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Introdução
A
história do campesinato amazônico tem sido marcada por
práticas cotidianas de luta e resistência, com a finalidade de
garantir os meios de subsistência e a consequente reprodução
dos modos de vida no campo. Conforme este capítulo demonstrará, a resis-
tência no espaço rural, como tática dos “fracos”, ocorre em diversas arenas
e de forma articulada com diferentes sujeitos.1 Segundo Michel de Certeau,
enfocar as táticas nos permite compreender a ação do sujeito subalternizado
dentro do seu restrito campo de possibilidades. É no improviso, no burlar a
normatização e no ir além do que se espera que as táticas são forjadas. Nas
palavras do autor:
1 É na fronteira, conforme definição do sociólogo José de Souza Martins, que essas práticas se tornam
mais evidentes, pois é no encontro conflitivo que os sujeitos sociais buscam formas de resistir. Para
Martins, a fronteira é lugar de alteridade, encontro dos diferentes e desencontro de temporalidades histó-
ricas, e é, sobretudo, lugar de conflito. Trazendo para a realidade palpável da Amazônia do século XX,
é o lugar onde camponeses encontram os latifundiários, os empresários e demais agentes do capital.
Aí, então, é estabelecido o conflito, a resistência, a revolta, o protesto, etc. (MARTINS, José de Souza.
Fronteira: a degradação do Outro nos confins do humano. 2. ed. São Paulo: Contexto, 2009, p.132-133).
A tática não tem por lugar senão o do outro. E por isso deve
jogar com o terreno que lhe é imposto tal como o organiza a
lei de uma força estranha. Não tem meios para se manter a si
mesma, à distância, numa posição recuada, de previsão e de
convocação própria: a tática é movimento dentro do “campo
de visão inimigo”, como dizia Von Bullow, e no espaço por ele
controlado.2
2 CERTEAU, Michel de. A invenção do cotidiano: vol. 1 Artes de fazer. Petrópolis: Vozes, 1994, p.100.
3 RODRIGUES, José Honório. Teoria da História do Brasil: introdução metodológica, 3. ed. rev., São
Paulo: Companhia Editora Nacional, 1968.
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lado, o semanário Folha do Amapá estava vinculado a esse partido, e, portanto,
era fundamentalmente uma ferramenta de propaganda dos feitos do governo.
Destarte, os debates travados entre os articulistas do Jornal do Dia e da Folha do
Amapá devem ser compreendidos como expressões de posições antagônicas
na arena política amapaense.
Quando se trata de fontes jornalísticas, não há acasos. A historiadora
Tânia Regina de Luca adverte que “a imprensa periódica seleciona, ordena,
estrutura e narra, de uma determinada forma, aquilo que se elegeu como
digno de chegar até o público”.4 Portanto, todas as informações advindas dos
artigos de periódicos amapaenses foram entendidas como partes de discursos
propositalmente construídos, com finalidades políticas. Contudo, o diálogo
conflituoso que se estabeleceu entre os jornais, nesse contexto, merece uma
pesquisa mais profunda, o que não é a intenção agora.
Além dos artigos de periódicos, fez-se uso de correspondências. Ba-
cellar destaca algumas das tipologias de documento que podem ser encontra-
das em acervos públicos e privados. As correspondências, segundo o autor,
são bastante numerosas. Partes de um processo de comunicação, elas trazem
à luz preocupações de autoridades e de civis sobre aspectos do cotidiano da
gestão e vida nas cidades.5 Neste capítulo, correspondências internas da CPT,
de sindicatos e de membros do judiciário foram exploradas com a finalidade
de se compreender o papel desempenhado pela Pastoral no Amapá. Perce-
beu-se, por exemplo, que a comunicação era constante e servia como meio de
se pressionar agentes e instituições envolvidas nos conflitos por terras.
Por fim, igualmente importantes foram as entrevistas. Destaca-se que a
história oral coloca o pesquisador em contato com testemunhos que revelam
diferentes facetas do vivido, no passado e no presente.6 As entrevistas fo-
ram produzidas pelo autor do presente capítulo e também foram encontradas
transcritas no acervo da CPT Nacional. Por meio dessa fonte, foi possível
reconhecer e compreender, para além das formas de atuação da Pastoral,
estratégias e táticas de outros sujeitos que vivenciaram a situação de fronteira.
4 LUCA, Tânia Regina de. Fontes impressas: História dos, nos e por meio dos periódicos. In: PINSKY,
Carla Bassanezi (org.). Fontes históricas. 3. ed. São Paulo: Contexto, 2011, p. 111-153.
5 BACELLAR, Carlos. Uso e mau uso dos arquivos. In: PINSKY, Carla Bassanezi (org.). Fontes históri-
cas. 3. ed. São Paulo: Contexto, 2011, p. 23-79.
6 ALBERTI, Verena. Fontes orais: Histórias dentro da História. In: PINSKY, Carla Bassanezi (org.).
Fontes históricas. 3. ed. São Paulo: Contexto, 2011, p. 155.
