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1.

TITULO:

RESSIGNIFICANDO O CURRÍCULO ESCOLAR NO ENSINO FUNDAMENTAL


DO CAMPO: O Estudo de Caso do Componente Agricultura Familiar e Práticas
Agroecológicas no Município de Marabá-PA.

2. INTRODUÇÃO

O documento em questão diz respeito a um projeto de intenção de pesquisa para


ingresso no Programa de Pós Graduação em Desenvolvimento Rural e Gestão de
Empreendimentos Agroalimentares, do Instituto Federal do Pará – Campus de
Castanhal, stricto sensu, em nível de doutorado.

A pesquisa tem como objeto de estudo o Componente Curricular: Agricultura


Familiar e Práticas Agroecológicas, sendo este, integrante da parte diversificada da
“Proposta Pedagógica Curricular Pensando em Rede 1” do município de Marabá. O
componente foi criado pela necessidade de desenvolver uma educação voltada para o
ensino do campo, visando deste modo, atender os anseios sócio produtivos dos
agricultores familiares do município de Marabá-PA. É uma possibilidade real e concreta
de interlocução e diálogo com o contexto rural e os povos do campo. Desse modo, uma
ação fundamental para o estreitamento da relação entre estudante e a escola (MARABÁ,
2020).
Entre os motivos da escolha dessa temática para a pesquisa, diz respeito a sua
proximidade com minha trajetória profissional. Neste sentido, há quase vinte anos
venho atuando na região do Sudeste Paraense em atividades de pesquisa, extensão e
educação do campo, fato este que me possibilitou um contato com os sujeitos do campo
e os movimentos sociais.
A participação na Escola Família Agrícola de Marabá (2003-2006),
proporcionou experienciar a metodologia da pedagogia da alternância e a possibilidade
concreta de construção curricular para as escolas das comunidades rurais. Sobretudo,
vale ressaltar a contribuição histórica desta experiência educativa, como referência para
materialização da proposta pedagógica do Instituto Federal do Pará – Campus Rural de
Marabá. Somando-se a esse contexto, está a minha participação no Fórum Regional de
Educação do Campo (FREC), cuja ação na região tem sido essencial na reflexão e na
1
construção do Movimento pela Educação do Campo no Sul e Sudeste paraense. E
também, destaco a relevância da atuação como educador no Campus rural de Marabá,
somando mais de dez anos, onde tenho atuado prioritariamente na formação de
professores, na orientação de planejamento integrado, e na construção curricular na
perspectiva da educação do campo.
E, por fim, ressalto/ a minha participação e envolvimento direto na elaboração
do Componente Curricular Agricultura Familiar e Práticas Agroecológicas. Essa
experiência possibilitou uma vivência reflexiva e a compreensão da dimensão
pedagógica do componente, que serão fundamentais para a análise do processo de
implantação e materialização.
A escolha do componente como lócus de estudo desta pesquisa deve-se também
mediante a sua legitimidade, originalidade e relevância pedagógica. E, sobretudo pelo
interesse institucional na implantação em outras escolas, constituindo desta forma, uma
possibilidade concreta da materialização de uma proposta pedagógica para o campo no
município de Marabá, respeitando a diversidade sociocultural, econômica e ambiental
dos distintos territórios onde situa-se as escolas, e assim, primando pelo pluralismo
pedagógico.
Neste sentido, a pesquisa se traduz em uma tentativa de equacionar uma
demanda institucional – a materialização do Componente Curricular Agricultura
Familiar e Práticas Agroecológicas - ao produto final do doutorado em
Desenvolvimento Rural e Gestão de Empreendimento Agroalimentares, do Campus de
Castanhal do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Pará. Esse fato
proporcionará dinâmica, vida e significado a esta pesquisa, como também uma
ressignificação de minha atuação profissional na instituição, resultado de uma
articulação estreita entre trabalho e a formação.
Essa pesquisa se torna pertinente quando nos deparamos com a ausência de
estudos e referências não só na região, mas em nível de Brasil que retratem a formação
na perspectiva da educação do campo como estratégia para o desenvolvimento rural
sustentável, sobretudo, os estudos relacionados à construção metodológica destas
experiências de ensino. Neste sentido, a presente pesquisa é fundamental para obtermos
elementos que ajudem a materializar na prática, a resignificação curricular nas escolas
do campo, sendo esta uma questão atual e relevante no cenário da educação nacional
(CALDART, 2009, 2019; HAGE, 2005; FIRIGOTTO; CIAVATTA; RAMOS, 2005;
MARINHO; 2007, 2016; MOLINA, 2011; SCALABRIN, 2011; SOBRINHO, 2013;
SOUSA, 2011).
Em outra perspectiva a pesquisa justifica-se pela existência de uma população de
crianças e jovens agricultores no município de Marabá que necessitam acessar a
formação escolar, mas uma formação que lhes permita contribuir concretamente no
desenvolvimento de suas comunidades e na construção de possibilidades para seus
projetos de vida. E, sobretudo, afirma a educação como instrumento essencial no
processo de transformação e desenvolvimento rural sustentável do campo (IFPA, 2009).
O Componente Curricular Agricultura Familiar e Práticas Agroecológicas foi
criado tendo como respaldo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
(9394/1996), que define princípios e objetivos curriculares gerais, considerando uma
base nacional comum e uma parte diversificada na construção dos currículos: a) A Base
Nacional Comum Curricular (BNCC) que garante uma unidade nacional para que todos
os alunos possam ter acesso aos conhecimentos mínimos necessários ao exercício da
vida cidadã e uma Parte Diversificada do currículo, também obrigatória, que se compõe
de conteúdos complementares, identificados na realidade regional e local, que devem
ser escolhidos em cada sistema ou rede de ensino. b) As Diretrizes Nacionais
Curriculares da Educação Básica (BRASIL, 2013) e as Diretrizes operacionais para as
escolas do Campo - Resolução CNE/CEB 1/ 2002 (BRASIL, 2002), que orienta a
necessidade de construção do currículo, de forma que contemple a diversidade do
campo em seus aspectos sociais, culturais, políticos, econômicos, de gênero, geração e
etnia” (MARABÁ, 2020).

