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FACULDADE DA CIDADE DE MACEIÓ

LUANA MACENA DE MELO

A ACUMULAÇÃO DE CARGOS PÚBLICOS À LUZ DA CONSTITUIÇÃO DE


1988

MACEIÓ-AL
2018

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LUANA MACENA DE MELO

A ACUMULAÇÃO DE CARGOS PÚBLICOS À LUZ DA CONSTITUIÇÃO DE


1988

Trabalho apresentado para obtenção de


nota referente a Bases Constitucionais da
Administração Pública do 4º Período de
Direito, turma Q, sob orientação da
Professor Carlos Bernardo.

MACEIÓ-AL
2018

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INTRODUÇÃO

A necessidade financeira compele as pessoas a buscar cada dia mais aumentar seus
rendimentos, que seja por atividades esporádicas quer seja pelo acumulo de empregos. Em
virtude da estabilidade e da boa remuneração é cada dia mais comum o acumulo de cargos
públicos.
Analisaremos a licitude e a ilicitude do acumulo de cargos públicos no Brasil, bem
como os requisitos obrigatórios para que o acumulo de cargos públicos, ato lícito, não se tornem
ilícitos a luz da Constituição Federal de 1988.

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Acumulação de cargos públicos

Popularmente entende-se o acumulo como sendo a concentração excessiva de


algo. Inclusive, a nossa associação cerebral avalia o acumulo como algo negativo, ou
seja, o excesso desnecessário de algo.
A atual economia brasileira a cada dia faz o salário do trabalhador render
mensalmente menos que o mês anterior e como forma de tentar manter o seu padrão de
vida, é cada dia mais comum que se tenha mais de um emprego, gerando o tão
conhecido acumulo de funções. E estranhamente, nesta situação não associamos o
acumulo a algo negativo, já associamos a algo natural e normal.
O emprego público é atualmente a melhor alternativa para quem busca a
estabilidade, uma jornada justa de trabalho, e claro, status. Afinal, ser funcionário
público dá maior respeitabilidade. Quer seja por admissão em concurso público, quer
seja como cargo comissionado é cada dia mais comum a acumulação de cargos públicos
em qualquer das esferas.
É salutar salientar que nem sempre será possível acumular cargos públicos,
sendo totalmente vedadas as atividades que impliquem em dedicação exclusiva e nos
demais casos vale o que prevê a Constituição Federal, no art. 37, inciso XVI, que
estabelece a possibilidade legal de acumulação de cargos nos seguintes termos:
“Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes
da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos
princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e
eficiência e, também, ao seguinte:
XVI – é vedada a acumulação remunerada de cargos públicos, exceto,
quando houver compatibilidade de horários, observado em qualquer caso o
disposto no inciso X.
a) a de dois cargos de professor;
b) a de um cargo de professor com outro, técnico ou científico;
c) a de dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde, com
profissões regulamentadas. ”

Para compreendermos por completo o inciso XVI faz-se necessário buscar a


definição de cargo público que está contida no art. 3º da Lei nº 8.112, de 1990, que
assim estabelece:
“Art. 3º. Cargo público é o conjunto de atribuições e responsabilidades
previstas na estrutura organizacional que devem ser cometidas a um servidor.
Parágrafo único. Os cargos públicos, acessíveis a todos os brasileiros, são
criados por lei, com denominação própria e vencimento pago pelos cofres
públicos, para provimento em caráter efetivo ou em comissão”.

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Ainda assim o inciso XVI não é claro, visto que ainda esbarramos na ausência de
definição legal do que seja um cargo técnico ou científico, cabendo um conceito
subjetivo para o caso concreto e por consequência implicando numa insegurança
jurídica.
Destaquemos ainda que os servidores públicos federais têm suas relações
regulamentadas pela lei acima citada, popularmente conhecida como Regime Jurídico
Único, que além da definição contida no Art. 3º complementa as informações da Carta
Magna sobre a acumulação de cargos públicos:
Art. 118. Ressalvados os casos previstos na Constituição é vedada a
acumulação remunerada de cargos públicos.
§1º. A proibição de acumular estende-se a cargos, empregos e funções
públicas, sociedades de economia mista da União, do Distrito Federal, dos
Estados, dos Territórios e dos Municípios.
§2º. A acumulação de cargos, ainda que lícita, fica condicionada à
comprovação da compatibilidade de horários.