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Uma nova Igreja para novos tempos
No bojo da tensa área de fronteira na Amazônia da segunda metade do
século XX, permeada pela agressiva intervenção do capitalismo multinacio-
nal trazido e subsidiado pelos militares, a Igreja católica se viu diante de uma
forte e crescente hostilidade no espaço rural, o que a obrigou a se posicionar
de modo mais contundente diante dos casos de violência cada vez mais fre-
quentes.
Mas muito antes disso, já havia se configurado um novo modo de ex-
pressão do catolicismo no Brasil, fruto de mudanças ocorridas dentro da
Igreja. Mudanças atreladas a uma autocompreensão que vinha sendo elaborada
após a Segunda Guerra Mundial. Nesse contexto, constitui-se um processo
de autonomia da Igreja nas mais diversas partes do planeta, descentralizando-
-se as decisões de Roma e consolidando-se, na América Latina, Ásia e África,
uma Igreja Católica mais plural e dedicada as realidades locais.7
Segundo Pimentel, as inúmeras transformações que ocorreram na Igre-
ja Católica durante o século XX tiveram sua oficialização durante o Concílio
Ecumênico Vaticano II (1962-1965).8 No Brasil, as bases dessas mudanças
começaram a ser aplicadas após a II Assembleia Geral do Conselho Epis-
copal Latino-Americano (Celam), ocorrida na cidade de Medellín, em 1968.
Este ano marcou também o início dos “anos de chumbo” da ditadura militar
brasileira. Segundo Mainwaring, a crescente onda de violência estatal fomen-
tou as transformações nas diretrizes eclesiais, uma vez que situações como as
“violações generalizadas dos direitos humanos, a marginalização das classes
populares, a repressão contra a Igreja e o fechamento de outros canais de dis-
sidência fizeram com que muitos bispos se tornassem mais progressistas”.9
Nesse contexto, nasce também a Teologia da Libertação, que se cons-
tituiu, sobretudo, como uma teologia de questionamento da miséria e do
subdesenvolvimento da América Latina, tornando-se uma corrente de pen-
7 IOKOI, Zilda Grícoli. Igreja e camponeses: Teologia da Libertação e movimentos sociais no campo. São
Paulo: Hucitec, 1996, p. 21-22.
8 PIMENTEL, Walbi Silva. A Igreja dos pobres: origem e desenvolvimento das CEBs no Amapá (1966-
1983). Curitiba: Prismas, 2016. As reformas implantadas pelo Concílio Vaticano II desdobram-se em
diversos níveis: na liturgia, na reflexão sobre o papel da Igreja na contemporaneidade, no papel dos
leigos e sua relação com o clero e etc
9 MAINWARING, Scott. A Igreja católica e a política no Brasil (1916-1985). São Paulo: Brasiliense, 2004,
p.103.
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samento crítica em relação ao capitalismo e que clamava para que a Igreja se
voltasse, preferencialmente, aos mais pobres, comprometendo-se com suas
lutas sociais.10
À luz desses documentos e dessa nova teologia, foi fundada a Comis-
são Pastoral da Terra, após encontro em Goiânia em 1975. Data desse pe-
ríodo a já mencionada intervenção do capitalismo nacional e internacional
na Amazônia promovida pelo regime ditatorial militar que, nas pegadas do
chamado “milagre brasileiro”, entregava terras e demais recursos naturais da
região a latifundiários, mineradoras, madeireiras, pecuaristas e etc., passando
por cima de camponeses e suas mais distintas tipologias.11
Em pouco mais de um ano, a CPT já havia se instalado em mais da
metade dos estados brasileiros, totalizando 14 equipes regionais.12 Apesar de
ter surgido a partir da articulação primordial entre Amazônia e Centro-Oeste,
logo se espalhou por todo o país, chegando também ao Amapá, ainda então
Território Federal (TFA). A atuação inicial da CPT aí, entretanto, deu-se de
forma diferenciada em comparação às demais regionais, algo que veremos a
seguir.
A Regional Amapá: os primeiros anos e o Sindicato dos
Trabalhadores Rurais de Macapá (1979-1983)
Então constituímos esse grupo de Pastoral Rural para as ativi-
dades do campo, digamos. Seja do ponto de vista da Pastoral,
seja do ponto de vista dos direitos humanos.
Sandro Gallazzi
19 A condição de Território Federal, estabelecida por meio do Decreto-Lei nº. 5.812 de 13 de setem-
bro de 1943, assinado pelo então presidente Getúlio Vargas, inferiu diretamente sobre o controle das
terras no Amapá. Em um primeiro momento, a administração dessas terras cabia ao DTC (Divisão de
Terras e Colonização), órgão federal criado com essa finalidade. Em 1970, é criado o Incra, que passa
a centralizar a administração das terras públicas da União. Com isso, todo e qualquer empreendimento
nas terras amapaenses deveria ter aval do poder federal, o que dificultava o avanço do capital nacional
e internacional na região, fato este que ainda interfere no seu lento e gradual, porém não menos nocivo
e preocupante, avanço na contemporaneidade. O Amapá deixou o status de Território Federal e passou
a ser estado após a constituição federal de 1988.
