Você está na página 1de 186
aes ter) A publicagio deste livro foi possivel ‘eragas as conteibuigoes da angelisches Missionswerk in Deutschland (Hamburgo, Alemanha) e das Igrejas Protestantes Unidas na Holanda ~ ‘Ministérios Globais (Uecht), Ais quais a Associagio de Seminérios ‘Teoldgicos Evangélicos agradece. B Associagio de Semindtios Teolégicos Evangélicos Presidente: Pro. Jest Carls de Souza (Sto Burnardo do Campo) Vice-President ira (Resi) 0 (Rao de acre) sn Carri de Lacerda (Si Paul) Prof, Dr. Zaquen Morena d Oi Seoretdriae Pro. Manor! Bernantiee de Santana 8 Tacourciv: Prof. Gi Vogai: Prof Dr Laoearde Notts! (So Paulo) Prof, Dr. Neleon Kilyp (80 Loopokts) ee (Se Banso do Sl Prof. DrWerner Secretdrio Geral (of, Vivmando Batalte Vio = LIBER GUSTAF AULEN il WM ee A FE CRISTA ‘Tradugio de iRSON GLENIO VERGARA DOS SANTOS 2002 "alo do orig em sees DEN ALLMANNELIGA KRISTNA TRON. Tilo di ei om sac do aly, ea a pest rain em potas The Fath of se Uondist SCM Press Lids, 2 Eagdoevsudu 196 Prnwir eds em tng rath Semindsos Rvangicoe~"ASTE © 196. Sopund edgar ling prtasicsa da Asse ‘ealicos Evanson -ASTE © 2002, Todas os dies rexcrator ings du gual ration Char a Aree do Dinegio Bair ae Ferrando Dor Filho Seminirio Concérdia Biblioteca Sist, 2 2992 Reviaio Femsndo Bosal ko Proc Compost e arte final stontelepien come Pe Raping daSilva Nopuira ‘oes de Siva Dass I racionals de Catalogo nn Publicwo (CIP) imara braselea do Livro, SP Beall ‘sles, Gora 1879-1977 foe Gusta Ata mom lb Ve on Soto, — Sto Paulo AST, 2002, “hate ain: Den Amelia Keita Tow igri 316 pias: 10429 em, ISHN: £54555.07.09, IL FE (Cetin) 2, Yolo siemes 1, To, Ince par eadlog stein 1 Teolagis siti: Ctaniems 230 -Assosagbo do Semin Ts Ru Rego Fes, (ca O1230 010+ St Pa rh APRESENTACAO we PREFACIO DO TRADUTOR PREFACIO. INDICE Introdugio FEE TEOLOGIA ATARBFA DA TEOLOGIA SISTEMATICA, ) Objetivo: compreender a fé b) A teologia “sistemitica” ©} A teologia sistematica e afi 4) A teologia sistemitica e a psicologia da religiio. ©) A fé crista “ecuménica”: a teologia sistemética e a simbética 1) O cariter cientifico da teologia sistemitica FE: EXPRESSAO APLICADA A RELACAO CRISTA ENTRE DEUS E 0 HOMEM. a) Definigdo preliminar do termo b) Fée revelagio divina ... ssn AREVELACAODIVINA .. . a) Relagio da revelagdo divina com a natureza ea hst6ra b) A revelagio decisiva de Deus ... ©) Universalidade © exclusividade, da revelago divina 4d) Afé ctistd ¢ a religido do Antigo Testamento. ©) Anatureza da revelagao divina “ A REVELACAO DIVINAE A HISTORIA... 1) A revelagio divina nao pode ser separada da histria by Arew sofia da religiio lagi divi Jo pexie ser identiffieada com sina 13 1S 17 21 21 24 25 29 33 6 AFa Cnard - Guta dutén tics 7 : ©) Adialética da fé . 61 @)Observacio sobre a fé em Cristo e acxfica histrica, 61 r 5. FEEM DEUS E FE EM CRISTO : 64 O DEUS VIVO a) O problem... . ot CartrnolL b) O sentido da eristocentricidade ccnnn soi 65 O CONCEITO CRISTAO DE DEUS c) Tnterpretagdes errOneas sobre a relagao entre fem Deus e fé em Cristo “ “ srenennsnene OT ASANTIDADECOMO PRESSUPOSTO DO CONCEITO DE DEUS 6. OCONTEUDO DA FE. 68, a) O pressuposto do conceito de Deus ... - a) A féeo seu conteddo 68 'b) A santidade como sentinela. b) A mensagem criste sua interpretagio. n 13, TENSAO E UNIDADE NO CONCEITO DE DEUS ¢) Temas e formas de expressio. n a) A tenstio no conecito de Deus 7. AVALIDAGAO BIBLICA DO CONTEUDO DA Ft wm b) A unidade no conceito de Deus a) A mensagem da Biblia 5 4, DEUS E AMOR ) Natureza e possibilidade da validagio 16 2) O amor € a centro do conecito de Deus. 8, ESCRITURABTRADIGAO 5 ) A natureza do amor divino... a) O testemunho vivo da Igreja 8 ©) A imperscrutabilidade do amor... b) A legitimidade da tradigio ” 15. AOPOSICAO ENTRE AMOR E MAL ... ©) A tradigo como guarda na interpretagio biblica sone 80 8) A puteza do &MOP sn snnncrennnsnn €) O primado da Bseritura 82 ») A ira doamer..... ¢) A radigdo nfo deve sor interpretada de modo legalista ou evolu- ©) Aluta do amor cionista sn seen 83 16, ASOBERANIA DO AMOR se 1) Doutrina pura 8h 2) A soberania de Deus € a soberaia do amor. 9, ANATUREZA DAS AFIRMACOES DE FE 96 ») Os vérios aspeotos da soberania de Deus 2) Asafirmagies da £8 no sio proposigées metafisicas 86 ©) Amor ¢ soberania - b) O eariter simbélico das afirmagées da f6 7 17, ODEUS VIVO .rsnseun ©) O compreensivel ¢ 0 incompreenstvel sevnnnene BB a) 0 Deus da fé € Deus vivo 4 A tensao nas afirmagoes da 6. ny b) As idéias defstas e panteistas de Deus ¢) O contedo da fé: unidade carregada de tensio 92 ©) A personalidade de Deus: " 10. ACERTEZA DA FE 93 Caettmott 2) A teologia eo probtema da certeza da f6. 1.94 bb) A certeza da fé nao 6 demonstrivel 1.94 © DEUS QUE AGE ©) Acerteza da fé ndo é pragmitica 1.95 4 7 4) Certeza da f6 - certoza por experiéneia? .. 97 18, DEUS COMO SALVADOR ss le 8 Nae noone os 1) Viios aspeetos da atvidade divina seve BF wna erst " by) A atividade divina como ato de salvagao. 139 TEU é x ©) A dupla porspectiva da f6 crista 4 © CONTEUDO DA FE CRISTA bo aiuto sune 143 1) Q julyamento ative de Deus... ta L. PLANO DO LIVRO ssn 1) say “ 101 newlere pani APA Onots - Gustaf c) Observagio sobre a linha divis6ria da $6 vou esses 148 d) O fato ¢ 0 modo da ressUrteiGAO wren sens 205 |. DEUS COMO CRIADOR. a 452 28, CRISTO E 0 ESPIRITO... ws 207 a) Fscopo e importincia da doutrina da criag 152 a) A oba de Cristo ea obra do Espirito... 207 b) 0 cardter distintivo da doutrina da €ti¢0 oomnenonnneanne 154 b) Fé em Deus como fé no Espirito. @ 209 ©) CriagSo e histéria 156 29, OELEMENTO TRINITARIO NA FE CRISTA ... see DL ALBIDACRIACAO.... - 157 Nota sobre a linha linitrofe da f6 . 214 a) Lex creations wo. - 138 b) Lex creationis ¢ lex revelations we 160 . CariroLo IV DEUS EO MUNDO 161 ARELAGAO CORTADA E RESTAURADA COM DEUS 4) Duas espéeies de mal stnnsntnnae 10D b) A vontade de Deus e 0 curso dos eventos 163 30, NATUREZA DO PECADO... ©) O cuidado de Deus (fé na providéncia) 166 a) O pecado como conceito rel LEGITIMIDADE E LIMITAGAO DO DUALISMO 168 b) © peeado como deserenca ¢ como egocentrismo 4) Impossibilidade do duatismo metafisico .. so 169 ©} O pecado como perversio da vontade by) Impossibilidade de explicagio racional do mal en. "90 4) O pecado refere-se ao homem inteiro _ ©} Nota sobre a rejeigdo de esquematizagies psicalégica.. 223 Segunda Parte 31. A SOLIDARIEDADE DO PECADO, 5m OATO DE DEUS EM CRISTO a) A doutrina do pecado original b) O poder do mal Crriruro lll ) O pecado ao mesmo tempo inevitavel e volitivo, “ OATO VITORIOSO DE RECONCILIAGAO 4d) A inter-relagio solidéria no pecado ¢ 0 problema da sua origem ... 32, PECADO E CULPA JA OBRA COMPLETA E CONTINUA DE CRISTO veo 175 2) Conseiéneia de pecado e consciéncia de culpa. a) O caminho para a comunhio com Deus as 'b) A consciéncia religiosa de culpa nfo reconhece graus de 1b) Dois aspectos do ato de Deus em Cristo. 176 culpabilidade .... 234 AENCARNACAO 7 ©) O ponto de vista relat... 235 4) O sentido religioso da confissao de f€ em Cristo. 177 \8, ACOMUNHAO DIVINA EFETIVA-SE ATRAVES DO PERDAO 237 1b) O carater peculiar da confissio de fé em Cristo. 181 a) Conceito de perdio even ©) A wologia da encarnaglo e a teologia da expiagiio 184 ) O milagre do perdio . «l) Nota sobre a linha limitrofe da fé 185 ) O perdido nao anula a oposicao de Deus ao mal CIIRISTUS CRUCIFIXUS — CHRISTUS VICTOR 186 «l) Conceituagiies erréneas do perdlo w..mrsr 4) obra consumada . 187 PERDAO DOS PECADOS, VIDA E SALVAGAO 1) Vit6ria e reconciliagio ... 189 38) O milagre da nova vida... ©) Propter Christum . . 