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Capı́tulo 1

Elementos de estrutura
nuclear

1.1 Factos e conceitos.


Um núcleo é um estado ligado de partı́culas - os nucleões -, que são de dois
tipos: o protão (p) e o neutrão (n). As massas dos nucleões são:

mp c2 = 928, 27 MeV, mn c2 = 939, 56 MeV,

A diferença entre as duas massas é

mn c2 − mp c2 = 1, 29 MeV,

Para a fı́sica nuclear, esta diferença de massa é mais importante que propria-
mente as massas, que por vezes são consideradas infinitas.
Os nucleões são fermiões com spin 1/2. Associado ao spin, os nucleões têm
um momento magnético intrı́nseco (~µs ), além do momento magnético associado
ao movimento orbital (~ µl ). Ou seja:
q ~ q
µ
~ =~
µl + ~µs = l + ~s
2m m !
~l ~s
= gl + gs µN
~ ~

onde
|e|~
µN ≡ = magnetão nuclear.
2mp
e  
1 p 2µp = 5, 585695 p
gl = gs =
0 n 2µn = −3, 826085 n
Os nucleões num núcleo estão ligados por forças nucleares que são de curto
alcance e suficientemente fortes para se sobreporem à força repulsiva de Cou-
lomb entre os protões. As interacções nucleares são interacções residuais das
interacções fundamentais entre quarks.

1
CAPÍTULO 1. ELEMENTOS DE ESTRUTURA NUCLEAR 2

A caracterização de um núcleo envolve a determinação de um conjunto de


propriedades. Por exemplo:
(i) Propriedades estáticas: a carga eléctrica, (Q), o raio nuclear, (R), a massa
nuclear, (M ), o spin nuclear, (I), a paridade, (P ), os momentos eléctricos
e magnéticos, a energia dos estados nucleares, ...

(ii) Probabilidades de acontecimentos (decaimentos e reacções),...

1.1.1 Distribuição da carga nuclear


A determinação dos raios nucleares e da distribuição de carga eléctrica nuclear
pode ser feita usando diferentes métodos, como por exemplo:
• estudos do espectro de átomos exóticos,

• estudo de desvios isotópicos,

• estudo da energia de Coulomb de núcleos-espelho,

• a difusão de partı́culas de muito alta energia.


O leitor deve procurar na bibliografia sugerida na disciplina a descrição des-
tes métodos. Aqui limitamo-nos ao estudo da difusão elástica de partı́culas de
elevada energia. Neste caso, a interpretação dos resultados é mais simples se
o projéctil não tem estrutura interna como é o caso dos electrões, que são fre-
quentemente utilizados. Então a força relevante é a força electromagnética e
consegue-se determinar a distribuição de carga. As primeiras experiências deste
tipo foram realizadas por Hofstader e os seus colaboradores, nos anos 1950s.
Desde então acumulou-se imensa informação sobre o tema. Os resultados ex-
perimentais (na figura (1.1.1) mostram-se algumas distribuições de carga para
diferentes núcleos) permitem concluir:

- Os núcleos não são esferas com uma fronteira bem definida.


No seu interior a densidade de carga é razoavelmente constante.
Na superfı́cie nuclear ρ(r) decai ao longo de uma espessura considerável.

- Em boa aproximação a distribuição de carga é descrita por uma função de


dois parâmetros - a distribuição de Fermi -,
ρ0
ρ(r) = (r−R1/2 )/a
(1.1)
1+e
onde R1/2 é a distância ao centro do núcleo na qual o valor da densidade
de carga nuclear é metade do seu valor central, e a está relacionado com
a espessura da superfı́cie do núcleo, t (t = 2a ln 9).
Experimentalmente obtém-se, para núcleos médios e pesados, os valores:

R1/2 = 1, 07A1/3 fm a = 0, 54 fm (1.2)


CAPÍTULO 1. ELEMENTOS DE ESTRUTURA NUCLEAR 3

- Partindo de ρ(r) pode determinar-se o raio médio quadrático da distribuição.


Obtém-se, para núcleos médios e pesados, aproximadamente:

hR2 i1/2 = R0 A1/3 fm, sendo R0 = 0, 94 fm (1.3)

Frequentemente o núcleo é aproximado a uma esfera de carga com densi-


dade constante e raio RC . Neste caso:
3
hR2 i = RC A2 (1.4)
5
Esta aproximação apenas é razoável para núcleos médios e pesados. Nestes
casos o raio nuclear é por vezes definido como o raio RC que dá o mesmo
valor de hR2 i que a distribuição de Fermi. Ou seja,

RC = 1, 21A1/3 (1.5)

Este resultado implica que o volume do núcleo é proporcional ao número de


partı́culas, indicando uma quase incompressibilidade da matéria nuclear.

- A espessura nuclear, t, é definida como a espessura da camada ao longo da


qual a distribuição de carga passa de 90% para 10% do seu valor máximo:

t = 2a ln 9 (1.6)

O valor de t para quase todos os núcleos pesados é aproximadamente o


mesmo:
a ≈ 2, 40 fm
CAPÍTULO 1. ELEMENTOS DE ESTRUTURA NUCLEAR 4

- ρ0 é aproximadamente o mesmo para núcleos médios e pesados:

ρ0 ≃ 0, 17 nucleões/m3 (1.7)

- Alguns núcleos desviam-se da forma esférica e têm formas elipsoidais defor-


madas (por exemplo os elementos que formam as terras raras).

- Os núcleos leves não exibem nenhum patamar onde a distribuição de carga


seja constante. Para eles não é válida a expressão R = R0 A1/3 e a
distribuição de carga é descrita por uma função gaussiana.

Difusão de partı́culas
Numa experiência de difusão tı́pica, o objecto que se pretende estudar - o alvo -
é bombardeado por um feixe de partı́culas (aproximadamente) monoenergético.
Ocasionalmente a reacção tem a forma:

a+b→c+d

onde a designa o projéctil e b o alvo. Os processos podem ser elásticos ou


inelásticos (neste caso as partı́culas no estado final são diferentes das do estado
inicial e pode haver mais que duas partı́culas).
Duas quantidades são relevantes no estudo da difusão: a secão eficaz de um
processo e a luminosidade.

Secção eficaz de difusão O número de partı́culas difundidas de um ângulo


θ numa direcção contida num ângulo sólido dΩ é proporcional ao número de
partı́culas incidentes por unidade de tempo e por unidade de área e ao ângulo
sólido dΩ. A constante de proporcionalidade é a secção eficaz diferencial de
difusão, dσ/dΩ:
dN dσ
(E, θ, ∆Ω) = L ∆Ω (1.8)
dt dΩ
CAPÍTULO 1. ELEMENTOS DE ESTRUTURA NUCLEAR 5

e L é a luminosidade, que a seguir se define.


A secção eficaz total obtém-se integrando a expressão anterior para todo o
ângulo sólido.

Luminosidade Para um acelerador de alvo fixo:

L = Fa Nb (1.9)

onde Fi é o fluxo de partı́culas incidente, Fa = na va , na é densidade de partı́culas


incidentes e va é a velocidade das partı́culas do feixe incidente.
Para um acelerador em anel de colisão, com um perimetro L, que injecta j
pacotes de partı́culas, cada um contendo ou Na ou Nb partı́culas, com velocidade
v, tem-se::
Na Nb jv/L
L= (1.10)
A
onde A é a secção recta do feixe no ponto de colisão.

Secção eficaz de difusão - expressões A secção eficaz de difusão de uma


partı́cula não relativista, sem spin, por um núcleo, suposto pontual, é dada pela
expressão de Rutherford:

Z 2 α2 ~2 c2
 

= (1.11)
dΩ Rutherf ord 4E 2 sin4 (θ/2)

Na expressão anterior, θ é o ângulo de difusão, Z o número atómico do núcleo


difusor, E é a energia cinética do electrão incidente, α é a constante de estrutura
fina e β = v/c. Esta expressão não tem em conta o recuo do alvo nem os spins
do projéctil ou do alvo.
Na difusão de electrões de elevada energia deve usar-se a expressão de Mott
para a secção eficaz de difusão:
   
dσ dσ
= [1 − β 2 sin2 (θ/2)] (1.12)
dΩ Mott dΩ Rutherf ord

A expressão de Mott assume:

• mecânica quântica relativista para o electrão,

• que o recuo do núcleo é desprezável,

• que o spin nuclear é zero,

• que a carga nuclear é pontual.

Para ter em conta o efeito do recuo do núcleo difusor há que introduzir um
termo cinemático extra:
E′ q2
     
dσ dσ 2 2 2 θ
= [1 − β sin (θ/2)] 1− tan
dΩ Mott dΩ Rutherf ord E 4M 2 c2 2
(1.13)
CAPÍTULO 1. ELEMENTOS DE ESTRUTURA NUCLEAR 6

onde M é a massa do núcleo–alvo, E ′ é a energia final do electrão, ~q é o qua-


drivector momento transferido:
EE ′ 4EE ′
 
θ
q 2 = (p − p′ )2 = 2m2e c2 − 2 2
− | p
~ || p
~ ′
| cos θ ≈ − 2 sin2 (1.14)
c c 2
onde (p(p′ ) é o quadrivector momento inicial (final) do electrão.
A modificação para atender à distribuição não pontual da carga eléctrica
do núcleo envolve a consideração dos factores de forma eléctrico e magnético.
O factor de forma magnético é desprezável nas condições habituais da Fı́sica
nuclear e por isso não será aqui considerado. O factor de forma eléctrico, F (q 2 ),
da distribuição de carga ρc (~r) é definido como:
R i~q·R~
e ~
ρc (r) dR
2
F (q ) = (1.15)
~
R
ρc (r) dR
Ter em conta o spin nuclear, I, obriga a considerar diferentes factores ci-
nemáticos para cada estado possı́vel de I.
Resumindo, a secção diferencial de difusão de um electrão relativista por um
núcleo é dada por:
   
dσ dσ
= × |F (q 2 )|2 . (1.16)
dΩ dΩ Mott

Se se medir a secção eficaz de difusão para uma dada energia e diferentes


ângulos (e portanto também diferentes valores de q 2 ), pode-se, em princı́pio
determinar o factor de forma usando a (1.16). Como o factor de forma é a
transformada de Fourier da densidade de carga, ρc (r), é em princı́pio possı́vel
determinar ρc (r) invertendo (1.16):
~ Z
R
ρc (r) dR ~ ~
ρc (r) = e−i~q·R F (q 2 ) dR (1.17)
2π 3
Mas na prática, a muito altas energias, o intervalo de valores de ângulos sobre
os quais se podem fazer medidas, é limitado. A estratégia usada consiste em
assumir uma dada distribuição de carga (com alguns parametros ajustáveis) e
a partir dela obter uma expressão da secção eficaz de difusão electrão-núcleo.
Os parâmetros são depois determinados de modo a reproduzirem os resultados
experimentais.
Expandindo F (q 2 ) em série, obtém-se:
q 2 2 1/2
F (q 2 ) = 1 − hr i + . . .
6~2
onde
dF (q 2 )
hr2 i1/2 = −6~2 |q2 =0
dq 2
é o raio quadrático médio:
~
R 2
r ρc (r) dR
hr2 i1/2 = R (1.18)
ρc (r) dvecR
CAPÍTULO 1. ELEMENTOS DE ESTRUTURA NUCLEAR 7

Se o factor de forma poder ser determinado para valores muito pequenos de


q 2 , então obtém-se hr2 i1/2 .

