Você está na página 1de 11
Poesia seiscentista Fénix renascida & Postilhdo'de Apolo Organizagio © Alcir Pheora Introdugdo, Joto Adolfo Hansen $40 Paulo 2002 Possn sce. Ania Ausincias Sonsro. ‘Sinto-me'sem sentir todo abrasado No rigoroso fogo, que me alenta, © mal, que me consome, me sustenta, O bem, que me entretém, me dé cuidado: ‘Ando sem me mover, falo calado, (0 que mais perto vejo, se me ausenta, Eo que estou sem ver, mais me atormenta, Alegro-me de ver-me atormentado: Choro no mesmo ponto, em que me rio, No mor risco me anima a confianga, ‘Do que menos se espera estou mais certo; Mas se de confiado descontfio, i porque entre os receios da mudanga Ando perdido em mim, como em deserto, Ant6nio Barbosa Bacelar. Soxctos ‘A.UNs Ottios Toros. Sonero. ‘Travessos olhios, que na travessia Deixais os olhos todos derrubados, Contra quem s6 trés dedos cavalgados ‘So na manh& remédio a todo o dia: Dos milagres, que fez Santa Luzia, Nenhum sabemos de olhos enfrestados, E mais de olhos que sdo tao namorados, Que olham um para o outro & mor portia: Ciosos olhos, pois essas meninas Escondeis no mais alto das capelas, Nio consintais haver delas suspeita: ‘Torcei-Ihe a condigdo de pequeninas, Porque nunea se possa dizer delas Quem torto nasce, tarde se endireita, Anténio Barbosa Bacelar, Pots stucens ‘A ona Amos, Sonero. Belisa la amistad es un tesoro ‘Tan digno de estimarse eternamente, Que a su valor no es paga suficiente ? De Arabia, y Potost la plata, y oro. Es la amistad un Icito decoro, Que se guarda en lo ausente, y lo presente Y con que un amigo el otro siente La tristeza, el pesar, la risa, el oro. No se lama amistad la que es violenta, Sino la que es conforme simpatia, ‘De quien lealtad hasta la muerte ostenta: Esta la amistad es, que hallar queria Esta la que entre amigas se sustenta, Y esta, Belisa, en fin la amistad mia. Violante do Céu. 8 Sonos Act Ret D. Joio IV. Sonsro tat piiLoco. Que logras Portugal? Umn Rei perfeito: Quem o constituiu’ Sacra piedade: Que aloangaste com ele? A liberdade! Que liberdade tens? Ser-Ihe sujeito: Que tens na sujeigao? Honra, e proveito: Que é o novo Rei? Quise deidade: Que ostenta nas agBes? Felicidade, E que tem de feliz? Ser por Deus feito. Que eras antes dele? Um labirinto, Osea ln send OR Becaidsto, ‘Temes alguém? Nao temo a mesma Parca. Sentes alguma pena? Uma sé sint®. Qual é? Nao ser um mundo, ou ndo ser cento, Para ser mais capaz de tal Moriarca. ‘ Violante do Céu, he poco | 5 Avuna Ausencta. ‘ +" Soneto. i + Quien dice que la ausencia es homicida 1 I ., *"No sabe conocer rigor tan fuerte, ‘Que si la dura ausencia diera muerte, No,zne matara a mi la propria vida. ‘Mas ay quie’ de tu ojos dividida, La vida me atormenta de tal suerte, Que miuriendo sentida de no verte, Sih verte vivo, por morir sentida. Pera si de la suerte la mudanza Eis fuerte, me asegure la evidencia, Que tanto me dilata una tardani "No quede el sentimiento en contingencia ay ! Que el milagro mayor de la esperanza -Es no rendir la vida a tal ausencia. Violante do Céu. 126 Sous ‘Aum DEsencano. Sonsro. Seré brando 0 rigor, firme a mudanga, Humilde a presungio, viria a firmeza, Fraco o valor, covarde a fortaleza, Triste o prazer, discreta a confianga. Tord a ingratidao firme lembranga, Seri rude o saber, sibia a rudeza, Lhana a ficgo, sofistica a lhaneza, ‘Repero o amor, benigna a esquivance Seri merecimento a indignidade, Defeito a perfeigio, culpa a defensa, Intrépido 0 temor, dura a piedade, Delito a obrigagio, favor a ofensa, Verdadeira a traigio, falsa a verdade, Antes que vosso amor meu peito venga. Violante do Céu. wy Poss secrets, A Senna pe Sivtna. Sonero. ‘Aspera Serrania que elevada ‘Ao mais sublime cume rutilante, Te obedece esse orbe de diamante, Ne jamais te viu raio fulminada; ‘De ti mesma em ti mesma despertada, Parece que presumes de arrogante * Escalar essa esfera cintilante, Atropelar a maquina estrelada: Eterna vive dando leis aos ventos, ‘Ao mar espanto, assombro da grandeza, Do tempo injuiria, da firmeza templo: Eterno vive império aos elementos, Pois és de Nise exemplo na dureza, Pois és de Lauro na firmeza exemplo. Anténio Barbosa Bacelar. 