Note-se que o critério utilizado m linhas gerais é a função a ser exercida e a


compatibilidade de horários para o exercício destas funções acumuladas.
Estas regras para acumulação de cargos públicos também se aplicam à
administração indireta, incluindo empresas públicas de direito
privado, fundações, sociedades de economia mista e sociedades controladas pelo poder
público, mesmo que se trate de empregado. (RE 130.539/DF)
“Acumulação. Cargo público e emprego em Sociedade de Economia Mista.
- A norma proibitiva do § 2º do art. 99 da Constituição tem aplicação
necessária aos Estados, e é abrangente de qualquer espécie de vínculo
empregatício, seja estatutário ou trabalhista, compreendendo autarquias,
empresas públicas e sociedades de economia mista. Recurso extraordinário
conhecido e provido. ” Do exposto, nego seguimento ao recurso. ”

A compatibilidade de carga horária

Inicialmente estamos novamente diante de outro critério subjetivo que a


definição de “compatibilidade de horários”. E para dirimir tal questão a matéria foi
submetida à Advocacia-Geral da União, que dentre suas competências está a assessoria
e consultoria da Administração Pública Federal.
E em 16 de março de 1998, a AGU publicou o Parecer GQ-145, normatizando
que seria considerado ilegal o exercício cumulativo de funções aqueles que tivessem
pelo menos dois regimes de quarenta horas semanais. Determinou ainda que sessenta
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horas não implicaria em ilegalidade. Este parecer foi chancelado pelo presidente da
República, tornando-se vinculante a toda Administração Pública Federal.
Exaltemos a lacuna que ocorreu com tal parecer, visto que considerou 80
(oitenta) horas como ilegal e 60 (sessenta) horas como permitido, ignorando a
possibilidade de um acumulo de cargo como 70 (setenta) ou 75 (setenta e cinco) horas
semanais.
A temática acumulação de cargos públicos é constantemente circundada de
critérios subjetivos que terminam por ferir o princípio da isonomia. Aplicar a analogia
neste caso, é um risco desnecessário visto que permite tanto avalizar 70 (setenta) como
legal quanto como ilegal.
O Tribunal de Contas da União, por exemplo, aplica uma interpretação restritiva
do parecer da AGU como podemos notar no Acórdão n. 2133/2005-Plenário:
“Sumário: Admissão. Acumulação de dois cargos públicos privativos da área
de saúde. Jornada de trabalho de setenta e cinco horas semanais. Ilegalidade
da admissão. Dispensa de devolução dos valores percebidos. Determinações.
(…) 3. Em situações similares à ora verificada, em que a carga de trabalho
excede 60 (sessenta) horas por semana, esta 1ª Câmara tem considerado
ilegais os correspondentes atos de admissão, negando-lhes o registro,
conforme Acórdãos ns. 533/2003, 2.860/2004 e 155/2005.
A propósito, conquanto o texto constitucional, para efeito da verificação da
compatibilidade de horários, não aluda expressamente à duração máxima da
jornada de trabalho, as condições objetivas para a acumulação de cargos
devem ser aferidas sob uma ótica restritiva, porquanto a hipótese, como dito,
constitui exceção à regra geral de não acumulação. “

Vemos ainda que em 2014, o Superior Tribunal de Justiça decidiu que:


“É vedada a acumulação de dois cargos públicos quando a soma da carga
horária referente aos dois cargos ultrapassar o limite máximo de 60 horas
semanais. No caso concreto, a servidora acumulava dois cargos públicos
privativos de profissionais de saúde e a soma da carga horária semanal de
ambos era superior a 60 horas. A servidora foi notificada para optar por um
dos dois cargos, tendo se mantido inerte. Diante disso, foi demitida de um
deles por acumulação ilícita de cargos públicos. A servidora impetrou
mandado de segurança, mas o STJ reconheceu que a demissão foi legal. STJ.
1ª Seção. MS 19.336- DF, Rel. originária Min. Eliana Calmon, Rel. para
acórdão Min.Mauro Campbell Marques, julgado em 26/2/2014 (Info 548).”

