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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE FEIRA DE SANTANA

DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E FILOSOFIA


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PLANEJAMENTO TERRITORIAL - PLANTERR
MESTRADO PROFISSIONAL

SILVANA MACIEL PIRES

A ATUAÇÃO DA ASSOCIAÇÃO DE MULHERES TRABALHADORAS RURAIS NO


CONTEXTO DAS POLÍTICAS DE SEGURANÇA ALIMENTAR E A
CONSTITUIÇÃO DE NOVAS TERRITORIALIDADES EM SANTALUZ - BAHIA

Orientador: Prof. Dr. Onildo Araujo da Silva

Feira de Santana/BA
2016
SILVANA MACIEL PIRES

A ATUAÇÃO DA ASSOCIAÇÃO DE MULHERES TRABALHADORAS RURAIS NO


CONTEXTO DAS POLÍTICAS DE SEGURANÇA ALIMENTAR E A
CONSTITUIÇÃO DE NOVAS TERRITORIALIDADES EM SANTALUZ - BAHIA

Trabalho de conclusão de curso (Dissertação) apresentado


ao Programa de Pós-Graduação em Planejamento Territorial
(Mestrado Profissional) do Departamento de Ciências
Humanas e Filosofia da Universidade Estadual de Feira de
Santana, como requisito para obtenção do Título de Mestre
em Planejamento Territorial.

Orientador: Prof. Dr. Onildo Araujo da Silva

Feira de Santana/BA
2016
AGRADECIMENTO

Às mulheres da AMMTRAFAS, que pelo trabalho desempenhado despertaram a minha


curiosidade e deram sentido a esta pesquisa. Sou bastante grata pela atenção, disponibilidade,
acolhida, conversas, pousada e tudo mais que fizeram por mim durante a pesquisa. Tenho
enorme admiração e respeito por todas vocês e pelo trabalho lindo que desenvolvem nas suas
comunidades. Sintam-se representadas nas pessoas de Valmira, Leane, Joseane, Luciana,
Dulce, Juliana, D. Elzita, D. Nenem, Luciene, Paizinha, D. Marizete, Netinha, Patrícia, D.
Jailda, Neiriam, Evani, D. Abelina, Comadre Laurinda, Edilene e Lúcia. Estando com vocês
“aprendi que se depende sempre de tanta, muita, diferente gente/ Toda pessoa sempre é as
marcas das lições diárias de outras tantas pessoas/ E é tão bonito quando a gente entende que a
gente é tanta gente onde quer que a gente vá [...]” (Caminhos do Coração/Gonzaquinha)

Minha família, tão GRANDE! Minha gratidão é do tamanho de todos vocês. Carrego
emocionada toda confiança e responsabilidade que vocês me atribuem para tudo que faço.
Matheus, meu lindo, significou muito a sua colaboração na leitura desse trabalho, valeu
mesmo. Obrigado a todas (os) pelas correntes de orações e boas energias em prol dessa
conquista, em especial, minhas avós Matilde e Isabel, mainha Ivete (obrigada pelas orações) e
minhas irmãs Cíntia e Patrícia pelo carinho.

Ao meu Bem Luciano, que acompanhou o dia a dia dessa construção, obrigado pela presença e
por somar sempre suas impressões às minhas. Seu olhar melhora o meu todos os dias, isso é um
fato.

À minha querida amiga Aracele que se disponibilizou para construção dos mapas na fase de
qualificação e à Irialine (Pernalonga), que com sua bondade e atenção contribuiu para
construção dos mapas finais deste trabalho. Amigas, desejo de coração que a luz de cada uma
brilhe incessantemente em todas as direções. Foi muito significativo a contribuição de vocês.

À família Sementes do Sertão porque como diz letra da música “Família que se escolhe são os
amigos que tu tem, tu carrega um pouco deles e eles levam um pouco de tu também [...]”.
Agradeço o imenso carinho, a compreensão pelas muitas vezes que faltei aos nossos encontros
e a torcida de todas e todos. Obrigado por tornarem o nosso grupo um espaço acolhedor,
iluminado e, portanto, muito prazeroso de se estar.

Aos mestres da vida, pelas vivências experimentadas nas instituições de ensino que passei e
fora delas também. A todos os professores do Programa em planejamento Territorial –
Mestrado Profissional da Universidade Estadual de Feira de Santana (PLANTERR-UEFS),
pela responsabilidade, partilha de conhecimento, disponibilidade e pelo amor dedicado ao
trabalho de vocês. Parabenizo desde já a profª Jocimara Lobão (primeira coordenadora do
programa), pelo esforço em organizar e administrar o curso na perspectiva de formar
profissionais qualificados no campo do planejamento, da gestão territorial e visando tornar o
programa referência no estado e no Brasil.

Aos colegas do mestrado pela companhia e alegrias compartilhadas nesta caminhada, em


especial, àquelas que se fizeram mais presentes - Gracione, Joelia, Eliane, Nilza e Roberta, pelo
convívio, pelas parcerias de estudos, debates e trabalhos em grupo, por compartilharem
momentos de felicitações e angustias, enfim: pela amizade verdadeira.
Às colegas do grupo de pesquisa em Geografia e Movimentos Sociais: Érica, Tamires,
Valdinéia, Sara, Fabrício e André, muito obrigado a todos (as) pela companhia, pelos
momentos de conversa e distração que também me proporcionaram conhecimento.

À Vandalva do Movimento de Organização Comunitária (MOC), por me permitir estar


próxima e aprender um pouco com você, da vida e da dinâmica das mulheres do sertão baiano.
Obrigada pela disposição em contribuir com minha pesquisa e por socializar um pouco de suas
impressões nos poucos momentos que estivemos juntas. Agradeço pelos materiais que me
cedeu para leitura, você é uma mulher de luz. Parabéns pelo trabalho que desenvolve com as
organizações no Território do Sisal, através do MOC.

À professora Acácia (tão atenciosa), pela generosidade e disposição em participar da avaliação


do meu trabalho. Tenho grande estima e enorme admiração pela profissional e pessoa que a
senhora é, parabéns! Obrigada pelos ensinamentos, as observações precisas, as indicações de
leituras e a partilha de algumas ideias que me proporcionaram ampliar os horizontes de
aprendizagem e apropriação do meu tema de pesquisa.

Ao professor Renato Léda pela disponibilidade e colaboração, especificamente, pela leitura


cuidadosa e pelas exposições de argumentos que se somam a esse trabalho para melhor
qualificá-lo.

Agradeço ao professor Onildo pela confiança, observações, críticas, sugestões e,


principalmente, por favorecer a minha autonomia nesse trabalho.

A todas (os) as (os) funcionárias (os) da administração, limpeza e segurança que zelam
humildemente pela nossa instituição de ensino na pessoa de dona Antônia (serviços gerais),
Jakson (estagiário) e Weliza/Kênia (secretária), pela contribuição e importância dos serviços
prestados a nós - mantendo os espaços limpos e disponibilizando as informações e orientações
necessárias. Significa muito o trabalho, a simpatia e a receptividade de todas (os). Desejo
sempre muito sucesso a todas (os).

À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia (FAPESB) que me concedeu apoio


financeiro para realização da pesquisa.
Cada pessoa tem uma história que é só sua, mas que é tecida por muitos
em cada época da vida, como uma colcha de retalhos feita por muitas
mãos. Quando se vê, já não dá mais pra ser sozinho nessa travessia. Aos
poucos, a gente descobre que sonho, por mais belo que seja, só tem
sentido se for sonhado junto. Que caminhar sozinho é percorrer o
anonimato na solidão de si, com riscos de não chegar a nenhum lugar
distante. Sonhos se alimentam de partilhas, de abraços, de presença
doada. Sonhos se reinventam e se plenificam em cada reencontro.

Francisco Galvão
LISTA DE FIGURAS

Figura 1: Caracterização dos procedimentos metodológicos......................................................30

Figura 2: Produtos da agricultura familiar comercializados pela COOBENCOL em Santaluz/


Bahia/Brasil (2015).....................................................................................................................47

Figura 3: Logomarca da loja da AMMTRAFAS – Santaluz/Bahia/Brasil (2015)......................48

Figura 4: Artigos em artesanato comercializados na loja Maria Bunita da AMMTRAFAS –


Santaluz/Bahia/Brasil (2015).......................................................................................................49

Figura 5: Fluxograma organizacional da diretoria da


AMMTRAFAS/2015...................................................................................................................50

Figura 6: Distribuição de renda segundo sexo e cor no Brasil - IPEA 2011...............................63

Figura 7: Passo a passo do processo de aquisição de produtos da agricultura familiar para o


PNAE, realizado pelo governo no Brasil (2015).........................................................................94

Figura 8: Gêneros alimentícios produzidos pelas mulheres da AMMTRAFAS para o PAA em


Santaluz/Bahia/Brasil (2015).....................................................................................................104

Figura 9: Produção de beiju – Grupo Mulheres Artesãs de Mocambinho –


Santaluz/Bahia/Brasil – 2015....................................................................................................113

Figura 10: Produção de beiju – Grupo Mulheres de Fibra – Santaluz/Bahia/Brasil -


2015...........................................................................................................................................114

Figura 11 – Informativo do MOC sobre experiências dos grupos de mulheres de


Santaluz/Bahia/Brasil................................................................................................................129

Figura 12: Curso de Panetone para mulheres do Território do Sisal – Realização COOPEREDE
Feira de Santana - novembro de 2015.......................................................................................130

Figura 13: Sedes próprias dos grupos de mulheres da AMMTRAFAS – Santaluz/Bahia/Brasil


(2015)........................................................................................................................................132

Figura 14: Espaços onde atuam os grupos da AMMTRAFAS que não têm sedes próprias –
Santaluz/Bahia/Brasil (2015).....................................................................................................133
LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1: Motivações que orientaram a participação das mulheres na AMMTRAFAS –


Santaluz (2015)............................................................................................................................43

LISTA DE MAPAS

Mapa 1: Localização do município de Santaluz no semiárido da Bahia – Região nordeste do


Brasil .........................................................................................................................................18

Mapa 2: Municípios do Território de Identidade do Sisal na


Bahia...........................................................................................................................................20

Mapa 3: Povoados onde existem grupos de mulheres da AMMTRAFAS que participaram do


PAA em Santaluz – Bahia (2015)............................................................................................100

Mapa 4: Povoados onde existem grupos de mulheres da AMMTRAFAS que participaram do


PNAE em Santaluz – Bahia
(2015).......................................................................................................................................111

LISTA DE QUADROS

Quadro 1: Documentos utilizados para análise dos programas PAA e PNAE – Brasil
(2015)..........................................................................................................................................31

Quadro 2: PAA: modalidades de execução, legislação e objetivos.............................................85

Quadro 3: Caracterização do PAA e limites em reais (R$) para acesso por unidade familiar –
Brasil...................................................................................................................................86

Quadro 4: Caracterização do PAA e limites em reais (R$) para acesso por organização
fornecedora – Brasil...........................................................................................................87

Quadro 5: Repasse em reais (R$) do PNAE para as escolas no Brasil (2015)...................92

Quadro 6: Concepções das trabalhadoras rurais da AMMTRAFAS sobre o que precisa


melhorar na execução do PNAE – Santaluz/Bahia/Brasil (2015) ........................................121
LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Percentual de questionários aplicados por grupos de mulheres da AMMTRAFAS


durante o trabalho de campo – Santaluz/Bahia/Brasil (2015).....................................................33

Tabela 2: Número de Agricultores e agricultoras participantes do PAA por sexo na Bahia/Brasil


– 2014..........................................................................................................................................97

Tabela 3: Caracterização dos grupos de mulheres associadas à AMMTRAFAS que atendem ao


PAA em Santaluz na Bahia (2015)..............................................................................................99

Tabela 4: Repasse em reais (R$) para o PAA pelo Ministério do Desenvolvimento Social e
Combate à Fome (MDS) – Santaluz/Bahia/Brasil
(2015)........................................................................................................................................106

Tabela 5: Caracterização dos grupos de mulheres associadas à AMMTRAFAS que atenderam


ao PNAE em Santaluz na Bahia (2015)....................................................................................110

Tabela 6: Valor (R$) recebido pelas mulheres dos grupos de produção da AMMTRAFAS que
comercializaram alimentos para o PNAE em Santaluz (2015).................................................115

Tabela 7: Valores (R$) investidos na aquisição de gêneros alimentícios diretamente da


agricultura familiar para o PNAE nos anos de 2012, 2013 e 2014 Santaluz/Bahia/Brasil.......119

Tabela 13: Relação dos estudantes atendidos pelo Programa Nacional de Alimentação Escolar
(PNAE) matriculados na rede pública de Santaluz e valores em R$ por modalidade de ensino
no ano de 2015 – Santaluz/Bahia/Brasil....................................................................................120
LISTA DE SIGLAS

AMMTRAFAS: Associação do Movimento de Mulheres Trabalhadoras Rurais da Agricultura


Familiar de Santaluz

ARCO SERTÃO: Agência Regional de Comercialização

ASCOOB: Associação das Cooperativas de Apoio a Economia Familiar

BNDES: Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social

CEAIC: Centro de Apoio aos Interesses Comunitários

CAE: Conselho de Alimentação Escolar

CODES SISAL: Conselho Regional de Desenvolvimento Rural Sustentável da Região Sisaleira


do Estado da Bahia

CONAB: Companhia Nacional de Abastecimento

CNDM: Conselho Nacional dos Direitos da Mulher

CONSEA: Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional

COOBENCOL: Cooperativa de Beneficiamento e Comercialização

COOPEREDE: Cooperativa Rede de Produtoras da Bahia

DAP: Declaração de Aptidão ao Pronaf

EJA: Educação de Jovens e Adultos

FAO: Organização das Nações Unidas

FNDE: Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação

GGPAA: Grupo Gestor do Programa de Aquisição de Alimentos

IBGE: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

INAN: Instituto Nacional de Alimentação e Nutrição

IPEA: Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas

LOSAN: Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional

MAPA: Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento

MDA: Ministério do Desenvolvimento Agrário


MDS: Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome

MEC: Ministério da Educação e Cultura

MESA: Ministério Extraordinário de Segurança Alimentar e Combate à Fome

MFPA: Movimento Feminista Pela Anistia

MMTR-NE: Movimento de Mulheres Trabalhadoras Rurais do Nordeste

MMTR-Regional: Movimento de Mulheres Trabalhadoras Rurais da Região Semiárida da


Bahia

MMTR-Santaluz: Movimento de Mulheres Trabalhadoras Rurais de Santaluz

MMTR-SHA: Movimento de Mulheres Trabalhadoras Rurais de Serrinha

MOC: Movimento de Organização Comunitária

MPOG: Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão

PAA: Programa de Aquisição de Alimentos

PNAD: Pesquisa Nacional de Amostra Domiciliar

PNAE: Programa Nacional de Alimentação Escolar

PNPM: Plano Nacional de Políticas para as Mulheres

PRONAF: Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar

PRONAN: Plano Nacional de Alimentação e Nutrição

SAGI: Secretaria de Avaliação e Gestão da Informação

SISAN: Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional

STR: Sindicato dos Trabalhadores Rurais

SUAF: Superintendência de Agricultura Familiar do Estado da Bahia

UNICEF: Fundo das Nações Unidas para Infância


RESUMO

A presente dissertação aborda sobre a atuação da Associação do Movimento de Mulheres


Trabalhadoras Rurais da Agricultura Familiar (AMMTRAFAS) no contexto do município de
Santaluz na Bahia (Brasil); a participação dessas mulheres no Programa de Aquisição de
Alimentos (PAA) e no Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE); as transformações
ocorridas no contexto da vida e do trabalho dessas mulheres a partir da participação delas
nesses programas federais; e das novas territorialidades instituídas a partir da associação de
mulheres no contexto municipal. Quanto aos procedimentos metodológicos, consideraram-se as
abordagens qualitativa e quantitativa e utilizamos como instrumentos para coletar e sistematizar
informações a pesquisa bibliográfica e documental, observação participante, aplicação de
questionários e a realização de entrevistas. A AMMTRAFAS surgiu na década de 1990 como
Movimento de Mulheres Trabalhadoras Rurais de Santaluz (MMTR-Santaluz), se
institucionalizou entidade civil em dezembro de 2010 com o objetivo de acessar políticas
públicas para mulheres rurais. A partir da segunda metade dos anos 2000, as trabalhadoras
rurais da AMMTRAFAS foram aos poucos sendo inseridas nos programas federais PAA
(2007) e PNAE (2010). Pode-se afirmar que a inserção das agricultoras nestes programas
contribuiu para a geração de trabalho e renda tão desejada. Contudo, não basta pensar e analisar
o movimento de mulheres somente a partir do viés da organização e das relações de trabalho,
pois, tais ações se realizam no espaço, considerando dimensões sociais, políticas, econômicas e
culturais. O movimento, portanto, apresenta-se com forte expressão territorial e com
significativo potencial emancipatório, por surgir com uma proposta de valorização e de
fortalecimento das mulheres trabalhadoras rurais, por consolidar um sistema de organização do
espaço baseado na implantação de sedes de grupos de produção formado por mulheres nas
comunidades rurais, interligadas e assistidas por uma associação constituída a partir delas
próprias. Daí a configuração territorial assumida pela AMMTRAFAS, que ao criarem as
relações sociais e as condições para tratarem de seus interesses, produzem seus próprios
espaços, seus territórios e, logo, propagam suas territorialidades.

Palavras-chave: Associação do Movimento de Mulheres Trabalhadoras Rurais. Trabalho e


renda. Políticas públicas. Territorialidades.
ABSTRACT

This thesis aims to analyze the performance context of the Movement Association of Rural
Women Workers of Family Agriculture Santaluz (AMMTRAFAS), in order to understand the
new territoriality laid down by the civil society organization in Santaluz municipality in Bahia,
situated in Bahia's semiarid region. Considered for both, women's participation in the Food
Acquisition Program (PAA) and the National School Feeding Programme (PNAE) and the
changes occurring in the context of life and work of these women from the participation of
women in these federal programs. As for the methodological procedures adopted for this work,
we considered the qualitative and quantitative approaches and used the following tools for
gathering information: bibliographical and documentary research, participant observation,
questionnaires and interviews. AMMTRAFAS emerged in the 1990s as a Movement of Rural
Women Workers of Santaluz (MMTR-Santaluz), institutionalized civil entity in December
2010 in order to access public policies for rural women. From the second half of the 2000s,
rural workers of AMMTRAFAS were gradually inserted in federal programs PAA (2007) and
PNAE (2010). It can be said that the inclusion of farmers in these programs contributed to the
generation of employment and income as desired. However, do not just think and analyze the
women's movement only from the organization bias and labor relations, because such actions
are carried out in space, considering social, political, economic and cultural dimensions. The
movement, therefore, presents itself with a strong territorial expression and significant
emancipatory potential, by coming up with a proposal for recovery and strengthening of rural
women workers, to consolidate a system of organization of space based on the deployment of
physical headquarters groups women in communities, interconnected and assisted by an
association from their own. Hence the territorial configuration assumed by AMMTRAFAS that
by creating social relations and conditions to address their interests, produce their own spaces,
their territories and thus propagate their territoriality.

Key words: Association of Rural Women Workers Movement. Work and income. Public
policy. Territoriality.
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 166
1.1 O universo da pesquisa: contextualização e procedimentos metodológicos ...................... 277
1.1.1 Coleta e sistematização dos dados ..................................................................................... 29

2.ASSOCIAÇÃO DO MOVIMENTO DE MULHERES TRABALHADORAS RURAIS


DA AGRICULTURA FAMILIAR DE SANTALUZ BAHIA (AMMTRAFAS): ORIGEM
E PARTICULARIDADES ..................................................................................................... 355
2.1 Trajetória de formação da Associação do Movimento de Mulheres Trabalhadoras Rurais da
Agricultura Familiar de Santaluz (AMMTRAFAS) ................................................................. 366
2.2 AMMTRAFAS: caracterização e estrutura ........................................................................ 444

3.TERRITORIALIDADE, MOVIMENTO SOCIAL E POLÍTICAS PÚBLICAS:


PERSPECTIVAS TEÓRICAS PARA ANALISAR A AÇÃO DA AMMTRAFAS ......... 522
3.1 Território e territorialidade como elementos constitutivos das relações sociais................. 533
3.2 As desigualdades de gênero e a luta dos movimentos de mulheres .................................... 600
3.2.1 Movimentos sociais: percepções teóricas e reflexões sobre a espacialidade das ações
coletivas .................................................................................................................................... 655
3.3 Políticas públicas: perspectiva conceitual e a configuração das políticas públicas para as
mulheres no Brasil .................................................................................................................... 722

4. O PROGRAMA DE AQUISIÇÃO DE ALIMENTOS (PAA) E O PROGRAMA


NACIONAL DE ALIMENTAÇÃO ESCOLAR (PNAE) NO ÂMBITO DA POLÍTICA
DE SEGURANÇA ALIMENTAR NO BRASIL ................................................................ 7979
4.1 PAA: contexto de implantação, regulamentação e caracterização do programa ................ 800
4.2 PNAE: contexto de implantação, regulamentação e caracterização do programa .............. 888

5. A PARTICIPAÇÃO DA AMMTRAFAS NA EFETIVAÇÃO DOS PROGRAMAS DE


SEGURANÇA ALIMENTAR (PAA E PNAE) E A CONSTITUIÇÃO DE NOVAS
TERRITORIALIDADES EM SANTALUZ NA BAHIA .................................................... 955
5.1 Participações das mulheres da AMMTRAFAS no Programa de Aquisição de Alimentos
(PAA) de Santaluz - Bahia ........................................................................................................ 966
5.2 Participação das mulheres da AMMTRAFAS no Programa Nacional de Alimentação
Escolar (PNAE) de Santaluz - Bahia ...................................................................................... 1077
5.3 AMMTRAFAS – instituindo espaços de referência, poder e estabelecendo novas
territorialidades no município de Santaluz - Bahia ................................................................. 1255

CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................... 1444

REFERÊNCIA ...................................................................................................................... 1488

APÊNDICES ......................................................................................................................... 1600


CAPÍTULO 1

Fonte: http://guiatcc.blogspot.com.br (2015)

“Onde quer que haja mulheres e homens, há sempre o que fazer, há sempre o que ensinar, há
sempre o que aprender.”

Paulo Freire
16

INTRODUÇÃO

Os movimentos sociais de mulheres emergiram com maior expressão no Brasil a partir


da segunda metade do século XX, por influência principalmente das organizações feministas,
marcadas pela manifestação intelectual e política que visava combater estruturas patriarcais de
opressão da sociedade, baseadas nas desigualdades de gênero. Desejavam conquistar a
igualdade de direitos entre homens e mulheres e garantir a participação da mulher na
sociedade, do mesmo modo como ocorre a participação do homem.
As décadas finais do século XX estiveram associadas a ações que sinalizavam a
ampliação da cidadania no Brasil. Acontecimentos marcantes representaram para a história do
país um passo adiante no sentido de consolidação de uma nova democracia, inclusive pela
maior participação das mulheres no contexto da vida pública. O fim do regime militar (1964-
1984)1, a criação do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (1985) e do Conselho
Estadual da Condição Feminina2 de São Paulo (1983) e do Rio de Janeiro (1987), assim como
a promulgação da Constituição Brasileira (1988), caracterizaram o panorama de
acontecimentos que se tornaria a base para tantas outras conquistas como, por exemplo, a
emergência e a institucionalização dos movimentos de mulheres por todo o país, a criação da
Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM) em 2003, os Conselhos Municipais de
Mulheres e o Plano Nacional de Políticas para as Mulheres (PNPM) 3, a partir de 2004. A
própria Constituição de 1988 já revelava um avanço para a democracia no Brasil quando
estabeleceu direitos iguais a todo e qualquer cidadão sem distinção de qualquer natureza.
Como se vê, a emergência pela incorporação no debate das políticas públicas de
questões específicas de gênero se tornou pauta importante dos movimentos de mulheres e
feministas em alguns estados do Brasil nas três últimas décadas do século XX,
principalmente, com a criação de Conselhos Estaduais dos Direitos da Mulher: São Paulo, Rio
de Janeiro, Bahia (criado pelo Decreto nº 7.452/1985 e Lei Municipal nº 3.542/1985), Rio

1
Período em que o país esteve sob controle das Forças Armadas Nacionais. Após uma intensa campanha no Brasil que
reivindicava o fim do regime militar e a instauração das eleições diretas para presidente da República iniciada em 1983-1984,
Tancredo Neves vence eleições em 15 de janeiro de 1985 (indiretamente), marcando o fim da ditadura militar no país.
2
Órgão institucional criado pelo Decreto n. 20.892, de 4/4/1983 e institucionalizado pela Lei n. 5.447, de 1/12/1986.
Integrado por representantes da sociedade civil e do poder público, contribui para a formulação e acompanhamento das
políticas públicas referentes aos direitos da mulher. Disponível em: <http://www.defensoria.sp.gov.br> Acesso em 22 jul.
2015.
3
O I PNPM foi lançado em 2004 e tinha por objetivo apontar os princípios da Política Nacional para as Mulheres através de
um conjunto de diretrizes que devem orientar, ampla e irrestritamente, a atuação estatal na construção de suas políticas
públicas. BRASIL. Presidência da República. Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres. Relatório Final de
Implementação: I Plano Nacional de Políticas para as Mulheres 2005/2007. Brasília: SPM, 2009.
17

Grande do Sul (criado em 1986 e sancionado pela Lei nº 13.947/2012), Santa Catarina (criado
pela Lei nº 11.159/1999), entre outros. Os conselhos expressavam a institucionalização da
democracia participativa no país e a possibilidade de implementação de políticas públicas,
pelas quais as demandas sociais poderiam, efetivamente, serem consideradas e atendidas.
Tendo em vista essa conjuntura, emergiram em diversas regiões do Brasil e também na
região Nordeste experiências de movimentos organizados por mulheres trabalhadoras rurais,
como o Movimento de Mulheres Trabalhadoras Rurais do Nordeste (MMTR-NE). Uma
associação de mulheres do espaço rural, sem fins lucrativos que defende os direitos das
trabalhadoras rurais do nordeste brasileiro. Teve sua origem na década de 1980 a partir da
organização das mulheres dos estados de Pernambuco e da Paraíba, depois estendeu suas
ações pelos demais estados do nordeste, tornando-se referência e contribuindo para a criação e
o fortalecimento de mais grupos ou coletivos de mulheres.
A região Nordeste caracteriza uma divisão administrativa dos estados brasileiros, que
foi assim classificada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 19804. É
formada por nove estados: Alagoas (AL), Bahia (BA), Ceará (CE), Maranhão (MA), Paraíba
(PB), Pernambuco (PE), Piauí (PI), Rio Grande do Norte (RN) e Sergipe (SE). A região
apresenta características físicas e socioeconômicas bem variadas, em função da diversidade
natural e de fatores relacionados à dinâmica social e econômica.
O município de Santaluz, recorte espacial deste estudo, localiza-se no estado da Bahia e
especificamente no Sertão nordestino, como mostra Mapa 1 (página 19), no qual predomina o
clima semiárido que se distingue por apresentar temperaturas elevadas e estiagens
prolongadas durante todo o ano. É um município que dispõe de uma população de 33.838
habitantes, desses 20.795 residem no perímetro urbano enquanto que 13.043 residem no
espaço rural, segundo dados do censo demográfico do IBGE (2010). Porém, o próprio IBGE
estima que a população de Santaluz tenha chegado a 36.915 habitantes em 2015.
Santaluz foi desmembrada do município de Queimadas em julho de 1935 e elevado à
categoria de cidade em 1938 com a denominação de Santa Luzia e, em 1943 o topônimo foi
alterado para Santaluz. A área do município é de 1.563,291 km² e está distante da capital do
estado (Salvador) 261 km (distância percorrida pela BR 324).

4
ANUÁRIO ESTATÍSTICO DO BRASIL. Rio de Janeiro: IBGE, 2007.
Mapa 1 -
18
19

Em 2003, foi implementado no Brasil a política de promoção e desenvolvimento dos


territórios rurais, através de iniciativa do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) e da
Secretaria de Desenvolvimento Social (SDT). A partir dessa perspectiva, o estado da Bahia
estruturou 27 Territórios de Identidades, institucionalizados no governo de Jacques Wagner
(2007-2010) visando o planejamento estratégico da gestão pública representando, portanto,
um marco para execução de políticas setoriais de natureza diversificada. A ação pública
ocorre através da parceria dos municípios de um mesmo território com os poderes públicos
estadual e federal.
O Território do Sisal constitui um dos 27 territórios da Bahia, localizado no semiárido
baiano, faz referência à cadeia produtiva do sisal uma das principais economias da maioria
dos municípios deste território e abrange 20 municípios: Araci, Barrocas, Biritinga, Candeal,
Cansanção, Conceição do Coité, Ichú, Itiúba, Lamarão, Monte Santo, Nordestina, Queimadas,
Quinjingue, Retirolândia, Santaluz, São Domingos, Serrinha, Teofilândia, Tucano e Valente.
O mapa 2 (página 21) destaca Santaluz no contexto do Território de Identidade do Sisal na
Bahia/Brasil.
A atividade econômica que mais se destaca no município de Santaluz, pelo número de
pessoas ocupadas, é a prestação de serviços seja na rede privada ou pública (IBGE, 2010). No
contexto rural, a atividade mais expressiva está relacionada a produção permanente da cultura
do sisal, desde o cultivo até o processamento da agave sisalana, planta conhecida como sisal.
Essa é a principal fonte de renda no campo – um trabalho que agrega tanto mão de obra
masculina quanto feminina. Já a produção rural temporária faz referência ao cultivo de
produtos como o feijão, o milho e a mandioca, principalmente. Um tipo de produção
direcionada, principalmente, à subsistência das famílias dos agricultores rurais do município.
Nesse contexto, surgiu o Movimento de Mulheres Trabalhadoras Rurais de Santaluz
(MMTR-Santaluz), que posteriormente foi transformado em Associação do Movimento de
Mulheres Trabalhadoras Rurais da Agricultura Familiar de Santaluz (AMMTRAFAS). É
preciso salientar que a manifestação dos movimentos de mulheres na luta pela representação
política das trabalhadoras rurais no nordeste, nas décadas finais do século passado, contribuiu
para o pensamento e a formação do Movimento de Mulheres de Santaluz que dentre suas
reivindicações destacamos: a geração de trabalho e renda para as agricultoras e a valorização
do trabalho da mulher que vive do campo.
Mapa 2 - 20
21

A trajetória do MMTR-Santaluz começou a ser traçada no início da década de 1990,


quando algumas agricultoras do município começaram a se reunir e participar, mais
expressivamente, de espaços voltados à discussão e formação política, como as Associações
Comunitárias, o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Santaluz (STR-
Santaluz)5, a Central de Apoio às Iniciativas Comunitárias do Semiárido da Bahia (CEAIC)6 e
o Movimento de Organização Comunitária (MOC)7, além de marcar presença em ações
coletivas no Estado, como as audiências públicas, fóruns, reuniões e passeatas de seus
interesses.
A partir dessa contextualização, apresentamos as intenções de que tratam nossa
dissertação: compreender a atuação da AMMTRAFAS na perspectiva de revelar as novas
territorialidades estabelecidas por e a partir desta entidade no município de Santaluz na Bahia,
situado no semiárido baiano e que compõe o Território de Identidade do Sisal.
A pesquisa foi desenvolvida no âmbito do Programa de Pós-Graduação em
Planejamento Territorial (PLANTERR), do Departamento de Ciências Humanas e Filosofia
da Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS). Caracteriza, portanto, um esforço no
sentido de compreender de que forma a atuação da AMMTRAFAS: (a) constitui
territorialidades no município de Santaluz e considera, para tanto, (a1) a participação das
mulheres no Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e (a2) a participação das mulheres
no Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE); (b) as transformações ocorridas no
contexto da vida e do trabalho dessas mulheres assistidas pela AMMTRAFAS e (c) as
relações de poder estabelecidas pelo movimento com vistas à realização de seus objetivos.
Ao longo da sua trajetória, o movimento de mulheres de Santaluz estabeleceu parcerias
que contribuíram para somar forças e proporcionar maior articulação e estrutura para o
movimento, sobretudo, na escala do município. Dentre esses parceiros pode-se destacar
algumas associações comunitárias rurais8 de Santaluz, principalmente, aquelas onde existem
grupos de mulheres da AMMTRAFAS, o STR do município, a CEAIC, o MOC, a
Cooperativa Rede de Produtoras da Bahia (COOPEREDE), a Cooperativa de Beneficiamento
e Comercialização (COOBENCOL) e a Associação das Cooperativas de Apoio a Economia
Familiar (ASCOOB Itapicuru).

5
O Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Santaluz foi criado em dezembro de 1973. (SILVA, 2006)
6
A Central das Associações foi criada em 15 de Novembro de 1993, com a finalidade legal de organizar, legalizar e
assessorar as associações comunitárias (SILVA, 2006).
7
Organização Não Governamental que surgiu nos finais da década de 1960 a partir do trabalho comunitário desenvolvido
pela Igreja Católica nos bairros do Cruzeiro, Rua Nova, Baraúnas e Galileia de Feira de Santana, de iniciativa da então
Diocese de Feira d Santana (Bahia). (MOC, 2007)
8
Associações de moradores e pequenos agricultores rurais das comunidades de Ferreiros, Miranda, Lagoa Escura, Rose,
Serra Branca, Morro dos Lopes, Calumbi entre outras de Santaluz - Bahia.
22

Inclusive, muitas associações comunitárias da qual as mulheres participam, surgiram na


mesma década que o MMTR-Santaluz como, por exemplo, a Associação dos Pequenos
Agricultores da Comunidade Rose (1990), a Associação dos Moradores e Produtores do
Povoado de Miranda (1994), a Associação dos Moradores e Pequenos Agricultores de Lagoa
Escura (1995) e a Associação dos Moradores e Pequenos Agricultores de Ferreiros (1996), o
que demonstra que as mulheres contribuíram também com essas outras formas de organização
da luta coletiva no município.
O MOC, além de disponibilizar uma secretaria específica para tratar de assuntos
relacionados às questões de gênero, desenvolve trabalhos de formação social, política,
econômica e assessorias técnicas para as mulheres. Dentre as estratégias de ação do MOC,
destacam-se: apoiar organizações de trabalhadoras rurais para que elas ocupem os espaços na
sociedade voltados para processos de discussão e proposição de políticas públicas para
mulheres e, também, incentiva a geração de renda, proporcionada através da formação e
estruturação de grupos específicos de produção (MOC, 2007). Oficinas, reuniões e encontros
são algumas das atividades realizadas pelo MOC, para sistematizar necessidades e demandas
das mulheres, visando contribuir com seus projetos.
A COOPEREDE surgiu a partir da necessidade de formalização e assistência dos
grupos de produção de mulheres dos Territórios de Identidade onde atua. Abrange três
Territórios no Estado da Bahia (Bacia do Jacuípe, Portal do Sertão e Sisal), conta com a
assessoria do MOC e tem contribuído para fortalecer a organização de mulheres, através da
valorização do trabalho feminino e da realização de práticas de desenvolvimento solidário. É
uma entidade que tem viabilizado para as mulheres da AMMTRAFAS a participação e a
execução de diversos projetos ou programas do Governo (MOC, 2008), como por exemplo, o
Programa Nacional de Documentação da Trabalhadora Rural (MDA)9, Projeto Mãos que
Trabalham10 e o Projeto Março Mulheres 2016: Empoderamento e Inclusão Social (SPM)11. A
COOPEREDE foi criada em 2002 para articular empreendimentos solidários formados
exclusivamente por mulheres do espaço rural e urbano, com sede na cidade de Feira de
9
Uma política pública do Ministério do Desenvolvimento Agrário iniciado em 2004, com objetivo de promover a inclusão
social das trabalhadoras rurais, seja na reforma agrária ou na agricultura familiar. Ocorre por meio da emissão gratuita de
documentos civis, trabalhistas e do acesso aos direitos previdenciários, através dos mutirões itinerantes de documentação
(PIRES, 2012).
10
O projeto de iniciativa da Petrobrás foi realizado pelo MOC, o MMTR-Regional e a COOPEREDE entre os anos de 2006 a
2011, nos territórios Bacia do Jacuípe, Portal do Sertão e Sisal. Contou com a participação de 300 mulheres e atuou na
organização de empreendimentos de economia solidária de mulheres e apoiando a inserção de seus produtos nos mercados
locais, institucionais e solidários (MOC, 2011).
11
Edital publicado pela Secretaria de Políticas para as Mulheres da Bahia (2016), com o objetivo de selecionar projetos que
têm como recorte o empoderamento e a inclusão social das mulheres. O edital visa apoiar financeiramente (Total R$
408.000,00) até 26 projetos organizados por grupos, coletivos ou movimentos de mulheres da Bahia. A COOPEREDE e o
MOC atuam assessorando e auxiliando os grupos de mulheres na elaboração de seus projetos. Disponível em:
<www.mulheres.ba.gov.br> Acesso em: 04 mar. 2016.
23

Santana. A cooperativa assiste mulheres que atuam na produção de gêneros alimentícios e de


artesanato.
A COOBENCOL12 foi criada no final do ano de 2001, por diretores e funcionários da
ASCOOB Itapicuru, com objetivo de gerar renda e comercializar os produtos da própria
região, na perspectiva de valorizar o trabalho dos pequenos agricultores (SILVA, 2006).
Porém, a cooperativa estava desativada há alguns anos, até que em 2014 a ASCOOB propôs à
AMMTRAFAS fazer parte da COOBENCOL, pois, era meta da associação de mulheres criar
também uma cooperativa no município com a mesma função, prevendo beneficiar as
produtoras rurais. Desde então, todos os grupos de mulheres da AMMTRAFAS estão filiados
à COOBENCOL e a AMMTRAFAS está à frente desta cooperativa, assumindo dessa forma a
presidência, a vice presidência, a secretaria, a vice secretaria, parte do conselho
administrativo, todo o conselho fiscal e o departamento de comercialização da
COOBENCOL.
Através da ASCOOB Itapicuru, a associação de mulheres acessa crédito rural e
estabelece todo tipo de operação financeira. A ASCOOB Itapicuru13 foi criada em 2000 com
sede no município de Santaluz, na época da sua implementação contou com apoio e a
assessoria do MOC e da agremiação de organizações da região, principalmente, do CEAIC,
do Sindicato dos Trabalhadores da Pedra, do Polo Sindical da Região Sisaleira e dos
Sindicatos dos Trabalhadores Rurais de Santaluz, Queimadas, Nordestina, Cansanção e
Quinjingue. É uma cooperativa de responsabilidade limitada, instituição financeira, uma
sociedade de pessoas de natureza civil sem fins lucrativos, que assume como missão: o
desenvolvimento sustentável e solidário visando fortalecer a economia familiar na região.
Após mais de duas décadas de atuação do Movimento de Trabalhadoras Rurais de
Santaluz, as mulheres optaram pelo registro em Cartório desse movimento, criando assim a
Associação do Movimento de Mulheres Trabalhadoras Rurais da Agricultura Familiar de
Santaluz (AMMTRAFAS), em 2010. E, uma das principais missões assumidas pela
associação, estabelecido em Estatuto, foi contribuir com o processo de organização social e
econômica das produtoras e agricultoras rurais, enfatizando a necessidade de fomentar
processos de produção, beneficiamento e comercialização de produtos da agricultura familiar
pelas mulheres. O que supõe uma demanda de trabalho e renda.

