visitara com um cartão, e à qual devia muitas
finezas!”
(Iracema, José de Alencar)
Deve-se algo a alguém.

Como estudamos no item 1, c, o encontro da


preposição a (dever a) com o pronome relativo a
qual ocasiona a crase: à qual.

O relativo a qual, nesse trecho, retoma a família. O


indivíduo mencionado devia muitas finezas à
família.

“Mas dizem que é tão brando e generoso, tão fácil de


perdoar a traidores!”
(O arco de Sant’Ana, Almeida Garrett)

Perdoa-se a alguém.

No entanto, como traidores não é vocábulo


feminino e nem sequer está acompanhado de
artigo, não há crase.

Se houvesse artigo, este seria os, e a construção


assim ficaria: “…perdoar aos traidores!”.

“E deixava-se viver, gozando como um favor cada dia


que vinha sentindo vagamente, à distância, alguma
coisa de indefinido e de tenebroso onde se afundaria!”
(O primo Basílio, Eça de Queirós)
“…uma claraboia reluzia, a distância, como uma velha
lâmina de prata…”
(O primo Basílio, Eça de Queirós)

Temos aqui, na mesma obra, um caso em que a


locução adverbial a distância é gravada com crase, e
outro caso em que não há crase. O significado é o
mesmo — ao longe.

Não há, como esclareci no tópico 3.9., consenso


quanto à necessidade do acento grave em tal
expressão.

“Além… os cerros de granito dessa formosa terra de


Guanabara, vacilantes, a lutarem com a onda invasora
de azul, que descia das alturas…”
(Espumas flutuantes, Castro Alves)

Não há crase antes de verbos — simplesmente


porque verbos não se acompanham de artigo
feminino.

“Marta tomou por uma rua transversal, dobrou à


esquerda, enveredou por uma avenida paralela àquela
em que habitava e onde as construções eram ainda
raras. Dirigiu-se a um pequeno prédio de azulejos
verdes.”
(A confissão de Lúcio, Mário de Sá-Carneiro)
Há três situações, nesse único trecho, que nos
interessam.

À esquerda: locução adverbial que, como emprega a


maioria dos gramáticos e escritores, leva crase.

Àquela: contração da preposição a com o pronome


aquela. A preposição a, no contexto, pertence a
paralela: uma coisa é paralela a outra. A avenida é
paralela a “aquela em que habitava…”.

A um: se não pode haver artigo a antes de “um


pequeno prédio”, não pode haver crase. Resta a
preposição a de “dirigir-se a algum lugar”.

“O amigo a cujas instâncias se deveu a viagem a


Santarém: Passos Manuel.”
(Viagens na minha terra, Almeida Garrett)

Cá está presente apenas a preposição a, exigida


quando se quer dizer que uma coisa deve-se a
outra, isto é, aconteceu graças a outra.

O pronome relativo cujo(a)(s) jamais se acompanha


de artigo, razão pela qual jamais haverá crase.

No contexto, diz-se que a viagem a Santarém


deveu-se às instâncias do amigo Passos Manuel.
Cujas indica que instâncias é posse de o amigo.
“No dia seguinte à mesma hora voltei à casa de Lúcia…”
(Lucíola, José de Alencar)

À hora está qualificada pelo pronome mesma, o que


não dispensa a necessidade de crase para indicar
horário. Aliás, trocando-se hora por horário,
teríamos ao mesmo horário.

À casa acompanha-se do fenômeno da crase


porque, conforme ensinei em 3.1., o termo que
especifica a casa (de Lúcia) permite a presença do
artigo feminino, possibilitando a crase. Caso o
personagem dissesse simplesmente que voltara à
própria casa, a seu lar, não se empregaria o artigo
e, portanto, não ocorreria a crase: “voltei a casa”.

“Quanto às larguezas do marido, não esqueças que o


parente era defunto, e o defunto um parente menos.”
(Esaú e Jacó, Machado de Assis)

Há preposição a na expressão quanto a (sobre; com


relação a; com respeito a; no que se refere a).
Encontrando-se a preposição com artigo feminino
a, portanto, ocorre a crase: quanto a + as larguezas
do marido.
“…porque preferia um covil de feras habitado por
Pelágio às delícias de Tárraco, sobre a qual não
tardaria, talvez, a pesar o férreo jugo dos
muçulmanos.”
(Eurico, o presbítero, Alexandre Herculano)

Trata-se da regência do verbo preferir. Prefere-se


uma coisa a outra. No contexto, preferiu-se um
covil de feras a as delícias de Tárraco: a com as
resulta em às.

