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ROSELI A. C.

FONTANA
2 'charel e licenciada em Pedagogia pela UNICAMP
'estre em Psicologia Educacional pela UNICAMP
^Jcente de Prática de Ensino na Escola de 1? grau na
Faculdade de Educação da UNICAMP

MARIA NAZARÉ DA CRUZ


Bacharel e licenciada em Psicologia pela FFCL-USP
Ribeirão Preto — SP
Mestre em Psicologia Educacional pela UNICAMP
Docente de Psicologia Educacional na Universidade
Federal de Uberlândia — MG

PEMtÍGKO
© Roseli A. C. Fontana
Maria Nazaré da Cruz
Copyright desta edição:
ATUAL EDITORA LTDA.. São Paulo. 1997.
/ Todos os direitos reservados.

Catalogação na fonte do
Departam ento Nacional do Livro

F679p
Fontana. Roseli
Psicologia e trabalho pedagógico / Roseli Fontana. Maria Nazaré
da Cruz. — São Paulo : Atual. 1997.
240p. cm. — (Formação do educador).
ISBN 85-7056-902-5
Suplementado por manual do professor.
Inclui bibliografia.
1. Psicologia educacional. 2. Psicologia da aprendizagem. I. Cruz.
Maria Nazaré da. II. Título. III. Série.
CDD-370.15
K
Capítulo 2

A abordagem
inatista-maturacionista

Todos nós já ouvimos ou dissemos coisas como: “Ele ainda não


tem maturidade para aprender a ler”; “Meu filho tem uma aptidão incrí­
vel para a matemática”; "A Marina é tão inteligente! Puxou ao pai!”.
Maturidade, aptidão, inteligência são temas tradicionalmente abor­
dados pela psicologia numa perspectiva que atribui um papel central a
fatores biológicos no desenvolvimento da criança. Essa perspectiva,
que estamos denominando inatista-maturacionista, parte do princípio
de que fatores hereditários ou de maturação são mais importantes para o
desenvolvimento da criança e para a determinação de suas capacidades
do que os fatores relacionados à aprendizagem e à experiência.
Mas o que são esses fatores hereditários ou de maturação?
A hereditariedade pode ser entendida como um conjunto de quali­
dades ou características que estão fixadas na criança, já ao nascimento.
Ou seja, quando falamos em hereditariedade estamos nos referindo à
herança genética individual que a criança recebe de seus pais. Todos
sabemos que traços como. por exemplo, a cor dos olhos e do cabelo, o
tipo sanguíneo, o formato da orelha e da boca já estão determinados
geneticamente quando nascemos.
A idéia de maturação refere-se a um padrão de mudanças comum a
todos os membros de determinada espécie, que se verifica durante a
vida de cada indivíduo. O crescimento do feto dentro do útero da mãe.
por exemplo, segue um padrão de mudanças biologicamente determi­
nado. As transformações do corpo, o crescimento dos órgãos, etc. acon­
tecem de acordo com uma sequência predeterminada, que. a princípio,
não dependeria de fatores externos.
Você pode estar se perguntando o que essa história de cor dos olhos
ou do desenvolvimento do feto tem a ver com uma abordagem psicoló­
gica da maturidade, das aptidões e da inteligência.
E que, na psicologia, teóricos da perspectiva inatista-maturacio­
nista supõem que. do mesmo modo que a cor dos olhos, aptidões indi vi
duais e inteligência são características herdadas dos pais e, portanto, já
estão determinadas biologicamente quando a criança nasce. Ou então
que, à maneira do crescimento das partes do corpo, o desenvolvimento
do comportamento e das habilidades da criança é governado por um
processo de maturação biológica, independentemente da aprendizagem
e da experiência.
São essas concepções que estudaremos no decorrer deste capítulo.

A questão das diferenças individuais e a hereditariedade


da inteligência: “filho de peixe, peixinho é?”

Por que as pessoas são diferentes umas das outras? Por que algu­
mas crianças parecem mais inclinadas para atividades artísticas, en­
quanto outras se saem melhor com os nú­
meros? Foram perguntas desse tipo que
orientaram, no começo do século, as pri­
meiras investigações psicológicas sobre o
problema da natureza hereditária das apti­
dões e da inteligência.
Interessados em saber por qué uma pes­
soa é diferente da outra — quanto a traços de
personalidade, de habilidades, de desempe­
nho intelectual, etc. —■. pesquisadores pro­
curaram obter dados que permitissem esta­
belecer comparações entre pessoas.
Eles constataram, então, que pessoas
com uma aptidão especial (um artista, por
exemplo) normalmente tinham familiares
que apresentavam o mesmo tipo de aptidão.
Ou. ainda, que gêmeos idênticos apresenta­
vam aptidões e nível intelectual com um
grau de semelhança maior do que o encon­
trado entre irmãos não gêmeos. Por outro
lado, identificaram diferenças de aptidões e
de traços mentais entre homens e mulheres
ou entre raças diferentes.
Essas constatações foram interpretadas como indicadoras de que os
(iê n ic o s : centro
th interesse nos
fatores inatos são mais poderosos na determinação das aptidões indivi­
i \tinlo\ \ohre duais e do grau em que estas podem se desenvolver do que a experiên­
hcictlU tirietltule cia. o meio social e a educação. O papel do meio social, segundo essa
perspectiva inatista. se restringe a impedir ou a permitir que essas apti-
dões se manifestem.
Assim, uma criança — filha, neta ou sobrinha de músicos — apre­
senta inclinação e facilidade para aprender música porque herdou de
seus familiares a aptidão, o "dom" para a música, e não porque foi
12 educada num ambiente em que. provavelmente, a música é valorizada e
ensinada. Do mesmo modo, crianças brancas e negras apresentam dife­
renças no desempenho de determinadas tarefas em razão da herança ge­
nética de suas raças, e não de diferenças culturais ou de oportunidades.
Foi nessa linha da preocupação com as diferenças individuais que
se desenvolveram os primeiros estudos psicológicos com o objetivo de
avaliar a inteligência. Um dos pioneiros desses estudos, o pesquisador
francês Alfred Binet, interessou-se especialmente pela mensuração da
inteligência através de testes.