Até então, analisamos somente se seria compatível o acumulo de duas funções,


visto que a semana tem 07 (sete) dias e cada dia com 24 (vinte e quatro) horas
perfazendo o total de 168 (cento e sessenta e oito) horas.
No entanto, estamos nos esquecendo que nos referimos a pessoas acumulando
funções e não máquinas e precisamos trazer a luz os preceitos da Constituição Federal
através do Art. 6º “São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a

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moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à
maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”.
Portanto, há entendimento equivocado sobre o que seria a compatibilidade de
horários, primeiro porque simplesmente permite entender que se uma jornada terminar
neste instante e, no seguinte, outra jornada se iniciar estaremos diante da
compatibilidade, ignorando requisitos básicos previstos no Art. 6º como condições
adequadas de deslocamento entre os locais de trabalho, bem como necessidades
fundamentais a todo e qualquer ser humano que é o descanso adequado e o lazer que
atingem diretamente a saúde do trabalhador se não forem respeitadas.
Sabiamente Mozart Victor Russomano, condena as jornadas diárias extensas
“porque, se o empregado repousar, trabalhará mais, produzindo melhor, enchendo o
mercado de produtos abundantes e qualificados”. Alerta que não seria
“Razoável entenderem-se compatíveis os horários cumpridos
cumulativamente de forma a remanescer, diariamente, apenas oito horas para
atenderem-se à locomoção, higiene física e mental, alimentação e repouso,
como ocorreria nos casos em que o servidor exercesse dois cargos ou
empregos em regime de quarenta horas semanais, em relação a cada um”.
(RUSSOMANO, 1990, p. 86)

Seguindo os preceitos de RUSSOMANO o Tribunal de Contas da União, no


voto proferido pelo Relator Ministro José Jorge, por meio do Acórdão nº 1168/2012 -
explicita:
11. Ainda que não expressamente demarcada, penso que a compatibilidade de
horários deve sempre observar, prioritariamente, o atendimento ao interesse
público, não podendo se circunscrever à simples comprovação de ausência de
superposição de jornadas. Decerto, o legislador, ao vedar - via de regra – a
acumulação de cargos, ou admiti-la de forma restrita, buscou, dentre outros
objetivos, garantir melhor qualidade na prestação dos serviços públicos. Não
é demais relembrar que o princípio da eficiência, nos termos do art. 37, caput,
da Constituição, também deve nortear as ações oriundas da administração.
12. Além de não se prestar a atender interesses particulares, em desfavor de
um melhor desenvolvimento da função pública, a verificação da
compatibilidade de horários não pode comungar com a degradação da
condição humana, consistente no repouso inadequado e não reparador, na
redução do tempo de alimentação e do deslocamento seguro, circunstâncias
essenciais para a sanidade física e mental de qualquer trabalhador.

Ao analisar os julgados alinhados com o Parecer GQ-145/98 e dos acórdãos do


TCU fica explicitado o entendimento restritivo condicionando o acumulo de cargos a
até 60 horas semanais para as situações constitucionalmente permitidas. Percebe-se que
este entendimento restritivo se alinha com a CLT Art. 66 “Entre 2 (duas) jornadas de
trabalho haverá um período mínimo de 11 (onze) horas consecutivas para descanso. ”

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A pacificação sobre a carga horária para acumulo de função precisa ser feita pelo
Supremo Tribunal Federal que ao longo dos anos se contradisse em suas decisões tanto
considerando inconstitucional a limitação de carga horária compatível bem como
decidindo pelo desprovimento de caso parecido. A solução seria uma súmula vinculante
que aparentemente não está sendo construída.

A licença não remunerada e o acumulo de cargo

Para tentar solucionar a incompatibilidade de carga horária e não onerar os


cofres públicos, poderia ser possível o afastamento do servidor mediante licença sem
vencimentos para que este pudesse assumir o outro cargo público.
A licença é um período de interrupção ou de suspensão do exercício do cargo
público em razão de motivos previstos nas legislações estatutárias, a ocorrer nos prazos
e condições indicados em lei. O Regime Jurídico Único, Lei n° 8.112/90, prevê as
motivações da licença:
“ Art. 81. Conceder-se-á ao servidor licença:
I - por motivo de doença em pessoa da família;
II - por motivo de afastamento do cônjuge ou companheiro;
III - para o serviço militar;
IV - para atividade política;
V - para capacitação;
VI - para tratar de interesses particulares;
VII - para desempenho de mandato classista”