“As lendas das ‘cidades encantadas’, na Bahia, que têm


conseguido dar à fantasia dos matutos o complemento
de sérias indagações de homens estudiosos…”
(Os sertões, Euclides da Cunha)

Dá-se alguma coisa a (para) alguém. Esse alguém,


no contexto, é a fantasia. Dar a + a fantasia resulta
em dar à fantasia.

Noutras palavras, o complemento de sérias


indagações foi dado pelas lendas à (para a) fantasia
dos matutos.

“Enfim, concluiu a inglesa, custa-me crer que ela ame


a alguém neste mundo.”
(A mão e a luva, Machado de Assis)
O verbo amar é transitivo direto, ou seja, liga-se a
seu complemento sem preposição. Entretanto,
como vimos no tópico 3.7., e, certos pronomes
indefinidos podem ser usados como objetos
diretos preposicionados, como é o caso de alguém
aí: o autor poderia dizer “que ela ame alguém”,
mas preferiu empregar a preposição — “que ela
ame a alguém”.

Importante perceber que apenas a preposição a


está presente no exemplo. Não há crase, porque o
pronome alguém nunca se acompanha de artigo
definido (nem o alguém, nem a alguém).

“Discutido o programa, escolhido o edifício, orçadas


as obras de pedra e madeira, chegou a notícia às
gazetas.”
(Amor de salvação, Camilo Castelo Branco)

Uma coisa (ou alguém) chega a algum lugar. No


caso, esse lugar é as gazetas. A notícia chegou a + as
gazetas: às gazetas.

“Se não fosse a astronomia, não descobriria eu tão


cedo as dez libras de Capitu; mas não é por isso que
torno a ela, é para que não cuides que a vaidade de
professor é que me fez padecer com a desatenção de
Capitu e ter ciúmes do mar.”
(Dom Casmurro, Machado de Assis)
Quem torna, no sentido de regressar (voltar) a
alguma coisa, a algum lugar, torna a algo ou a
alguém — é como dizer que volta para algo, para
alguém. Como, porém, os pronomes pessoais retos
jamais se acompanham de artigo definido, resta
apenas a preposição a: o narrador tornou a ela
(assim como poderia dizer, se se tratasse de
homem, tornou a ele).
6. EXERCÍCIOS

Aliada à teoria e à demonstração, a prática de


exercícios é uma das maneiras mais eficazes de
verdadeiramente assimilar o conteúdo estudado.
Tendo isso em vista, trago algumas questões que eu
mesmo elaborei com base em nossa preciosa
literatura. O gabarito está no fim.

1) Em qual dos seguintes exemplos está incorreta a


ocorrência da crase no trecho sublinhado?

a) “…e, sem saber como, ele se achou envolvido


numa disputa com Veremudo Peres, à qual
chamara a atenção não só dos cavaleiros que se
achavam mais próximas, mas até do Conde de
Trava e de D. Teresa.”

b) “…balbuciou ela como admirada desta pergunta,


à qual o seu coração julgava ter respondido de
muito.”

c) “Por fim ergueu a fronte com o meneio de


rainha, que às vezes tomava a sua cabecinha loura,
à qual só faltava o diadema…”

d) “A criança ia lagrimosa e carecida de meiguices


e consolações de alguma senhora que lhe falasse a
linguagem polida à qual estava afeita.”
e) “Estácio sentiu-se movido de imperiosa
curiosidade, à qual vinha misturar-se uma sombra
de despeito e ciúme.”

2) Em qual dos seguintes exemplos está incorreta a


ausência da crase no trecho destacado?

a) “E Hermengarda sentia uma ânsia vertiginosa de


se atirar aquela voragem; uma como atração
magnética, voluptuária, indizível…”

b) “O cavaleiro, segurando violentamente o braço


da donzela, desfez aquela espécie de encanto fatal,
obrigando-a a recuar alguns passos.”

c) “Tens alguma coisa; aposto que foi aquela carta?”

d) “…quem mais contava com isso era a vizinha do


barbeiro, aquela a quem ele chamava o agouro do
pequeno.”

e) “Um vago ar de tristeza, de amargura, que após


o seu casamento ainda de vez em quando o
anuviava, esse mesmo desaparecera hoje por
completo — como se, com o decorrer dos dias, ele
já tivesse esquecido o acontecimento cuja
lembrança lhe suscitava aquela ligeira nuvem.”
3) No excerto abaixo, de Euclides da Cunha, qual é a
ordem correta dos termos que preenchem as
lacunas, conforme a presença ou a ausência da crase?