Quem foi Binet?

Alfred Binet nasceu em 1857 e viveu até 1911. Formou-se em


Medicina, mas desde cedo interessou-se pela psicologia da crian­
ça e do deficiente, área em que se tornou conhecido.
Em 1904, quando era diretor do Labora­
tório de Psicologia Fisiológica da> Universi­
dade de Sorbonne, participou de uma comis­
são de médicos, educadores e cientistas, no­
meados pelo ministro da Instrução Pública da
França, que tinha como objetivo estabelecer
métodos e formular recomendações para o
ensino de crianças deficientes mentais. Binet
fo i incumbido da tarefa de desenvolver um
instrumento que pennitisse identificar as crian­
ças mentalmente deficientes.
Como resultado de seu trabalho nessa
comissão e de suas pesquisas anteriores, ele
publicou em 1905, com a colaboração de
Théodore Simon. a primeira escala para a
medida da inteligência geral. Essa escala,
que se tornou conhecida como escala Binet-
Simon, passou por duas revisões: a primeira,
em 1908, e a segunda, em 1911, pouco antes da morte de Binet.
Pode-se dizer que o desenvolvimento dessa escala marcou o
início da medida da inteligência, tal como a conhecemos hoje.
Os testes de Binet e Simon foram traduzidos e utilizados também
em muitos outros países e deram origem a inúmeras revisões,
realizadas por outros pesquisadores, bem como inspiraram a
elaboração de outros testes de inteligência.
No Brasil, seus estudos e testes foram introduzidos em 1916
por educadores ligados ao Laboratório de Psicologia Pedagógi­
ca do Rio de Janeiro.

Binet concebia a inteligência como uma aptidão geral que não de­
pende das informações ou das experiências adquiridas no decorrer da
vida do indivíduo. Segundo ele, as principais características da inteli­
gência seriam as capacidades de atenção, de julgamento e de adaptação
do comportamento a objetivos:

Parece-nos que na inteligência há uma faculdade fundamen­


tal... Esta faculdade é o julgamento, também chamado bom senso
prático, iniciativa, a faculdade de adaptar-se às circunstâncias. Jul­
gar. compreender e raciocinar bem; estas são as atividades essen­
ciais da inteligência.
(Binei e Sinion. O desenvolvimento do inteligência nos crianças.
Apud Bec. H.)

E importante compreender que. nessa perspectiva, a idéia de inteli­


gência não se confunde com os conhecimentos adquiridos pelo indiví­
duo durante sua vida. Habitualmente, consideramos como muito inteli­
gente uma pessoa que demonstra ter um vasto conhecimento: ou seja,
dizemos que os mais inteligentes (entre nossos colegas, por exemplo)
são os que sabem mais.
No entanto, o que define a inteligência de um indivíduo não é a quan­
tidade de conhecimentos que ele possui, mas sua capacidade de julgar,
compreender e raciocinar. Essas capacidades, segundo Binet. não podem
ser aprendidas", mas. ao contrario, são biologicamente determinadas. As­
sim. a inteligência é vista como um atributo do indivíduo fixado pela he­
reditariedade e, como tal, variável de uma pessoa para outra.

Padrões de desenvolvimento: o que é próprio de


cada idade?

Mas, se as pessoas são diferentes umas das outras nas suas apti­
dões, traços de personalidade ou de inteligência, existem também mui­
tas semelhanças entre elas. A maioria dos bebês, por exemplo, torna-se
capaz de se sentar antes que possa se arrastar, engatinhar e depois andar.
Do mesmo modo, quando começa a falar, a criança primeiro diz apenas
palavras isoladas, e só depois junta duas ou mais palavras, formando
frases. Ou. então, antes de desenhar casas, animais ou carros, a criança
rabisca traços e círculos.
Essas seqüências parecem se repetir sempre em relação à maioria
das crianças, o que sugere a existência de certo padrão de desenvolvi­
mento humano. Esse fato tem chamado a atenção de muitos pesquisa­
dores desde as primeiras décadas deste século. Um dos primeiros psicó­
logos a se interessarem por essa questão foi Arnold Gesell. nos Estados
Unidos. Ele se preocupou com a evolução da criança, do nascimento
aos 16 anos. e estudou as formas que seu comportamento vai tomando
14 no decorrer dessa evolução.
Quem fo i Gesell?
Pesquisador norte-americano que viveu entre 1880 e 1961,
Gesell foi o principal expoente das teorias do desenvolvimento
que dão maior ênfase ao papel da maturação. Desde
muito cedo, logo que formado na Escola Normal (Ma­
gistério), dedicou-se à carreira de professor. Foi dire­
tor de colégio e escreveu sua primeira tese sobre um
assunto ligado à pedagogia. Depois de doutorar-se
em psicologia, Gesell retomou o seu trabalho como
professor em uma escola primária. Alguns anos de­
pois, decidiu-se por fazer o curso de Medicina e assim
que o concluiu fo i nomeado professor de Higiene da
Criança na Escola de Medicina de Yale, cargo que
ocupou até a sua aposentadoria.
Em 1915, Gesell passou a empregar a psicologia
com vistas em proporcionar ajuda pedagógica às
crianças desadaptadas. Ele é, por isso, considerado o
primeiro psicólogo escolar norte-americano.
Preocupado com a criação de uma ciência do desenvolvimento
humano que integrasse todos os recursos da psicologia experimen­
tal, da biologia evolutiva e da neurofisiologia, de 1920 a 1961 Gesell
dedicou-se à pesquisa científica e à publicação de livros e artigos.