12
A sede da COOBENCOL está localizada na rua Rio Branco nº 180 Cep. 48880-000 Centro de Santaluz/Bahia.
13
Disponível em: <www.ascoobitapicuru.com.br> Acesso em: 17 fev. 2016.
24

A partir da experiência das mulheres e da discussão no movimento a respeito da


dificuldade de gerar renda, elas optaram pela criação de grupos de produção nas comunidades
para que pudessem realizar seus trabalhos de forma coletiva, no intuito de gerar renda. Os
grupos de produção surgiram com objetivo de valorizar o trabalho desenvolvido por elas -
trabalhos com bordados, crochê, artesanato em palha e em cerâmica, ou no ramo da
alimentação. Esse foi, também, um fator que impulsionou o registro jurídico da associação,
porque dessa forma poderiam propor projetos e concorrer a programas do Governo (Federal,
Estadual e Municipal) em nome do movimento para beneficiar as mulheres.
Algumas mulheres da AMMTRAFAS (pouco mais de 100) vêm sendo, ao longo desses
últimos 5 anos ou mais, beneficiadas com a participação nos programas do Governo Federal
PAA e PNAE, instrumentos de políticas públicas, instituídos pelo artigo 19 da Lei nº
10.696/2003 e pela Lei nº 11.947/2009, respectivamente. A participação das mulheres nos
programas ocorre através da comercialização de alimentos da agricultura familiar para órgãos
governamentais do Estado (Companhia Nacional de Abastecimento - Conab) e do município
(Prefeitura) que acontece por meio de chamada pública14.
O PAA e PNAE constituem um conjunto de iniciativas do Governo Federal para
garantir o combate à fome e promover a segurança alimentar no país. O direito a alimentação
saudável, adequada e em quantidade passou a ser garantido na Constituição Federal e em
2006 cria-se a Lei de Segurança Alimentar15 que dá origem ao Sistema Nacional de
Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN). O SISAN unifica a gestão de vários programas,
ações sociais e de assistência social e, é nesse contexto que se reconhece a agricultura familiar
como fonte de recursos para a política de segurança alimentar e como um instrumento de
fortalecimento da política agrícola brasileira.
No ano de 2015, participaram dos programas PAA e PNAE, em Santaluz (Bahia), 16
grupos de mulheres da AMMTRAFAS, todos eles do próprio município, o que corresponde a
142 trabalhadoras rurais tendo acesso aos mercados institucionais, através da comercialização
de produtos de origem da agricultura familiar como os alimentos do tipo beiju, farinha de
tapioca, sequilhos, bolos, broas, pão, polpa de frutas e hortaliças – por isso os grupos de
mulheres são denominados grupos de produção.
Os 16 grupos de produção da AMMTRAFAS encontram-se distribuídos da seguinte
forma: um grupo em cada uma das seguintes comunidades Areal, Barreirinho, Calumbi,
14
Nesse contexto, a chamada pública é o procedimento administrativo voltado à seleção de proposta específica para
aquisição de gêneros alimentícios provenientes da Agricultura Familiar e/ou Empreendedores Familiares Rurais ou suas
organizações. (BRASIL, RESOLUÇÃO CD/FNDE Nº 26/2013, §2º)
15
Lei nº 11.346/2006 cria o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional – SISAN visando assegurar o direito
humano à alimentação adequada e dá outras providências (BRASIL, 2014, p. 14)
25

Ferreiros, Lagoa Escura, Lagedinho, Miranda, Mocambinho, Morro dos Lopes, Rio do Peixe,
Rose, Serra Branca, Tombador, Várzea da Pedra e dois grupos na comunidade de Várzea da
Pedrinha.
A preocupação com questões envolvendo trabalho e renda sempre esteve presente na
pauta da luta das trabalhadoras rurais, seja pelo fato de seu trabalho não ser valorizado ou
porque não é reconhecido. A desigualdade na participação das mulheres no mercado de
trabalho, seja econômica e social a partir das tarefas desempenhadas por elas, refletem em
menores salários e na segregação ocupacional, que reserva para elas, muitas vezes, as piores
condições de trabalho e a informalidade (BERRO, 2008). Diante de tal constatação formulou-
se as seguintes questões com objetivo de orientar a pesquisa: 1) Quais as estratégias de luta da
AMMTRAFAS para acessar programas do governo voltadas à geração de trabalho e renda
para as mulheres do campo? 2) Qual a importância da participação das mulheres nos
programas PAA e PNAE? 3) A ação da AMMTRAFAS, nesse sentido, tem constituído novas
territorialidades no município?
Determinado o problema, construímos o seguinte objetivo geral: Compreender a
atuação da AMMTRAFAS para a constituição de novas territorialidades no município de
Santaluz Bahia, sobretudo, a partir de sua participação nas políticas de segurança alimentar
(PAA e PNAE). E foram elencados os seguintes objetivos específicos:

1- Caracterizar a AMMTRAFAS no contexto do município de Santaluz – Bahia;


2- Caracterizar os programas do Governo Federal PAA e PNAE no contexto das políticas
de segurança alimentar no país;
3- Mapear os 16 grupos de produção da AMMTRAFAS que participam dos programas
de governo no município de Santaluz;
4- Identificar as estratégias de luta e de poder da AMMTRAFAS que tem por objetivo
acessar o PAA e PNAE;
5- Analisar elementos que caracterizam a territorialidade da AMMTRAFAS em Santaluz
- Bahia.

A pesquisa se justifica pela possibilidade de conhecer e divulgar as ações e as


experiências das trabalhadoras rurais a partir da atuação da AMMTRAFAS no município de
Santaluz, conhecer e avaliar políticas públicas que tem possibilitado trabalho e renda para as
mulheres do espaço rural e de ratificar a importância da organização das mulheres para
efetivação de transformações na “ordem” social, política, econômica e cultural da sociedade
26

brasileira, pois, as desigualdades sociais tem relação direta com as desigualdades de gênero e
raça.
O interesse pelo tema desenvolvido neste trabalho perpassava a possibilidade de
relacionar a AMMTRAFAS às políticas públicas de trabalho e renda e a atuação da
associação de mulheres para constituição de territorialidades. Vislumbra também, destacar a
expressiva contribuição das mulheres trabalhadoras rurais na esfera da vida pública, que se
manifesta por meio da participação política e do diálogo estabelecido entre o movimento de
mulheres e o poder público, municipal e estadual principalmente.
Outra motivação para essa pesquisa surgiu do conhecimento adquirido no decorrer de
uma investigação realizada, no Curso de Especialização em Dinâmica Territorial e
Socioambiental do Espaço Baiano (2010 a 2012), na UEFS. Na oportunidade, buscamos
analisar as implicações socioespaciais da organização política do Movimento de Mulheres
Trabalhadoras Rurais de Serrinha, na Bahia (MMTR-SHA), município que também compõe o
Território de Identidade do Sisal. E constatamos que a luta do movimento contribuiu para sua
organização espacial, para a reconstrução de valores acerca da mulher na sociedade e
promoveu a visibilidade da trabalhadora rural.
Daí a necessidade de produzir uma pesquisa que enfatizasse os processos, as
experiências e as transformações geradas na vida das trabalhadoras rurais, a partir do acesso
às políticas públicas voltadas para a geração de trabalho e renda. Tomou-se como objeto de
estudo a AMMTRAFAS porque é um movimento com expressiva participação das mulheres16
nos programas PAA e PNAE, tendo em vista que são programas que objetivam a inclusão
produtiva das mulheres do campo, proporcionando trabalho e gerando renda para suas
famílias.
Esta dissertação encontra-se estruturada em cinco capítulos e as considerações finais. O
primeiro deles constitui a Introdução, direcionada a apresentação da proposta de pesquisa, a
problematização da temática, os objetivos e a estruturação da metodologia com a descrição
dos procedimentos e instrumentos da pesquisa, bem como, a síntese de cada uma das seções
que se seguem.
O segundo capítulo, Associação do Movimento de Mulheres Trabalhadoras Rurais da
Agricultura Familiar de Santaluz Bahia (AMMTRAFAS): origem e particularidades, aborda a
trajetória de formação do movimento de mulheres trabalhadoras rurais de Santaluz e apresenta
o panorama de formação da atual associação de mulheres, sua estrutura e suas características.

16
São 16 grupos de mulheres que vendem para o PAA e /ou PNAE no município, caracterizando um total de 142
trabalhadoras rurais que participam dos programas através da comercialização institucional.
27

No terceiro capítulo destacam-se os pressupostos teóricos que fundamentam a pesquisa,


expõe-se sobre os principais conceitos e categorias pertinentes à pesquisa, de forma que se
relacionam tais concepções com o objetivo de compreender a atuação do movimento de
mulheres de Santaluz (AMMTRAFAS).
O capítulo quatro - O PAA e o PNAE no âmbito da política de segurança alimentar no
Brasil – sistematiza os programas de governo mencionados no trabalho. Parte-se da
contextualização histórica dos processos de construção da política de segurança alimentar e
nutricional no Brasil e, depois, apresentam-se as normas que regem os programas, seus
objetivos, suas principais características e o seu funcionamento.
O quinto capítulo é resultado da coleta de dados primários, das análises realizadas sobre
a associação de mulheres. Destaca-se a participação dos grupos de produção da
AMMTRAFAS nos programas PAA e PNAE, dialogando com dados apresentados a partir do
trabalho de campo e reflete sobre as territorialidades instituídas pela associação de mulheres
no espaço rural de Santaluz.
Nas Considerações Finais, destaca-se a síntese dos resultados da pesquisa, realizando as
observações necessárias a respeito da participação das trabalhadoras rurais nos programas
federais PAA e PNAE e ressaltando a configuração das novas territorialidades praticadas a
partir da atuação da associação de mulheres (AMMTRAFAS) no município de Santaluz -
Bahia.

1.1 O universo da pesquisa: contextualização e procedimentos metodológicos

A principal questão que orientou o desenvolvimento dessa dissertação partiu da


necessidade de relacionar temas como trabalho, renda, políticas públicas e territorialidades à
atuação dos Movimentos de Mulheres Trabalhadoras Rurais (MMTR) do Território do Sisal.
Em trabalho realizado anteriormente por Pires (2012), sobre o MMTR de Serrinha (Bahia), foi
possível concluir que uma das principais demandas das mulheres rurais do Sisal era,
justamente, a falta de oportunidades de trabalho e renda que valorizassem a condição da
mulher. E, diante da constatação e existência da Secretaria de Políticas para as Mulheres
(SPM)17 criada em 2003, tornava-se necessário identificar e compreender as políticas públicas

17
Órgão da Presidência da República criado para formular, coordenar e articular políticas públicas para as mulheres através
do Plano Nacional de Políticas para as Mulheres em todo território nacional. Disponível em: <http://www.spm.gov.br>
Acesso em: 14 ago. 2015.
28

com relação as demandas de gênero, sobretudo, no contexto do trabalho e da remuneração,


que tem se efetivado nos últimos dez anos.
O Território do Sisal se destaca no contexto da Bahia por ser um espaço pautado na
organização e no fortalecimento de agentes da sociedade civil, entre outros aspectos. De
acordo com Santos e Silva (2010), as pessoas se mobilizam em torno de associações
comunitárias, movimentos sociais, cooperativas e ONGs na perspectiva de contribuir com a
melhoria das condições de vida e com o desenvolvimento social local.
O Movimento de Mulheres Trabalhadoras Rurais da Região Semiárida da Bahia
(MMTR Regional) é constituído por oito organizações de mulheres18, dentre os quais, seis são
de municípios pertencentes ao Território do Sisal. Daí surgiu o interesse em pesquisar os
movimentos de mulheres do território, porém, foi preciso fazer um recorte e delimitar um
desses movimentos atuantes no Regional.
Dentre os critérios pensados para a escolha do movimento de mulheres para ser o objeto
de pesquisa, destacam-se alguns: 1) a preferência em estudar um MMTR do Território do
Sisal, por ser mais viável devido ao conhecimento já sistematizado existente a respeito da
dinâmica social e política deste território; 2) o acesso aos municípios do Sisal também foi um
fator preponderante pela facilidade de transporte intermunicipal; 3) que o movimento tivesse
o maior número de mulheres associadas e acessando programas do Governo Federal
relacionados com trabalho e renda, de modo que fosse possível refletir sobre as
territorialidades estabelecidas por esta organização.
Na ocasião, identificamos dois programas do Governo Federal que estavam
contribuindo para geração de trabalho e renda para as mulheres rurais do Sisal, o PAA e o
PNAE. E a organização de mulheres que tinha maior número de trabalhadoras rurais
participando desses programas era a Associação das Trabalhadoras Rurais de Santaluz. Logo,
diante dessas informações preliminares, optamos por estudar a AMMTRAFAS.
No que diz respeito à natureza da abordagem metodológica, adotamos para este trabalho
tanto a abordagem quantitativa quanto a qualitativa, porque compreende o uso da
quantificação na coleta e no tratamento das informações de campo, de forma que tais
informações fossem tratadas considerando as particularidades, as ações e os valores atribuídos
à organização das mulheres. Logo, a estratégia metodológica abrangeu a exploração,
descrição e interpretação do fenômeno estudado, sendo possível utilizar tanto procedimentos
qualitativos quanto quantitativos. Sendo assim:
18
MMTR de Araci, Secretaria de Mulheres do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Conceição do Coité, MMTR de
Quixabeira, MMTR de Retirolândia, MMTR de Santa Barbara, AMMTRAFAS de Santaluz, MMTR de Serrinha, MMTR de
Teofilândia.
29

A abordagem qualitativa aplica-se ao estudo da história, das relações, das


representações, das crenças, das percepções e das opiniões, produto das
interpretações que os seres humanos fazem de como vivem, constroem seus
artefatos e a si mesmos, sentem e pensam. (CAVALCANTI et al, 2014, p.
14)

Segundo Deslandes (2012), as técnicas e os instrumentos da pesquisa se direcionam


tanto para a produção primária de dados (quando há a produção de dados através da interação
com os envolvidos por meio de entrevistas, aplicação de questionário e observações), quanto
para a obtenção de dados secundários, através de acervo já existente (livros, artigos,
documentos, banco de dados, leis, relatórios etc.).
Quanto aos procedimentos de análise, Deslandes (2012, p. 49) afirma que se referem “às
formas de organização dos dados e os passos empreendidos para a produção de influências
explicativas ou de descrição”. Por isso, a análise de conteúdo e a análise de discurso são
exemplos de procedimentos utilizados para interpretação dos dados da pesquisa. Através
destes métodos, buscamos descrever o conteúdo acessado durante realização da pesquisa
documental e de campo (texto e falas das entrevistadas) para uma análise em profundidade do
conteúdo textual, destacando principalmente as subjetividades das pessoas envolvidas e os
sentidos atribuídos por elas em suas informações. Na análise do discurso a linguagem é algo
que está para além do texto, apresenta sentidos previamente construídos que se associam às
condição de vida, da história e das relações sociais que envolvem essas mulheres. E, nesse
sentido, é preciso compreender que o discurso expressado por meio da fala tem relação com o
contexto social e histórico (CAREGNATO; MUTTI, 2006).

1.1.1 Coleta e sistematização dos dados

A realização da pesquisa compreendeu três diferentes fases, divididas da seguinte


forma: I) Reestruturação do projeto, II) Sistematização do referencial teórico e documental e
III) Trabalhos de campo: coleta, sistematização e análise dos dados – conclusão da pesquisa.
A figura 1 apresenta a sistematização dos procedimentos metodológicos da pesquisa.
Descreve sobre as fases, os instrumentos de coleta, organização e análise de conteúdo.
30

Figura 1 - Caracterização dos procedimentos metodológicos

Procedimentos, instrumentos, sistematização e


interpretação dos dados da pesquisa.

I Procedimentos II Instrumentos III Organização IV Análise de conteúdo


de exploração de coleta dos dados e resultados
pretendidos

1-Pesquisa Livros, teses, Estruturação do referencial Interpretação dos


bibliográfica dissertações e teórico, principais conceitos e categorias.
artigos. conceitos e categorias. Sistematização
do capítulo 3 (teórico).

Relatório do MDS (BRASIL, Contextualização da Reflexão dos


2014), Leis 10.696/2003, criação do PAA e princípios
2-Pesquisa 11.947/2009 e 12.512/2012, PNAE. Descrição das estabelecidos nas
documental Decretos 7.775/2012 e principais questões de leis, decretos,
8.293/2014, Resolução que tratam as resolução do PAA e
FNDE/MEC nº 26/2013, leis/decretos e do PNAE e
Resolução nº 44 de 16 de resoluções. Elaboração caracterização da
agosto de 2011, Estatuto da de quadro, tabelas e AMMTRAFAS.
AMMTRAFAS. caracterização da Sistematização dos
AMMTRAFAS. capítulos 2 e 4.

3- Pesquisa Observação Sistematização das Análise e interpretação


de campo participante (diário de informações do dos dados (tabelas e
campo), questionário, questionário (quadros gráficos) e das
roteiro de entrevistas, tabelas, gráfico); narrativas. Associação
máquina fotográfica e transcrição das entrevistas; das imagens, das falas
aparelho receptor: contextualização das e dos dados do
Sistema de imagens; processamento questionário;
Posicionamento Global dados de GPS - elaboração mapeamento dos
(GPS). de mapas. grupos de produção;
construção dos
capítulos 2 e 5.

Elaboração: Silvana Maciel Pires, 2015.

A sistematização do capítulo teórico buscou identificar e analisar os principais conceitos


e categorias relacionadas à ação do movimento de mulheres (territorialidade, movimento de
mulheres, trabalho e políticas públicas), para isso, utilizou-se das seguintes fontes: livros,
teses, dissertações e artigos científicos. E, para análise documental dos programas PAA e
PNAE, elencamos os principais instrumentos utilizados na pesquisa, a seguir, fundamentais à
caracterização dos programas.
31

Quadro 1 - Documentos utilizados para análise dos programas PAA e PNAE – Brasil (2015)

Relatório e documento do PAA Documentos do PNAE

1- Relatório elaborado pelo Ministério do 1- Lei nº 11.947 de 16 de


Desenvolvimento Social e Combate à Fome junho de 2009;
(BRASIL, 2014); 2- Resolução
2- Artigo 19 da Lei nº 10.696 de 02 de julho de CD/FNDE/MEC nº 26 de
2003; 17 de junho de 2013;
3- Resolução nº 44 de 16 de agosto de 2011.
4- Lei nº 12.512 de 14 de outubro de 2011;
5- Decreto 7.775 de 4 de julho de 2012;
6- Decreto 8.293 de 12 de agosto de 2014.
7-
Fonte: MDS e FNDE.
Elaboração: Silvana Maciel Pires, 2015

Um roteiro foi necessário para orientar a análise dos documentos, a fim de expor de
forma objetiva a representação e o entendimento desses instrumentos. O roteiro foi pensado
para auxiliar na organização das informações e, por conseguinte, na interpretação dos dados
obtidos. Os tópicos disponibilizados no roteiro para a exploração da pesquisa documental,
sobretudo, dos instrumentos normativos leis, decretos e resolução são os seguintes:
 Contexto da criação dos instrumentos
 Período de implementação
 Marco legal para implantação
 Órgãos públicos responsáveis pela execução
 Objetivos dos programas
 Principais ações
 A quem se direciona
As leis, decretos e resoluções caracterizam o conjunto de normas jurídicas criadas no
âmbito do legislativo e estabelecidas pelas autoridades competentes. Eles orientam o
cumprimento e a execução dos programas PAA e PNAE. Para acessar tais recursos,
consultamos o site oficial do senado19, que disponibiliza leis e decretos promulgados, sites do
Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS)20, do Fundo Nacional de
Desenvolvimento da Educação (FNDE)21 e do Ministério do Desenvolvimento Agrário

19
Disponível em: <www.senado.gov.br/legislacao> Acesso em: 27 mar. 2015.
20
Disponível em: <www.mds.gov.br> Acesso em: 23 mar. 2015.
21
Disponível em: <http://www.fnde.gov.br/programas/alimentacao-escolar> Acesso em: 30 mar. 2015.
32

(MDA)22, que disponibilizam informações acerca dos programas PAA e PNAE, incluindo, os
relatórios dos programas em formato PDF como o relatório PAA: 10 anos de Aquisição de
Alimentos publicado em 2014.
A terceira fase se caracteriza pelas atividades desenvolvidas a partir do trabalho de
campo durante os meses de setembro de 2015 a janeiro de 2016. A coleta, a estruturação e a
análise dos dados de campo, caracterizou esta última fase da pesquisa que contou com a
utilização dos seguintes instrumentos de coleta: observação participante, questionário,
entrevistas semiestruturadas, análise do Estatuto da AMMTRAFAS, coleta de pontos
georreferenciados com aparelho GPS nas comunidades rurais e o registro de imagens das
atividades dos grupos, desde que autorizadas pelas mulheres. É preciso ressaltar que este
trabalho obteve aprovação junto ao Comitê de Ética da Universidade Estadual de Feira de
Santana (CEP/UEFS)23 para efetivação das atividades de campo.
Através da observação participante foi possível conhecer os espaços de atuação da
AMMTRAFAS, as comunidades rurais onde atuam os grupos de mulheres desta associação e,
especificamente, as sedes dos grupos e as pessoas que compõem os grupos. Além de
possibilitar a interação entre observador (a) e o conjunto de mulheres que formam a
AMMTRAFAS. A opção pela observação participante se fez pela necessidade de maior
conhecimento e apropriação da realidade e das pessoas em estudo, a observação se deu de
forma descritiva, focando aspectos considerados relevantes para o contexto da pesquisa como,
por exemplo: as condições de organização dos grupos de mulheres da AMMTRAFAS
(físicas, econômicas, contingente de membros); a existência de vários grupos de mulheres em
comunidades próximas umas das outras; a relação estabelecida entre os grupos e as
associações de moradores em suas comunidades, entre outras questões.
A amostra adotada para aplicação dos questionários foi representativa e contemplou
50% do total de mulheres de cada grupo da AMMTRAFAS. A amostragem foi por
conveniência, ou seja, as mulheres eram convidadas a responderem ao questionário e sem que
houvesse um critério rígido elas iam se disponibilizando de acordo com a vontade de cada
uma. A tabela 1 representa os grupos da AMMTRAFAS que acessaram o PAA e o PNAE em
2015 e o percentual de questionários aplicados por grupo.

22
Disponível em: <http://www.mda.gov.br> Acesso em: 23 mar. 2015.
23
A carta de aprovação do projeto pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UEFS está disponível em anexo.
33

Tabela 1 – Percentual de questionários aplicados por grupos de mulheres da


AMMTRAFAS durante o trabalho de campo – Santaluz/Bahia/Brasil (2015)

Nome Nº de mulheres Questionários Percentual


do grupo por grupo aplicados (%)
Mulheres de Garra 7 3 42,8
Mulheres Virtuosas 19 9 47,3
Mulheres de Fibra 27 13 48,1
Mulheres de Força 8 4 50
Mulheres Vencedoras 6 3 50
Sabores da Caatinga 4 2 50
Mãos Artistas 4 2 50
Mulheres Sonhadoras 6 3 50
Mulheres Produtoras do Rose 20 10 50
Novo Sabor 4 2 50
Mulheres em Ação 9 5 55,5
Mão na Massa 7 4 57,1
Mulheres Artesãs de Mocambinho 5 3 60
Garra Feminina 5 3 60
Mãos que Produzem 5 3 60
Arte e Sabores 6 4 66,6
Total 16 142 73 51,4
Fonte: Trabalho de campo realizado de 05/10/2015 a 03/12/2015 – Santaluz (Bahia)
Elaboração: Silvana Maciel Pires

Foram efetuadas nove entrevistas semiestruturadas com as mulheres da


AMMTRAFAS. Elaboramos dois diferentes modelos de roteiros para serem realizados com
representantes da diretoria da AMMTRAFAS (presidente e tesoureira) e outras mulheres
lideranças dos grupos da AMMTRAFAS, especialmente, das comunidades de Calumbi,
Ferreiros, Lagoa Escura, Morro dos Lopes, Mocambinho, Rose e Várzea da Pedrinha. As sete
mulheres das comunidades supracitadas e que foram também entrevistadas, caracterizam o
equivalente a pouco mais de 40% (43,75) do total dos grupos investigado. Através das
entrevistas com as lideranças desses grupos observaram-se questões muito comuns em relação
às experiências vivenciadas por cada um deles (dificuldades, perspectivas e impressões) assim
como, também, questões dissociáveis mesmo estando inseridas em um universo que as unem
e representam como a AMMTRAFAS. É importante destacar também que a entrevista com as
mulheres contribuiu para entender a concepção das mulheres em relação às ações
desenvolvidas pela AMMTRAFAS para beneficiar os grupos e os resultados dos programas
PAA e PNAE para a melhoria das condições de vida dessas trabalhadoras rurais.
A proposta da entrevista com a diretoria da AMMTRAFAS visou identificar as
estratégias de atuação do movimento no município que tem por objetivo organizar os grupos
34

de mulheres para acessarem os programas PAA e PNAE, conhecer a história de formação do


movimento, suas principais motivações e objetivos e identificar seus parceiros de luta.
O Estatuto da AMMTRAFAS - conjunto de normas acordadas entre as trabalhadoras
rurais associadas para orientar o funcionamento da associação - foi utilizado no intuito de
construir uma caracterização da associação de mulheres rurais (estrutura organizacional,
objetivos, metas e ações) que, em 2010, passou da condição de MMTR-Santaluz para
AMMTRAFAS.
O georreferenciamento foi pensado para se obter as coordenadas da superfície terrestre
no local específico onde os grupos de produção estão situados e onde realizam suas atividades
de produção, visando localizá-los geograficamente nas comunidades rurais do município e
sistematizar essas informações através de mapas, demonstrando a espacialização da
AMMTRAFAS em Santaluz e a abrangência de grupos de mulheres beneficiadas com os
programas PAA e PNAE.
O diário de campo, um caderno de anotações, constituiu um instrumento tão importante
a essa pesquisa quanto os demais instrumentos. Nele foi possível registrar as informações que
eram consideradas importantes durante a realização dos trabalhos de campo. Informações
fornecidas pelas mulheres da AMMTRAFAS, observações de fatos relevantes ao contexto da
pesquisa, tudo isso a partir do contato e da interação com os grupos.
Todo esse arcabouço culminou na sistematização dos dados (quadros, tabelas, gráficos,
mapas e transcrições) proporcionando, dessa forma, a realização de descrições, ilustrações,
análises e reflexões propostas nesta dissertação.
35

CAPÍTULO 2

ASSOCIAÇÃO DO MOVIMENTO DE MULHERES


TRABALHADORAS RURAIS DA AGRICULTURA FAMILIAR
DE SANTALUZ BAHIA (AMMTRAFAS): ORIGEM E
PARTICULARIDADES

Fonte: Silvana Maciel Pires (2015)

É, portanto, em favor de todas as mulheres brasileiras que escrevemos, é a sua geral


prosperidade o alvo de nossos anelos, quando os elementos dessa prosperidade se acham
ainda tão confusamente marulhados no labirinto de inveterados costumes e arriscadas
inovações.

Nísia Floresta
36

2.1 Trajetória de formação da Associação do Movimento de Mulheres Trabalhadoras


Rurais da Agricultura Familiar de Santaluz (AMMTRAFAS)

A Associação de Mulheres (AMMTRAFAS) surgiu por iniciativa das trabalhadoras


rurais do então MMTR Santaluz que atuava no município desde a década de 1990. A
AMMTRAFAS é constituída, portanto, de mulheres que atuam desde a sua origem até
aquelas que participam a menos de uma década e frequentemente mais e mais mulheres vão se
inserindo à entidade, contribuindo para que ela cresça cada vez mais.
Através das mobilizações sociais, conferências, passeatas de reinvindicações e reuniões
organizadas por entidades como a Igreja Católica, o Sindicato Rural (STR) e o Movimento de
Organização Comunitária (MOC), no município ou mesmo na região, as mulheres rurais de
Santaluz passaram a ter visibilidade no contexto político social e toda essa dinâmica
estimulou e fortaleceu a organização das mulheres local.
É necessário relacionar o surgimento do MMTR em Santaluz às diversas experiências
políticas, econômicas e sociais que se efetivaram naquele final de século no contexto
nacional, pois, acredita-se que de alguma forma tais fatos interferiram também no contexto
local. O Brasil, ao final do século XX, passou por transformações que marcaram,
consideravelmente, a sociedade brasileira e que a professora Dagnino (2004) denominou de
processo caracterizado por uma confluência perversa. Tinha-se de um lado um projeto político
pautado na democracia participativa24 e por outro lado um projeto neoliberal que se apoiava
na defesa de um Estado mínimo marcado pela ausência de responsabilidades sociais.
A crescente mobilização dos movimentos sociais, nesse período, em suas diversas
expressões (movimentos de mulheres, negros, homossexuais, urbanos, rurais, da floresta etc.)
e, independente de suas demandas específicas, contribuiu para o fortalecimento e a construção
de uma sociedade mais crítica e democraticamente participativa. No entanto, isso não
significa que todas as experiências de formação de movimentos de mulheres no Brasil, por
exemplo, tenham obedecido a uma única motivação, mas, de compreender que há
semelhanças nos processos e no contexto de suas formações, muito embora persistam as
diferenças e especificidades. Nesse sentido, concorda-se com Bardalo (2011) quando ela
afirma que o percurso construído pelos movimentos de mulheres desperta para “a necessidade
de se conciliar as dimensões que envolvem o seu cotidiano e as possibilidades locais de
engajamento e organização com este cenário político mais amplo.” (BARDALO, 2011, p. 10).

24
A Constituição de 1988 constitui o marco legal desse processo.
37

A emergência do Movimento de Mulheres Trabalhadoras Rurais do Nordeste (MMTR-


NE), por exemplo, data de meados da década 1980, a partir das trocas de experiências e
reflexões levantadas por trabalhadoras rurais de dois estados do Nordeste, Pernambuco e
Paraíba25. Experiências desse tipo foram significativas, porque inseriram mais
expressivamente as mulheres rurais na luta por direitos sociais, no cenário político do país e
orientou a organização de diversas outras iniciativas pelas mulheres no nordeste.
A trajetória do MMTR-NE se construiu a partir da necessidade das mulheres em discutir
e propor ações que as conduzissem rumo à superação das dificuldades enfrentadas no
contexto das relações de gênero no âmbito da vida privada e do espaço público. A partir de
então o movimento foi se fortalecendo, contribuindo para que em 1986 o MMTR-NE fosse
consolidado e mais tarde passou a se estender pelos demais estados nordestinos, apoiando e
fortalecendo outras iniciativas de grupos organizados (MMTR-NE, 2015).
É interessante destacar a influência que teve o MMTR-NE para os demais movimentos de
mulheres do nordeste do Brasil, porque é um movimento que estipulou como metas o reforço
à participação consciente das mulheres trabalhadoras rurais nas relações que se estabelecem
cotidianamente entre mulheres e homens; a construção de mecanismos para ampliação da
participação das trabalhadoras rurais nos espaços públicos no âmbito estadual, regional,
nacional e latino americano; discussão, planejamento e trabalho com a organização produtiva,
articulando-se com as questões que envolvem gênero e as políticas de governo para o campo
(MMTR-NE, 2015).
Tendo tais metas como propostas de ação, é justificável a abrangência que obteve o
MMTR no Nordeste, pois, é um movimento que na sua trajetória vem lutando pela superação
das desigualdades percebidas e vivenciadas no âmbito do trabalho, da moradia, da
convivência familiar e coletiva das mulheres. Atualmente, o MMTR-NE encontra-se
estruturado de forma que compreende coordenações municipais e estaduais, estabelecendo
assim uma unidade regional.
Histórias de êxitos como essa chegaram ao conhecimento das mulheres no Território do
Sisal e, associada às dinâmicas sociais do lugar, contribuíram para provocar, naquelas que já
estavam articuladas, a necessidade de consolidação e intensificação da luta e, para aquelas que
ainda não se encontravam organizadas, despertou a necessidade de reunir e criar uma
organização que de fato as representassem e da qual elas fossem protagonistas de uma
construção política.

25
Disponível em: www.mmtrne.org.br Acesso em: 03/03/2015.
38

A partir da década de 1980, diversos MMTR passaram a fazer parte da esfera política nos
espaços rurais do Estado da Bahia. Segundo Firmo (2010), ao tratar da organização política
das mulheres na Bahia e em especial as dos municípios pertencentes ao Território do Sisal, há
“registros da organização de suas lutas no início da década de 80 com os clubes de mães, mas
também na mesma década surgem os primeiros Movimentos de Mulheres Trabalhadoras
Rurais (MMTR), em Araci e Retirolândia” (FIRMO, 2010, p. 27). A autora ainda ressalta
que:

Nos anos 2000, as organizações de mulheres do território foram ampliadas,


hoje existem além dos MMTR‟s, os Coletivos de Mulheres dos Sindicatos
dos Trabalhadores/as Rurais a Rede de Produtoras da Bahia e as dezenas de
Empreendimentos Econômicos Solidários formados por Mulheres, de forma
articulada essas organizações passaram a ter maior representatividade no
cenário político baiano e nacional, ocupando espaços como os Conselhos
Municipais, Territoriais, Estadual e Nacional. (FIRMO, 2010, p. 28)

Nota-se que o processo de criação e fortalecimento das organizações de mulheres na Bahia


foi crescente, multiplicando-se as perspectivas de participação política das trabalhadoras
rurais que outrora não existia. A reflexão que se faz, nesse sentido, é que a formação do
movimento das trabalhadoras rurais em Santaluz caracterizou-se como uma forma que elas
encontraram para radicar um espaço de poder, no qual pudessem pensar sobre questões que
lhes eram específicas e realizar projetos que fossem de seus interesses. A necessidade de
organização política, associada a questões como a construção da autonomia, a formação de
lideranças femininas, a valorização do trabalho da mulher e a melhoria das condições de vida
– no que diz respeito a renda e à superação da cultura de opressão da mulher - representaram
motivações que resultaram na formação dos MMTR nos municípios do Território do Sisal,
incluindo Santaluz.
A socióloga Souza-Lobo (1991)26, observou que a participação das mulheres nos
movimentos sociais nas décadas finais do século passado, tinha relação direta com
reivindicações e necessidades voltadas para suas condições de vida e suas especificidades. E,
também, que “[...] a participação das mulheres nos movimentos políticos foi determinada pela
necessidade de abrir novos espaços para a prática política, face aos limites institucionais
impostos pela ditadura militar durante os anos 70. [...]” (SOUZA-LOBO, 1991, p. 8).

26
SOUZA-LOBOO, Elizabeth. O gênero da representação: movimento de mulheres e representação política no Brasil (1980-
1990). Revista Brasileira de Ciências Sociais. Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais, n.
17, ano 6, out. de 1991.
39

A emergência das mulheres nos movimentos sociais de modo geral ou na formação de


movimentos feministas e de mulheres, além de estar relacionada a reivindicações que
buscavam garantir os direitos dessa parcela da população, também, garantiu a visibilidade
delas como pessoas politizadas capazes de questionar, participar, debater e formular questões
de políticas públicas para a sociedade.
Desde a origem do MMTR-Santaluz que as mulheres sinalizavam as dificuldades
enfrentadas por elas em gerar renda a partir do seu trabalho. Ou seja, a criação do movimento
significava a possibilidade de afirmação de um espaço próprio a ressignificação das atividades
produtivas realizadas por elas no campo e, logo, a probabilidade de realização de um trabalho
mais valorizado, que garantisse uma renda equivalente. Segundo depoimento de uma das
militantes do movimento, a dificuldade com a renda foi, também, um dos fatores que
fortaleceu a organização do movimento porque:

Desde quando eu comecei a acompanhar o movimento já ouvia essa história


delas, que desde 1990 elas já se reuniam. E aí quando elas começaram a se
engajar mesmo, elas sentiam essa dificuldade da questão da geração de
renda. Como cada uma das mulheres já desenvolviam alguma coisa, umas
faziam crochê outras faziam o aió27 e outras faziam o chapéu, cada uma
delas produziam lá nas comunidades delas e quando elas saiam para as
reuniões, elas levavam as peças que elas produziam para lá mesmo elas
venderem (...). Depois, foi surgindo essas ações de está incentivando a
questão da criação, da formação desses grupos de produção. Como elas já
trabalhavam muito essa questão da geração de renda, da autonomia, daí a
gente começou (...). (Representante da AMMTRAFAS, 2015)28

A declaração da representante da AMMTRAFAS retrata a preocupação das mulheres


em gerar renda e como elas buscaram em suas práticas cotidianas utilizar de tais habilidades
(técnicas de costura) para superar essa falta de recurso financeiro. Expressa ainda, que a
autonomia da mulher passa pela independência financeira, sendo que a formação dos grupos
de produção nas comunidades era visto como uma possibilidade de aumentar a renda e
valorizar sua condição de trabalhadora rural.
Se a autonomia delas estava relacionada a própria geração de renda, a expectativa das
mulheres era que, através do movimento, seu trabalho tivesse uma visibilidade maior para a
sociedade, ressignificando aquelas atividades que já desenvolviam há muitos anos nas

27
Bolsa típica do nordeste brasileiro, onde se guarda qualquer coisa. Uma espécie de bolsão.
28
Entrevista concedida por representante da AMMTRAFAS em 15 out. 2015 (33 anos de idade). Entrevistadora: Silvana
Maciel Pires.
40

comunidades onde moravam, como o crochê, produção de artigos em palha como chapéus e
esteiras, em tecido como o aió e o fuxico29, pintura em tecido e a produção de alimentos.
A luta das mulheres por autonomia perpassa, também, o fato de seu trabalho ser pouco
valorizado no contexto rural. Por isso que a existência do movimento de mulheres deve ser
abordada também “(...) na perspectiva da construção de sua emergência como grupo, coletivo
personalizado, em luta por reconhecimento e direitos” (MOTA, 2006, p. 340). A categoria
„movimento de mulheres trabalhadoras rurais‟ se configura enquanto condição para reuni-las,
seja pelas experiências de vida, trabalho e/ou espaço de vivência. Para Elisabeth Souza-Lobo

[...] A formulação das demandas, das reivindicações coletivas, passa pela


construção de uma ideia de direitos, pelo reconhecimento dos direitos de um
grupo, pela consideração a experiências coletivas que estão na origem dos
grupos. As pesquisas efetuadas sobre a formação dos clubes de mães
mostram o processo de construção das identidades de grupo: as mulheres se
reconhecem a partir de uma atividade tradicional, como o tricô ou a costura.
(SOUZA-LOBO, 1991, p. 8-9)

O cotidiano e as experiências de vida das mulheres são características comuns que


fizeram e ainda fazem parte da formação dos movimentos de mulheres no Brasil. Tais
questões agregam o grupo e fortalecem o coletivo no sentido de refletirem sobre o contexto
social onde estão inseridas e de como agir para buscar os meios necessários às melhorias de
suas condições de vida.
No entanto, com o passar do tempo o MMTR de Santaluz desestabilizou-se pela
ausência e desânimo das próprias mulheres. Uma situação que elas justificam ter ocorrido
pela falta de apoio de outras entidades, porém, deve-se considerar para além dessa questão,
diversos outros obstáculos enfrentados pelo movimento que não tinha, por exemplo, uma sede
específica para as reuniões e encontros do grupo, a distância entre as comunidades rurais e as
dificuldades de transportes, a intransigência dos companheiros que muitas vezes reprovavam
a luta das mulheres, só para citar alguns. Como afirma o relato:

Ao longo dessa caminhada o movimento enfraqueceu, porque muitas delas


desistiram. Só que assim, antes a gente tinha mais projeto que apoiava essa
participação nos espaços. Tinha um projeto pela equipe de gênero do MOC
que sempre tinha os recursos para fazer as reuniões municipais, para pagar
alimentação, passagens dessas mulheres. Então tinha aquele recurso certo,
mensalmente, pra fazer essas atividades. Com o passar do tempo o projeto
acabou, porque projeto é período, aí foi ficando assim desmotivado, só se
reunia quando a regional chamava – porque além de ter os municipais tem o
29
Técnica artesanal que aproveita restos de tecido para transformá-los em acessórios (colchas, toalhas de mesa, bolsas,
bijuterias entre outros). Consiste em pequenas trouxinhas de panos, costuradas em círculos recortados de sobra de tecidos.
41

movimento regional – aí esse regional chamava para fazer as reuniões


mensais a cada dois meses, para ver como é que estava a situação de cada
município. Depois, foi surgindo essas ações de está incentivando a questão
da criação, da formação desses grupos de produção. Como elas já
trabalhavam muito essa questão da geração de renda, da autonomia, daí a
gente começou... (Representante da AMMTRAFAS, 2015)30

A desmotivação das mulheres se dava muitas vezes pela falta de recursos que
custeassem ou garantissem a participação sobremaneira delas nas atividades do movimento:
reuniões, encontros de formação e troca de experiências. Ainda, de acordo com a fala de uma
das representantes da AMMTRAFAS, a partir dos incentivos para a formação dos grupos de
produção (discussões efetuadas juntamente com o Sindicato dos Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais – Santaluz) o movimento se reestabeleceu, tendo a autonomia da mulher
como um fator preponderante para a caminhada do movimento.
A consolidação do MMTR em Santaluz contribuiu para que se rompesse com a
concepção das mulheres associada à esfera da vida privada, fazendo com que o movimento se
fortalecesse e tivesse um alcance mais abrangente, tanto espacial considerando os limites do
município quanto da representação social e política. Sendo assim, formar um movimento de
mulheres naquele contexto significava se impor enquanto mulheres trabalhadoras rurais, na
expectativa de que seus direitos sociais fossem, acima e tudo, reconhecidos e atendidos. Mas,
as mulheres não deixaram de atuar em outras esferas de ação social, continuaram somando
esforços, forças e atuando como parte fundamental em ações organizadas pelo próprio
Sindicato Rural do município e/ou pelas associações de moradores das comunidades, para
citar alguns exemplos.
No intuito de ver seus objetivos materializados, as mulheres transformaram o MMTR
de Santaluz em Associação do Movimento de Mulheres Trabalhadoras Rurais da Agricultura
Familiar de Santaluz - AMMTRAFAS. Observa-se, no entanto, que a identidade de MMTR se
manteve no nome, na composição e nas prioridades desta nova entidade por desejo das
próprias mulheres. Para uma representante da AMMTRAFAS, elas se identificam:

Como movimento e até hoje nós ainda somos movimento. Porque nós
reconhecemos que muito dos frutos de hoje foi da batalha de outras mulheres
anterior e se não tivesse atuação delas seria mais complicado chegar até aqui.
Então assim, a gente sabe que no futuro não estaremos, mas, virão outras e

30
Entrevista concedida por representante da AMMTRAFAS em 15 out. 2015 (33 anos de idade e 16 anos no movimento de
mulheres). Entrevistadora: Silvana Maciel Pires.
42

essas outras também tem que levar essa história. (Representante da


AMMTRAFAS, 2015)31

A institucionalização do movimento foi necessária porque dessa forma seria mais fácil
acessar projetos e programas do governo que viessem a beneficiar as mulheres, pois, os
processos de participação nessas políticas têm exigências de ordem burocrática, devendo o
movimento estar legalmente registrado como entidade jurídica para participar dos programas
de governo.
Mas, é preciso ressaltar que muitos objetivos estabelecidos no Estatuto da
AMMTRAFAS já eram desenvolvidos pelo movimento antes mesmo da sua
institucionalização, inclusive, quando a AMMTRAFAS foi registrada o movimento já contava
com onze grupos de mulheres atuando na produção de alimentos para as compras
governamentais do PAA e do PNAE.
Até o presente momento (março de 2016), a associação é uma entidade constituída
somente por mulheres, todas trabalhadoras rurais que vivem em diferentes comunidades rurais
do município e, também, de Araci município vizinho à Santaluz e que, também, constitui o
Território do Sisal. A associação conta com 22 grupos de mulheres associados,
correspondendo a 280 membros até o final do ano de 2015. A maioria são mulheres casadas,
mães de família que compõem faixas etárias entre os 19 e 60 anos de idade.
Dentre as motivações que levaram as mulheres a associarem-se à AMMTRAFAS,
destaca-se o fato da associação poder propiciar trabalho e renda para elas. Seja porque a
associação dispõe dos meios para acessar programas de governos com foco no trabalho e no
apoio aos grupos produtivos ou porque a própria associação cria estratégias que venham a
favorecer aspectos relacionados a trabalho e renda para as mulheres como, por exemplo, a
inserção delas ao mercado através da COOBENCOL e da loja Maria Bunita. Além dessa
motivação, outras podem ser observadas no gráfico 1 a seguir.