1.1.2 Distribuição da massa nuclear


Quando a informação pretendida é a distribuição de massa, usam-se hadrões
(por exemplo, neutrões) como projectéis.
As experiências mostram que a distribuição da carga eléctrica nuclear e da
massa nuclear são idênticas. Definindo RV de modo idêntico a R1/2 , verifica-
se também aqui uma dependência em A1/3 . (Para os núcleos pesados há al-
guma evidência de que a distribuição de neutrões excede a distribuição de carga
eléctrica em ≈ 0, 1 F ).
Façamos uma estimativa da ordem de grandeza densidade nuclear. Considere-
se um núcleo X(Z, A). A massa do núcleo é M (Z, A) ≈ Amp ; o volume nuclear
é V (Z, A) ≈ 34 πR3 ≈ 6, 4 × 10−5 A m3 . Assim:

M (Z, A)
ρ= ≈ 3 × 1017 kgm−3
V (Z, A)

Compare-se este valor com:

ρ(matéria ordinária, por ex. H2 O) ≈ 103 kg m−3


ρ(matéria estelar, por ex. o Sol) ≈ 1011 kg m−3

Estime-se, agora a ordem de grandeza da distância média entre nucleões. Su-


pondo um ajustamento perfeito, V = d3 ou seja d ≈ 1, 8 fm.
As massas de núcleos estáveis são determinadas em medidas directas com
espectrógrafos de massa. As massas de núcleos instáveis são determinadas in-
directamente a partir de balanços de energia de reacções nucleares ou de decai-
mentos.

1.1.3 A forma do núcleo


Os núcleos estáveis são aproximadamente esféricos. Esta forma corresponde ao
esforço para minimizar a energia, tal como acontece numa gota lı́quida. Contudo
observam-se alguns desvios à esfericidade, por exemplo na região 150 < A < 190.
Um modo de quantificar estas deformações é usar a razão
∆R
δ≡
R
onde R é o raio médio nuclear dado por (1.18), e para o caso de um elipsóide,
∆R é a diferença entre o semi-eixo maior e o semi-eixo menor. O valor tı́pico de
δ é 0,1. (No laboratório podem criar-se superdeformações, fundindo núcleos.)
Uma das razões para a deformação nuclear está na competição entre a força
de Coulomb e a força nuclear. A força de Coulomb, proporcional ao inverso do
quadrado da distância, implica que um núcleo diminui a sua energia colocando
CAPÍTULO 1. ELEMENTOS DE ESTRUTURA NUCLEAR 8

os protões o mais afastados possı́vel. Para um dado volume, isto implica uma
forma deformada. A força nuclear, ao invés, tenta preservar a forma esférica,
para se tornar mais efectiva. Como as forças nucleares são as mais intensas,
os núcleos mais leves são esféricos. Contudo, para núcleos médios e pesados,
a propriedade de saturação das forças nucleares (ver adiante) faz com que a
energia de ligação nuclear por nucleão não aumente com A. Como resultado,
uma pequena deformação pode traduzir-se num aumento da energia de ligação.

1.1.4 Massas nucleares e energias de ligação


A definição de energia de ligação nuclear. é idêntica á de energia de ligação
electrónica. Notando por:
• m(Z, A), massa nuclear

• M (Z, A), massa atómica

• B(Z, A), energia de ligação nuclear

• b(Z, A), energia de ligação atómica

escreve-se:

M (Z, A) = m(Z, A) + Zme − b(Z, A)/c2 (1.19)


2
m(Z, A) = Zmp + N mn − B(Z, A)/c (1.20)

A equação 1.19 pode ser reescrita de um modo mais útil, notando que:

M (1, 1) = MH = mp + me − b(1, 1)/c2 (1.21)

Substituindo 1.21 em 1.19 obtém-se:

M (Z, A) = ZMH + N mn − B(Z, A) + [Zb(1, 1) − b(Z, A)/c2 ]

O termo entre parentesis é desprezável em relação aos outros termos, pois é da


ordem da de 10 -100 eV, enquanto os outros termos são da ordem de A × 103
MeV. Resumindo:

B(Z, A) = [ZMH + N mn − M (Z, A)] c2 (1.22)

Os valores das massas isotópicas podem ser obtidos em tabelas. Como em si-
tuações similares, a sistematização dos resultados permite retirar conclusões so-
bre as propriedades nucleares. Na figura (1.1.2 representam-se as determinações
experimentais de energias de ligação nucleares ou, em rigor, a energia de ligação
nuclear por nucleão (B(Z, A)/A)) em função do número de nucleões (A). A
CAPÍTULO 1. ELEMENTOS DE ESTRUTURA NUCLEAR 9

partir desta curva é possı́vel extrair algumas conclusões importantes sobre a


natureza da força forte nuclear. Comecemos por notar que:
• para A ≥ 12, B(Z, A)/A tem valores entre 7,5 MeV/nucleão e 8,5 MeV/nucleão,
sendo o valor médio de cerca de 8 MeV/nucleão;

• Para os núcleos leves B(Z, A)/A é significativamente menor, mas com


máximos relativos para A = 4 (He(2,4)), A = 8 (Be(3,8)), A = 12
(C(6,12)), etc.

• O máximo da curva, cerca de 8,8 MeV/nucleão, ocorre para A ≃ 55 − 60;


por exemplo, para o 56F e, a energia de ligação nuclear por nucleão é 8,79
MeV.

• Para A superior a este máximo, B/A decresce gradualmente.


E, notemos que:
(i) Se cada nucleão exercesse a mesma força atractiva sobre todos os outros
nucleões haveria A × (A − 1)/2 ligações atractivas. Isto é, para A ≥ 1,
B(Z, A) seria proporcional a A2 . É obvio que não é assim que acontesse:
experimentalmente o que se conclui é que B(Z, A) ∝ A. Esta situação
é idêntica ao que acontece relativamente á energia de ligação homopolar
de átomos: a quantidade de energia necessária para evaporar (fundir)
uma dada quantidade de matéria M = nm, (n, número de moléculas,
m, massa de uma molécula) é independente do número de moléculas:
E = Lnm (L, é o calor de evaporação (fusão) da substância). As forças
responsáveis pela ligação molecular são forças de troca, resultantes da
troca de electrões entre os átomos envolvidos. Será pois razoável admitir
que as forças nucleares são forças de troca.
CAPÍTULO 1. ELEMENTOS DE ESTRUTURA NUCLEAR 10

(ii) O facto de B(Z, A) ser praticamente independente de A, significa que a


energia necessária para remover um nucleão de um núcleo é essencialmente
independente do número de nucleões que aquele tem. Este facto traduz a
saturação das forças nucleares.
Recorde-se, para comparação, que no caso da interacção gravı́tica ou elec-
tromagnética a energia potencial V (r) é proporcional a 1/r. Por exemplo,
no caso gravitacional a energia necessária para retirar uma massa m da
superfı́cie de uma esfera de raio R e massa M , homogénea, é:
M
V =G
r
Como M ≃ R3 , quanto maior for M , maior é a energia de ligação (≃ R2 ).
É mais facil lançar um foguetão na Lua do que na Terra. Isto acontece
porque V ∝ r−1 , o alcance é infinito e portanto cada partı́cula sente a
acção de todas as outras partı́culas.

(iii) Ou seja, o facto B(Z, A) ∝ A indicia que o potencial nuclear (ou generica-
mente, as forças nucleares) é de curto alcance – um nucleão sente apenas
a atracção de alguns poucos vizinhos, e, o número de vizinhos ”activos”é
sensivelmente constante e independente de A. A distância média entre
nucleões é da ordem de 1,8 fm. e o alcance da interacção do potencial
nuclear deve ser desta ordem de grandeza.

(iv) Apesar de B(Z, A) ∝ A os núcleos não colapsam para A elevado. V (r)


tem necessariamente uma componente repulsiva que é dominante para
muito curtas distâncias. Na figura 3 apresenta-se um esquema do potencial
internuclear.

(v) A força nuclear é independente do tipo de nucleão, isto é a mesma entre


pares pp, nn ou pn. Este facto é revelado pela experiências de difusão pp,
nn ou pn.

(vi) A inspecção da curva mostra que se um núcleo muito pesado (A elevado)


se dividir em dois núcleos menores com números de massa ≃ A/2, então,
como a energia de ligação por nucleão aumenta de cerca de 1 MeV, há li-
bertação de uma quantidade de energia da ordem de A MeV. Esta é a base
da fissão nuclear. Analogamente. se dois núcleos muito leves se com-
binarem há um aumento de energia de ligação por nucleão e consequente
libertação de energia. Esta é a base da fusão nuclear.

Resumindo: as forças nucleares são forças de dois corpos,com alcance finito


e com carácter saturado.

1.1.5 Independência da carga


As experiências de difusão p − p e p − n mostram que as forças nucleares são
independentes da carga do nucleão.
CAPÍTULO 1. ELEMENTOS DE ESTRUTURA NUCLEAR 11

1.1.6 Energia de separação de um neutrão


Considere-se um núcleo X(Z, A) com massa M (Z, A) que perde um neutrão. A
energia de separação do primeiro neutrão é:

Sn (Z, A) = [m(Z, A − 1) + mn − m(Z, A)] c2


Sn (Z, A) = [M (Z, A − 1) + mn − M (Z, A)] c2
= B(Z, A) − B(Z, A − 1)

1.1.7 Energia de separação de um protão


Considere-se um núcleo X(Z, A) com massa M (Z, A) que perde um protão. A
energia de separação do primeiro protão é:

Sp (Z, A) = [m(Z − 1, A − 1) + mp − m(Z, A)] c2


Sp (Z, A) = [M (Z, A − 1) + MH − M (Z, A)] c2
= B(Z, A) − B(Z − 1, A − 1)

Tal como no caso das energias de ionização atómicas, as energias de separação


de nucleões evidenciam uma estrutura de camadas nucleares semelhante à es-
trutura atómica (ver resultados experimentais apresentados na figura 4).

Um cálculo simples permite estimar a ordem de grandeza das energias nucleares.


Supondo A nucleões numa esfera de raio R, podemos confinar cada nucleão a
uma dimensão linear ∆r ≃ A−1/3 R. O princı́pio de incerteza de Heisenberg
implica então que ∆pi ≃ ~A1/3 /R para cada componente da quantidade de
movimento do nucleão. Para um nucleão, < pi >= 0 e portanto

(∆pi )2 =< p2i > .