20 Entrevista com Alessandro Gallazzi realizada pelo autor em 16/03/2017.
21 Durante os anos 1980, o STR – Afuá esteve sempre atrelado a CPT/AP. Por exemplo, no periódico
informativo de circulação interna do sindicato, A Poronga, n. 04, de setembro a dezembro de 1986,
Sandro Gallazzi e Anna Maria, da CPT/AP, ganhavam destaque na página 3 por terem assessorado dois
encontros de formação com a finalidade de promover um estudo sobre a situação política brasileira
naquele momento (A Poronga, n. 04, setembro a dezembro de 1986).
22 É interessante ressaltar o papel do Estado nesse contexto, sobretudo no que concerne ao aparato
policial. Não havia, segundo Alessandro Gallazzi, nem mesmo transporte para o delegado se locomo-
ver até as áreas de conflito. Isto só ocorria quando os interessados eram os próprios proprietários de
terras que providenciavam o transporte para os policiais, a fim de garantirem seus interesses. Em um
dos casos, um camponês que seria preso não o foi porque um grande grupo de camponeses se reuniu
exigindo que todos fossem presos junto com ele. Como não havia espaço no pequeno barco para todos,
ninguém foi preso. Este evento demonstra a organização e o afloramento de uma consciência de classe
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O aviamento, assiduamente enfrentado nesse momento, era uma for-
ma de relação de trabalho presente havia muito tempo na Amazônia. O pa-
trão, proprietário das terras e das benfeitorias, apropriava-se também da mão
de obra de homens e mulheres que tinham na terra uma importante fonte
de sustento. Por intermédio de práticas coercitivas – o estabelecimento da
obrigatoriedade de compra de mercadorias em certa casa de comércio e o
consequente endividamento – o patrão criava um vínculo de dependência
inquebrável com os trabalhadores.23
Coube à CPT, inicialmente, providenciar meios de combater o avia-
mento em Afuá. Mas, o seu desmoronamento completo se deu por iniciativa
dos próprios trabalhadores, quando estes se apropriaram do conhecimento
sobre a legislação trabalhista e perceberam na organização sindical uma ferra-
menta imprescindível para o fortalecimento das suas lutas.
Ademais, algo em torno de 13 escolas foram improvisadas com o ob-
jetivo de se promover a alfabetização dos moradores. Nelas, sem estrutura
alguma, quem sabia ler ensinava quem não sabia, tudo de forma voluntária.
A CPT recorreu a escolas da rede privada de ensino em Macapá para solicitar
materiais escolares e didáticos. Estes últimos, porém, não correspondiam à
realidade dos alunos, o que dificultava o processo de aprendizagem. Segundo
Sandro Gallazzi, livros de alfabetização contendo palavras como “edifício”
e “elefantes” não surtiram o efeito desejado. Por causa disso, foi proposta a
confecção de materiais didáticos pelos próprios moradores, contendo histó-
rias da cultura e do cotidiano ribeirinho afuaense24, algo, metodologicamente,
ancorado nos escritos de Paulo Freire.
Os problemas de saúde da população, que atingiam sobretudo as crian-
ças, eram de ordem urgente. As doenças afetavam inclusive o cotidiano esco-
lar, o que também preocupava os agentes da Pastoral. Para descobrir a raiz do
problema, uma enfermeira italiana, amiga do coordenador da CPT/AP, foi le-
vada a Afuá onde fez testes com a água que era consumida pelos moradores,
detectando um alto grau de contaminação. Este problema foi solucionado
27 Comissão Pastoral da Terra-AP, Macapá. Comunicação interna sobre chacina no município de Amapá. Des-
tinatária: CPT Nacional. Data: 02/03/1994 (CTB. Arquivo AP14-16-119).
28 CONFLITOS antigos. Jornal do Dia, de 26 de fev. de 1994 (CTB. Arquivo AP14-16-128).
29 CHACINA dos Magave. Boletim Povo da Terra [CPT/AP], de fev. de 1994 (CTB. Arquivo AP14-16-
129).
30 ACHADOS mais dois corpos da chacina em Amapá. Jornal do Dia, de 27 e 28 de fev. de 1994 (CTB.
Arquivo AP14-16-126).
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o mandante do crime, porém essa afirmação sofreu modificações em depoi-
mentos posteriores, não se sabendo até hoje precisamente o porquê.31
Após a prisão dos suspeitos e perícia no local do crime e nos corpos, a
brutalidade que foi descoberta causou escândalo na sociedade local. O caso,
a partir de então, ganhou repercussão nacional e até mesmo internacional.