No intuito de garantir a legalidade institucional referente a validação e


reconhecimento do Conselho Escolar Municipal, o componente curricular Agricultura
Familiar e Práticas Agroecológicas foi vinculado a área de conhecimento das ciências
da natureza. Embora, epistemologicamente possua uma ligação “mais estreita” com a
área das ciências agrárias.
A área de ciências agrárias engloba um conjunto de conhecimentos científicos
aperfeiçoados ao longo dos tempos que, relacionados aos princípios e concepções da
Educação do Campo, favorecem compreensão dos processos culturais; as estratégias de
produção e reprodução social; as relações de trabalho vividas pelos sujeitos do campo
em suas lutas cotidianas para o desenvolvimento das comunidades rurais, sobretudo,
para manutenção desta identidade como elementos essenciais do processo formativo
(MARABÁ, 2020).
Desse modo, o campo do saber das ciências agrárias abrange os aspectos da
agricultura, da pecuária, da relação da produção com o meio ambiente, dentre outros,
visando o aumento da produção, da produtividade, aliados a conservação e preservação
dos recursos naturais e se propõe a oportunizar novas estratégias de formação,
contribuindo para uma atuação capaz de compreender as necessidades e especificidades
dos processos de produção e de promoção do desenvolvimento do campo no âmbito da
Agricultura Familiar2 (SANTOS, ett, al. 2014).
No município de Marabá, a garantia do direito a esse componente se estende
ainda por meio do Plano Municipal de Educação (2002-2021) que garante, na meta 6 e
nas estratégias 6.3 e 6.22 a inserção de aulas práticas, devidamente articuladas aos
processos formativos. De acordo com as metas do PME, o município de Marabá deverá:
6.3 Reformular a Proposta Curricular da Educação do Campo e Ribeirinhos,
considerando as suas especificidades, em consonância com as Diretrizes
Curriculares Nacionais da Educação Básica. (Redação dada pela Lei
Municipal nº 17.682 de 19 de junho de 2015)

6.22 Ampliar a oferta da Educação Infantil, do Ensino Fundamental e suas


modalidades no e do campo, respeitando as peculiaridades de cada região,
com
infraestrutura apropriada, estimulando a prática agrícola e tecnológica com
base na agroecologia e na socioeconomia solidária. (inserida pela Lei
Municipal nº 17.682 de 19 de junho de 2015).