193 1b) A nova vida como conflito ¢ servigo «) © cariter peculiar da doutrina crista da expiag’ 198 ©) Sulvagio e paz CHRISTUS-KYRIOS 201 «ly Nota sobre significado da espontancidade 4) A obra continuada de Cristo. 201 ©) Nota sobre a falsa idealizagao da vida crista bby Crane ressureig er) 1) Nota sobre a falsa idealizagio da relagdo entte 0 cristo e @ ©) Varios aspeetis cht esa a sun 284 hw APE CusrA «Gustaf Alin $5. ACOMUNHAO DIVINA EXIS- A telagao de fé . +) A f8 como abra de Deus e como atividade humana 36. A FE COMO POSSE E COMO ESPERANCA vo a) A 18 como “posse” estan b) Af como esperanga . ©) Relagiio entre fé como “posse” e fE como esperanga COMO RELACAO DE Fit ‘Terccira Parte AIGREJA DE DEUS, Captruvo V NATUREZA DAIGREJA, ¥7. AIGREJA COMO DOMINIO DO CRISTO..... 8) O dominio de Cristo na terra b) A Igreja e Cristo ¢) A Igreja como comunhio eriada pelo Espirito Santo 38, AIGREJA UNA, SANTA, ECUMENICA E APOSTOLICA a) A Tgreja viva b) Aunidade da Tnreja. ©) A santidade da Igreja @) A ccumenicidade da Igreja ©) A apostolicidade da Igreja 39. ACOMUNHAO DOS SANTOS: 8) Commuinio sanctorUt eonnon b) A navem de testemunhas cnn 40. AIGREJAE A VIDA CRISTA..... a) “A mile que gera e cria cada ex b) Membros da Tgreja Cavéruco VI OS FATORES CONSTITUTIVOS DA IGREIA 11. OS MFIOS DE GRAGA 8) Os fatores constitutivos da Tgreja « enn 1») Os meio de graga como expresso uplicad a ava im «ho Espivite ©) Blasticiladle © estabilidade dos nicios de pagan 255 256 258 262 262 263 262 269 269 27m mm 291 291 se 202 9993 42. 43, 45 46, as, \ su facie u APALAVRA DE DEUS 204 a) A Palavra como mensagem nnn sen 295 ) A Palavra fiele viva... 297 ©) Duas interpretagdes errdneas ... so 298 4d) Nota sobre lei e Evangetho 300 e) Nota sobre a posigo do Antigo Testamento nen 300 OS SACRAMENTOS . 301 a) O Bvangetho em forma de acd0 ... 301 ) A importaneia dos sacramentos 303 ©) Duas concepgées erréneas 1. 305 O SACRAMENTO DA GRAGA PREVENIENTE we snsonseneennes 306 8) O batismo como ato de Dews «en sn 1-307 b) Validade do batismo de criancas - 308 ) Falsas interpretagdes da idéia cristé do batismo 310 O SACRAMENTO DA CEIA DO SENHOR 7 seve BLL a) Controvérsias teol6gicas e interpretagio da Ceia do Senhor ven 312 b) A Ceia do Senhor como ato de Cristo se 313 ©) Adidiva 318 4) A Ceia do Senor como ago da Igreia - 320 AORAGAO, a innnninnennnnnn 322 a) A oragdo como meio de praca 1323 b) A oragdo como acesso do homem a Deus. 304 ©) A oragio como acesso de Deus 20 homem 327 O MINISTERIO CRISTAO....... “ 328 a) O ministério como comissiio dada por Cristo... b) Falsas interpretacdes . Caviruco VIL AIGREJA NA ERA PRESENTE, AS OBRIGACOES DOS MEMBROS DA IGREJA a) Membros vivos do corpo de Cristo. by A atividade da Igreja ayy |AIGREIA E.0 ESTADO. 68 a) A fungiio do Estado... v8 hy Nao se deve confundir a fungdo da Igreja com a do Estado wn ©) A Tpreja c a ordem da justiga fost ur A UNIDADE DAIGREJA BA DESUNIAO DAS IGRUIAS uw 8} A hase «0 objetivo do movinnento ecuméniee: uy Me by Leumenisnne teuloysia bs ARG A Gusta Aula Carino VT AIGREJA A LUZ DA ESPERANGA CRISTA 51. OS VIVOS E OS MORTOS.. a) A comunhio cristi e a morte +b) Duas interpretagies erréneas ©) A perspectiva da fé REGNUM GLORIAE a) A Igreja e 0 regnum gloriae b) O conteiido da esperanga crista iNDICEREMISSIVO INDICE DE REFERENCIAS BIBLICAS APRESENTACGAO 10, a Associ grande satista (0 de Seminirios Teolégicos 1 velivos-ASTE apresenta esta segunda edigéo do compéndio de Jour Sistemaitica de Gustaf Aulén, A Fé Crsid, Esta obra, novai \v ponnvel ent Iingua portuguesa, encontra agora um ambiente bastante ines daguele que fol mareado pela sua primeira edico, em 1965. Haves tyemios mais 0 contexto de escassez de obras de Teologia Sistema- by crt hinytia portuguesa. Entretanto, A Fé Cristd niio perdeu seu lugar, wr Tido e estudado, pois representa uma postura teologiea aberta palavra que precisa ser [embrada ¢ valorizada nestes nossos \- estudantes ¢ professores/as sintam-se estimulados/as a dialo- 14 partir co desafio constante de refletir sobre as questes da nossa Fé. S30 Paulo, dezembro de 2002 Femando Bortolteto Filho Bditor da ASTE PREFACIO DO TRADUTOR A publicagio de un tratado de teologia sistemética de autoria de um bispo luterano ~e, ainda mais, traduzido por um anglicano ~ em lingua por- tusuesa poderia, & primeira vista, semear exclamagdes de admiragao, nota- amente entre aqueles cuja ocupacdo imediata nao se) 0 ensino ou o apren- ulicado formais da teologia em semindrio, Cabe, portanto, uma breve palavra, niio de recomendagdo ~ que a obra por si mesma se recomenda ~ mas de eonfianiga no acerto da iniciativa de tomar este livro acesstvel aos leitores brusileiros, Em primeiro lugar, porque é de esperar-se que sua leitura néo fique restrita aos especialistas. A propésito, valevia a pena lembrar mais uma vec que a necessidade de uma teologia leiga se torna cada vez mais imperiosa en nosso mieio. B é por isso que lemos razio em regozijar-nos com a publica- «wo de mais uma obra teoldgica na lingua do nosso povo, confiando em que roy leigos de toda sorte e filiagao eetesidstica dela se apropriem O nome de Gustaf Aulén merece-nos respeito todo especial. Depois de varios anos na edtedra de teologia da Universidade de Lund. foi nomeado hispo de Strdingnés, retornando a Lund hé alguns anos, apés aposentar-se Kcpresentante de um grupo de escritores escandinavos notdveis por sua con nibuicdo original a varios campos da pesquisa teoldgica, seu nome situa-se on destague entre os de homens como Nathan Séderblom e Anders Nygren, nara citar os mais conhecidos. Muitos teremos certamente reparos a fazer na exposigao da Fé Crista syue nos é dada nesta obra, A alguns de nés, por exemplo, causaré séria preo- ijuacio, 0 fato de o autor cultivar uma atitude de desconfianga radical no nupet que « razéio ocupa no pensamento teoldgico. E evidente, porém, que cle escreve de dentro de wna tradigao teolégica definida e elara. Nao the eabe unne taio caberiee a nenkum tedlogo com mente ecunénica— ocultar on des mercer esse fato, Nao obstante isso, alguns valores maitiseuls ner fue sl lunnar pasticularmente « atengdo ao percorrermos essa exposique, © suut relevancia invdiuta para a empresa teoldgica em nossa poe parece nos voidente, Para Autén a teologia & funieao da grejay, funcan a yee crisin « pnvieade poly mero fate de estar envevtade ni comaaidade da ketene be 16 AE Custs - Gustaf significa, de um lado, que a penquiricdo weolbgica ndo é una dimensio opeio~ nal na vida cristd, um extra dispensdvel na obedigacia e no servigo eristios. Fla € reclamade~ ¢ hoje talvez mais do que nunce ~ pela nossa insergaio no Corpo do Cristo. De outro tado, a idéia da teologia como funcéo da Igreja nos leva dt compreensio de que a tarefa teoldgica nao é obra do teélogo indi- vidual, pessoal, exclusiva, desvinculada do contexto em que, como cristo, esteje situado. O tedlogo nao escolhe a seu talanie o temdrio, as premissas, 0 alicerce do trabalho. Nem se Pode dar uo tuxo de eontentar-se cont a formu lacao de wn sistema sem atender aos padrées de julgamento que brown dle referencia, isto 6, a Fé daguilo que &a sua maiéria-prima e seu ponto fi uma ver confiada aos santos, 0 depésito Talves seja em raziio desse entendimento da fingiio do tedlogo que deve ‘mos reconhecer— coma o faz Aulén — que a dimensiio ecun sariamente permear todo 0 trabalho teoldgico, estes sao dias de crescente rico. De redescobrinento da atitude de dispo- iew deve neces- abertura para o didlogo eeu nibilidade diante daguilo que os erisiios de outras familias nos podem reve- lay na busca conuim da plenitude e da