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RESUMO
1
Departamento de Pedagogia, Universidade Estadual de Ponta Grossa, Ponta Grossa, PR, Brasil.
ABSTRACT
In the context of the development of university pedagogical practice, one of the concerns
of teachers refers to the methodological referral of teaching and learning processes. This
paper proposes to discuss the possibilities and limits of pedagogical practice when guided by
the perspective of the transmission of knowledge, through lectures, as opposed to teaching
proposals through active methodologies. The methodology adopted for the development
of the present study is bibliographical, based on the reading and analysis of works related
to the proposed theme. In the search for support in the researches of Nóvoa and Amante
(2015), Mainardes (2008), Heacox (2006), Pozo (2002) and Roldão (2007) among others, the
text problematizes the didactic dimension of university teaching in order to re-significate
and approach teaching to learning. The study developed also showed some possibilities of
methodological referral in the university classroom, in planned didactic situations in which the
students’ active perspective on their learning is privileged.
INTRODUÇÃO
Como nos bons filmes, uma boa instrução é aquela em que não só há
boas réplicas, um diálogo eficaz, mas uma mudança sutil e progressiva
nos personagens, que vão se enchendo de nuances à medida que se
desenvolve a trama, de forma que no final o durão do começo nos
sai um romântico incorrigível, o bondoso fazendeiro um personagem
inquietante com um passado turvo, e o espião na realidade é um
espião duplo, que acaba sendo dos bons, ou seja, dos nossos. Também
a aprendizagem e a instrução requerem uma transição, uma mudança
de papéis, não menos importante por ser menos emocionante. A
entrega progressiva da responsabilidade da aprendizagem para os
aprendizes simboliza, de alguma forma, a transição para essa nova
cultura da aprendizagem (POZO, 2002, p. 264).
No filme Vem dançar, o dançarino profissional Pierre Dulaine (interpretado por Antonio
Banderas) torna-se voluntário para dar aulas de dança em uma escola pública de Nova York.
Diante da resistência de seus alunos no que respeita aos métodos clássicos, Pierre propõe
um novo estilo de dança, a fim de envolver os alunos na proposta de ensino e aprendizagem.
Uma das cenas do filme, em que os atores interpretam o tango, motivou-nos a introduzir
e problematizar o tema que aqui nos propomos a desenvolver: “[...] o tango é uma coisa
para dois. Se os mestres se movem para um lado e os aprendizes para outro será difícil que a
aprendizagem seja eficaz” (POZO, 2002, p. 264). De fato, pontua o autor, ensinar e aprender
são dois verbos que nem sempre são conjugados concomitantemente. A prática pedagógica
universitária aproxima-se, desse modo, das coreografias no mundo da dança: nós, os docentes,
organizamos as metodologias de ensino (coreografias) que, ao serem colocadas em cena,
orientam os processos de aprendizagem dos estudantes (ZABALZA, 2006).
A temática privilegiada neste trabalho articula-se, numa dimensão mais ampla, ao contexto da
formação pedagógica para e na docência do ensino superior. Não raras vezes, as universidades
têm promovido congressos sobre a temática das metodologias ativas, a fim de possibilitar o
envolvimento dos professores na organização e gestão da prática pedagógica universitária.
Porém, em que pese o fato da relevância das iniciativas voltadas para o desenvolvimento
dos saberes pedagógicos, há que se considerar que os professores universitários carecem de
formação pedagógica no que respeita aos fundamentos da docência: filosofia da educação,
psicologia da educação, teorias do conhecimento, políticas e gestão educacional, e,
indiscutivelmente, numa dimensão mais específica sobre o ensino, o suporte do campo da
formação didática para a docência universitária.
Por ser complexa, múltiplos saberes constituem a prática pedagógica universitária. Não
somente os saberes do campo disciplinar, mas, sobremaneira, os saberes pedagógicos que,
articulados com os saberes da experiência profissional, aproximam-se dessa construção da
docência.