Obtém-se assim
hp2 i ~2 A2/3
< E >≃ ≃ .
2m 2m R2
Como R = r0 A1/3 , isto implica que a energia cinética média por nucleão, deve-
ria, em boa aproximação ser igual para todos os núcleos. Usando m ≈ mp ≃
1000 MeV/c2 e ~ = 6, 5026 × 10−22 MeV obtém-se

< E >≈ MeV

Esta informação é suficiente para justificar uma aproximação não relativista nos
modelos nucleares (recentemente têm sido estudados modelos relativistas que
mostram a relevância dos efeitos relativistas, apesar da estimativa anterior). De
facto, a energia cinética dos nucleões é quase insignificante quando comparada
com a energia de repouso dos nucleões.
A velocidade de um nucleão com uma energia cinética, por exemplo, de
T = 40 MeV é: r
2T
v= ≈ 0, 3c
m
CAPÍTULO 1. ELEMENTOS DE ESTRUTURA NUCLEAR 12

e o comprimento de onda de Broglie associado é:


2π~ 2π(~c)
λ= = ≈ 4, 5 fm.
mv mc2
Este resultado mostra que os efeitos quânticos não são desprezáveis, pois λ é
menor que o raio nuclear.

1.1.8 Estabilidade nuclear


Os núcleos estáveis têm Z de 1 até 82 (existem algumas poucas excepções).
Os únicos núcleos instáveis que podem ser encontrados na natureza são aqueles
cujas vidas médias são maiores ou comparáveis à idade do sistema solar (≃ 5
biliões de anos) ou são produtos de decaimentos de outras espécies com semivida
longa. Contudo nas estrelas, os núcleos instáveis são criados continuamente
em reaccões nucleares. Muitos núcleos com semivida curta são ainda criados
nos laboratórios. A sistematização dos resultados observados relativamente à

estabilidade nuclear está contida na carta de Segrè. Pode-se concluir que:

• os núcleos leves estáveis têm Z ≈ N .

• os núcleos estav́eis médios e pesados têm N > Z (devido ao carácter da


interacção de Coulomb). A razão N/Z mais elevada conhecida é de 1,2
para o P b − 265

Na tabela (??) indica-se o número de núcleos estáveis em função do carácter


par ou impar de Z e de N . ((*: 21 H,63 Li,105 H,14 180
71 N, ( 55 Ta).)

Os resultados permitem-nos concluir que:

• a força nuclear é particularmente efectiva quando nos nucleões de cada


tipo estão emparelhados.
CAPÍTULO 1. ELEMENTOS DE ESTRUTURA NUCLEAR 13

A Z N número de núcleos estáveis

par par par 166


impar impar par 51
impar par impar 55
par impar impar 5*

Tabela 1.1: Número de núcleos estáveis em função do carácter par-impar de Z


e N.

• a interacção forte não distingue os dois tipos de nucleões.

Os resultados relativos à abundância dos diferentes nuclı́deos (ver anexo com


resultados experimentais) permitem concluir que:

• os elementos mais abundantes são o hidrogénio e o hélio.

• o número de isótopos estáveis ou de vida muita longa é maior para Z =


2, 8, 20, 28, 50 e 82, que para os elementos vizinhos.

• o número de isótonos estáveis ou de vida muita longa é maior para Z =


2, 8, 20, 28, 50, 82 e 126, que para os elementos vizinhos.

Estes reultados evidenciam a existência de uma estrutura de camadas no núcleo.

1.1.9 Momento angular e momentos eléctricos e magnéticos


Os constituintes nucleares, protões e neutrões, têm ambos spin 1/2. Além do
momento angular intrı́nseco, os nucleões podem também ter momento angular
orbital em virtude do seu movimento no núcleo. O momento angular do núcleo,
resultante dos momentos angulares individuais, é determinado no âmbito de
modelos especı́ficos. Adiante, usaremos o modelo de camadas para o determinar
(capı́tulo 2).
Associado à distribuição de carga eléctrica nuclear o núcleo tem momentos
eléctricos e magnéticos. A determinação destes é o objectivo do capı́tulo 3.
CAPÍTULO 1. ELEMENTOS DE ESTRUTURA NUCLEAR 14

Bibliografia
Nuclear PhysicsJ. Lilley,
Nuclear Physics K. Krane
Fı́sica Nuclear Theo MayerK ucuuk
Capı́tulo 2

Modelos nucleares

A compreensão das propriedades nucleares conduziu à formulação, desde 1920,


de vários modelos de estrutura nuclear. Estes modelos incluem desde os mais
simples o modelo da gota lı́quida, o modelo de camadas (do tipo atómico) até
propostas mais sofisticadas como os modelos colectivos e modelos unificados.
Cada modelo tende a concentrar-se num aspecto particular do comportamento
nuclear, revelado pelas experiências à época; mas os modelos mais recentes
procuram unificar todos os aspectos num só desenvolvimento.
De acordo com as considerações do capı́tulo 1, um modelo nuclear de baixa
energia é um modelo quântico não relativista. Assim o ponto de partida é a
equação de equação de Schrödinger:

ĤΨ = EΨ (2.1)

A questão é qual é o Hamiltoniano do sistema e que graus de liberdade usar


para descrever a função de onda.
A selecção mais natural para os graus de liberdade é, claro, usar as próprias
coordenadas nucleónicas, i.e, as A posições ~ri , os spins ~si , os isospins ~τi . A
função de onda tem então a forma:

Ψ = Ψ(~r1 , ~s1 , ~τ1 , . . . , ~rA , ~sA , ~τA ). (2.2)

Para o Hamiltoniano o natural (e mais simples) é escrever-se:


i=A
X ~2 2 X
Ĥ = − ∆ + V (i, j) (2.3)
i=1
2mi i,j

Este é o ponto de partida dos chamados modelos microscópicos, em que os


graus de liberdade são os das partı́culas constituintes do núcleo. Na expressão,
V (i, j) é o potencial de interacção nucleão-nucleão, que pode depender de todos
os graus de liberdades do par de nucleões. É impraticável resolver a equação
de Schrödinger directamente e, o problema é decidir da aproximação a fazer.
Incluem-se neste tipo de modelos, os modelos de camadas.

15
CAPÍTULO 2. MODELOS NUCLEARES 16

A priori não há uma teoria para V (i, j): umas formas são melhor que outras
para determinados tipos de cálculos. Ademais, não é ainda claro a importância
das forças a três corpos e se devem ser incluı́das no Hamiltoniano. Um modelo
tı́pico microscópico depende assim da forma do funcional da interacção entre
nucleões que conterá o número de parâmetros necessários para reproduzir os re-
sultados experimentais. A escrita do funcional é fortemente simplificada usando
argumentos de simetria (ver adiante).
E, enquanto a interacção nucleão-nucleão não poder ser deduzida de uma
interacção mais fundamental, como a Cromodinâmica Quântica (teoria da in-
teracção forte: a interacção é entre quarks - constituintes dos nucleões - e é
mediada por gluões) é com interacções efectivas que se faz a fı́sica nuclear.
Nos modelos colectivos, os graus de liberdade não são os dos nucleões indi-
viduais mas antes propriedades globais do núcleo como um todo. Um exemplo
trivial de coordenadas colectivas é as coordenadas do centro de massa e o mo-
mento quadripolar eléctrico. Incluem-se nesta classificação de modelos, o modelo
da gota lı́quida, o modelo de gás de Fermi, os modelos rotacional e vibracional
e o modelo unificado.

2.1 Modelo da gota lı́quida


Um dos primeiros modelos nucleares - proposto em 1935 por Bohr-, baseia-se na
afinidade de comportamentos da matéria nuclear e de uma gota lı́quida. Assim:

• na ausência de campos exteriores uma gota minimiza a sua energia assu-


mindo a forma esférica (minimizando assim a tensão superficial).

• se o fluido é incompressı́vel, a densidade de massa, ρ, é constante.

• a energia de ligação molecular por molécula é constante (E = lmN , L,


calor latente; m, massa da molécula; N = número de moléculas; E/N =
LM = constante).

• o potencial intermolecular (Potencial de Lennard-Jones) tem a seguinte


dependência na distância intermolecular:
−6 −10

 decresce muito rapidamente ∝ r − atractivo r ≫ 10
V (r) = mı́nimo para r ≈ 0, 5 × 10−10
fortemente repulsivo distâncias muito curtas

Relativamente a matéria nuclear, recorde-se que:


• os núcleos são aproximadamente esféricos (os desvios da esfericidade são
medidos por momentos quadripolares eléctricos não nulos).

• a densidade de massa nuclear, - e a densidade de carga eléctrica-, é sensi-


velmente igual, em todos os elementos da tabela periódica.
CAPÍTULO 2. MODELOS NUCLEARES 17

• a energia de ligação nuclear por nucleão, B/A, é aproximadamente cons-


tante.

• o potencial internuclear é:



fortemente atractivo distâncias da ordem do tamanho do núcleo
V (r) =
fortemente repulsivo distâncias muito curtas

A energia de uma gota lı́quida (suposta de um fluido incompressı́vel, e na


ausência de campos exteriores), escreve-se:

B ∝ AN − T N 1/3 (2.4)

• O primeiro termo - termo de volume - é o mais importante e reflecte


o facto de a energia ser proporcional ao número de moléculas, ou seja,
proporcional ao volume da gota.

• O outro termo, que diminui a energia, é o termo de superfı́cie. As moléculas


à superfı́cie têm menos ligações que as moléculas no interior da gota (T
designa a tensão superficial).

A energia de ligação nuclear inclui termos análogos aos anteriores. Mas,


além destes terá de incluir outros termos que traduzam as especificidades dos
nucleões. A saber:
• dos constituintes nucleares, os protões têm carga eléctrica, e

• os constituintes nucleares são fermiões.


A expressão proposta em 1935 por Bethe e Weizäcker (BW) para a energia de
ligação dos núcleos, no seu estado fundamental, é:

(N − Z)2
B(Z, A) = +av A + aS A2/3 − aC Z 2 A−1/3 − aC + δ(Z, A). (2.5)
A
Expliquemos os termos de (2.5)

(i) Termo de volume


A curva B/A é praticamente constante em toda a tabela periódica:

BV ∝ av A

(obs. R ≈ r0 A1/3 ⇒ V ∼ A)

(ii) Termo de superfı́cie


Os nucleões próximos da superfı́cie estão rodeados de menos nucleões que
os nucleões do interior, e consequentemente têm uma contribuição menor
para a energia. Ao termo de volume deve subtrair-se um termo proporci-
onal ao número de nucleões à superfı́cie (R ≈ r0 A1/3 ⇒ S ∼ A2/3 )

BS ∝ aS A2/3
CAPÍTULO 2. MODELOS NUCLEARES 18

(iii) Termo de Coulomb


O núcleo tem uma carga elétrica +Z | e | e, em boa aproximação, ela está
confinada a uma esfera (raio R). Admitindo uma distribuição de carga
uniforme (e como se referiu, esta é uma boa hipótese) obtém-se (recordar
Electromagnetismo):
BC ∝ aC Z 2 A−1/3
onde aC = (1/4πǫ0 )(3e2 /(5r0 ) O termo de Coulomb favorece o excesso de
neutrões sobre o número de protões.

(iV) Termo de assimetria


As expressões anteriores consideram que o protão e o neutrão, como partı́culas
idênticas, a menos da interacção de Coulomb. Mas, protões e neutrões são
fermiões diferentes e a energia de ligação nuclear reflecte este facto:

BC ∝ aC Z 2 A−1/3

O termo de assimetria tende a favorecer igual número de protões e de


neutrões.