31
Entrevista concedida por representante da AMMTRAFAS em 15 out. 2015 (33 anos de idade e 16 anos no movimento de
mulheres). Entrevistadora: Silvana Maciel Pires.
43

Gráfico 1 - Motivações que orientaram a participação


das mulheres na AMMTRAFAS - Santaluz/Bahia (2015)
1%

5%
7%

12%

51%

24%

Violência contra a mulher Outra opção


Falta de ocupação Diversão/lazer
Adquirir mais conhecimento Possibilidade de trabalho e renda

Fonte: Trabalho de campo realizado de 05/10/2015 e 07/01/2016 - Santaluz /Bahia


Elaboração: Silvana Maciel Pires, 2016

O conhecimento é também um fator relevante e motivador para as trabalhadoras rurais


no contexto da associação de mulheres. A AMMTRAFAS, então, é concebida enquanto
espaço de construção de saberes diversos: conhecimentos que se relacionam ao mundo do
trabalho, da economia solidária, das relações de gênero, da participação política e da
autonomia. Concepções que são passadas ou construídas de forma coletiva compreendendo,
portanto, processos de troca e partilha das informações e que ampliam o universo do
conhecimento e as perspectivas de aprendizagens dessas mulheres.
Logo, a construção coletiva de conhecimento proporcionada pela AMMTRAFAS se
torna significativa para as mulheres porque faz referência às experiências de vida e agrega
conhecimentos acumulados a partir da vivência de cada uma delas. Ou seja, são questões e
temas que de alguma forma estão inseridos no dia a dia e na trajetória de formação dessas
mulheres.
A diversão e o entretenimento é, também, para as trabalhadoras rurais um fator de
motivação para estar na associação. Algo que está relacionado diretamente ao lazer, que é
percebido como ocupações dentro do grupo ou da associação de mulheres e fora também.
Geralmente, elas relacionam o lazer aos momentos voltadas a recreação, formação,
intercâmbios ou mesmo o trabalho coletivo que desenvolvem em suas comunidades, por
44

exemplo. Há, portanto, a compreensão de que o lazer promove bem estar, satisfação pessoal e
coletiva e proporciona felicidade às mulheres. O lazer está presente nos eventos e datas
comemorativas festejadas por elas como: os festejos juninos (junho), aniversários, dia
internacional da mulher (março), o natal (dezembro) e também nas atividades de intercâmbio
e formações que são proporcionadas através da AMMTRAFAS, que ocorrem em outros
contextos que não o do município de Santaluz.
Então, o contexto de formação da AMMTRAFAS, foi motivada pela necessidade de
organização e representação das trabalhadoras rurais na luta pelas demandas específicas de
gênero na sociedade. Dentre as demandas, a que mais se destacou foi a de trabalho e renda
para as mulheres rurais porque não se valorizava o trabalho realizado por elas, qualificado
muitas vezes como mera ajuda, “[...] o que inviabilizou durante muito tempo o
reconhecimento das mulheres como trabalhadoras e, consequentemente, a garantia de seus
direitos sociais” (SALES, 2007, p. 441).
Mas, a consolidação do movimento e, sua posterior transformação em associação,
significava muito mais que a garantia de trabalho e renda para as mulheres que se permitiram
fazer parte desse sonho. Representava diversas outras oportunidades e possibilidades de
crescimento e bem estar, concebidas por elas como espaço de diversão, construção de
conhecimento, exposição das demandas, inclusive, do combate à violência contra a mulher.

2.2 AMMTRAFAS: caracterização e estrutura

Desde o final do ano de 2010 que o movimento de mulheres (MMTR Santaluz) passou a
se chamar Associação do Movimento de Mulheres Trabalhadoras Rurais da Agricultura
Familiar de Santaluz (AMMTRAFAS) por iniciativa das mulheres que desejavam tornar o
movimento uma personalidade jurídica, com existência legal. As mulheres almejavam o
reconhecimento do movimento por parte das autoridades, sobretudo, do Poder Público.
Discutiram a proposta em diversas reuniões, realizaram uma Assembleia Geral para a criação
da associação, elaboraram o Estatuto e a Ata da Assembleia e encaminharam a documentação
para a inscrição da instituição à Receita Federal.
A AMMTRAFAS foi instituída como entidade jurídica, de natureza privada e sem fins
lucrativo em 6 de dezembro de 2010, para representar as associadas e desenvolver atividades
que estivessem relacionadas aos interesses das trabalhadoras rurais. Desde então, a entidade
passou a ter a seguinte atribuição: organizar e representar as mulheres produtoras e
45

agricultoras do município e do Território do Sisal, na prestação de assistência e serviços de


naturezas diversas, desde que promovam bem estar e qualidade de vida para as mulheres
(ESTATUTO DA AMMTRAFAS, 2010).
Para a representante da AMMTRAFAS, a necessidade de formalização da entidade era
uma emergência porque elas já vinham na ação desde muito tempo, porém, com dificuldades
de acessar projetos e programas do governo voltados às mulheres rurais. Com a associação
elas estariam, juridicamente, representadas para executar tais projetos e concorrer aos editais.
Para ela, o MMTR Santaluz caracterizava apenas uma forma de articulação das mulheres,
mas, sem uma documentação que as legitimassem enquanto entidade civil, por isso,
discutiram durante um ano sobre a possibilidade e os benefícios de transformar o movimento
em associação até que, em dezembro de 2010, optaram pela criação da associação do
movimento de mulheres.
A partir do registro da entidade, velhos e novos compromissos se apresentaram ao
movimento e, por isso, a reprodução a seguir destaca os objetivos afirmados pela
AMMTRAFAS em seu Estatuto:

a) Prestar às produtoras e agricultoras do município de Santaluz e


Território do Sisal, serviços de natureza social, educacional, cultural,
esportiva, recreativa e outros que possam contribuir para melhoria das
condições de vida das associadas. Podendo, portanto, celebrar convênios,
contrair empréstimos com órgãos públicos e/ou privado para solução de
problemas da população desta região;
b) Reivindicar e exigir dos órgãos públicos a implantação, melhorias e
reparos referentes ao desenvolvimento da infraestrutura de serviços e
equipamentos básicos necessários à qualidade de vida da população;
c) Lutar contra todas as formas de opressão e exploração que venha
atingir, direta ou indiretamente, as associadas;
d) Produzir, comprar, beneficiar ou comercializar produtos e mercadorias
visando a geração de renda das associadas;
e) Participar diretamente das políticas públicas municipal, estadual e
federal através de conselhos municipais, grupos gestores e comissões a fim
de defender os interesses das associadas;
f) Buscar apoio de entidades e órgãos públicos ou privados destinados ao
desenvolvimento das associadas;
g) Para realização dos seus objetivos a associação pode-se afiliar a outras
entidades congêneres, sem perder sua individualidade e poder de decisão;
h) A AMMTRAFAS poderá contratar serviços, celebrar convênios,
contrair empréstimos e parcerias, com projetos e programas com órgãos
públicos municipais, estaduais, federais e instituições não governamentais
nas áreas: social, educacional, cultural, esportiva, saúde, geração de renda,
agricultura familiar, lazer, habitação rural, infraestrutura, cisternas, casas e
barragens e financiamentos, dentro do limite de suas possibilidades
econômicas e financeira para executar suas atividades;
i) Prestar assistência técnica em regime de economia solidária e familiar
para que juntos tenhamos uma sociedade civil mais digna;
46

j) Promover cursos profissionalizantes as jovens e mulheres na área da


agricultura familiar. (ESTATUTO DA AMMTRAFAS, 2010, p.1 e 2)

Os objetivos discriminados no Estatuto são bem abrangentes, como se pode notar. Parte
do princípio da organização e representação das trabalhadoras rurais com a perspectiva de que
elas alcancem melhores condições de vida. A prestação de serviço de natureza diversificada
(social, educacional, cultural, esportiva, recreativa) incorporada pela associação, torna-se um
desafio constante para a entidade, devido ao tamanho da demanda – de serviços e de mulheres
a serem contempladas. Todavia, reflete a sensibilidade da instituição de perceber, da mesma
forma, que o bem estar coletivo depende de uma série de fatores (essenciais à vida) da qual
elas próprias se percebem como responsáveis.
Atividades de formação, cursos e capacitações que a AMMTRAFAS viabiliza para os
grupos de mulheres, momentos de recreação e intercâmbios são exemplos de ações
diversificadas, proporcionadas pela associação às mulheres. De acordo com o Estatuto, a
AMMTRAFAS se compromete a combater todas as formas de opressão e exploração de suas
associadas. Algo que pode ser realizado por meio do apoio e assistência às mulheres vítimas
de violência, por meio da denúncia ou da orientação para as mulheres acerca das várias
formas de manifestação da violência, dos diferentes graus de severidade e de como agir no
sentido de se defenderem.
Por isso, pensar ações do tipo, formalização de campanhas e encontros sobre o tema da
violência contra a mulher, lutar pela implantação de equipamentos de combate à violência
contra as mulheres (delegacias e casa abrigo para as mulheres vítimas da violência) e
estabelecer estratégias de acompanhamento e fiscalização do funcionamento desses
equipamentos, são na verdade possibilidades de prestação de serviços reconhecidos pela
instituição.
Em se tratando da compra e comercialização de produtos e mercadorias das agricultoras
rurais, na perspectiva de gerar renda para as associadas, a AMMTRAFAS tem de fato
cumprido com este objetivo quando compra das mulheres produtos alimentícios como a
fécula da mandioca, o beiju, o sequilho, a farinha de tapioca, ovos e frango caipira, polpa de
frutas, hortaliças, doces e outros gêneros alimentícios, para comercializar na Cooperativa de
Beneficiamento e Comercialização (COOBENCOL, da qual elas também são associadas,
inclusive, as mulheres da AMMTRAFAS assumiram a presidência da COOBENCOL desde
2014.
47

É preciso ressaltar que a AMMTRAFAS passou a fazer parte da diretoria da


COOBENCOL a partir do convite da ASCOOB Itapicuru que administrava unicamente a
cooperativa. Esse convite foi proposto após a tentativa da AMMTRAFAS de também criar
uma cooperativa de comercialização no município que beneficiasse as produtoras rurais,
especialmente, aquelas da AMMTRAFAS. Como está previsto no Estatuto da associação, ela
pode se tornar membro ou sócia de outras entidades congêneres, sem perder sua
individualidade e poder de decisão (ESTATUTO DA AMMTRAFAS, 2010). Nesse sentido,
foi estabelecida essa parceria que se direciona à geração de renda no contexto da agricultura
familiar.
Na cooperativa são comercializados alimentos produzidos por agricultores e
agricultoras de Santaluz e de outros municípios da Bahia como, a fécula da mandioca que
vem de Conceição do Coité32 e a cachaça produzida no município de Abaíra33. Em sua
maioria, os alimentos são provenientes do próprio município e são produzidos pelos grupos de
mulheres da AMMTRAFAS. A figura 2 retrata alguns desses alimentos comercializados pela
COOBENCOL.

Figura 2 - Produtos da agricultura familiar comercializados pela COOBENCOL


Santaluz/Bahia/Brasil (2015)

Fonte: Trabalho de campo realizado 05/10/2015 a 07/01/2016 – Santaluz/Bahia


Imagens: Silvana Maciel Pires e Luciana Santos de Matos

32
Município pertencente ao Território de Identidade do Sisal, que faz limite com Santaluz estando distante desta 49 km.
33
O município de Abaíra pertence ao Território de Identidade Chapada Diamantina e está distante de Santaluz 478 km.
48

A AMMTRAFAS também apoia e trabalha com grupos de mulheres que desenvolvem


artesanatos e na perspectiva de proporcionar a geração de renda para esses grupos, a
associação criou a Loja Maria Bunita34, inaugurada em 26 de agosto de 2011. A loja da
AMMTRAFAS reflete a organização e a luta da associação de mulheres no intuito de ter um
espaço próprio no centro da cidade para expor e comercializar os produtos criados e
produzidos pelas agricultoras. A AMMTRAFAS contou com o apoio de parceiros como o
MOC, o STR de Santaluz, a ASCOOB Itapicuru e a COOPEREDE para abrir e manter, nos
primeiros meses, a sua loja.
A loja Maria Bunita simboliza, portanto, uma oportunidade de trabalho, de renda e de
qualificação profissional para essas mulheres. Nos dois primeiros anos, as mulheres
comercializaram na loja tanto alimentos como peças de artesanato, somente a partir de 2014 a
AMMTRAFAS decidiu pela separação desses itens: alimentos passaram a ser
comercializados através da COOBENCOL e o artesanato através da loja. Os artigos em
artesanato são de diversos tipos, produzidos em couro, palha, sisal, cipó, madeira, tecido entre
outros, produzidos por mulheres de Santaluz e demais municípios35 do Território do Sisal
como Araci e Tucano.
Recentemente, em 2015, a AMMTRAFAS criou a logomarca da sua loja, como mostra
a figura 3 - Loja Maria Bunita.

Figura 3 – Logomarca da loja da AMMTRAFAS – Santaluz/Bahia/Brasil (2015)

Fonte: Trabalho de campo realizado de 05/10/2015 a 07/01/2016


Figura: AMMTRAFAS

34
A loja Maria Bunita está localizada na Rua Rio Branco s/n, Cep 48880-000 Centro de Santaluz/Bahia.
35
Municípios do interior da Bahia pertencentes ao Território de Identidade do Sisal e distante de Santaluz 52 km e 116 km,
respectivamente.
49

É interessante destacar a identidade e referência que assume a proposta da logomarca da


loja da AMMTRAFAS ao relacionar o nome a uma personalidade feminina do nordeste que
viveu no final do século XIX e início do século XX - Maria Bonita36 - uma das mais
importantes personagens do movimento do Cangaço37 que existiu na região nordeste do
Brasil.
A figura 4 retrata alguns dos artigos comercializados na loja Maria Bunita: panos de
prato, descanso de panelas, cestos de vários tamanhos, arranjos de flores, bonecas, aió,
carteiras de mão, sandálias de couro, chapéu, camisetas, entre outros.

Figura 4 - Artigos em artesanato comercializados na loja Maria Bunita da


AMMTRAFAS – Santaluz/Bahia/Brasil (2015)

Fonte: Trabalho de campo realizado de 05/10/2015 a 07/01/2016 – Santaluz/Bahia


Imagens: Jaqueline do Carmo Cunha

36
Maria Gomes de Oliveira (1911-1938), mais conhecida como Maria Bonita, participou do movimento social denominado
de Cangaço ocorrido no sertão nordestino, entre o século XIX e início do XX. Ela foi companheira de Virgulino Ferreira da
Silva (o Lampião) líder do Cangaço e foi a primeira mulher a entrar no movimento. Disponível em:
<www.eunapolis.ifba.educa.br> Acesso em 10 mar. 2016.
37
O Cangaço foi motivado por disputas entre famílias poderosas e pela falta de perspectiva de ascensão social na região
marcada pela miséria. Cangaceiro era o nome usado para designar bandos de camponeses pobres que habitavam o sertão
nordestino, vestindo roupas de couro, chapéus e utilizando armas como carabinas, revólveres e facas. Disponível em:
<www.eunapolis.ifba.educa.br> Acesso em 10 mar. 2016.
50

Quanto à constituição organizacional da AMMTRAFAS, a entidade funciona a partir da


formação dos seguintes órgãos:

Figura 5 - Fluxograma organizacional da diretoria da AMMTRAFAS/2015

Diretoria Executiva

Conselho Fiscal
Presidente 1ª Secretária 1ª Tesoureira
3 titulares

Vice presidente 2ª Secretária 2ª Tesoureira 3 suplentes

Fonte: Estatuto da AMMTRAFAS (2010), Santaluz/Bahia


Elaboração: Silvana Maciel Pires, 2016

As Comissões constituem também outro órgão que compõem a Diretoria Executiva,


porém, serão criadas comissões somente quando assim for necessário e suas competências
serão estabelecidas em Assembleia Geral. A Diretoria tem mandato de 2 anos podendo ser
reeleita, desde que com renovação obrigatória de 30% de seus componentes.
Representam instâncias de ação e de tomada de decisão na entidade, as reuniões
mensais da Diretoria, a Assembleia Geral Ordinária da AMMTRAFAS que se realiza uma vez
por mês (sendo esta composta por uma representante de cada grupo) e uma vez por ano
sempre no mês de dezembro com todas as mulheres da associação, para prestação de contas
das atividades exercidas naquele ano e planejamento das atividades do ano seguinte. Também,
podem ocorrer Assembleias Extraordinárias caso seja julgado conveniente, pois, essa não tem
uma periodicidade definida.
A AMMTRAFAS conta com recursos financeiros procedentes das mensalidades pagas
por todos os grupos de produção associados, além de recursos oriundos da comercialização
dos produtos que são vendidos na cooperativa COOBENCOL e na loja Maria Bunita. Os
grupos de mulheres associados à AMMTRAFAS repassam mensalmente um valor
equivalente a R$ 10,00 (os grupos que trabalham apenas com uma modalidade de produção,
exemplo: alimentação ou artesanato) e R$ 20,00 (os grupos que trabalham com as duas
51

modalidades de produção, exemplo: alimentação e artesanato) para associação de mulheres.


Tanto a COOBENCOL quanto a Loja Maria Bunita compram os produtos das agricultoras
associadas à AMMTRAFAS para revenderem.
Sobre a participação da AMMTRAFAS nos espaços de discussão e elaboração de
propostas de políticas públicas no município, destacam-se sua representatividade nos
Conselhos de Segurança Alimentar (neste momento em construção), Conselho de Educação, e
o Conselho de Desenvolvimento Rural, todos no âmbito municipal. No que diz respeito à
integração da AMMTRAFAS em espaços de ação política, em uma escala espacial mais
abrangente que a municipal, aponta-se para sua participação no MMTR-Regional e no Comitê
Territorial de Mulheres (CTM)38. Este último, foi criado em maio de 2010 para discutir
propostas de políticas públicas para as mulheres e o enfrentamento à violência contra a
mulher numa perspectiva territorial e, surgiu da necessidade de ter um espaço de articulação e
fortalecimento das mulheres no território.

38
O CTM do Sisal foi fomentado a partir do Movimento de Organização Comunitária (MOC) e se legitima enquanto fórum
de discussão e capacitação específico para as mulheres e para fomentar ações de intervenção nas políticas públicas que
atendam especialmente suas demandas, seus direitos (OLIVEIRA, 2012). Não está ligada à uma esfera do poder público,
mas, à sociedade civil.
52

CAPÍTULO 3

TERRITORIALIDADE, MOVIMENTO SOCIAL E POLÍTICAS


PÚBLICAS: PERSPECTIVAS TEÓRICAS PARA ANALISAR A
AÇÃO DA AMMTRAFAS

Fonte: www.elfikurten.com.br (2014)

“Que o espaço se torne, cada vez mais, o espaço de toda sociedade, e não o espaço do capital,
que oprime e explora.”

Milton Santos
53

3.1 Território e territorialidade como elementos constitutivos das relações sociais

Ao buscar a sistematização de forma coerente das categorias geográficas para análise e


compreensão das relações sociais existentes no espaço do município de Santaluz - que se dá
por influência da ação de agentes como a associação de mulheres, o poder público e outros
agentes sociais (associações comunitárias) – é que consideramos necessário discorrer sobre
espaço (de forma breve), território e territorialidade.
O espaço geográfico somente é definido como tal quando existe uma ação humana em
interação com os demais elementos que também constituem a natureza e que se exerce por
objetivos previamente definidos, como por exemplo, a subsistência da espécie humana.
Consequentemente, sociedade e natureza constituem elementos fundamentais à construção,
transformação ou mesmo reorganização do espaço.
Especificamente, na obra Por uma Geografia Nova, Santos (2008) define o espaço como
um conjunto de formas representativas de relações instituídas por diferentes sociedades em
contextos do passado e do presente, entendendo que estas relações se manifestam por meio de
processos e funções. O espaço interpretado como campo de manifestação de forças com
diferentes intensidades. Para o autor, isso explica “porque a evolução espacial não se faz de
forma idêntica em todos os lugares” (SANTOS, 2008, p. 153). Ainda, segundo ele, o espaço
através de suas características e pelo seu funcionamento, pelo que ele oferece e recusa às
pessoas, é consequência de práticas coletiva de reprodução das relações sociais, evoluindo
sempre pelo movimento da sociedade total (SANTOS, 2008).
A compreensão à qual Milton Santos chegou a partir da análise da categoria espaço, no
contexto da Geografia, o define enquanto conjunto indissociável de sistemas de objetos e
sistemas de ações. Segundo o autor, “O espaço é formado por um conjunto indissociável,
solidário e também contraditório, de sistemas de objetos e sistemas de ações, não
considerados isoladamente, mas como o quadro único no qual a história se dá. (...)”
(SANTOS, 2009, p. 63).
Ou seja, o espaço se consolida a partir da interação de sistemas de objetos e sistemas de
ações. Um sistema condiciona o outro em uma dinâmica que cria, recria e transforma o
espaço. A perspectiva proposta pelo autor é a de considerar para a análise do espaço
geográfico, o resultado conjunto dessa interação, já que sugere não considera-los
isoladamente, de modo que essa forma de perceber o espaço possa explicar a multiplicidade e
a diversidade de situações e processos que estão envolvidos na sua constituição. Assim, ainda,
analisa Saquet (2008) a respeito da concepção de Milton Santos: “O trabalho e as técnicas
54

ganham centralidade em sua argumentação; o homem é o sujeito, as técnicas, a mediação e o


espaço é um produto histórico” (SAQUET, 2008, p. 77).
Objeto é tudo aquilo que a humanidade, em muitos casos, constrói visando a sua
utilização em algum momento da vida ou mesmo cotidianamente, serve para mediar,
dinamizar as relações sociais e expressa significação, ou seja, adquire sentido. Por isso
mesmo, os objetos tem papel importante na produção do imaginário das pessoas, interferindo
na redefinição da sociedade e do espaço. Santos (2009) estabelece que o enfoque geográfico
para o estudo dos objetos deve considerar a existência deles através de sistemas, pois, “(...)
sua utilidade atual, passada ou futura vem, exatamente, do seu uso combinado pelos grupos
humanos que os criaram ou que os herdaram das gerações anteriores. (...)” (SANTOS, 2009,
p. 73). Por isso, os objetos apresentam uma representação simbólica, mas, também funcional.
A ação, no entanto, caracteriza um comportamento que é próprio do ser humano, refere-
se a um agir. Portanto, terá sempre consequências para as relações sociais ou socioespaciais,
influenciando inclusive a construção e projeção dos objetos e sistemas de objetos.
Não se deve confundir o conceito de território com o de espaço como lembra Andrade
(2004). No entanto, é preciso compreender que a perspectiva de território aqui adotada o
caracteriza enquanto um espaço que é definido (fração do espaço) e delimitado por
manifestação de relações de poder, aproximando-se da definição consolidada por Souza
(2005, p. 78)39. Saquet (2008, p. 76) afirma que: “Há, para nós, uma relação de unidade entre
espaço e território, porém, correspondendo a dois níveis e processos sócio-espaciais distintos
de nossa vida cotidiana e a dois conceitos diferentes no pensamento científico. Este é um
debate que envolve questões de ordem epistemológicos e ontológicos”.
O espaço geográfico abrange a totalidade da vida social, enquanto que o território
limita-se a uma porção do espaço condicionada essencialmente a partir das relações de poder
ali existentes. O poder é, assim, condição primeira para a constituição de um território.
Partindo desse princípio, é preciso definir qual concepção de poder se tem como referência,
pois, cada autor ao refletir sobre território traz consigo expressões da manifestação do poder,
que podem divergir ou complementar a reflexão pretendida.
Desde já, parte-se do pressuposto que, os movimentos sociais são expressões de poder
da sociedade civil, já que quando organizados agem num contexto de correlações de forças
sociais (GOHN, 1997). Diante disso e tendo em vista a experiência da AMMTRAFAS, uma
organização social que visa representar e lutar pelos direitos de uma categoria (trabalhadoras

39
“O território, objeto deste ensaio, é fundamentalmente um espaço definido e delimitado por e a partir de relações de poder
(...)” (SOUZA, 2005, p. 78). Grifos do autor.
55

rurais) no município, acredita-se que as relações de poder se instauram e são exercidas em


diferentes contextos da sociedade, bem como, por diferentes agentes – ainda que em
intensidades variáveis.
As relações de poder e as lutas sociais se estabelecem cotidianamente em espaços
definidos e motivadas por interesses específicos. Porém, Foucault (1979) vem alertar para esta
questão do poder que, antes, relacionava-se ou mesmo limitava-se a algumas esferas da
sociedade - as instituições econômicas e, sobretudo, a autoridade do Estado. Mas, essas não
eram as únicas esferas da vida em sociedade onde se exercia poder, pois, o poder também se
manifestava de diferentes formas naqueles contextos sociais tidos como desprovidas deste
fundamento: a periferia, as instituições penais, os hospitais psiquiátricos, entre outros
exemplos. É nessa perspectiva que a análise das relações de poder, aqui consideradas, busca
dialogar com as concepções teóricas elaboradas por Michel Foucault a partir da obra
Microfísica do Poder (1979).
A reflexão posta pelo autor faz referência aos mecanismos de exercício do poder que
podem sim ocorrer em diferentes espaços e contextos que envolvem toda a sociedade. Pois, o
poder é relativo e produto das relações instituídas, logo, é pela convivência e nas relações
efetivadas que ele se manifesta. Por isso acredita-se que “[...] o poder não se dá, não se troca
nem se retoma, mas se exerce, só existe em ação, como também da afirmação que o poder não
é principalmente manutenção e reprodução das relações econômicas, mas acima de tudo uma
relação de forças” (FOUCAULT, 1979, p. 175).
Mas, é preciso analisar que o preceito foucaultiano de poder, permeado por este
conjunto de relações sociais e sendo exercido por diferentes agentes, considera a possibilidade
de que as escalas de ação do poder serão, por conta disso, igualmente diferenciadas. O poder
concebido como ação exequível, seja por pessoas individualmente, instituição ou organização
social, envolve, por conseguinte, diferentes processos de afirmação. Isto é, as dimensões de
manifestação das relações de poder variam de acordo os sujeitos, o tempo e o contexto
espacial.
Isso significa que, se os interesses e os objetivos particulares de cada um é o que move
uma dada ação, e se pensarmos em uma sociedade movida por interesses divergentes em
espaços comuns, é possível verificar as relações de poder que aí se afirmam (pois haverá
obviamente o conflito) e qual melhor se sustenta. Para sustentar uma ideia, um interesse ou
uma determinada demanda, é preciso recursos e estratégias que representem as relações de
poder. Sendo assim, é válido destacar que:
56

o poder não é alguma coisa que se adquire (...); o poder se exercita a partir
de inumeráveis pontos e no jogo de relações desiguais e móveis; as relações
de poder são, contemporaneamente, intencionais e não subjetivas; onde há
poder há resistência (...). Isto significa o caráter estritamente relacional das
relações de poder (FOUCAULT, 1979, p. 83-85).

Ressalta-se aí o caráter relacional das formas de manifestação do poder, pois, a


sociedade é constituída de relações conflituosas, variáveis e diversificadas intencionalmente.
Destarte, são relações que decorrem das experiências realizadas no/com espaço apropriado
onde se vive e trabalha.
As trabalhadoras rurais mantém diferentes relações com o espaço rural, tanto como
morada quanto local de trabalho, o que lhes conferem uma experiência assídua com esse
espaço, seja na perspectiva social, cultural ou econômica. O espaço rural representa em
essência todo um modo de vida, é a condição e ao mesmo tempo resulta das relações que aí se
revelam. Quando as mulheres de uma comunidade rural resolvem, organizadas em grupo,
participarem de uma associação de mulheres de representação municipal, há a possibilidade
de maior ação e fortalecimento do movimento pelas próprias mulheres da comunidade, o que
significa uma forma de territorialização do movimento, ou seja, consolidar mais um limite de
ação da AMMTRAFAS no município. Observa-se dessa forma que

[...] Sem dúvida, sempre que houver homens em interação com um espaço,
primeiramente transformando a natureza (espaço natural) através do
trabalho, e depois criando continuamente valor ao modificar e retrabalhar o
espaço social, estar-se-á também diante de um território, e não só de um
espaço econômico: é inconcebível que um espaço que tenha sido alvo de
valorização pelo trabalho possa deixar de estar territorializado por alguém.
Assim como o poder é onipresente nas relações sociais, o território está,
outrossim, presente em toda a espacialidade social – ao menos enquanto o
homem também estiver presente. (SOUZA, 1995, p. 96, grifos do autor)

Trata-se, portanto, de perceber como território aquele espaço que, além de ser
delimitado, é apropriado por uma ou mais pessoas que, estando em interação, cria valor e
significação para as relações e para a fração de espaço na qual se vive, interage.
De acordo com Raffestin (1993, p. 143), é imprescindível a compreensão de que o
espaço existe antes mesmo que o território, pois, a formação deste último só acontece a partir
do espaço, e “(...) é o resultado de uma ação conduzida por um ator sintagmático (ator que
realiza um programa) em qualquer nível. Ao se apropriar de um espaço, concreta ou
abstratamente (por exemplo, pela representação), o ator “territorializa” o espaço”. Quer dizer
que, o território se caracteriza por ser a porção de espaço onde ocorre e se conforma uma
57

ação, um trabalho. Por isso, o autor afirma que como consequência o território vai revelar as
relações marcadas pelo poder.
Para o autor, ainda, a formação do território pressupõe a existência de um espaço social,
organizado e transformado pela ação da sociedade. As relações e as práticas sociais se
configuram enquanto sistemas de ações e comportamentos que vão se tornando perceptíveis
através do aparecimento dos nós e redes espaciais. Logo, o Estado, uma empresa, uma
organização social ou as pessoas individualmente, quando instalam-se em determinados
espaços, produzem territórios, pois, “Todos nós elaboramos estratégias de produção, que se
chocam com outras estratégias em diversas relações de poder” (RAFFESTIN, 1993, p. 153).
E, nessa perspectiva, a territorialidade pode ser definida “como um conjunto de relações que
se originam num sistema tridimensional sociedade-espaço-tempo em vias de atingir a maior
autonomia possível, compatível com os recursos do sistema”, segundo Raffestin (1993, p.
160).
Para Brito (2006), o território é uma categoria geográfica construída historicamente,
podendo ser apreendido através das ações humanas empreendidas por certos agentes sociais e
que podem ser, em sua maioria, mensuradas a partir da investigação dos sistemas de objetos
(cidades, indústrias, rodovias, etc.), dos sistemas de ações (normas relacionadas às relações
sociais, de produção e de trocas) e também da cultura. Observa-se, na reflexão do autor, a
relevância do tempo e da ação humana para análise do território, passando pela compreensão
de que este se forma a partir da dinâmica dos diversos agentes sociais (pessoas, sociedade
civil, empresas, poder público) estabelecida por meio dos sistemas que compõem a sociedade:
objetos, ações e a cultura.
A territorialidade, segundo Brito (2006), é o resultado das relações sociais realizadas
por esses agentes mencionados anteriormente, porém, mediadas pelo poder e, quando
projetadas numa dada porção do espaço, configura-se o território. Logo,

[...] a territorialidade humana aparece como o conjunto de relações mediadas


pelo poder entre os distintos agentes sociais (Estado, empresas, instituições
sociais e cidadãos) que se interessam por algum objeto comum localizado
numa dada porção do espaço geográfico. A territorialidade implica a
capacidade desses agentes de produzirem e/ou organizarem sistematicamente
os territórios, segundo um projeto orientado por um agente hegemônico
(BRITO, 2006, p. 116).
58

A territorialidade, portanto, expressa a complexidade de relações sociais que são


permeadas pelo entendimento do que seja o poder. E que esta territorialidade se constitui a
partir de algum foco ou interesse dos agentes envolvidos em um determinado contexto.
Partindo para mais uma contribuição acerca da temática, apresentamos também a
compreensão proposta por Saquet (2010) sobre a territorialidade, pois, segundo ele:

[...] A territorialidade é um fenômeno social, que envolve indivíduos que


fazem parte de grupos interagidos entre si, mediados pelo território;
mediações que mudam no tempo e no espaço. Ao mesmo tempo, a
territorialidade não depende somente do sistema territorial local, mas
também de relações intersubjetivas; existem redes locais de sujeitos que
interligam o local com outros lugares do mundo e estão em relação com a
natureza. O agir social é local, territorial e significa territorialidade.
(SAQUET, 2010, p. 115)

A partir desta concepção do autor é possível fazer uma relação com as ações da
AMMTRAFAS no município de Santaluz: é uma associação que se estabeleceu
territorialmente abrangendo-se para diversas comunidades rurais (22 povoados) e institui
relações intersubjetivamente. Tais relações orientam a ação do movimento no intuito de tecer
redes de relações e cooperação tanto na escala local, entre as comunidades, quanto na escala
regional, através de outras organizações como MMTR Regional, a COOPEREDE e o MOC,
por exemplo.
Interessa, ainda, a essa análise as considerações de Haesbaert (2005) sobre a
multiterritorialidade, porque propõe discutir a complexidade dos processos de (re)
territorialização em que a sociedade se insere, percebendo esses processos como múltiplos
territórios – multiterritorialidade. Nesse sentido ele analisa a desterritorialização como um
mito, algo inexistente. Para Haesbaert (2005) estes processos de multiterritorialização
precisam ser compreendidos especificamente porque relacionam perspectivas políticas
inovadoras.
O autor associa o território a poder, no sentido concreto da dominação, ou seja,
funcional e no sentido simbólico da apropriação, que relaciona-se ao vivido. De acordo com
ele, “(...) todo território é, ao mesmo tempo e obrigatoriamente, em diferentes combinações,
funcional e simbólico, pois, exercemos domínio sobre o espaço tanto para realizar funções
quanto para produzir significados” (HAESBAERT, 2005, p. 6776).
A perspectiva de Haesbaert chama atenção nesse processo de reflexão e aplicação do
conceito de território porque, para além de reconhecer o sentido relacional do território, parte
dessa apreensão para afirmar que o território inclui também o movimento e a fluidez
59

(HAESBAERT, 2011). Nessa perspectiva, “(...) o território e a territorialização devem ser


trabalhados na multiplicidade de suas manifestações – que é também e, sobretudo,
multiplicidade de poderes, neles incorporados através dos múltiplos agentes/sujeitos
envolvidos. (...)” (HAESBAERT, 2005, p. 6776).
Portanto, este autor propõe uma reflexão sobre o território que considere as relações
mediadas pelo poder e espacialmente delimitadas, associada à possibilidade da existência
mútua de múltiplos territórios em um mesmo espaço, protagonizados, em alguns casos, pelos
mesmos agentes ou por agentes diversos. A subjetividade dos agentes, tanto no âmbito
individual quanto no coletivo, é também uma característica considerada na análise do autor.
Ressaltada através dos referenciais simbólicos manifestados no decorrer das relações sociais,
nos processos de apropriação do espaço e, logo, nas formas de consolidação dos territórios.
Ou seja, as estruturas sociais/territoriais revelam particularidades relacionadas às experiências
do pensar e do agir das pessoas.
Coelho Neto (2010) ao propor discutir sobre a emergência e atuação das redes de
coletivos sociais organizados no Território de Identidade do Sisal (Bahia), também faz uma
reflexão acerca do conceito de territorialidade. Ele entende que a territorialidade pode ser
concebida como uma relação que se estabelece entre a sociedade e o espaço, e que isso
implica uma apropriação material e/ou simbólica, de forma que assegura a reprodução da vida
material (COELHO NETO, 2010). Logo, “[...] A territorialidade manifesta-se, portanto, no
fortalecimento da organização e participação política, na inserção ao sistema produtivo e na
(re) construção da identidade regional, condições que, imbricadas constroem novos horizontes
para os sujeitos territoriais” (COELHO NETO, 2010, p. 343).
Assim, pode-se dizer que a territorialidade se manifesta na atuação dos coletivos
organizados, quando considera os espaços instituídos por essas organizações (seja para
discutir, planejar ou elaborar alguma ação) como local de fortalecimento e construção de
identidade. A organização, a participação e a identidade são fatores geradores de nexos ou
redes de cooperação, no que ele chama de espaço-referência, que no contexto do movimento
de mulheres aqui analisado, pode ser o próprio município e também o próprio Território de
Identidade. De acordo com o autor: “[...] As redes nesse sentido jogam no caminho da
construção da territorialidade” (COELHO NETO, 2010, p. 343).
Mas, é preciso elucidar que tal entendimento resultante das análises deste autor, não
quer dizer que a territorialidade deixa de existir quando não há tal mobilização social e
política. Na verdade ele esboça algumas perspectivas interpretativas para o fenômeno de
formação de redes de coletivos sociais organizados e suas estratégias de ação no território do
60

Sisal. A compreensão que se tem a esse respeito, é que ele estabeleceu uma possibilidade de
apreensão dessas relações instituídas naquele contexto, mas, que não é a única forma de
interpretação possível para a realidade (COELHO NETO, 2010).
O entendimento que se elabora a partir dessa compreensão de territorialidade, através da
AMMTRAFAS no município, é justamente a possibilidade de a associação de mulheres ser
um agente social capaz de construir novas territorialidades, tendo em consideração sua
organização, suas demandas e suas estratégias de ação.

3.2 As desigualdades de gênero e a luta dos movimentos de mulheres

As desigualdades sociais existentes no Brasil tem relação direta com as desigualdades


de gênero e raça. Assim afirmam estudos elaborados pelo Ipea (2008, 2011) 40 a partir da
análise de dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), realizada pelo
IBGE e que dispõe de informações sobre a situação social brasileira de brancos, negros,
homens e mulheres.
O estudo do Ipea propõe traçar o perfil da desigualdade social a partir das variáveis
gênero e raça/cor porque acredita que essas variáveis contribuem para a consolidação da
desigualdade social brasileira. Segundo o Instituto (Ipea, 2011): “Não há, nesta afirmação,
qualquer novidade ou qualquer conteúdo que já não tenha sido insistentemente evidenciado
pela sociedade civil organizada e, em especial, pelos movimentos negro, feminista e de
mulheres, ao longo das últimas décadas. ” (IPEA, 2011, p. 7), pois, são muitas as denúncias
que indicam as condições de vulnerabilidade que expõe mulheres e negros impossibilitando as
suas participações de forma equitativa nos diversos contextos da vida social.
Voltando basicamente para a questão de gênero, esse termo passou a ser utilizado como
categoria de análise, principalmente, a partir das feministas na segunda metade do século
passado, com objetivo de teorizar a questão da diferença sexual (SOIHET, 1997). Porém, isso
não significa que até este período não tivesse existido outras propostas de discussões acerca
das desigualdades de gênero no contexto da sociedade brasileira, mas, foi principalmente a
partir da década de 1950 que se buscou entender de forma mais específica as consequências
das relações de gênero estabelecidas social, cultural e espacialmente para as diversas

40
Retrato das desigualdades de gênero e raça. 3ª edição (IPEA, 2008), e Retrato das desigualdades de gênero e raça. 4ª edição
(IPEA, 2011).
61

sociedades. Acontecimentos internacionais41 intensificaram e estabeleceram as bases para o


debate sobre questões envolvendo gênero na sociedade mundial, sobretudo, na segunda
metade do século XX como, por exemplo, a Conferência Mundial do Ano Internacional da
Mulher na Cidade do México (1975) e as Conferências Mundiais da Mulher em
Copenhague/Dinamarca (1980), em Nairobi/Quênia (1985) e em Beijing/China (1990).
Então, a compreensão que se tem a respeito dos movimentos feministas da segunda
metade do século XX é que eles objetivavam tornar a mulher visível para a sociedade, já que
à mulher atribuíam-se papéis de caráter mais subalternos. Logo, o termo gênero surge com
maior expressão, principalmente, no âmbito acadêmico e como uma categoria relevante à
compreensão dos papéis definidos para homens e mulheres, tendo como referência seu reflexo
nas diferentes formas de organização da sociedade, seja cultural ou espacialmente falando. A
referência de que se tem conhecimento acerca do termo gênero no universo acadêmico,
atribui-se às feministas americanas que buscaram acentuar o caráter social das distinções
baseadas no sexo e, “[...] foi proposto por historiadoras que acreditavam que a pesquisa sobre
as mulheres transformaria fundamentalmente os paradigmas da disciplina [...]” (SOIHET,
1997, p. 101).
No contexto da sociedade brasileira as abordagens referentes ao termo gênero não são
tão recentes quanto o que parece. De acordo com os relatos existentes na história do Brasil, e
da qual se tem sistematizado até o momento, a temática de gênero aparece inicialmente na
primeira metade do século XIX, principalmente a partir das obras da escritora Nísia Floresta
Augusta Brasileira42 (COSTA, 1998). Mas, é a partir do Movimento Feminino pela Anistia
(MFPA) que teve início em 197543, em São Paulo, que a questão se estende às demais capitais
brasileira, segundo Peres (2009).
É nesse sentido que Soares (1994) afirma que os movimentos de mulheres que nasceram
no Brasil, na década 1970, foram responsáveis por apresentar “(...) uma nova versão da
mulher brasileira, que vai às ruas na defesa de seus direitos e necessidades e que realiza
enormes manifestações de denúncia de suas desigualdades”. (SOARES, 1994, p. 13). A
influência de ações a nível mundial, associada à realidade de exclusão e subordinação na qual

41
Para contextualizar a origem das discussões sobre a categoria gênero consultar: Rosa Ester Rossine (1988), Isabel
Margarida André (1990), Elisabeth Souza-Lobo (1991), Celi Pinto (1992), Vera Soares (1994), Cristina Bruschini (1994),
Rachel Soihet (1997).
42
Educadora, escritora e poetisa nascida em 1810 no Rio Grande do Norte. Considerada uma pioneira do feminismo no
Brasil. O livro Direitos das mulheres e injustiça dos homens (1832) foi sua primeira obra escrita, e o primeiro no Brasil a
tratar dos direitos das mulheres à instrução e ao trabalho. Disponível em: http://www.semira.go.gov.br/post/ver/148219/nisia-
floresta-brasileira-augusta. Acesso em 22/12/2014.
43
Foi o Ano Internacional da Mulher organizado pela ONU e muitas mulheres representando várias partes do mundo foram
ao México, sede da Conferência Internacional da Mulher. Na tribuna paralela, Therezinha de Godoy Zerbini lê um
documento onde expressa a importância da anistia para o Brasil. (PERES, 2009, p. 101)
62

as mulheres brasileiras viviam, fez despontar naquele período com maior efervescência, a luta
das mulheres por igualdade de gênero. Logo, os movimentos de mulheres e feministas foram
assim como outros movimentos sociais no Brasil nos anos finais do século XX, precursores
também do processo de redemocratização do país, pautando questões que interessavam de
modo geral a população, como o acesso aos direitos e a cidadania para as mulheres.
A categoria gênero também foi valorizada no contexto da Geografia, principalmente a
partir de meados da década de 1980, quando a componente gênero passou a ser utilizada para
evidenciar que “[...] a organização social e territorial engloba diferenças consideráveis entre
homens e mulheres e que as relações entre ambos são um elemento estruturador importante da
sociedade [...]” (ANDRÉ, 1990, p. 334). Para a autora, esse seria um motivo importante para
que as pesquisas e discussões envolvendo gênero não fossem restringidas ao espaço da vida
privada.
É nessa perspectiva, que se faz necessário apontar e analisar, por exemplo, as
desigualdades de gênero que se apresentam ainda na nossa sociedade. O Ipea divulgou, na sua
última edição, o retrato das desigualdades de gênero e raça existentes na sociedade brasileira.
No tópico sobre pobreza e desigualdade de renda, os dados são apresentados segundo o
rendimento médio do trabalho e de todas as fontes com base na renda domiciliar per capita
(IPEA, 2011)44. Dessa forma, o Instituto afirma que em 2009, a renda da mulher branca
correspondia a 55% da renda média dos homens brancos; já as mulheres negras permanecem
bem isoladas na base da hierarquia social “sua renda média equivalia a 18% dos rendimentos
percebidos pelos homens brancos, em 1995, e chega a 30,5% em 2009” (IPEA, 2011, p. 35).
A figura 6 demonstra a posição das mulheres brancas e negras em relação à distribuição da
renda em comparação com os homens brancos e negros.