Diante destas demandas e desafios, o Componente Curricular Agricultura


Familiar e Práticas Agroecológicas foi elaborado a partir de uma parceria entre a
Secretaria Municipal de Educação de Marabá (SEMED) e o Instituto Federal do Pará -
Campus Rural de Marabá. As etapas de elaboração foram iniciadas no ano de 2019,
porém somente no ano de 2021 recebe a aprovação final do conselho escola, protocolo

O componente será implantado em duas escolas (Escola Municipal de Ensino


Fundamental Carlos Marighela e a Escola Família Agrícola de Marabá – Jean Hebette),
ambas vinculadas a Secretaria Municipal de Educação de Marabá-PA. As escolas foram

2
Agricultura Familiar é uma instituição de reprodução da família, cujo núcleo está na relação direta com
a terra e com a produção agrícola. Uso a concepção de agricultura familiar no seu sentido histórico e
antropológico, como unidade dessa reprodução social da família, regulada por valores de tradição
familiar. Nela, as estratégias de reprodução não se limitam a reproduzir, isto é, subsistir e permanecer.
Elas também dão conta das novas necessidades e dos novos desafios que são continuamente gerados pelas
transformações econômicas e sociais (MARTINS, 2001, p. 29).
escolhidas mediantes os seguintes critérios estabelecidos pela SEMED: 1) escolas
localizadas no campo; 2) funcione em tempo integral; 3) desenvolva experiências
diferenciadas no município e utilizem os pressupostos da educação do campo e da
Pedagogia da Alternância, intercalando tempo escola e tempo comunidade; 4) possuam
estrutura física necessária para a garantia da permanência ampliada dos estudantes; 5)
possuam profissionais habilitados para atuar.

O componente de Agricultura Familiar e Práticas Agroecológicas propõe


desenvolver habilidades e competências nos estudantes, tendo a realidade/localidade
(assentamentos, vilas, distritos, acampamentos, etc.) desses estudantes onde vivem suas
experiências diárias, como objeto de estudo, reflexão e proposição de transformações a
partir dos conhecimentos construídos na escola. Sobretudo, por meio de ações e práticas
solidárias, cooperativas e associativas, envolvendo a produção agropecuária e
relacionando-a aos aspectos políticos, sociais, ambientais, culturais, idenitários e do
mundo do trabalho (MARABÁ, 2020).

3. PROBLEMÁTICA

A ausência e a má qualidade das escolas localizadas no campo, como também a


descontextualização do currículo têm influenciado diretamente na expulsão de um
grande contingente humano em direção aos centros urbanos, na expectativa de encontrar
melhores condições, perspectivas de vida e possibilidade de estudo. Essa mobilidade
espacial contribui para diminuição do vínculo com a terra, o mesmo acontece com a
coesão da unidade familiar, aumentando a despesa e principalmente diminuindo a força
de trabalho da família (MARINHO, 2016).
Esta situação é fruto do reflexo das políticas de desenvolvimento que
historicamente foram direcionadas ao campo, cujas consequências aumentaram o estado
de pobreza no meio rural, pois a modificação do perfil técnico e econômico da nossa
agricultura se fez com exclusão de uma parcela importante dos camponeses, gerando
concentração de terras e de renda, como também tornando os conflitos agrários e a
violência cada vez mais latente (MOREIRA; CARMO, 2004).
O modelo de educação ofertado no campo corresponde ao da escola “rural”
referenciado em uma visão urbanocêntrica e etnocêntrica resultou na negação da
diversidade, das culturas, das diferentes formas e modos de vida, assim como dos
conhecimentos e saberes das populações do campo (CALDART; MOLINA, 2004;
FERNANDES; MOLINA, 2004).