integratidade da Reveiagdo. De deseo: berta cada vex mais intensarclaquele esptrito que Villain chan de "emulagéio”, Ea teologia, em decorréncia, tende a perter o caréter polémico que a avila va. Assim 0 6, ao menos, em terras em que a obra nnitiva do Espirito Santo nd é obstada pelus barreiras que desafortuncdamente séio ainda encontrei gas em nosso meio. Nesta ¢ emi obras mais recentes Aulén surge conio wm redlogo seriamen- te preocupado com 0 aprofundamento do didtogo ecuménico, Os resultados de sua pesquisa e erudigio teoldgica ele os pie a servico da Igreja, que busca no ecttmenismo uma das formas de obediéncia ao imperativo do seu Senhor Temos certeza de que o presente livro, tio cristalino na sua afirmagio da atituete verdadeiramente ecuménica do irabatho teologico, serd de grande ilidade para os que, professores ou seminaristas, clérigos ou leigos, se vol tam &tarefa de descobrir, em toda a sua profiundeza, as dimensdes da Verdade pela qual a Igreja é animada ¢ & qual ela é chamada a dar testemunko no Brasil de nossos dias. Dison Gutnio Vercara Dos SANTOS PREFACIO (da primeira edigéo inglesa) Este livin & tradugito da quarta edigéo revisada de “Den allminneliga Arista trom”. O vocdbulo sueco “allmannelig” conesponde ao que aparece no Credo Apostélico: “Cremos na santa Igreja catslica {crisia)”, Pare evitar ‘os mal-entendidos que poderiam ser suscitados pela palavra “eatdlica”, 0 ‘tuto da livre fot traduzdo em ingles para. “The Faith ef the Christian Church”, Nao tenho evidentemente « intengdo de afirmar que as declaragdes contidas nesta obra podem ou dlevens ser aceitas em toda a eristandade. O titulo indi- ‘1, antes, uma perspectiva importantissima que nio pode ser ignoradla pele ‘vologia sistennitica, a menos que esta deixe dle cumiprir a su fungao. Como todas as eiéucias, a tologia sistemdica possui também un objeto especifico, a saber, a fé cristd como realidade viva, E tarefa da teologia siste: initica explicar o sentido desta fé, esclarecer o que pertence a sua esséncia e iescobrir, de modo total e completo, as perspectivas que the sto caractertsti- ‘as e peculiares, A tarefa da teologia, por conseguinie, € revelar aquilo que ss olhos da fé entrevéem. Em outras palavras, o propisito da teolagia € esfor- «ar-se em apresentar conscienciosamente o sentido da verdade erist A teologia precisa, portanto, manier-se fiel a perspectiva ecuménica. Mio se pode adiitir que 0 sew esforco se transmude em confissdo particular le un tedlogo, pois estaria, neste caso, abandonando o propésito cientifico- enitico para com 0 seu préprio objeto. O mesmo acomteceria se a teologia se confinasse aun confessionalismo estreito e indulgente consigo mesmo. Tam: boweo constituem estas proposigées uma plataforma de indiferenca com rela- ‘ule aos pontos de vista confessionais. Significanm, isso sim, que doutrina algu- ma pude ser aceita como verdadeiramente crista se se baseia exclusivamente ‘mis suas Felagdes confessionais por exemplo, no confronta entre ela ¢ 0 pen sumento de Litero, Calvino ou Tomas de Aquino. Néwo nos reportantes «Lat 10 came se ele fosse debitro final da verdade, mas 86 ¢ exetusivamente ts medidas eM que 0 seu pensantente wes aja eevnntemplar tis elarannente a tue che evistianisona, Nar meat ev que se naan fick ae se abet a bs APs Guava - Gusta dé teologia sistemtica deve implicar em auto-examne, Ela tem de render gragas pelos dons recebidos na nossa prépria confissdo ¢, a0 mesma tempo, rejeitar como pecaminosa qualquer tendéncia no sentido de tornar-se “incurvatus inse” No século XIX, bem como nas primeiras décadias do presente, travow-se um conflito entre dois tipos de pensamento teoldgico, conhecidos como "fun- damentalista” e “moderista”. O primeiro tina caracteristicas escoldsticas e pietistas, pretendendo ds vezes combinar ambas as atitudes. O segundo tipo reinterpretox o cristianismo segundo ponto de vista da filosofia ideatista e de tun huenanismo um tanto vago. Na reatidade, um ¢ outro se mostraram igual- mente incapaces dle eumprir a tarefa teoldgica de compreender ¢ explanar a {é crista. Em ambos as casos, ensombrow-se 0 realismo radical do cristianis- rio. As alternativas a que conduziam cram a estreieza de visio ou o falsea- mento dissolvente Felizmente néo nox é necessdrio escolher neniuma dessas alternativas. A perspectiva tealdgica esta passando por um processo de mudanca, sob a influéncia dle dois futores dominantes: prineiro, unsa pereepedo nova e mais profunda do sentido ¢ da temdtica da Reforma do século XVI; segundo — ¢ mais importante ~ um enfocar novo, licido ¢ realista da mensagem biblica. Mais do que em qualquer outra coisa, o exforgo da teologia deve consistir em vero cristianismo como ele de fato é, segundo « sua singularidade peculiar Em outras palavras, devemos propor-nas at libertar a mensagem cristé de tudo aquito que possa toldar os seus tracos caracteristicos a fim de que, por esse meio, essa mensagem se nos mostre em todo o seu poder original, Gusrar AuLeN Residéncia Episcopal Stringnas, Suécia Outubro de 1947 Introducaio FE E TEOLOGIA 1.A TAREFA DA TEOLOGIA SISTEMATICA, 8) Objervo: compreender a f6 ~ & teoloala sistemstica tern por objeto © ‘tudo da fSerst. Sua finale & lucidar, por todos os mens ao seu aleance, 0 ‘ntedido ¢o significado da fé criti. A sua trela nin € nem demonstrativa nem nnormativa, mas sim avalitica e extea, NBo se prope nem a fornecer provas pars Te nem a determinar o que “deve ser erida”. Tudo se concentza no esforga le ompeeeader a f&¢ expor a seu signiticada com a maior claroza posstvel 1) A teologia “sistemndtica” — Sendo o {8 cst, por naturera, completa sents teqetntriea e,portanto, determinada pelo ato de Deus em Crist, a apresen- tecio do seu conteido tem do resultar om ura todo orginico. ©) A ealogia sistemética ea filosofia da religizo — A teologia sistemstica Ulistineue-s da flosoti da religido,eujo objetivo € mvestgaro lugar da experién- ‘i teligiosa na vida do esto humana, Difere sadicalmente dayuele tipo de 1a religito que se aos presenta come melafisica racional 1) A teologia sistemstica ea psicofogia da relighzo ~A f8 referee exclu svanonte a Deas. Sussafiemagbes, portant, dizem respeito 4 relodo entre Deus ‘omen, Par isso a teologia ssteniiea distinguc-se da psicologia da religio, “amet do sujeica rligioso ese limita & andlse da conseiéneiareigiosa ‘WAJE erst “ecumbnica™: a teolagia sistemdtica ea simbiica ~ Sendo a nga da tcologia sistemsticaelucidar 0 significado da f€ erst, nto pode ser souinsid por Tiskages eonfessionais, Sé pode ser confessional aa medica em sywe sé-lo contribua para a comipreensto daguilo que é genvinamente cristzo. 