(V) Termo de Pares


O modelo apresentado até agora não reproduz alguns aspectos da in-
formação, obtida experimentalmente, de energias nucleares. Sabe-se que
as energias de ligação são particularmente elevadas no caso de nucleões
emparelhados. De facto, o número de nuclideos estáveis com N e Z pares
é muito maior que o número de nuclideos com A impar. O emparelha-
mento conduz ainda a que praticamente não existam estados excitados
de baixa energia em núcleos com N e Z pares (é necessário romper uma
ligação muito forte). A correcção devida ao emparelhamento pode será
deduzida no âmbito do modelo de Fermi. De momento, limitamo-nos a
introduzir apenas o factor correctivo:

 +δ núcleos par-par
δ(Z, A) = 0 núcleos impar-par, par-impar
−δ núcleos impar-impar

Em boa aproximação δ ≈ ap A−1/2 . O termo de pares tende a favorecer


configurações em que fermiões idênticos estão emparelhado

Os coeficientes ai são escolhidos de modo a se obter uma boa aproximação às


energias observadas. Uma boa combinação é a seguinte:

aV = 15, 56 MeV
aS = 17, 23 MeV
aC = 0, 697 MeV
aA = 93, 14 MeV
CAPÍTULO 2. MODELOS NUCLEARES 19

e 
 12 se N e Z pares
ap = − 12 se N e Z impares
0 se A impar

A relevância da contribuição de cada termo de (2.5) é ilustrada na figura (6) in-


cluı́da no anexo. Nela se pode observar como a subtracção do termo de superfı́cie
e o aumento do termo de Coulomb conduz a um máximo da curva B/A = f (A)
para A ≈ 60.

Na figura (7) mostra-se o resultado da aplicação de (2.6) para núcleos com


A > 20, e os correspondentes resultados experimentais. O acordo entre os dois
resultados é muito bom mas não é total. Mo entanto, os resultados obtidos
com BW são suficientemente bons para se poder usar este modelo para anali-
sar diversos problemas e em particular a estabilidade nuclear relativamente a
processos β e de fissão. Finalmente, a massa de um nuclı́deo (Z, N ) é, usando
a expressão (2.5):

(N − Z)2
M (Z, A) = ZmH + N mn − av A − aS A2/3 + aC Z 2 A−1/3 + aA + δ(Z, A)
A
(2.6)

2.1.1 Alguns factos experimentais explicáveis pelo modelo


da gota lı́quida
De entre os sucessos do modelo da gota lı́quida destacam-se os seguintes:

(i) reproduz, como já foi referido, razoavelmente a curva B/A = f (A);

(ii) define uma condição de estabilidade nuclear. A relação (2.6) implica, como
se mostra a seguir, que os núcleos estáveis têm N ≈ Z.
Reorganizando os termos, a BW pode ser reescrita como:

M (Z, A) = aA − bZ + cZ 2 + d. (2.7)
CAPÍTULO 2. MODELOS NUCLEARES 20

sendo
as aA
a = m n − av + 1/3
+ (2.8)
A 4
b = aA + (mn − mp − me ) (2.9)
as aC
c = + 1/3 (2.10)
A A
d = aP (2.11)
M (Z, A) é assim uma função quadrática de Z, para A fixo e tem um
mı́nimo para Z = b/2c. Para A fixo, um núcleo estável tem um Z inteiro
próximo da solução Z = b/2c. Substituindo as constantes, obtém-se a
condição
(mn − MH ) + ac A−1/3 + 4asim
Z≃ (2.12)
2ac A−1/3 + 8asim A−1
Para A pequeno, a expressão anterior implica que os nuclı́deos estáveis
têm Z ≃ N .
(iii) permite determinar o número de nuclı́deos de um dado isóbaro que são
estáveis;
Partindo de (2.7) conclui-se que para A impar, BW define uma única
parábola de massa, mas para A par, obtêm-se duas parábolas, devido às
diferentes energias de emparelhamento. Um núcleo está numa ou noutra
curva consoante é par-par ou impar-impar. Os isóbaros de Z vizinhos po-
dem, por processos β ± ou CE, transformar-se uns nos outros. A conclusão
é que para A impar existe apenas um isóbaro estável, enquanto para A par
podem existir vários isóbaros estáveis. Eis alguns exemplos: dos isóbaros
com A = 96, os núcleos 96 96 96
44 Ru e 42 Mo e 440 Zr são todos estáveis.

Parábola de massa para os isóbaros A =


111; os cı́rculos são resultados experimentais
e a curva refere-se às previsões do modelo da
gota lı́quida.

Parábola de massa para os isóbaros A =


102; os cı́rculos são resultados experimentais
e a curva refere-se às previsões do modelo da
gota lı́quida.
CAPÍTULO 2. MODELOS NUCLEARES 21

(IV) permite um estimativa de raios nucleares.


Mostra-se, considerando dois núcleos-espelho (Z1 , Z2 ) que o raio de um
núcleo com número de massa A é dado por:
3e2
R= (Z 2 − Z22 ) (2.13)
20πǫ0 ∆B 1
(V) prevê o número máximo de protões para uma dado N e o número máximo
de neutrões para uma dado Z.
Estes limites são determinados requerendo que a última partı́cula adicio-
nada, esteja num estado ligado, i.e:

B(Z + 1, N ) − B(Z, N ) > 0, B(Z, N + 1) − B(Z, N ) > 0,


ou de modo equivalente:

∂B(Z, N ) ∂B(Z; N )
> 0, >0 (2.14)
∂Z ∂Z
O lugar dos pontos (Z, N ) em que estas desigualdades se tornam igual-
dades determina a região onde existem estados ligados. Na figura (8)
mostram-se os limites previstos por (2.14). As linhas limite são desig-
nadas por drip-lines. Os núcleos na vizinhança, mas fora destas linhas,
decaem rapidamente por emissão nucleónica. Não se observam núcleos
afastados destas linhas.
(VI) permite a definição de condições para a ocorrência de diferentes processos
nucleares, como veremos posteriormente.

2.2 Modelo do gás de Fermi


No modelo de gás de Fermi os núcleos são considerados como sendo constituı́dos
por dois gases fermiónicos, um gás de neutrões e um gás de protóes. A partı́culas
não interagem, mas estão confinadas a uma esfera com a dimensão do núcleo.
As interacções aprarecem implicitamente ao assumir que os nucleões estão con-
finados à esfera.
O modelo da gota lı́quida baseia-se na saturação das forças nucleares. O
modelo de Fermi tem por base a estatı́stica de dois gases fermiónicos e permite
calcular as constantes aV , aS e aA da fórmula de BW. Mostra-se, no âmbito
deste modelo, que:
3
aV = εF (2.15)
5
3 3π~
aS = εF (2.16)
5 8ro pF
1 (N − Z)2
aS = εF (2.17)
3 A
(2.18)
CAPÍTULO 2. MODELOS NUCLEARES 22

2.3 Modelos fenomenológicos de partı́cula única


O núcleo é um sistema de muitos corpos, cuja interacção não depende só da
distância entre pares de nucleões (forças a 2-corpos) mas também de l, de s
(spin) e das correlacções com outros nucleões (forças a 3-corpos). Na base
dos modelos de camadas está a observação experimental da existência de uma
estrutura de camadas nos núcleos. E a informação mais importante relativa a
esta estrutura é a existência de números mágicos. Se o número de protões e/ou
de neutrões é um dos valores mágicos, então o núcleo é especialmente estável;
em especı́fico, é caracterizado por:

• uma energia de ligação elevada,

• uma energia de separação do nucleão elevada,

• uma energia do primeiro estado excitado elevada,

• um número elevado de isótopos e isótonos com o mesmo número mágico


de protões e/ou de neutrões.

• um momento quadripolar eléctrico próximo de zero,

• uma secção eficaz de captura de neutrões muito baixa.

(sempre em comparação com os vizinhos na tabela de núcleos).


Os números mágicos mais baixos são iguais para protões e neutrões:2, 8, 20, 28, 50
e 82. O número mágico seguinte, 126, é estabelecido experimentalmente, só para
neutrões. Teoricamente esperam-se números mágicos adicionais próximos de 114
para protões e de 184 para neutrões (o valor exacto depende do modelo), mas a
existência destes núcleos super-pesados não está confirmada experimentalmente.

Recorde-se o caso análogo dos átomos: os electrões movem-se num campo


eléctrico criado pelo núcleo central e o screening devido aos outros nucleões é
CAPÍTULO 2. MODELOS NUCLEARES 23

só um factor correctivo. As configurações electrónicas são bem determinadas


e a probabilidade de colisão entre electrões é baixı́ssima. No caso dos núcleos,
o campo médio não é exterior; cada nucleão move-se no campo médio criado
por todos os outros nucleões. Como não existe uma partı́cula pesada central,
não é de todo óbvio que este campo seja central. Por outro lado, o raio de
um nucleão é da ordem de grandeza do raio nuclear, pelo que intuitivamente
esperamos colisões entre nucleões. No entanto, o princı́pio de exclusão de Pauli
previne estas ocorrências: um nucleão comporta-se como transparente para os
nucleões da mesma orbital pois não tem energia suficiente para passar para as
orbitais de valência.
Os modelos de camadas são inspirados no modelo do átomo: os nucleões
estão num potencial nuclear efectivo (potencial médio), e não interagem entre
si (single particle shell model - SPSM. As orbitais são preeenchidas de acordo
com o princı́pio de energia mı́nima e as propriedades são determinadas pelos
nucleões de valência.
Ou seja, a questão que se põe é a de resolver a equação de Schrödinger para
uma partı́cula:
~2 2
 
− ∆ + V (~r Ψi (~r) = ǫi Ψi (~r) (2.19)
2m
para um dado V (~r). As funções de onda Ψi descrevem o movimento do nucleão
i no potencial médio.
Que V (~r) escolher?
CAPÍTULO 2. MODELOS NUCLEARES 24

Deve ser relativamente constante no interior dos núcleos pesados para expli-
car a densidade constante sugerida pelo facto de o raio nuclear ser da forma:

R = r0 A1/3 ,

mas anular-se rapidamente fora da superfı́cie nuclear

2.3.1 Modelos esféricos


Algumas escolhas populares (assumidindo simetria esférica) são as seguintes:

• Potencial de Woods-Saxon
V0
V (r) = − (2.20)
1 + e(r−R)/a
Os valores tı́picos dos parâmetros são: profundidade V0 ≈ 50 MeV, raio
R ≈ 1, 1 fmA1/3 , e espessura de superfı́cie a ≈ 0, 5 fm.
Embora este potencial tenha uma forma semelhante à da densidade de
carga e tenha o comportamento geral descrito acima, tem a desvantagem
de não ser resolúvel analiticamente.