Desta forma, o inciso VI atenderia a questão permitindo “tratar de interesses


particulares” e conforme o mesmo Regime esta licença pode ser sem remuneração
conforme previsto no § 3º do Art. 183.
No entanto, segundo entendimento da Administração Pública, mesmo de licença
sem remuneração o servidor ainda mantém vínculo com o órgão, mesmo sem onerar os
cofres públicos. Desta forma, ainda que exista compatibilidade de horários e o servidor
esteja licenciado de uma de suas funções, permanece a restrição constitucional, nos
termos da Súmula nº 246 do Tribunal de Contas da União:
“O fato de o servidor licenciar-se, sem vencimentos, do cargo público ou
emprego que exerça em órgão ou entidade da administração direta ou indireta
não o habilita a tomar posse em outro cargo ou emprego público, sem incidir
no exercício cumulativo vedado pelo artigo 37 da Constituição Federal, pois
que o instituto da acumulação de cargos se dirige à titularidade de cargos,

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empregos e funções públicas, e não apenas à percepção de vantagens
pecuniárias. ”

Em casos concretos fica nítido este entendimento, a exemplo do Tribunal


Regional Federal da 1ª Região - APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA:
AMS 58754 MG 1998.01.00.058754-0:
Ementa: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO - SERVIDOR
PÚBLICO EM GOZO DE LICENÇA SEM REMUNERAÇÃO - POSSE EM
NOVO CARGO PÚBLICO SEM DESLIGAMENTO COM A ENTIDADE
DE ORIGEM: IMPOSSIBILIDADE - INTELIGÊNCIA DO ART. 37, XVI E
XVII, DA CF/88 - APELAÇÃO E REMESSA OFICIAL PROVIDAS. 1. A
licença para tratar de interesses particulares não rompe o vínculo entre o
funcionário e a entidade a que ele pertence, sendo manifesta a
incompatibilidade da acumulação de cargos, um da administração indireta
(Analista do Banco Central do Brasil) e outro da administração direta
(Auditor Fiscal do Tesouro Nacional), por isso que não autorizada pela
Constituição (art. 37, XVI e XVII). 2. "O fato de o servidor encontrar-se
licenciado para tratar de interesses particulares não descaracteriza o seu
vínculo jurídico, já que a referida licença somente é concedida a critério da
administração e pelo prazo fixado em lei, podendo, inclusive, ser
interrompido, a qualquer tempo, no interesse do serviço ou a pedido do
servidor" (RE n. 180597-8/CE, STF, T1, Rel. Min. ILMAR GALVÃO, ac.
un., DJ 27 MAR 98, p. 18). 3. Apelação e remessa oficial providas. 4.
Processo recebido no Gabinete em 06 NOV 2000 para lavratura do acórdão.
Acórdão liberado pelo Relator em 23 NOV 2000 para a publicação.

Acumulação lícita de cargo

O “jeitinho brasileiro” encontrou uma forma de tornar lícito o que é ilícito,


criando os "prestadores de serviço". Empresas terceirizadas contratam o servidor que
não poderia mais adquirir nenhum cargo ou função, passando este a ser mero
funcionário da empresa.
Afinal, o servidor estava impedido de ser novamente funcionário de outro órgão
público e não de ser contratado por uma empresa privada. Este servidor não é culpado
pela “coincidência do destino” que irá aloca-lo para trabalhar em um órgão público.
Assim como é inocente se seu pagamento advém dos cofres públicos fruto da
contratação da empresa com o órgão.
Na prática temos total consciência que não foi um “milagre divino” que se
abateu, ao tempo que também não é possível punir neste tipo de situação. Só nos
restaria acreditar no grande poder da licitação para que uma empresa séria vencesse a
concorrência.