Veículos de comunicação de grande circulação passaram a acompanhá-lo, de-
nunciando a morosidade com que a Justiça local lidava com ele.
Mas, não apenas a mídia32 tratou de pressionar o Judiciário local e de-
mais envolvidos nas investigações. No dia 23 de julho de 1994, portanto qua-
se seis meses após o massacre, foi organizada uma grande manifestação por
entidades ligadas ao campo (dentre elas a CPT), familiares das vítimas e civis
no município de Amapá. A pauta era a cobrança de justiça. Em comunicado
emitido pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais do Amapá (Sintra) direcio-
nado ao Departamento Nacional dos trabalhadores rurais da CUT, afirma-
va-se:
No último dia 23 de julho realizamos manifestação na cidade
de Amapá. Na oportunidade dois filhos do fazendeiro (man-
dante) Aderbal Távora, puxaram arma para tentar intimidar os
manifestantes. Os policiais a tempo os detiveram, liberando-os
logo a seguir.33
As acusações feitas pelo sindicato geraram repercussão nos meses se-
guintes. Percebe-se que o fazendeiro Aderbal Távora já era tratado pelos mo-
vimentos sociais como o mandante do crime e que seus filhos, buscando de-
fender a honra de seu pai, acabaram por tentar intimidar os manifestantes34,
segundo o comunicado.
31 Goiano foi assassinado pouco tempo depois de ter sido preso.
32 O periódico Jornal do Dia, segundo o jornalista Edgar Rodrigues, foi “o segundo diário do Amapá.
Tiragem média: mil exemplares. O aparecimento do Jornal do Dia em 4 de fevereiro de 1987 foi um
embrião para a consolidação da presença dos jornais diários no Amapá. Foi idealizado pelo empre-
sário Júlio Maria Pinto Pereira. Na realidade, o jornal foi uma extensão da Gazeta Trabalhista, um
noticioso de tendência político-partidária, que divulgava, naquela época, notas públicas e notícias do
PDT (Partido Democrático Trabalhista), ao qual Júlio Pereira estava filiado”. (RODRIGUES, Edgar.
As comunicações sociais no Amapá.s/d. Disponível em: http://www.achetudoeregiao.com.br/ap/macapa/
As_comunicacoes_sociais.htm. Acesso em: 4 jan. 2018.
33 Sindicato dos Trabalhadores Rurais do Amapá (Sintra). Comunicado direcionado ao departamento nacional
dos trabalhadores rurais da CUT. Data: 28/07/1994. (CTB. Arquivo AP14-16-10).
34 A versão do sindicato, ligado à CUT, foi contestada pelo juiz da Comarca de Amapá, responsável
pelo caso. Em carta direcionada ao Subprocurador Geral da República, datada de 29 de agosto de 1994,
ele acusa a CUT de mentir sobre os filhos de Aderbal Távora portarem armas. O juiz também afirmou
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Nos meses que se seguiram, o processo continuou de forma lenta, o
que ocasionou novas mobilizações. Em agosto de 1994, nasce o Movimento
pela justiça aos Magave, com ato organizado pela Comissão Pastoral da Terra,
movimentos sociais, familiares das vítimas e membros da sociedade em geral.
A programação, dividida em três dias (25, 26 e 27 de agosto), contou com
passeatas, caravanas (carreatas de Macapá até Amapá), um fórum de debates
sobre a situação do campo no Amapá, audiências com autoridades amapaen-
ses, missa campal na Fazenda Campo Alegre, presença de líderes nacionais
dos movimentos sociais e partidos políticos, além da coleta de assinaturas de
um abaixo-assinado.35
Em resposta a essas mobilizações, o juiz da Comarca de Amapá, José
HilmoHass (responsável pelo caso), escreveu uma carta onde criticava, de
forma forte, a conduta dos movimentos sociais envolvidos nas manifesta-
ções. Dentre outras afirmações, o juiz acusava a Comissão Pastoral da Terra
e a Central Única dos Trabalhadores de terem fabricado a versão de que o
massacre ocorreu devido a um conflito de terras. À época, o juiz afirmou que:
“políticos inescrupulosos promovem manifestações para que seja decretada
a prisão do suposto mandante. A CUT e a Pastoral da Terra, no interesse de
construir um conflito fundiário, pois interessa à sua bandeira, aproveitam o
embalo”.36 Além disso, disse ainda que as duas entidades haviam acusado
Aderbal Távora sem provas.
A carta gerou grande repercussão devido ao seu teor agressivo e acusa-
tório. A CPT, em resposta, escreveu uma correspondência37, datada de 31 de
agosto daquele ano, ao Subprocurador Geral da República, defendendo-se e
afirmando não ter sido a criadora da hipótese de que o massacre ocorreu em
decorrência de um conflito de terras, pois esta foi levantada pela mídia local
logo após a descoberta dos corpos. A CPT afirma ainda que tampouco acu-
sou alguém sem ter provas, mas que apenas cobrou justiça nas manifestações.
que só houve reação por parte destes por conta de provocações feitas pelos manifestantes que gritavam
“assassino” em frente à casa do fazendeiro. A seguir analisaremos outros aspectos desta carta.