• Potencial Harmónico
1
V (r) = − mω 2 r2 (2.21)
2
sendo de ~ω ≈ 41 MeVA1/3 o valor tı́pico.
Esta forma tem resolução analı́tica exacta mas o inconveniente de ir para
infinito para grandes distâncias, o que faz com que as funções de onda ob-
tidas não tenham o comportamento assimptótico desejado, indo para infi-
nito como exp(−k 2 r2 ) e não exp(−kr) como seria desejável. Os números
mágicos obtidos com este potencial são: 2, 8, 20, 40, 70, 112 e 168.
CAPÍTULO 2. MODELOS NUCLEARES 25

• Potencial constante

−V0 r≤R
V (x) = (2.22)
∞ r>R
onde V0 é uma constante positiva.
Esta forma é um compromisso entre um potencial com alcance finito e
ter dificuldades computacionais moderadas. As soluções da equação de
Schrödinger são as funções de Bessel regulares na origem para r > R e
zero para r > R. Os números mágicos obtidos com este potencial são:
2,8,20,34,58,92 e 138.
Embora permita formas analı́ticas das funções de onda, em geral quando
o potencial harmónico não é suficiente, prefere-se o potencial de Woodes-
Saxon.

Resumindo os resultados anteriores: todos os modelos só permitem estabe-


lecer os números mágicos 2, 8 e 20; daı́em diante os modelos não satisfazem.
A viabilidade do modelo fenomenológico de partı́cula única deve-se aos fı́sicos
G. Mayer e Jensen, que em 1955, propuseram a inclusão de um termo correc-
tivo de acoplamento spin-órbita (novamente inspirados na fı́sica atómica) ao
Hamiltoniano nuclear:
~2 2 ˆ
Ĥ = − ∆ + V (r) + C~l · ~ˆs (2.23)
2m
O termo adicional acopla o spin do nucleão ao seu momento angular orbital.
Uma consequência imediata é o desdobramento dos nı́veis de energia com
j = l ± 1/2. Obtém-se:
 
1
Ej=l+1/2 − Ej=l+−1/2 = C~2 l + (2.24)
2
Experimentalmente verifica-se que os estados com j = l + 1/2 tem energia
infeiror aos estados com j = l − 1/2 e por isso, C deve ser negativo.
Haveria a possibilidade de C ter uma dependência em r, mas não há in-
formação suficiente para se fixar uma tal dependência e por isso C é considerado
uma constante. O valor de C está entre 0,3 - 0,6 MeV/c2 . Os resultados para
o potencial harmónico são apresentados na tabela.

2.3.2 Testes ao modelo de camadas, com o acoplamentospin-


órbita
• Previsão de momentos angulares e paridades de estados fundamentais.

Regra 1: Uma camada completa tem spin-paridade, I π = 0+ .


Não há (experimentalmente) excepções a esta regra.
Numa camada incompleta, o spin-paridade é determinado pelo nu-
cleão de valência.
CAPÍTULO 2. MODELOS NUCLEARES 26

Regra 2: Os núcleos com Z e N par têm I π = 0+ .


Não há (experimentalmente) excepções a esta regra.
Regra 3: Em núcleos impar-par e/ou par-impar, o spin-paridade são de-
terminados pelo nucleão desemparelhado.
Há (experimentalmente) várias excepções a esta regra.
Regra 4 Em núcleos impar-impar com impar=número mágico±1, o spin-
paridade são determinados pela Regra de Nordheim: os nucleões ten-
dem a emparelhar-se de modo que o spin do protão e do neutrão
estejam paralelos.
Há (experimentalmente) várias excepções a esta regra.

• Previsão para os momentos magnéticos.

De acordo com o SP SM :

– os momentos dipolares magnéticos de núcleos com Z e N pares são


nulos,
– os momentos magnéticos nucleares dos núcleos com Z ou N impar,
são completamente determinados pelos valores de l e de s do nucleão
desemparelhado.

Assim, os momentos magnéticos nucleares deveriam estar sobre duas li-


nhas - as linhas de Schmidt, correspondentes às duas configurações do
nucleão desemparelhado J = l + 1/2 e j = l − 1/2.
Na figura (ver no fim do anexo) apresentam-se os resultados experimentais
para os momentos magnéticos de vários núcleos. A conclusão é que se
bem que quase todos os momentos magnéticos estejam entre as linhas de
Schimdt, muito poucos estão sobre as linhas ou na vizinhança delas.
Claramente o modelo necessita de correcções. Mas, relativamente ao
cálculo do momento magnético nuclear, há duas fontes de erro facilmente
identificáveis:

– as correntes mesónicas, que traduzem a interacção nuclear, corres-


pondem a fluxos de cargas eléctricas e podem assim contribuir para
o momento magnético nuclear.
– os nucleões no núcleo não são partı́culas livres; os momentos magnéticos
dos nuclões usados no cálculo do momento magnético nuclear devem
ser corrigidos.

• Previsão para os momentos quadripolares eléctricos. De acordo com o SP SM :

– os momentos quadripolares eléctricos de núcleos com Z e N pares


são nulos,
CAPÍTULO 2. MODELOS NUCLEARES 27

– os momentos quadripolares eléctricos dos núcleos com Z ou N impar,


são completamente determinados pelos valores de l e de s do nucleão
desemparelhado.
– A ordem de grandeza de Q é o barn.

Consultando uma tabela de valores de Q


(http://www.nndc.bnl.gov/nndc/stonemoments/nuclear−moments.pdf )conclui−
seque :

• o SP SM explica basicamente os momentos quadripolares eléctricos


observados,

• o SP SM não explica as grandes deformações quadripolares obser-


vadas nas terras raras.

• os núcleos leves apresentam valores de Q muito superiores aos pres-


vistos pelo SP SM .

Previsão para os estados excitados de núcleos.


O SP SM interpreta (com algumas excepções) os estados fundamentais dos
núcleos. Contudo os estados excitados não são em muitos casos explicados
por este modelo tão simples que atribui todo o vedetismo ao nucleão desempa-
relhado ignorando as interacções entre os nucleões fora da camada completa, o
papel do core do núcleo (modos rotacionais e vibracionais) e as interacções entre
os modos colectivos e os modos individuais.
Para um estudo deste tópico pode consultar, o livro Nuclear Physics de John
Lilley, no capı́tulo II.
Resumindo, o SP SM

• determina correctamente os estados fundamentais de todos os núcleos par-


par,
CAPÍTULO 2. MODELOS NUCLEARES 28

• determina correctamente os estados fundamentais de todos os núcleos


impar-par ou par-impar, com impar=número mágico±1,

• determina correctamente os estados fundamentais de muitos núcleos impar-


par ou par impar (ver o tema do emparelhamento),

• permite determinar os estados excitados de núcleos; no entanto há si-


tuações que ele não explica,

• determina que o momento magnético nuclear é o do nucleão de valência;


este resultado não é verificado experimentalmente para muitos núcleos,

• determina que o momento quadripolar eléctrico nuclear é o do nucleão


de valência; este resultado não é verificado experimentalmente pra muitos
núcleos,

2.3.3 Modelos esféricos de camadas deformados


A generalização dos modelos de camadas para potenciais deformados foi apre-
sentada primeiro por S.G. Nilsson em 1955 e constitui o modelo de Nilsson. A
ideia principal do modelo é a de considerar o potencial harmónico anisotrópico:

~2 2 ˆ ˆ
Ĥ = − ∆ + V (r) + C~l · ~l (2.25)
2m
Com uma parametrização conveniente o potencial anterior pode ser reescrito
como:
~2 2 ˆ ˆ
Ĥ = − ∆ + V (r) + C~l · ~l (2.26)
2m
O Hamiltoniano total deste modelo, é:

Ĥ == (2.27)

onde se incluiu o termo de acoplamento spin-órbita e ainda um termo proporci-


onal a l2 , para baixar a energia dos estados de partı́cula próximos da superfı́cie
nuclear.
Os resultados deste modelo são essenciais na explicação das propriedades
dos núcleos deformados.1

2.3.4 Modelo relativista de campo médio


Consultar Nuclear models, de Greiner Maruhn, capı́tulo 7.
1 Sobre o modelo de Nilsson, consultar Nuclear models de Greiner Maruhn, capı́tulo 7.
CAPÍTULO 2. MODELOS NUCLEARES 29

2.3.5 Termo de emparelhamento


Os modelos de camadas apresentados têm alguns problemas. Um dos problemas
surge, por exemplo, quando se considera o momento angular num núcleo esférico.
Neste caso os estados nucleares podem ser indexados pelos números quânticos
n, j, m.
Quando se considera uma camada incompleta, o momento angular nuclear,
de acordo, com o teorema de adição do momento angular, tem vários valores
possı́veis. No entanto, a energia neste modelo, é independente do tipo de inte-
racção entre nucleões na mesma camada (ou não), ou seja, todos os estados com
diferentes j são degenerados.
Experimentalmente a degenerescência do estado fundamental com diferentes
valores de j não ocorre; aliás o que se observa é que:

• em núcleos par-par o estado fundamental tem sempre momento angular


nulo; i.e, a interacção residual faz com que o estado com I = 0 seja o de
menor energia,

• os núcleos par-par têm maior energia de ligação que os outros,

• nos núcleos par-par há um lapso de energia de 1-2 Mev entre o estado
fundamental e o primeiro estado excitado.

A resolução do problema pode ser consultada em Nuclear models de Greiner


Maruhn, capı́tulo 7. Aqui limitamo-nos a indicar o que acontece quando os
nucleões na camada semi-preenchida são de um único tipo - configuração (j)λ .
Não havendo informação sobre o tipo de acoplamento a considerar, estudamos
dois tipos limites:

• interacção de longo alcance (forças de Majorana)

V0
V = [1 + σ(i) · σ(j)] (2.28)
2

• interacção de contacto (forças de Wigner)

V = −V0 δ (~r1 − ~r2 ) (2.29)

Os cálculos, realizados no âmbito da teoria de perturbações, estabelecem


que:

Int. Majorana Int. Wigner

λ par I=0 I=0


λ impar I = Jmin I =j
CAPÍTULO 2. MODELOS NUCLEARES 30

onde Jmin indica o menor dos valores de J compatı́vel com o teorema de adição
de momento angular e j indica o momento angular da camada.
A hipótese de forças de longo alcance é a melhor para núcleos leves enquanto
a hipótese de forças de contacto é a melhor para núcleos médios e pesados. O
núcleo que faz a transição entre os dois casos é o 23
11 Na.

Ao terminar este capı́tulo relembro que não foram estudados os modelos


nucleares colectivos rotacional e vibracional nem os modelos unificados que in-
corporam aspectos colectivos e de partı́cula única, nem modelos formulados em
teoria de campo.
CAPÍTULO 2. MODELOS NUCLEARES 31

Bibliografia
Nuclear models de Greiner Maruhn,
Nuclear Physics de J. Lilley,
Nuclear Physics de K. Krane
Capı́tulo 3

Momentos estáticos dos


núcleos

3.1 Momentos eléctricos de um núcleo - Fı́sica


clássica: Expansão multipolar.
Considere-se um núcleo caracterizado pela distribuição de carga ρ(~r), colocado
numa região onde existe um potencial eléctrico V (~r). Admita-se que a distri-
buição de carga eléctrica que cria o potencial é totalmente exterior ao núcleo.
Neste caso, em qualquer ponto da região nuclear, verifica-se a equação de Pois-
son:
△V (~r) = 0
A energia potencial do núcleo é:
Z
W = ρ(~r) V (~r) d~r (3.1)

Desenvolvendo V (~r) em série:


∂2V
   
∂V 1
V (~r) = V (0) + xi + xi xj + ... (3.2)
∂xi 0 2! ∂xi xj 0

obtém-se:
∂2V
 
1
Z
W = V0 ~
ρ(~r)d~r − p~ · E(0) + xi xj + ... (3.3)
2! ∂xi xj 0
A interpretação dos termos da equação anterior é a seguinte:
R
• W0 = qV (0) = V0 ρ(~r)d~r, representa o acoplamento da carga nuclear
ao potencial exterior;
  R
• W1 = ∂V ~
xi ρ(~r) d~r = − p~ · E(0), representa o acoplamento do
∂xi
0
momento dipolar eléctrico ao potencial exterior. Se o centro de distri-
buição de carga coincidir com a origem do referencial, o momento dipolar
eléctrico é nulo. Os núcleos têm momentos dipolares eléctricos nulos.