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Mesmo com o mecanismo da licitação que a priori deveria dar transparência ao
uso do dinheiro público, este também é constantemente burlado de forma a atender os
interesses particulares dos gestores públicos.
Podemos citar como formas de burlar o sistema os acordos entre as empresas
que combinam o seu preço e entre si já orquestram quem irá vencer, podendo este
acordo ainda incluir o gestor do órgão. Neste último caso é conferido favores ao gestor
que podem incluir repasses financeiros em cima do valor do contrato ou ainda a
contratação de pessoas por ele indicada.
Há somente uma forma de acumulo de cargo público: o que está previsto no Art.
37 da Constituição Federal. Seu texto é taxativo e não exemplificativo, portanto
somente é permitido dois cargos de professor, ou um de professor com outro técnico ou
científico, ou os dois privativos de profissionais de saúde, conjuntamente com a
compatibilidade de horários.
Novamente o caso concreto é elucidador conforme Acórdão nº 3075/16, do
Tribunal de Contas do Estado do Paraná, quando da análise do acúmulo do cargo de
Assessor Jurídico em três Municípios distintos:
“A defesa sustentou a plena compatibilidade de horários, uma vez que a
carga horária para o cargo efetivo era de 20 (vinte) horas semanais. A
compatibilidade de horários não é uma premissa constitucional isolada. O
artigo 37, inciso XVI, da Constituição Federal, é absolutamente cristalino ao
dispor que “é vedada a acumulação remunerada de cargos públicos, exceto,
quando houver compatibilidade de horários, observado em qualquer caso o
disposto no inciso XI”, que por sua vez é taxativo quanto à possibilidade de
cumulação nos seguintes casos: “(...) a) a de dois cargos de professor; b) a de
um cargo de professor com outro técnico ou científico c) a de dois cargos ou
empregos privativos de profissionais de saúde, com profissões
regulamentadas; Portanto, além da compatibilidade de horários, o servidor
deve se amoldar em uma das situações supramencionadas, o que não se
verifica no presente caso. Portanto, evidente a desobediência à norma inserta
no artigo 37, XVI, da Constituição Federal. Além do mais, o cargo em
comissão pressupõe, por si só, comprometimento de dedicação exclusiva à
função de direção, chefia ou assessoramento. ”

Devemos lembrar que neste caso além do acumulo de função, estamos diante de
cargos comissionados, que por sua natureza implicam em dedicação exclusiva.

Acumulação lícita e remuneração acima do teto constitucional

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Precisamos abordar a questão da remuneração do servidor público, visto que é a
motivação principal para a acumulação de cargos. Seria possível, hipoteticamente, que
um servidor público receba o dobro da remuneração de um Ministro do STF, caso ele
acumule licitamente dois cargos que paguem o teto do funcionalismo público?
A Constituição Federal no Art. 37, inciso XI define o teto de remuneração dos
servidores considerado constitucional de forma a atender o princípio ético, visto que são
as Câmaras que definem as suas próprias remunerações. Desta forma, é possível impedir
os “supersalários”, bem como proteger o Erário evitando o derramamento indevido de
verbas públicas.
XI - a remuneração e o subsídio dos ocupantes de cargos, funções e empregos
públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos membros de
qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos
e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos
cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer
outra natureza, não poderão exceder o subsídio mensal, em espécie, dos
Ministros do Supremo Tribunal Federal, aplicando-se como limite, nos
Municípios, o subsídio do Prefeito, e nos Estados e no Distrito Federal, o
subsídio mensal do Governador no âmbito do Poder Executivo, o subsídio
dos Deputados Estaduais e Distritais no âmbito do Poder Legislativo e o
subsídio dos Desembargadores do Tribunal de Justiça, limitado a noventa
inteiros e vinte e cinco centésimos por cento do subsídio mensal, em espécie,
dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, no âmbito do Poder Judiciário,
aplicável este limite aos membros do Ministério Público, aos Procuradores e
aos Defensores Públicos; (Redação dada pela Emenda
Constitucional nº 41, 19.12.2003)

A questão foi pacificada em 27 de abril de 2017, quando o Supremo Tribunal


Federal (STF) julgou os Recursos Extraordinários nº 602043 e 612975, em sede de
repercussão geral. Eis a tese definida:
“Nos casos autorizados, constitucionalmente, de acumulação de cargos,
empregos e funções, a incidência do artigo 37, inciso XI, da Constituição
Federal, pressupõe consideração de cada um dos vínculos formalizados,
afastada a observância do teto remuneratório quanto ao somatório dos ganhos
do agente público”

Compreende-se que para o STF o teto constitucional de remuneração está


diretamente ligado a cada cargo sendo exercido isoladamente e, portanto, cada um
destes é que precisa estar dentro do teto, mesmo que os somatórios dos rendimentos
deste servidor ultrapassem o teto constitucional.