35 Convite e programação para participação nas manifestações do Movimento pela justiça aos Magave. Data:
23/08/1994. (CTB. Arquivos AP14-16-63 a AP14-16-66).
36 Correspondência de José HilmoHass direcionada à Procuradoria Geral da República. Data: 29 de agosto de
1994 (CTB. Arquivos AP14-16-77 a AP14-16-82).
37 Comissão Pastoral da Terra-AP. Resposta ao Subprocurador Geral da República, referente à acusação do juiz
da Comarca de Amapá sobre a fabricação de um conflito de terras pela CPT. Data: 31 de outubro de 1994 (CTB.
Arquivos AP14-16-22 a AP14-16-23).
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A pressão, a partir de então, foi para que o juiz deixasse o caso. Havia
a ideia de que este estava tentando proteger o fazendeiro Aderbal Távora,
tio do então prefeito da cidade com quem o magistrado mantinha, segundo
informantes, uma relação muito próxima.38 Em 28 de novembro de 1994,
a Folha de São Paulo, veículo de circulação nacional, informou, em texto pu-
blicado em seu site, a troca de juízes no caso da chacina da família Magave.
Segundo a reportagem, isto ocorreu devido “a ONU, a Comissão Teotônio
Vilela, a CUT, a Pastoral da Terra, a OAB e a America’s Watch acusarem o juiz
de beneficiar o fazendeiro Aderbal Távora, 68, apontado como mandante do
crime”.39 Com novo juiz, o caso continuou na pauta dos movimentos sociais,
da mídia e da sociedade civil que acompanharam o desenrolar do processo e
o julgamento.
O estudo sobre a disputa da opinião pública a respeito da chacina ain-
da deve ser feito. Porém, pode-se afirmar que a ampla cobertura midiática,
somada às mobilizações promovidas por diversas entidades e movimentos
sociais, foi fundamental para que, em menos de dois anos após o crime, ocor-
resse o julgamento. Até hoje o massacre da família Magave é rememorado
como um conflito emblemático na história das lutas do campesinato ama-
zônico, no âmbito das atividades da CPT no Amapá. A memória é evocada,
porém, não mais no sentido de cobrança de justiça, tal como fora no período
pós-chacina. Agora, mais de vinte anos após o acontecido, ganha uma cono-
tação de esperança: “o sangue converteu-se em fogo”, em outras palavras, o
crime se tornou bandeira de luta, luta para que não se repita e o campesinato
amapaense tenha seus meios de subsistência e vida respeitados.
A Fronteira nas páginas dos periódicos: a chegada da multinacional
Champion no Amapá e a CPT nadando contra o “Progresso”
(1995-1996)
Se nos anos 80 do século XX a Comissão Pastoral da Terra se viu
diante de uma árdua luta contra fazendeiros, seringalistas e outros sujeitos do
latifúndio na ilha paraense de Afuá, a partir de 1995 ela teve adversários ainda
mais poderosos dentro do estado do Amapá. Adversários, no plural, pois não
38 Sindicato dos trabalhadores rurais do Amapá (Sintra). Comunicado direcionado ao departamento nacional
dos trabalhadores rurais da CUT. Data: 28 de julho de 1994 (CTB. Arquivo AP14-16-10).
39 NOVO juiz apura chacina no Amapá. Folha de São Paulo, de 28 de novembro de 1994. Disponível
em: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/1994/11/28/cotidiano/6.html acesso em: 02/01/2018.
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apenas uma empresa multimilionária de capital internacional, que pretendia
se instalar nas terras amapaenses, pôs suas peças no tabuleiro. Outros agen-
tes estiveram em constante atuação, movimentando-se de formas variadas e,
por vezes, imprevisíveis dentro do jogo de xadrez que se tornou o estado do
Amapá, sobretudo a partir de agosto de 1995.
No centro do debate, balançava-se a opinião pública, ora bandeada
para um lado, ora para outro, disputada com afinco pelo governo estadual,
pela empresa e pelas entidades da sociedade civil amapaense. Neste contexto,
era a mídia local, por meio de periódicos semanais e diários, quem dava as
cartas e revelava o teor da disputa. Exatamente por isso optou-se, nesta parte
do texto, por se fazer uso mais assíduo das fontes jornalísticas, abundantes
no Centro de Documentação Dom Tomás Balduíno40, e que permitem não
apenas construir uma narrativa dos fatos, mas, sobretudo, compreender os
movimentos dos sujeitos presentes dentro deles.