Pode-se dizer que Gesel 1foi o primeiro teórico da maturação, uma vez
que defendia a prioridade dos fatores de maturação sobre os fatores de
aprendizagem, ou de experiência, na evolução do comportamento da
criança. Para ele. o que explica a existência de um padrão de desenvolvi­
mento comum à maioria das crianças é o processo de maturação biológica
inerente às transformações por que passa o comportamento da criança.
Assim, a evolução psicológica da criança seria determinada biolo­
gicamente, do mesmo modo que o crescimento do feto no útero mater­
no. Seus comportamentos e formas de pensar tomam-se mais comple­
xos à medida que ela cresce, que seu sistema nervoso, sua estrutura
muscular, etc. se desenvolvem. O ambiente social e as influências exter­
nas. de modo geral, limitam-se a facilitar ou dificultar o processo de
maturação. Por exemplo, uma criança que raramente é tirada do berço e
deixada à vontade no chão. certamente vai demorar mais para enga­
tinhar ou andar. Em condições adequadas, seu desenvolvimento se pro­
cessaria no ritmo e na seqüência determinados pela maturação. '
Tanto Binet quanto Gesell. acreditando que a inteligência e o desenvolvi­
mento psíquico da criança são biologicamente determinados, preocuparam-
se em descrev er comportamentos e habilidades típicos de cada faixa etária.
Binet estava interessado, como já dissemos, em medir e comparar a
inteligência das pessoas. Mas. se podemos medir a altura ou o tamanho
do dedo de uma criança simplesmente usando uma fita métrica, medir a
inteligência é bem mais complicado. Enquanto aptidão geral do indiví­ 15
duo. a inteligência não pode ser medida diretamente, mas apenas atra-
ves de algumas de suas realizações. Por isso, para construir um teste de
inteligência, Binet precisava conhecer o que crianças são capazes de
fazer cm cada idade.
Essa também foi uma necessidade experimentada por Gesell. Preo­
cupado em compreender a evolução da criança, ele procurou estabele­
cer escalas de desenvolvimento que permitissem comparar os compor­
tamentos de uma criança com aqueles que eram esperados, ou conside­
rados “normais”, para sua faixa etária.
Mas como foram criados cs testes de inteligência e estabelecidas as
escalas de desenvolvimento?
Essa é uma pergunta importante, porque sua resposta nos mostra um
pouco como o conhecimento é produzido na área da psicologia. Partindo
do princípio de que a hereditariedade e a maturação são os fatores mais
decisivos na determinação da inteligência e na evolução do comporta­
mento da criança, tanto Binet quanto Gesell dedicaram-se a pesquisas.

Pesquisando a criança: a construção dos testes de


inteligência

Binet partiu da experimentação e da observação do que as crianças


eram capazes de fazer em idades variadas. Ele procurou selecionar proble­
mas ou questões cuja solução envolvesse os efeitos combinados da aten­
ção. do juízo e do raciocínio e não dependesse de aprendizagens anteriores.
Essas questões eram organizadas em grupos por idade, de acordo
com o seguinte critério: se um teste era resolvido satisfatoriamente por
60% a 909c das crianças de determinada idade estudadas, ele era consi­
derado adequado para aquela idade.
Um exemplo: se todas ou quase todas as crianças de 6 anos fossem
capazes de comparar dois pesos, essa tarefa era considerada muito fácil
para essa idade; se 60% a 90% das crianças de 5 anos estudadas resol­
vessem o problema de maneira coneta, ele era aceito como adequado
para essa faixa etária. Do mesmo modo. se quase nenhuma das crianças
de 4 anos estudadas conseguisse copiar um quadrado, essa tarefa era
considerada difícil demais para essa idade.
Seguindo esse procedimento. Binet selecionava um número deter­
minado de tarefas, em ordem crescente de dificuldade, para cada idade.
Assim, o seu teste de inteligência geral, destinado a avaliar pessoas dos
3 anos até a idade adulta, era composto por vários conjuntos de proble­
mas: um para as crianças de 3 anos. outro para as de 4 anos, outro para
as de 5 anos. e assim sucessivamente.
Por meio desses testes, a inteligência é avaliada pelo desempenho
nas tarefas. O número de testes que a criança consegue resolver determi­
na a sua idade mental ou o seu quociente de inteligência (QI). Se ela con­
seguir resolver todos os testes propostos para a sua idade, sua inteligên­
cia será considerada normal. Se ela também resolver corretamente al­
guns dos testes propostos para crianças mais velhas, seu QI estará acima
da média. E se. ao contrário, ela acertar apenas questões propostas para
crianças mais novas, sua inteligência será considerada abaixo da média.
Você sabe o que é o QI?
Embora confundido por muita gente com a própria inteligên­
cia, o QI (quociente intelectual) é basicamente uma comparação
entre a idade mental e a idade real da criança (idade cronológica).
A idade mental é detenninada pelo número de tarefas de um tes­
te que a criança consegue resolver corretamente. Por exemplo, se ela
acerta todas as tarefas atribuídas ao grupo de 10 anos, diz-se que ela
tem idade mental de 10 anos, seja qualfor sua idade cronológica.
O QI é obtido quando se divide a idade mental de uma criança
pela sua idade cronológica. Suponhamos que uma criança de 8
anos consiga resolver todos os problemas propostos para a idade
de 10 anos, mas nada além desse nível. Diremos que sua idade men­
tal é de 10 anos e, para calcular o seu QI, dividiremos 10 por 8, o
que dá um resultado de 1,25. Por convenção, esse resultado é mul­
tiplicado por 100, para que o QI possa ser expresso em números
inteiros. Isso significa que, em nosso exemplo, a criança tem um QI
de 125, que é considerado acima da média.

Qj _ idade mental x 100


idade cronológica

Assim, a quando a idade mental e a idade cronológica forem


as mesmas, o QI será sempre 100. Se a idade mental fo r inferior
à idade cronológica, os resultados serão sempre inferiores a 100,
o que indicará um QI abaixo da média. Se, ao contrário, a idade
mental fo r superior à idade cronológica, o QI será sempre supe­
rior a 100, ou acima da média.