Os estudos de Stedile (2011) Apud Marinho (2016) mostram que na última


década, 835 mil jovens brasileiros deixaram o campo em busca de oportunidades nas
áreas urbanas, tendo como referência os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística, segundo ele o êxodo da juventude se explica pela falta de oportunidades,
sendo assim, uma ação necessária para garantir o acesso à educação em todos os níveis,
sem deixar de considerar as realidades locais.
A política educacional no meio rural de uma forma geral não têm se
preocupado em desenvolver uma proposta pedagógica que assegure a permanência da
juventude na escola, e que atenda aos anseios dos processos sócios produtivos das
famílias camponesas, de modo, a contribuir com o melhoramento do sistema de
produção e, por conseguinte estimular a permanência da juventude no campo. Outro
fato deve-se a situação deficitária da infraestrutura existente nessas unidades de ensino 3
(MARINHO, 2016).
O reflexo deste descaso tem contribuído para transformar o campo em um
espaço cada vez mais envelhecido, ou seja, com pouca presença de jovens, fato este, que
tem preocupado e mobilizado estudiosos e movimentos sociais a fim de compreender as
perspectivas para continuidade do campesinato, como também as possibilidades de
reprodução social, ambiental e econômica das famílias camponesas (MARINHO, 2007).
A introdução da temática a agricultura familiar no currículo das escolas do
campo é uma medida fundamental para a melhoria da qualidade de vida e a
sustentabilidade no meio rural, esta ação tem sido desenvolvida em várias unidades
educativas do Brasil, materializadas a partir da adoção dos princípios e metodologias da
educação do campo4.

3
De acordo com os dados do Ministério da Educação no ano de 2012,  90% dessas escolas – um total de
68.651 unidades – não têm internet. A taxa de estabelecimentos sem energia elétrica é de 15% (11.413
escolas), enquanto 10,4% não contam com água potável (7.950) e 14,7% não apresentam esgoto sanitário
(11.214). Além disso, apenas 11% das escolas do campo têm biblioteca, 1,1% contam com laboratório de
ciências (MANDELLI, 2012 APUD MARINHO, 2016, p.45).
4
A especificidade da Educação do Campo, em relação a outros diálogos sobre educação deve-se ao fato
de sua permanente associação com as questões do desenvolvimento e do contexto na qual ela se enraíza.
Sua base de sustentação é que o campo deve ser compreendido para muito além de um espaço de
produção agrícola. O campo é espaço de vida, de produção de relações sociais; de produção de história,
cultura e conhecimento, de luta de resistência dos sujeitos que nele vivem (MOLINA, 2009, p.18).
No município de Marabá iniciativas como essas têm sido apoiadas e
desenvolvidas pelos movimento sociais do campo (Movimento Sem Terra-MST e
Federação dos Agricultores na Agricultura-FETAGRI) em parcerias com instituições
públicas (Secretaria Municipal de Educação-SEMED; Universidade Federal do Pará;
Instituto Federal do Pará - Campus Rural de Marabá; Universidade Federal do Sul e
Sudeste do Pará-UNIFESSPA; Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária),
assumindo uma dimensão regional. Desse modo, materializando um acúmulo histórico
de mais de 25 anos de ações concretas em prol da educação do campo, no qual geraram
experiências pedagógicas que vão desde Alfabetização de Jovens e Adultos; Ensino
Técnico, Ensino de Graduação, ao Ensino de Pós Graduação, em sua grande maioria
financiados com recursos do Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária
(MARINHO, 2016).
O acúmulo das experiências dos projetos educacionais, das ações educacionais
dos movimentos sociais do campo, e dos profissionais das instituições de ensino
superior e assistência técnica, possibilitou a criação de uma instituição de ensino pública
fundamentada na concepção de educação do campo, agroecologia e alternância
pedagógica5. Iniciando um processo de institucionalização das propostas de educação do
campo na região do Sudeste Paraense.
O Campus Rural de Marabá (CRMB)6 é sucessor da Escola Agrotécnica Federal
de Marabá criada pela Lei nº 11.534 sancionada pelo Presidente da República em 25 de
outubro de 2007 (BRASIL, 2007). Sobretudo, compõe a política de expansão da Rede
Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica do governo federal que
constituiu o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia (IFPA), a partir da
5
A alternância de tempos e espaços tem sido vista como uma forma de enfrentar na organização do
currículo a articulação entre teoria e prática e o envolvimento dos próprios estudantes como responsáveis
pela sua formação. Não se trata de alternar ou de buscar integrar tempos e espaços de teoria e de prática,
ou mesmo de aprendizados diferenciados que podem ser complementares na formação. A integração aqui,
que deve ser cuidadosamente pensada, precisa garantir a articulação entre as práticas e as discussões
teóricas destas mesmas práticas, em ambos os tempos e espaços. Pensando no objetivo da formação
profissional, a alternância a ser garantida é aquela entre períodos ou situações de trabalho escolares, no
sentido de criadas pelo curso, ou seja, práticas de campo, estágios, situações de trabalho real, da inserção
dos estudantes em processos de trabalho que existem e os envolvem independentemente do curso, mas
que o curso pode potencializar na formação, através do seu acompanhamento e pela formalização ou
reflexão sobre os conhecimentos ali produzidos (CALDART, 2010, p. 96).