44
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Retrato das desigualdades de gênero e raça. 4 ed. Brasília: Ipea, 2011.
63

Figura 6 - Distribuição de renda segundo sexo e cor no Brasil – IPEA 2011

Fonte: Retrato das desigualdades de gênero e raça. 4ª edição, Ipea, 2011.

Dados da PNAD (2009) confirmam, portanto, as desigualdades de gênero e raça no


Brasil, através da representação dos rendimentos acima de R$ 500,00. Rendimentos de
homens e de pessoas brancas estão acima dos rendimentos de mulheres e pessoas pretas. E
evidencia a dupla discriminação sofrida pelas mulheres negras em relação ao mercado de
trabalho, que além de representarem um percentual bem abaixo dos homens ocupam as
atividades minimamente valorizadas. Apesar de a sociedade brasileira avançar em relação ao
estabelecimento dos direitos de forma igualitária para homens e mulheres, a partir da
promulgação da Constituição de 1988, e, embora, existam instituições formais45 que atuem na
perspectiva de fazer valer os direitos das mulheres ou mesmo para combater as desigualdades
de gênero, elas ainda sofrem pelas condições de vida a qual são submetidas. E, a divisão do
trabalho na sociedade brasileira é uma das formas onde as desigualdades de gênero e raça se
tornam mais perceptíveis, dado que:

[...] A inserção das mulheres nesta realidade é, no entanto, marcada por


diferenças de gênero e raça. Além de estarem menos presentes do que os
homens no mercado de trabalho, ocupam espaços diferenciados, estando
sobrerrepresentadas nos trabalhos precários. Ademais, a trajetória feminina
rumo ao mercado de trabalho não significou a redivisão dos cuidados entre
homens e mulheres, mesmo quando se trata de atividades remuneradas, o
que pode ser percebido pela concentração de mulheres, especialmente
negras, nos serviços sociais e domésticos. (BRASIL, 2011, p. 27).

45
Conselhos Municipal e Estadual dos Direitos das Mulheres, Secretaria de Políticas para as Mulheres, Delegacia da Mulher.
64

Assim sendo, incentivar a inclusão da mulher no mercado de trabalho democratizar o


seu acesso considerando suas especificidades e diversidades, é fator preponderante que supõe
transformações fundamentais para os padrões de sociabilidade que existem no país.
A realidade das mulheres de Santaluz em relação à ocupação nos setores de atividades
de trabalho caracteriza-se de forma que afirma e fortalece o contexto das desigualdades de
gênero que se apresentam no Brasil. Ao comparar e analisar dados de ocupação por setores de
atividades, constata-se que: 59,8% das mulheres com 16 anos ou mais de idade se ocupam em
atividades de serviços, enquanto 33,6% estão na agricultura e 6,6% na indústria. Já os homens
estão distribuídos de forma que: 44,5% estão ocupando em atividades na agricultura, 30,9%
setores de serviços e 24,6% ocupam o setor de atividade de indústria (IBGE, 2010) 46. É
importante ressaltar ainda, que esses 33,6% das mulheres ocupadas na agricultura pode não
retratar de forma concreta a realidade, visto que muitas das atividades desempenhadas por
elas nesse contexto são interpretadas meramente como ajuda.
Além de ser uma expressão marcante da sociedade brasileira, a desigualdade é ainda
mais acentuada em algumas regiões do país como no Nordeste e no Centro-Oeste, “que
apresentaram coeficientes de Gini47 (respectivamente 0,557 e 0,556) maiores que a média
nacional (0,540). Entre os segmentos populacionais, há maior desigualdade entre os negros e
a população rural” (IPEA, 2011, p. 35). Isso mostra quanto os diferentes fatores geradores das
desigualdades sociais no Brasil quando associados à variável gênero se tornam ainda mais
agravantes para a sociedade brasileira de modo geral.
Outro fator que revela as desigualdades de gênero na sociedade brasileira diz respeito à
violência contra a mulher, que revela que 70% dos crimes contra mulheres ocorrem no âmbito
doméstico e que os agressores são geralmente pessoas do convívio afetivo das vítimas como
os maridos, pais ou irmãos (BAHIA, 2008). Dados do Ipea (2011) também confirmam que as
mulheres enfrentam, com mais intensidade, a violência no espaço doméstico. Tais condições
de existência e desigualdades sociais a qual as mulheres são submetidas, tem sido a causa para
que coletivos de mulheres organizadas (movimentos sociais, associações, ONGs etc.) se
estabeleçam e se fortaleçam na luta pela superação das condições de submissão e
subordinação social.
É através dos coletivos organizados que as mulheres discutem e planejam estratégias de
ação e transformação dessa realidade. Espaços, muitas vezes, de formação política e cultural,
46
Dados do censo demográfico do IBGE (2010). Disponível em: <http://www.cidades.ibge.gov.br/bahia|santaluz|sistema-
nacional-de-informacao-de-genero-uma-analise-dos-resultados-do-censo-demografico-2010> Acesso em: 25 jan. 2016.
47
O Índice de Gini, criado pelo matemático italiano Conrado Gini, é um instrumento para medir o grau de concentração de
renda em determinado grupo. Ele aponta a diferença entre os rendimentos dos mais pobres e dos mais ricos e varia de 0
(perfeita igualdade) a 1(completa desigualdade). (IPEA, 2011, p. 35).
65

constituem inclusive, o cenário que fomenta a elaboração de projetos de políticas públicas


para a sociedade. A contribuição dos movimentos de mulheres é fundamental para o debate e
a inserção da perspectiva de gênero nas políticas públicas, pois, elas pautam demandas
próprias de suas realidades (trabalho e renda, combate à violência contra a mulher, saúde,
educação são alguns dos principais temas abordados).

3.2.1 Movimentos sociais: percepções teóricas e reflexões sobre a espacialidade das ações
coletivas

Para pensar sobre a possibilidade de compreensão dos movimentos sociais como


agentes atuantes de uma sociedade, é preciso ter em mente algumas questões que justificam e
fundamentam a existência desses agentes como, por exemplo: as motivações, as formas de
organização, suas ações, a contribuição dos movimentos para o desenvolvimento da
democracia no país, a concepção de movimento e de democracia que regem suas práticas.
Nesse sentido, Silva (2013) apoia-se na referência da socióloga Gohn (2007) para dizer
que é preciso delimitar o entendimento que se tem a respeito do que são os movimentos
sociais, pois, podem se apresentar como movimentos conservadores e movimentos
progressistas. Sendo que, os conservadores negam as possibilidades de mudanças sociais de
caráter emancipatório e prezam pela manutenção dos padrões atuais ou impõem mudanças
que estejam de acordo com seus interesses particulares. Enquanto que os movimentos sociais
de perspectivas progressistas atuam de acordo o diagnóstico da realidade construindo
propostas com vistas à inclusão social (SILVA, 2013).
Por isso mesmo, é pertinente especificar que a concepção de movimentos sociais
apreciada para este trabalho parte da perspectiva progressista que acredita na construção de
uma sociedade mais justa. No entanto, a busca por esse modelo de sociedade não virá por
meio do consenso, pois, se a sociedade é diversa em sua constituição assim também serão os
processos que a tornará mais igualitária para todas (os), carregados de tensões e conflitos.
Para Porto-Gonçalves (2003), analisar as relações sociais do ponto de vista dos conflitos
estabelecidos é reconhecer a necessidade de se admitir processos teórico-metodológicos que
contribuam para interpretar as ordens sociais constituídas. Segundo o autor: “[...] A
conflitualidade se revelaria, assim, rica de possibilidades teóricas e, porque não dizer,
políticas. É nela que as bifurcações possíveis se tornam reais ou não” (PORTO-
GONÇALVES, 2003, p. 267).
66

Significa, então, que todo movimento social carrega consigo a possibilidade de


promover uma nova ordem, de criar uma expectativa sobre novas proposições e novas
relações socialmente instituídas. Consequentemente, esta situação provoca nos conservadores
daquela ordem específica, uma rejeição aos movimentos sociais, atribuindo-lhes uma
qualidade pejorativa de desordeiros. Por isso, os conservadores de determinadas
ordem/desordem procuram assim, “desenvolver estratégias discursivas de criminalização dos
que contestam a (sua) ordem como se só houvesse uma ordem possível – a sua” (PORTO-
GONÇALVES, 2003, p. 268). O autor não faz uma distinção entre movimento progressista e
conservador, apenas dispõe sobre a sua concepção de movimentos sociais, de modo que seu
entendimento perpassa a noção de que todo movimento social é, de alguma forma, portador
de uma nova conformação social.
Em se tratando da realidade brasileira, Silva (2013) justifica que os movimentos sociais
– enquanto ações sociais coletivas – ocorrem por consequência principalmente da existência
de injustiças sociais no país, a exemplo da desigualdade na distribuição da riqueza nacional,
da segregação espacial presentes no espaço rural e no espaço urbano, da consolidação da
desigualdade racial e de direitos. O que refletiu na constituição dos movimentos com
formulação de uma agenda com perspectivas de ação progressista, emancipatória.
Tendo a Sociologia como referência, ressaltamos as contribuições da professora Gohn
(1997) que compreende o movimento social como sujeito coletivo e, nesse sentido, afirma que
o mesmo não pode ser pensado fora de seu contexto histórico e conjuntural. A condição de
sujeito social coletivo faz com que o movimento vivencie processos de socialização da
identidade e dos interesses comuns, construídos dentro de um determinado contexto.
Assumindo o risco de cometer equívocos - como ela mesma indica - Gohn (1997) se esforça
para formular um conceito que pudesse explicar a teoria dos movimentos sociais. À vista
disso, a autora afirma que:

Movimentos sociais são ações sociopolíticas construídas por atores sociais


coletivos pertencentes a diferentes classes e camadas sociais, articuladas em
certos cenários da conjuntura socioeconômica e política de um país, criando
um campo político de força social na sociedade civil. As ações se estruturam
a partir de repertórios criados sobre temas e problemas em conflitos, litígios
e disputas vivenciados pelo grupo na sociedade. As ações desenvolvem um
processo social e político-cultural que cria uma identidade coletiva para o
movimento, a partir dos interesses comuns. Esta identidade é amalgamada
pela força do princípio da solidariedade e construída a partir da base
referencial de valores culturais e políticos compartilhados pelo grupo, em
espaços coletivos não institucionalizados. Os movimentos geram uma série
de inovações nas esferas pública (estadual e não estatal) e privada;
67

participam direta ou indiretamente da luta política de um país, e contribuem


para o desenvolvimento e a transformação da sociedade civil e política [...]
(GOHN, 1997, p. 251).

Ou seja, os movimentos sociais desenvolvem ações de cunho social e político e por isso
mesmo, tais ações assumem uma perspectiva de transformação da sociedade. Outra questão
importante, fruto dessas ações, está relacionada com a problemática do conflito social, uma
vez que, através das ações empreendidas os movimentos podem ou não expressar poder e,
desse modo, geram um campo de correlação de forças na sociedade. A autora citada refere-se,
ainda, a capacidade dos movimentos sociais em gerar solidariedade e coesão social, mobilizar
ideias e valores e, gerar saberes e aprendizados coletivos, afirmando que esses saberes
decorrem de suas práticas cotidianas.
Dagnino (2001) lembra que foi com a transição do regime autoritário para um Estado de
Direito no Brasil, que surgiu um contingente expressivo de movimentos sociais com a
pretensão de contribuir para a efetivação da democracia no país. Dentre esses, podemos citar
as organizações de direitos humanos, movimentos urbanos, associações comunitárias,
Comunidades Eclesiais de Base ligadas à Igreja Católica, movimentos de mulheres, de negros,
entre outros. A expectativa gerada com o fim da Ditadura Militar e a promulgação da
Constituição Brasileira de 1988 significou um resgate do sentido de participação, como meio
e recurso fundamental do processo de construção democrática.
A Constituição de 1988 assegurava institucionalmente a possibilidade real de
construção e implantação de uma cidadania no Brasil, através da participação da sociedade
nas decisões políticas. A própria constituição já garante essa participação do povo brasileiro,
conforme o artigo 1º da Constituição Federal: “Todo o poder emana do povo, que o exerce
por meio de representantes eleitos ou diretamente48, nos termos desta Constituição”
(BRASIL, 1988, grifo nosso).
A trajetória recente e intensa dos movimentos sociais fez com que as pessoas se
reconhecessem como capazes (através de uma organização coletiva) de pensar, discutir e
deliberar ações de políticas públicas em parceria com o Estado, para a construção da
democracia brasileira. Assim também aconteceu com as associações comunitárias, em
especial, que representam uma escala local e reflete em parte essa realidade, pois, passaram
segundo Santos (2010), a desempenhar um papel mais ativo no sentido de propiciar maior

48
Grifo nosso para evidenciar a instituição da possibilidade legal da participação popular, além de outros mecanismos
previstos também pela Constituição como o plebiscito, o referendo e a iniciativa popular disposto no capítulo 5 dos direitos
políticos da Constituição de 1988 que fazem referência à participação direta da sociedade nas decisões políticas.
68

participação das pessoas em relação à gestão municipal, sobretudo, através da formação dos
conselhos de gestão. Nesse sentido, é válido destacar que:

O associativismo figura como possibilidade de resolução de problemas ou de


melhoria das condições de vida. Mas é necessário entender que podem
existir estratégias montadas para que essa participação sirva para outros
interesses, não potencializando a participação dos seus membros e os
resultados conseguidos podem ser apenas elementos que resolvem
problemas imediatos, sem alteração das condições estruturais que causaram
tais problemas. (SANTOS, 2010, p. 35)

Por se tratar de uma forma de organização coletiva, o associativismo pode pressupor


melhorias nas condições de vida de seus associados ou, simplesmente, não trabalhar a serviço
da comunidade, sendo usada como recurso para outros interesses que não o coletivo. Essa
observação é justamente pelo fato de se perceber a associação como um agente capaz de
interferir na realidade, podendo assim também, funcionar com outras formas de organização
coletiva como os movimentos sociais.
Para citar um exemplo do espaço rural, Santos e Silva (2010) ao tratar das organizações
do espaço rural, destacam as associações como agentes capazes de reorganizar o espaço e
dinamizar os fluxos em diversas escalas quando realizam seus projetos, suas demandas. Por
isso mesmo, elas ampliam seu poder de relacionamento com os demais agentes assumindo,
inclusive, significativa importância para as decisões referentes à organização do espaço rural
onde atuam.
A perspectiva de Scherer-Warren (1999), quando discorre sobre o tema associação, a
compreende como “[...] formas organizadas de ações coletivas empiricamente localizáveis e
delimitadas, criadas pelos sujeitos sociais em torno de identificações e propostas comuns
como melhoria da qualidade de vida, defesa dos direitos de cidadania etc.” (SCHERER-
WARREN, 1999, p. 15).
Pode-se afirmar, portanto, que a associação é uma das formas de expressão do
movimento social, porém, constitui um eixo estruturador juridicamente formalizado da luta de
um coletivo. Uma associação como a AMMTRAFAS, por exemplo, caracteriza-se como uma
organização social que faz parte de movimentos sociais mais amplo de luta pelos direitos
sociais das mulheres e trabalhadores rurais.
A valorização da diversidade societal versus a tendência ao reducionismo e a
monopolização da representação assim como, a busca de formas de cooperação, de autogestão
da economia e a emergência de novos valores de solidariedade, reciprocidade e
69

comunitarismo (SCHERER-WARREN, 1996), são algumas das principais orientações ou


particularidade que definem como novos49 os movimentos sociais da atualidade. As
organizações sociais deixam de agir de forma fragmentada e passam a agir em conjunto,
articuladas em rede.
Para Coelho Neto (2014), “[...] as redes assumem duas perspectivas distintas, como
forma organizacional ou como estratégia de ação e de inter-relação com outros poderes
instituídos, em face das possibilidades de estabelecimento de relações mais horizontalizadas,
descentralizadas e democráticas. [...]” (COELHO NETO, 2014, p. 139). As redes, portanto,
representam os vínculos que os agentes sociais (individual ou coletivamente) estabelecem
com vistas à conquista de seus objetivos. Essa articulação em rede é possível a partir do
momento em que os agentes envolvidos compartilham de interesses que lhes são comuns ou
similares, então, quando se analisa as articulações estabelecidas entra a AMMTRAFAS e
outros agentes no município ou no Território, é preciso considerar os elementos que orientam
tais articulações.
Todas essas circunstâncias - desde a abertura política que possibilitou maior
engajamento social das pessoas, a diversidade de demandas dos movimentos sociais, a
institucionalização de formas coletivas de colaboração e articulação dos agentes sociais, entre
outras – contribuíram para uma reconfiguração no cenário do associativismo civil no Brasil,
quando proporciona a criação de espaços de interlocução entre o Estado e a sociedade
organizada (GOHN, 2013). Além do que:

Passou-se a enfatizar a responsabilização dos cidadãos, das empresas e dos


órgãos governamentais nas novas políticas públicas; criaram-se espaços para
a participação nessas políticas via parcerias ou nos espaços criados
institucionalmente, como os conselhos e os fóruns sociais públicos (GOHN,
2011, p. 61).

A parceria firmada entre movimentos sociais e o poder público caracteriza uma


possibilidade de a sociedade civil se fazer ativa, participativa e proposita nos processos e
debates de construção das políticas públicas, considerando que se trata de uma participação
institucionalizada que permite propor projetos para se lograr resultados.
Em nossa perspectiva, a reflexão que se pretende acerca dos movimentos sociais deve
buscar compreender, mais especificamente, as ações e as estratégias de luta desses

49
“Os Novos Movimentos Sociais (NMS) introduziram novas questões e assinalaram novas dimensões nas sociedades
modernas que passaram a ser entendidas como substitutas da antiga divisão baseada nas classes, assim como na divisão entre
capital e trabalho. (...) A nova perspectiva busca ir além das análises da inserção dos sujeitos sociais envolvidos com o
“universo dos movimentos sociais”. (PEDON, 2013, p. 63)
70

movimentos como condições que expressam sua territorialidade numa dada porção do espaço
geográfico. De acordo com Moraes (2005, p. 15): “O espaço produzido é um resultado da
ação humana sobre a superfície terrestre que expressa, a cada momento, as relações sociais
que lhes deram origem”. Atribui-se, desse modo, ao espaço geográfico um sentido de
construção social.
Se o espaço é percebido enquanto uma dimensão da realidade, é por consequência
multidimensional e deve ser considerado a partir de algumas peculiaridades que lhe são
próprias como: movimento, fixidez, processo, resultado, entre outros. Pois, a produção do
espaço ocorre pela intervenção das relações sociais no processo de consolidação da sociedade,
estando relacionada diretamente às intencionalidades de quem o produz (FERNANDES,
2005).
Sendo assim, destaca-se a análise proposta por Fernandes (2005) porque afirma que os
movimentos sociais representam mais do que formas de organização política e relações
sociais estabelecidas. A ação política dos movimentos sociais resulta de uma intencionalidade
que perpassa, necessariamente, a dimensão espacial. O referido autor compreende que:

As formas de organização, as relações e as ações acontecem no espaço. Elas


se realizam no espaço geográfico e em todas as suas dimensões: social,
político, econômico, ambiental, cultural etc. Portanto, a partir do momento
que nos propomos a realizar uma análise geográfica dos movimentos, além
da preocupação com as formas, ações e relações, é fundamental
compreender os espaços e territórios produzidos ou construídos pelos
movimentos (FERNANDES, 2005, p. 08).

Os movimentos sociais, nessa perspectiva analítica, passa pela apreensão do


espaço enquanto elemento fundamental que auxilia o entendimento da relação sociedade e
território. Ou seja, espaços e territórios constituem elementos de grande influência para os
movimentos socioterritoriais.
Movimentos sociais e movimentos socioespaciais são compreendidos por
Fernandes (2005) como um mesmo sujeito coletivo que se organiza com o propósito de
desenvolver uma determinada ação em defesa de seus interesses. O autor propõe tal
comparação objetivando evitar mal-entendido com relação ao conceito. A preocupação do
autor em analisar os espaços e territórios produzidos pelos movimentos está na possibilidade
de mapeamento das denominadas formas concretas da ação social, uma sistematização que
colabora para a reflexão geográfica. De acordo com o autor:
71

No espaço as relações sociais se materializam e se reproduzem, produzindo


espaços e territórios em movimentos desiguais, contraditórios e conflitivos.
Denominamos esses movimentos de processos geográficos, que são também
processos sociais. As relações sociais a partir de suas intencionalidades
produzem espaços, lugares, territórios, regiões e paisagens [...] Nesses
movimentos as propriedades dos espaços e dos territórios são manifestadas
em ações, relações e expressões, materiais e imateriais. (FERNANDES,
2005, p. 06)

As relações sociais são estabelecidas a partir de uma intencionalidade e se materializam


espacialmente. E neste sentido, a intencionalidade é um fator que orienta as diferentes leituras
do espaço. Para Fernandes (2005), existem movimentos sociais desde a perspectiva
sociológica e movimentos socioterritoriais ou socioespaciais na perspectiva geográfica. Há,
no entanto, particularidades que, segundo este autor, define os movimentos socioterritoriais
como aqueles que têm o território como essencial à sua existência, por exemplo, os
movimentos camponeses, os indígenas, os sindicatos. Enquanto que os movimentos
socioespaciais atuam em múltiplos espaços, mas no sentido de mediar e defender os interesses
coletivos, não necessariamente com o objetivo de reivindicar território.
A reflexão elaborada por Pedon (2013) a partir da concepção de movimentos
socioterritoriais, o reconhece como coletivo de pessoas organizadas que objetivam produzir
mudança na sociedade, que surge por influência do caráter excludente da sociedade
capitalista, e dispõe de competência para introduzir novas formas de apropriação e uso dos
territórios. Para Pedon o objetivo de um movimento socioterritorial relaciona-se a “[...]
instauração de uma nova territorialidade. Mesmo limitadas e/ou estritamente localizadas,
essas novas territorialidades implicam transformações nas relações sociais e na configuração
dos lugares. [...]” (PEDON, 2013, p. 186).
Pessoas, organizações sociais, instituições públicas ou privadas atuam dentro de
territórios definidos, e expressam territorialidades que estão ligadas às suas concepções e
modos de reprodução da vida em sociedade. Na medida em que surgem os movimentos
sociais ou socioterritoriais como prefere Fernandes (2005), que criam estratégias e firmam
relações com outros agentes, no sentido de transformar uma dada situação, tem-se aí a
implementação de novas territorialidades. O que significa que o movimento busca, através de
suas estratégias de ação, os meios necessários para se firmar, fazer conhecer seus princípios e
seus objetivos. Por isso mesmo:

Busca-se afirmar uma representação de si mesmo, como indivíduo ou grupo,


que se apropria de um espaço. Essa autodefinição constitui-se dentro de um
espaço maior, onde as relações de poder estão arranjadas de forma a dar
72

sentido ao ordenamento no território. Impor sua territorialidade, imprimir no


espaço o conjunto de seus valores, ideias e vontades faz que a conquista do
território seja um trunfo para os movimentos socioterritoriais. O espaço
torna-se trunfo ao tornar-se território, nesse processo ele é a base da criação
e recriação das experiências de resistência e transformação das relações
sociais (PEDON, 2013, p. 187).

A representação do movimento exprime a identidade do coletivo, e a conquista do


território como trunfo perpassa a luta pelo direito ao espaço de vida e de trabalho. Segundo
Pedon (2013), é dessa forma que se manifesta a territorialidade dos diversos movimentos
sociais situados no campo: através da luta e das relações estabelecidas pelos trabalhadores
rurais pelo direito de acesso a terra, pela sua permanência e pela busca de melhores condições
de sobrevivência.

3.3 Políticas públicas: perspectiva conceitual e a configuração das políticas públicas para
as mulheres no Brasil

O interesse em abordar o tema das políticas públicas passa pela necessidade de


compreensão da sua importância, suas características, sua definição e a precisão de entender
os processos de sua implementação. Destaca-se, ainda, a importância de se atribuir um
enfoque às políticas públicas voltadas à questão de gênero, pois é uma abordagem ainda muito
recente que tem sido debatida no âmbito do poder público por influência e pressão, sobretudo,
dos movimentos de mulheres e movimentos feministas50 desde o final do século passado até
os dias atuais.
A caracterização que a sociedade brasileira assumiu a partir das últimas décadas do
século XX, quando se registrou uma crescente participação das pessoas nos processos
políticos em prol da redemocratização do país e da constituição de uma cidadania no Brasil,
influenciou a própria construção do conceito de políticas públicas que Boneti (2007) defende
e que é pertinente nesse sentido evidenciar. O autor compreende as políticas públicas como
sendo:

[...] as ações que nascem do contexto social, mas que passam pela esfera
estatal como uma decisão de intervenção pública numa realidade social, quer
seja para fazer investimentos ou para uma mera regulamentação
administrativa. Entende-se por políticas públicas o resultado da dinâmica do
50
“(...) o ideário feminista, independente de sua filiação teórica ou tendência política, além de desestabilizar a lógica moldada
por mitos e estereótipos, que reforçava a discriminação das mulheres, contribuiu para a incorporação do tema da igualdade de
gênero à agenda pública e às instâncias políticas. (...)” (PRÁ; CARVALHO, 2004, p. 2).
73

jogo de forças que se estabelece no âmbito das relações de poder, relações


essas constituídas pelos grupos econômicos e políticos, classes sociais e
demais organizações da sociedade civil. [...] (BONETI, 2007, p. 74)

Portanto, são as demandas da sociedade que movem as ações de políticas públicas, que
somente se efetivam quando se instala um jogo de forças, reflexo das relações de poder
próprias dos agentes que constituem a sociedade. Dessas relações saem os direcionamentos
necessários às ações que deverão ser executadas pela administração pública, visando intervir
na realidade social. Ao final desse processo de correlação de forças, tem-se as políticas
públicas consubstanciadas em um plano de ação, que só deve ser considerado tomando como
base a sociedade, porque pressupõem um alcance social.
De acordo com Teixeira (1997), participar significa “[...] fazer parte, tomar parte, ser
parte de um ato ou processo, de uma atividade pública, de ações coletivas. (...) implica pensar
o todo, a sociedade, o Estado, a relação entre as partes entre si e com o todo. [...]”
(TEIXEIRA, 1997, p. 187). O autor compreende ainda, que esse todo não é homogêneo,
porque as partes apresentam interesses, aspirações, valores e recursos de poder que se
diferenciam. Daí o primeiro sinal de quanto as relações de poder em uma sociedade podem
ser complexas, principalmente, quando nela predominam a cultura do individualismo e da
fragmentação.
Segundo Boneti (2007), os agentes do poder que fazem parte dessa correlação de forças
na sociedade e no processo de elaboração das políticas públicas, podem ser identificados
como sendo os representantes dos grupos econômicos, das empresas, dos grupos políticos, os
agentes individuais e/ou a sociedade civil organizada. Sendo, porém, de responsabilidade do
poder público, por meio de suas instituições, por em prática as decisões.
Porém, é preciso compreender que o governo não deve ser considerado neste processo,
como um agente responsável somente pelo cumprimento das metas que são estabelecidas por
aqueles agentes outros destacados por Boneti (2007). Ao contrário, é preciso ponderar que o
próprio Governo é constituído por pessoas que representam diferentes grupos sociais, e que
esses grupos integram-se a essa esfera de poder pelo interesse de fazer valer seus interesses, já
que compreendem que ao Estado cabe a execução das políticas públicas. Por isso, os
Governos não se configuram agentes neutros no processo de construção das políticas públicas,
ele está inserido em todos os processos da elaboração à avaliação.
Assim também deve acontecer com a sociedade de modo geral. Todos os agentes devem
participar necessariamente da elaboração até a avaliação das políticas públicas, pois:
74

O caráter de uma política pública, isto é, o tipo de intervenção do Estado na


realidade social, o tipo de impacto que ela provoca nessa realidade, os
benefícios que ela produz e a quem ela beneficia, é construído durante o todo
da sua trajetória, desde o momento da sua elaboração até a sua
operacionalização, assumindo importância decisiva na formação desse
caráter a correlação de forças sociais envolvidas [...] (BONETI, 2007, p. 91).

Então, a construção das políticas públicas não deve ser pensada separadamente,
atribuindo-se responsabilidades diferenciadas aos agentes no decorrer do processo de sua
criação, mas, todos devem estar atentos e inseridos no processo por se tratar de uma
intervenção social que atinge a todos os interessados.
De modo geral, comportamentos e atitudes procedentes da sociedade influenciam na
organização das políticas públicas. Dinâmicas que se relacionam a diversos aspectos da
sociedade como a organização da produção e as relações de poder, sejam elas em escala
nacional ou global, motivam as estratégias e os interesses econômicos e sociais dos grupos
proponentes de políticas públicas em uma sociedade de dimensões capitalista (BONETI,
2007). Isso quer dizer que interesses diversos e abrangentes estão por detrás das propostas de
políticas públicas, logo, é preciso estar atento ao contexto, aos agentes e às diretrizes dessas
ações a serem implementadas.
Inserindo a este debate a contribuição do Teixeira (2002), que compreende as políticas
públicas como “[...] diretrizes, princípios norteadores de ação do poder político; regras e
procedimentos para as relações entre poder público e sociedade [...]” (TEIXEIRA, 2002, p. 2),
ou seja, perpassa também a sistematização das ações voltadas à regulação das relações entre
sociedade e Estado. O autor trata o tema das políticas públicas de forma ampla, a apreende
enquanto princípio, diretriz, regra e procedimentos que são sistematizados em documentos
como leis ou programas entre outros exemplos.
A participação como registrada anteriormente, deve ser considerada na perspectiva das
políticas públicas por se tratar de um processo importante para a interação constante dos
diferentes agentes que simbolizam as partes de um todo que é a própria sociedade,
representada através do Estado, demais instituições públicas ou privadas, agentes individuais,
movimentos sociais etc. Estas relações, complexas e contraditórias em sua essência,
demandam condições e/ou estruturas de ambos os envolvidos, a fim de tornar as ações de
políticas públicas mais eficazes.
Outra questão importante do ponto de vista das discussões sobre políticas públicas diz
respeito à convicção de que:
75

Elaborar uma política pública significa definir quem decide o quê, quando,
com que consequência e para quem. São definições relacionadas com a
natureza do regime político em que se vive, com o grau de organização da
sociedade civil e com a cultura política vigente. [...] Para serem “públicas”, é
preciso considerar a quem se destinam os resultados ou benefícios, e se o seu
processo de elaboração é submetido ao debate público (TEIXEIRA, 2002, p.
2, grifos do autor).

Esses critérios assinalados pelo autor são fundamentais, devendo ser admitidos como
base para interpretação e compreensão das políticas sociais implantadas pelos governos no
Brasil. As políticas públicas assumem uma significação que se relaciona com a necessidade
de participação social nos debates e demais processos de sua constituição. Quem define as
estratégias, quando essas deverão ser executadas e prevê um benefício para alguém ou algum
grupo especificamente, deve estar ciente dos processos de construção das políticas públicas.
Acredita-se que os questionamentos (quem, o quê, quando, com que consequência e
para quem) sinalizados pelo autor são de fato relevantes, na medida em que orientam as
análises a respeito das políticas públicas, mas, não são suficientes para a compreensão do
processo como um todo. Faltam outras questões tão importantes quanto as já estabelecidas por
Teixeira (2002), que aumentam consideravelmente as possibilidades de interpretação e
compreensão do processo de gestação e efetivação das políticas como, por exemplo: por que e
para qual recorte espacial se define tal ação. O „para quem‟ caracteriza a identificação das
pessoas que deverão ser beneficiadas com a ação de política pública, como consequência, essa
questão suscita a compreensão do „por que‟ decidir por essa ou aquela opção, também.
É preciso pensar, ainda, que programas e projetos de governo são constantemente
executados tomando como referência a dimensão espacial de atuação e realização da
sociedade. Seja do espaço rural, da floresta ou da cidade, do centro ou da periferia, do espaço
público ou do espaço privado, todas essas classificações de recortes espaciais perpassam as
agendas e os planos de ação do Governo e, de uma forma ou de outra, a ação que se realiza
nesses espaços promovem transformações de ordem estrutural e/ou simbólica cultural. Por
isso que a Geografia pode contribuir, de diferentes maneiras, para a construção e avaliação
das políticas públicas. De acordo com Serpa (2011):

Certamente se há aqui alguma especificidade do conhecimento geográfico


relativa às políticas públicas, ela está na dimensão espacial que permeia a
temática, fazendo pensar em questões como a distribuição espacial dos
programas, planos e projetos no território nacional e as desigualdades
regionais advindas da formulação e da implementação das políticas públicas
no Brasil (SERPA, 2011, p. 38).
76

Ou seja, a contribuição da ciência geográfica perpassa, também, a questão da


articulação de escalas e recortes espaciais na formulação e implementação de políticas
públicas no país, considerando para isso os diferentes níveis de atuação do governo
(municipal, estadual e federal). Em síntese, o que se deseja sinalizar a partir das reflexões de
Serpa (2011) é pensar criticamente sobre as políticas públicas e alertar para a capacidade da
Geografia nesse processo de reflexão. Porque, através dela é possível valorizar a dimensão
espacial dos problemas e demandas da população, bem como da ação pública na sociedade.
De modo geral, pode-se afirmar a partir das discussões estabelecidas, que as políticas
públicas são ações de intervenção concreta numa realidade que se dá por intermédio da
administração pública - por Governos específicos - envolve necessariamente a participação
coletiva dos agentes que constituem a sociedade, surgem com a proposta de suprir
necessidades que dizem respeito à sociedade em suas diferentes dimensões (social, cultural,
econômica) e, por isso mesmo, seus processos de elaboração e implementação incitam
relações conflituosas.
Por isso, também, a necessidade de os projetos de políticas públicas contemplarem as
relações de gênero. O primeiro Plano Nacional de Políticas para as Mulheres (I PNPM) foi
construído com o objetivo de enfrentar as desigualdades entre mulheres e homens no Brasil e
reconhece o papel fundamental do Estado, através de ações e políticas públicas, no combate a
estas e outras desigualdades sociais. Publicado em 2004, o I PNPM foi elaborado com base
nos resultados da I Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres, fomentada pela
Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM) criada em março do ano de 2003.
O I PNPM foi estruturado com base em quatro áreas estratégicas de atuação: autonomia,
igualdade no mundo do trabalho e cidadania; educação inclusiva e não sexista; saúde das
mulheres, direitos sexuais e direitos reprodutivos; e, enfrentamento à violência contra as
mulheres. E o processo de elaboração do plano contou com a participação de representantes
dos poderes executivos estaduais e municipais, diversos ministérios e secretarias especiais,
além de organizações de mulheres e feministas (BRASIL, 2004). Atualmente o PNPM
encontra-se na sua terceira edição publicado em 2013 e, são elaborados a cada quatro anos51.
Os PNPM (2004, 2008, 2013) representam um marco no processo de amadurecimento e
consolidação das propostas de políticas para as mulheres no Brasil porque consolida e reúne
os resultados do diálogo estabelecido entre poder público e sociedade civil (BRASIL, 2013).
Vale ressaltar que a trajetória de inclusão de questões relacionadas às mulheres na
discussão das políticas públicas no Brasil, ainda é muito recente, pode-se dizer. Pois, o
51
I PNPM – 2004; II PNPM - 2008; III PNPM – 2013.
77

próprio processo de restauração da democracia e da consolidação da Constituição Brasileira,


fatores que permitiram a liberdade de expressão e de participação dos movimentos sociais no
país, tem hoje apenas três décadas.
Essa nova configuração do sistema político brasileiro, iniciada no final do século
passado favoreceu a ação dos movimentos feministas e de mulheres em todo o país para que
suas demandas fossem ouvidas e se constituíssem em políticas públicas. A expectativa da
população brasileira com relação às essas políticas, naquele contexto de redemocratização, foi
marcada por diversas formas de manifestações de lutas sociais, que reivindicavam direitos
agora instituídos por lei − como o acesso à terra, moradia, trabalho, saúde, educação,
cidadania, segurança – e, toda essa dinâmica, proporcionava às pessoas uma esperança de que
as ações do poder público mudariam consideravelmente por e a partir da pressão popular.
Como consequência da pressão e da constante ação dos movimentos de mulheres e
feministas no Brasil foram criadas, por exemplo, “as delegacias especiais de atendimento à
mulher e os conselhos da condição feminina [...]” (MARIANO, 2008, p. 343). As primeiras
delegacias de atendimento à mulher, por exemplo, surgiram em 1985, ano em que foi criado
também o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (CNDM), vinculado ao Ministério da
Justiça e visava promover políticas para eliminar a discriminação contra a mulher
assegurando sua participação nas atividades políticas, econômicas e culturais do país. Além
dos Conselhos Estaduais da Condição Feminina de São Paulo criado em 1983 e o do Rio de
Janeiro em 1987.
Para Mariano (2008), tais esferas da administração pública reflete bem a luta dos
movimentos de mulheres no sentido de consolidar políticas específicas que atendessem suas
demandas. Ou seja, as décadas finais do século passado (século XX) e as décadas
subsequentes deste início de século foram marcadas pelo aumento da participação da
sociedade civil nos processos de elaboração e efetivação de políticas públicas, através de
mecanismos de construção coletiva como reuniões comunitárias, conferências, fóruns,
colegiados, conselhos deliberativos entre outras e, vale ressaltar também, pela ampliação da
parceria entre o poder público e as entidades dos movimentos sociais.
Como consequência desse processo de manifestação pública das desigualdades de
gênero e da necessidade de superação dessa realidade, os movimentos de mulheres foram
cada vez mais se fortalecendo e questionando a estrutura ou mesma a posição do Estado para
admitir atitudes e procedimentos voltados essencialmente para a reprodução da cidadania, dos
direitos às diferenças. Por isso:
78

[...] as reivindicações pela incorporação da perspectiva de gênero nas


políticas públicas partem da compreensão de que homens e mulheres
ocupam papéis distintos na sociedade, os quais fundamentam relações
desiguais entre os sexos, que são construídas social e historicamente.
Pressupõe o entendimento de que a população não é homogênea e de que as
políticas públicas não são neutras em relação às desigualdades sociais
(MARIANO, 2008, p. 5).