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O Relator da ação, o ministro Marco Aurélio Mello baseou o seu voto no
princípio da “irredutibilidade de salários”, principio pelo qual um trabalhador não pode
ter seu salário reduzido, principalmente sendo no mesmo emprego e exercendo a mesma
função.
É importante ressaltar que o Tribunal de Contas da União (TCU) depois deste
julgado, o STF publicou o informativo Nº 862 onde publicizou este seu entendimento,
que vem sendo seguido por outras cortes brasileiras.

ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. RECURSO ORDINÁRIO


EM MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO
APOSENTADO. CUMULAÇÃO DE CARGOS PERMITIDA
CONSTITUCIONALMENTE. MÉDICO. ART. 17, § 2º, DO ADCT. TETO
REMUNERATÓRIO. INAPLICABILIDADE 1. Cuida-se, originariamente,
de Mandado de Segurança impetrado por Márcia Silva com objetivo de
assegurar o pagamento integral da remuneração a que tem direito,
relativamente a cada um dos vínculos que mantém com a Administração
(dois cargos de médico exercidos na Secretaria de Estado da Saúde do
Espírito Santo). 2. A partir da vigência da Emenda Constitucional 41/2003,
todos os vencimentos percebidos por servidores públicos, inclusive os
proventos e pensões, estão sujeitos aos limites estatuídos no art. 37, XI, da
Constituição. 3. Por outro lado, a EC 41/2003 restabeleceu a vigência do art.
17 do ADCT que, embora em seu o caput afaste a invocação do direito
adquirido ao recebimento de verbas remuneratórias contrárias à Constituição,
os respectivos §§ 1º e 2º trazem exceção ao assegurar expressamente o
exercício cumulativo de dois cargos ou empregos privativos de profissionais
de saúde. 4. Assim, a acumulação de proventos de servidor aposentado em
decorrência do exercício cumulado de dois cargos de médico, legalmente
exercidos, nos termos autorizados pela Constituição, não se submete ao teto
constitucional, devendo os cargos ser considerados isoladamente para esse
fim. 5. Recurso Ordinário provido. (STJ, RMS 38.682/ES, Rel. Ministro
HERMAN BENJAMIN, Segunda Turma, j. 18/10/2012, DJe 5/11/2012).

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CONCLUSÃO

A acumulação de cargos públicos previsto Art. 37, inciso XVI da Constituição


Federal deve ser lida de forma taxativa ao definir quais cargos ou funções podem ser
acumuladas por um servidor. É preciso lembrar que mesmo estando enquadrado como
cargo técnico, as contratações para cargos comissionados, não podem ser incluídas nas
citadas na Constituição Federal, visto que estas exigem dedicação exclusiva.
Ainda que o cargo se enquadre elencado no Art. 37, inciso XVI deve-se observar
que haja compatibilidade de horário e que cada um destes cargos não ultrapasse 60
(sessenta) horas semanais, caso contrário haverá a demissão ou exoneração.
Ressalte-se que em caso de incompatibilidade de carga horária não cabe a
licença sem remuneração. Primeiro porque o servidor continuará a manter o vínculo
empregatício e segundo porque as licenças são temporárias e, portanto, o servidor
deverá voltar as suas atividades rotineiras. O impedimento antecipa as possíveis
consequências de se permitir o acumulo de função que inicialmente seria licita e
posteriormente se tornaria ilícita.
Nem sempre o que é licito é ético e assim sendo um servidor contratado por uma
empresa privada não estaria acumulando cargos públicos, porém ao ser alocado em um
órgão público continuaria sendo lícito, mas não seria ético.
Apesar do “teto constitucional” estar voltado a evitar os supersalários, seu foco
consiste apenas na análise individualizada da remuneração pública, de forma que o
somatório de remunerações daqueles que acumulam cargo público pode ser superior ao
teto constitucional e de toda forma ser considerado um supersalário.
Fica claro que a preocupação central está na função, carga horária semanal e a
remuneração esquecendo-se de outros princípios constitucionais com a saúde, lazer e
bem-estar do servidor.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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periódica científica impressa: apresentação.

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