Pesquisando a criança: a elaboração das escalas de


desenvolvimento

À semelhança de Binet. Gesell também se utilizou da observação e


da experimentação com crianças para elaborar suas escalas de desen­
volvimento. No entanto, ele introduziu uma importante inovação técni­
ca na observação e no registro do comportamento da criança: as câme­
ras cinematográficas.
Na Clínica do Desenvolvimento da Criança, criada por ele em
193Ü na Universidade de Yale. Gesell montou um observatório fotográ­
fico. que era um hemisfério de 4 metros de diâmetro e 2,5 metros de
altura, equipado no alto e nas paredes laterais com câmeras cinemato­
gráficas. Enquanto Gesell submetia as crianças a vários testes — sem­
pre voltados a descobrir o que são capazes de lazer em cada idade — as
câmeras rodavam, registrando todas as reações que elas apresentavam.
Os filmes obtidos eram posteriormente analisados. Gesell procura­
va, então, destacar diversos aspectos da evolução do comportamento
da criança. A postura, a locomoção, a ação de agarrar, os jogos, as con­
dutas sociais, etc. eram minuciosamente analisados e descritos com o
objetivo de captar as formas que esses com­
portamentos tomam no decorrer do desenvol­
vimento da criança.
A partir dessas análises, tomava-se possí­
vel estabelecer que comportamentos eram típi­
cos de cada faixa etária, como, por exemplo,
começar a engatinhar, colocar-se de pé e andar
com apoio, subir em cadeiras ou sofás e cami­
nhar sozinha.

I .ui/ Tniz/i/Angulnr
h n ^ iiiin h a r e a n d a r s o z in h o : está g io s
diferentes d o d esen vo lvim e n to infantil.

Essas pesquisas, baseadas na análise dos filmes, foram denomina­


das por Gesell pesquisas normativas, já que visavam à apreensão do
ritmo e da sequência “normais” do desenvolvimento. Assim, ao enume­
rar os comportamentos considerados típicos de cada faixa etária, é esse
ritmo e essa seqiiência que as escalas de desenvolvimento expressam.

A questão dos comportamentos típicos

Tanto Binet quanto Gesell ocuparam-se em definir os comportamen­


tos típicos de cada faixa etária, embora a partir de perspectivas diferentes.
Como já apontamos. Gesell não apenas destacava quais são os
comportamentos infantis comuns a determinada idade, mas também
procurava retratar a maneira como esses comportamentos evoluem,
transformam-se. E o caso. por exemplo, da capacidade da criança de
manter-se sentada sem apoio.
É possível observar, nas figuras a seguir, que a evolução desse
18
comportamento deve-se ao progresso do alinhamento das costas e do
aumento do controle da cabeça: gradativamente as costas do bebê (que,
no recém-nascido, são arredondadas) ficam mais alinhadas, e a criança
toma-se capaz de manter a cabeça levantada, podendo, então, permane­
cer sentada sem apoio.

Primeiros 4
semanas de vida: Entre 4 e 6
o dorso do bebê semanas o bebê
é imiformemente tem o dorso
arredondado, arredondado e a
havendo falta de cabeça c erguida
controle da por alguns
cabeça. momentos.

Binet, por sua vez, preocupava-se


com aqueles comportamentos que, numa
determinada idade, pudessem ser tomados Entre X c 12
como indicadores do nível de inteligência semanas ■ > dorso
da criança. A evolução ou o desenvolvi­ ainda c
mento dos comportamentos considerados arredondado e a
cabeça já se
típicos não o interessaram de modo espe­ levanta mais.
cial. mas sim a capacidade da criança de porém o bebé
realizá-los na idade tida como adequada. ainda tende a
pender <>corpo
Mas. apesar das diferenças, podemos
para a frente.
dizer que Binet e GeselI estabeleceram pa­
drões de comportamento com a finalidade
de avaliar a inteligência ou o desenvolvi­
mento da criança. O pressuposto de que os _
fatores biológicos (heredífãnedade e
maturação) são os mais decisivos na deter­
minação da inteligência e do desenvolvi­
mento leva a supor que tais padrões de Entre 16 c 20
comportamento são independentes de fa­ semanas o bebé
tem o dorso mais
tores externos ou do contexto social em alinhado < a
que as crianças vivem. Desse modo. nãcç cabeça e mantida
importa o lugar e a época em que a criança' ereta sem
viva ou as condições materiais e as possi­ vacilação.

bilidades educacionais a que tenha acesso:


a criança “normal” deve apresentar tais
comportamentos.
No entanto, é importante lembrar que eles chegaram à definição
dos padrões de comportamento de cada faixa etária a partir de pesqui­
sas realizadas nas primeiras décadas do século, com determinados gru­
pos de crianças (francesas e norte-americanas). L020 . os comporta-
19
mentos considerados típicos foram aqueles apresentados pela maioria
das crianças que eles estudaram, e foi a partir daí que se definiu o que
é normal ou não.
Esse procedimento é bastante coerente com os princípios teóricos
pelos quais Binet e Gesell se orientaram. Se o ritmo e a seqiiência do
desenvolvimento são biologicamente determinados, espera-se que cer­
tos comportamentos apareçam sempre na mesma seqiiência e na mesma
idade, quer se trate de crianças européias de classe média, quer de crian­
ças do interior do Nordeste brasileiro.