O fato de homens e mulheres exercerem papéis distintos na sociedade, não quer dizer
que o Estado deva, por meio dessa circunstância, passar a tratá-los como iguais em tudo, sem
considerar as especificidades. O que a autora enfatiza enquanto relevante é, justamente, a
dinamicidade da população observando que homens e mulheres apresentam necessidades
específicas e que, de acordo com esta reflexão, as ações de políticas públicas muitas vezes
orientam a construção ou perpetuação dessas desigualdades, quando privilegia um grupo em
função de outro e não reflete sobre a possibilidade de se atender às diferenças.
Analisar, portanto, políticas públicas voltadas à geração de trabalho e renda,
reconhecendo os programas de segurança alimentar – PAA e PNAE – como políticas que
assumiram essa perspectiva de fortalecimento da agricultura familiar através da geração de
trabalho e renda para os/as agricultores/as, torna-se uma questão preponderante para a
compreensão das relações instituídas no contexto rural de Santaluz, especificamente, a partir
da atuação de uma associação de mulheres que vem sendo beneficiada com essa possibilidade
de trabalho e renda, ao longo desses últimos 5 anos. Essa é uma oportunidade para
caracterizar as reais configurações das políticas públicas que aderem à concepção de
igualdade de gênero.
79

CAPÍTULO 4

O PROGRAMA DE AQUISIÇÃO DE ALIMENTOS (PAA) E O


PROGRAMA NACIONAL DE ALIMENTAÇÃO ESCOLAR
(PNAE) NO ÂMBITO DA POLÍTICA DE SEGURANÇA
ALIMENTAR NO BRASIL

Fonte: http://portal.saude.pe.gov.br (2015)

[...] a igualdade dos cidadãos supõe, para todos, uma acessibilidade semelhante aos bens e
serviços, sem os quais a vida não será vivida com aquele mínimo de dignidade que se impõe.
[...] O simples nascer investe o indivíduo de uma soma inalienável de direitos, apenas pelo
fato de ingressar na sociedade humana. [...] Direito a um teto, à comida, à educação, à saúde,
à proteção contra o frio, a chuva, as intempéries; direito ao trabalho, à justiça, à liberdade e a
uma existência digna (SANTOS, 2007, p. 19).

Milton Santos
80

4.1 PAA: contexto de implantação, regulamentação e caracterização do programa

O PAA e PNAE são programas que constituem estratégias de combate à fome e as


desigualdades sociais. Contrapondo a temática da fome, o tema da segurança alimentar e
nutricional começou a ter destaque no âmbito da política a partir da década de 1990,
caracterizando-se como resultado da ação das diversas entidades dos movimentos sociais,
através principalmente, do movimento Ação da Cidadania contra a Fome, a Miséria e pela
Vida, de 199352, que articulou e também coordenou campanhas de mobilização social para o
combate à fome. O movimento tinha como objetivo formar uma imensa rede de mobilização
que tivesse alcance nacional, com a justificativa de ajudar 32 milhões de brasileiros que,
segundo dados do Ipea53 daquela época, estavam abaixo da linha da pobreza.
Este movimento trabalhava na arrecadação de alimentos, roupas e materiais de
construção que eram distribuídos entre a população de baixa renda, sobretudo, àquelas
famílias ou pessoas em situação de insegurança alimentar e nutricional.
De acordo com a Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional – LOSAN (Lei nº
11.346/2006, art. 3º): “A segurança alimentar e nutricional consiste na realização do direito de
todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem
comprometer o acesso a outras necessidades essenciais [...]”.
A LOSAN reúne as dimensões de segurança alimentar e nutricional, associadas as
dimensões da disponibilidade de alimentos e da qualidade desses alimentos, considerando
para isso, práticas alimentares pautadas na sustentabilidade. A alimentação caracteriza desse
modo o eixo que orienta o Sistema e a Política Nacional de Segurança Alimentar e
Nutricional no Brasil. A LOSAN é, assim, a principal lei nacional que versa sobre o tema no
país, tendo sido elaborada no âmbito do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e
Nutricional (CONSEA), e contou com a participação de representantes do governo e da
sociedade civil na sua composição (BRASIL, 2009).
A criação do CONSEA começou em 1992, quando Luiz Inácio Lula da Silva, na
condição de líder do Governo Paralelo54 (posteriormente transformado em Instituto
Cidadania), apresentou uma proposta de Plano Nacional de Segurança Alimentar e
Nutricional (PNSAN) ao então presidente da República Itamar Franco, com objetivo de criar

52
Organização não governamental que nasceu em 1993 por iniciativa do sociólogo Herbert de Souza (Betinho) a partir
do Movimento pela Ética na Política. Disponível em http://www.acaodacidadania.com.br Acesso em 25 de março de 2015.
53
Disponível em: http://www.acaodacidadania.com.br Acesso em: 25/03/2015.
54
Grupo de ação política liderado por Lula, fundado em 1990 para o exercício de uma oposição qualificada ao recém eleito
presidente da República Fernando Collor de Melo empreender uma fiscalização democrática da nova gestão. Disponível em
http://www.institutolula.org Acesso em 25 de março de 2015.
81

um Conselho de Segurança Alimentar (CONSEA). Embora a proposta para a implantação do


CONSEA tenha sido acolhida, ele só funcionou até 1994. Na década de 2000 o Instituto
Cidadania lança o Programa Fome Zero e, em 2003, quando Lula assume a presidência da
República, é criado o Ministério Extraordinário da Segurança Alimentar e Combate a Fome
(MESA) e o Programa Fome Zero torna-se uma estratégia de governo (BRASIL, 2014). A
partir de então, uma das primeiras medidas da estratégia do Fome Zero foi a reinstituição do
CONSEA que:

(...) depois de sua recriação, logrou uma série de êxitos, tendo sido o espaço
onde foi construído o Programa de Aquisição de Alimentos da Agricultura
Familiar; onde foi elaborada a proposta de Lei Orgânica de Segurança
Alimentar e Nutricional; onde foi negociado com o Presidente da República
a recuperação do valor per capita da alimentação escolar e elaborada a
proposta de uma nova e avançada legislação sobre o programa e, também,
aprofundadas propostas para o aperfeiçoamento do Programa Bolsa Família,
algumas delas implementadas (...) (BRASIL, 2009, p. 42).

É nesse contexto que nasce o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), articulando


o tema da fome e da pobreza com o da insegurança alimentar e nutricional da população. O
programa busca ser um instrumento de estruturação para o desenvolvimento da agricultura
familiar como meio de combater o problema da fome. O programa procura, de acordo com
seu regulamento e através da agricultura familiar, inserir os trabalhadores e as trabalhadoras
rurais, assentados da reforma agrária, os povos indígenas e povos de comunidades tradicionais
na política pública de segurança alimentar brasileira. Tanto o PAA e quanto o PNAE fazem
parte da construção do Sistema e da Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional
(PNSAN) de iniciativa do CONSEA (BRASIL, 2014).
Instituído pelo artigo 19 da Lei nº 10.696 de 02 de julho de 2003, o PAA é uma ação do
Governo Federal com vistas ao enfrentamento da fome e da pobreza no Brasil através do
incentivo e do fortalecimento da agricultura familiar55, é realizado já na etapa final do
processo produtivo, na fase de comercialização.
Através do Programa Fome Zero, no início do governo Lula (2003), foram criadas
estratégias que viabilizaram um conjunto de outras iniciativas voltadas, essencialmente, ao
combate à fome e objetivando a promoção da segurança alimentar. Diante disso, o direito à

55
No âmbito do governo, define-se a agricultura familiar como sendo o cultivo da terra realizado por pequenos proprietários
rurais, que utilizam o núcleo familiar como mão de obra essencial, a agricultura familiar foi assim definida na Lei nº 11.326,
de 24 de julho de 2006.
82

alimentação foi introduzido na Constituição, a Lei de Segurança Alimentar56 foi aprovada no


Congresso e criado o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sisan)
(BRASIL, 2014, p. 15).
O marco legal do PAA está assim definido pelo artigo 19 da Lei nº 10.696/2003,
atualizado pela Lei nº 12.512/2011, regulamentado pelos Decretos nº 7.775/2012 e nº
8.293/2014 e pelas resoluções e demais regulamentos estabelecidos pelo Grupo Gestor do
PAA (GGPAA). A aquisição de alimentos realizada pelo PAA é feita diretamente dos
agricultores familiares ou por meio de suas organizações (associações, cooperativas,
sindicatos), com dispensa de licitações. Esses alimentos são destinados à formação de
estoques governamentais ou à doação para pessoas em situação de insegurança alimentar e
nutricional, que são atendidas por programas sociais. Destacam-se assim, as seguintes
finalidades do programa estabelecidas no artigo 19:

I - incentivar a agricultura familiar, promovendo a sua inclusão econômica e


social, com fomento à produção com sustentabilidade, ao processamento de
alimentos e industrialização e à geração de renda; II - incentivar o consumo e
a valorização dos alimentos produzidos pela agricultura familiar; III -
promover o acesso à alimentação, em quantidade, qualidade e regularidade
necessárias, das pessoas em situação de insegurança alimentar e nutricional,
sob a perspectiva do direito humano à alimentação adequada e saudável; IV -
promover o abastecimento alimentar, que compreende as compras
governamentais de alimentos, incluída a alimentação escolar; V - constituir
estoques públicos de alimentos produzidos por agricultores familiares; VI -
apoiar a formação de estoques pelas cooperativas e demais organizações
formais da agricultura familiar; e VII - fortalecer circuitos locais e regionais
e redes de comercialização (BRASIL, Lei nº 10.696, de 02 de julho de 2003,
art. 19).

O artigo firma duas grandes metas, que se destacam porque são diretrizes que
fundamentam toda a política do PAA. A primeira meta: apoiar a comercialização dos
produtos agropecuário dos agricultores familiares, a partir do estímulo à produção de
alimentos; a segunda meta: disponibilizar às famílias em situação de insegurança alimentar o
acesso a alimentos em quantidade, qualidade e regularidade. Nesse contexto, o PAA é tanto
um instrumento da política agrícola quanto da política de segurança alimentar do país.
Outras normas legais (leis, decretos e resoluções) foram criadas no decorrer desses anos
após instituição do PAA, a fim de melhorar as diretrizes que foram determinadas no artigo 19

56
Lei nº 11.346 de 15 de setembro de 2006, criou o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, com vistas a
assegurar o direito humano à alimentação adequada e dá outras providências.
83

da Lei nº 10.696/2003, explicitando de forma mais específica cada meta. A Lei nº 12.512, de
14 de outubro de 2011, por exemplo, institui o Programa de Apoio à Conservação Ambiental
e o Programa de Fomento às Atividades Produtivas Rurais, tendo como finalidade alterar as
Leis nº 10.696/2003, 10.836/2004, e 11.326/2006. O capítulo III da Lei nº 12.512/2011 trata,
especificamente do PAA que, nesse texto da Lei, foi organizado em artigos e incisos que
estabelecem as diretrizes do PAA de forma mais esmiuçada, se comparada com o artigo 19 da
Lei nº 10.696/2003.
A respeito dos beneficiários aptos a fornecerem alimentos ao programa PAA, o Decreto
7.775/2012 os classificam da seguinte forma:

I - beneficiários consumidores - indivíduos em situação de insegurança


alimentar e nutricional e aqueles atendidos pela rede socioassistencial, pelos
equipamentos de alimentação e nutrição e, em condições específicas
definidas pelo GGPAA, pela rede pública e filantrópica de ensino; II -
beneficiários fornecedores - público apto a fornecer alimentos ao PAA, quais
sejam, os agricultores familiares, assentados da reforma agrária,
silvicultores, aquicultores, extrativistas, pescadores artesanais, indígenas e
integrantes de comunidades remanescentes de quilombos rurais e de demais
povos e comunidades tradicionais, que atendam aos requisitos previstos no
art. 3º da Lei nº 11.326, de 24 de julho de 2006; e III - organizações
fornecedoras - cooperativas e outras organizações formalmente constituídas
como pessoa jurídica de direito privado que detenham a Declaração de
Aptidão ao Programa Nacional de Agricultura Familiar - PRONAF - DAP
Especial Pessoa Jurídica ou outros documentos definidos por resolução do
GGPAA (BRASIL, Decreto nº 7.775/2012, Artigo 4º).

É interessante destacar que o parágrafo 5º deste mesmo Decreto (nº 7.775/2012, artigo
4), estabelece que das organizações fornecedoras aptas a participarem do PAA serão
priorizadas aquelas constituídas por mulheres.
O Artigo 17 da Lei nº 12.512, autoriza o Poder Executivo Federal, Estadual, Municipal
e o Distrito Federal a adquirir alimentos produzidos pelos agricultores familiares,
dispensando-se o procedimento licitatório. Ainda nesse artigo, determina-se que os preços
pagos pelos produtos sejam compatíveis com os vigentes no mercado em escala local ou
regional, desde que submetidos à metodologia instituída pelo Grupo Gestor do PAA
(GGPAA); e que o valor máximo anual ou semanal para aquisições de alimento, por unidade
familiar seja conforme regulamento.
O GGPAA é composto e coordenado pelo Ministério do Desenvolvimento Social
(MDS) e por representantes de mais cinco órgãos federais, visando uma gestão compartilhada
entre os Ministérios do Desenvolvimento Agrário (MDA); da Agricultura, Pecuária e
84

Abastecimento (MAPA) – representado pela Conab; do Planejamento, Orçamento e Gestão


(MPOG); da Fazenda (MF) e o da Educação (MEC), e para cada um desses há um
representante titular e outro suplente. Dois desses ministérios são responsáveis diretos no
financiamento do PAA – o MDA e o MDS. De acordo com avaliação do próprio governo:

(...) o importante desse mecanismo de gestão é que dele participam os


ministérios diretamente envolvidos com a sua execução e financiamento,
como o MDS, MDA, Fazenda, Planejamento, Agricultura – por meio da
Conab – e, mais recentemente, o MEC. Dessa forma, a visão intersetorial
está assegurada e as decisões tomadas, legitimadas de forma efetiva, já que
seus membros representam as unidades que têm envolvimento direto na sua
execução. O comitê conta com um grupo consultivo, formado por
representações de agricultores familiares e do Consea, garantindo o diálogo
com a sociedade (...) (BRASIL, 2014, p. 15).

O grupo consultivo do qual trata a citação, geralmente está relacionado com os


conselhos locais como os Conselhos Rurais57, por exemplo, composto por representantes da
sociedade civil organizada e do governo local. O Artigo 24 da Lei nº 12.512/2011 afirma que
os Conselhos de Segurança Alimentar e Nutricional – CONSEA são instâncias de controle e
participação social do PAA. Esse GGPAA é responsável pela definição de medidas
necessárias à sua operacionalização, a sistemática da aquisição de produtos, metodologia para
a definição dos preços, definição das regiões prioritárias e as condições de doação e de venda
dos produtos e outras medidas necessárias para a operacionalização do PAA (BRASIL,
Decreto nº 7.775/2012).
No caso de inexistência do CONSEA, na esfera administrativa de execução do
programa, a Lei nº 12.512/2011, determina que seja indicada outra instância de controle social
responsável pelo acompanhamento de sua execução, sendo preferencialmente, o Conselho de
Desenvolvimento Rural Sustentável ou Conselho de Assistência Social (BRASIL, Lei nº
12.512/2011, Parágrafo Único).
O acesso ao programa ocorre por meio da chamada pública - procedimento
administrativo voltado à seleção da melhor proposta para aquisição de produtos de
beneficiários fornecedores e/ou de organizações fornecedoras. O Decreto nº 8.293/2014
especifica que no edital da chamada pública deverá conter: I) objeto a ser contratado; II)
quantidade e especificação dos produtos; III) local da entrega; IV) critérios de seleção dos
57
Exemplo de um conselho rural: Conselho Regional de Desenvolvimento Rural Sustentável da Região Sisaleira do Estado
da Bahia – CODES SISAL é constituído por entidades, instituições, e organizações governamentais e não governamentais.
Objetiva contribuir para o desenvolvimento integral, participativo e ecologicamente sustentável do Território do Sisal,
priorizando o fortalecimento da cidadania, a erradicação da exclusão social e a melhoria da qualidade de vida, através da
articulação dos sujeitos e das políticas públicas e apoiando e incentivando ações e projetos referenciais. Disponível em:
http://codessisal.blogspot.com.br Acesso em: 30/02/2015.
85

beneficiários ou organizações fornecedoras; V) condições contratuais; e VI) relação de


documentos necessários para habilitação.
A DAP pode ser física, quando se destina a identificar o agricultor ou agricultora
individualmente e sua família, ou pode ser jurídica, instrumento que identifica as formas
associativas ou cooperadas dos agricultores familiares – organizados em pessoas
juridicamente formalizadas.
Em relação às modalidades de execução do PAA, o GGPAA criou e classificou as
formas de execução do Programa visando melhor administrar as possibilidades de aquisição
dos alimentos produzidos pelos agricultores familiares. A partir do Decreto nº 7.775/2012, o
GGPAA estabeleceu quatro modalidades de execução para a compra e venda dos alimentos
no PAA e, nos dois anos seguintes, o grupo instituiu mais outras duas modalidades, através de
Resoluções como pode ser observado no quadro 2 a seguir.
O GGPAA, no uso de suas atribuições que lhe foram conferidas pelo artigo 19 da Lei nº
10.696/2003 (§ 3º) e pelo Decreto nº 7.775/2012 (art. 21), tem plenos poderes para definir as
modalidades de execução do PAA, a forma de funcionamento, a metodologia, as condições e
critérios que se fizerem necessários à criação de outras modalidades, à sua gestão e
funcionamento, tudo isso por meio de resoluções específicas. As tabelas a seguir, apresentam
a estruturação da forma de funcionamento das modalidades existente no PAA.

Quadro 2 - PAA: modalidades de execução, legislação e objetivos

Modalidade Marco legal Objetivo


I - Compra com Decreto nº 7.775 de Compra de alimentos diversos e doação simultânea à
Doação Simultânea 04/07/2012 entidade da rede socioassistencial, aos equipamentos
públicos de alimentação e nutrição e, em condições
específicas definidas pelo GGPAA, à rede pública e
filantrópica de ensino, com o objetivo de atender
demandas locais de suplementação alimentar de
pessoas em situação de insegurança alimentar e
nutricional;
II - Compra Direta Decreto nº 7.775 de Compra de produtos definidos pelo GGPAA, com o
da Agricultura 04/07/2012 objetivo de sustentar preços, atender a demandas de
Familiar – CDAF programas de acesso à alimentação e das redes
socioassistenciais e constituir estoques públicos;
III - Incentivo à Decreto nº 7.775 de Compra de leite que, após beneficiamento, é doado
produção e ao 04/07/2012 aos beneficiários consumidores;
Consumo de Leite
IV - Apoio à Decreto nº 7.775 de Apoio financeiro para a constituição de estoques de
Formação de 04/07/2012 alimentos por organizações fornecedoras, para
Estoques – CPR posterior comercialização e devolução de recursos ao
Estoque Poder Público ou destinação aos estoques públicos;
V - Compra Resolução nº 50 de Compra voltada para o atendimento de demandas
86

Institucional 26/09/2012 e regulares de consumo de alimentos por parte da


União, Estados, Distrito Federal e Municípios
Resolução nº 64 de (universidades federais/estaduais, as forças armadas,
20/11/2013 hospitais públicos, presídios entre outros);
VI - Aquisição de Resolução nº 68 de Compra de sementes, mudas e materiais
sementes 02/09/2014 do propagativos para alimentação humana ou animal de
GGPAA beneficiários fornecedores para doação a
beneficiários consumidores ou fornecedores.
Fontes: Decreto n° 7.775/2012; Resolução nº 50/2012, nº 64/2013 e nº 68/2014.
Elaboração: Silvana Maciel Pires, 2015

Quadro 3 - Caracterização do PAA e limite em reais (R$) para acesso por unidade familiar –
Brasil

Modalidade Fonte de Executor Forma de acesso Limite por


recursos ano R$

Compra com MDS Conab, Estados e Individual, R$ 6.500 e


Doação Municípios. Cooperativas, R$ 8 mil
Simultânea Associações, outros.

Compra Direta MDS, MDA Conab Individual, R$ 8 mil


da Agricultura Cooperativas,
Familiar – Associações, outros.
CDAF

Incentivo à MDS Estados do Nordeste e Individual, R$ 8 mil


produção e ao Minas Gerais (norte). Cooperativas,
Consumo de Superintendência do Associações, outros.
Leite Desenvolvimento do
Nordeste – SUDENE.

Apoio à MDS, MDA Conab Cooperativa, R$ 8 mil


Formação de Associações
Estoques – CPR
Estoque

Compra Órgãos da Conab, Estados, Individual, R$ 20 mil


Institucional União, Municípios Cooperativas,
Estados, Associações, outros.
Municípios

Aquisição de MDS Conab, Estados, Cooperativa, R$ 16 mil


sementes Municípios Associações

Fonte: Decreto nº 8.293 de 12 de agosto de 2014


Elaboração: Silvana Maciel Pires, 2015
87

Quadro 4 - Caracterização do PAA e limite em reais (R$) para acesso por organização
fornecedora – Brasil

Modalidade Fonte de Executor Forma de acesso Limite por ano


recursos R$

Compra com MDS Conab, Individual, 2.000.000,00


Doação Estados, Cooperativas,
Simultânea Municípios. Associações, outros.

Compra Direta MDS, MDA Conab Individual, 500.000,00


da Agricultura Cooperativas,
Familiar - CDAF Associações, outros.

Incentivo à MDS Estados do Individual, Fixado em


produção e ao Nordeste e Cooperativas, Resolução - de
Consumo de Minas Gerais Associações, outros. acordo com a
Leite (norte). média dos preços
praticados pelo
mercado local

Apoio à MDS, MDA Conab Cooperativa, 1.500.000,00


Formação de Associações
Estoques – CPR
Estoque

Compra Órgãos da Conab, Individual, 6.000.000,00


Institucional União, Estados, Cooperativas,
Estados, Municípios Associações, outros.
Municípios
Aquisição de MDS Conab Cooperativa, 6.000.000,00
sementes Associações

Fonte: Decreto nº 8.293 de 12 de agosto de 2014.


Elaboração: Silvana Maciel Pires, 2015

Com relação ao termo de adesão ao programa PAA, a lei determina que os modelos de
termos de adesão ao PAA deverão atender às normas aprovadas pelo GGPAA e conterão, no
mínimo, a descrição: I) do objeto do termo; II) dos compromissos assumidos pelas partes; III)
da vigência do termo; e IV) da previsão de alteração, denúncia ou rescisão.
Para concorrer aos editais é necessário estar atento ao período de publicação dos
mesmos, pois são divulgados e publicados através de portal do MDS em endereço
eletrônico58. Nas páginas do site do ministério é possível conhecer as ações e o Programa de
Segurança Alimentar e Nutricional, saber a respeito do que é oferecido, a forma de
participação, as datas e as informações adicionais que sejam necessárias.

58
www.mds.gov.br
88

Para a construção do edital de chamada pública, é preciso que o órgão comprador


(MDA, MDS) sistematize as demandas, considerando os princípios da alimentação adequada
e saudável, e divulgue amplamente este edital em locais de fácil acesso, principalmente para
as organizações da agricultura familiar. A partir de então, as organizações de agricultores
familiares devem elaborar as propostas de venda de seus produtos de acordo com os critérios
da chamada pública e encaminhar ao órgão responsável. Cabe ao comprador habilitar as
propostas que estejam de acordo com os critérios exigidos no edital e que tenham preços
compatíveis com o do mercado para, daí, assinar o contrato que estabeleça o cronograma de
entrega dos produtos, a data de pagamento aos agricultores ou às suas organizações e todas as
demais cláusulas de compra e venda, segundo rege a normativa do Programa.

4.2 PNAE: contexto de implantação, regulamentação e caracterização do programa

Em 2009, foi sancionada a lei que estabelece as novas diretrizes e modalidades de


implementação do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). Considerado o mais
antigo programa alimentar brasileiro, teve início na década de 1940, a partir dos estudos e
proposições do médico, sociólogo e geógrafo pernambucano Josué de Castro, pioneiro na luta
contra a fome no Brasil59. A Lei nº 11.947 de 16 de junho de 2009, renovou a proposta de
política pública para a merenda escolar quando estabeleceu a alimentação escolar como um
direito dos estudantes da educação básica pública e quando criou um elo institucional entre a
alimentação que é servida nas escolas e a agricultura familiar dos municípios onde essas
escolas se localizam.
Apresentamos, de forma breve, a história e a trajetória do PNAE e na sequência
trataremos sobre a atual configuração e caracterização do programa de acordo com o seu atual
regulamento, a Lei 11.947/2009. A primeira iniciativa para construção de uma política
alimentar para a escola se deu na década de 1940, através do Instituto de Nutrição, órgão que
naquela época sustentava a ideia de que a oferta de alimentos para o público escolar deveria
ser de responsabilidade do Governo Federal.
Surge então, na década de 1950, o primeiro Plano Nacional de Alimentação e Nutrição
denominado de Conjuntura Alimentar e o Problema da Nutrição no Brasil. É a primeira vez

59
Josué de Castro denunciou a fome como sendo um fenômeno universal. Para ele, a fome coletiva não resulta de fatores
naturais, mas sim de fatores sociais, sobretudo, estruturas econômicas imperfeitas. Principais obras de Josué de Castro: O
problema fisiológico da alimentação no Brasil (1932), Alimentação brasileira à luz da Geografia humana (1937), Geografia
da Fome (1947), Geopolítica da Fome (1951) entre outras. MANÇANO, B.; PORTO-GONÇALVES, C. V. Josué de Castro:
vida e obra. 2000.
89

que um plano de alimentação no Brasil dá origem a um programa de merenda escolar em


âmbito nacional. O Programa de Alimentação Escolar era financiado pelo Fundo
Internacional de Socorro à Infância (FISI), atual Fundo das Nações Unidas para Infância
(UNICEF)60.
Em 31 de março de 1955, foi assinado o Decreto n° 37.106, que instituiu a Campanha
de Merenda Escolar, de responsabilidade do Ministério da Educação e Cultura. A Campanha
previa que as instituições públicas ou particulares de educação proporcionassem a
alimentação escolar aos seus alunos, para isso era preciso observar o valor nutritivo da
merenda escolar, promover medidas para aquisição dos alimentos adquiridos com entidades
públicas ou particulares, nacionais ou internacionais e se responsabilizar em construir cantinas
escolares. Daí a permanência com os convênios firmados com o FISI além de outros
organismos internacionais. Com o Decreto n° 39.007, de 11 de abril de 1956, a Campanha
passou a ser chamada de Campanha Nacional de Merenda Escolar, com o objetivo de
promover, obrigatoriamente, o atendimento em âmbito nacional.
Em 1972, o governo criou o Instituto Nacional de Alimentação e Nutrição (INAN)61,
autarquia vinculada ao Ministério da Saúde e com encargo de formular uma política nacional
de alimentação e nutrição. O INAN propôs o Programa Nacional de Alimentação e Nutrição
(PRONAN), que definiu como alvo as mulheres gestantes, nutrizes e crianças de até sete anos
na população de baixa renda e os escolares de sete a quatorze anos. A primeira fase do
PRONAN foi de 1973 a 1974, porém, com baixo resultado devido a problemas de
administração, e a segunda fase de 1976 a 1979, quando o programa ofereceu o primeiro
modelo de uma política nacional de alimentação mais ampla, além da merenda escolar
também desenvolvia outros 10 programas voltados à suplementação alimentar, amparo ao
pequeno produtor rural, alimentação do trabalhador, apoio à realização de pesquisas etc.
(SILVA, 1995).
A partir dessa segunda fase do PRONAN, o programa da merenda escolar passou a se
chamar Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), já em 1979. Segundo Takagi
(2006) “O programa, antes restrito ao fornecimento de leite em pó para as escolas de alguns
Estados, passou a atender os alunos com alimentos industrializados (sopas, mingaus, bebidas

60
Criado em dezembro de 1946 por decisão da Assembleia Geral das Nações Unidas. Em 1950 foi instalado o primeiro
escritório do UNICEF no Brasil (João Pessoa/Paraíba). Em setembro de 1954 foi liberado pela primeira vez recursos do
UNICEF para alimentação nas escolas, permitindo a execução do programa nacional de merenda escolar. Disponível em:
<www.unicef.or/brazil> Acesso em: 18 fev. 2015.
61
O INAN foi criado pela Lei nº 5.829, de 30 de novembro de 1972.
90

lácteas, etc.). Em 1978, atendia a 9,4 milhões de crianças, ampliando para 30,9 milhões, em
1986”.
Em 1983, foi criada a Fundação de Assistência ao Estudante (FAE), instituição
vinculada ao MEC e que assume, desde então, a responsabilidade pela formulação,
financiamento e gerenciamento da alimentação escolar. Desde então, o PNAE começou a
passar por um processo de descentralização, através da municipalização da gestão da
alimentação escolar nos estados de São Paulo, durante o governo de André Franco Montoro
(1983-1987), e do Rio de Janeiro, durante o governo de Leonel Brizola (1983-1987) -
(BRASIL, 2014). Entre os anos de 1986 e 1988, a FAE estimulou a descentralização do
PNAE por meio da municipalização e dessa forma:

(...) Os municípios se responsabilizavam pelo gerenciamento e pela


operacionalização do Programa e, fundamentalmente, pela aquisição de
alimentos básicos in natura. Apesar dos benefícios da experiência de
descentralização do PNAE, o Programa padeceu com a lentidão na liberação
de recursos (o que implicava em intermitência operacional) e com a
dificuldade na prestação de contas por parte dos municípios (BRASIL, 2014,
p. 101).

Após a publicação da Constituição Federal de 198862, a alimentação escolar tornou-se


um direito de todos os alunos matriculados no ensino fundamental, por meio de programa
suplementar de alimentação escolar a ser oferecido pelos três níveis de governo: Federal,
Estadual e Municipal.
A oficialização do processo de descentralização dos recursos para a realização do PNAE
se deu através da promulgação da Lei nº 8.913, de 12 de julho de 1994. De acordo com a lei,
“a transferência de recursos do governo federal para os governos municipais ficou
condicionada à criação dos Conselhos de Alimentação Escolar (CAE), com funções de
fiscalizar, controlar a aplicação dos recursos financeiros e acompanhar a elaboração dos
cardápios” (BRASIL, 2014, p. 102). Ou seja, os Conselhos (CAE) caracterizavam a
possibilidade de participação direta da sociedade civil no processo de fiscalização e cuidado
com a alimentação escolar em cada município.
Em 1998, a Lei nº 9.649, de 27 de maio, extinguiu a FAE e transferiu suas competências
para o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). E, finalmente, a Lei nº
11.947/2009 ampliou o PNAE para toda a rede pública de educação básica, inclusive aos
alunos da Educação de Jovens e Adultos (EJA) e do Programa Mais Educação. Portanto, esta

62
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 – Artigo 208, incisos IV e VII.
91

lei tornou obrigatório a utilização de no mínimo 30% dos recursos financeiros transferidos
pelo FNDE para aquisição de gêneros alimentícios diretamente da agricultura familiar. O
artigo 2º da Lei nº 11.947/2009, define as seguintes diretrizes para alimentação escolar:

I - o emprego da alimentação saudável e adequada, compreendendo o uso de


alimentos variados, seguros, que respeitem a cultura, as tradições e os
hábitos alimentares saudáveis, contribuindo para o crescimento e o
desenvolvimento dos alunos e para a melhoria do rendimento escolar, em
conformidade com a sua faixa etária e seu estado de saúde, inclusive dos que
necessitam de atenção específica; II - a inclusão da educação alimentar e
nutricional no processo de ensino e aprendizagem, que perpassa pelo
currículo escolar, abordando o tema alimentação e nutrição e o
desenvolvimento de práticas saudáveis de vida, na perspectiva da segurança
alimentar e nutricional; III - a universalidade do atendimento aos alunos
matriculados na rede pública de educação básica; IV - a participação da
comunidade no controle social, no acompanhamento das ações realizadas
pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios para garantir a oferta
da alimentação escolar saudável e adequada; V - o apoio ao desenvolvimento
sustentável, com incentivos para a aquisição de gêneros alimentícios
diversificados, produzidos em âmbito local e preferencialmente pela
agricultura familiar e pelos empreendedores familiares rurais, priorizando as
comunidades tradicionais indígenas e de remanescentes de quilombos; VI - o
direito à alimentação escolar, visando a garantir segurança alimentar e
nutricional dos alunos, com acesso de forma igualitária, respeitando as
diferenças biológicas entre idades e condições de saúde dos alunos que
necessitem de atenção específica e aqueles que se encontram em
vulnerabilidade social (BRASIL, Lei nº 11.947 de 16 de junho de 2009,
artigo 2º).

A proposta do PNAE, de acordo com as diretrizes do programa, objetiva integrar


dimensões básicas para a constituição e desenvolvimento da sociedade: o direito à
alimentação visando garantir a segurança alimentar e nutricional, a educação e a inclusão dos
pequenos agricultores. O programa estabelece como prioridades: o cuidado com a
alimentação e o desenvolvimento de práticas alimentares saudáveis e adequadas, por meio da
educação escolar, que passam a ser consideradas como conteúdos no currículo escolar, e
também a valorização do trabalho e do trabalhador local através do incentivo à produção e
comercialização de gêneros alimentícios do contexto local.
Assim, o artigo 12º da Lei nº 11.947/2009, estabelece que a elaboração do cardápio da
alimentação escolar é de competência de um profissional nutricionista, que por sua vez, deve
considerar a utilização de gêneros alimentícios básicos, respeitar as referências nutricionais,
os hábitos alimentares, a cultura e a tradição alimentar da localidade, pautar suas escolhas na
sustentabilidade e diversificação agrícola da região, para uma alimentação saudável e
adequada. Vale ressaltar que, do total dos recursos financeiros repassados pelo FNDE, no
92

âmbito do PNAE, no mínimo 30% deverão ser utilizados para aquisição de alimentos
diretamente da agricultura familiar (BRASIL, Lei nº 11.947/2009, artigo 14º).
O valor que é repassado pela União a estados e municípios por dia letivo para cada
estudante, atualmente, é definido de acordo com a etapa e a modalidade de ensino na qual o
estudante se encontra, como pode ser observado no quadro 5 a seguir. Os recursos financeiros
são originários do Tesouro Nacional e estão assegurados no Orçamento da União. O FNDE é
quem realiza a transferência financeira às Entidades Executoras por meio de contas correntes
definidas e abertas pelo próprio FNDE (BRASIL, Lei nº 11.947/2009, artigo 5º).

Quadro 5 - Repasse em reais (R$) do PNAE para as escolas no Brasil (2015)

Modalidade – Etapas de Ensino Valor (R$)


repassado por
estudante
Creches 1,00
Pré-escolas 0,50
Escolas indígenas e quilombolas 0,60
Ensino Fundamental, Ensino Médio e Educação de Jovens e Adultos 0,30
Ensino Integral 1,00
Alunos do Programa Mais Educação 0,90
Alunos que frequentam o Atendimento Educacional Especializado no 0,50
contraturno.
Fonte: Disponível em: http://www.fnde.gov.br Acesso em 28/03/2015
Elaboração: Silvana Maciel Pires, 2015

As Entidades Executoras do PNAE são: as Secretarias de Educação dos Estados e do


Distrito Federal, prefeituras municipais e escolas federais. Elas são responsáveis pelo
recebimento, pela execução e pela prestação de contas dos recursos financeiros que são
transferidos pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). A transferência
do dinheiro é feita em 10 parcelas mensais, a partir do mês de fevereiro, no intuito de cobrir
os 200 dias letivos, e cada parcela corresponde a 20 dias de aula. O valor que é repassado para
as Entidades Executoras do Programa corresponde: ao número de alunos x número de dias
letivos x o valor per capita.
O Conselho de Alimentação Escolar (CAE) constitui órgão deliberativo e autônomo,
composto por representantes do Poder Executivo, da sociedade civil organizada, de
trabalhadores da educação, discentes e pais de alunos. Tem mandato de quatro anos e seu
principal objetivo é fiscalizar a aplicação dos recursos transferidos para realização do
programa e zelar pela qualidade dos produtos, desde a compra até a distribuição nas escolas,
93

observando as práticas de higiene. A existência do CAE é condição para o recebimento dos


recursos financeiros repassados pelo FNDE, porém, o acompanhamento e a fiscalização do
programa não ficam por conta somente do CAE, mas também, do FNDE, do Tribunal de
Contas da União, da Controladoria Geral da União e do Ministério público.
A aquisição dos produtos da agricultura familiar deverá ser realizada por meio de
chamada pública, na qual devem constar as seguintes informações: o período de validade do
contrato a ser firmado, os documentos necessários para habilitação, o período de inscrição de
projetos e o endereço para sua efetivação, a fonte dos recursos, a habilitação do fornecedor
(fornecedores individuais, grupos informais e grupos formais), os critérios de seleção dos
beneficiários, local e periodicidade de entrega dos produtos, o pagamento entre outras
informações.
A aquisição dos produtos da agricultura familiar para a alimentação escolar está
regulamentada também pela Resolução nº 26 de 17 de junho de 2013, que dispõe sobre o
atendimento da alimentação escolar aos alunos da educação básica no âmbito do PNAE.
Tendo por base a presente Resolução, a coordenação geral do Programa elaborou o Manual de
Aquisição de Produtos da Agricultura Familiar para a Alimentação Escolar, que visa
apresentar o passo a passo do processo de aquisição de alimentos.
O manual determina as seguintes etapas para a compra dos produtos da agricultura
familiar: 1º) Realização do orçamento; 2º) articulação entre os atores sociais; 3º) elaboração
do cardápio; 4º) pesquisa de preço; 5º) chamada pública; 6º) elaboração do projeto de venda;
7º) recebimento e seleção dos projetos de venda; 8º) amostra para controle de qualidade; 9º)
contrato de compra; 10º) entrega dos agricultores. A figura 7, na próxima página, representa a
distribuição dessas etapas.
94

Figura 7 – Passo a passo do processo de aquisição de produtos da agricultura familiar para o


PNAE - realizado pelo governo – Brasil (2015)

Fonte: Cartilha Aquisição de produtos da Agricultura Familiar para Alimentação Escolar. MEC/FNDE.
Disponível em: http://www.fnde.gov.br Acesso em: 02/04/2015.
Elaboração: Silvana Maciel Pires, 2015

O fluxograma detalha os procedimentos a serem executados para acessar o programa


PNAE, a formalização e as etapas do processo de comercialização dos alimentos, realizadas
pelo poder público e os agricultores familiares. Diante do que se conhece acerca do PNAE, a
sua efetivação representa uma possibilidade real de geração de trabalho e renda para os
agricultores e agricultoras rurais do Brasil, um meio de fortalecer a economia local, além de
significar a valorização dos hábitos alimentares locais, já que a preferência é dada aos
agricultores locais. Inclusive, possibilita a própria constituição e/ou fortalecimento da
organização civil, por meio do cooperativismo e associativismo entre os (as) agricultores (as).
95

CAPÍTULO 5

A PARTICIPAÇÃO DA AMMTRAFAS NA EFETIVAÇÃO DOS


PROGRAMAS DE SEGURANÇA ALIMENTAR (PAA E PNAE)
E A CONSTITUIÇÃO DE NOVAS TERRITORIALIDADES EM
SANTALUZ NA BAHIA

Fonte: www.transformatoriomargaridas.org.br (2015)

Esta luta não é fácil / Mas tem que acontecer


A mulher organizada / Tem que chegar ao poder.
Vamos juntas companheiras /Vamos botar pra valer
Vamos quebrar as correntes / Do machismo e do poder.

Maria de Nazaré de Souza – Ceará


96

5.1 Participações das mulheres da AMMTRAFAS no Programa de Aquisição de


Alimentos (PAA) de Santaluz - Bahia

O PAA foi inserido no município de Santaluz no ano de 2005, beneficiando


inicialmente os agricultores e agriculturas pertencentes à Associação dos Moradores e
Produtores do Povoado do Miranda (AMPPM), através da compra institucional de produtos
da agricultura familiar, na modalidade compra com doação simultânea63.
A associação do Miranda foi a primeira no município que acessou o PAA servindo de
referência para outras associações, contribuindo para que a proposta do Programa tivesse uma
abrangência maior no município quando, por meio de suas lideranças, possibilitou trocas de
experiências e assessoria a outras comunidades. Após a implementação do programa no
município, diversas outras associações em diferentes comunidades rurais procuraram a
AMPPM, com objetivo de serem orientados quanto aos processos necessários à participação
no PAA. As orientações aconteciam através de reuniões realizadas com os associados nas
comunidades que não tinham ainda o programa.
Ao relatar sobre a origem da efetivação do PAA no município, a presidente da
AMMTRAFAS afirmou que a associação de mulheres tomou conhecimento do programa
após experiências da AMPPM e que, a partir daí, as demais associações passaram a inscrever
propostas de participação para a Conab, com objetivo de acessarem também o programa. As
associações das comunidades rurais de Ferreiros, Rose e Lagoa Escura são alguns dos
exemplos. E, a partir da inserção das mulheres nesses espaços, houve a ampliação da
participação delas no PAA.
O programa funciona da seguinte forma: as instituições proponentes (associações das
comunidades do Rose, do Miranda e do Ferreiros) inscrevem projetos para concorrerem à
Chamada Pública do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social/Companhia
Nacional de Abastecimento (BNDES-CONAB), se comprometendo cada uma a fornecer
determinada quantidade e variedade de alimentos por um período de 12 meses para o
programa PAA e as mulheres dos grupos de produção da AMMTRAFAS assumem a
responsabilidade pela produção desses alimentos. O desenvolvimento do projeto no município
acontece sob a supervisão da Secretaria Municipal de Assistência Social que, através de ata,
registra os processos e as etapas dos projetos.

63
Compra governamental de alimentos das associações proponentes no programa e a realização de doação simultânea, ou
seja, o imediato atendimento às demandas locais de suplementação alimentar de pessoas em situação de insegurança
alimentar (BRASIL, 2014).
97

O PAA no estado da Bahia, em termos de produção dos alimentos da agricultura


familiar, beneficia um número maior de mulheres agricultoras em relação ao percentual de
agricultores no programa. No município de Santaluz não é diferente, pois, das cinco
associações proponentes em 2015, três dessas tem parceria com a AMMTRAFAS de modo
que os alimentos sejam produzidos por grupos de mulheres. A Secretaria de Avaliação e
Gestão da Informação do MDS apresenta uma síntese dessa inclusão das mulheres no PAA,
especificamente na Bahia como mostra a tabela 2.