“_ 3 de junho, chegamos _ Novo Lugar, onde


estacionara _ comissão administrativa brasileira,
tolhida pela vazante; _ 21, estávamos em Cataí; _ 29,
em Curanja. Compensáramos bem, nessa arrancada,
parte do tempo que se perdera.”

a) À, a, a, à, à.

b) A, à, a, a, a.

c) A, a, a, a, a.

d) À, à, a, à, à.

e) A, a, à, a, a.

4) Quanto ao trecho abaixo, assinale a única


alternativa que apresenta uma informação correta
sobre as partes destacadas.

“Helena, que tivera tempo de se tranquilizar, voltou o


rosto para a rua, e começou a rufar com os dedos na
vidraça.”
a) Em “voltou o rosto para a rua”, pode-se
empregar a crase facultativamente, sem prejuízo
do sentido: “voltou o rosto para à rua”.

b) Em “começou a rufar com os dedos”, pode-se


adicionar o artigo o sem prejuízo do sentido:
“começou ao rufar com os dedos”.

c) Não se emprega crase em “voltou o rosto para a


rua” porque a rua não está especificada. Caso
estivesse, empregar-se-ia: “voltou o rosto para à
rua Pio XII”.

d) Se fosse adicionado o pronome possessivo sua


junto de rua, em “voltou o rosto para a rua”, a crase
seria facultativa: “voltou o rosto para a/à sua rua”.

e) As construções “voltou o rosto para a rua” e


“começou a rufar com os dedos” não admitem
crase.

5) Apenas uma das lacunas destacadas a seguir


admite facultativamente, segundo a norma culta, a
crase: tanto a como à. Assinale a alternativa correta.

a) “Luísa bordava, calada; a luz do candeeiro,


abatida pelo abajur, dava aos seus cabelos tons de
um louro quente, resvalava sobre _ sua testa
branca como sobre um marfim muito polido.”
b) “Carlos respirava como desoprimido de um
grande peso, ouvindo as explicações da prima que
bem claro lhe mostravam _ sua perfeita ignorância
dos fatais segredos da família.”

c) “Tinham-no criado; ele tinha servido. Também


não encontrou grande resistência _ sua
deliberação.”

d) “Morrer de amor, morrer por amor, era _ sua


clara predestinação.”

e) “Como o arcebispo é um hábito visual e auditivo


do brasileiro, vemos _ sua figura e ouvimos o seu
nome por toda a parte.”

6) No excerto abaixo, de Machado de Assis, qual é a


ordem correta dos termos que preenchem as
lacunas, conforme a presença ou a ausência da crase?

“Foi por esse tempo que Rita, desconfiada e medrosa,


correu _ cartomante para consultá-la sobre _
verdadeira causa do procedimento de Camilo. Vimos
que _ cartomante restituiu-lhe _ confiança, e que o
rapaz repreendeu-a por ter feito o que fez.”

a) à, a, a, à.

b) à, a, a, a.
c) a, a, a, a.

d) a, à, à, à.

e) à, a, à, a.

7) Em qual dos seguintes exemplos está incorreta a


ausência da crase no trecho destacado?

a) “Logo depois rejeitava a ideia, vexado de si


mesmo, e seguia, picando o passo, na direção do
Largo da Carioca, para entrar num tílburi.”

b) “…a moça começou a cantar; mas as primeiras


notas, sentindo-se tolhida pela posição, abandonou
o piano…”

c) “Cruzes! — gritou a senhora D. Patrocínio,


horrorizada. — Ir a Paris!”

d) “A vista é bonita, mas nunca pude tolerar o mau


cheiro que há aqui, em certas ocasiões, disse Carlos
Maria.”

e) “Mando-lhe estas frutinhas para o almoço, se


chegarem a tempo; e, por ordem do Cristiano, fica
intimado a vir jantar conosco, hoje, sem falta.”
8) Assinale a única alternativa em que o emprego da
crase está correto no destaque.

a) “Para teus filhos és, no caminho da vida, / Como


a faixa de luz que o povo hebreu guiava / À longe
Terra Prometida.”

b) “Quem o encanto dirá destas noites de estio? /


Corre de estrela à estrela um leve calefrio…”

c) “À amplidão se estende, iluminada e calma…”

d) “Alva, à luz do luar cai sobre a tua casa.”

e) “De qual de vós desceu para o exílio do mundo /


À alma desta mulher, astros do céu profundo?”