134 Soneros A Vanugpape po Munpo, Sovero. Este nasce, outro morre, acola soa Um ribeiro que corre, aqui suave ‘Um Rouxinol se queixa brarido, e grave, Um Leio co rugido o monteatros: * Aqui corre uma fera, acolé voa Co grdozinhe na boca ao ninho uma ave; ‘Um derruba o edificio, outro ergue & trave, Um caga, outro pesca, outro enferos. Um nas armas se alista, outro aé pendura, ‘Ao soberbo Ministro aquele'adora, ‘Outro segue do Pago a sombra amada, Este muda de amor aquele atura: Do bem, de que um se alegra, 0 outro chora, Oh mundo, 6 sombra, 6 zombaria, 6 nada! Anténio Barbosa|Bacelar. 135, Sones, Poss ssconnsta Aum Pnano Fionuno, ‘A.um Sono. Sonero. Sonsto, Do que sou me vi jé mui diferente, Alegre tu virds a estar de luto: Qual te vejo, me vi com flo, e fruto, Qual me vés, te verés bem descontente. Di-te agora tributo o estio ardente, Adormeci ao som do meu tormento, E logo vacilando a fantasia, Gozava mil portentos de alegria, Que todos se tornaram sombra, e vento Eu ao frio inverno dou tributo, Sorihava, que tocava o pensamento Com liberdade bern que mais queria, Assim nos fez o tempo sempre astuto, } Se triste agora a mim, ati florente Fortuna venturosa, claro dia: "Nao queiras fazer certo o meu receio; : i Mas ai! que foi um vo contentamenio! S Estava 6 Clori minha possuindo ! “+: Desse formoso gesto a vista pura, y Pois tens exemplo em mim: Ah quem me deri, . : ‘Que em mim escarmentaras teus enganos! : ‘Mas la vird tempo horrendo, e feio, Alegrés glérias mil imaginando: Mas acordei, ¢ tudo resumindo, | | Achei duré pristo, pena segura, ‘Ah quem estivera assim sempre sonhando! Donde perea seu brio a primavera, E te sirvam de dor meus desenganos Ant6nio Barbosa Bacelar, Ant6nio Barbosa Bacelar. 138 Pose scent A.uw Pé Pequeno, Soxero. Instante de jasmin, concepto breve, Atomo de azucena presumido, Pues os juzgan las ansias del sentido, Sospecha de cristal, susto de nieve. No pie, mentira sois, pues come la Neve Ni verdad en un punto habéis eumplido, ‘Anttes digo, que eseriipulo habsis sido, Pues de ser, ono ser la duda os mueve. Como si idea sois de ojos tan claros Hacéis la vista fe para creeros, Y¥ hacéis los ojos fe para miraros? . Yome persuado en fin, que he de perderos, Porque si el veros es imaginaros, Siendo imaginacion, como he de veros? Jeronimo Baia, | | | | | | | | Sones A.uma Tnanga De|Cauztos Necros. Sonero, Diversa em coy, igual em bizarria : Sois, bela tranga, ao lustre de Sofala Luto por negra, por vistosa gala, Nas cores noite, na beleza dia Negra, porém de amor na Monarquia Reinais senhora, nao sereis vassala, Sombre, mas toda a luz nfo vos iguala, Tristeza, mas venceis toda a alegria, ‘Tudo sois, mas eu tenho resolute, Que sois s6 na aparéncia.enganadora, ‘Negra, noite, tristeza, sombra, tuto. Porém na esséncia, 6 doce matadora, Quem nfo dira que sois, e nfo'diz muito, Dia, gala, alegria, luz, senhora? Jeronimo Bafa. i ie Porsa sescomn. ‘VeNpo-sz eras Conrusons A Fracttapape pa Vina Humana. Nasctpas px st Mesvo. Sonero. Sonero. Esse baixel nas praias derrotado, -Nasto mar, triste Tréia, irado Noto, Toi nas ondas Narciso presumido; Nasee o pranto, arde o amor, cresce o suspiro; pe en EE NNN Pois Céus busco, astros sigo, a bens aspiro, Foi do monte libré, gala do prado; Etnas guardo, Euros rompo, Niles broto: eee eae Lee Sem norte, sem discurso, e sem piloto, PaO OER eee TANT dodo; Cogo a'luz, vivo ao aio, exposto a0 tiro, ete Veires ineenilide, reas ears ened cee Foi Zéfiro suave em doce agrado: eed eae cent esc ee: Se a Nau, o Sol, a Rosa, a Primavera, Se Einas verto, ares queimo, horrores toco, Estrago, eclipse, cinza, ardor cruel, Baste o ardor, pare o arp%o, cesse o tormento, . een ere na cio ao, (Cego amor, doce agrado, incéndio