Para entender a atuação da CPT nesse momento, é fundamental conhe-
cer as alianças construídas, sem as quais não haveria força política e institu-
cional suficiente para se posicionar no tabuleiro. É nesse sentido que surge o
Fórum das Entidades da Sociedade Civil Organizada do Estado do Amapá,
entidade criada em 1995 e que aglutinava movimentos populares, associações
de moradores e de categorias de trabalhadores, sindicatos, movimentos estu-
dantis e juvenis, centrais sindicais, partidos políticos, ONGs, pastorais sociais
e etc. A partir desse ponto do texto, quando nos referirmos ao Fórum esta-
remos também nos referindo a CPT, posto que era uma das entidades mais
atuantes dentro dele.
Por aglomerar grande número de entidades, o Fórum passou a ter des-
taque e voz dentro dos jornais amapaenses, além de ter participado assidu-
amente do debate em torno da instalação do Projeto Amapá, da empresa
norte-americana Champion Papers Inc., como veremos adiante.
É importante ressaltar que o Amapá sempre foi alvo de grandes proje-
tos econômicos. É o caso do projeto Icomi, instalado no Amapá na década
40 Mérito de Anna Maria Gallazzi, responsável pelo trabalho de recolher os relatos jornalísticos refe-
rentes aos temas que interessavam à CPT. Esse material era compartilhado com a CPT Nacional, que,
após digitalização, disponibilizou na internet, no Centro de Documentação Dom Tomás Balduíno.
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de 195041 e da Jari Celulose42, presente na região desde 1967. Em agosto de
1995, a Champion Papers Inc. chegava (oficialmente) ao estado por meio de
suas subsidiárias Chamflora Amapá Agroflorestal e Empreendimentos Mogi
Guaçu, com a intenção de iniciar um projeto milionário de monocultura de
eucalipto.
Porém, como bem descreveu um articulista do semanário Folha do
Amapá, “nem mesmo o mais profético assessor da Champion seria capaz
de prever o reboliço que a vinda da empresa poderia causar no Amapá”.43 A
multinacional não esperava ser recepcionada com tamanha resistência a sua
instalação. Antes mesmo de apresentar seu EIA/RIMA (Estudo de Impac-
to Ambiental/Relatório de Impacto Ambiental), suas discretas compras de
terras no interior do estado já haviam gerado suspeitas. No início de agosto
de 1995, a empresa tentou estabelecer o primeiro diálogo com a sociedade
amapaense ao convidar deputados, jornalistas, empresários e o Fórum das
Entidades da Sociedade Civil Organizada para uma viagem até Mogi Guaçu,
no interior de São Paulo, onde já havia instalado um projeto parecido com
o que pretendia instalar no Amapá. A intenção era mostrar aos amapaenses
os benefícios que o estado poderia obter a partir da aprovação da entrada da
empresa.
Na edição de 2 a 8 de agosto de 1995, o jornal Folha do Amapá anun-
ciava, no artigo “Fórum X Champion”44, o posicionamento do Fórum em
relação a empresa, que não sofreu alterações com o passar do tempo. O texto
do semanário informava que a entidade havia declinado de aceitar o convite
feito para conhecer as instalações da Champion em Mogi Guaçu. Ainda se-
gundo o artigo, a decisão foi comunicada por meio de carta escrita por San-
dro Gallazzi, coordenador da CPT/AP, na qual argumentava que a empresa
só mostraria aquilo que tinha interesse, porquanto os problemas ocasionados
41 Para saber mais, ver: PAZ, Adalberto. Os mineiros da floresta: modernização, sociabilidade e a forma-
ção do caboclo-operário no início da mineração industrial amazônica. Belém: Paka-Tatu, 2014.
42 Para saber mais, ver: SAUTCHUK, Jaime; CARVALHO, Horácio M. de; GUSMÃO, Sérgio Buar-
que. Projeto Jari: a invasão americana. 4 ed. São Paulo: Brasil Debates, 1979; e ARRUDA, Marcos. Daniel
Ludwig e a exploração da Amazônia. Encontros com a civilização brasileira. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 1979, p. 35-56.
43 UM BASTA à mediocridade. Folha do Amapá, de 16 a 22 de setembro de 1995 (CTB. Arquivo AP19-
21-68).
44 FÓRUM X Champion [coluna: Pauta Livre]. Folha do Amapá, de 02 a 08 de agosto de 1995 (CTB.
Arquivo AP19-21-22).
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pelo projeto seriam camuflados.