As relações entre desenvolvimento e aprendizagem e


as influências do inatismo-maturacionismo na escola

Se o ritmo e a seqiiência do desenvolvimento são biologicamente


determinados, qual a sua relação com os processos de aprendizagem?
Antes de responder a essa pergunta, é importante lembrar que os pes­
quisadores da abordagem inatista-maturacionista não tinham como ob­
jetivo o estudo da aprendizagem. No entanto, ao destacar o papel de
fatores internos na determinação da inteligência e do desenvolvimento,
essa abordagem considera que aquilo que a criança aprende no decorrer
da vida não interfere no processo de desenvolvimento.
De acordo com a perspectiva inatista-maturacionista, a aprendiza­
gem é que depende do desenvolvimento. Ou seja. o que a criança é
capaz ou não de aprender é determinado pelo nível de maturação de
suas habilidades e do seu pensamento ou, ainda, pelo seu nível de
inteligência.
Essa concepção tem tido bastante influência na escola, desde sua
elaboração. Pode-se dizer que o inatismo-maturacionismo marca o co­
meço da relação entre a psicologia científica e a educação. Como vi­
mos, a construção dos primeiros testes de inteligência de Binet e
Simon foi resultado de uma necessidade emergente nos meios educa­
cionais franceses da época: a de identificar as crianças mentalmente
deficientes e estabelecer métodos que tornassem o ensino acessível a
elas. O trabalho de Gesell também foi orientado por fins ligados à
educação, especialmente a de crianças consideradas desadaptadas.
No Brasil, as principais pesquisas psicológicas sobre crianças da­
tam do início do século. Educadores, geralmente vinculados às Escolas
Normais (antigo nome dos cursos de Magistério), implantaram na déca­
da de 20. em suas escolas, laboratórios de Psicologia Experimental e de
Psicologia Pedagógica. Nesses laboratórios, as crianças eram submeti­
das a exames destinados a medir suas reações psicofísicas (discrimina­
ções visuais, auditivas, etc.), e foi através deles que se introduziram no
país os primeiros testes psicológicos. O primeiro teste para avaliar a
prontidão de crianças para a alfabetização foi desenvolvido por um edu­
cador. Lourenço Filho.
A idéia de que a criança é portadora dos atributos universais (bioló­
gicos) do gênero humano produz ou justifica a crença de que caberia à
educação fazer aflorar esses atributos naturais, desenvolvendo as
potencialidades do educando de modo harmonioso. Tal concepção teve
o mérito de chamar a atenção para as especificidades da criança, para as
características, habilidades e capacidades dos educandos, colocando
em destaque noções como prontidão, maturidade, aptidão.
Mas, ao mesmo tempo que atribuem à escola o papel de “cultivar”
o indivíduo, de possibilitar o seu desenvolvimento harmonioso, as pro­
postas pedagógicas orientadas por essa perspectiva consideram que
para aprender os conteúdos escolares a criança precisaria já ter desen­
volvido determinadas capacidades. Isso acaba gerando a idéia de que
existe uma idade bem precisa para aprender certos conteúdos. Ou, ain­
da, que o proveito que a criança tira das situações de aprendizagem
depende de seu nível de prontidão ou maturidade.
Essas noções, além de circularem entre os agentes do processo
educacional, influenciando, muitas vezes, o cotidiano da escola, tam­
bém dão sustentação à prática de utilização de testes psicológicos para
avaliar as possibilidades educacionais da criança.
É fato bem conhecido que testes de prontidão (para a leitura, por
exemplo) e testes de inteligência têm sido amplamente utilizados para a
avaliação de crianças em idade escolar, penalizando muitas delas. Os
resultados de tais testes têm. historicamente, impedido que inúmeras
crianças tenham acesso ao conhecimento e à própria escolarização, ao
fornecerem indicadores de sua “imaturidade” ou de seus "déficits” de
inteligência. Há crianças, por exemplo, que são retidas na pré-escola ou
permanecem nos exercícios preparatórios, às vezes um ano inteiro, por­
que “não estão prontas" para aprender a ler e escrever; outras são envi­
adas às classes especiais porque “não têm condições" intelectuais de
seguir o curso normal da escolaridade.

21
> Sugestão de atividades
>
> Organizando as informações do texto

1. Organize um quadro explicando, resumidamente, o que é:


l
• hereditariedade;
f • maturação.
k
2. Monte um quadro que apresente um resumo de como se explica, na
I abordagem inatista-maturacionista:

• inteligência;
• desenvolvimento.

3. Explique a relação existente entre desenvolvimento e aprendizagem,


de acordo com essa abordagem.

Refletindo sobre o texto

1. Dividam-se em dois grupos, para discutir a seguinte frase: “Algumas


pessoas são mais inteligentes que outras em razão de sua herança
genética”.
2. O grupo 1 deve se reunir e pensar em argumentos a favor dessa frase
(durante dez minutos).
3. O grupo 2 pensará em argumentos contra essa frase (durante dez mi­
nutos).
4. Organizem o debate entre os grupos. Mas lembrem-se: quem é do
grupo 1 só pode falar “a favor” da frase e quem é do grupo 2 deve
falar “contra”.
5. Registre em seu caderno suas opiniões sobre os aspectos favoráveis e
desfavoráveis da abordagem analisada.

Trabalho de campo

1. Para realizar esta pesquisa, cada aluno deverá entrevistar uma pessoa
que tenha filhos (mãe ou pai) e uma professora (de pré-escola ou de
I“a 4“ série). Explique à pessoa que você está realizando um trabalho
escolar e precisa da ajuda dela.
• Pergunte à mãe (ou ao pai) sobre o que se lembra a respeito do
desenvolvimento dos filhos. O que mais lhe chamou a atenção
nesse processo? O que foi motivo de encantamento e o que foi
# - 22 motivo de preocupação? Por quê? Registre ou grave as respostas
#
obtidas. Caso a pessoa queira lhe mostrar fotos da criança ou ano­
tações sobre ela, observe-as atentamente e sintetize as informa­
ções proporcionadas por esses materiais.
• Pergunte à professora quais são as situações a que ela presta aten­
ção para analisar o desenvolvimento de seus alunos. Procure saber
o que a encanta e o que a preocupa em seus alunos. Peça a ela que
descreva algumas situações ou experiências que foram marcantes
em seu trabalho com as crianças. Registre as respostas obtidas.

2. Em grupo, organizem os dados obtidos, reunindo as respostas seme­


lhantes. Destaquem nas respostas dadas pelos pais e professoras os
aspectos que as associam à visão inatista-maturacionista do desen­
volvimento.
Concluído o trabalho, convém guardar os registros das entrevistas e o
resultado da organização dos dados estabelecida pelo grupo, pois
eles serão utilizados em atividades referentes aos próximos capí­
tulos.

Exercitando a análise

Leia o livro A Terra dos Meninos Pelados, de Graciliano Ramos


(Editora Record). Nesse livro, o autor conta a estória de Raimundo, um
menino considerado “diferente” ...
Após a leitura, responda:
• De que tipos são as diferenças de Raimundo?
• Quais as consequências dessas diferenças na vida do menino?
Em grupo, discutam essas questões, relacionando-as com as idéias
apresentadas no capítulo a respeito do desenvolvimento humano.

Sugestão de leituras

A curva do sino. Folha de S. Paulo, 30 de outubro de 1994, p. 6-4 a 6-6.


B ee,H. A criança em desenvolvimento. São Paulo: Harper e Row do
Brasil, 1977.