Tabela 2 – Número de Agricultores e agricultoras participantes do PAA por


sexo na Bahia/Brasil - 2014

Sexo Nº de agricultores

Feminino 4.036

Masculino 1.758

Total 5.794
Fonte: SAGI/MDS. Disponível em: <http://aplicacoes.mds.gov.br> Acesso em: 13/01/2016
Elaboração: Silvana Maciel Pires, 2016

A crescente participação das mulheres no PAA foi possibilitada por diferentes motivos.
Destacamos, porém, dois que reconhecemos relevantes para a modalidade de compra
específica realizada nesse contexto do município de Santaluz (compra com doação
simultânea):
I) os produtos vendidos para a Conab estão relacionados mais diretamente com atividades
que são desenvolvidas pelas agricultoras como, por exemplo, o cultivo de hortaliças, a
produção de bolo, sequilho e beiju. Isso caracteriza, de certa forma, uma divisão do
trabalho no contexto do espaço rural, pois, às mulheres atribuem-se funções
diferenciadas àquelas atribuídas aos homens;
II) a Resolução GGPAA nº 44/2011, ressalta que nas compras realizadas nas modalidades
de compra com doação simultânea e de formação de estoques, será exigida a
participação de, pelo menos, 40% e 30% de mulheres, respectivamente, do total de
produtores fornecedores (RESOLUÇÃO nº 44, 2011, artigo 4º) e o § 5º do Artigo 4 do
Decreto nº 7.775/201264 estabelece prioridade para as organizações constituídas por
mulheres, no ato de seleção das entidades.

64
Decreto que está em vigência no momento.
98

É importante compreender a participação das mulheres no PAA, a partir desses dados,


porque trata-se de um programa que estabelece prioridades às organizações de mulheres. O
fato de a participação feminina ser mais expressiva no âmbito do programa reflete a
capacidade de auto-organização das agricultoras, seja através de movimentos que representem
o coletivo ou da participação delas em entidades de caráter misto que também tem como
propósito representar as demandas das mulheres, como o Sindicato Rural e as associações de
pequenos agricultores e agricultoras rurais.
Significa que uma vez que as mulheres encontram-se organizadas conseguem articular
melhor suas reivindicações e, consequentemente, obter com mais facilidade êxitos. No
entanto, é preciso considerar e atribuir que a expressiva participação das mulheres no
programa PAA tem relação com a divisão sexual do trabalho, pois, a produção dos alimentos
faz referência ao trabalho desempenhado pelas mulheres no âmbito da vida privada, através
do cuidado com alimentação da família.
Pode-se observar, nesse contexto e a partir dos dados da tabela 2 (p. 97), que a intensa
luta das mulheres em buscar melhorias para suas condições de vida e, principalmente, pelo
fim das desigualdades de gênero, vem sendo considerada ao longo desses últimos 10 anos
através da implementação de programas do Governo Federal como o PAA, por exemplo.
Se acompanharmos as transformações que já foram realizadas ao programa desde sua
criação com o artigo 19 da Lei nº 10.696/2003, passando por Resoluções, Decretos e Lei,
podemos afirmar que mudanças foram alcançadas e os dados mostram isso, pois, tais
alterações de ordem normativas foram efetivadas no âmbito do poder público e refletem em
uma maior participação e inserção das mulheres.
No ano de 2015, seis grupos de mulheres da AMMTRAFAS comercializaram para o
PAA, a tabela 3 (p. 99) apresenta algumas características desses grupos como: identificação,
comunidade de origem, ano em que foi criado e o total de membro por grupo e o tempo de
participação no PAA.
99

Tabela 3- Caracterização dos grupos de mulheres associadas à AMMTRAFAS que


atenderam ao PAA em Santaluz Bahia - 2015
Tempo de
Criação Nº de
Comunidade atuação no
Nº Grupo do mulheres
rural PAA/anos
grupo grupo
1 Mulheres de Fibra Miranda 2004 27 8
Mulheres

2 Produtoras do Rose 2008 20 4


Rose

Mulheres Ferreiros 2009 19 3


3
Virtuosas
Várzea da
2009 5 5
4 Garra Feminina Pedrinha

Várzea da
5 Novo Sabor 2009 4 5
Pedrinha

6 Mulheres de
Areal 2010 8 3
Força

Total 6 5 83

Fonte: Trabalho de campo realizado de 05/10/2015 a 07/01/2015 – Santaluz/Bahia


Elaboração: Silvana Maciel Pires, 2016

Diante dos dados apresentados na tabela acima, espacializamos os seis grupos de


mulheres da AMMTRAFAS que participam do PAA em Santaluz no mapa do município.
Esses grupos são responsáveis por fornecerem gêneros alimentícios ao programa e executam
esta ação a partir do apoio das associações comunitárias de Ferreiros, Miranda e Rose. É
preciso lembrar que três desse grupos estão localizados nas mesmas comunidades das
associações proponentes ao PAA e os outros três em comunidades adjacentes àquelas que são
proponentes.
Os grupos de mulheres da AMMTRAFAS participaram do programa através das
associações de produtores e agricultores rurais de comunidades como: a Associação dos
Moradores e Pequenos Agricultores de Ferreiros, a Associação dos Moradores e Produtores
do Povoado de Miranda e Associação dos Pequenos Agricultores da Comunidade de Rose.
Essa participação foi possível devida a parceria estabelecida entre as associações comunitárias
e a AMMTRAFAS.
Mapa 3 -
100
101

O interesse em constituir a parceria com as associações comunitárias surgiu,


inicialmente, pela necessidade de inserir as mulheres no programa, já que até 2010 a
AMMTRAFAS não tinha registro civil (CNPJ), mas, contava com 10 grupos de mulheres
organizados nas comunidades (Mocambinho, Ferreiros, Lagoa Escura, Miranda, Morro dos
Lopes, Rio do Peixe, Rose, Serra Branca, Tombador, Várzea da Pedra e Várzea da Pedrinha)
que viam no PAA uma possibilidade de trabalho e renda, inclusive, alguns grupos como o
Mulheres de Fibra e o Garra Feminina já acessavam o programa através da associação de
produtores rurais da comunidade Miranda. Sem um registro, no entanto, a AMMTRAFAS
não podia celebrar convênios com o poder público para fazer o mesmo.
Depois que a associação de mulheres efetuou seu registro, outras questões se
apresentaram ao movimento. Pois, mesmo podendo acessar o programa diretamente através
da DAP da entidade, as mulheres sentiram a necessidade de permanecer com as parcerias que
já haviam estabelecido com as Associações. Dessa forma, a diretoria da AMMTRAFAS
achou melhor permanecer com os vínculos firmados porque dessa forma poderiam contribuir
com as associações de suas comunidades e assegurar uma parceria para qualquer outra
atividade que viessem a realizar no município. Acreditam também que se essa articulação
deixasse de existir poderiam, como consequência disso, gerar uma desmotivação e
fragilização das associações nas comunidades.
A AMMTRAFAS proporcionou às mulheres formações relacionados aos programas
PAA e PNAE, alertando para a compreensão de que esses programas representam iniciativas
do poder público federal com objetivo de fomentar a produção familiar e incentivar a geração
de trabalho e renda para elas. Diante dessa conjuntura, a AMMTRAFAS (que na ocasião era
MMTR-Santaluz) firmou acordo com as associações para que seus grupos de mulheres
fossem contemplados nos programas e fornecessem os gêneros alimentícios solicitados. E, até
o presente momento, ainda é dessa forma.
O Grupo Mulheres de Fibra, um dos mais antigos, foi o primeiro no município a
participar do PAA. Os demais grupos de mulheres fornecem para o mesmo programa entre
três e cinco anos, o que demonstra que a participação deles no programa se efetivou de forma
gradativa e, também, a partir da experiência do grupo Mulheres de Fibra.
Para acessar o programa as mulheres precisam combinar fatores como estruturação local
(sede e recursos materiais), disponibilidade de tempo e habilidades específicas adquiridas
através de cursos de formação necessárias para produção dos alimentos em quantidade e
qualidade, como já observados anteriormente. Outras duas associações de agricultores do
município também comercializam para o PAA, na modalidade compra com doação simultânea,
102

porém, sem vínculo com a AMMTRAFAS - são elas: Associação Comunitária da Fazenda
Nova e Associação dos Moradores de Sítio Novo.
Nesta modalidade, compra com doação simultânea, os alimentos comercializados pelas
associações e grupos de mulheres devem ser característicos dos hábitos alimentares locais
(alimentos perecíveis, produtos in natura ou processados), devendo cumprir os requisitos de
controle de qualidade exigidos nas normas vigentes. Os alimentos são entregues duas vezes ao
mês a cada 15 dias para as associações das comunidades carentes beneficiadas com a política
de segurança alimentar. As comunidades beneficiadas com os alimentos produzidos pelas
mulheres da AMMTRAFAS são: Antônio Conselheiro, Arapuá, Areal, Boa Esperança,
Caldeirãozinho, Junco, Lagoa das Cabras, Lagoa Escura, Nova Divinéia, Queimada do Milho,
Sítio e Várzea da Pedra.
Cada grupo de produção das mulheres está organizado de modo que apresenta uma
coordenação com atribuições muito bem estabelecidas. Geralmente, todas elas são nomeadas
a uma função dentro do grupo (coordenação e vice, tesouraria e vice, secretaria e vice,
conselho fiscal e suplentes).
As atividades desempenhadas pelos grupos estão voltadas para o planejamento da
produção e a comercialização principalmente, embora, os grupos não se limitem às questões
da geração de renda para as mulheres, também se dedicam a estudos e momentos de lazer. As
atividades de produção são desenvolvidas todas as semanas, entre 2 a 3 dias correspondendo a
uma dedicação diária de 8 horas por dia de trabalho e às vezes menos que isso. Os grupos
produzem sempre a mesma quantidade de alimentos por quinzena e a entrega é feita de 24h a
48h após a produção.
Quatro desses grupos fretam transporte particular - que em geral já faz linha da
comunidade para o centro da cidade de Santaluz diariamente - para efetuar as compras dos
materiais da produção (fécula da mandioca e de trigo, manteiga, açúcar) e, também, para fazer
a entrega dos alimentos às comunidades beneficiadas com o PAA. Apenas o grupo Mulheres
Virtuosas da comunidade de Ferreiros tem transporte próprio para realizar tais atividades. O
transporte foi adquirido com recursos de Projeto65 lançado pela Secretaria de Políticas para as
Mulheres (SPM) do Governo Federal, via edital público no ano de 2014.
O carro representou para as mulheres uma autonomia, pois, deixaram de depender dos
serviços de terceiros e aos poucos foram se habilitando com objetivo de exercerem, também,
mais essa função no grupo - de conduzirem elas próprias suas mercadorias. Essa, porém, não

65
A coordenadora do Grupo Mulheres Virtuosas não soube informar o nome do Projeto ou número do Edital para o qual
concorreram e ganharam o carro.
103

foi uma motivação apenas do grupo da comunidade de Ferreiros, mas, das demais mulheres
dos grupos da AMMTRAFAS que desejam um dia ter a chance de comprar um carro ou
adquiri-lo através de projetos de iniciativa do poder público.
Os grupos fornecem para o PAA os seguintes gêneros alimentícios: beiju66, bolo,
bolacha de goma67, broa de milho68, farinha de tapioca69, hortaliças, polpa de frutas e sequilho.
A AMMTRAFAS se encarrega de fazer a distribuição da quantidade de alimentos que deve
ser produzido e entregues por quinzena e segundo a diretoria da associação de mulheres, não
há privilégios na hora da distribuição das encomendas, todos os grupos recebem a mesma
quantidade de pedidos. As próprias mulheres dos grupos confirmam não terem problemas ou
queixas com relação aos critérios de partilha da produção.
Para a AMMTRAFAS, a distribuição dos alimentos para os grupos de produção deve se
basear no princípio da igualdade porque todos contribuem com a associação de mulheres da
mesma forma e, portanto, não deve haver benefícios para um e outro não. Embora se perceba
diferenças nesta distribuição, a justificativa para esta situação está no fato de haver grupos
mais habilitados seja em estrutura física (disponibilidade de equipamentos) ou em
competências adquiridas em relação à variedade de produtos oferecidos.
Os dados colhidos com as mulheres dos seis grupos, indicam o panorama da
distribuição da produção desses alimentos entre os grupos. Todos os seis fornecem o bolo e
três deles fornecem hortaliças (Mulheres de Fibra, Produtoras do Rose e Mulheres Virtuosas),
três o beiju (Mulheres de Fibra, Mulheres Virtuosas, Produtoras do Rose), três o sequilho
(Mulheres de Força, Produtoras do Rose e Mulheres Virtuosas) e três a bolacha de goma
(Novo Sabor, Garra Feminina e Mulheres de Fibra). A figura 8 a seguir retrata tais gêneros
alimentícios:

66
Iguaria típica da culinária brasileira, de origem indígena, feita com a fécula extraída da mandioca (substância farinácea
também conhecida como goma da tapioca).
67
Biscoito seco, assado no forno e feito da mistura da fécula de mandioca, água, açúcar, sal, óleo.
68
Biscoito grande de milho redondo e achatado, feito com fubá de milho, fécula de mandioca ou trigo, açúcar, fermento,
manteiga e sal.
69
Espécie de farinha granulada feita com a fécula extraída da mandioca, que serve para fazer bolos e mingaus.
104

Figura 8 - Gêneros alimentícios produzidos pelas mulheres da


AMMTRAFAS para o PAA em Santaluz/Bahia/Brasil (2015)

1 2

3 4

5 6

Fonte: Trabalho de campo realizado de 05/10/2015 a 07/01/2016 – Santaluz/Bahia


Imagens: Luciana Santos de Matos e Silvana Maciel Pires, 2016

Na figura 8 temos os tipos de alimentos que foram fornecidos ao PAA, durante o ano de
2015, numerados nessa ordem: 1) beiju; 2) bolacha de goma, sequilho; 3) bolo de aipim; 4)
broa de milho; 5) farinha de tapioca; 6) polpa de frutas; 7) hortaliças (coentro, cebolinha
verde, couve, alface). Todos esses alimentos compõem cestas básicas entregues às famílias
em situação de insegurança alimentar assistidas pelo PAA no município de Santaluz.
O recurso obtido com as vendas para o PAA garante às mulheres valores, em reais por
mês, que variam entre cinquenta reais e trezentos reais individualmente. Esse valor que as
mulheres recebem individualmente caracteriza o lucro obtido pelo grupo com a
105

comercialização feita para o programa, pois, do valor bruto recebido elas administram o
recurso da seguinte forma:
1) priorizam o pagamento de dívida/empréstimo contraído pelo grupo;
2) efetuam a reposição de materiais necessários à próxima produção (fécula da
mandioca, manteiga, açúcar, frutas etc.);
3) custeiam as despesas com transporte (frete) contratado naquele mês;
4) direcionam entre 10% a 30% do recurso para manter a poupança do grupo e;
5) o valor restante é dividido entre elas, de acordo a horas trabalhadas no mês.
Os seis grupos da AMMTRAFAS apresentam realidades diferentes como, por exemplo,
uns tem sede própria (Mulheres de Fibra, Produtoras do Rose, Mulheres Virtuosas), outro está
no processo de construção de sua sede (Novo Sabor), outros ainda trabalham em espaços
cedidos pela comunidade (Mulheres de Força, Garra Feminina); alguns são mais estruturados
em termos de equipamentos de produção (Mulheres de Fibra, Mulheres Virtuosas, Produtoras
do Rose) outros dispõem de menos estrutura (Garra Feminina, Mulheres de Força, Novo
Sabor). Ou seja, o valor que elas recebem e a quantia que investem para melhorias de seus
próprios grupos se diferenciam porque apresentam singularidades e necessidades muito
específicas.
Portanto, o PAA tem gerado renda para as trabalhadoras rurais da AMMTRAFAS,
ainda que consideremos um valor significativamente pequeno, que se caracteriza enquanto
complemento de renda porque as mulheres não conseguem sobreviver apenas desse recurso e,
por isso mesmo, em sua maioria, elas se inserem em outros postos de trabalho voltados
principalmente para a cultura do sisal, exercendo diferentes funções: corte da planta,
transporte da palha, secagem da fibra ao sol, aproveitamento da planta do sisal para produção
de artesanato.
Os recursos destinados ao contrato do PAA são pagos através do Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico Social - Fundo Social (BNDES Fundo Social)70. Para que as
associações participem do programa, elas concorrem a edital do BNDES-CONAB
inscrevendo projetos. O edital dispõe, entre outras informações, sobre o valor total (montante)
destinado ao programa naquele ano e do limite de valor a ser destinado a cada organização
proponente. Significa que ao elaborar o projeto as entidades proponentes estabelecem um
orçamento, que deve estar dentro desse limite estipulado pelo BNDES.

70
O BNDES Fundo Social é constituído com parte dos lucros anuais do BNDES para apoiar projetos de caráter social nas
áreas de geração de emprego e renda, serviços urbanos, saúde, educação e desportos, justiça, meio ambiente e outras
vinculadas ao desenvolvimento regional e social. Disponível em: <www.bndes.gov.br> Acesso: 25/03/2016.
106

Os valores repassados às entidades proponentes (associações comunitárias) do


município, para efetivação dos projetos do PAA pela Conab durante o ano de 2015, estão
registrados na tabela 4.

Tabela 4 - Repasse em reais (R$) para o PAA pelo Ministério do Desenvolvimento Social e
Combate à Fome (MDS). Santaluz/Bahia/ Brasil – 2015

Entidade Proponente Data de Valor total


vencimento R$
Associação dos Moradores e Pequenos 10/10/2015 143.087,50
Agricultores de Ferreiros

Associação Comunitária da Fazenda Nova 05/12/2015 78.000,00

Associação dos Moradores de Sítio Novo 04/12/2015 143.000,00

Associação dos Moradores e Produtores do 27/11/2015 212.275,00


Povoado do Miranda

Associação dos Pequenos Agricultores da 25/11/2015 107.796,00


Comunidade de Rose

684.158,50
Fonte: Conab. Disponível em: <www.conab.gov.br> Acesso em: 12/04/2015. Grifo nosso.
Elaboração: Silvana Maciel Pires, 2016

A liberação dos recursos para execução do programa é feita diretamente em conta


corrente de titularidade da organização social, de forma parcelada, condicionada a
apresentação e aprovação da prestação de contas pela entidade e de acordo o cronograma
físico financeiro a ser seguido.
Os recursos estabelecidos em edital se apresentam em valores brutos, o que significa
que ocorrem reduções nesses valores, por ocasião de pagamentos de impostos (Conab
desconta 5,85%) e tributos previstos em legislação vigente71. A associação proponente
também realiza um desconto de 7% nesse valor do PAA para custear despesas com nota
fiscal, documentação, correios e telefone que são investimentos feitos para realização do
projeto do PAA, segundo representante da AMMTRAFAS.
Podemos elencar algumas questões positivas em relação a participação das mulheres
da AMMTRAFAS (Santaluz/BA) no programa PAA desde 2007: I) a ampliação e
organização dos grupos de mulheres no município que trabalham com produção de alimentos

71
Edital de Chamada Pública BNDES-CONAB, nº 001/2013. Disponível em: <www.conab.gov.br/bndes> Acesso em:
12/05/2015.
107

na perspectiva de fazer parte desse projeto; II) a produção qualificada dos gêneros
alimentícios; III) o reconhecimento do poder público municipal, da sociedade civil e das
comunidades atendidas pelos PAA, dos alimentos produzido pelos grupos de mulheres; IV) o
PAA tem se consolidado enquanto uma fonte de geração de renda para as mulheres e; V) o
programa vem inserindo cada vez mais os grupos de mulheres na produção de seus gêneros
alimentícios, inclusive, a Resolução nº 44/2011 e o § 5º do Artigo 4º do Decreto nº
7.775/2012 estabelecem que as organizações de mulheres tem prioridades no fornecimento
desses alimentos.
Apesar de apontar questões que são bastante significativas do ponto de vista da
participação das mulheres da AMMTRAFAS no PAA, é preciso também destacar que esse
contexto ou arranjo ainda é muito recente, tanto no âmbito municipal quanto nacional e ele
tem se concretizado, sobretudo, a partir da luta das trabalhadoras rurais na busca pela
construção, inserção e efetivação de políticas para as mulheres rurais, em diferentes linhas de
ação dos programas do governo, como ocorre com o PAA.

5.2 Participação das mulheres da AMMTRAFAS no Programa Nacional de Alimentação


Escolar (PNAE) de Santaluz - Bahia

A AMMTRAFAS tomou conhecimento do PNAE através dos parceiros Sindicato Rural


do Município (STR-Santaluz), Movimento de Organização Comunitária (MOC) e
Cooperativa Rede Produtoras da Bahia (COOPEREDE), quando da participação das mulheres
em encontros organizados por estas entidades. Nesses encontros foi possível conhecer e se
informar sobre: a regulamentação do programa, seus benefícios, os processos e as
possibilidades de inserção das trabalhadoras rurais no mesmo.
A partir daí, a AMMTRAFAS buscou cada vez mais informações para melhor se
apropriar dos termos da Lei nº 11.947/2009 e passou a difundir entre as mulheres a
necessidade de estarem sempre informadas e de buscar os meios para participar do programa
no município. A associação de mulheres também lutou para que o município aderisse o
quanto antes ao programa, segundo afirmação de representante da AMMTRAFAS.
Em 2010, alguns grupos de produção da AMMTRAFAS começaram a participar do
programa através da chamada pública. Os grupos Mulheres de Fibra, Mulheres Virtuosas,
Mulheres Sonhadoras, Mão na Massa, Mulheres de Garra, Arte e Sabores e o Garra Feminina
foram, então, os primeiros no município a serem inseridos no PNAE. Como se observa, a
108

implementação do PNAE em Santaluz (2010) beneficiou, de início, uma quantidade


expressiva de grupos de mulheres, isso porque naquele ano o movimento já contava com 11
grupos organizados. A experiência de alguns grupos com o programa da Conab (PAA) e a
atuação da AMMTRAFAS no sentido de mediar, unir e fazer com que houvesse entre os
grupos essa socialização das práticas foi, em parte, o que possibilitou esse reconhecimento e
participação rápida das trabalhadoras rurais no PNAE.
A transformação do movimento para associação, através do registro, influenciou
também e, por outro lado, uma tomada de consciência e atitude da coordenação da
AMMTRAFAS na perspectiva de lutar e de cobrar maior atuação das mulheres trabalhadoras
rurais nas políticas públicas Municipal, Estadual e Federal, a fim de contribuir para melhorar
as condições de suas associadas. Como explica Santos (2010), ao tratar do associativismo na
Região Sisaleira72 da Bahia, “(...) o associativismo figura como uma possibilidade de
resolução de problemas ou melhoria das condições de vida (...)” (SANTOS, 2010, p. 35).
Em 2015, a AMMTRAFAS viabilizou a participação de 16 grupos de produção do
município de Santaluz no programa PNAE. O primeiro passo da associação nessa perspectiva
foi de analisar o perfil dos grupos que demostravam interesse em participar das chamadas
públicas – analisar as aptidões e a disponibilidade das mulheres para o trabalho com a
produção dos alimentos, identificar as condições e os recursos materiais e financeiros que os
grupos dispunham para dar início ao trabalho. A partir daí a associação de mulheres
viabilizou, em parcerias com o MOC e a COOPEREDE, cursos de formação relacionados
com a produção de alimentos para capacitar os grupos de produção.
Inicialmente, quando da inserção das mulheres no PNAE em 2010, a AMMTRAFAS
não possuía registro de entidade civil, como registramos anteriormente. Por conta disso e
desejando inserir seus grupos de produção no programa, a AMMTRAFAS realizou
articulações com as associações comunitárias de Ferreiros, Lagoa Escura, Miranda e Rose
para que estas entidades acessassem o programa e garantisse que as trabalhadoras rurais
realizassem a produção. Com as articulações, a AMMTRAFAS ganhava aliados, defensores
de sua causa e contribuía para a manutenção e fortalecimento desses espaços de articulação
política e social nas comunidades onde vivem e atuam as mulheres.
Todas as comunidades rurais onde existem os grupos de mulheres têm, também, uma
associação de moradores e pequenos agricultores rurais que representa aquela comunidade –
são denominadas de associações comunitárias. Nesse sentido, é válido ressaltar que o número
72
A Região Sisaleira da Bahia é resultado de um processo de regionalização do estado efetuado pela Companhia de
Desenvolvimento e Ação Regional (CAR), tendo em vista a caracterização peculiar deste espaço baseada no cultivo e
beneficiamento da agave sisalana – planta popularmente conhecida como sisal (SANTOS, 2010).
109

de associações de base comunitária no contexto do Território do Sisal é bem significativo,


assim já sinalizava Santos (2010), que do total de associações registradas em cartório, 67,95%
caracterizam associações comunitárias.
Atualmente a AMMTRAFAS permanece mantendo as parcerias com as associações
comunitárias, principalmente com aquelas que celebram contratos com a Prefeitura municipal
para realização do PNAE (associações de Ferreiros, Miranda, Lagoa Escura e do Rose). E, no
ano de 2015, também estabeleceu articulação com a COOBENCOL (Cooperativa vinculada a
ASCOOB e a AMMTRAFAS), de modo que, as cinco instituições concorreram à chamada
pública da Prefeitura e ganharam a licitação. De acordo com a representante da
AMMTRAFAS:

Os produtos e os valores que são lançados na chamada pública é dividido


para essas cinco entidades. Essas entidades colocam os produtos e os
mesmos preços. Ou seja, na hora do pregão não tem uma associação que vai
ganhar da outra, porque todas estão com o mesmo preço. Dentro dessa
parceria todas ganham a licitação. E aí, a articulação fica para
AMMTRAFAS, a nossa associação se mantem na articulação desses
produtos. Então, é isso que a gente faz, uma parceria com as entidades que
concorrem na chamada pública pra se manter todo ano no programa.
(Representante da AMMTRAFAS, 2015, grifo nosso)73

Há, portanto, uma articulação com as associações para que elas pleiteiem o contrato do
PNAE no município, porém, de forma que não se tornem umas para as outras concorrentes, há
nesse processo o entendimento de que todas as entidades são parceiras. Contudo, a associação
comunitária não terá, em contrapartida, responsabilidades alguma no que se refere à
organização e assistência aos grupos, que ficam a cargo da AMMTRAFAS. Cabe apenas às
associações, fechar o contrato, prestar contas e repassar os valores todos os meses para as
mulheres, que são também associadas nestas entidades.
Isso não significa, porém, que as quatro associações citadas não tenham competência
para assistir aos grupos de mulheres nas suas comunidades, mas, que há uma divisão de
tarefas e responsabilidades assumidas em comum acordo entre a AMMTRAFAS e as cinco
entidades (associações comunitárias e a COOBENCOL) que participam desse processo de
chamada pública para o PNAE. Em 2015, a AMMTRAFAS contribuiu para que dezesseis
grupos de mulheres participassem do PNAE no município, esses grupos estão caracterizados
na próxima tabela.

73
Entrevista concedida por representante da AMMTRAFAS em 27 nov. 2015. Entrevistadora: Silvana Maciel Pires.
110

Tabela 5- Caracterização dos grupos de mulheres associadas à AMMTRAFAS que


atenderam ao PNAE em Santaluz/Bahia/Brasil - 2015

Nº Tempo de
Comunidade Criação do
Nº Grupo mulheres atuação no
rural grupo
grupo PNAE/anos
1 Mulheres de Fibra Miranda 2004 27 5
Mulheres Artesãs
2 Mocambinho 2005 5 4
de Mocambinho
3 Mãos Artistas Morro dos Lopes 2007 4 4
4 Mão na Massa Serra Branca 2007 7 5
5 Arte e Sabores Várzea da Pedra 2008 6 5
Mulheres
6 Rose 2008 20 4
Produtoras do Rose
7 Mulheres Virtuosas Ferreiros 2009 19 5
8 Mulheres em Ação Lagoa Escura 2009 9 3
Mulheres
9 Rio do Peixe 2009 6 5
Sonhadoras
10 Mulheres de Garra Tombador 2009 7 5
Várzea da
11 Garra Feminina 2009 5 5
Pedrinha
Várzea da
12 Novo Sabor 2009 4 5
Pedrinha
13 Sabores da Caatinga Lagedinho 2010 4 4
14 Mulheres de Força Areal 2010 8 3
Mulheres
15 Calumbi 2011 6 4
Vencedoras
Mãos que
16 Barreirinho 2013 5 1
Produzem
Total 16 15 142

Fonte: Trabalho de campo realizado de 05/10/2015 a 07/01/2016 – Santaluz/ Bahia


Elaboração: Silvana Maciel Pires, 2016

O mapa 4 (p. 111) representa a localização das comunidades rurais de Santaluz onde
existem os grupos da AMMTRAFAS que participaram do PNAE em 2015, ou seja, destaca a
abrangência dos grupos de mulheres atuantes no programa e também a espacialização destes
no espaço rural do município.
Mapa 4 111
112

Desde que o PNAE passou a ser executado no município, em 2010, que as mulheres da
AMMTRAFAS participam no processo de compra institucional, evidentemente que através
das associações comunitárias, vendendo os produtos da agricultura familiar produzido por
elas. Portanto, há cinco anos que a produção dos alimentos para o PNAE tem sido realizada
exclusivamente pelas mulheres da AMMTRAFAS. Se a associação de mulheres consolidou
esse espaço diante das outras organizações da sociedade civil atuantes em Santaluz (BA) e
diante do poder público, é porque a AMMTRAFAS age de forma estratégica e planejada.
Logo, é pertinente sinalizar algumas de suas estratégias que as orientam para essa conquista:
 Realiza reuniões com as entidades consorciadas, renovando a cada ano as
parcerias estabelecidas (associações comunitárias de Ferreiros, Lagoa Escura, Miranda e Rose
e, mais recentemente, com a Cooperativa de Beneficiamento – COOBENCOL);
 Viabiliza constantemente cursos de formação e aprimoramento para as mulheres;
 Assegura representação da AMMTRAFAS no Conselho de Alimentação Escolar
(CAE), órgão que fiscaliza a aplicação dos recursos transferidos para realização do PNAE,
que zela pela qualidade dos produtos no município e tem mandato de quatro anos;
 Inscreve os grupos de produção em projetos e demais programas do Governo
Federal/Estadual, que tenham como objetivo disponibilizar aos empreendimentos solidários
equipamentos de produção, escritório ou mesmo recurso financeiro para estruturação das
sedes dos grupos;
 Disponibiliza informações para os grupos sobre o PNAE, para que as mulheres
conheçam as normas e as diretrizes do programa e saibam que atitudes devem ser tomadas
caso a Lei não se cumpra;
 Presta assessoria e acompanhamento constante aos grupos nas comunidades, algo
que é realizado em parceria com o MOC e a COOPEREDE, através de profissionais técnicos
que trabalham diretamente com os grupos, inclusive, as técnicas que acompanham esse
trabalho são da própria AMMTRAFAS, já que duas dessas mulheres são funcionárias: uma do
MOC e outra da COOPEREDE;
 Realiza avaliações do programa com os grupos de produção todo ano em
assembleia geral do movimento ou, mesmo, extraordinária quando se faz necessária.
Os grupos fornecem diferentes gêneros alimentícios ao PNAE, que em sua maioria são
produzidos manualmente principalmente porque essa é uma característica própria da produção
e manuseio desses alimentos como: sequilho, broa, pão, beiju e polpa de frutas.
113

O beiju, por exemplo, pode ser produzido em diferentes formatos, mas para atender ao
PNAE apenas dois são exigidos, um em forma de conchinha sem nenhum recheio, outro
quadrado com recheio de côco e açúcar. A técnica para fazer o beiju é a mesma utilizada
desde outrora pelas mães e avós dessas mulheres: em um chapa de ferro (medindo entre 120
cm² a 150 cm²) aquecida à lenha é espalhada a fécula da mandioca fresca (semiúmida) com
auxílio de uma colher ou peneira, distribuindo-a de tal maneira que ela vai assumindo a forma
que se deseja, depois espera-se até que o beiju esteja torrado para retirá-lo do forno e após
esfriar é embalado. As figuras 9 e 10 retratam, respectivamente, processos diferenciados de
produção do beiju pelos grupos Mulheres Artesãs de Mocambinho e Mulheres de Fibra.

Figura 9 - Produção de beiju – Grupo Mulheres Artesãs de Mocambinho –


Santaluz/Bahia/Brasil - 2015

Fonte: Trabalho de campo realizado de 05/10/2015 a 07/01/2016 – Santaluz/Bahia


Imagens: Silvana Maciel Pires
114

Figura 10 - Produção de beiju – Grupo Mulheres de Fibra –


Santaluz/Bahia/Brasil - 2015

Fonte: Trabalho de campo realizado de 05/10/2015 a 07/01/2016 – Santaluz/Bahia


Imagens: Silvana Maciel Pires e Luciana Santos de Matos

A AMMTRAFAS é responsável pela distribuição da quantidade de alimentos que cada


grupo deve produzir para o PNAE. Essa divisão se realiza em reunião organizada pela
associação de mulheres e leva em consideração os seguintes fatores: 1) que todos os grupos
recebam a mesma demanda de pedidos, a fim de evitar que um seja mais beneficiado que o
outro, pois, consideram que todos contribuam com a associação de forma equitativa, mas
dentro de suas possibilidades; 2) os gêneros alimentícios são distribuídos de acordo a
habilitação e estruturação dos grupos para aquela produção específica, já que nem todos
produzem todas as variedades de alimentos, por exemplo, somente o Grupo Mulheres
Virtuosas está habilitado (até o presente momento) para produção de pão, pois, dispõe dos
equipamentos necessários à produção em quantidade e qualidade.
Há grupos que se identificam melhor com a produção de um tipo de gênero alimentício
mais do que outros, a partir daí os próprios grupos solicitam para a AMMTRAFAS cursos de
culinária que venham a atender suas demandas particulares. Por isso também, que alguns
grupos desenvolvem competências e habilidades em relação a um gênero específico de
alimentos. De acordo com representante da associação de mulheres, elas só podem fornecer os
alimentos depois de capacitadas para isso. O que ficou evidente, é que todos têm o direito de
oferecer seus produtos para o programa, contudo, precisam estar bem capacitadas e, inclusive,
as mulheres têm a liberdade de propor demandas para melhor se estruturarem, assim afirma:
115

A gente não tem uma limitação de dizer: cinco grupos fornecem para o
PNAE e não vai fornecer mais nenhum. Não. Enquanto tiver grupo e eles se
identificarem com a produção, aquele pouco e o que a prefeitura pedir vai
ser distribuído para todos os grupos que mostrarem interesse em está
fornecendo seu produto. (Representante da AMMTRAFAS, 2015)74

As mulheres dos grupos reconhecem a importância das capacitações que são


viabilizadas pela AMMTRAFAS e oferecidas geralmente por seus parceiros, a
COOPEREDE, o MOC e o STR-Santaluz. Para elas, os cursos são importantes porque ajudam
a melhorar a qualidade dos alimentos produzidos e possibilitam ampliar outras oportunidades
de trabalho.
Os alimentos comercializados institucionalmente para o PNAE são distribuídos pela
AMMTRAFAS entre os 16 grupos para as respectivas produções, da seguinte forma: Pão
(apenas um grupo é responsável pela sua produção); Farinha de tapioca (dois grupos) ; Beiju
de côco (quatro grupos) ; Beiju de conchinha (quatro grupos) ; Broa (cinco grupos); Polpa de
frutas (sete grupos); Bolinho (nove grupos) ; Sequilho (treze grupos).
Destaca-se a seguir a tabela 6 elaborada com o intuito de representar parcialmente os
valores em reais obtidos pelos dezesseis grupos de mulheres e que são correspondentes à
venda para o PNAE em um dado mês do ano de 2015. Os valores foram declarados
individualmente pelas mulheres dos grupos durante atividade de campo e representam uma
fração da renda obtida por elas com a venda institucional, retratam, portanto, um valor obtido
individualmente após divisão do lucro realizado pelos respectivos grupos, em diferentes
meses do ano de 2015. Diante disso, é possível observar a diferença na remuneração que as
mulheres dos diferentes grupos da AMMTRAFAS obtiveram com o PNAE (2015).

Tabela 6 - Valores (R$) recebidos pelas mulheres dos respectivos grupos de produção da
AMMTRAFAS que comercializaram alimentos para o PNAE em Santaluz (2015)

Grupo de Produção Maior valor Menor valor


declarado em reais declarado em reais

Mulheres de Força 60,00 40,00

Mulheres que Produzem 120,00 20,00

Mulheres Vencedoras 60,00 30,00

Mulheres Virtuosas 230,00 100,00

Sabores da Caatinga 225,00 50,00

74
Entrevista concedida por representante da AMMTRAFAS em 27 nov. 2015. Entrevistadora: Silvana Maciel Pires.
116

Mulheres em Ação 200,00 50,00

Mulheres de Fibra 80,00 17,00

Mãos Artistas 150,00 60,00

Mulheres Artesãs de Mocambinho 150,00 50,00

Mulheres Sonhadoras 200,00 60,00

Mulheres Produtoras do Rose 50,00 20,00

Mão na Massa 80,00 40,00

Mulheres de Garra 60,00 40,00

Arte e Sabores 200,00 100,00

Garra Feminina 80,00 40,00

Novo Sabor 80,00 60,00

Fonte: Trabalho de campo realizado de 05/10/2015 a 07/01/2016 – Santaluz/Bahia


Elaboração: Silvana Maciel Pires, 2016

A sistematização dos dados demonstra que os valores declarados pelas mulheres dos
grupos de produção se diferenciam uns dos outros e pode-se dizer que é consideravelmente
baixo. Mas, é preciso considerar que esse resultado é reflexo de alguns fatores como:
estruturação dos grupos, pois, parte do dinheiro que elas receberam com o PNAE foi investido
no próprio coletivo para construção e/ou manutenção da sede do grupo, compra de
equipamentos de produção; quitação de empréstimos realizado pelo coletivo em benefício do
grupo, dentre outros. Enfim, por terem realidades diferenciadas os grupos apresentaram
resultados financeiros também diferenciados.
As mulheres demostraram, por um lado, insatisfação ao falar do rendimento com o
PNAE, pois, segundo elas o ganho com o programa se torna pouco por consequência da ação
da própria Prefeitura, que não estabeleceu uma quantidade fixa de gêneros alimentícios nos
pedidos que foram executados durante todo o ano de 2015. Existindo, dessa forma, meses em
que a renda individual chegava a ser satisfatória e meses em que, praticamente, não se tinha
renda, porque depois de custear as prioridades do coletivo, o que sobrava do dinheiro para
repartir entre elas era pouco ou, simplesmente, não existiam sobras. Por outro lado, elas
entendem que o PNAE é uma possibilidade de fonte de renda, desejam continuar participando
117

do programa e têm esperança de que esta renda que chega até suas mãos, futuramente, seja
mais significativa.
As mulheres percebem o programa como uma condição para mantê-las em atividade,
desempenhando um trabalho e fortalecendo os vínculos entre elas mesmas. Ou seja, não se
restringe só ao trabalho com a produção, compartilham toda semana fatos que se relacionam
às suas vidas particulares, isso para elas se configura como uma terapia. Então, o PNAE tem
sua importância atribuída não só à geração de renda, mas, ao fortalecimento e
amadurecimento das mulheres proporcionado através das relações que se desenvolvem
durante a prática de produção para o programa. As atividades representam diferentes ganhos:
de ordem sentimental (vínculos, interação), procedimental (habilidades), atitudinal
(personalidade), econômica (financeira). De acordo representantes75 da AMMTRAFAS, o
PNAE:

É muito importante, porque assim, além de ter uma geração de renda que
não seja grande, mas, é uma auto estima também pra nossa mente. É um
relaxante pra nosso corpo, nossa alma. No meu grupo mesmo, ninguém tem
emprego fixo. Então assim, o que vem do grupo, que não seja muito, já é
alguma coisa. Mesmo que reclame, mas, ninguém diz que vai sair porque
não tá dando. Fica em cima do muro, mas ninguém sai. Então assim, talvez
não seja pra sobreviver só disso, mas que seja uma ajuda dentro de casa, não
só para alimento, mas para outras coisas pessoais também. (Representante do
Grupo Mulheres Artesãs de Mocambinho, 2016).

Tem importância sim. Uma importância é porque pelo menos já é um


aumento para renda familiar e outra é o conhecimento que a gente tem com
as pessoas, porque passa a conhecer muita gente de fora, nós participamos de
intercâmbio em diversos lugares como Ceará, Pernambuco e tantos outros.
(Representante do Grupo Mulheres Produtoras do Rose, 2016).

Tem importância. A gente aprendeu muita coisa que a gente não sabia. Sem
contar nas amizades que a gente faz lá fora, isso é muito bom... Nossa renda
que aumentou. A gente não tinha renda, não quer dizer que hoje a gente já
tenha uma renda fixa, mas, a gente já conta com aquele que a gente tem.
(Representante do Grupo Novo Sabor, 2016).

Pra mim é importante... para nós todas, porque a gente não tem outro
trabalho. O trabalho é esse mesmo e a gente não tem como se manter de
outro jeito. Damos graças a Deus que apareceu esse e peço que nunca acabe.
Hoje ela não é suficiente porque as mercadorias do mercado vão subindo de
preço, enquanto que o preço que a gente vende para a prefeitura durante o
ano todo é o mesmo, não muda. A gente não tem lucro por causa disso,
porque a gente tem muita despesa, inclusive, com o frete do carro para

75
Entrevistas concedidas por representantes da AMMTRAFAS/ Grupo Mulheres Produtoras do Rose e o Grupo Mulheres
Vencedoras em 04 jan. 2016; Grupo Mulheres Artesãs de Mocambinho em 05 jan. 2016; Grupo Novo Sabor em 07 jan. 2016.
Entrevistadora: Silvana Maciel Pires
118

comprar as mercadorias (farinha de trigo, a manteiga) e pra fazer a entrega


para prefeitura. (Representante do Grupo Mulheres Vencedoras, 2016).

Ou seja, o que parece pouco inicialmente, representa uma parte da aplicação da renda
gerada com o programa que cabe a cada uma delas depois de custos com a produção,
maquinário, empréstimo, estrutura física, entre outros. E esses custos de ordem coletiva, do
grupo, caracterizam um investimento financeiro muitas vezes momentâneo, pois, em alguns
casos, não ocorrerão futuramente, tendo em vista que os benefícios uma vez agregados ao
grupo farão parte de sua estrutura, proporcionando-lhes mais autonomia de gestão.
Todo esse processo de participação das mulheres da AMMTRAFAS no PNAE ainda é
muito recente, considerando que o programa foi implementado no município no ano de 2010 e
que nem todos os grupos de mulheres foram contemplados naquele primeiro momento. Isso
explica, por exemplo, o fato de existirem grupos mais organizados do ponto de vista da
estrutura física e também da logística como os grupos: Mulheres Virtuosas, Mulheres de
Fibra, Arte e Sabores, Artesãs de Mocambinho e Produtoras do Rose. Demandas que para uns
grupos já foram superadas, para outros se faz de forma ainda muito expressiva como, por
exemplo, as sedes próprias de produção dos grupos Mulheres Sonhadoras, Mulheres de Garra,
Novo Sabor (além de outros) que se encontram em fase de construção ou acabamento e, por
isso mesmo, os rendimentos financeiros do grupo passam a ser investidos para este propósito
específico.
As declarações apresentadas por elas em relação à renda do PNAE, confirmam que o
ganho individual não é suficiente para se manterem, mas, de modo geral, a renda com o
programa é revestida para benefício do coletivo e, ainda que não se tenha abordado sobre este
fato, as mulheres reconhecem a importância de participar do programa para além da geração
de renda. Para algumas delas, as atividades desenvolvidas no grupo de produção tem se
estabelecido como o único trabalho rentável e que lhes oferecem certa qualidade de vida no
espaço rural.
Segundo a legislação que dispõe sobre o funcionamento do PNAE (Lei nº 11.947/2009),
a compra de gêneros alimentícios da agricultura familiar deve ser realizada desde que os
preços sejam compatíveis com os vigentes no mercado local e a Prefeitura enquanto entidade
executora do programa é responsável por este levantamento dos preços.
Fazendo uma análise dos dados referentes aos repasses financeiros do Fundo Nacional
de Desenvolvimento da Educação (FNDE) para compras da merenda escolar no município de
Santaluz, nos anos de 2012, 2013 e 2014, destaca-se que a Prefeitura tem de fato investido o
119

percentual que cabe às compras da agricultura familiar, tendo por referência a Lei nº
11.947/2009, como mostra tabela 7.

Tabela 7 - Valores (R$) investidos na aquisição de gêneros alimentícios diretamente da


agricultura familiar para o PNAE nos anos de 2012, 2013 e 2014 Santaluz/Bahia/Brasil

Ano Entidade Executora Valor transferido Valor em aquisições Percentual


pelo FNDE da agricultura
familiar
2012 Prefeitura Municipal de Santaluz R$ 569.664,00 R$ 179.450,50 32,01%

2013 Prefeitura Municipal de Santaluz R$ 655.708,00 R$ 272.392,10 41,54%

2014 Prefeitura Municipal de Santaluz R$ 730.476,00 R$ 232.252,55 31,79%


Fonte: FNDE. Disponível em: www.fnde.gov.br Acesso em: 27 jan. 2016
Adaptação: Silvana Maciel Pires, 2016

Os valores que são transferidos pelo Governo Federal para execução do PNAE no
município de Santaluz e os valores que foram investidos pela Prefeitura, nesses três anos
destacados, afirmam que a Prefeitura tem cumprido com o determinado na Lei nº
11.947/2009: “Do total dos recursos financeiros repassados pelo FNDE, no âmbito do PNAE,
no mínimo 30% deverão ser utilizados na aquisição de gêneros alimentícios diretamente da
agricultura familiar e de suas organizações [...]” (BRASIL, Lei nº 11.947 de 16 de junho de
2009, artigo 14). E, o município tem até mesmo ultrapassado o mínimo obrigatório, embora o
faça de forma tímida, reduzida.
De acordo com as próprias mulheres da AMMTRAFAS, a agricultura familiar de
Santaluz tem potencial para oferecer muito além daquilo que é estipulado em lei e adquirido
pela Prefeitura. Embora essa seja uma questão de prioridade que perpassa as decisões do
poder público municipal, já que tem cumprido com o mínimo estabelecido, a AMMTRAFAS
tem pautado essa questão do aumento do percentual de compras do PNAE, como sendo uma
alternativa para gerar mais renda e qualidade de vida para as trabalhadoras rurais, que vivem
basicamente dos trabalhos gerados com os grupos de produção.
Ao observar os valores transferidos pelo FNDE para a merenda escolar à Prefeitura,
atribuídos individualmente por alunos, compreende-se que são valores incontestavelmente
reduzidos e vergonhosos para um país que diz se preocupar com alimentação escolar em
quantidade e qualidade. Até o ano de 2015, o valor transferido para os municípios por dia
letivo para cada aluno foi definido de acordo com a etapa e a modalidade de ensino, como
mostra tabela 8.
120

Tabela 8– Relação dos estudantes atendidos pelo Programa Nacional de Alimentação


Escolar (PNAE) matriculados na rede pública de Santaluz e valores em reais (R$) por
modalidade de ensino no ano de 2015 – Santaluz/Bahia/Brasil

Modalidade de etapas Valor repassado por Estudantes matriculados na Total para o ano letivo
de ensino estudante e por dia rede pública por modalidade de 200 dias por
letivo (200 dias) de ensino atendidos pelo modalidade de ensino
PNAE
Creche 1,00 306 72.000,00
Pré-escola 0,50 794 79.400,00
Escolas Indígenas e 0,60 0 0
Quilombolas
Ensino Fundamental 0,30 5.336 320.160,00
Ensino Médio 0,30 0 0
Educação de Jovens e 0,30 615 36.900,00
Adultos
Atendimento à 0,50 101 10.100,00
Educação Especial
Mais Educação 0,90 250 45.000,00
Total geral 7.402 563,560,00
Fonte: FNDE. Disponível em: www.fnde.gov.br Acesso em: 18 fev. 2016
Elaboração: Silvana Maciel Pires, 2016

A rede pública de ensino do município de Santaluz contou com um total de 7.402


estudantes matriculados, inseridos nas modalidades de ensino que tiveram ação direta do
PNAE, em 2015. De acordo com os valores repassados por estudante e por dia letivo, pode-se
afirmar que o governo brasileiro ainda investe pouco na alimentação escolar, embora,
assegure que o PNAE contribui para o crescimento, o rendimento escolar dos estudantes e a
formação de hábitos alimentares saudáveis. Será que é possível garantir alimentação em
quantidade e qualidade para os estudantes, tendo valores tão baixos para aquisição da
merenda escolar? Essa é uma questão que merece ser evidenciada, embora, não seja
problematizada no contexto deste trabalho por não dispormos de meios suficientes para isso e
também porque não é este o foco principal.
Para fazer uma avaliação do PNAE no município a partir da perspectiva das mulheres
que trabalharam diretamente para o programa e, ao mesmo tempo, ao pensar em uma
avaliação que fosse propositiva, foi direcionada uma questão para as agricultoras, com o
propósito de que elas apontassem propostas de melhorias para a execução do PNAE e que
pudessem ser analisadas pelo poder público. O quadro 6, apresenta, desse modo, a visão das
mulheres da AMMTRAFAS em relação ao que precisa melhorar na execução do PNAE,
registradas durante o trabalho de campo.
121

Quadro 6- Concepções das trabalhadoras rurais da AMMTRAFAS sobre o que precisa


melhorar na execução do PNAE – Santaluz/Bahia/Brasil (2015)

Valorização dos produtos “A prefeitura tem que valorizar mais e pagar melhor pelos nossos produtos”.
da agricultura familiar do (Representante do Grupo Novo Sabor)
ponto de vista do poder
público municipal. “O prefeito deveria ter uma visão mais voltada para o produtor rural e
principalmente para os grupos de produção, que já é seu dever”. (Representante
do Grupo Mão na Massa)

“Comprar mais produtos dos grupos para a merenda escolar”. (Representante do


Grupo Mulheres Sonhadoras)

“O dinheiro que o governo paga é muito pouco, nosso trabalho não é valorizado”.
(Representante do Grupo Mulheres Artesãs de Mocambinho)

“Precisa melhorar o valor pago e a quantidade de produtos que o município


compra dos grupos. É preciso rever essa porcentagem de 30% porque é pouco pra
gente”. (Representante do Grupo Mãos Artistas)

“Comprar mais da agricultura familiar. Ainda é pouco os 30% que eles compram
dos nossos grupos”. (Representante do Grupo Arte e Sabores)

“Aumentar a nossa renda e fazer mais pedidos pra gente”. (Representante do


Grupo Mulheres de Força)

“O preço, porque a prefeitura paga muito barato pelos nossos produtos”.


(Representante do Grupo Mulheres Vencedoras)

“O preço pago pelos nossos produtos, porque tudo aumenta (matéria prima no
mercado), mas, a prefeitura não quer comprar nada caro”. (Representante do
Grupo Mulheres Virtuosas)

“Se o valor que eles pagam para a gente fosse mais alto, seria melhor pra gente,
mesmo que fosse mais trabalho” (Representante do Grupo Mulheres Virtuosas)

“Melhorar os preços dos produtos, porque a gente dá um preço aos produtos,


mas, a prefeitura não quer pagar porque diz que é caro e não tem dinheiro”
(Representante do Grupo Mulheres em Ação)

“A porcentagem de 30% é pouca pra nós, eles podem pagar mais, até 50%. Por
que não?” (Representante do Grupo Mulheres em Ação)

“Valorizar mais nosso trabalho e comprar mais nossos alimentos”.


(Representante do Grupo Garra Feminina)

“Sempre tem o que melhorar. O preço mesmo que a prefeitura compra nossos
produtos tem que aumentar”. (Representante do Grupo Mulheres de Fibra)

“O programa é ruim porque a prefeitura não compra o suficiente dos grupos. Tem
que comprar mais dos nossos produtos e pagar bem”. (Representante do Grupo
Mulheres Produtoras do Rose)

“Ter mais pedidos, toda semana porque só pedem por quinzena e pedir em maior
quantidade”. (Representante do Grupo mulheres de Garra)

Desburocratização da “Precisa melhorar o nosso pagamento que nunca é no mês certinho, o valor que a
prestação de contas para prefeitura paga é muito barato e a gente tem muitos gastos”. (Representante do
122

que os pagamentos sejam Grupo Mulheres Produtoras do Rose)


regularizados por mês.
“Receber o pagamento todo mês certinho. Ver a prestação de contas porque o
pagamento atrasa e a gente fica até 2 meses sem receber”. (Representante do
Grupo Mulheres de Fibra)

“Não atrasar nosso pagamento porque a gente tem despesas...” (Representante do


Grupo Mulheres de Força)

“A forma como a prefeitura faz o pagamento, porque é muito atraso”


(Representante do Grupo Sabores da Caatinga)

Mais organização na “Fazer os pedidos com antecedência que é pra gente se organizar melhor”.
solicitação dos produtos (Representante do Grupo Mulheres de Força)
da agricultura familiar
para merenda escolar: “Prazo para a entrega dos produtos e também, a quantidade que a prefeitura pede
determinar quantidades poderia ser sempre a mesma”. (Representante do Grupo Mãos que Produzem)
fixa por semana/mês.
“As vezes, os pedidos são feitos muito próximo da data de entrega, não tendo
muito tempo para fazer as compras necessárias para a produção” (Representante
do Grupo Novo Sabor)

Melhorar a logística de “O frete poderia ser feito pela própria prefeitura. Seria uma ajuda e tanto para os
entrega desses produtos – nossos grupos” (Representante do Grupo Mãos que Produzem)
realizar parceria com a
prefeitura municipal. “A coleta dos produtos da merenda escolar poderia ser feita por carro da
prefeitura nas comunidades, pra economizar nossos gastos com transporte”
(Representante do Grupo Mulheres em Ação)

“O transporte para entregar a merenda em Santaluz (sede) fica muito caro pra
gente por causa da distância”. (Representante do Grupo Sabores da Caatinga)

“A logística de entrega dos produtos”. (Representante do Grupo Novo Sabor)

“Se a prefeitura colocasse um carro pra pegar os alimentos nas comunidades era
melhor pra gente”. (Representante do Grupo Mulheres de Garra)

Diversificar o cardápio da “Pedem produtos novos para a merenda, a gente apresenta como, por exemplo, as
merenda escolar, solicitar geleias de fruta que a gente apresentou em reunião no meio do ano, e depois não
novos produtos e efetivar compram dizendo que está caro...” (Representante do Grupo Mulheres
compras. Vencedoras)

“Fazer mudança no cardápio seria uma forma de dar mais oportunidade para
agricultura familiar” (Representante do Grupo Mulheres em Ação)

“Que o programa pudesse comprar todo tipo de alimento da agricultura familiar,


principalmente, os de época como o milho, amendoim, abóbora, hortaliças. Esses
alimentos, a prefeitura não pede para os grupos” (Representante do Grupo
Mulheres em Ação).

Fonte: Trabalho de campo realizado de 05/10/2015 a 07/01/2016 – Santaluz/Bahia


Elaboração: Silvana Maciel Pires, 2016
123

O reconhecimento do trabalho das mulheres, na concepção delas, está associado ao


aumento de compra dos produtos da agricultura familiar e ao aumento na oferta de preços
desses produtos, por parte da entidade executora do PNAE e para a qual a AMMTRAFAS
presta serviço – a Prefeitura. Isso porque, elas reconhecem que os valores investidos na
compra de seus produtos são baixos, mesmo tendo por base o preço de mercado. E, é preciso
considerar que, de fato, o investimento estabelecido pelo FNDE por estudantes e dias letivos
para a merenda escolar é barato e a Prefeitura recebe em função desse parâmetro para investir
na merenda escolar.
É notório que as mulheres não desconsideram a relevância do programa na geração de
trabalho e renda para elas, mas, que o poder público poderia investir mais de 30% nas
compras da agricultura familiar e isso é sentido e denunciado por elas, porque trabalham
diretamente para suprir necessidades da rede pública de ensino, através da oferta de alimentos
para o PNAE. Portanto, elas estabelecem relação entre o trabalho que desenvolvem e a
valoração dele está associada à renda.
A renda consolidada com a comercialização para o PNAE, no caso de Santaluz, não é
a única garantia de autonomia financeira para as mulheres, mas, é uma renda que tem
contribuído para fortalecer os empreendimentos coletivos das mulheres da AMMTRAFAS,
através de investimentos feitos por elas nos seus espaços de produção para melhoria da
estrutura física e para a compra de equipamentos, por exemplo.
Algumas mulheres da AMMTRAFAS exercem outras atividades em outros postos de
trabalho, seja na própria agricultura ou na prestação de outros tipos de serviços. Destacam-se,
então, as demais fontes de renda declaradas pelas mulheres durante trabalho de campo:
atividades produtivas relacionadas com o trabalho autônomo como o comércio realizado pela
própria família, a confecção e a venda de artesanato individualmente, serviços prestados em
salão de beleza (manicure, pedicure, cabeleireira) e a criação particular de animais para venda
(aves, caprinos, ovinos). Portanto, isso significa que a maioria das mulheres que fornecem
alimentos para o PNAE não vivem unicamente do ganho gerado com o programa, mas, que se
ocupam de outras formas de trabalho, fortalecendo a ideia de que a renda gerada com esse
programa tem um caráter suplementar.
A autonomia das mulheres perpassa, também, a autonomia financeira, porque o
trabalho remunerado proporciona para elas maior independência no planejamento de questões
relacionadas às suas vidas. Ou seja, a “autonomia econômica das mulheres se refere à
capacidade delas de serem provedoras de seu próprio sustento, assim como das pessoas que
124

delas dependem (...)” (BRASIL, 2014, p. 103), e ter a possibilidade de decidir sobre o que
fazer com o dinheiro que se ganha fruto da sua força de trabalho.
A questão financeira é tão importante nesse processo de autonomia das mulheres que,
muitas vezes, elas precisam acumular mais de uma ocupação remunerada para garantir uma
renda que seja significativa e exercer sua autonomia em uma sociedade em que as relações se
manifestam de forma tão desigual para elas. Historicamente os homens ocuparam posições de
trabalho mais expressivas do que as mulheres, socialmente e financeiramente. Este fato criou
em muitos casos uma condição de subordinação das mulheres em relação aos homens,
principalmente, de ordem financeira e por conta desse contexto, a independência financeira da
mulher é fator preponderante para o exercício da sua autonomia.
O próprio fato de algumas mulheres da AMMTRAFAS sobreviverem com tão pouca
renda - menos que o atual salário mínimo (R$ 788,00) – pode inclusive, ser analisada como
uma forma de manutenção dos padrões e das relações desiguais de gênero manifestadas no
espaço rural. A divisão sexual do trabalho, que se apresenta nesse contexto, agrega
principalmente remunerações diferenciadas para ambos os gêneros. Além de outras questões,
que se mostram enquanto limitações para autonomia plena das mulheres, por exemplo: o
medo de represália do companheiro por terem que se ausentar todos os dias para o trabalho
fora do lar, a preocupação por não ter (às vezes) um grau de instrução suficiente para
desempenhar outros trabalhos, as atribuições nos cuidados com os filhos, a casa, o marido ou
mesmo doentes na família.
Então, é importante lembrar que a autonomia para mulher representa mais que a
garantia de autonomia financeira. “[...] A remuneração não é a única fonte de autonomia; esta
depende de nossa formação, do acesso aos bens comuns, ao crédito, à economia solidária e
aos serviços públicos [...]” (BRASIL, 2014, p. 101). Por isso, consideramos que a autonomia
das mulheres da AMMTRAFAS tem sido conquistada todos os dias, por meio de muita luta e
persistência de cada uma delas, seja através da associação ou individualmente onde quer que
estejam inseridas. A AMMTRAFAS tem sido responsável por construir juntamente com as
agricultoras, processos organizativos que geram renda para as mulheres, como os grupos de
produção e a própria associação se constitui condição e consequência da autonomia das
mulheres, sobretudo, porque ela existe em função das atividades desempenhadas pelas
trabalhadoras rurais.
Uma das representantes da AMMTRAFAS, ao avaliar o resultado do PAA e do PNAE
para a realidade das agricultoras associadas, compreende que os programas contribuíram para
transformação da vida dessas mulheres, porém, não se limita a uma transformação apenas
125

financeira, mas também social, pois, motivadas pelo trabalho desenvolvido para os
programas, elas participam de capacitações, intercâmbios, reuniões direcionadas às demandas
dessas políticas e tudo isso contribui para o desenvolvimento/desempenho pessoal,
profissional e político das mulheres. Para ela:

São duas políticas que tem transformado bastante a vida das mulheres,
porque são oportunidades que elas tem hoje que antigamente nem se sonhava
em ter. Onde a mulher, a mãe (vamos dizer assim, vamos tratar na questão
da mãe) está ali produzindo seu produto, sabendo que seu produto vai para
as escolas e que seus próprios filhos irão se alimentar daquilo que elas estão
fazendo. E, além disso, da mãe produzir a própria merenda, alimentação para
seus filhos, elas ainda são compensadas financeiramente por isso. Então,
olhando por esse lado do cuidado da mãe e da questão financeira de ter
melhorado a renda delas... Muitas trabalham no sisal, muitas são donas de
casa e esses dois programas vieram pra complementar e, às vezes, é a
principal renda na casa dessas mulheres. (Representante da AMMTRAFAS,
2015)76

Uma questão muito significativa na fala da representante da AMMTRAFAS está em


reconhecer a importância emocional e afetiva que as mulheres carregam consigo quando se
trata de pensar o PNAE. Mulheres que trabalham produzindo o alimento dos próprios filhos,
algo que atribui às mulheres uma carga de responsabilidade e que muito mais do que uma
cobrança alheia se torna uma cobrança pessoal, delas mesmas em relação ao trabalho.
O programa vem desde a sua implementação (2010) contribuindo para fortalecer e
estruturar as organizações produtivas de mulheres do município e esse processo tem a
AMMTRAFAS como principal articuladora e mediadora das demandas e dos processos que
dizem respeito às trabalhadoras rurais de Santaluz.

5.3 AMMTRAFAS – instituindo espaços de referência, poder e estabelecendo novas


territorialidades no município de Santaluz - Bahia

Os movimentos sociais costumam usualmente se articular a outras forças


institucionalizadas e a força social que passam a ter, também, vai estar relacionada com essas
articulações pactuadas (GOHN, 1997). A AMMTRAFAS é uma organização social que vem
ao longo desses 20 anos atuando no espaço rural do município de Santaluz, organizando e
contribuindo para estruturação de grupos de mulheres trabalhadoras rurais. Uma associação
formada por e a partir das próprias mulheres, que vem crescendo e se fortalecendo no

76
Entrevista concedida por representante da AMMTRAFAS em 27 nov. 2015. Entrevistadora: Silvana Maciel Pires.
126

município e também no Território do Sisal, dentre outros fatores, pela capacidade de


articulação política.
Todas essas articulações se efetuam por meio de parcerias que visam conquistas coletivas,
porém, isso não significa que não haja nessas relações estabelecidas incompatibilidade de
interesses. Mas, o que se deseja é chamar atenção para as nuances que se fazem presentes
nessas relações, o poder de persuasão e os “malabarismos” empreendidos por uns e outros
agentes com objetivo de defender seus interesses e seus territórios.
A AMMTRAFAS atua no sentido de amparar e assistir as trabalhadoras rurais que são
suas associadas no município de Santaluz e também de Araci, para isso, reconhece a
necessidade da efetivação de parcerias que cooperem com a troca de informações e
conhecimentos técnicos, organizacionais, de gestão e apoio à produção e comercialização,
que venham nesse sentido auxiliar a luta da associação. Segundo depoimento da atual
presidenta da AMMTRAFAS:

Nosso objetivo hoje é o fortalecimento das mulheres, em suas comunidades,


em suas bases. Fortalecer também a própria associação (AMMTRAFAS),
porque a gente também não pode fortalecer somente os grupos e esquecer da
associação. Hoje, toda base do grupo está na associação. A associação acaba
interferindo, identificando projetos pra está buscando recursos e melhorar a
estrutura dos grupos e também a formação de novas lideranças, até porque
essa diretoria que está hoje não é eterna, vai passar. E, para que uma de nós
saia hoje, alguma vai ter que assumir isso. Porque quando a gente está em
uma instituição vai sempre aparecendo outras atribuições, por exemplo, uma
liderança se forma na comunidade, lá na base dela, só que depois ela não fica
só na base dela, porque passa a ir para outros espaços. Então, tem que ter
alguém para assumir o lugar dela. Muitas de nós deixamos a estrutura dos
grupos e não é pra dizer que nós não vamos mais lá, sempre estamos lá,
porém, não como as outras - no dia a dia com a mão na massa. Estamos mais
aqui na sede do município por causa da diretoria da AMMTRAFAS. Aí,
depois que a gente chegou aqui na diretoria, já tem outros espaços que nós
vamos participar e que exigem maior presença nossa, como a REDE77. A
Rede de Produtoras hoje é uma cooperativa do estado, representa o estado e
boa parte da gente aqui da AMMTRAFAS estamos lá, compondo a diretoria
dessa cooperativa. Só que essa articulação lá já não é mais municipal, a
articulação é a nível de Território e também já requer um tempo nosso.
(Representante da AMMTRAFAS, 2015)78

A AMMTRAFAS se dedica basicamente à organização, fortalecimento e assessoria dos


grupos de mulheres. Uma vez fortalecido os grupos, o próprio movimento se fortalece
também e, nesse sentido, o depoimento demonstra que existe uma preocupação no que diz
77
A sigla REDE muito utilizada pelas representantes da AMMTRAFAS durante entrevistas refere-se à Cooperativa Rede
Produtoras da Bahia – COOPEREDE.
78
Entrevista concedida por representante da AMMTRAFAS em 15 de out. 2015. Entrevistadora: Silvana Maciel.
127

respeito ao trabalho que elas desenvolvem na direção da associação, para que ele seja
contínuo. As mulheres reconhecem a importância que tem a entidade (AMMTRAFAS) para
a organização das trabalhadoras rurais no município, por isso, se preocupam em repassar o
conhecimento e as responsabilidades com a gestão da associação às demais companheiras da
luta, a fim de que o trabalho por elas desempenhado não morra. E, também, que à medida
que as mulheres chegam à direção da associação, se afastam dessa pela necessidade de
assumir outros postos de representação no município ou no território em prol da coletividade
do movimento.
A AMMTRAFAS representa um espaço de projeção das mulheres no município e no
Território do Sisal, tem sua importância e por isso mesmo as mulheres são convidadas a
participarem de outras instituições. Esses espaços de inserção tanto servem à projeção da
associação como representam formas instituídas de relações de poder, pois, assegurar sua
participação em espaços de discussão e decisão no município como, o Conselho de
Alimentação Escolar (CAE), Conselho de Desenvolvimento Rural e a Secretaria de Mulheres
do Sindicato Rural, é compreender que daí sai deliberações e projetos que podem favorecer
as agricultoras da AMMTRAFAS necessitando, portanto, que a associação esteja pronta para
demandar, questionar e disputar o que for de seu interesse. Assim como, fiscalizar a
aplicação dos recursos repassados para os programas (PAA e PNAE) e a prestação de contas
do gestor público. Portanto, os conselhos representam espaços de exercício de poder e,
também, são instâncias tão importantes para a execução dos programas que, caso eles não
funcionem corretamente, o Governo Federal pode até suspender os recursos para o
funcionamento dos programas.
A COOPEREDE, outra entidade da sociedade civil com atuação em diferentes
territórios de identidade da Bahia, é considerada pelas mulheres da associação, como a “mãe”
dos grupos de produção. A COOPEREDE estabelece parceria com o MOC que é responsável
por assessorar projetos do Governo Federal e Estadual, e a cooperativa executa os projetos.
Através desses projetos os grupos são beneficiados com formação, capacitação,
equipamentos, intercâmbio entre outros. Daí a necessidade delas em constituir parceria e
compor esse espaço de efetivação de políticas públicas para as mulheres.
Para representante da AMMTRAFAS, a importância de se efetivar parcerias com outras
instituições em escala de atuação territorial e estadual, está na possibilidade de reunir forças
na hora de demandar questões específicas das mulheres do município. de acordo
representante da AMMTRAFAS do Grupo Mulheres Artesãs de Mocambinho:
128

Eu acho que a REDE hoje é a mãe dos grupos de produção, porque a REDE
tem parceria com o MOC e boa parte dos projetos hoje (Federal e Estadual)
o responsável pelo projeto é o MOC, mas, tem a REDE de PRODUTORAS
como a executora desses projetos. A Rede faz essa articulação com os
grupos de produção e todos os nossos grupos, hoje, são filiados à
COOPEREDE, aonde eles são beneficiados com formação, capacitação,
equipamentos, intercâmbio. Hoje a REDE é para gente um braço forte e o
MOC também, porque se não tivesse eles, só a gente em si conseguiria
alguma coisa, mas, não tanto quanto se todo mundo unir forças para buscar
algo. A voz de uma entidade que é a nível de território, a nível de estado, ela
tem mais força do que uma entidade que é só a nível municipal. Por isso que
a gente acha importante estar também nesses espaços e boa parte dessas
mulheres daqui estão nessa cooperativa, inclusive, a coordenadora da REDE,
hoje, é daqui da AMMTRAFAS. (Representante da AMMTRAFAS, 2015)79

Algumas motivações levam a associação a criar estratégias de parcerias com as demais


organizações sociais: I) garantir a construção das sedes dos grupos; II) inscrever e acessar
programas ou projetos do governo através do MOC ou da COOPEREDE destinados à
organização produtiva das mulheres, para garantir a estruturação dos grupos de produção; III)
proporcionar formação de qualidade e em diferentes aspectos (profissional, social,
econômico) para as trabalhadoras rurais entre outras motivações.
A AMMTRAFAS é uma associação que compreende bem a importância de se
estabelecer e firmar parcerias na perspectiva de cumprir com seus objetivos. Assim, também,
entende que essa conquista só é possível quando as parcerias são instituídas com
organizações que se comprometem e empregam lutas que lhes são comuns. Os próprios
parceiros da AMMTRAFAS contribuem para divulgar o trabalho da associação de mulheres
e as experiências dos grupos de produção, como faz o MOC através da publicação do
Bocapiu, um informativo mensal que busca socializar as vivências das agricultoras e
agricultores dos municípios onde a entidade atua, como mostra a figura 11 (pag. 134), uma
reprodução de informativos que retrataram experiências dos grupos de mulheres da
AMMTRAFAS: (1) Grupo Mulheres Produtoras do Rose e (2) Grupo Arte e Sabores.
Os dois informativos do MOC foram publicados no ano de 2015, destacam a origem
desses grupos de mulheres da AMMTRAFAS, seus desafios e os resultados positivos a partir
da organização delas. As informações foram sistematizadas a partir das falas das próprias
mulheres e apresentam ilustrações relacionadas à rotina de vida e trabalho delas nos seus
grupos.

79
Entrevista concedida por representante da AMMTRAFAS em 15 de out. 2015. Entrevistadora: Silvana Maciel.
129

Figura 11 – Informativo do MOC sobre experiências dos grupos de mulheres de


Santaluz/Bahia/Brasil

1 2

Fonte: Reprodução por fotografia do informativo original do Movimento de Organização


Comunitária (MOC)/2015.

Os serviços prestados pela AMMTRAFAS aos grupos de mulheres são de natureza


educacional, cultural, recreativa e objetivam qualificação e melhoria das condições de vida
das associadas (Estatuto da AMMTRAFAS, 2010). As próprias trabalhadoras rurais
salientaram sobre essa questão em entrevista80, como mostra transcrição das entrevistas
concedidas:

A AMMTRAFAS já deu muito cursos, de cooperativismos e associativismo,


gênero, autoestima, em convivência com outras companheiras, então assim,
ela vem trazendo muitas atividades, muitos cursos que relacione não só o
trabalho, mas, outras questões pessoais. Tem a parceria da AMMTRAFAS
com a REDE, no caso a AMMTRAFAS é filiada a REDE e aí todos os
grupos que são filiados à AMMTRAFAS tá também filiados na REDE.
Então assim, tem os passeios, os intercâmbios que não é só para conhecer
outras experiências, mas, onde a gente possa se divertir. Tanto a REDE
como a AMMTRAFAS, fizeram sua festa esse ano, um dia de lazer pra
gente. Algumas capacitações acontecem aqui, mas, a maioria das
capacitações acontece em Feira de Santana porque é pela REDE ou pelo
MOC ou onde tenha o produto, no caso de Coité, ele é pioneiro em beiju,
então assim, se der capacitação de beiju, de broa, de biscoito e a maioria das
mulheres são da região de cá, então, elas marcam em Coité ou Araci. Sempre

80
Entrevistas concedidas por representantes da AMMTRAFAS. Jan. 2016. Entrevistadora: Silvana Maciel Pires.
130

tem cursos com as mulheres do MMTR de Araci ou da Secretaria de


Mulheres do Sindicato Rural de Coité, além de Feira de Santana.
(Representante do Grupo Mulheres Artesãs de Mocambinho, 2016)

Através da AMMTRAFAS tomamos vários cursos: cursos técnicos,


autoestima da mulher, oportunidades que surgem elas vão buscar, passeios,
confraternização. A gente aprendeu várias coisas que a gente não sabia. Sem
contar com as amizades que a gente busca lá fora nos cursos, nas atividades
e o divertimento. É muito bom! Pessoas de outros grupos daqui, da própria
AMMTRAFAS, como o grupo do Tombador, já repassou algumas
capacitações pra gente, como o curso de broa que quem deu foram elas, e
outros grupos que estejam mais adiantados que o nosso vai repassando o que
sabe para aqueles que precisam apreender ainda. (Representante do Grupo
Novo Sabor, 2016)

Desse modo, concorda-se com a reflexão do professor Coelho Neto (2014), que
denomina essas formas de articulações estabelecidas entre agentes sociais de coletivos em
redes, porque priorizam questões e pautas de caráter territorial. Ele afirma que esse tipo de
articulação pode ser pensado na perspectiva de redes socioterritoriais, pois, “acionam e
delimitam um espaço referência como base de suas estratégias de operações, e suas ações se
dirigem para construção de territorialidades” (COELHO NETO, 2014, p. 140). As
capacitações e cursos ministrados por entidades parceiras da AMMTRAFAS caracterizam
uma consolidação de parcerias, como esta retratada na figura 12:

Figura 12 - Curso de Panetone para mulheres do Território do Sisal -


Realização COOPEREDE Feira de Santana Bahia - novembro de 2015

Fonte: Trabalho de campo realizado de 05/10/2015 a 07/01/2016 – Santaluz/Bahia


Imagem: AMMTRAFAS
131

O curso foi promovido pela COOPEREDE na cidade de Feira de Santana e contemplou


diversos grupos de organizações produtivas de mulheres dos municípios do Território do Sisal
como: Araci, Serrinha e Santaluz, entre outros. O curso teve como meta capacitar as mulheres
para produção de panetone81 como sendo uma alternativa para geração de renda aos grupos,
principalmente, porque se aproximava das festas de final de ano, na qual, o panetone é
tradicionalmente consumido de forma mais expressiva.
Os grupos de produção caracterizam uma das principais e mais significativas formas de
organização coletiva das mulheres da AMMTRAFAS. As sedes desses grupos representam
processos de apropriação de espaços nas comunidades pelas trabalhadoras rurais, pois, ao
construírem suas sedes as mulheres passam a desenvolver aí ações relacionadas à organização
produtiva, formação e socialização de práticas de economia solidária, tornando visível sua
ação na comunidade.
As sedes de produção da AMMTRAFAS (espaços físicos) estão localizados nas
comunidades rurais, locais onde as mulheres desenvolvem seus trabalhos com a produção de
alimentos e também de artesanato, no caso de alguns grupos (Arte e Sabores, Artesãs de
Mocambinho, Mulheres de Fibra). São realizadas, também, nas sedes dos grupos: reuniões
(do próprio grupo, da diretoria da AMMTRAFAS e das (os) técnicas (os) do MOC) e cursos
para as mulheres. Todos os 16 grupos estão ligados à AMMTRAFAS que possui sede na
cidade de Santaluz e é meta desta entidade contribuir para que as trabalhadoras rurais
instituam e estruturem seus grupos de produção.
Portanto, as sedes de produção dos grupos e os demais espaços de atuação das mulheres
da AMMTRAFAS (sede da associação82e a loja Maria Bunita) caracterizam espaços de
referência, frutos de um processo histórico de organização das mulheres que começou no
início da década de 1990, esses espaços foram materializados por e a partir das mulheres, para
desenvolver aí suas ações sejam elas de ordem política e/ou econômica. Os espaços físicos
caracterizam o sistema de objetos e as atividades desenvolvidas pelas mulheres caracteriza os
sistemas de ações.
Dos dezesseis grupos de mulheres da AMMTRAFAS que participaram do PNAE
(2015), oito tem sedes próprias, cinco exercem suas atividades em sedes da associação
comunitária, um na sede da cooperativa comunitária, um na casa de farinha comunitária e um
outro tem sede alugada no próprio povoado.

81
Constitui um pão doce, tradicional da ceia de Natal.
82
Rua Lomanto Junior nº 104, Centro Santaluz Bahia CEP: 48880-000
132

A figura 13 a seguir, retrata as sedes de 3 grupos da AMMTRAFAS: (1) sede do Grupo


Mulheres Produtoras do Rose - Rose; (2) sede do Grupo Mulheres Sonhadoras – Rio do
Peixe; (3) sede do Grupo Mulheres Virtuosas – Ferreiros. E, a figura 14 (pag. 133) retrata os
espaços onde atuam os grupos que não têm sedes próprias: (1) Grupo Mãos Artistas –
Associação de Morro dos Lopes; (2) Mulheres Vencedoras – Associação de Calumbi; (3)
Mulheres que Produzem - Casa de Farinha Comunitária de Barreirinhos.

Figura 13 - Sedes próprias dos grupos de mulheres da AMMTRAFAS –


Santaluz/Bahia/Brasil (2015)

Fonte: Trabalho de campo realizada de 05/10/2015 a 07/01/2016 – Santaluz/Bahia


Imagens: Silvana Maciel Pires, 2015
133

Figura 14 – Sedes comunitárias onde grupos da AMMTRAFAS exercem suas


atividades– Santaluz/Bahia/Brasil (2015)

Fonte: Trabalho de campo realizada de 05/10/2015 a 07/01/2016 – Santaluz/Bahia


Imagens: Silvana Maciel Pires, 2015

As sedes de produção caracterizam uma forma efetiva de valorização do trabalho delas,


porque são empreendimentos construídos para reunir as mulheres e organizar suas atividades.
A implantação desses espaços de trabalho nas comunidades é uma estratégia importante e
134

imprescindível para reconhecer e fazer respeitar o trabalho dessas mulheres, além de


determinar uma forma de reorganização dos espaços de participação coletiva.
As sedes dos grupos de mulheres da AMMTRAFAS assumem um entendimento tanto
do ponto de vista funcional, devido às atividades realizadas nesses espaços (território dessas
mulheres), como simbólico, a partir dos valores que lhe são atribuídos e que estão associados
às ações das mulheres. Para Haesbaert (2004, p. 6777) “(...) todo território funcional tem
sempre alguma carga simbólica, por menos expressiva que ela seja, e todo território simbólico
tem sempre algum caráter funcional, por mais reduzido que ele seja.”.
As mulheres da AMMTRAFAS são agentes que tem se apropriado e constituído
espaços no contexto rural e urbano, conferindo-lhes funções e produzindo significados. As
sedes dos grupos nos povoados e a sede da AMMTRAFAS, da loja Maria Bunita e da
COOBENCOL na cidade de Santaluz, são espaços com funções específicas e definidas como:
produção, comercialização dos produtos gerados nos grupos (artesanato e gêneros
alimentícios), reunir e abrigar as mulheres da associação. Para a presidenta da associação de
mulheres - AMMTRAFAS:

(...) A partir do momento que os empreendimentos têm sua estrutura física


na sua própria comunidade, faz com que a comunidade tenha uma visão
diferente do trabalho das mulheres. Então, dá visibilidade para a comunidade
(...) Faz com que a comunidade cresça e isso também é muito importante. E,
também, que a gente saiba que estrutura física para se trabalhar com
alimentação também pode ser organizada e estruturada em área rural. Ainda
não é a realidade de todos os empreendimentos de mulheres do município a
questão da estrutura física totalmente padronizada para trabalhar com
alimentos, mas, já existe em algumas comunidades alguns grupos que já tem
sua estrutura ou que já está construindo sua estrutura dentro das normas para
trabalhar com alimentação. É algo que a gente vê que tem possibilidade e
que é importante porque elas não precisam se deslocar para área urbana, elas
trabalham em suas próprias comunidades. Até faz com que não exista o
êxodo rural, principalmente, para os jovens os filhos e as filhas, porque as
mães que ali trabalham já é uma forma também de incentivar o trabalho
coletivo, o trabalho solidário com seus filhos. (Presidenta da
AMMTRAFAS, 2015)83

A territorialização do espaço é orientada a partir de alguns objetivos que Haesbaert


(2004, 2005) vai classificar em quatro, especificamente: 1) abrigo físico, fontes de recursos ou
meio de produção; 2) identificação de grupo através de referencias espaciais; 3) controle
através do espaço e; 4) construção de conexões e redes. Portanto, a associação das
trabalhadoras rurais caracteriza uma forma de fortalecer a luta delas através da efetivação de

83
Entrevista concedida pela presidenta da AMMTRAFAS em 27 nov. 2015. Entrevistadora: Silvana Maciel Pires.
135

espaços que lhes representem, uma possibilidade de firmar vínculo, agregar mais mulheres e
realizar fluxos de pessoas e de produtos. Por isso, “além da preocupação com as formas, ações
e relações, é fundamental compreender os espaços e territórios produzidos ou construídos
pelos movimentos” (FERNANDES, 2005, p. 8).
Para compreender os fatores ou o contexto da territorialização da associação de
mulheres em Santaluz, é preciso identificar quais são os demais agentes (instituições e/ou
formas organizativas da sociedade) que se estabelecem neste mesmo território e que
desenvolvem suas relações direta ou indiretamente com a AMMTRAFAS, para pensar as
possibilidades de como essas relações se desenvolvem. Então, destacamos aqui os seguintes
agentes que estabelecem relações com a associação do movimento de mulheres: as pessoas
individualmente; as associações comunitárias dos povoados onde existem grupos de
mulheres; as associações beneficiadas com o PAA e aquelas que não têm vínculo com a
AMMTRAFAS, mas concorreram ao PAA em 201584; o Sindicato Rural do município; a
ASCOOB e a Prefeitura. Esses são, apenas, alguns dos agentes também atuantes no
município.
A partir dessa perspectiva, de identificar os diversos agentes sociais atuantes no
município, que se pode considerar a existência de múltiplos territórios e territorialidades,
como consequência das relações que eles estabelecem entre si e para devidos fins. A
territorialização do espaço por estes agentes se dá de forma complexa, no momento em que
envolve diferentes formas de apropriação e funcionalidades. Uma dessas formas, percebida
nas relações empreendidas pela AMMTRAFAS envolve, justamente, o poder de articulação
que o movimento tem ao estabelecer parcerias para a realização de seus objetivos.
Observa-se a partir da declaração da representante da AMMTRAFAS, que o
reconhecimento do grupo é buscado, primeiramente, na própria comunidade e o desejo é que
se estenda para outras esferas do município e quiçá do estado. A configuração territorial
estabelecida pelas mulheres, através de suas sedes e de seu trabalho, é um produto da
valorização simbólica do grupo em relação ao seu espaço vivido. Uma configuração territorial
compreendida pelo valor de uso, pelas vivências experimentadas no espaço e por uma
subjetividade que reflete as relações de poder abstratas.
A representante afirma que as sedes de produção e a estruturação adequada delas não
representam, ainda, uma realidade comum a todos os grupos, devido ao fato de muitos grupos
(8 ao todo) não possuírem sedes próprias, o que impossibilita uma autonomia das mulheres na
gestão desses espaços. Mas, essa é uma meta da AMMTRAFAS, apoiar os grupos e contribuir
84
Associação Comunitária da Fazenda Nova e Associação dos Moradores de Sítio Novo.
136

para que construam seus espaços físicos para reuniões e para desenvolver seus trabalhos,
inclusive, é uma forma de estimular os jovens da comunidade a não deixarem seu espaço de
vivência em busca de emprego na cidade. Ou seja, os grupos de mulheres tornam-se
referências organizativas para as comunidades.
Outra questão relevante a ser destacada na fala da representante da AMMTRAFAS, é a
necessidade de valorização do espaço rural para organização de empreendimentos solidários
de mulheres e para construção de oportunidades de trabalho que objetivam melhorar a
qualidade de vida das pessoas que vivem no rural. Pensar a valorização do espaço rural a
partir das ações do movimento de mulheres, é compreender que há nesse processo uma
possibilidade de constituição de novas territorialidades.
A implantação dos empreendimentos de mulheres nas comunidades rurais expressão
uma configuração territorial organizada por influência e ação da AMMTRAFAS. Grupos
foram criados e sedes foram instaladas para realização de atividades relacionadas ao trabalho
dessas mulheres do campo. Na medida em que a associação de mulheres cresce no município
pode-se observar o estabelecimento de novas territorialidade, porque incorpora desde
dimensões políticas, daquilo que as mulheres acreditam e defendem enquanto meta, até as
dimensões econômicas ligadas à forma como utilizam esse espaço na comunidade, para qual
fim e como lhe atribuem significados. De acordo com Haesbaert (2005):

A territorialidade, além de incorporar uma dimensão estritamente política,


diz respeito também às relações econômicas e culturais, pois está
“intimamente ligada ao modo como as pessoas utilizam a terra, como elas
próprias se organizam no espaço e como elas dão significado ao lugar”
(HAESBAERT, 2005, p. 6776).

Portanto, pode-se perceber a territorialidade da AMMTRAFAS a partir das relações que


ela estabelece politica, econômica e culturalmente no contexto do município de Santaluz.
A perspectiva de produção dos grupos da AMMTRAFAS, se aproxima de um
Empreendimento de Economia Solidária (EES)85, porque a base de produção é a organização
coletiva e solidária das mulheres. As atividades dos grupos são desenvolvidas com intuito de
gerar trabalho e renda, envolve uma série de relações coletivas e cooperadas entre elas, com a
comunidade e não se busca de forma descomedida o lucro, mas a qualidade de vida dessas
mulheres.

85
“[...] Definem-se os EES como uma organização coletiva, onde os indivíduos juntam-se para produzir em conjunto,
solidarizando os ônus e bônus inerentes às suas atividades produtivas. Nota-se que nestes empreendimentos as vantagens
produtivas locacionais (como a existência de matérias-primas e capital social nos territórios, por exemplo) são aproveitadas
pela coletividade como um todo [...]” (MARIANI; ARRUDA, 2010, p. 11).
137

As próprias mulheres afirmam que os grupos assumem outras responsabilidades, que elas
não se dedicam somente para o trabalho com a produção. Ou seja, os grupos ou as mulheres
dos grupos se inserem, também, em eventos e atividades organizados na comunidade, o que
demonstra a preocupação das mulheres da AMMTRAFAS em atuar também para benefício da
comunidade, como sinalizaram as respostas delas, ao serem questionadas sobre a
possibilidade de se envolverem em atividades locais. Buscando entender se os grupos se
dedicavam apenas ao trabalho com a produção, elas responderam que:

Não! Só pra produção não, a gente se reúne... A gente convoca reuniões, faz
eventos voltados para o grupo mesmo e para comunidade (Representante da
AMMTRAFAS/ Grupo Novo Sabor).

Nós temos outras atividades, hoje mesmo tem reunião da associação. Nós
participamos de missa, de evento na comunidade, torneio de futebol, passeio.
A gente participa e organiza também. Nós participamos de tudo! De tudo
a gente participa! O grupo cultural são quase as mesmas, só tem poucas que
são diferentes, porque são mais idosas... Mas somos todas, tudo junto
(Representante da AMMTRAFAS/Grupo Mulheres Produtoras do Rose,
grifo nosso).

A gente se reúne para outras coisas também, faz confraternização, faz


mobilizações. Aí, às vezes assim, tem alguma pessoa passando necessidade,
porque cada um tem seus momentos de dificuldade, então a gente se reúne
pra vê o que vai fazer, vender uns bilhetinhos, vender sorvete pra ajudar, isso
pra qualquer um da comunidade... Porque é assim, todas do grupo são
sócias da associação na comunidade. É os critérios: tem que ter seis
meses de associação primeiro e a gente só trabalha com quem é da
associação. (Representante da AMMTRAFAS/ Grupo Mulheres Virtuosas,
grifo nosso)86

Logo, desenvolver trabalhos coletivos em prol da comunidade faz parte dos objetivos
dos grupos da AMMTRAFAS. As mulheres participam no grupo e nos demais espaços de
organização coletiva da comunidade, como a associação comunitária, a Igreja, o grupo
cultural. Até aqueles grupos, que atuam mais especificamente para a produção, ainda assim,
algumas mulheres participam destes outros espaços coletivos da comunidade.
Há situações em que o compromisso com a comunidade é uma condição primeira para
participar no grupo de mulheres, como descreve representante do Grupo Mulheres Virtuosas.
Isso é muito significativo, porque estimula as mulheres a se comprometerem também com
questões que envolvem sua comunidade de modo mais amplo, no sentido de assegurar um

86
As três entrevistas foram concedidas por representantes da AMMTRAFAS em Jan. 2016. Entrevistadora: Silvana Maciel
Pires
138

bem estar para todos e não somente para seu grupo. Esse pensar e agir coletivo fortalece a
articulação das mulheres nos povoados e no município.
As falas traduzem a importância e a responsabilidade que elas próprias assumem
enquanto grupo na comunidade, de promover momentos de lazer e diversão para elas próprias
e para as demais pessoas que ali vivem. Eventos, comemorações, passeios e confraternizações
são palavras de ordem que estão presentes nos discursos dessas mulheres e se caracterizam
enquanto compromissos dos quais se encarregam os grupos em relação às comunidades.
Se os movimentos sociais são expressões de poder da sociedade civil, ao agir de forma
organizada e num contexto de correlações de força social (Gohn, 1997), devemos levar em
consideração a existência de múltiplos territórios disposto sobre o espaço geográfico. Esses
múltiplos territórios se entrecruzam e se sobrepõe, a depender do contexto, da escala e dos
agentes envolvidos. E essas territorializações múltiplas refletem as multiterritorialidades –
“Ou seja, o poder no seu sentido simbólico também precisa ser devidamente considerado em
nossas concepções de território” (HAESBAERT, 2004).
A AMMTRAFAS caracteriza, desse modo e como o próprio nome define, uma
Associação do Movimento de Mulheres Trabalhadoras Rurais, que atua ha 25 anos no
município de Santaluz acompanhando e articulando as mulheres rurais visando garantir suas
demandas. Essas ações postas em prática pela AMMTRAFAS nem sempre são compatíveis
com os interesses de outros agentes sociais que atuam também no município, daí os conflitos
e a certeza de que existem múltiplos territórios porque eles se atravessam.
Um exemplo específico desta situação está no fato de a AMMTRAFAS ter estabelecido,
em 2014, parceria com a ASCOOB Itapicuru para reabilitar a COOBENCOL. Uma parceria
proposta por membros da ASCOOB, a fim de realizar a junção das duas entidades para
reestabelecer a cooperativa de beneficiamento, como afirma representante da AMMTRAFAS:

Pensamos em criar uma cooperativa, ainda criamos uma cooperativa que o


nome era COOPETRAFAS, organizamos ata e tudo. Aí quando a gente
estava no processo de registro, essa outra cooperativa chamou a gente para
não registrar a nossa, pra não ter duas cooperativas no município com a
mesma função. E sugeriram da gente se juntar com eles, aí a gente se juntou.
Filiamos todos os grupos nossos de produção à cooperativa COOBENCOL.
A COOBENCOL foi criada por diretores e funcionários da ASCOOBE e,
hoje, nós da AMMTRAFAS é que estamos à frente. Tem quase um ano. A
maioria da diretoria da COOBENCOL é da AMMTRAFAS, a gente tem lá:
presidente e vice é da AMMTRAFAS; secretario e vice é da
AMMTRAFAS; conselho administrativo uma é da AMMTRAFAS; o
conselho fiscal todo é da AMMTRAFAS e tem o Departamento de
139

comercialização que também é da AMMTRAFAS. Então quem manda é


nós! (Representante da AMMTRAFAS, 2015)87

É interessante observar na fala da representante da AMMTRAFAS, como as


articulações de poder se desdobraram no contexto de implementação de uma cooperativa que
seria gerida, essencialmente, por uma entidade organizada pelas mulheres trabalhadoras rurais
(COOPERTRAFAS). Na concepção dos membros da ASCOOB, provavelmente, a criação de
mais uma cooperativa no município resultaria, em uma primeira hipótese, no fim da
COOBENCOL já que a cooperativa não estava funcionando, ou, em uma segunda hipótese,
na instituição de uma concorrente forte. Logo, se fez mais interessante naquele momento,
decidir pela articulação e cooperação conjunta das duas entidades a fim de reativar a
COOBENCOL, caracterizando assim, uma ajuda mútua, em que a AMMTRAFAS contribuiu
com a organização e gestão da cooperativa, principalmente.
Ao assumirem a maior parte dos cargos de responsabilidade da COOBENCOL e pela
própria dinâmica de funcionamento desta após a inserção das mulheres da AMMTRAFAS, a
representante avalia que os direcionamentos dentro da cooperativa tem se dado, sobretudo,
por influência da AMMTRAFAS.
Nesse caso específico, a AMMTRAFAS e a ASCOOB Itapicuru estabeleceram
parcerias e acordos em prol de uma questão de interesse comum às duas entidades: assessorar
e mediar a comercialização de produtos da agricultura familiar no município. Brito (2006) vai
definir esse processo como territorialidade, pois, caracteriza relações mediadas por acordos
entre distintos agentes que se interessam por algum tipo de objeto comum a eles e localizados
numa dada porção do espaço geográfico.
A concepção de que trata Gohn (1997), ao relacionar os movimentos sociais a
representações de poder, é válida porque dialoga com a perspectiva de poder abordada por
Foucault (1979), o qual apreende o poder como algo próprio às redes de relações variáveis e
multiformes estabelecidas pela sociedade. A relação que Foucault (1979) faz ao tratar dos
micropoderes amplia, nessa perspectiva, as possibilidades de análise e compreensão da
sociedade, que é constituída por diferentes grupos de pessoas. O poder, portanto, concebido
como uma condição onipresente em qualquer espaço e nas relações que se desenvolvem de
forma mais disciplinar e formal, como no âmbito do poder público municipal (prefeitura) e
em uma escola, àqueles mais singulares e informais que são suscitadas em uma praça pública,
um bairro ou um grupo de mulheres, por exemplo.

87
Entrevista concedida por representante da AMMTRAFAS em 15 out. 2015. Entrevistadora: Silvana Maciel Pires.
140

Mas, nem sempre as relações entre a AMMTRAFAS e outros agentes no município se


realizam por meio de acordos e parcerias devido, justamente, ao choque de interesses. Por
estar inserida em espaços de discussão e demandas que lhes dizem respeito, como o Sindicato
Rural e o Conselho de Alimentação Escolar no município, por exemplo, a AMMTRAFAS
passa a interceder sobre questões que dizem respeito às mulheres rurais, principalmente, as
dos grupos de produção que são associados à ela. Isso significa que a opinião da associação de
mulheres é significativa no contexto das demandas do município, especialmente se estas
tiverem relação direta com questões que envolvem gênero. Segundo representante da
associação de mulheres, quando se trata de decidir sobre algo que interfere diretamente na
dinâmica dos grupos de mulheres, a palavra da AMMTRAFAS tem relevância e é
considerada em muitos casos. De acordo com ela:

Tem e como nós decidimos um bocado de coisa, viu? Tem coisa que se for
para nossos grupos e não discutir com a AMMTRAFAS e a gente vê que no
início pode ser bom, mas, que lá na frente o negócio não vai ter um bom
resultado, a gente interfere logo. Por exemplo, a gente já teve duas entidades
que já vieram para o município e queriam fazer assessoria técnica nos
empreendimentos. A gente vai lá e interfere porque os empreendimentos já
tem assessoria técnica. Como é que chega outro técnico para acompanhar os
mesmos grupos que já estão sendo acompanhados? Então assim, tem alguns
tipos de articulação feita no município, desenvolvida aí por outras pessoas,
que a gente vê que é para ganhar nome em cima do grupo... Se a gente vê
que é pra tirar vantagem, a gente alerta os grupos. Não é que a gente impede
o grupo de fazer, não. O grupo é independente, a gente sempre diz isso para
elas. Não é que a gente proíbe elas da decisão, a gente mostra o que foi
encaminhado e elas tomam a decisão. (Representante da AMMTRAFAS,
2015)88

É preciso levar em conta que a AMMTRAFAS se constitui entidade representativa das


trabalhadoras rurais no município de Santaluz, é nesse sentido que elas reivindicam o direito
de opinar e decidir sobre questões que estejam direta ou indiretamente relacionadas a elas. Por
já desenvolverem um trabalho de acompanhamento, apoio e assessoria com as trabalhadoras
rurais nas comunidades, a AMMTRAFAS se coloca na condição de intervir ou protestar a
favor das mulheres.
Compreende-se que as contradições e os conflitos existentes no jogo das relações
sociais, se tornam inevitáveis pelo que as pessoas são - por se diferenciarem no âmbito das
ideias, das intenções, das oportunidades, dos privilégios - e, até mesmo, esses conflitos são
necessários na medida em que envolvem questões e diferenças relativamente peculiares.
Logo, com base em BRITO (2005), o conjunto de relações que se origina em um dado espaço

88
Entrevista concedida por representante da AMMTRAFAS em 15 out. 2015. Entrevistadora: Silvana Maciel Pires.
141

e que envolve distintos agentes em torno de objetivos comuns, determina as territorialidades.


A AMMTRAFAS por seu caráter organizativo e estruturador se apresenta enquanto um
agente que tem influenciado relações no contexto do município de Santaluz, de forma que tem
beneficiado as mulheres, instituído territórios e territorialidades.
A valorização do trabalho desenvolvido por mulheres e por homens tem pesos
diferenciados na sociedade das relações desiguais de gênero. A constituição da
AMMTRAFAS denota essa necessidade de valorização das questões relacionadas ao
feminino, da luta pelo reconhecimento, direito e fortalecimento dos focos de trabalho para
mulheres no espaço rural. Portanto, situar o movimento dentro da perspectiva das relações de
gênero é importante porque surge aí a necessidade de se criar novas relações, de se instituir
novas dinâmicas no espaço rural que sejam orientadas por outro agente – as mulheres
trabalhadoras rurais – que no contexto de formação da sociedade brasileira sempre estiveram
subjugadas à categoria masculina.
Atualmente, a participação das trabalhadoras rurais nos programas PAA e PNAE no
município, reflete de alguma forma o esforço das mulheres da AMMTRAFAS e de outras
organizações sociais do país (como o MMTR-NE e muitas secretarias de mulheres dos
Sindicatos Rurais) na luta por políticas de trabalho e renda para as mulheres rurais. Embora os
programas PAA e PNAE não tenham sido criados especificamente com esse intuito, já que
constituem ações da política de segurança alimentar no combate à fome, os programas
passaram a dispor sobre a inclusão das mulheres agricultoras rurais através da aquisição de
alimentos produzidos por elas. Inclusive, as organizações de mulheres passaram a ter
prioridade89 no processo de aquisição dos alimentos provenientes da agricultura familiar,
assim como as comunidades tradicionais indígenas e quilombolas. Ao ser questionada sobre a
importância de programas como o PAA e o PNAE para as mulheres, a presidenta da
AMMTRAFAS respondeu que:

É importante porque a gente sabe o quanto, antes, o trabalho feminino era


desvalorizado, na verdade, não era nem enxergado. Então, quando vem essas
políticas específicas para mulheres, elas se sentem autônomas, donas de suas
próprias vidas e se sentem valorizadas em saber que tem políticas específicas
para elas, que hoje elas têm um espaço para ser ocupado. Porque antes elas
queriam ocupar um espaço, mas não sabiam onde e nem como. Então todas
essas políticas, projetos... Né? Como a gente sabe que já existem as
secretarias estaduais de mulheres voltadas apenas para as mulheres... Todas
essas políticas vêm fazer com que cresça cada vez mais a valorização para
elas. O trabalho da mulher hoje, a gente pode dizer que ele é valorizado,

89
Lei nº 11.947/2009 artigo 14º; Decreto 7.775/2012 § 5º; Resolução nº 44/2011 do Comitê Gestor do Programa (CGPAA).
142

porque a gente sabe que tem essas políticas específicas para elas. (Presidenta
da AMMTRAFAS, 2015)90

De modo geral, a representante da associação faz referência a todas as políticas públicas


que tem se direcionado especificamente para as mulheres, destacando a importância destas na
construção da autonomia e da autovalorização das mulheres. Ou seja, esse novo contexto de
implementação de questões de gêneros nas políticas públicas, abriu possibilidade de maior
participação feminina nos processos de produção e da representação social, antes negado.
Uma conquista que vem sendo alcançada por causa da luta das próprias mulheres que
demandaram questões específicas como: mais oportunidades de trabalho e a criação de setores
do poder público municipal, estadual e federal - a exemplo do Conselho Municipal dos
Direitos da Mulher, Secretaria de Políticas para as Mulheres do Estado e a Secretaria Especial
de Políticas para Mulheres, vinculada à Presidência da República - voltados à elaboração,
execução e fiscalização das políticas públicas com igualdade de gênero.
Por tudo que já foi possível relatar, tendo em vista a atuação da AMMTRAFAS no
município de Santaluz, pode-se afirmar que as trabalhadoras rurais têm estabelecido novas
relações no município a fim de empreender seus projetos e promover melhores condições de
vida para as trabalhadoras rurais. O que caracteriza novas territorialidades, porque são
relações motivadas a partir das mulheres, de suas demandas e desejos e tem relação direta
com suas experiências de vida. E, sobretudo, buscam a superação das desigualdades sociais de
gênero, ainda, muito presentes na sociedade como revelam dados do Ipea (2011), em que as
mulheres estão na base da hierarquia social na questão da renda, sendo elas as que enfrentam
com mais intensidade a violência doméstica.
Nesse contexto de desigualdades e ao mesmo tempo de participação política e
economicamente ativa das mulheres, as trabalhadoras rurais de Santaluz construíram o
movimento de mulheres (AMMTRAFAS) e de forma organizada vem projetando suas ações
em defesa de seus interesses, que entre possíveis enfrentamentos e diálogos, objetivam a
transformação de uma realidade que muitas vezes não lhes representam.

90
Entrevista concedida pela presidenta da AMMTRAFAS em 27 nov. 2015. Entrevistadora: Silvana Maciel Pires.
143

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Fonte: Silvana Maciel Pires (2015)

É... A gente quer valer o nosso amor, a gente quer valer nosso suor, a gente quer valer o nosso
humor, a gente quer do bom e do melhor, a gente quer carinho e atenção, a gente quer calor
no coração, a gente quer suar mas de prazer, a gente quer é ter muita saúde
a gente quer viver a liberdade, a gente quer viver felicidade [...]
É... A gente quer viver pleno direito, a gente quer é ter todo respeito, a gente quer viver numa
nação, a gente quer é ser um cidadão.

É - Gonzaguinha
144

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O propósito deste trabalho foi analisar a atuação da AMMTRAFAS no contexto do


município de Santaluz, na perspectiva de inserir as trabalhadoras rurais nos programas PAA e
PNAE e, a partir desse processo, compreender aspectos da ação da associação de mulheres
que se constituem enquanto novas territorialidades.
Desde já, é preciso dizer que foi muito significativo todo o processo de construção desse
conhecimento, que teve como foco a associação das trabalhadoras rurais de Santaluz, porque
as histórias dessas mulheres representam referências de luta necessárias à busca e ao
fortalecimento da autonomia das mulheres no contexto da sociedade. A temática geral que
motivou tal pesquisa esteve em torno da organização social das mulheres para o acesso às
políticas públicas voltadas ao trabalho e renda e as territorialidades geradas a partir da atuação
desta.
Através deste trabalho foi possível compreender que uma das principais caraterísticas da
AMMTRAFAS é estabelecer relações de cooperação, entre os grupos de mulheres que a
constitui e com outras entidades no município – relação esta que a própria associação vai
denominar de parcerias, como apontado anteriormente. Uma relação extremamente
significativa pelo que ela representa – ajuda mútua. Na rede de cooperação da AMMTRAFAS
pode-se destacar as associações comunitárias e a Cooperativa de Beneficiamento
(COOBENCOL), que são as principais proponentes nos programas PAA e PNAE, que
beneficia as mulheres da AMMTRAFAS com trabalho e renda. Embora a AMMTRAFAS
possa propor projetos para acessar tais programas, ela prioriza a parceria com as demais
entidades por acreditar que dessa forma contribui para o fortalecimento da sociedade civil
organizada no município e todas e todos ganham com isso.
A pesquisa revelou que a participação da AMMTRAFAS nos programas PAA e PNAE
potencializou o processo de organização e fortalecimento dos grupos de mulheres, pois, a
renda gerada com os programas contribuiu para montar e estruturar os grupos de produção e
proporcionar um incremento na renda das mulheres. Contudo, acredita-se que a Prefeitura
municipal possa investir mais que 30% nas compras para o PNAE, pois, a Lei nº 11.947/2009
dispõe sobre um percentual mínimo para compras com agricultura familiar e a
AMMTRAFAS garante que seus grupos podem fornecer muito mais do que 30% para as
compras institucionais.
145

Considerando que em alguns municípios do Território do Sisal91 as Prefeituras


municipais compraram da agricultura familiar para o PNAE em 2014, um percentual próximo
de 50% - Barrocas (49,60%), Lamarão (48,70%) e Conceição do Coité (46,16%) – é possível
pensar sobre esta possibilidade também para Santaluz, tendo em vista a realidade dos
municípios do Território do Sisal apontados. Essa tem sido uma demanda apontada pelas
mulheres dos grupos de produção da AMMTRAFAS que, inclusive, foi debatida na
Conferência Municipal de Mulheres em Santaluz realizada em 14/09/2015 e, também, na II
Conferência Territorial de Políticas Públicas para as Mulheres, realizada na cidade de
Conceição do Coité, nos dias 22 e 23 de setembro de 2015. A proposta das mulheres é que o
Governo Federal reestabeleça o percentual de compras, aumentando esse valor mínimo para
50%.
Acredita-se, dessa forma, que este é um dos desafios que as agricultoras rurais vêm
enfrentando no âmbito de avaliação dos programas federais, que atualmente tem
proporcionado trabalho e renda para as mulheres. As demandas apontadas pelas agricultoras
nas Conferências municipais, territoriais e estaduais foram encaminhadas como propostas
para a 4ª Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres92, que articula todas essas
experiências com o objetivo de avaliar, planejar e efetivar ações de políticas públicas para o
desenvolvimento social, político e econômico das mulheres.
A implantação das sedes dos grupos de mulheres, da sede da AMMTRAFAS e da loja
Maria Bunita, encontra-se inserida numa configuração territorial desenvolvida por e a partir
da organização e do trabalho das agricultoras da AMMTRAFAS. São, por conseguinte,
objetos que dão materialidade ao processo de ressignificação dos espaços de participação
coletiva das mulheres no município. Esses espaços se relacionam diretamente e
indissociavelmente à história de vida delas e, obviamente, refletem a necessidade de pensar
uma territorialidade diferenciada, que passa a ter nos grupos de mulheres da AMMTRAFAS
sua maior expressão.
Todos os espaços apropriados pelas mulheres da AMMTRAFAS são aqui definidos
como sistema de objetos em interação, que constituem uma configuração territorial própria.
Logo, foi preciso mapear os grupos para entender a dimensão que tem a espacialidade das
ações da AMMTRAFAS no município, compreender as motivações, as experiências e as

91
Disponível em: www.fnde.gov.br Acesso em: 27 jan. 2016.
92
A 4ª Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres teve como tema “Mais direitos, participação e poder para as
Mulheres” e foi realizada entre os dias 10 e 13 de maio de 2016 em Brasília . O desafio principal dessa Conferência foi traçar
estratégias para que as políticas públicas de igualdade para as mulheres sejam efetivadas nas 27 unidades da Federação e nos
5.570 municípios do país. Para mais informações, consultar texto base da 4ª Conferencia Estadual de Políticas para Mulheres,
disponível no endereço: www.spm.gov.br.
146

expectativas das trabalhadoras em relação ao coletivo, às demandas relacionadas a gênero no


espaço rural (autonomia da mulher, políticas públicas) e os processos que, de fato, asseguram
uma configuração territorial específica e, por conseguinte institui novas territorialidades.
Os grupos estabelecem relações de interdependência com a AMMTRAFAS quando
atribui à associação o direito de representá-los junto às instâncias de participação social e
política no município ou no Território do Sisal. Por outro lado, a AMMTRAFAS só existe por
consequência da formação dos grupos de mulheres, a associação surgiu por uma necessidade
de auto-organização política dos grupos. Portanto, carregam em si expressões simbólicas e
materiais estabelecidas por esse coletivo específico de trabalhadoras rurais.
A territorialização dos grupos da AMMTRAFAS caracteriza ressignificação dos
espaços de participação coletiva das trabalhadoras rurais nas comunidades porque se
apresenta enquanto mobilização solidária para as mulheres, sobretudo, com a perspectiva de
gerar conhecimento e autonomia. A formação dos grupos está relacionada à necessidade de
gerir seus próprios espaços e seus meios de produção, e isso tem acontecido em Santaluz a
partir da ação da AMMTRAFAS. Sendo assim, a AMMTRAFAS se apresenta com forte
expressão territorial e com significativo potencial emancipatório para as agricultoras, pois,
surge com uma proposta de valorização e de fortalecimento da trabalhadora rural, consolida
um sistema de organização do espaço baseado na implantação de sedes físicas de grupos de
mulheres, interligadas e assistidas por uma associação constituída a partir delas próprias.
Mas, é preciso reconhecer que há limitações e problemas que ainda se colocam para a
associação como desafios, desde os mais estruturais àqueles de ordem relacional da própria
instituição ou mesmo das múltiplas relações nas quais a AMMTRAFAS se envolve. A
AMMTRAFAS assessora o trabalho de 22 grupos de mulheres, tendo em vista a dimensão
territorial que assume a espacialização desses grupos no município e suas demandas, pode-se
avaliar o quanto é trabalhoso para a associação dar conta dessas questões.
Um dos maiores desafios da AMMTRAFAS, por exemplo, é manter todos esses grupos
articulados, organizados e desenvolvendo bem seus trabalhos, algo que está relacionado
também à própria convivência das mulheres em seus grupos, seus interesses específicos, as
relações e os conflitos que acontecem internamente no grupo e reflete no movimento de modo
geral. Todavia, tais situações se colocam como desafios e não como motivações que as façam
desistir da luta.
Outra questão que se apresenta enquanto desafio a ser enfrentado pela associação de
mulheres, diz respeito à dependência de alguns grupos (Mulheres Vencedoras, Mulheres em
Ação, Mão na Massa, Garra Feminina entre outros) em relação aos programas PAA e PNAE,
147

no intuito de gerar renda para o coletivo. O cenário político brasileiro tem se mostrado
favorável a execução de programas dessa natureza e, principalmente, à valorização e inserção
dos movimentos de mulheres nessas políticas na perspectiva de ampliar a autonomia das
mulheres. Porém, é importante compreender que o contexto da política nacional é, por
natureza, imprevisível e pode mudar. Então, como ficam os grupos de produção da
AMMTRAFAS se ocorrer um retrocesso ou redução significativa desses programas? A
autonomia das mulheres precisa ser pensada a partir de estratégias que venham a fortalecer o
coletivo independente das ações de políticas públicas, embora, se reconheça que esta é um
direito social.
A organização do movimento das trabalhadoras rurais de Santaluz caracteriza-se, dessa
forma, pela emergência de novas relações sociais no contexto da sociedade, estejam elas
relacionadas ao mundo do trabalho, das políticas públicas e, também, da vida privada. A
AMMTRAFAS atua na perspectiva de proporcionar às suas associadas (trabalhadoras rurais)
melhores condições de vida, por isso, a associação busca construir as alternativas para
consolidação dos seus projetos: fortalecer a organização e autonomia das mulheres, ocupar
espaços de discussão, proposição e deliberações das ações de políticas públicas e estabelecer
ou se inserir em redes de cooperação no município e no Território.
Pensar a emergência de novas relações sociais a partir do movimento de mulheres de
Santaluz significa pensar na instituição de novas territorialidades. Porque há nessas relações
uma subjetividade que se relaciona às mulheres individualmente ou enquanto coletivo através
da ação da AMMTRAFAS, que atinge uma dada forma conteúdo, evidentemente,
territorializada com resultados socialmente mensuráveis como: as sedes dos grupos de
produção, formação e conhecimento para as mulheres, produção e comercialização de
produtos alimentícios e artesanais e o acréscimo na renda dessas trabalhadoras rurais. Nesse
sentido, que a territorialidade reflete a dimensão do que é vivido territorialmente pelas
mulheres da Associação, sobretudo, na escala local. E, é preciso ressaltar, que as parcerias
efetivadas com outras instituições é fator preponderante para a configuração de novas
territorialidades no município, pois, caracterizam um apoio à organização e ao fortalecimento
do movimento de mulheres rurais, na medida em que suas propostas são ouvidas e discutidas
de forma integrada.
148

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160

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE FEIRA DE SANTANA


MESTRADO PROFISSIONAL EM PLANEJAMENTO TERRITORIAL –
PLANTTER

APÊNDICE I
QUESTIONÁRIO DE PESQUISA PARA AS MULHERES DA AMMTRAFAS

SESSÃO I: perfil da entrevistada

Nome: Idade: Estado Civil:


Nome do Grupo: Ano de Criação do grupo:

SESSÃO II: Organização das mulheres

1- Há quanto tempo você faz parte da AMMTRAFAS?


___________________________________________________________________

2- Quais motivos te levaram a fazer parte da AMMTRAFAS?


(__) Falta de ocupação na comunidade (__) Violência contra a mulheres
(__) Possibilidade de trabalho e renda (__) É uma forma de se divertir
(__) Para adquirir mais conhecimento (__) Outra
opção_______________________________

SESSÃO III: Participação das mulheres nos programas do governo PAA e/ou PNAE

3- Para qual programa do governo seu grupo fornece alimentos?

PAA (__) e/ou PNAE (__)


4-Quais produtos seu grupo fornece para o PAA? 4-Quais produtos seu grupo fornece para o
PNAE?

5-Através de quem você ficou sabendo do PAA? 5-Através de quem você ficou sabendo do
PNAE?
(__) AMMTRAFAS
(__) Associação da comunidade (__) AMMTRAFAS
(__) Prefeitura (__) Associação da comunidade
(__) Televisão/Jornal (__) Prefeitura
(__) Outros (__) Televisão/Jornal
(__) Outros

6-Há quanto tempo seu grupo fornece para o 6-Há quanto tempo seu grupo fornece para o
PAA? PNAE?
161

7-De quanto é sua renda mensal com o PAA? 7-De quanto é sua renda mensal com o PNAE?

8-Quanto tempo (horas) você dedica para a 8-Quanto tempo (horas) você dedica para a
produção durante a semana? produção durante a semana?

9- O PAA é hoje a sua única fonte de renda? Caso 9- O PNAE é hoje a sua única fonte de renda?
não seja, qual (is) é (são) a (s) outra (s) formas de Caso não seja, qual (is) é (são) a (s) outra (s)
renda? formas de renda?

SESSÃO IV: Avaliação das mulheres em relação aos programas

10- Como ficou a sua rotina de trabalho após as atividades do grupo de produção?

_____________________________________________________________________
_____________________________________________________________________
______________________________________________________

11- Hoje, você se considera uma mulher que tem autonomia financeira? Por quê?
_____________________________________________________________________
_____________________________________________________________________
_____________________________________________________

12- Há alguma coisa que você acredita que poderia melhorar com relação à execução
do programa? O que exatamente, poderia descrever?

_____________________________________________________________________
_____________________________________________________________________
______________________________________________________
162

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE FEIRA DE SANTANA


MESTRADO PROFISSIONAL EM PLANEJAMENTO TERRITORIAL – PLANTTER

APÊNDICE II
ROTEIRO DE ENTREVISTA SEMIESTRUTURADA PARA A PRESIDENTE DA
AMMTRAFAS

TEMA 1: ESTRUTURAÇÃO E PARTICIPAÇÃO DAS MULHERES DA


AMMTRAFAS NOS PROGRAMAS PAA E PNAE

1- Como a AMMTRAFAS tomou conhecimento dos programas PAA e PNAE?

2- Como a AMMTRAFAS age no sentido de inserir os grupos de mulheres nos programas


PAA e PNAE? Quais critérios vocês utilizam?

3- Qual (is) estratégia (s) a associação utiliza para que os grupos de mulheres se
mantenham nos programas?

4- As mulheres dos grupos de produção recebem capacitação para participarem dos


programas PAA e PNAE?

TEMA 2: AVALIAÇÃO DA PARTICIPAÇÃO DAS MULHERES NOS PROGRAMAS


PAA E PNAE

1- Considerando que muitos grupos da AMMTRAFAS, atualmente, participam dos


programas PAA e PNAE, qual avaliação que você faz em relação aos resultados desses
dois programas para as mulheres?

2- A AMMTRAFAS se propõe a realizar momentos de avaliações com as mulheres?


Como é realizada?

3- Que importância você atribui às políticas públicas voltadas para as mulheres?

TEMA 3: DESAFIOS E PERSPECTIVAS DA AMMTRAFAS

1- Qual tem sido os maiores desafios enfrentados pela AMMTRAFAS em relação à


execução dos dois programas?

2- E qual tem sido os desafios enfrentados pela AMMTRAFAS em relação a organização


e estruturação dos grupos de mulheres nas comunidades?

3- Qual a importância da estruturação de grupos de mulheres nas comunidades rurais em


suas sedes específicas?

4- Como vocês organizam as mulheres para criação desses grupos?


163

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE FEIRA DE SANTANA


MESTRADO PROFISSIONAL EM PLANEJAMENTO TERRITORIAL –
PLANTTER

APÊNDICE III
ROTEIRO DE ENTREVISTA SEMIESTRUTURADA PARA AS MULHERES DOS
GRUPOS DE PRODUÇÃO DA AMMTRAFAS

1- Além do trabalho com a produção para o (s) programa (s) PAA e/ou PNAE, a
AMMTRAFAS proporciona aos grupos outras atividades durante o ano? Quais?

2- Qual a importância do (s) programa (s) PAA e/ou PNAE para vocês do grupo (X)?

3- Vocês recebem capacitações para participarem do (s) programa (s) PAA e/ou PNAE?
Onde e quem realiza as capacitações?

4- Você acha importante fazer os cursos de capacitação? Por quê?

5- A renda gerada com o (s) programa (s), hoje, é suficiente para que as mulheres se
mantenham? Explique?

6- Para você, o grupo de mulheres (X) é só um grupo de trabalho?

7- Vocês fazem avaliação das atividades do grupo juntamente com as demais mulheres
da AMMTRAFAS? Quando e como acontecem as avaliações? O que exatamente
vocês avaliam
164

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PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO – PPPG
MESTRADO PROFISSIONAL EM PLANEJAMENTO TERRITORIAL

APÊNDICE IV
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO – MODELO PARA
ENTREVISTA

Eu Silvana Maciel Pires estudante do Mestrado em Planejamento Territorial da Universidade Estadual


de Feira de Santana (UEFS), venho através deste documento apresentar uma proposta de pesquisa que
tem como título “Trabalho, renda e novas territorialidades no município de Santaluz – Bahia: a
atuação da Associação do Movimento de Mulheres Trabalhadoras Rurais para efetivação do PAA e
PNAE” e convidá-la para ser colaboradora nesse projeto. Por isso, é importante que a senhora
compreenda as intenções e instruções contidas nesse documento. A sua participação nesta pesquisa é
voluntária e não tem custo de ordem financeira alguma, se decidir não participar ou quiser desistir da
pesquisa em qualquer momento, tem absoluta liberdade para fazê-lo sem causar nenhum prejuízo ou
danos e eu estarei à sua disposição para responder todas as dúvidas antes ou durante a realização da
pesquisa. A entrevista deverá ser gravada, com a sua previa autorização. As perguntas do roteiro
referem-se aos programas PAA e PNAE e a contribuição deles para a transformação das condições de
vida das mulheres do movimento, avaliação desses programas e sobre o papel da associação de
mulheres. Nosso estudo propõe fortalecer ainda mais a organização do movimento porque perpassa a
análise da atuação deste e a avaliação das políticas públicas implementadas para as mulheres do
campo. Essa pesquisa tem como objetivos: analisar a influência dos programas do governo federal
PAA e PNAE na promoção de trabalho e renda para as mulheres integrantes da AMMTRAFAS no
município de Santaluz na Bahia; caracterizar a AMMTRAFAS no contexto do município; caracterizar
os programas PAA e PNAE; mapear os grupos produtivos da AMMTRAFAS beneficiados pelos dois
programas; identificar as estratégias de luta da AMMTRAFAS que visam acessar o PAA e PNAE.
Justifica-se pelo fato de possibilitar maior conhecimento sobre a ação política da AMMTRAFAS, um
conhecimento dos programas ofertados pelo governo e seus resultados para a qualidade de vida das
mulheres trabalhadoras rurais e suas famílias. Os procedimentos desse trabalho são: a pesquisa
bibliográfica, documental e de campo que compreende a entrevista e aplicação de questionário com as
mulheres dos grupos. Pretendemos, ao final da pesquisa, retornar à AMMTRAFAS para apresentar os
resultados e divulga-los em outros meios como, por exemplo, publicação de artigo em revista,
apresentação de trabalho em eventos e publicação em anais de eventos relacionados com a temática.
Todas as informações que você desejar sobre a pesquisa poderão ser consultadas na própria
Universidade localizada na Avenida Transnordestina s/n Cep 44036-900 Novo Horizonte, Feira de
Santana Bahia (módulo VII sala do GEOMOV e tel. 75 31616251 da coordenação do Mestrado), no
Comitê de Ética da UEFS (tel. 75 31618067 e email: cep@uefs.br) ou pelo e-mail da pesquisadora
responsavel silvana.uneb@bol.com.br. Os dados coletados na pesquisa de campo (áudio e a
transcrição da entrevista) ficarão guardados num período de até cinco anos sob a responsabilidade da
pesquisadora, sendo posteriormente eliminados. Caso autorize a gravação dessa entrevista, deverá
assinar este documento em duas vias ficando uma com a senhora e a outra com a pesquisadora.
Telefone de Silvana 75 99138-2055 ou Zap 99884-0107.

Santaluz, Bahia _____ de ___________ de 2015.

Silvana Maciel Pires (Pesquisadora) Nome da entrevistada


165

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PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO – PPPG
MESTRADO PROFISSIONAL EM PLANEJAMENTO TERRITORIAL

APÊNDICE V
RETRATOS DOS GRUPOS DE PRODUÇÃO DA AMMTRAFAS

Grupo Mulheres em Ação – Comunidade Lagoa Escura


Imagem: AMMTRAFAS e Silvana Maciel Pires, 2015.

Grupo Arte e Sabores – Comunidade Várzea da Pedra


Imagem: Silvana Maciel Pires, 2015.

Grupo Mulheres Artesãs de Mocambinho – Comunidade de Mocambinho


Imagem: Silvana Maciel Pires, 2015.
166

Grupo Mulheres de Fibra – Comunidade do Miranda


Imagem: Silvana Maciel Pires, 2015.

Grupo de Mulheres Mão na Massa – Comunidade Serra Branca


Imagem: Silvana Maciel Pires, 2015.

Grupo de Mulheres Sonhadoras – Comunidade Rio do Peixe


Imagem: Silvana Maciel Pires, 2015.
167

1 2

(1) Grupo Mãos Artistas – Comunidade Morro dos Lopes. (2) Grupo Mulheres Vencedoras – Comunidade Calumbi
Imagens: Silvana Maciel Pires, 2015.

Grupo Mãos que Produzem – Comunidade Barreirinho


Imagem: Silvana Maciel Pires, 2015.

Grupo Garra Feminina – Comunidade Várzea da Pedrinha


Imagem: Silvana Maciel Pires, 2015.
168

Grupo Novo Sabor – Comunidade Várzea da Pedrinha


Imagem: Silvana Maciel Pires, 2015.

Grupo Mãos que Tecem – Comunidade da Laginha


Imagem: Silvana Maciel Pires, 2015.
.

Grupo Sabores da Caatinga – Comunidade Lagedinho


Imagem: Silvana Maciel Pires, 2015.
169

Grupo Mulheres Virtuosas – Comunidade de Ferreiros


Imagem: AMMTRAFAS, 2014.

Grupo Mulheres Produtoras do Rose – Comunidade de Rose


Imagem: AMMTRAFAS, 2016.
170

II Feira das Margaridas de Santaluz Bahia, realizada no dia 12/03/2016.


Organização: AMMTRAFAS e Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Santaluz (STR)
Imagens: Silvana Maciel Pires, 2016

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