9) Assinale a única alternativa em que o emprego da


crase está incorreto no destaque.

a) “Assim é que as enseadas serenas estão para


além das vagas montuosas, que lá cospem o
náufrago aferrado à sua tábua.”

b) “Ele aqui vai subindo as escadas que nos levam à


primeira sala.”

c) “Depois do almoço cavalgámos, embrenhámo-


nos por uns quinchosos pedregosos, e saímos à
estrada entre Guimarães e Famalicão.”
d) “Fora educada num convento; saíra do convento
para casar com o filho do seu tutor, moço idiota e
abominável; e saíra de sua casa para à de Afonso de
Teive…”

e) “O tio, como ele não voltasse ao segundo dia,


meteu-se à sua carruagem e foi procurá-lo e
entregar-lhe cartas recebidas do Norte.”

10) Quanto ao trecho abaixo, assinale a única


alternativa que apresenta uma informação correta
sobre as partes destacadas.

“Era depois mais longe ainda a Grécia; desde a aula de


retórica, ela aparecera-me sempre como um bosque
sacro de loureiros, onde alvejam frontões de templos,
e, nos lugares de sombra em que arrulham as pombas,
Vênus de repente surge, cor de luz e cor-de-rosa,
oferecendo a todo o lábio, ou bestial ou divino, o
mimo dos seus seios imortais.”

a) Em “desde a aula de retórica”, a crase é


facultativa: pode-se escrever tanto “desde a aula de
retórica” como “desde à aula de retórica”.

b) Mesmo que se substitua “oferecendo a todo o


lábio” por “oferecendo a toda a boca”, não há
possibilidade de crase.
c) Em “Era depois mais longe ainda a Grécia”, se
for removido o advérbio ainda, poderá ocorrer a
crase: “Era depois mais longe à Grécia”.

d) Em “desde a aula de retórica”, caso os termos


sejam levados para o plural, deverá ocorrer a crase:
“desde às aulas de retórica”.

e) Em “oferecendo a todo o lábio”, não ocorre


crase porque não está presente a preposição a.

11) Quanto ao trecho abaixo, assinale a única


alternativa que apresenta uma informação correta
sobre as partes destacadas.

“A doçura que mete na alma a vista refrigerante de


uma jovem seara do Ribatejo nos primeiros dias de
abril, ondulando lascivamente com a brisa temperada
da Primavera, — a amenidade bucólica de um campo
minhoto de milho, à hora da rega, por meados de
agosto, a ver-se-lhe pular os caules com a água que lhe
anda por pé, e à roda as carvalheiras classicamente
desposadas com a vide coberta de racimos pretos —
são ambos esses quadros de uma poesia tão graciosa e
cheia de mimo, que nunca a dei por bem traduzida
nos melhores versos de Teócrito ou de Virgílio, nas
melhores prosas de Gessner ou de Rodrigues Lobo.”
a) Em “a vista refrigerante de uma jovem”, a vista é
locução adverbial feminina e, como tal, poderia
corretamente receber o acento grave se o autor o
desejasse: “à vista refrigerante de uma jovem
seara”.

b) Em “a ver-se-lhe pular os caules” e “nunca a dei


por bem traduzida”, a é preposição, e não ocorre a
crase porque não há artigo feminino a em seguida.

c) Em “A doçura que mete na alma” e “a vista


refrigerante de uma jovem seara”, a é artigo
feminino, e não ocorre a crase porque não há
preposição a antes de si.

d) Em “à hora da rega”, se fosse inserido o


pronome aquela antes de hora, a construção
adaptada, sem prejuízo do contexto, seria “aquela
hora da rega”.

e) Em “com a brisa temperada”, “com a água que


lhe anda” e “com a vide coberta de racimos
pretos”, apenas dois desses trechos não recebem
crase pelo mesmo motivo, enquanto um terceiro
não apresenta crase por outra razão gramatical.
12) No excerto abaixo, de Machado de Assis, qual é a
ordem correta dos termos que preenchem as
lacunas, conforme a presença ou a ausência da crase?

“Tão depressa vi desaparecer o agregado no corredor,


deixei o esconderijo, e corri _ varanda do fundo. Não
quis saber de lágrimas nem da causa que as fazia
verter _ minha mãe. _ causa eram provavelmente os
seus projetos eclesiásticos, e _ ocasião destes é _ que
vou dizer, por ser já então história velha; datava de
dezesseis anos.”

a) à, à, À, a, a.

b) a, à, A, a, à.

c) à, a, A, a, à.

d) a, a, A, a, à.

e) à, a, A, a, a.

13) Quanto ao excerto seguinte, de José de Alencar,


assinale a alternativa correta sobre a ocorrência ou a
ausência de crase nas lacunas.

“Um rosto moreno, coberto por uma longa barba


negra, entre _ qual o sorriso desdenhoso fazia brilhar
_ alvura de seus dentes; olhos vivos, _ fronte larga,
descoberta pelo chapéu desabado que
caía sobre o ombro; alta estatura, e uma constituição
forte, ágil e musculosa, eram os principais traços deste
aventureiro. _ pequena cavalgata tinha deixado _
margem do rio, que não oferecia mais caminho, e
tomara por uma estreita picada aberta na mata.”

a) Todas as lacunas devem ser preenchidas com a.

b) Três lacunas devem ser preenchidas com a;


duas, com à.

c) Três lacunas devem ser preenchidas com à;


duas, com a.

d) Quatro lacunas devem ser preenchidas com a;


uma, com à.

e) Todas as lacunas devem ser preenchidas com à.

14) Quanto ao excerto abaixo, de Camilo Castelo


Branco, assinale a alternativa correta sobre a
ocorrência ou a ausência de crase nas lacunas.

“Ora, Simão Botelho saíra de Coimbra com _ sua


mesada, que não era grande, e quase lha absorvera o
aluguel da cavalgadura, e _ gorjeta generosa que dera
ao arreeiro, _ quem devia o conhecimento do
prestante ferrador. As relíquias desse dinheiro dera-as
ele _ portadora da carta naquele dia. Má situação!
Lembrou-se de escrever _ mãe. Que lhe diria ele?”
a) Todas as lacunas devem ser preenchidas com a.

b) Três lacunas devem ser preenchidas com a;


duas, com à.

c) Três lacunas devem ser preenchidas com à;


duas, com a.

d) Quatro lacunas devem ser preenchidas com a;


uma, com à.

e) Todas as lacunas devem ser preenchidas com à.

15) Em qual dos seguintes exemplos está incorreta a


ocorrência da crase no trecho destacado?

a) “Não achou a moça na sua alegre alma palavras


em resposta à doçura que o rosto do mancebo
exprimia.”

b) “Ontem fui à cerca, e vi lá uma porta de carro


que dá para o caminho.”

c) “A carta congratulatória não a recebeu Teresa,


porque viera à mão de seu pai.”

d) “É impossível à nossa correspondência. Vou ser


tirada daqui para outro convento. Espera em
Coimbra notícias minhas.”
e) “Quis Teresa nessa noite escrever a Simão; mas
a criada da prelada, obedecendo às suspeitas da
ama, não desamparou a cabeceira do leito da
enferma.”
6.1. GABARITO

1A
2A
3C
4E
5C
6B
7B
8A
9D
10 B
11 C
12 E
13 A
14 B
15 D
Ao fim chegamos.

É com grande prazer que entrego este material;


espero realmente que lhe tenha sido útil e que, a
partir daqui, facilite sua vida na compreensão da
crase.

Há detalhes, há pormenores, há exceções, como


ocorre em quase toda a gramática, mas a fórmula
essencial não devemos esquecer: a crase (como repito
incansavelmente) é a fusão de dois a. Leve tal verdade
consigo, e com efeito enxergará a crase com muito
mais tranquilidade.

A própria língua portuguesa, aliás, é muito mais lógica


do que parece: quanto mais você estudar, mais o
perceberá.
CONTATO

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Gabriel Lago
Revisor e preparador de textos

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