23
TEXTO 3
Capítulo 3

A abordagem
comportamentalista

Ao contrário do inatismo-maturacionismo, a abordagem compor­


tamentalista destaca a importância da influência de fatores externos, do
ambiente e da experiência sobre o comportamento da criança.
Enquanto aquela abordagem enfatiza o papel de fatores biológicos
internos, como a hereditariedade e a maturação, o comportamentalismo
parte do princípio de que as ações e as habilidades dos indivíduos são
determinadas por suas relações com o meio em que se encontram.
John B. Watson foi o fundador do movimento comportamentalista
(ou behaviorista, do inglês behavior, que significa “comportamento”)
na psicologia. Ele definiu a psicologia como a ciência do comportamen­
to, como um ramo objetivo e experimental das ciências naturais.

Quem foi Watson?

John Broadus Watson nasceu em 1878, nos


EUA, e viveu até 1958. Formou-se em Filosofia,
pela Universidade de Furmam. aos 22 anos, mas
logo interessou-se pela psicologia animal, área em
que desenvolveu sua tese de doutoramento.
Em 1908, assumiu o cargo de professor de Psi­
cologia na Universidade Johns Hopkins, onde conti­
nuou suas pesquisas com animais.
Após algumas tentativas de formulação de prin­
cípios que considerava mais objetivos para o estudo
da psicologia — desestimuladas pelas críticas —,
Watson publicou, em 1913, um artigo intitulado “A

ft
psicologia como um behaviorista a vê", considera­
do o lançamento oficial da escola behaviorista.
O fato de incluir a psicologia entre as ciências naturais deve-se à
crença na existência de uma continuidade entre o animal e o homem.
Ou seja, para os comportamentalistas, embora o comportamento do ho­
mem difira do dos animais em razão de um maior refinamento e com­
plexidade, ambos podem ser explicados pelos mesmos princípios. Des­

.
se modo, o comportamento humano não é privilegiado como objeto de
pesquisa: no comportamentalismo, estudam-se tanto o comportamento
humano quanto o comportamento animal.

Mas o que é comportamento?


Na perspectiva de Watson, podemos dizer que o comportamento é
sempre uma resposta do organismo (humano ou animal) a algum estí­
mulo presente no meio ambiente.
Por estímulo, Watson entende toda modificação do ambiente que
pode ser captada pelo organismo por meio dos sentidos. Assim, as res­
postas são modificações que ocorrem no organismo em decorrência
desses estímulos, como, por exemplo, alterações na expressão facial,
mudanças na posição do corpo, ações ou movimentos de qualquer tipo.
Imaginemos um pequeno animal silvestre bebendo água na beira
de um riacho. Ao captar um ruído de passos de animal no mato, ele sai
correndo. Na linguagem comportamentalista, diremos que o ruído (estí­
mulo) provocou, no animal, uma resposta: o ato de correr.
O que interessa à psicologia, entendida como uma ciência natural
e objetiva, é a relação entre estímulos e respostas — fatos exteriores
que podem ser empiricamente observados. O que ocorre no interior do
organismo entre um dado estímulo e uma dada resposta não pode ser
observado e, portanto, não interessa aos psicólogos comporta­
mentalistas. No exemplo do animal silvestre bebendo água, o compor­
tamento do animal é explicado pela relação entre o estímulo (o ruído) e
a resposta desencadeada por ele (correr), e não a partir de determinado
estado interno do organismo.
Veja bem: isso não significa que Watson descarte a existência de pro­
cessos internos no organismo. Ele apenas considera que tais processos
devem ser estudados pela fisiologia. A psicologia, segundo sua concep­
ção, cabe o estudo das respostas do organismo aos estímulos do meio.
Assim, os problemas de que se ocupa o comportamentalismo são:
prever a resposta, quando se conhece o estímulo, e identificar o estímu­
lo, quando se conhece a resposta. Ou seja, o estudo do comportamento
deve possibilitar o conhecimento das relações estímulo-resposta, das
quais ele é o resultado. Assim, cabe ao comportamentalista descobrir
quais são os estímulos que provocam determinado comportamento.
De acordo com essa concepção, o comportamento animal ou huma­
no é sempre uma adaptação, uma reação aos estímulos, às alterações que
se processam no ambiente. Essa postura ambientalista opõe-se a qual­
quer tipo de inatismo. Para Watson, não existem aptidões, disposições
intelectuais ou temperamentos inatos ou hereditários. O que existe é certa
propensão para responder a certos estímulos de uma forma determinada.
to e aprendizagem
Para o comportamentalismo, a aprendizagem é um tema central.
Ao enfatizar a influência dos fatores externos e ambientais, essa con­
cepção teórica afirma que o mais importante na determinação do com­
portamento do indivíduo são as suas experiências, aquilo que ele apren­
de durante a vida. Aliás, podemos dizer que o comportamentalismo
confunde-se com uma teoria da aprendizagem, uma vez que sua preo­
cupação básica é explicar como os comportamentos são aprendidos.
Skinner, outro importante comportamentalista, cujo trabalho deu
continuidade a algumas das formulações de Watson, distingue dois ti­
pos de aprendizagem: por condicionamento clássico e por condiciona­
mento operante.

Quem foi Skinner?


Burrhus Frederic Skinner, psicólogo norte-americano, tiascido
em 1904, foi o criador do que ele denominou “análise experimental
do comportamento ”, método que permite prever e con­
trolar cientificamente o comportamento humano.
Doutorou-se em Harvard, em 1931, e depois de
alguns anos lecionou na Universidade de Minnesota
e na Universidade de Indianaf da qual foi presidente.
Regressou a Harvard como professor e pesquisador
em 1947.
Skinner interessou-se pela análise da aprendiza­
gem verbal, pelo adestramento de pombos, pelas má­
quinas de ensinar e pelo controle do comportamento
tnediante reforço positivo.
Até a sua morte, em 1980, desenvolveu trabalhos
de aplicação tecnológica dos princípios da análise ex­
perimental do comportamento no campo do ensino e no
trabalho psicoterapêutico. Atém disso, dedicou-se à
elaboração de uma fdosofia, o behavior \smo, que se vincula ao mo-
vimerüó de análise experimental do com