32
CAPÍTULO 3. MOMENTOS ESTÁTICOS DOS NÚCLEOS 33

• O terceiro termo, W2 , representa o acoplamento do momento quadripolar


eléctrico ao potencial exterior. É habitual definir o momento quadripolar
eléctrico como um tensor com traço nulo. Se a W2 se subtrair o termo:
1
Z
− (△V )0 r2 ρ(~r)d~r
6
obtém-se:
∂2V
 
1
W2 = Qij
6 ∂xi xj 0
sendo Z
3xi xj − r2 δij ρ(~r)d~r

Qij = (3.4)

O tensor momento quadripolar eléctrico é um tensor de segunda ordem com


traço nulo. Num processo experimental de medida o que se conhece, a priori
∂2V
são as componentes do tensor ∂x i xj
. Assim,
0
• Se o referencial que adoptamos no desenvolvimento em série coincidir com
∂2 V
os eixos próprios do tensor ∂x i xj
, o termo W2 simplifica-se:
0
2
∂2V ∂2V
      
1 ∂ V
W2 = Qxx + Qyy + Qzz
6 ∂x2 0 ∂y 2 0 ∂z 2 0

• Se o campo eléctrico tiver simetria cilı́ndrica:


 2   2   2 
∂ V ∂ V ∂ V
= −2 = −2
∂z 2 0 ∂x2 0 ∂x2 0
e o termo W2 simplifica-se:
∂2V
  
1
W2 = Qzz
4 ∂z 2 0

A quantidade Qzz assim introduzida é o momento quadripolar eléctrico da


distribuição de carga referido ao eixo dos zz. Pode mostrar-se que:
• Qzz = 0 para uma distribuição de carga com simetria esférica;

• Qzz = −2Qxx = −2Qyy = 52 q(c2 − a2 ), para uma distribuição de carga


com simetria elipsoidal (eixos de simetria a, b e c).
Note-se que Qzz é determinado a partir do cálculo de W2 , o qual pressupõe
o conhecimento das direcções principais do campo eléctrico exterior. E, Qzz
depende da distribuição de carga relativamente ao eixo dos zz, ou seja, de-
pende da orientação do eixo nuclear de deformação relativamente a zz. Ora,
num núcleo a direcção de eixo de deformação está relacionada com a direcção
de quantificação do momento angular I. Designando por Qinstrinseco o mo-
mento quadripolar relativamente ao eixo de quantificação do momento angular,
verifica-se que:
3 cos2 α − 1
Qzz = Qinstrinseco ,
2
onde α é o ângulo entre as duas direcções envolvidas.
CAPÍTULO 3. MOMENTOS ESTÁTICOS DOS NÚCLEOS 34

3.2 Momentos eléctricos de um núcleo - Fı́sica


Quântica.
3.2.1 Momento Quadripolar eléctrico de um nucleão.
Calcule-se a contribuição de um nucleão num estado |j, mi para o momento qua-
dripolar nuclear. Por simplicidade suponha-se um núcleo como uma distribuição
esférica de carga a que se junta um nucleão (que não ”perturba”a distribuição
esférica de carga). Defina-se:
Q[j, m] ≡ hj, m|Q̂zz |j, mi (3.5)
Pode mostrar-se que:
1 3m2 − j(j + 1)
Q[j, m] = − < r2 > (3.6)
2 j(j + 1)
O momento quadripolar eléctrico do protão é, por definição, o valor médio do
operador Q̂zz no estado |j, ji. Pode mostrar-se que as contribuições de um
protão ou de um neutrão são:


 0 neutrão extra ou neutrão lacuna


Q= −|q| 2j−1 2
2j+2 < r > protão extra


2j−1

+|q| 2j+2 < r2 > protão lacuna

O resultado anterior precisa de uma correcção: de facto, não se considerou a


perturbação sobre a distribuição de carga devida à presença de um nucleão
extra. Em rigor, obtém-se, (numa primeira correcção):
 h i
2j−1 Z


 −|q| 2j+2 < r2 > 0 + (A−1) 2 + ... neutrão extra




 h i
2j−1 Z
 2
+|q| < r > 0 + + . . . neutrão lacuna



 2j+2 (A−1) 2

Q= h i
 −|q| 2j−1 < r2 > 1 + Z 2 + . . . protão extra




 2j+2 (A−1)



 h i
 +|q| 2j−1 < r2 > 1 + Z + . . . protão lacuna


2j+2 (A−1)2

A correcção efectuada é praticamente irrelevante no caso de protões. Mas,


no caso da contribuição de um neutrão, ela constitui a contribuição, na ordem
mais baixa, não nula, sendo portanto, importante considerá-la:

3.2.2 Momento Quadripolar eléctrico de um núcleo.


O momento quadripolar eléctrico de um núcleo com A nucleões é definido por:
A
X
Q[I, I] ≡ hI, I| Q̂izz |I, Ii (3.7)
I=1
CAPÍTULO 3. MOMENTOS ESTÁTICOS DOS NÚCLEOS 35

3.2.3 Momento dipolar magnético de um nucleão

O momento magnético dipolar de um nucleão tem duas componentes: a contri-


buição orbital µs e a contribuição de spin µs :
!
~l ~s
µ = gl + gs
~ µN (3.8)
~ ~

onde
e~
µN ≡ = magnetão nuclear,
2mp
e  
1 p 2µp = 5, 585695 p
gl = gs =
0 n 2µn = −3, 826085 n
CAPÍTULO 3. MOMENTOS ESTÁTICOS DOS NÚCLEOS 36

3.2.4 Momento dipolar magnético de um núcleo


Num sistema com A nucleões o operador momento dipolar magnético é:
A 
ˆ

~ˆ = gli~li + gsi~ˆsi
X
µ
i

O momento magnético do núcleo é, por definição, o valor médio da componente


segundo Oz do operador µ̂ calculado para o estado |I, MI = Ii:

µ(I, I) = hI, I|µ̂z |I, Ii

Pode mostrar-se que as contribuições de um protão ou de um neutrão, num


estado |j, mj i, para o momento magnético nuclear: são:
1
µ(j, j) = j + (µp − 12 µN
  
 j
 =l+ 2
p= h i
1 j
− 12 ) µN

 j =l− 2 µ(j, j) = j − j+1 (µp

1

 j
 =l+ 2 µ(j, j) = [µn ] µN
n= h i
j
= l − 12 µ(j, j) = − j+1

 j µn µN

Bibliografia Aulas de Fı́sica Nuclear do Prof. J.Moreira de Araújo.


Capı́tulo 4

Radioactividade

4.1 Introdução: Radioactividade ambiental.


A radioactividade ambiental pode ser classificada nos dois grupos seguintes:

• radioactividade natural;

• radioactividade artificial.

A radioactividade natural foi descoberta em 1836 por H. Becquerel que ob-


servou que as placas fotográficas (na ausência de luz) enegreciam quando na
vizinhança de um cristal de urânio. Posteriormente a causa do enegrecimento
foi encontrada: eram as partı́culas α emitidas no decaimento 238 U →234 T h + α.
A radioactividade artificial foi descoberta em 1934 por Irène e Pierre Curie
que observaram no laboratório a reacção:

α +27 Al →30 P + n

seguida de
α +27 Al →30 P + n
A radioactividade natural pode ter origem em :

• nuclı́deos primordiais

• nuclı́deos cosmogénicos

4.1.1 nuclı́deos primordiais


A maioria dos elementos presentes na Terra tiveram origem numa condensação
de uma núvem interestelar que aconteceu há cerca de ≃ 4, 5 × 109 anos. Esta
núvem continha principalmente núcleos leves, que foram produzidos nos três
primeiros minutos após o Big Bang (1 H e 4 He). Além disso, a núvem pode-
ria conter alguns elementos mais pesados que foram produzidos nas primeiras
gerações de estrelas e dispersos no meio interestelar de modos diversos (por
exemplo, em explosões de supernovas). Alguns dos elementos produzidos nas

37
CAPÍTULO 4. RADIOACTIVIDADE 38

Tabela 4.1: Núcleos com 109 anos< T < 1012 anos. Indicam-se a suas
abundâncias terrestres (percentuais, relativamente ao elemento em causa) e a
suas actividades.

decaimento T abundância actividade actividade


em anos % Bq kg−1 (elemento) Bq kg−1 (crusta)
40
K →40 − →40 Ca + e− + ν e ; (89%)
40
K + e− →40 Ar + νe ; (11%) 1, 28 × 109 0,0117 3, 0 × 104 6, 3 × 102
87
Rb →87 Sr + e− ν e 4, 75 × 1010 27,83 8, 8 × 105 8, 0 × 101
146
Sm+ →142 N d + α 1, 03 × 108 < 10−7 <1 < 10−4
147
Sm+ →143 N d + α 1, 06 × 1011 15,1 1, 3 × 105 9 × 10−1
176
Lu + e− →176 Hf + νe 3, 78 × 1010 2,61 5, 5 × 104 4 × 10−2
187
Re →187 Os + e− + ν e 4, 15 × 1010 62,6 1, 1 × 106 8 × 10−4
232
T h+ →228 Ra + α 1, 405 × 1010 100 4.05 × 106 3, 5 × 102
235
U →231 T h + α 7, 038 × 108 0,72 5,7×105 1, 7 × 101
238
U →234 T h + α 4, 468 × 109 99,275 1, 2 × 107 4, 7 × 102

supernovas eram radioactivos. Milhões de anos mais tarde, quando a nuvem se


condensa e se forma o sistema solar, apenas algumas poucas espécies radioactivas
sobrevivem ainda. Actualmente, apenas os núcleos que têm vidas médias, diga-
mos, > 108 anos, existem em quantidades significativas. (??): 232T h, 235U, 238U
dão origem a três séries radioactivas naturais, que terminam em isótopos de chumbo
(núcleos com Z-mágico):
232
T h →208 P b (A = 4n); 235
U →207 P b (A = 4n+3); 238
U →206 P b (A = 4n+2).

4.1.2 nuclı́deos cosmogénicos


O meio insterestelar é fundamentalmente um gás termalizado, cujos componentes prin-
cipais são o hidrogénio e o hélio. Além deste, há uma componente de gás não ter-
malizada, cuja origem não está completamente estabelecida - os raios cósmicos - de
composição quı́mica análoga, e com energia cinética ≃ 300K.
Quando os raios cósmicos atingem a atmosfera terrestre (principalmente protões,
núcleos de hélio e alguns poucos núcleos pesados, dos quais os principais são o C e o F e)
perdem energia ao provocar ionizações e reacções nucleares. A radiação cósmica que
atinge a superfı́cie terrestre é essencialmente constituı́da por muões e neutrinos. Uma
pequena fracção de neutrões consegue atingir a superfı́cie terrestre, mas é rapidamente
absorvida nos primeiros metros da crusta terrestre.
Ao interagirem com os elementos da atmosfera e da crusta terrestre, os raios
cósmicos produzem núcleos radioactivos.
Outros núcleos cosmogénicos:
10
Be,26 Al,36 Cl,80 Kr,32 Si,39 Ar,22 N a,
CAPÍTULO 4. RADIOACTIVIDADE 39

Tabela 4.2: Núcleos cosmogénicos

núcleo formação T actividade(Bq/kg)


14
C n +14 N →14 C + p 5730 a 250
3
H n +6 Li →3 H + α 12,36 a 1, 2 × 102
n+16 O →3 H + 14N
7
Be n +8 O →7 Be + p, . . . 53,28 d 2, 2 × 10−3

Tabela 4.3: Núcleos artificiais

núcleo T fonte
90
Sr 28,78 a reactores nucleares
99
Tc 2, 11 × 109 a PET
131
I 8, 04d tratamento de problemas da tiróide
129
I 1, 57 × 107 a tratamento de problemas da tiróide
137
Cs 30,17 a reactores nucleares
239
Pu 2, 14 × 104 a reactores nucleares

35
S,37 Ar,33 P,32 P,38 M g,24 N a,38 S,31 Si,18 F,39 Cl,38 Cl,34m Cl

4.1.3 Núcleos artificiais


Os núcleos radioactivos podem ser fabricados em laboratórios. Os processos habituais
envolvem ou interacções com neutrões carregados ou reacções com partı́culas carre-
gadas. Alguns são produzidos para utilização em diagnóstico e terapeutica médica;
outros para estudos de Fı́sica aplicada.

4.2 Processos Radioactivos


Os processos radioactivos mais relevantes são apresentados na tabela seguinte:
1 - Emissão β −

Neste processo um nuclido X(Z, A) (com excesso de neutrões relativamente à


linha de estabilidade nuclear) transforma-se no nuclido X(Z + 1, A):

X(Z, A) → X(Z + 1, A) + e− + νe (4.1)

O processo básico é o do decaimento de um neutrão num protão, num electrão


(a partı́cula β − ) e num anti-neutrino electrónico:
0
1n →11 p + e− + νe τ = 898s (4.2)
CAPÍTULO 4. RADIOACTIVIDADE 40

São exemplos deste modo de decaimento os seguintes processos:


14 14
6C → 7N + e − + νe T1/2 = 5, 73 ± 0, 04 ka
3 5 −
1H → 2 He + e + νe T1/2 = 12, 3 ± 0, 06 a
87 87 −
37 Rb → 38 Sr + e + νe T1/2 = 47, 5 ± 0, 4 Ga
40 40 −
19 K → 20 Ca + e + νe T1/2 = 1, 277 ± 0, 008 Ga

Os electrões emitidos têm velocidades elevadas, e o seu alcance no ar é da or-


dem de alguns metros. Podem ser detidos por uma placa metálica com alguns
milı́metros. O decaimento β − é energeticamente possı́vel se:

m(X(Z, A)) > m(X(Z + 1, A)) + m(e− ) + m(νe ) (4.3)

A massa do neutrino electrónico é praticamente nula e pode ser desprezada na


equação anterior; a condição (4.3) pode ser reeescrita em termos das massas
isotópicas como:
M (X(Z, A)) > M (X(Z + 1, A)) (4.4)

2 - Emissão β +

Neste processo um nuclido X(Z, A) (com excesso de protões relativamente á


linha de estabilidade nuclear) transforma-se no nuclido X(Z − 1, A):

X(Z, A) → X(Z − 1, A) + e+ + νe (4.5)

onde e+ é o positrão (antipartı́cula do electrão).

O processo básico é o do decaimento de um protão num neutrão, num positrão


(a partı́cula β + ) e num neutrino electrónico:
1
1p →10 n + e+ + νe (4.6)

São exemplos deste modo de decaimento os processos:


22 22
11 N a → 10 N e + e + + νe T1/2 = 2, 6019 ± 0, 0004 ka
13 13 +
7 N → 6C + e + νe T1/2 = 9, 965 ± 0, 0004 min
39 39 +
20 Ca → 19 K + e + νe T1/2 = 859, 6 ± 1, 4ms

O decaimento β + é energeticamente possı́vel se:

m(X(Z, A)) > m(X(Z − 1, A)) + m(e+ ) + m(νe ) (4.7)

ou em termos das massas isotópicas como:

M (X(Z, A)) > M (X(Z − 1, A)) + 2m(e− ) (4.8)

O processo β + não é espontâneo (recorde que a massa do protão é inferior à


massa do neutrão).
CAPÍTULO 4. RADIOACTIVIDADE 41

Tabela 4.4: Tipos principais de radioactividade

designação reacção espectro de energia


β− (Z, A) → (Z + 1, A) + e− + νe contı́nuo
β+ (Z, A) → (Z − 1, A) + e+ + νe contı́nuo
captura electrónica e− + (Z, A) → (Z − 1, A) + e− + νe + RX/eAuger discreto
2β (Z,A) → (Z ± 2, A) + 2e± + 2νe (2νe) contı́nuo
α (Z, A) → (Z − 2, A − 4) + (2, 4) discreto
fissão (Z, A) → (Z1 , A1 ) + (Z2 , A2 ) + n′ s contı́nuo
γ (Z, A)∗ → (Z, A) + γ discreto
conversão interna e− + (Z, A)∗ → (Z, A) + e− + RX/eAuger discreto

3 - Captura electrónica

Num processo de captura electrónica (CE) um electrão, pertencente a uma


camada próxima do núcleo, é capturado por este. O resultado é a criação de um
neutrão, que fica no núcleo e e emissão de um neutrino electrónico. Ou seja, um
nuclideo X(Z, A) (com excesso de protões relativamente à linha de estabilidade
nuclear) pode desintegrar-se (além da emissão β + ) por CE, de acordo com a
equação seguinte:

X(Z, A) + e− → X(Z − 1, A) + νe (4.9)

O processo básico é o seguinte:


1 1
1p + e− → 0n + νe (4.10)

Como exemplo deste tipo de decaimento tem-se:


40 40 ⋆
19 K + e− → 18 Ar + νe

O processo CE é energeticamente possı́vel se:

m(X(Z, A)) + m(e− ) > m(X(Z − 1, A)) + m(νe ) + b(e− ) (4.11)

onde b(e− ) é a energia de ligação do electrão capturado ao átomo. Em termos


das massas isotópicas a condição anterior pode ser reescrita como:

M (X(Z, A)) > M (X(Z − 1, A)) + b(e− ) (4.12)

O processo CE não é espontâneo.

4 - Emissão α

Um nuclideo X(Z, A), que tem um excesso de nucleões (protões e neutrões),


poderá decair por emissão α, transformando-se no nuclido X(Z − 1, A − 4):

X(Z, A) → X(Z − 2, A + 4) + α (4.13)

Uma partı́cula α é um núcleo de hélio-4: um estado ligado de dois protões e dois


neutrões.
CAPÍTULO 4. RADIOACTIVIDADE 42

São exemplos deste tipo de decaimento os processos:


238 234
92 U → 90 T h +α T1/2 = 4, 468 ± 0, 003 Ga
235 233
92 U → 90 T h +α T1/2 = 703, 8 ± 0, 5 M a
215 211
84 P o → 82 P b +α T1/2 = 1, 781 ± 0, 004 ms

Uma condição para que o processo (4.13) ocorra é que:

m(X(Z, A)) > m(X(Z − 1, A − 4)) + m(α) (4.14)

ou em termos das massas isotópicas como:

M (X(Z, A)) > M (X(Z − 2, A + 4)) + M (He(2, 4)) (4.15)

Embora o Q para a emissão α seja positivo para núcleos com A ≥ 104, o emissor
α mais leve até hoje encontrado é 21084 P o, com uma semi-vida de 138 d e cujo
Q é de 5,4 MeV, Isto é devido ao facto de a partı́cula α uma vez formada ter
de atravessar uma barreira de potencial superior à sua energia. (De facto, esta
passagem, por efeito túnel, só é compreensı́vel em Fı́sica Quântica.)
As partı́culas α emitidas têm energias cinéticas da ordem de poucos MeV, a que
correspondem velocidades da ordem de 107 ms−1 . Têm um poder de penetração
muito curto: uma folha de papel ou alguns centı́metros de ar são suficientes para
as parar.

5 - Emissão de nucleões

Muitı́ssimo pouco frequente.

6 - Fissão Nuclear

Num processo de fissão nuclear, um núcleo cinde-se em (geralmente) dois núcleos,


com números de massa aproximadamente iguais. (A fissão simétrica é pouco
provável; a fissão envolvendo mais de dois núcleosno estado final é pouco provável.)
A fissão classifica-se em espontânea ou induzida; em controlada ou do tipo–
bomba. Em geral, a fissão é acompanhada de emissão de neutrões.

7 - Emissão γ

Um núcleo num estado excitado tende a perder o excesso de energia por emissão
γ:
X(Z, A)∗ → X(Z, A) + γ (4.16)
Os fotões emitidos têm energia num intervalo de valores muito variado. O poder
de penetração da radiação γ é muito grande, podendo atravessar centenas de
metros no ar ou placas de chumbo, até ser absorvida.
CAPÍTULO 4. RADIOACTIVIDADE 43

4.3 Lei do decaimento radioactivo

A lei do decaimento radioactivo é independente do tipo de processo (α, β ou γ) e pode


ser formulada do seguinte modo: a probabilidade de um núcleo decair na unidade de
tempo, λ, (λ, constante de decaimento) é uma constante caracterı́stica de cada ele-
mento (uma propriedade nuclear, que não é afectada pelos agentes fı́sicos ou quı́micos
usuais).
Dado o número de núcleos envolvidos nos processos radioactivos ser muito elevado,
este número pode ser legitimamente assumido como uma variável contı́nua.
Designe-se por N (t) o número de núcleos de uma amostra de uma espécie radio-
activa. O número de núcleos que decaem na unidade de tempo é:

dN (t)
= −λN (t) (4.17)
dt
Integrando a equação anterior obtém-se:

N (t) = N (0) e−λt (4.18)

onde a constante de integração N (0) é o número de núcleos presentes na amostra num


instante que consideramos o instante inicial da contagem do tempo (4.1). Assim, por

N(t)

tempo

Figura 4.1: N (t) versus tempo.


Quantidade do nuclido-filho

tempo

Figura 4.2: Número de núcleos-filho versus tempo.


CAPÍTULO 4. RADIOACTIVIDADE 44

exemplo, se a espécie A decai (constante de decaimento λA ) na espécie B, que é estável


ter-se-á:

NA (t) = NA0 e−λA t (4.19)


−λA t λA t
NB (t) = NB0 + N0A (0) [1 − e ] = NB0 + NA (t) [e + 1] (4.20)

onde NA0 e NB0 são o número de núcleos das espécies A e B no inı́cio da contagem
dos tempos.
Assim se se medirem as concentrações actuais das espécies A e B e se se conhecer
a concentração inicial de B, NB0 , a idade da amostra pode ser determinada usando a
relação:
1
t= [ln(NB (t) − NB0 + NA (t)] (4.21)
λA
ou, se se medir NB (t) e se se conhecerem as concentrações iniciais de A e B, a
idade da amostra pode determinada por:
1
t= [ln(−NB (t) − NB0 + NA0 ) − ln NA (t)/λ] (4.22)
λA

Define-se:
• Perı́odo de uma amostra (ou semivida), T , como o intervalo de tempo ao fim
do qual o número de núcleos presentes na amostra se reduziu a metade do seu
valor inicial.
Da equação (4.18) deduz-se:

N0 ln 2
= e−λT → T = (4.23)
2 λ
• Vida média de uma amostra, τ , como o intervalo de tempo ao fim do qual o
número de núcleos presentes na amostra se reduziu a 1/e do seu valor inicial.
Da equação (4.18) deduz-se:
N0 1
= e−λτ → τ = (4.24)
e λ

A actividade da amostra num dado instante A(t) é o número de desintegrações por


segundo. Da equação (4.18) deduz-se:

A(t) = λN (t) = λ N (0) e−λt (4.25)

4.4 Algumas unidades usadas em radiometria


A unidade de actividade de uma amostra é o becquerel (Bq):

1 Bq=uma desintegração por segundo

Em livros mais antigos é geralmente usado o curie (Ci):

1 Ci = número de desintegrações por segundo de 1 grama de Ra=3, 7 × 1010


desintegrações por segundo

Outras unidades definidas no âmbito da radioactividade relacionam-se com os efeitos


das radiações.
CAPÍTULO 4. RADIOACTIVIDADE 45

4.5 Decaimentos multiplos


4.5.1 Decaimentos multimodais
Um processo particular de decaimento é chamado de modo de decaimento. Frequen-
temente um isótopo tem vários modos de decaimento. Por exemplo o 40 K decai por
captura electrónica no 40 Ar e por emissão beta no 40 Ca.
Consideremos por simplicidade o caso de uma espécie radioctiva que tem dois
modos de decaimento, com constantes de decaimento λB e λC , em espécies B e C,
respectivamente. As equações do decaimento radioactivo são:
dNA (t)
= −(λA + λB )NA (4.26)
dt
dNB (t)
= +λB NA (4.27)
dt
dNC (t)
= +λC NA (4.28)
dt
Suponhamos que no instante t = 0 o número de núcleos das espécies A, B e C são,
respectivamente, NA0 , NB0 e 0. A solução da equação (4.27) é

NA = N0A e−(λB +λC )t (4.29)

Para obter a solução para o isótopo B substitui-se o resultado (4.32) em (4.28):


dNB (t)
= +λB N0A e−(λB +λC )t (4.30)
dt
Integrando a equação (4.30) obtém-se:
λB
NB = N0B + N0A (1 − e−(λB +λC )t ) (4.31)
λB + λc
Procedendo de modo análogo para a equação (4.28) obtém-se:
λC
NC = N0C + N0A (1 − e−(λB +λC )t ) (4.32)
λB + λC

4.5.2 Decaimentos sequenciais


Se o núcleo-pai, A, decai num núcleo-filho, B, que também é radioactivo e decai num
isótopo C, estável, as equações do decaimento escrevem-se:
dNA (t)
= −λA NA (4.33)
dt
dNB (t)
= +λA NA − λB NB (4.34)
dt
dNC (t)
= +λB NB (4.35)
dt
O sistema de equações anteriores pode ser facilmente resolvido e a solução é:

NA (t) = NA0 e−λA t (4.36)


λ A
NB (t) = NB0 e−λB t + N0A [e−λA t − e−λB t ] (4.37)
λB − λA
λB e−λA t λA e−λB t
NC (t) = NC0 + NB0 (1 − e−λB t ) + N0A [1 + − ] (4.38)
λB − λA λA − λB
(4.39)
CAPÍTULO 4. RADIOACTIVIDADE 46

Note-se que os termos na equação (4.39) representam, por ordem, o número de núcleos
iniciais da espécie C, o número de núcleos de B que decairam em C e o número de
núcleos de A que decairam em C.
No caso particular de λA ≪ λB a equação (4.39) pode ser escrita, na forma apro-
ximada, como:
NC (t) ≈ NB0 + NC0 + NA0 (1 − e−λA t )
Ou seja, neste caso, pode ignorar-se o decaimento do produto intermédio e tratar
o decaimento como se este ocorresse num único passo (é o que se passa na cadeia
urânio-chumbo).
Os resultados anteriores são generalizáveis a cadeias de decaimentos mais comple-
xas.
Capı́tulo 5

Decaimento β

Em 1934 E. Fermi apresentou uma teoria do decaimento β, desenvolvida em completa


analogia com a teoria das transições electromagnéticas.
De acordo com a Regra de ouro de Fermi, a taxa de transição entre um estado
inicial i e um estado final f , de um dado sistema, é dada por:

λif = | Mif |2 ρEf , (5.1)
~
onde Z
Mif = Ψ∗f V Ψi dτ (5.2)

é o elemento de matriz de transição do operador da perturbação, entre os estados


inicial e final, e ρ(Ef ) é a densidade de estados finais com energia Ef = E.
Neste ponto nada se sabe sobre o operador V excepto que pode ter um caracter
vectorial (Fermi) ou de vector axial (Gamow-Teller) (ver parte final do texto). Para o
repressentar nesta fase escreveremos simplesmente:
Z
Mif = g Ψ∗f Ox Ψi dτ (5.3)

No desenvolvimento que se segue ignoraremos as funções de onda de spin.


A função de onda do estado final é o produto da função de onda nuclear, χf , pela
função de onda do electrão φe (~r) e pela função de onda do neutrino electrónico, φν (~r).
As funções de onda do electrão e do neutrino são representadas por ondas planas:
1
φe (~r) = √ ei~pe ·~r (5.4)
V
1 i~pν ·~r
φν (~r) = √ e (5.5)
V
Como o neutrino só muito fracamente interage com as outras partı́culas, é certamente
correcto usar uma representação por onda plana, no seu caso. No entanto, a função
de onda do electrão é distorcida pelo campo de Coulomb do núcleo e a aproximação
de onda plana só é justificável para muito altas energias. Para as energias envolvidas
nos decaimentos β, os comprimentos de onda tı́picos dos leptões são muito maiores
que o tamanhos dos raios nucleares. Assim podem-se substituir as funç oes de onda
dos lept oes pelo seu valor em ~r = 0. Substituindo em (5.3) obtém-se:
Z
g
Mif = χi dτ (5.6)
V

47
CAPÍTULO 5. DECAIMENTO β 48

O estado final é um estado de três partı́culas e assim a densidade de estados finais


é o produto das densidades de estados finais do núcleo, da partı́cula β e do neutrino.
O número de estados finais do núcleo é 1; o número de estados finais da da partı́cula
β com quantidade de movimento no intervalo p e p + dp é:

4πp2β dpβ
dnβ = V (5.7)
(2π~)3
Analogamente se escreve para o neutrino:
4πp2ν dpν
dnν = V (5.8)
(2π~)3
Consequentemente:
dn dnβ dnν p2β p2ν dpβ dpν 2
= = V (5.9)
dE dE 4π 4 ~6 dE
q
Contudo pβ e pν não são independentes; estão relacionados por Eβ = p2β c2 + m2β c4
e Eν = pν c e (do teorema da conservação da energia e desprezando a energia de recuo
do núcleo):
Ef = Ee + Eν (5.10)
e assim para um dado valor da energia da partı́cula β, dEν = dE. Como a massa do
neutrino electrónico é desprezável neste contexto, tem-se:
Ef − Eβ dEν dE
pν = ; dpν = = . (5.11)
c c c
Ou seja:
Z
dn dnβ dnν
=
dE dE
Z pmax
V2
(E − Eβ )2 p2e dpβ
ˆ ˜
=
4π 4 ~6 c3 0
onde pβ corresponde à quantidade de movimento máxima da partı́cula β. Substituindo
em (5.1) obtém-se:

2π g 2 !Mif
2 Z pmax h q i
λif = !Mif !2 ρEf = (E − p 2 2
β c + m 2 4 2 2
β c ) p β dpβ (5.12)
~ 2π 3 ~7 c3 0
Em termos da energia cinética:

Eβ = Tβ + mβ c2 ; Ef ≈= Eβ (max) = Tmax + mβ c2

o integral anterior pode ser reescrito como:


h i
intp0max (T + mβ c2 ) T ≤ +2mβ c2 (Tmax−T )2 dT
p
(5.13)

Resumindo:
5
λif ≃ Tmax (5.14)
Até aqui nao se considerou os spins das partı́culas intervenientes. O teorema da
conservação do momento angular impõe:

I~i = I~i + S
~ +L
~

~ = ~l − β + ~lν . Os decaimentos em que os leptões transportam


~ = ~s − β + ~sν e L
onde S
momento angular diferente de zero são proibidos; isto não significa que eles são abso-
lutamente proibidos mas que são muito menos prováveis que os outros.(Se as regras de
CAPÍTULO 5. DECAIMENTO β 49

selecção proibem a existncia de outros decaimentos permitidos, então são os chamados


decaimentos proibidos que ocorrem.)
Relativamente aos spins dos leptões eles podem ser S = 1 ou S = 0. As regras de
selecção de momento angular são as seguintes:

∆I = 0ou∆I = 1; 0 → 0

Os processos β classificam-se em processos de Fermi, em que a interacção simples-


mente modifica um neutrão num protão (ou vice-versa no caso de decaimento β + )
sem afectar a função de onda espacial ou de spin do núcleo. Não há assim qualquer
alteração do valor do momento angular nuclear. As regras de selecção para transições
de Fermi são pois:

transições de Fermi permitidas : ∆I = 0; conservação da paridade; S = 0

As transições 0+ → 0+ são designadas por superpermitidas de Fermi.


Após E. Fermi ter proposto a sua teoria, foi imediatamente reconhecido que ela
não contemplava todos os casos observados. Em especı́fico, os casos em que, sem
ocorrer violação de paridade,se tinha ∆I = 1.A resolução deste problema implica a
introdução de um termo no potencial de interacção de carácter vector-axial. Este
termo foi proposto por Gamow e Teller. As regras de selecção para transições de
Gamow e Teller são:

transições de G-T permitidas : ∆I = 0ou1; 0 → 0conservação da paridade

Como decorre da estrutura da teoria apresentada, há ainda transições permitidas mis-
tas em que participam os termos de F e de GT simultaneamente.
Para terminar, impõe-se agora fazer duas observações:
• É necessário fazer uma correcção à função de onda do electrão, devido á distorsão
que sofre no campo de Coulom do núcleo.
• A teoria correcta da emissão β decorre do modelo padrão das interacções fun-
damentais.

Bibliografia

J. Lilley, Nuclear Physics, cap 3


N.A. Jelley, Fundamentals of nuclear Physics, cap. 3

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