1 toulaputsistematiea dstingue-s, portant, da simbolica, que interpreta a vas ontissues wa elagdes de ras com as outras 1) U coniten cientfico da teologiasistemdtica — A tungko da eologia site ic, na medida em que soa tarefa éesclarecero signili- ta cristi se eumpric ess trea cient joe puramente sak a eis, $6 poder a esr pps $00 a) Objetivo: compreender a fé + definir a tacefa da teologia sistemitica, & necessario ressaltar, antes nave mii, que © objeto de estudo 6 a f& crista como realidade dada, objeti- « Vtonlupi sistenvitica & portanto,a diseiplina teoljgiea que tea por obj tonbo ea psapuisa dha he crista Sea 8 pouke see boitingnnvent vente A-Fe Cutsti « GastafAulén rada objeto de estudo, Deus nio pode ser transformaclo em objeto de invest _gaciio cientifica, de modo a fazer da teologia nesst sentido o estaclo de Deus. Deus niio é uma “coisa” que possa ser investigada cientificamente. Para a fé Deus é 0 Alfie o Omega; mas a teologia analitca s6 pode ocupar-se com a elucidagio da natureza da relagio eristi entre Deus ¢ ¢ homem ¢ com a idéin de Deus caracterfstica da #8 cris Deve-se acentuar que a teok sistemitica enfrenta a mesma situagio que todas as outras disciplinas cientifieas, isto é, ela se ocupa do estudo de um objeto definido. Esse fato & esquecido se se apresenta a teologia como uma eespécie de confissio expressa em forma “depurada e cientifica”. Isso eq Ieria a classificar na mesma categoria a teologia ea pregasao. A teologia seria nnesse caso uma proclamagiio confessional em forma completa ¢ ldgica, Depa: ramo-nos periodicamente com semelhante concepeéo do emprego da teolo- gia, Deve-se isso ao fato de as exposigbes teolégicas da I cristé no darem a nlengiio devida a elementos essenciais dessa f8, tornando-se, conseqtlente~ wente, falsas as interpretagGes, Pretende-se com tais apresentagSes defender a fé, dando énfase a pontos de vista confessionais, Malgrado a hoa intengio, 10 entanto, 0 resultado é uma trigica confusio entre ¢ ponto de vista da vida religiosa e o da pesquisa cientifica A fungdo teoldgica como cigncia é de natu- reza tolalmente diversa da fungiio confessional atinente vida religiosa, E por isso que se torna {fo importante insistir em que a teologia sistemitica se ccupa da investigagio e elucidagio de um certo campo de pesquisa. Esse estudo deve caracierizar-se pela maior objetividade possivl. jf que 0 intuito & expres- sar 0 genuino significado da fé, Se fato que as interpretacdes teolspicas da f& Cristi se tém por vezes tornado perversbes que nfo expressam a real natureza da f&, 0 reméio nao esti em que a teologia passe a ter 0 caréter de confissio subjetiva, mas sim, ao contrario, que se revista de carter puramente cientifi- co e objetivo. E dessa atitude objetiva que repousa a garantia de que a inter pretagio nio descambard para 0 equivoco e a perversiv. Aceita essa perspec~ tiva quanto & fungdo da teologia sistemitica desaparece aembaragosa discussso em toro das credenciais pessoais do pesquisador. No decorrer da histéria da tcologia, tem-se tentado, no raro, reduzir a discussio cientifica a respeito do significado da fa um debate sobre a f€ pessoal do pesquisador teol6gico ‘Se se define a tarefa nas linhas em que foi feito nos pargrafos acima, nenhum ‘outro requisito & necessério além da compreensio do assunto a ser investiga do, Tal 6a situagdo em toda pesquisa cientifica A fungio da teologia sistematica, portanto, ¢ esclarveer 0 eu ymnifieado da {6 crista por meio de todos as recursus disponiveds, Nesse ponte central deve se emlecar contin A tarefa consiste em descobrir e revelar tudo o que é essencial, extirpar tudlos os elementos nio essenciais ¢ estranhos, remover todos os acréscimos stesnecessérios. E dbvio que tal abordagem deve revestir-se de carater eri co, A investigagao nio se pode ater ao superficial ou as formuilagées mais evidentes, Tem, antes, de ultrapassar, pela andlise critica, as formas m wis e atingir os temas religiosos subjucentes e fundamentais, mantendo-se, 1m mesmo tempo, continusimente aterta Aquilo que & caracterfstica e essen cbnente cristo. Nio se deve atribuir, porsm, a teologia sistemitiea nem cardter demons- ative nem normativa, Scu intuito ndo € demonstrar “a verdade” cl tuorneecr fundamentagio racional 3 fé, nem prover-nos de provas da existéncia le Dous, Tais intentos sio nio s6 cientificamente impossiveis como também aibeios a £8, jf que a f8 nilo tem consciéneia de ser fundamentada em quais- ct provas tacionais, Sao, conseqitentemente, alheios também a diseiplina watitica cujo objetivo tinico & compreender a fé. Mesto se fosse possivel syuesentar argumentos racionais, esses argumentos nada teriam a ver com a tv 0 Deus cnja realidade puclesse ser assim demonstrada seria de natureza inte iramente diversa da natureza do Dous da f. A teologia sistemitica s6 pode Jnutir 0 problema da certeza da f& cristina medida em que investiga a natu- vera dessa certeza, A funcio da teologia sistemtica nfo pode também ser nommativa. A teo- 1 no decreta leis para a Fé, nem age como senhora da Fé. A teologia mio legermina a fé, antes analisa a f6 cristi enquanto efetivamente existe. Assim ‘ome at ética nao pode ditar ao homem o que deve fazer, assim também a 1 sistemiitica ~ cujo escapo é o estudo da f8 — niio pode atrever-se a Ieterminar 0 que deve ser crido. Na realidade, essa eiéncia “normativa” ntlo sisi, Assim como a ética ctista ter de esclarecer 0 “ethos” especificamente “ari, assim também a teologia deve esclarecer e fixar o caréter peculiar da Jv c1isti. As atitudes pessoais com relago a esses fatores so outro problema, 1 tuto se pode confundir com a pesquisa critica. A teologia sistemtica deve, nies, concentrar a atengo naquilo que € caracteristicamente cristo € naqui- Tal exame critico constitui a preocupagao principal da teologia eteunitica, porque sua tarefa é compreender a f8 cristd e, com a maior clare- ipresentar 0 contetido, os temas centrais © os pontos de vista da 1 prsssivel, fi, Nesse contexto, deve-se deixar claro que 0 problema especifico com que valehonta a teologia sistemiitica & 0 do conteride e do significado da fécrista \ toolupia sistemsitica néio & uma discipfina histérica, O seu problema nao & hnetiat a aripent ¢ a dlesenvolvinente dkts douttinas evistais, Para issc existe a 4 APeCatsrh Gustaf Alen historia do dogma. O estudo dessa hist6ria reveste-se é& maior importancia como requisito pretiminar da teologia sistemitica, Trata-se, porém, de duas disciplinas distintas e separadas. A teologia sistemstica ndo indaga como se originowa fé em Cristo quais os elementos que se podem considerar origin’ rios na nascente confissiio de fé da igeeja primitiva. O que ela indaga, antes: & qual a importincia e qual o significado essenciais dessa confissto, ‘A teologia sistemitica tem fungao propria, clarameate definida. Ao cum- prir a sua tarefa, contado, cla s¢ relactona intimamente com uma série de disciplinas cientificas, precisando utifizar-se de todos os recursos disponiveis. Seus contactos mais intimos so, & claro, 08 que mantém com todos os depar- tamentos da religito c da tcologia. Mas suas telagdes vao muito além do est do da religido propriamente dita. Alcanga especialmente a filosofia ¢ as hum: nidades em geral. Nos pardgrafos seguintes, a rolacdo entre a teologi sistemtica e essas disciplinas seré mais minuciosamemte definida, Ela no se jsola; relaciona-se, a0 contrério, com uma série de disciplinas cientificas Nenhuma destas, porém, trata daquilo que constitui a fungdo especifiea da ‘cologia sistemiitica, a saber, expor o contetido e o significado da fé erista b) A teologia “sistemdtica” Ao procurar investigar o significado da fé cist, teologia sistemitica iio se limita a tratar de um sem-niimero de doutrinas desordenadas que se apresentem como proposigées sem relagio umas com as outras, come no caso da assim chamada theologia loci. Existe, a0 contrério, um homogeneidade interna e orginica em tudo 0 que constitui 0 objeto da teologia sistemética Essa unidade decorre do cardter totalmente teocéntricoda f6, Falar em “teolo~ sia teocéntrien” é fazer confusto de termos. O que se tem em mente com tal redundiineia & dar énfase ao cardter teocéntrico da fé ~cariter esse que nunca 6 demais ressaltar. ‘No dominio da £8 cristi 0 problema gira sempre em tomo de Deus ¢ da relagio do homem com Ele. Deus & 0 centro tinico da fé. A f6 cristl € 18 em Deus, 2 s6 nele. Nao é possivel equacionar coisa alguma com Deus. A f€ niio pode ser dividida, de modo a dirigir-se em parte a Deas ¢ em parte a outros objetos”. Falar em 48 no Cristo, ou no Espitito, ou no perdio de pecados, ou na Igreja ou na vida eterna, ndo significa introduzir uma série de objetos de fé, os quais veniam competi com Deus. Tal perspectiva meciiniea e superficial ao caréter vivo, simples ¢ imediato da Fé 'S6 tem sentido falar em diferentes objetes da Fé se com isso se fontes aspects da atividade de Deus em favor de hemient ¢ assian ane= t Fee Teotocie a se evidencia 0 fato de que em tudo se trata da fé em Deus. Falar em Cristo como objeto de f equivale a falar em Deus revelado. Falar em perdio de pecados significa falar no Deus que estabelece comunhio com os homens. Falar em vida eterna € 0 mesmo que falar sobre o Deus eterno e vivificador. Se outros “objetos de f6" sto colocados lado a lado com Deus com ele riva- Jizam, subtrai-se a soberania que Ihe perience no dominio da £8. Para a fé, nada existe de mais Gbvio e iniludivel do que a afirmagao de que “devemos confiar em Deus acima de todas as coisas”. Quando se trata de deserever 0 “objeto” da fé crista, a palavra da Biblia é oportuna: Dens é “o Alfa e oOme- 88, 0 prine‘pio e o fim” (Ap 21.6). Se é fato, portanto, que a fé eristi & detentora desse carter unitério © teocéntrico, a exposi¢ao da teologia sistemstica, para ser fiel & sua materia, deve transformar-se em um todo orgdnico. Nao pode ser uma theologia loci, «que apresenta uma série de doutrinas mais ou menos desconexas. Os varios pronunciamentos da fé mantém ns com os outros uma relagio orgiinica inte nae d.undlise teoldgica deve refletir tal circunstincia. Hii de fato, um iinico tema, mas esse tema tem de ser encarado de varios pontos de vista. A andilise ‘ocupa-se permanentemente da relagdo entre Deus ¢ 0 homem enquanto deter- minada pelo ato de Deus em Cristo, Na andlise do significado da £6 no ha lugar para elementos que no tenham analogia com tal relagdo, ou no a expressem, A compreensio, porém, desse caréter organico ¢ sistemitico da andlise tcol6gica seria falseada se se concluisse que a exposigao teol6gica deve resul- tar em um sistema racionalinente completo ¢ acabado. A unidade a que aqui se faz mengao nao é um sistema fechado de raciocinio, mas sim uma unidade caracterizada por uma certa tensio interior. Sera forgoso voltar a esse fato seguidamente no correr desta exposigdo. Essa tensio niio pode ser eliminada por meio de alguma acomodagio racional, o que importaria em uma falsa interpretagao ¢ mesmo em perverstio da f6, De outra parte, apesar da tensio, vst f8, que se dirige a um tinico centro, possui o cariter de um todo orginico. © objeto da teologia sistemstica é um organismo sensibilissimo: qualquer wm «los seus aspectos se relaciona intimamente com os outros e o que acontece tia periferia tem reflexos imediatos sobre 0 prprio centro. ©) A teologia sistemdtica e a filosofia da religido do as diferentes interpretagdes quanto a fungao da filosofia da rel obsetras no qe lan A retagio entre cla ea teologiasistemma- sees dfinie ewan Lge eluckda a ro % AF Gusts Gustaf aati duas disciplinas. Foi dito que a intengo da teologia sistemética é possibili- :at a expressio total e completa da fE cristi. S6 se pode atingir esse escopo eixando vir a tona as perspectivas peculiares ¢ vitsis da prépria fé. Mas isso nao se pode fazer se a fé for examinada ¢ avatiada de acondo com perspectivas exteriores 2 fe com ela incompativeis. A tarefa consiste em descobrir e expor aquilo que € essencial A fé cristi, A fé deve ser compreendida a partir do seu préprio centro. Qualquer tentativa no somtido de forget a harmonizar-se com tum sistema que Ihe é estranho acarreta falsi interpretacio ¢ distorei Partindo desse ponto, & agora posstvel descobrir como se deve determi- nara relagtio entre a teologia sistemitica ca filosofia da religido. E inegaivel a freqllente confusdo entre as fungbes dessas duas disciplinas, Tem-se mesmo proposto a filosofia da religiao como substitutivo da teologia sistemitica, che- ‘gando-se a atribuir dquela uma certa superioridade. O pressuposto usiial éode {que a filosofia da religio procura criar um esbogo comum » primiirio da “essén~ cia da religidio". Tal eshogo servitia de ponto Ue partide ¢ de padtio eritico seguro para o exame € avaliagio das virias religides histéricas, inclusive o cristianismo. filosofia da religito podetia entio tratar do cristianismo de ponto de vista mais elevado e cientifico do que a “dogmitiea”, limitada que & esta por pressupostos confessionais e incapaz de assumnir uma posicao tio livre e isenta como a da filosofia da religido, Esse tipo de pensamento, contudo, nao s6 representa uma vistio defei- iuosa da fungao da teologia sistemstica, como também se engana quanto funcio da filosofia da religido. Tomou-se evidente que essa confusio com. respeito A fungio das duas disciptinas em nada contribuiu para a filosofia da cr ifo, nem [acilitou 0 estudo & elucidaesio da £6 crista. A religidio 56 existe cm manifestagdes hist6rieas. Quando a filosofia da religiio, de uma ou de outra forma, imagina uma “religiio comum” e faz des- sa idéia a base do jufzo a respeito da f€crist, o resultado inevitivel & que a f& sta § investigada e avaliada a partir do exterior, de ponto de vista ¢ com metodologia que Ihe sio estranhos. Nao pode haver assim clareza quanto & natureza ¢ ao significado da f6 cristi. A interpretagio passa a ser uma reinter= pretagio consoutte a esquedna previamente orcenadlo. Apesar da alegasio de objetividade cientifica, este método toma-se grandemente subjetivo e arbitré- rio. Como resultado, © pesquisador que argumenta ter enzontrado um eritstio objetivo, eientifico e seguro de julgamento, acaba sendo mais arbitrérioeirre- cuperivel. Para comprovar essa afirmacio basta lembrar a tentativa do ilumi- reli hismo po sentido de rinterpretar a {6 cristd de acordo com a sus religiio conmns “filosotien”, on entao o idealism do sSeulo XI, cou a sea Llesofia dda telipiaese tools A Lécrisha Loi fegacka nesses ston nor forts Pex Tuotoa x que eram estranhas. As interpretagGes resultantes nfo slo eaves le disfargar © fato incontestivel: a fé foi sujeita a uma transformagdo que obscu yatureza. As suas idgias préprias ¢ caracteristicas acabaram por ser apenas, se tanto, parcialmente entendidas. Mesmo Schlejermacher nao conse} ihr tar-se da influéneia fanesta da filosofia idealista da religido ~ e lembremos que ele combateu a religiio comum “ilosética” ¢ preparou o terreno para yn compreensfio mais acuruda da funedo da teologia, apresentando a 8 eristi como objeto proprio desta disciplina. Schleiermacher nio péde cumprir 0 pro _grama 2 que se propusera, No seu célebre tratado sobre a f€ cristd tomou teotogia dependente da filosofia da religidio, porque o critério para a determi- nagio da “esséneia do cristianismo” baseava-se numa idéia relipiosa cujo con- tevido caracterizava-se pela filosofia monista da imanéncia, Essa idéia exer- cet profunda influéncia sobre as posteriores exposigdes da fé ctisti © seu contetido. Tornou-se por isso impossivel a esse teGlogo fazer com que se evi- denciassem as idéias caracteristicas da fé ‘Se é proprio da pesquisa cientifica a capacidade de discernir ¢ esctare- cer o objeto de determinada ciéncia, esse tipo de filosofia da religito deseri- to nao tem rares para assumir foros de superioridade em relaedo 4 teologia sistemitica cuja fungio definimos. A metodologia cientifica atribuida a reli- gido influenciada pela metalisica racionalista é mera ilusio, E ineapar de tomar © cristianismo compreendide, Nio é suficientemente livre dos seus priprios pressupostos. Julga ¢ reformula baseada em postulados cujo con- teiido no foi por ela examinado a fundo. Se é de alguma forma possivel “compreender” o cristianismo, 0 contetido ¢ o significado da fé cristi, tal Possibilidade s6 pode efetivar-se mediante estudo cujo escopo tinico seja permitir que os temas centrais e pontos de vista da propria fé se evidenciem ‘no lugar gue Ihes pertence e ainda cujo tnico desejo seja a compreensio da {€ oriunda do seu interior. Se, portanto, é possivel ter por assente que uma filosofia da religito influ enciada pela metafisica ndo é itil para 0 estudo positive da f crist@, também € possivel afiemar que a fancio puramente religioso-filoséfica nio tem sido centendida de modo cientificamente satisfatério. Torna-se claro que a idéia da religido assim alcangada nio € fruto de anilise cientifica, mas se baseia em prineipios altamente subjetivos. Nada mais & do que uma concepgao subjetiva dia f&, a que se tenta aditar marcas de objetividade ¢ erudigao filoséfica, Euma confissi0 que se arvora em filosofia, porém “confissio filoséfiea” é contra~ dictio in adjecto, Por mais que se esforce em cobrit-se com o manto da filoso- lis, « confissio pessoal no pode ser admitida na consondncia dos estudos filosstieos, ; AFR Custa Gustaf Aun Para ser realmente cientifica, a filosofia da rcligido precisa libertar-se de todas as tendSncias no sentido de criar, “de modo filoséfico”, uma religiio comumente aceita, que seria antecedente a todas as manifestagoes histéricas «la religido, Seu objetivo deve ser explicar criticamente a rea da experigncia religiosa e determinara posigZo desta na vida espiritual dohomem. Vale dizer, cxaminar a relacio existente entre ela e as categorias teordticas, éticas ¢ esté- licas, o verdadeiro, o bom ¢ 0 belo. A filosofia da religido trata de unva série dé problemas essenciais a0 estudo da religio, problemas esses que a teologia sistematica niio pode debater, sob pena de desviar-se da sua tarefa principal. ‘Quando a fitosofia da religido se ocupa desse estuda importante — presente~ mente desprezado ~ pode-se estabelecer proveitosa cooperagiio entre ela ¢ a teologia sistemtica desde que cada uma conserve sua fungio essencial. A filosofia da religiio despojar-se-ia do seu cardter eritico se tentasse com sua influéncia tragar a diretriz da tarefa teol6gica, que consiste em interpretar 0 contetido da f6 cristi, Esta tarefa s6 pode receber diretrizes unicamente do material a ser estucado. Embora relacionada com uma filosofia critica da religiio, a teologia sis- tematica difere totalmente do tipo de “filosofia da religio” que se apresenta como metafisica racional, O que vem de ser dito jf deixa esse fato bem claro, mas nunca & demais ressalts-lo, especialmente porque tal metafisica racional procura continuamente imiscuit-se na teologia. A metafisica “filoséfiea” tem= se proclamado capaz. de prover uma “doutrina de Deus ¢ do mundo supra sensorial”, racionalmente motivada e esquematizada. ¥4 na Igreja primitiva {ez-se sentir a influéneia da metafisica racional. Desde essa época, toda teologia “escoldstica” — tanto do periodo medieval como do posterior & Refor- ‘ma tem tentado alicergar-se nessa metafisica filos6fica a fim de poder apre~ sentar-se como “teologia natural”, assim chamada, Passou-se a distinguir contre articuli puri, enraizados na revelagio € com o carater de afirmagies de Fé, € articuli mixt, baseados em parte ma revelagio ¢ em parte na metafisica ‘acional. Nao ha come negar quc, de um lado, essa base mais ampla significa ‘va uma certa protegio da teologia contra 0 exclusivismo, numa época em que se conceituava a funcio da teologia sistematica em termos um tanto estreitos, confessions e te6ricos, Por outro lado, no entanto, & forgoso admitir que essa perspectiva mais ampla foi conquistada a prego muito alto. Nada contribuiu inais para a confustio com respeito & diferenca cntre a natureza da fé cristae a netatisiea do que a idéia de que @ “doutrina de Deus” devesse resultar em articuli mixti. (© motivo dessa aversiio da teologi ani est sGinno fated vst metals stemitica pela metaffsica racional suspeita do pontode vists eviticoe de Pee Trav 6 que, por conseguinte, qualquer critica & metafisica se estenderia também a teologia que a contivesse. O verdadeiro motivo esta cm que a fé nada tem a ver cum a metafisica racionalista, A f§ crista’em Deus ¢ algo mais do que urna explicagio racional do universo. A teologia nao cabe outra tarefa além da de investigar aquilo gue é oferecido pela f8 € que é desta caraeteristico. Desde 0 ‘ncipio e durante os perfodos em que tinha mais consciéneia da sua prépria natureza, a fé eristi deu testemunho de que o Deus a que ela se refere revela- se exclusivamente aos olhas da fé « nio pore ser apreendido pela mera sabe- doria humana (cp. Mt 5,85 11,25; Jo 7,17; 1 Co 1,17ss; 2,10 ete.) Merece critica a filosofia da religida que se apresenta como “teologia natural”. Essa critica, no entanto, nao significa uma atitude totalmente, nega- tiva, de pura e simples rejeigdo. Nos casos em que prevalece tal atitude nega tiva, 0 resultado € 0 descuido de problemas vitais para.a teologia e 0 isolamen- to desta, Nem se pode descambar para uma situago em que se tenha de escother entre a accitaviio ou rejeigio radical de semethante filosofia da religiio. Tanto do ponto de vista filoséfico como teol6gico, uma filosofia da religido deterini- nada pela metafisica é insustemtavel, Atras da sua argumentagio pouco con- Vincente, no entanto, hi tendéucias e pontos de vista significativos para a fé cristi, notadamente no que se refere & doutrina da criagio ¢ ao aspecto univer- sal da revelagio (ep. par. 3, n 3, e par. 21). A filosofia da religiio enquanto tcologia natural atesta, de moda teal, embora inadequado, a soberania de Deus sobre © homem ¢ o mundo, A filosofia da religiio metafisica e escolistica deve ser substituida por outra de cunho diferente. A filosofia crista da religiio eve libertar-se da tirania da metafisica racionalista. E pode fazé-lo tomando como ponto de partida a perspectiva universal da revelagio divina, cujo cen- {0 so 08 atos do Deus vivo ¢ ndo as idias racionais do homem a respeito de Deus. «l) A teologia sistemética e a psicologia da religido Dentro da cigncia da religito, lugar certo e fungo importante estio reser- ‘alos & psicologia da religito, entendida como investigacio puramente empi- rica e deseritiva da consciéncia, Ha varios moclos pelos quis estas pesquisas podem tomar-se preparo ¢ auxilio & tarefa da teologia sistematica. Today nao se deve confundir as duas disciplinas. Assim como tem sido freqiiente certa confusio da Filosofia da religitio com a teologia sistemitica, assim m, nfo raro, tem havido confusdo semelhante entre esta iiltima e 4 psicologia dit religiio. Originon-se cla em Sebleiermacher, Notou-se ante- » foi possivel a esse pensaclor desenvolver 0 seu progam o AFECusrA Gastar Auten teol6gico porque, ao interpreté-la, deixou a f8 cristd sujeita & pressfio de cconceitos religiosos cujo contetido era previamente fixo e determinado, Mais ainda, porque ele praticamente identificou 8 € consciéncia religiosa como lal, atribuindo assim teologia sistemética sentido psicol6gico. Devido & influéncia que tem tido 6 método de Schleiermacher, € irsportante notar que a missio da teologia sistematica &, em principio, inteiramente diversa da tarefa da psicologia da religitio, por mais importante que esta possa ser para aquela Se o problema da teologia sistematica € elucidar 0 conteddo da f6 crit compreendé-la, ento essa elucidagio tem de levar em conta o fato de que a