Os estudos desenvolvidos por Franco (2012, p. 156) apontam que uma prática pedagógica é
constituída por um conjunto complexo e multifatorial. Ou seja, há ingredientes estruturantes
das práticas pedagógicas, tais como as decisões dos professores, os princípios, as ideologias
e também as estratégias didáticas que o professor pretende desenvolver no contexto da
aula. Dito de outra maneira, a prática pedagógica de um professor interpenetra na cultura
da instituição em que ele atua como docente, ao mesmo tempo que expressa o contexto
cultural do professor. Desse modo, pensar em alguma opção metodológica extrapola o viés
das escolhas didáticas, pois as decisões do “como ensinar” sempre estão articuladas com as
decisões do “por que” e do “para que” ensinar (VEIGA, 1994).
Neste contexto, o professor universitário, ao fazer uma opção metodológica, precisa ter
presente que há distintas concepções de conhecimento que estão articuladas e presentes no
desenvolvimento da prática pedagógica no ensino de graduação.
Segundo Roldão (2003, p. 44), o conceito de ensinar está relacionado a uma intencionalidade
de uma ação específica “[...] no sentido de produzir, promover, possibilitar a aprendizagem de
alguma coisa a alguém”.
Gauthier (1998, p. 371) diz que o ensino é um trabalho interativo, pois apresenta a “[...]
particularidade de agir diretamente sobre o elemento humano; seu produto [a aprendizagem]
assumirá a forma de uma mudança no usuário [discente]”. Além disso, o ensino pressupõe
a perpetuação do conhecimento aos estudantes, no entanto, ele não deve ocorrer de modo
exclusivamente transmissivo, pois o significado de ensinar decorre “[...] através dos elementos
envolvidos em tal prática: o aluno, o conhecimento, o professor e as situações didáticas”
(NADAL; PAPI, 2007, p. 22).
Mas qual seria o papel do ensino como transmissão/exposição dos conteúdos na aula
universitária? Quais as possibilidades ou limites dessa transmissão mesmo quando o professor
opta pela via das metodologias ativas? Ou ainda, como pensar nos diferentes momentos da
aula com o propósito de ensinar por meio das metodologias ativas?
A organização do espaço na aula expositiva tem como ponto central o quadro, “favorecendo
dinâmicas de comunicação vertical entre o professor e os alunos. A homogeneização do
espaço-tempo é um traço importante de uma pedagogia universitária que, ainda hoje,
continua marcada pelos espaços físicos e pelo tempo dos horários e calendários” (NÓVOA;
AMANTE, 2015, p. 24).
Tal entendimento também é discutido com propriedade por Roldão (2007, p. 95),
Segundo Imbernón (2012), o problema não está na aula expositiva, mas em como ela
se apresenta na prática, como se realiza a transmissão do conhecimento, ou seja, como a
aula expositiva se transforma em uma aula transmissora de comunicação unidirecional e
entediante. De acordo com Moran (2015), para qualquer pessoa a aprendizagem é maior
quando há prática e reflexão do que apenas a explicação, pois os conceitos mais simples,
conteúdos básicos, ela consegue estudar de acordo com o seu ritmo, mas as atividades em
grupo para o aprofundamento permitem “ir além” do estudo individual.
Para o autor, quando curtas e bem planejadas, as aulas expositivas podem ser úteis desde que
ocorram de forma dialogada, ou seja, considerando os questionamentos, contribuições e a
participação dos acadêmicos. Além disso, destaca que, atualmente, elas possuem mais sentido
ao iniciar (motivação, cenários, perspectivas) ou concluir (retomada, síntese, resultados)
um novo conhecimento e, ao longo do processo de ensino-aprendizagem, o professor deve
orientar e mediar as atividades (individuais e coletivas), a fim de motivar os alunos a encontrar
caminhos próprios de aquisição do conhecimento, por meio de um processo didático que
mobilize a pesquisa e a avaliação, com uma formação humana e crítica, para além do ensino
e aprendizagem.
com a proposta didática. São organizadas atividades e trabalhos em grupos (duplas, trios,
etc.), o que torna a aprendizagem mais colaborativa, além de contribuir para o exercício da
tolerância.