A aprendizagem por condicionamento clássico envolve um tipo de


comportamento determinado, que é sempre provocado por um estímulo
também determinado. Ela envolve uma reação do organismo ao meio e
não uma ação do organismo sobre o meio.
Digamos que alguém dê um sopro em seus olhos. Você automatica­
mente irá piscar. Piscar é uma reação, uma resposta a um estímulo. Não
se pode dizer que tenha sido uma resposta aprendida. No entanto, se
toda vez que alguém sopra em seus olhos soa uma campainha, pode
chegar um momento em que você piscará ao ouvir tal campainha, mes­
mo na ausência do sopro. Dizemos, então, que você aprendeu a piscar
quando ouve determinado som.
Em relação à primeira parte do nosso exemplo, podemos dizer que
o sopro é o estímulo que provoca a reação de piscar. Essa reação, como
já dissemos, é um tipo de resposta não aprendida, é um reflexo do orga­
nismo. A medida que o sopro é associado a um som determinado, esse
som passará a servir como um estímulo que também provoca a resposta
de piscar. Nesse caso, o som é chamado pelos comportamentalistas de
estímulo condicionado, porque, por si mesmo, ele não provoca a reação
de piscar, mas apenas quando é associado a outro tipo de estímulo (o
sopro) que automaticamente desencadeia tal reação.
Esse é um exemplo de aprendizagem por condicionamento clássi­
co, em que estão envolvidos um estímulo condicionado e uma resposta
que é simplesmente uma reação do organismo. Esse tipo de aprendiza­ Para Skinner, a
gem não implica nenhuma iniciativa por parte de quem aprende. Ou birra é um
seja, a pessoa aprende a piscar quando ouve um som determinado por­ comportamento
que se aprende.
que sua reação original acabou se associando a um novo estímulo.
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Já a aprendizagem por condiciona­
mento operante se dá de forma bastante
diferente, apoiando-se não em reações
provocadas por estímulos, mas em
comportamentos emitidos pelo próprio
organismo que são seguidos por algum
tipo de consequência.
Se o comportamento é seguido
por uma conseqüência agradável, ele
tende a se repetir. Ao contrário, se a
consequência for desagradável, o com­
portamento tem menos probabilidade
de se repetir. Essas consequências,
chamadas pelos comportamentalistas
de reforçadores, “modelam” o compor­
tamento dos indivíduos, sendo respon­
sáveis pela criação dos hábitos.
Segundo a concepção de Skinner,
a grande maioria dos comportamentos
das pessoas é aprendida por condicio­
namento operante. A birra de uma crian­
ça, por exemplo, é um comportamento
aprendido. Se a criança chora e
esperneia e a mãe (ou outro adulto) lhe
dá algo que ela deseja (como um doce,
um brinquedo, um refrigerante), o
comportamento da criança é reforçado e tende a se repetir em outras
ocasiões. Da mesma forma, uma criança pequena que sozinha leva o
copo de água à boca, tende a repetir esse comportamento se for elogia­
da e beijada pela mãe. Mas, se a mãe a repreender todas as vezes (te­
merosa de que a água seja derramada), ela provavelmente deixará de 27
ter esse comportamento.
Pesquisando a criança: condicionamento e
modelagem do comportamento
A idéia de que os comportamentos e as habilidades do indivíduo
são sempre aprendidos a partir da influência do ambiente serviu de base
para pesquisas psicológicas que tinham como objetivo estabelecer um
método que permitisse prever e controlar cientificamente o comporta­
mento humano ou animal.
Para que você saiba um pouco sobre as pesquisas que auxiliaram a
produção de conhecimentos relativos a como os comportamentos são
aprendidos, destacaremos aqui as pesquisas mais conhecidas de Watson
e Skinner.

A aprendizagem de comportamentos emocionais: uma


pesquisa de Watson

Interessado em saber como as crianças aprendiam comportamen­


tos emocionais, Watson realizou uma pesquisa com crianças de 4 meses
a 1 ano de idade que haviam sido criadas em hospitais e nunca tinham
visto nenhum dos animais ou objetos utilizados no experimento.
Vários animais foram apresentados às crianças no laboratório e em
um jardim zoológico. Suas reações eram todas anotadas pelo pesquisa­
dor. O resultado dessas situações foi sempre o mesmo: não se verificou
nenhuma manifestação de medo nas crianças.

Watson já havia verificado que situações como exposição a um


ruído forte, perda do equilíbrio ou sensação de dor provocavam rea­
ções de medo nas crianças. Para ele, essas seriam as situações originais
que suscitariam medo.

k
Como explicar o medo de tanta coisa que muitas crianças mais ve­
lhas e até mesmo adultos sentem? Watson afirma que medo de cachor­
ro, de escuridão, de insetos, e outros tipos de medo, é um sentimento
aprendido através de condicionamento. Ele resolveu verificar se era
possível produzir, em laboratório, uma reação de medo.
O sujeito da experiência foi uma criança de 11 meses que original­
mente não demonstrava medo a animais peludos, como o coelho e o
rato branco. Quando, no laboratório, era apresentado à criança um rato
branco e ela o tocava, um ruído forte — de uma barra de aço golpeada
com um martelo — era produzido. A criança manifestava então reações
de medo: estremecia e começava a chorar.
Após várias repetições desse procedimento, a criança passou a
apresentar reações de medo diante do rato branco quando este lhe era
apresentado sozinho (sem o ruído). Watson verificou, ainda, que tal rea­
ção estendia-se a outros animais ou objetos que lembravam o rato bran­
co: um coelho, um cão, um casaco de peles ou um chumaço de algodão.
Você pode reconhecer nessa experiência uma situação experimen­
tal de aprendizagem por condicionamento clássico. Um estímulo que
originalmente não provocava a resposta de medo (o rato branco) foi
associado a outro que naturalmente a provocava (um ruído forte), tor­
nando-se, assim, um estímulo condicionado. A reação de medo a ani­
mais peludos foi, portanto, aprendida pela criança.
Com esse experimento, Watson procurava comprovar a sua tese de
que a maioria das reações emocionais das pessoas é aprendida a partir da
influência do ambiente. Procurava também explicar “como as pessoas
aprendem”, explicitando os princípios do condicionamento clássico.