A atuação do Fórum passava também pela produção de estudos. As
correspondências evidenciam que muitos livros, cartilhas e documentários
eram solicitados pela CPT/AP às demais regionais no país. Um dos resul-
tados desses estudos apareceu no primeiro número do informativo A voz do
Fórum.45 Tratava-se da análise do EIA/RIMA apresentado pela Chamflora. O
texto afirmava que faltou uma postura isenta por parte da empresa respon-
sável pela produção do relatório, pois os documentos não possuíam impar-
cialidade, já que os dados apresentados eram os mesmos da empresa, ou seja,
“copiaram e colaram” o que interessava à Chamflora. Além disso, os impac-
tos do cultivo do eucalipto não eram apresentados de maneira consistente,
levando a crer que seriam mínimos. O Fórum deu parecer negativo ao EIA/
RIMA, solicitando que um novo fosse feito por outra empresa que usasse de
imparcialidade. O informativo ainda argumentava que faltavam informações
sobre a localização dos plantios, algo que preocupava a entidade, posto que o
cultivo do eucalipto consome muita água e, dependendo do local usado para
o seu cultivo, comunidades ribeirinhas, camponeses e ecossistemas poderiam
ser afetados de maneira permanente. O informativo acusava o governo do
estado, nomeando os órgãos governamentais responsáveis pela análise da via-
bilidade do projeto, de não se posicionar firmemente sobre o tema. Por fim,
fez-se um convite aos políticos e demais autoridades para uma visita à fábrica
de cavacos da Amcel46, na cidade de Santana. O convite que, de forma provo-
cativa, lembrava que Santana ficava mais perto do que Mogi Guaçu.
Os ataques ao projeto também ganharam força nos veículos de comu-
nicação. O jornal Amapá Estado, na edição de 26 de agosto de 1995, alerta-
va já no título do artigo: “Champion quer devastar o Amapá”. Nesse texto,
o articulista tecia severas críticas ao projeto da empresa, mas aproveitava a
oportunidade para atacar o governo do estado, como se pode observar no
trecho a seguir:
O estranho e inexplicável é a presença dos assessores do Go-
verno Fernando Allegretti e Elson Martins no Conselho exter-
45 EIA/RIMA da Champion apresenta falhas graves. A voz do fórum, n. 01, de abril de 1996 (CTB.
Arquivos AP-19-21-1 a AP-19-21-4).
46 Empresa Amapá Celulose, pertencente ao grupo Caemi (mesmo grupo detentor da Icomi). Se
instalou no Amapá no final da década de 1970, atuando na monocultura de pinus para a produção de
celulose.
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no da empresa. Os Allegretti, cansados de ver o sofrimento dos
homens da floresta nas regiões do Acre, Rondônia, Roraima e
Centro Oeste, dirigem sua insaciável fome de lucros e poder
para o Amapá. Os intermediários da Champion, incluindo o
assessor Fernando Allegretti, amedrontam e ameaçam os do-
nos das terras, para se desfazerem delas a preço de banana, sob
pena de amargarem o mesmo fim da família Magave.47
47 CHAMPION quer devastar o Amapá. Amapá Estado, de 26 de agosto de 1995 (CTB. Arquivo
AP19-21-90).
48 NEVES, Ruy Guarany. Como ficaremos? Jornal do Dia, de 02 de setembro de 1995 (CTB. Arquivo
AP19-21-86).
49 NEVES, Ruy Guarany. Ninguém come cavaco. Jornal do Dia, de 12 de setembro de 1995 (CTB.
Arquivo AP19-21-72).
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ganhava as páginas do Jornal do Dia, na edição de 29 de setembro de 1995. No
texto, Ruy Guarany asseverava que a Champion estava “[...] colocando em
prática a chamada grilagem branca, que nada mais é do que comprar terras
na região, inclusive induzindo pequenos proprietários a abrirem mão de suas
propriedades, mediante o pagamento de indenização que está muito abaixo
do mercado”.50 Essas denúncias desencadearam uma repercussão extrema-
mente negativa ao Projeto Amapá.
Voltemos ao mês de agosto, quando este projeto ainda não era tão
debatido nos jornais amapaenses. Nesse período, foram elaborados dois do-
cumentos que apresentavam denúncias de atividades irregulares na compra
de terras pela Champion. Tratam-se de dois abaixo-assinados produzidos por
camponeses de duas comunidades agrícolas do município de Amapá: Piquiá
e Cruzeiro.51 Os documentos datam do dia 10 de agosto de 1995 e contam
com as assinaturas de vários agricultores residentes nas comunidades citadas.
Foi solicitado, por meio dos documentos, que o Instituto de Terras do
Amapá (Terrap) averiguasse possíveis irregularidades cometidas pela empre-
sa, que estava oferecendo quantias irrisórias aos moradores em troca das ter-
ras em que viviam havia décadas. Outra preocupação levantada tinha relação
com a encampação, posto que as terras ao redor das comunidades estavam
sendo compradas, impossibilitando o acesso a rios e matagais onde exerciam
pesca, caça e extrativismo, atividades que praticavam havia também muitos
anos e estavam intimamente ligadas aos seus cotidianos e culturas.
A empresa, como se viu, recebeu uma enxurrada de críticas, advindas
de vários lados. No dia 27 de setembro de 1995, o Fórum das Entidades da
Sociedade Civil Organizada do Estado do Amapá realizou o debate “Flores-
tamento e Desenvolvimento Sustentável”, no qual participaram diversas en-
tidades, membros do governo e camponeses. Advém desse evento o pronun-
ciamento do governador João Alberto Capiberibe em que asseverava: “Este
tipo de acusações [de que havia incentivado a vinda da Champion para o
Amapá] considero inaceitável, que me associem a um empreendimento deste
50 NEVES, Ruy Guarany. Grilagem branca. Jornal do Dia, de 29 de setembro de 1995 (CTB. Arquivo
AP19-21-86).