6
Esta instituição tem como missão promover a educação profissional e tecnológica em diferentes níveis e
modalidades, sobretudo técnico integrado com o ensino médio, dos povos do campo da mesorregião do
sudeste do Pará, em atendimento as suas demandas sociais, econômicas e culturais e em sintonia com a
consolidação e o fortalecimento de suas potencialidades, estimulando a pesquisa com vistas à geração e
difusão de conhecimentos, privilegiando os mecanismos do desenvolvimento sustentável e promovendo a
inclusão social, a cidadania e o desenvolvimento regional (IFPA/CRMB, 2010).
integração do CEFET-PA com as Escolas Agrotécnicas Federais de Castanhal e Marabá
(CRMB, 2010).
O acúmulo histórico destas experiências pedagógicas tem sido fundamental no
incentivo e inspiração de educadores e estudantes das comunidade rurais, para o
desenvolvimento de processos educativos críticos e contextualizados em diversas
escolas do campo na região do Sudeste Paraense.
Desse modo, a adoção de currículos escolares pautados no contexto da
agricultura família e na perspectiva da agroecologia é uma ação estratégica para o
desenvolvimento rural sustentável do campo no município de Marabá, tendo em vista a
complexidade sócio ambiental, e os desafios produtivos e organizacionais vigentes no
meio rural.
O município de Marabá faz parte da região do Sudeste Paraense 7 caracterizada
como fronteira agrícola, podendo ser definida, como um espaço recentemente ocupado e
para o qual ainda hoje se dirigem novos fluxos migratórios e novas atividades
econômicas, tendo seu histórico de expansão influenciado pela abertura de
estradas/rodovias, por grandes projetos de exploração dos recursos naturais e
hidrelétricas (COSTA: 2000). Os dados atuais revelam que esta região é composta por
39 municípios, abrange uma área de aproximadamente 297.344.26 km 2, com uma
população urbana em torno de 1.349.816 habitantes e uma população rural com
aproximadamente 497.698 habitantes, totalizando 1.847.514 pessoas e uma densidade
demográfica de 5,78 habitantes/km² (BRASIL, 2019).
A diversidade sócio-cultural existente entre os camponeses nas comunidades
rurais do Sudeste Paraense têm desafiado o processo produtivo, pois, esta região é
marcada por uma presença massiva de migrantes de outros Estados com poucos
conhecimentos prévios acumulados sobre o agroecossistema8 local. Outra questão é

7
Os números atuais referentes à quantidade de Projetos de Assentamento no Sudeste Paraense apontam
está localidade como a região do Brasil com a maior quantidade de Projetos de Assentamento (PA),
totalizando um montante de 514 PAs, 94.702 famílias assentadas e uma área de 4.545.710 milhões de ha
(INCRA, 2020), correspondendo a quase 50% total de assentamentos do Estado e aproximadamente 6%
do montante nacional. E também, vale ressaltar a existência na região de outras categorias que se
organizam na lógica da produção familiar: ribeirinhos, indígenas, acampamentos, áreas de colonização e
outros (WANDERLEY, 1999). A expressividade desses números é o resultado da reação organizada de
um enorme contingente de expropriados em contraposição ao processo histórico autoritário e conservador
de ocupação existente na região.

8
Segundo Gleissman (2001), o conceito de agroecossistema está relacionado a uma estrutura na qual são
analisados o sistema de produção de maneira holística, incluindo-se também seus conjuntos complexos de
insumos e produção e as suas ligações e interconexões entre as partes que os compõem, “uma estrutura
com a qual podemos analisar os sistemas de produção de alimentos como um todo” (GLEISSMAN, 2001.
ausência de instituições públicas de pesquisa agropecuária que pudessem gerar
tecnologias adequadas à realidade local, em contraposição, há uma predominância de
sistemas de produção, baseados na precoce e intensa pecuarização dos estabelecimentos
familiares, resultante inicialmente da instabilidade da posse da terra e da falta de
infraestrutura de produção, incentivado pela política pública que historicamente
privilegiou a criação de gado como estratégia para garantir a posse da terra e a
modernização do campo (OLIVEIRA; VEIGA; TAVARES, 2005). Em consonância
com a necessidade criação de novas alternativas de produção que possa ser sustentáveis
ao longo do tempo.