Modelagem do comportamento: as pesquisas de Skinner

Skinner, por sua vez, interessou-se fundamentalmente pela apren­


dizagem por condicionamento operante, realizando pesquisas inicial­
mente com ratos, depois com pombos c, por último, com pessoas.
Para estudar o problema da programação do reforço no condiciona­
mento operante, Skinner utilizava em suas pesquisas com ratos uma
caixa em cujo interior havia
um dispositivo (uma pequena
barra de metal) que, quando
acionado, liberava água ou
comida. Essas caixas, com Caixa de Skinner.
isolamento contra ruídos e srnmrniiwmmm».
controle rigoroso de tempera­
tura e iluminação (para evitar
que sons, a luz ou o calor in­
terferissem em seus experi­
mentos), ficaram conhecidas
como “caixas de Skinner”.
Os experimentos consistiam em programar de modos diferentes a
liberação de reforçadores e estudar como cada programação afetava o
comportamento do animal (qual era mais eficiente para levar à aprendi­
zagem de um comportamento novo; qual era mais adequado para man­
ter esse comportamento por mais tempo; qual representava a melhor
forma de extinguir um dado comportamento, etc.).
Uma das formas utilizadas, para obter a aprendizagem de um novo
comportamento (no caso, pressionar a barra de metal), era colocar o
rato na caixa de Skinner após ter sido privado de água por certo tempo.
Supunha-se que a privação faria da água um excelente reforçador, já
que obtê-la resultaria para o rato na satisfação de uma necessidade.
Adotava-se, então, o seguinte procedimento: inicialmente, toda
vez que o rato se aproximava da barra de metal, o pesquisador liberava-
lhe, por meio de um dispositivo, um pouco de água. Após determinado
tempo, estando o rato próximo à barra, a água só era liberada se ele a
tocasse com o focinho ou a pata. Em seguida, reforçava-se (pela libera­
ção da água) apenas o comportamento de tocar a barra com a pata e,
depois, o de pressioná-la para baixo. Após várias sessões, verificava-se
que o rato tinha aprendido a pressionar a barra de metal para obter água.
Esse procedimento é conhecido como modelagem do comporta­
mento. A modelagem é obtida proporcionando-se reforçadores após
respostas que gradativamente se aproximam da resposta que se deseja
obter do animal (no caso, a pressão na barra).
Tal método envolve os princípios do condicionamento operante (o
comportamento emitido pelo animal, se reforçado, tende a se repetir) e
tem sido utilizado pelos comportamentalistas em uma série de situa­
ções, tanto na prática terapêutica clínica quanto no campo do ensino.
O que há em comum nos experimentos de Watson e Skinner é a
tentativa de controlar o comportamento pela manipulação de elementos
do ambiente que precedem (os estímulos) ou sucedem (os reforçadores)
ao comportamento. Além disso, os experimentos de um e de outro vi­
sam conhecer os princípios pelos quais o comportamento humano é
aprendido durante a vida.
Assim, os princípios descobertos ou sistematizados mediante si­
tuações experimentalmente controladas são os mesmos que explicam
os comportamentos aprendidos em situações cotidianas. Conforme a
perspectiva comportamentalista, pode-se dizer que pais e educadores,
por exemplo, modelam o comportamento da criança por meio de proce­
dimentos que correspondem ao condicionamento operante.

Fonte; Nossas crianças. Abril Cultural. 1970. v. 5.


(1

A ênfase dada pelos comportamentalistas à questão da aprendiza­


gem é resultado do pressuposto de que o ambiente e a experiência são
determinantes do comportamento. Os processos e fatores internos ao
indivíduo não são levados em conta, e o próprio desenvolvimento é
explicado como decorrente da aprendizagem.
Melhor dizendo, para os comportamentalistas, desenvolvimento e
aprendizagem são processos coincidentes. Aquilo que chamamos de
desenvolvimento nada mais é do que o resultado das aprendizagens
acumuladas no decorrer da vida do indivíduo. Por isso, os dois proces­
sos não se distinguem.
A idcia de que os comportamentos humanos são aprendidos em
decorrência de contingências ambientais e a noção de modelagem do
comportamento têm influenciado as práticas educativas. De acordo
com Skinner, ensinar é planejar/organizar essas contingências de modo
a tomar mais eficiente a aprendizagem de determinados conteúdos e
habilidades. A utilização de reforçadores e a organização da aprendiza-,
gem por pequenos passos são princípios decorrentes dessa abordagem.
Uma das marcas deixadas pelo comportamentalismo na educação
escolar foi a valorização do planejamento do ensino, tendo chamado a
atenção para a necessidade de se definirem com clareza e operacional­
mente os objetivos que se pretende atingir, para a organização das se-
qüências de atividades e para a definição dos reforçadores a serem utili­
zados (elogios, notas, pontos positivos, prêmios, etc.).
O próprio Skinner interessou-se pelo processo de ensino-aprendi­
zagem (reveja o boxe ‘Quem foi Skinner?’). Nas suas “máquinas de
ensinar”, o aluno é colocado diante de um painel onde aparece uma
questão relativa a algo que ele já conhece e, ao mesmo tempo, uma nova
informação concernente ao mesmo tema. O aluno deve responder à
questão apresentada e, se acertar, a máquina passará automaticamente
para a questão seguinte, que será referente à informação dada imediata­
mente antes. Se não acertar, não poderá prosseguir, devendo retomar a
algum passo anterior.
Por meio desse procedimento, organiza-se a aprendizagem da
criança “passo a passo”, em ordem crescente de dificuldade, seguindo
os princípios da modelagem do comportamento, e cada resposta certa
da criança constitui um reforço para a aprendizagem.
A chamada “instrução programada” derivou das máquinas de
Skinner. As questões apresentadas às crianças são impressas e as res­
postas corretas aparecem em outra página, em um gabarito. As questões
são intercaladas por pequenos textos informativos sobre os quais a
criança deverá responder no passo seguinte. De acordo com o compor­
tamentalismo, esse procedimento permite que o ensino tenha uma pro­
gressão gradual, que respeita o ritmo de cada aluno e toma o processo
de ensino-aprendizagem mais eficiente.

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