louco; Olha cego mortal, e considera, .Vé que na dita, na ansia, eno lamento, ‘Que és Rosa, Primavera, Sol, Baixel, eaiea ar ah weaeen ieee era oae) Para ser cinta, eclipse, incéndio, estrago. Morre flor, Fénix vive, acaba vento, Francisco de Vasconcelos, Francisco de Vasconcelos, Poss scennr, A Fraciuipape pa Vina Humana, Soxero. Baixel de confusdo em mares de asia, Edificio caduco em vil terreno, Rosa murchada jé no cainpo ameno, 4 Bergo trocado em tumba desd’a infancia, Fraqueza sustentada em arrogancia, Néctar suave em campo de veneno, Eseura noite em licido sereno, Sereia alegre em triste consonfncia, Viragao lisonjeira em vento forte, Riqueza falsa em venturosa mina, Estrela errante em fementido norte, Verdade, que o engano contamina, —* ‘Triunfo do temor, troféu da morte E nossa vida va, nossa ruina. Francisco de Vasconcelos. 54 Soveros. A um Rouxtno Cantanoo. Sonero. Ramalhete animado, flor do vento, Que alegremente teus cidimes choras, ‘Tu cantando teu mal, teu mal melhoras, Eu chorando met mal, meu mal aumerito, Eu digo minha dor to sofrimento; ‘Tu cantas teu pedar, a quem naroras, ‘Tuesperas o bem todas as horas, Eu temo qualquer mal todo o momento, Ambos agora estamos padecendo oe Por deczeto cruel da Deus Meninio; Mas eu padego mais, sb porque-entendo: Que é tio duro, ¢ cruel o meu destino, ‘Que tu choras 0 mal, que estis sofrendo, Eu choro o mal, que softo, ¢ que imagind. Prancisco de Vasconcelos. 55 Possa sescearst ‘Ao Cava Do Conpe po Sapucat ‘que Fazia Gnanpes Cunveris. Sonera, Galhardo bruto, teu bizarro dlento Miisica é nova com que aos olhos cantas. Pois na harmonia de cadéncias tantas Evclave o freio, é solfa o movimento, ‘Ao compasso da xédea, ao instrumento Do chao, que tocas, quando a vista encantas Ja baixas grave e agudo ja levantas, Onde o pisar é som, eo andar concento: Cantam taue pls, ¢ tou mencio pronto, Nas fugas'nflo, nas cléusulas medido, Mil consondncias forma em cada ponto. ” ‘Pois.em salsas airosas suspendido ‘Exgues.em cada quebro um contraponto, +. -Fazes em cada passo um sustenido, * Frei Amténio das Chagas. 104 Soneros As Porstas Que se Frzenam a uma, ‘Quetmapuna Ds Mio De Uma Sexuona. Sonero. O mio nao de cristal, ndo mio nevada, Mio de relogio sim, pois que pudeste Nesta misera terra, em que nasceste, Fazer dar tanta infinda badalada Que mao de almofaviz.enxovalhada Foi tal como tu foste, 6 mao celeste ois foste, quando mais resplandecente [Em tantas de papel, tio mal louvada. Nem de cebola a mio negra, e grosseira Queimada entre morrées publicamente Merecia to miseras Poesias. Mas louvo-as de sutis em gr’ maneira Pois que para apagar a flama ardente Se fizeram de industria assim to frias. D, Tomis de Noronha. Porsi scan, Soier0s. A Monre pa Sexuiona D. Manta Couriita, A Que st Tinstant Escarro Murros Vensos. Pragas se Cuoran Mas « pon una Dama CRUEL. Sonero. Sonero. ‘Morreu Maria Coutinha isto se sofrel A {6 de homem de bem, que é demasia, Que se atreva a.um rosto de‘tauxia ‘Uma vil ruim, que fede a enxofre, Enfim sero depésito de um cofre thos, que eram depésito do dia, infim ha de comé-la a terra fria Sem que primeiro a case Santo Onofre. ‘Anda por ai berrando a gente agora Ea todos em seu pranto « Musa core, Ha tamanha loucura, hé tal canseiral Morra Maria Coutinha, shorra embora Que anteontem também sendo uma torre Morreu minha vizinha a pasteleira Nio sossegue eu mais, que um bonifrate, Deurina sobre mim se vate um pote, | ‘As galas, que eu vestir sejanh picote, Com sede me déein gua em agifate. . Se jogar o xadrez me déem tim mate, E jogando as trenentas um capote, Faltem-me consoantes para um'moie, E seni o ser me tenham pot orate. Os licores que beba sejam mdrnos, (Os manjares, que.coma sejam ftios, Nao passeie mais rua, que a dos fornos. E para minhas chagas falter fios, Na cabega por plumas traga corns, ‘Se meus olhos por ti mais forem rios. D. Toms de Noronha D, Tomas de Noronha. 168 or

Você também pode gostar