Para Anastasiou e Alves (2006), a opção pelo uso da metodologia ativa pressupõe que o
método de aquisição dos saberes curriculares se fará pela ação do estudante sobre o objeto
de aprendizagem, possibilitando-lhe enfrentá-lo, inicialmente no nível de compreensão em
que este aprendiz se encontra, sempre mediado pela ação docente. E que essa ação seja
cercada do processo reflexivo. Segundo as autoras, um pressuposto na metodologia ativa é
que o conhecimento supera a simples informação, possibilitando que seu processamento seja
significativo e inteligente.
Para tanto, o uso de estratégias diversas é essencial, pois estas possibilitam a exercitação
de várias operações de pensamento, desde as menos complexas até as mais complexas,
como o trabalho com teorias e dados na solução de problemas. É importante destacar que
as estratégias não são recursos mágicos, mas ferramentas de trabalho docente e discente
para consecução de objetivos propostos na proposta curricular, através da articulação entre
as áreas de conhecimento que compõem o curso, processo no qual a relação teoria-prática se
torna chave (ANASTASIOU; ALVES, 2006).
As metodologias ativas podem ser desenvolvidas por meio de múltiplas opções (estratégias),
tais como: debates, aulas expositivas dialogadas, painel integrado, aprendizagem entre pares,
sala de aula invertida, seminários, júri simulado, estudos de caso, grupo de verbalização e de
observação (GVGO), aprendizagem baseada em problemas (PBL), projetos ou casos (GIL, 2015;
ANASTASIOU; ALVES, 2006).
Ou seja, não somente os discentes devem tornar-se sujeitos ativos, mas o docente deve
priorizar uma atitude ativa de mediação e orientação do processo de ensino-aprendizagem,
com um planejamento didático das práticas que serão desenvolvidas no decorrer das aulas.
(continua)
Segundo Farias, Martin e Cristo (2015), as metodologias de ensino ativas possuem algumas
características, como: têm como propósito a aprendizagem significativa, favorecem o trabalho
em grupo e a interdisciplinaridade, permitem a contextualização/aplicação do conhecimento
na realidade do discente, fortalecem a reflexão e a atitude crítica e investigativa, além de
motivar e desafiar o estudante na busca por “soluções” ou novas perspectivas para o
conhecimento/conteúdo em questão.
No que respeita à diversificação do trabalho na aula universitária, talvez o desafio seria pensar
na perspectiva da diferenciação do ensino, tal como já se desenvolve em muitas escolas, na
proposição do trabalho diversificado com os alunos. O que poderíamos aprender a partir
da experiência dos professores que ensinam crianças e jovens nas escolas? Vejamos. Se
diferenciar o ensino significa “alterar o ritmo, o nível ou o gênero da instrução que o professor
pratica” (HEACOX, 2006, p. 10), isto implica em responder especificamente ao progresso dos
alunos, rompendo com a clássica simultaneidade do ensino: ou seja, todos fazendo a mesma
coisa ao mesmo tempo, como nos primórdios da escola tradicional.
De acordo com as dificuldades e potencialidades de cada grupo de estudantes, pode ser definido
o ponto de partida para o estabelecimento das atividades diferenciadas (MAINARDES, 2008).
Segundo o autor, existem diversas possibilidades de organização de atividades diferenciadas:
“A escolha do tipo de diferenciação a ser empregada depende da habilidade do professor
para avaliar a classe (de modo diagnóstico), de planejar situações de ensino diferenciadas e
de manejar tarefas diferenciadas dentro de uma mesma classe” (MAINARDES, 2008, p. 131).