As questões apontadas acima reafirmam a necessidade da ressignificação da


função social das escolas nas comunidades rurais, aproximando-as das demandas sócio
produtivas do povos do campo. Este processo é mediado a partir da adoção da realidade
local e de conteúdos que apontem elementos da produção agropecuária e extrativista em
sinergia com a sustentabilidade, vinculados ao processo de construção curricular
envolvendo diferentes princípios pedagógicos (pesquisa, trabalho, diálogo de saberes e
outros).

Nesta perspectiva o Componente Curricular Agricultura Familiar e


Práticas Agroecológicas foi elaborado com a intenção de promover o diálogo como a
realidade do campo, possibilitando aos estudante uma reflexão crítica da sua realidade e
o conhecimento necessários para o aprimoramento dos aspectos sócio produtivo das
comunidades rurais no município de Marabá. Assim, a pesquisa será realizada buscando
responder as seguintes questões problema: quais foram os principais avanços e limites
na materialização do Componente Curricular Agricultura Familiar e Práticas
Agroecológicas? E como construir uma proposta pedagógica que possa ser implantada
nas escolas do campo que não tenham professores com a formação nas ciências
agrárias?

4. OBJETIVOS

4.1 OBJETIVO GERAL

Refletir sobre os avanços e limites na materialização do Componente Curricular


Agricultura Familiar e Práticas Agroecológicas, de modo, a possibilitar o

p. 61).
apontamento de elementos concretos para a reformulação do componente, a luz das
experiências vivida, com base na perspectiva dos sujeitos envolvidos no processo
educativo (educandos e educadores), tendo como foco a institucionalização da
Educação do Campo.

4.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS

1) Resgatar os processos históricos referente a implantação e institucionalização da


política de educação do campo no município de Marabá;

2) Caracterizar as escolas envolvidas diretamente no processo de implantação do


componente curricular;

3) Refletir sobre os aspectos pedagógicos referentes a elaboração do Componente


Curricular Agricultura Familiar e Práticas Agroecológicas;

4) Acompanhar, sistematizar e refletir sobre o processo de implantação do componente


curricular;

5) Construir elementos pedagógicos que ajudem na reelaboração do componente


Curricular Agricultura Familiar e Práticas Agroecológicas;

6) Avaliar as possibilidades de implantação da proposta curricular nas demais escola do


campo no município de Marabá.

REFERÊNCIAL TEÓRICO

Assumo o conceito de agroecologia, na perspectiva discutida pelos autores


Caporal; Costabeber; Paulus (2006) que abordam a agroecologia como uma ciência que
pretende contribuir para o manejo e desenho de agroecossistemas sustentáveis, em
perspectiva de análise multidimensional (econômica, social, ambiental, cultural, política
e ética).
E com base em Freire (1982) que discuti a importância do diálogo de saberes no
processo de construção do conhecimento e a educação como um instrumento de
transformação social.
E reafirmo a relevância dos estudos de Caldart (2016) referente a importância da
agroecologia no currículo das escolas do campo, refletindo sobre a construção de
relações orgânicas entre escolas e processos de produção agrícola fundamentados na
agroecologia, que integra o desafio da Educação do Campo de firmar práticas
educativas avançadas, vinculadas à vida e à complexidade de suas questões. E Caldart
(2000) que apresenta a pratica educativa no campo e do campo como afirmação de resistência.

METODOLOGIA

no presente trabalho será utilizado a pesquisa qualitativa, que busca perceber em lócus os
problemas enfrentados pela sociedade e leva em consideração o contexto em que estão
inseridos, como nos fala Bogdan e Biklen (1994, p. 42) “na investigação qualitativa a fonte
direta de dados é o ambiente natural, construindo o investigador o instrumento principal”, com
isso, “a abordagem qualitativa exige que o mundo seja examinado com ideia que nada seja
trivial, que tudo tem potencial para construir uma pista que nos permita estabelecer uma
compreensão mais esclarecedora do nosso objeto de estudo” (BOGDAM; BEKLEN, 1994,

Este estudo iniciará com uma pesquisa exploratória com o intuito de fazer um
levantamento bibliográfico a respeito do tema em questão, como prática de referenciar
as análises. Seguido de um levantamento documental: caderno pedagógicos; relatórios;
trabalhos produzidos pelos educandos, como também documentos e registros históricos
sobre a educação do campo na região, entre outros, pois “os documentos constituem
também uma fonte poderosa de onde podem ser retiradas evidências que fundamentem
afirmações e declarações do pesquisador” (LUDKE, 1986, p. 39). Além de serem
considerados cientificamente autênticos dão à possibilidade de descrever e comparar os
fatos sociais.
Com relação as técnicas de coleta de informações e análise, serão utilizadas
técnicas qualitativas, tendo em vista que a problematização teórica deste estudo situa-se
em um campo de discussão das relações sociais.
A abordagem que será utilizada para servir de referencial neste estudo, será
dialética, por ser, segundo Gatti (2002) aquela que em relação às demais, fornece
maiores possibilidades epistemológicas para se analisar o objeto investigado em suas
múltiplas e concretas determinações históricas, sendo este bastante utilizado em
pesquisa de perspectiva subjetiva.
Consideramos que a investigação faz parte de um contexto social que deve ser
entendido dentro das determinações apresentadas pelo próprio ambiente onde vivem os
sujeitos envolvidos, ou seja, existe uma relação intrínseca entre o mundo natural e o
social, o que nos levará a conviver com a complexidade, com a diversidade, com a
especificidade e com a diferença no decorrer da pesquisa (GATTI, 2002). Nesse tipo de
abordagem se leva em consideração as contradições sociais do sujeito relacionando-as
dialeticamente as condições materiais de existência dos envolvidos direta ou
indiretamente no processo investigativo.
A pesquisa será organizada no formato de estudo de caso, referente a
implantação do Componente Curricular Agricultura Familiar e Práticas
Agroecológica em duas escolas da rede municipal de ensino de Marabá (Escola
Municipal de Ensino Fundamental Carlos Marighela e a Escola Família Agrícola de
Marabá – Jean Hebette) que segundo Chizzotti (1991, p. 102).
[...] É uma caracterização abrangente para designar uma diversidade de
pesquisas que coletam e registram dados de um caso particular ou de
vários casos a fim de organizar um relatório ordenado e crítico de uma
experiência, ou avaliá-la analiticamente, objetivando tomar decisões a
seu respeito ou propor uma ação transformadora.

Neste estudo será utilizado também, a técnica da observação


participante, desse modo será realizada vivência no cotidiano das duas escolas que
serão implantadas o componentes, a partir da observação direta e acompanhamento
das atividades. Neste sentido, a técnica da observação participante de acordo com
Minayo (2002, p. 59-60):
[...] A técnica de observação participante se realiza através do contato direto
do pesquisador com o fenômeno observado para obter informações sobre a
realidade dos atores sociais em seus próprios contextos. O observador,
enquanto parte do contexto de observação, estabelece uma relação face a face
com os observados. Nesse processo, ele, ao mesmo tempo, pode modificar e
ser modificado pelo contexto. A importância dessa técnica reside no fato de
podermos captar uma variedade de situações ou fenômenos que não são
obtidos por meio de perguntas, uma vez que, observados diretamente na
própria realidade, transmitem o que há de mais importante e evasivo na vida
real.

As entrevistas ocorrerão com os principais sujeitos envolvidos no processo:


educandos, educadores e família. A partir da organização de três grupos focais (grupo
dos educadores, grupo dos educandos e grupo dos familiares), por considerar que essa
técnica propicia melhor entendimento de atitudes, preferências, necessidades e pontos
de vistas. Segundo Dias (2000) essa técnica possibilita uma sinergia entre os
participantes que leva à resultados que ultrapassam a soma das partes individuais.
Assim, a opção pela técnica de grupo focal se deu por considerarmos que esse
procedimento é o que melhor relata a totalidade dos processos no contexto em que são
desenvolvidas as ações.
Esse momento estará voltado para compreender a percepção dos educandos,
educadores e familiares sobre o processo de formação vivenciado com o Componente
Curricular Agricultura Familiar e Práticas Agroecológica, tendo como referência os
limites e avanços, como também, apontamentos para reestruturação do componente.

CRONOGRAMA

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICAS

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