fi sempre se mostra como expresso de uma relagdo em que tudo diz respeito a Deus como “objeto” tnico. Nao se pode “entender” a fé sem capacitar-se do fato de que toda afirmagio de fé é uma declaraciio a respeito de Deus e sua atividade. Se se enuncia uma proposigao referente ao significado da obra de Cristo, de que em Cristo Deus estava “reconciliando consigo o mundo”, 0 problema entio nfo se referea uma histéria empirica ou afirmagio puramente psicolégica, mas sim a uma assergao a respeito de Deus e sta atividade, Para citar outro exemplo, © mesmo acontece com a expressiio da 1 sobre © perdiio dos pecadlos. O problema que se prope niio alude simplesinente a uma varia- Go na consciéneia religiosa, mas se relaciona com 0 ato divino pelo qual se estabelece comunhiio entre Deus € © homem. A natureza da fé no se revela quando se diz, como Schleiermacher, que as douttinas cristis sio “descrigdes faladas dos sentimentos religiosos cristios”." Exatamente porque todas as afin magies da f6 sio declaragées referentes a Deus e sua atividade, a teologia sistematica deve diferenciar-se da psicologia da religido no seu esforgo em compreender a fé, No esclarecimento do significado da fécristi, tudo gira em tomo daqucla relagio com Deus definida cabalmente pela auto-revelagio ativa de Deus. A psicologia da religito ocupa-se exclusivamente do “sujeito religio- 0”, a6 passo que a teologia sistematica trata de “uma relagio”, na qual o fator docisivo € a revelacdo de Deuss. 0 esforgo da teologia em “compreender a f€ dove-se ditigirem primeiro lugard compreensiio do contetico da tevelagio divi- ni, 2 interpretagio do significado do contexto revelador, cujo centro & Cristo. ©) ASE crista “ecuménica”: a teologia sistematica ea simbélica propésito da teologia sistemitica é investigare esclarecer a conteiidoe ‘significado da fé erista, Esse objetivo seria falseado e restringido se a teolo- viel Sehlctennin bis, Bereich Canby, p. AS Fes Tunoota u gia sistemitica tomasse como ponto de partida uma conceituagio denomina~ cional ou confessional da fé considerada como dada de wma vor para sempre, ou se se deixasse limitar por essa conceituagio. A teologia sistemstica no pode considerar axiomitico que uma certa confissio represente, em todos 6 aspectos, aquilo que & perfeita e genuinamente cristo. Se assim o fizesse, sua tarefa resumir-se-ia em reproduzir, ordenar e definir douttinas jit antes apresentadas num determinado conjunto de escritos de carter confessional. Schleiermacher, ao dizer na sua enciclopédia que a fungio da dogmatica € apresentara doutrina aceita em uma certa comunhio eclesistica’, esqucce-se do fato de que a teologia sistemiitica ocupa-se da tarefa de compreender aqui To que é genuinamente cristdo, Acresce ainda que esse enunciado de Schleier- macher contradiz. a assertiva por cle mesmo feita em outros passos de sua obra, a saber, que 0 objeto da teologia no & uma certa “eonsciéncia erista” limitada, individual ou confessional, mas sim “os sentiments eristios em eral” E evidente — e compreende-se por que motivo ~ que um confessionalis- mo estreito ¢ autoritirio tem trazido 8 “dogmatica” uma certa dose de ma reputuciio A teologia sistemitica perderia, sem divida, o cariter cientifico sea sua investigugdo do sentido da f6 cristi fosse de comeco limitada a um concei- to especifico e autorizado em que jf se fornecessem os resultados. Seria mesmo que dizer que os eseritos confessionais sto barreiras dante das quais a pesquisa teol6gica ¢ obrigada a deter-se. A perquirigao da fé crista seria entao determinada por outros objetivos que nao o de compreender, tinico objetivo verdadeiramente cientifieo, Nesse conceito fechado e estreito da funcio da teologia sistemética est, em boa parte, a explicagio do fato de a teologia ter sido suplantada pela “filosofia da religiio” como acima foi meneionado, Diante do confessionalismo estrito, tal “filosofia” pode com Gxito afirmar que a fé crista devia ser encarada de perspectiva mais ampla e que o estudo do cristianismo feito pela “dogmatica” estava de antemio limitado a ccrtas for- nas restritivas que impediam livre exame e tinham de ser defendidas a todo custo, ilustrando ainda essas assertivas por meio da polémica confessional que se seguiu, Havia, sem diivida, fundamento para tas eriticas. O problemaé que urna “filosofia da religito”, examinando a f€ cristi do lado de fora e avaliando-a a partir de pontos de vista que the so estranhos, nfo podia pro- por substitativo adequado. Isto s6 poderia ser feito por uma tealogia siste- mtiea eujo propésito nico fosse aleangar a natureza e 0 significado da prpria (6 erista, “ Piinleich Schlvienmeher, Zor Dursteliog des thealagiseben Studies, 19S, © A Caisrk Gustaf ale Hi lugar, € 6bvio, no estudo teoldgico para a descrigio do conceito de £6 iccito pot uma comunhao eclesidstica especitica, baseada os documentos {idlos por autorizados em tal comunhéo, e também para ineluir no estudo as wirias concepgées porventura existentes dentro da Igreja. Seria um estudo hiist6rico ¢ estatistico, que tocaria & simbélica ou ao estudo da Igreja. Nao se” pode, porém, atribuito a fungi lidima da teologia sistematica. Sob pena de trait a sua Yocugao, a teologia sistemitica nio pode abdicar do direito de exa~ ninar todo e qualquer documento confessional a fim de veriicar em que medi- tla cle expressa o que é genuinamente cristo e nao simplesmente aquilo que & peculiar a uma certa secedo do cristianismo. A teologia sistemitica s6 pode ser confessional na medida em que 0 ele~ ‘onto também confessional contribu para a compreensioe percepeiio do que Gessencialmente cristo. Nao Ihe € dado ser “Iuterana’ ce ser “uterana signi- fica” fundamentar-se em certas afirmativas pelo mero fato de Lutero t&-las feito, Fla s6 pode ser luterana na medica em que Lutero demonstrar ser eapscz le auxiliar a teologia a penetrar mais a fundo no signi tange ao confessionalismo, portanto, o trahalho da teologia sistematica envol- ve continuo auto-exame, algo muito diverso de toda auto-suficiéneia confes- sional ingénua. A tedlogia ndo busea expresses denominacionais do cristia- iismo, mas sim © pr6prio cristianismo autéutico; no reconhece expressdes lenominacionais, a no ser que estas déem provas de serem genuinamente cristis, Seu objetivo ¢ apresentar “a f6 crista ecuménica’. § palavra ecuméni ignifica um grito de alerta contra toda a sorte de confessionalismo fechado to-suficiente. Isso nao significa que a teologia deva produzir uma espécie le stimério de doutrinas comuns a toxlos 0s cristios. Pouco valeria tal esfor- go", Nao ha nisso qualquer referéncia a um tipo de conceituagao universal que tepresente a fé cristd despida de toda expresso denominacional. Assim como ‘nunca hoave uma “religido universal”, também nunca existiu essa espécie de ceistianismo universal ou comum, O problema decisivo 2m relagio a essas ‘expresses diz respeito & qualidade de serem genuinamente cristas, Examina- «udesse ponto de vista, a contribuigdio de Lutero e da Reforma & compreensio «lo cristianismo pode ser avaliada com mais justiga. Devidoao fato de este pon- tude vista ter sido ignorado, o universalismo cristo de Lutero tem sido esque- ido ©-0 proprio Lutero isolado, circunscrito a um confessionalismo estreito. "Ut Sebleionmacher, Zur Darstellung. p. 197: “Tal composigdo parmente irénicu(concilia- "ori evi de tal fons pole indefinid que Ih faltatism nds wstermos rds neces ins prove m8 rccisio na doting de canes, ini nang da oak ei Pre Trovoe s A teologia sistemética consciente da sua fimo c criticamente orientada precisa adotar como programa o que esta implicito na expresso “a f€ cri ecumniea”, a qual em por objetivo a descoberta daquilo que é verdadeira- mente cristio, Se tal nio acontecesse, a teologia “evangeélica” teria de limitar- se i descrigio de uma das vatiantes da concepeio eristi da f6, que se colocaria ao lado de uma série de outras variantes igualmente vélidas, como, por exem- plo, a romana. A teologia sistematica pode ocupar-se de outra coisa além do que & puramente cristio. Para a teologia evangélica, isso no é novidade. A primeira “dogmatica” evangéliea chamou-se, com propriedade, Loci com umes, pois a Reforma no pretendia simplesmente apresentar uma variunte do cristianismo a ser aditada as ji existentes, mas sim expressar, tanto quanto possivel, aquilo que é genuinamente cristao. O principio evangélico da Escri- tura atesta esse fato, Depreendese de tudo isso que a tarefa da pesquisa entregue A teologia sistemalica nio pode ser compfetada com éxito por um tinico tedloge indy dual, Cada estudioso e cada perfodo tém suas limitagées préprias. O alvo da pesquisa é um ideal a que a teologia 86 pode encaminhar-se por meio de inces- sante busca da verdade. Nao quer isso dizer que se deva fazer dessa circuns- ‘incia um axioma que circunsereva o trabalho. Em hipétese alguma pode a teologia desviar a atengio do que & essencial c genuino no eristianismo, ja que este € 0 objetivo tinico da sua tarefa e nao pode ser descurado. f) O cardter cientifico da teologia sistematica Do que até aqui foi exposto, toma-se claro que a fungdo da teologia sis- temitica & de natureza puraments cientifica, pois seu propésito & pesquisar tum objeto definide — a fé crista ~ ¢ eselarecer-the o significado da mancira 'nais inteligivelmente possivel. Essa disciplina, a teologia sistemitica, no #0 tem sido encarada com suspeitas ~ e 0 foi especialmente no sécula XIX = 86 pelos que se dedicam aos estudos cientificos como também pelos que se ocupam da vida espiritual A raziio dessa suspeita, no que tange ao aspecto cientifico, justifica-se neralmente pela fato de se terem aceito como axiométicas certas conceitua- es dat fungi da “dogmética”. Quatro dessas conceituagées devem ser assi- adas, das quais duas ou mais As vezes, aparecem juntas: a exclusivamente ‘sional, a apologética metafisica, a eclesidstica pritica e a puramente shjetiva. Na primeira, © ponto de vista cientifico é dilufdo porque o que é enn mente eri io se identifica com uma confissio especifica. Associam- cont essa idenlificagaio constantemente propdsitos apologétiens. A inten u APE Cais «Gust Ain seria, neste caso, proteger uma confisstio especifiea contida na tradigdo. Na segunda, o caréter cientffico desaparece devido 3 tentativa de apresentar provas “cientificas” da verdade da fe da realidade do seu objeto, coisa cien- tificamente irvealiz4vel. Na terceira o carter cientifico se corrompe porque teologia se toma serva das finalidades préticas da Igreja, ao invés de ser uma investigacio puramente ciontifica. Mesmo Schleiermacher costumava dizer que 0 trabalho da teologia deve ser feito como “servico ao governo da Igre- Ja”, Mesmo que nao seja tomada literalmente, essa frase revela uma fala de conhecimento da fungi da teologia sistematica, falta essa que empana 0 carter cientilico da disciplina, Finalmente, & dbvio que esse carter cientifico G insustentavel se se transfere o exercicio da teologia pira 0 Ambito da confis- sio. A tarefa puramente cientifica se confunde com fungdo pertencente a0 AAmbito da vida cristi. Em face dessas varias conceituagies, ndo 6 de estranhar que se haja alimentado suspeitas de que a teologia sejt algo menos que uma disciplina cientifica. De outro lado, ¢ natural que se tenha tornado suspeita por aqueles que sc interessam pela vida religiosa. [sso sc deve ds veres, & bem verdade, 4 mera intolerincia. No entanto, nio se pode negar que a teologia niio tenha colimado consciente e claraimente a expresso cabal do ponto de vista peculiar & £8. Todavia tem deixado que esse objetivo seja ofuscado por interesses secundlitios e especulacdes metafisieas ‘A situago muda radicalmente quando wologia sistemtica & maneira do presente capitulo. O problema passa a ser, neste €aso, a investiga qo € a elucidagao, por todos os meios possiveis, dessa entidade, dessa reali- dade viva chamada f6 cristi, bem como o exame a anilise do seu contefido e significado. Assim definida e fimitada, « tarefa toma-s2 objeto determinado e necessirio de pesquisa, Nem 0 estudo académico nem a vida religiosa podem pola em xeque. Removem-se dessa forma todos 03 obsticulos a priori & investigagio, Nio se trata de propor alvos demonstraveis que nd podem ser atingidos cientificamente. O estudo € feito simplesmente com o fito de com- preender e elucidar — que & 0 propésito de toda pesquisa académica. Assim a teologia sistemnitica nao sofie a influéncia de escopos secundérios estranhios 3 sua esfera & nocivos 4 natureza cientifica da obra, Como em toda pesquisa cientifica, o rumo ¢ 0 mesmo: objetividade, facticidade Isso nio significa que a teologia sistemitica nao possa servir & vida e a Igreja Crista. S6 pode faz8-lo contudo sob a condi¢ao de que o seu objetivo ientifico nao scja prejudicado e de que a teologia, portanto, desempenhe a sua nig don vineanie & puramente cientifiea. Quando 0 seu propésito se define PeeTiov0s a8 de modo puramente cientifico, sempre so levados em consideragio os inte- esses proprios a vida eristd. A vida religiosa nfo pode apresentar & teologia outra exigencia sendo tentar compreender a f6 tal como ela é de fato. Em prin- cipio, o conflito entre f& ¢ teologia € resalvido por esta definigdo, O problema consiste em compreender a fé, aclaré-la, nio a partirde pontos de vista que Ihe sdo estranhos, que a possam falsear e perverter, mas sim a comecar do seu proprio ponto de vista religioso. Por nio serem cientificas, esto snjeitas ao maldgro todas as investigagées que nao encaram do ponto de vista religioso 0 Probleina do comeco ao fim. Como ja foi dito, em prinefpio o conffito entre £8 © teologia esti resolvido, embora na prética ainda permanega. Se a antitese subsiste & porque o resultado da tarefa cientifica é imperfeito ou entio porque em tudo o que & rotulado de fé cristi merece de fato tal titulo. E possivel ainda que persistam ambos os motives 2, Fil: EXPRESSAO APLICADA A RELACAO CRISTA ENTRE DEUS E 0 HOMEM 2) Definiga protininar do tema ~ Fé €3 expe fava upd & ‘lage onc Deus so hoe A feist cy teot ns Sate tence eno que Devo st lv igo e x pest lagan Da ‘ ‘ esta ago Deus Co sche Tebteag dues ct exes cau 9 etn mp comunticdintnca 1) Fé rveagt divine ~Conesida em temas "rac" pe lacmtarn dao pale ser cocycnia fo ds onto de vita Sabentende qc eam é stp Samide por Deas guvele sa para Devs eee serra Ese ps fanfic gus deus ad, ew Tulsa na evel vn ok sn, cut are dvi er porate vita fo, portano,conetos cosltos Dope Visaaigioay oe arevelagao divina antecede & ft. ee 2) Definigdio pretiminar do termo De acordo com a definigio da fungio da teologia sistematiea por nés wlotada, 0 seu propdsito consiste na elucidacio da fé erist®. Em prinefpio, Irentanto, a palavra “{é" aparece como termo principal. Se a tarefa por exce- ‘encia da teologia sistemstica é a exposigdo da fé crista, segue-se que tal expo- ‘igsio completa € definitiva s6 pode ser feita através da pesquisa global do rsunto. Isso todavia nfo exclui a necessidade de, ao ser encetada a investiga- " procurar definir preliminarmente o termo “fé". A veracidade da definigao «de ser confirmadt posteriormente peta prépria narrative.

Você também pode gostar