Outro aspecto a considerar no tocante às metodologias ativas diz respeito ao fato de que o
trabalho diferenciado não deve promover o isolamento ou distinção de grupos (mais fortes/
fracos, adiantados/atrasados) na classe, mas visar a contribuir, segundo Mainardes (2008,
p. 132), com a “[...] criação de classes mais igualitárias onde todos os alunos tenham a
oportunidade de aprender [...]. A diferenciação das tarefas [pressupõe que] [...] a mediação
do professor e a interação com colegas mais capazes são essenciais para que a aprendizagem
aconteça”.
Para Masetto (2003), a aula deve ser compreendida como um espaço de (con)vivência,
ou seja, um momento para aprender com o professor e com os colegas e consolidar uma
integração contextualizada à realidade, isto é, um ambiente de aprendizagem colaborativa e
de construção do conhecimento. Segundo Libâneo (2013, p. 196),
Uma aula pode ser subdividida em três momentos: introdução, desenvolvimento e conclusão,
ou iniciação, aprofundamento e síntese integradora (GIL, 2015; FARIAS et al., 2009). Na
introdução de uma aula, o professor tem como propósito mobilizar os alunos para o trabalho com
o conhecimento, os quais precisam ser desafiados, sensibilizados (GASPARIN, 2002). O professor
os ouve, para então “mapear” a bagagem que possuem sobre o tema proposto, e contextualiza o
trabalho, apresenta os objetivos, comunica-os sobre o que se espera deles (levantamento da prática
social inicial). Elencamos, a seguir, alguns encaminhamentos para iniciar uma aula, oportunizando
o desenvolvimento da aprendizagem ativa dos estudantes universitários:
c. Breve leitura de uma citação de um autor (em duplas sorteadas) para posterior
verbalização à turma, visando à problematização do conteúdo a ser trabalhado.
e. A aula iniciará com o “aluno memória” (responsável por verbalizar como foi
o desenvolvimento da aula anterior). Em seguida, será feita a retomada dos
conteúdos da aula anterior, por meio de perguntas planejadas previamente,
com participação dos alunos para resgate dos principais aspectos discutidos. As
perguntas serão sorteadas de modo criativo entre os alunos.
d. Os alunos irão acessar o grupo fechado da disciplina em uma rede social para
visualização das notícias postadas, visando à compreensão do conteúdo, em
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Segundo Saint-Onge (2007, p. 181), “aprender é sempre superar uma dificuldade: chegar a
pensar diferente, conseguir proceder de outro modo, obter melhores desempenhos. Ensinar
é sempre fornecer os conhecimentos que servem para transpor essa dificuldade.” Voltando à
analogia inicialmente apresentada pela via do tango: sejamos “bons condutores” (professores)
da dança, auxiliemos àqueles que aprendem a dançar novas músicas, com novos ritmos, tendo
como norte os objetivos para suas aprendizagens. Talvez assim os estudantes universitários
possam constituir-se como futuros profissionais, ao terem compreendido o “contexto da
dança” e conhecerem os saberes teóricos, mas com perspectivas críticas, inovadoras e
criativas, “para dançar conforme a música”. Sem isso, poderiam ser tão somente profissionais
conhecedores da teoria, ou seja, sem terem praticado a dança, não demonstrando saber
articular aquilo que aprenderam um dia juntamente com aquele que os conduziu.
A partir disso, podemos inferir, de modo provisório, que as metodologias ativas não são as
únicas ferramentas para a prática pedagógica na docência universitária, mas podem contribuir
para a formação de futuros profissionais que serão sujeitos reflexivos, críticos e criativos.
Por fim, segundo Raths et al. (1977, p. 374), “é fácil pensar pelos alunos. É muito mais
difícil dar-lhes oportunidades para que pensem sozinhos. No entanto, se a acentuação do
pensamento é um dos nossos objetivos, nós, como professores, devemos nos dedicar à criação
de oportunidades para que os alunos pensem.”
Tomando como referência a reflexão que aqui se desenvolveu, poderíamos afirmar que
aproximar o processo de ensinar do processo de aprender, como se anunciou no título,
requer, de certo modo, que possamos ser, como docentes, aprendizes permanentes da nossa
profissão.
REFERÊNCIAS
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