51 São eles: Abaixo-assinado direcionado ao Instituto de terras do Amapá feito pelos agricultores da Comunidade de
Piquiá, de 10 de agosto de 1995 (CTB. Arquivo AP19-21-108); e Abaixo-assinado direcionado ao Instituto
de terras do Amapá feito pelos agricultores da Comunidade Agrícola do Cruzeiro, de 10 de agosto de 1995 (CTB.
Arquivos AP19-21-106 a AP19-21-107).
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tipo”.52Ainda segundo o governador, o papel do Estado, ali representado por
ele, seria de fiscalizar e exigir o cumprimento da legislação vigente por parte
da Champion, em outras palavras, não poderia de modo algum impedir sua
instalação desde que cumprisse o que era exigido pelas leis.53
Entretanto, o que de fato se destaca no seio do debate ocorrido dentro
do evento é o depoimento de um camponês chamado Raimundo Nonato
Pontes da Silva, no qual se revelam algumas das estratégias utilizadas pela
Champion na compra de terras no estado. Segue a transcrição de alguns tre-
chos do depoimento:
Eles disseram que nossos vizinhos todos já tinham vendido; to-
dos os nossos vizinhos estavam negociados e citaram o nome
do senhor ex-prefeito Belisio Dias Ramos, citaram o nome do
nosso vizinho lateral que é Oscar Costa e outros e outros vizi-
nhos, outras pessoas que eu conheço desde criança, porque ali
nasci, ali vivi. [...]. Outro disse ‘eu não vendi’, todas as pessoas
que nós procuramos disseram que não tinham vendido. Come-
çou a mentira. Eles não apresentaram documento provando
que a terra era deles, nenhum documento, nem mesmo pro-
vando que ele era funcionário da empresa, ele apenas disse.54
52 Pronunciamento do sr. Governador do Estado do Amapá, João Alberto Capiberibe, proferido du-
rante o debate “Florestamento e Desenvolvimento Sustentável” promovido pelo Fórum das Entidades
da Sociedade Civil Organizada do Estado do Amapá, no dia 27 de setembro de 1995 (CTB. Arquivo
AP19-21-49).
53 No livro Amapá, um norte para o Brasil, de 2000, Capiberibe afirma que o projeto da Chamflora foi
viável a partir do momento em que a empresa aceitou se adequar ao plano de desenvolvimento susten-
tável do governo. (MARTINS, Elson; MOULIN, Nilson. Amapá, um norte para o Brasil: diálogo com o
governador João Alberto Capiberibe. São Paulo: Cortez, 2000).
54 Depoimento do sr. Raimundo Nonato Pontes da Silva, conhecido como Magave, agricultor e
agente de saúde da localidade Breu município de Amapá, gravado durante o debate “Florestamento e
Desenvolvimento Sustentável”, promovido pelo Fórum das Entidades da Sociedade Civil do Estado
do Amapá, no dia 27 de setembro de 1995 (CTB. Arquivos AP19-21-46 a AP19-21-48).
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esteve no centro do debate em torno da implantação do projeto. Ferrenho
em suas críticas, não tardou a ser tratado como réu por aqueles que pro-
curavam defender a Champion e os planos do Projeto Amapá. A título de
exemplo, temos o artigo “Manequim inadequado”55 do semanário Folha do
Amapá, assinado por Marco Antônio Gonçalves e datado da semana de 9 a 15
de setembro de 1995. Neste texto, Gonçalves questionava, desde o subtítulo
(“Fórum contra a Champion auto intitula-se ‘da sociedade civil’, mas tem for-
te presença governamental”), a credibilidade do Fórum e das entidades que o
compunham por estarem ligadas a órgãos do governo federal.
A crítica foi respondida na semana seguinte, em texto escrito pelo pró-
prio Fórum e intitulado “O reverso da medalha”.56 Pode-se, então, perceber
que a Folha do Amapá apresentava não apenas artigos favoráveis – de quem
sustentava o jornal – ao projeto da Champion; mas também as réplicas feitas
pelo Fórum. Por outro lado, o espaço cedido para a resposta no jornal deve
ser confrontado com o restante do conjunto de textos e imagens daquele nú-
mero da semana de 16 a 22 de setembro de 1995. Havia aí outro artigo, cujo
título era “Um basta na mediocridade”57, em que se faziam novas acusações
ao Fórum, qualificando as entidades que o compunham como medíocres e
incapazes de elaborar consistente argumentação para se oporem ao projeto
da Champion, apelando, por isso, para uma abordagem raivosa e emocional.
Data também dessa mesma edição a seguinte imagem: