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CANTARES Celebracao, poesia e devocao* Caio Fabio D'Aradjo Fitho** A CHAVE HERMENEUTICA Cantares € # expresso mafor da poesia que nasce entre um homem € sua mulher. Isso sem desconsiderarmos toda a gama variada de opgdes interpretativas que olivro oferece. Aliés, ele ¢ visto mais comumente como um texto espiritual de sentido vertical caracterizador das relagSes do homem com a divindade, de Israc} com Javé, do Messias com 0 crente. Desde 0 primeiro século da nossa era comegaram os judeus piedosos a ‘considerar cantares uma alegorin da relacao de Javé com Israel. O rabino Akiva, jéno segundo século, afirmou ser este livro 0 mais santo dos textos da Escritura ¢ de um valor incalculével para Isracl. Isso em razo de que se cria que nele se acha aafimagéo maior da poesia devocional de Israel para com Deus € a legitimagio do amor divino em Favor de Israel Na perspectiva cristé-exegética foi Origenes, especialista em alegorias, (quem comesou a ver no texto de Cantares alusbes 20 amor matuo entre Cristo € Igreja. Na época da Reforma Protestante o livro esteve para ser expurgado do cdinon Sagrado, s6 permanecendo gragas & interferencia de Calvino, que o fez permanecer sob a alegagdo de que se tratava de uma alegoria espiritual. ‘Aelutancia dos reformadores em fazer Cantares permanecer na relaga0.dos liveos inspirados acontecia em razao de ainda estar presente enraizada na perspectiva deles 2 mentalidade cat6lica-medieval anti-sexual ou pelo menos imputadora de um papel pecaminoso 20 sexo. Nonossoséculo, Watchman Nee, oescritor cristao chines, celebrizou-se por seu estilo alegorista, inclusive mediante a belissima exposigdo comentada que fez do "CAntico dos CAnticos", como se auto-intitula o livro de Cantares (1.1). ‘Ao meu ver 6 inquestionavel que o livro de Cantares possa ser visto como alegoria ou, melhor ainda: como parabola. Minha lamentagio € que ele seja visto somente como tal. Para que fique claro © que estou dizendo permitam a confecgao de um gréifico: + Extraido do livto homénimo, editado pela Vinde, com autorizagho da autor. ** Caio Fabio D'Aradjo Filho, pastor presbiteriano em Niter6i, RU, € presidente da Vinde © 4 Asociagho Evangélica Brasileia. Endereco: Caixa postal 100.084 - 24001 Niterdi RJ BTeol., 5(16), agosto/1991 43 REALIDADE CANTARES: A descrigio poética entre um homem € uma mulher equivalencia ALEGORIA DEVOGAO: ‘Amor métuo ene Cristo ¢ a Igreja (Ora a alegorin devocional s6 € verdadeira se ela se basear numa verdade * real; também s6 € utilizével se o fato no qual se inspira for igualmente ulilizével; € $6 € élicamente boa se a realidade tomada como ilustragao for do mesmo modo moral ce pura ‘A W6gica nos conduz & seguinte reflexdo: a alegoria 36 € legitima, tanto ‘comparative quanto morale eticamente, se 0 paradigma, ov seja, 0 padréo, o modelo, for igualmente legitimo, seja comparativa, seja eticamente. 'sso nos leva a inverter o grafico anterior: ALEGORIA DEVOGAO: Amor métuo entce Cristo € @Igreja cequivaléncia REALIDADE CANTARES: A descrigdo poética entre um homem e uma mulher (0 que estou querendo dizer ¢ que se o historico gera a alegoria, ¢ s¢ 0 que 6 fisico engravida aquilo que ¢espiritual, entdo & porque 0 histérico e 0 corpo-fisico “a BTeol,, (16) agosto/1991 em al caso esto revestidos de dignidadee devocionalidade. por isso que desta vez ‘oct va ler® um material sobre Cantares que no ignord a dimensBo horizontal da felagdo existenten0 ex. Em Canares, portanto, ha duas rela: Relugio 2: Vertical Deus Devogio, Providencia Amorosa Igreja No entanto, ainda que Cantares se apresentasse apenas na relagao 1, ele -mereceria estar no cAnon, pois o amor entre umm homem © sua mulher pode € deve ser visto como expresso de santidade v objeto de uma revelagdo especttica de Deus ‘quanto A sua poesia e pratice (Quando voce estiver lendo as simples c singelas reflexdes que seguirdo este intr6ito, tena em considerago algumas coisas bisicas: Primeira: O objetivo do livre. Meu objetivo € colocar voc? diante de um idea}, Lembre-se: de um ideal. Eu pessoalmente no sou diapasdo afinado diante da hharmonis da sinfonia do amor no "CAntico dos Canticos", mas € pela sua melodia © notas que estou tentando afinar a minha orquestra conjugal ‘Segunda: O meio de compreensao. Leia 0 livro como poesia pura, em voz alta, ¢ deixe sua imaginagio voliar no tempo © mergulhar nas Aguas profundas da encantagio do amor. ‘Terceira: A atitude, Enquanto estou escrevendo esta introdugao, antes de adentrar 0 véu do amor, nas paginas de Cantares, sinto-me cheio de temor e tremor, percebendo que estou diante da terra Santa. Parece esiranho, mas Cantares, mesmo ‘hos seus momentos mais {ntimos, tem que set lido como conto de santidade © poesia da pureza conjugal. Isso porque o amor conjugal dos cristaos deve também ser devoyao # Deus entre um homem e sua mulier. Deve ser liturgia do culto conjugal, * Recorde-se o Isitor que aqui est reproduzida apenss @ part inital do live. BTeol., 5(16), agosto 1991 oi ‘no santo altar do teilo, na aferenda de corpos grats ¢ eniregucs um 20 outro sem egofsmo, na dang ritual do amor edo prazer, em meio & melodia da respiragB0 feliz, 1 ideal de geratalegeia e Dem estar no oso. Se ea ndo pudesse encarar desse modo 0 proprio ato conjugal. de doas ev «scolherit uma apgéo- on tomiat-mc-ia celibate ob eonsiderarin mev eto fog a santidade, sempre que (ocasse em minha esposa. Mas quero viver vid com a perspectiva daquole que dive: “Etude quanto fizerdes,fazeio para a gic de Deus" (Co 10.31). E por essa razB0 que resol chamar a esse tbalho de “Cantares: celebragio, poesie e dev Meu desejo mais sinoero, poranto, ¢ cane, sem desmerecer os esfongos de outeas ao pass, para que 0 "Chntico dos Cantos" sea a cangto de muitos dos meus rm © tds eases, Todavia, deve fiear também claro, que o presente texto fo €,néo pretends. mesmo no petin serum cextoespecializade no assunto, Muito mais em fanggo das minhas propre liitagies no capo da erudigao, do que pet falta de descjo de que 0 mesino 0 fosse. UMA BREVE PERSPECTIVA DE ALTERNATIVAS HISTORICAS A INTERPREEAGAO DE CANTARES: Quando pensei em escrever sobre o Camco dos Canticos, 0 fiz com 0 desejo ‘de que o mesmo fosse um texto dos mais simples, desprovido de todos aqueles jargoes exegelicos € téenices, com as frequentes notas de rodapé, que castumam caracterizar 0s comentirjos bjblicos. Todavia, mesmo mantendo intactas minhus intengGes origi ‘ais -afinal, nem eu sou um erudio € nem o livro se destina a eles- Concluf que seria lil a0 pablico Teigo um mfaimo de orieniagio @ respeito daquelas que perspectivas hasicas pelas quais se vé 0 liveo de Cantar, A+ E encontro na vinha, 1A. Ironside imaginava assim a confecgio do poema: O Rei Salomdo tina um viniiedo na zona montanhosade Efraim, a uns 8O km ao Norte de Jerusalém (8.11). Para Cuidar do viniedo ele contratouarrendatérios (8.11), compostos por uma muiher, dois filios (1.6) eas filhas: asulam ita ea sua iemézinha (6,13). A Sulamita cre abela a famifia, ainda que passasse desapereebida (1.5). Seus imfos talvez fossem apenas filhos de sua me (1.6). Sobre a Sulamita recufam grandes responsabilidades que Ihe «ram impostus pelos irmaos, Por issonio Ihe sobrava quase nenhum tempo para trata pessoal (1.6). Seu cuidado com a vinha era dioturno ¢ indémito (2.15). Também cuidava de rebanhes nas “horas vagas” do dia (1.8). Por estar Wo exposte ao sol bronzeou-se demais ¢ machucou a pele (1.5). Num certo dia chegou 20 vinhedo um forasteiro elegante ¢ bonito. Era ‘Salomfo, desfigurado para ndo ser reconhecido. Demonstrou interesse pela jovem vinhateira, que se sentiu incomodada por julgar que seu aspecto pessoal esiava feio (1.6). Ela, no entanto, tomou o forasteiro por um pastor de ovelhas, ¢ perguntou-the ‘onde estava 0 seu rebanho (1.7), Ele the respondeu com evasivas (1.8), porém, 20 46 BTeol., 5(16) agosto/1991 mesmo tempo, Ihe falou palavras de amor (1.8-10). Prometeu-the também que no futuro the traria presentes ear0s (1.11). Saloméo encantou 0 coragio da jovem e Ihe prometeu que um dia volaria. De noite ela sonhava com ele e em certs Ocasioes ela «tia que ele estava voltando (3.1), Finalmente, um dia, ele voliou com todo 0 seu ajestoso esplendo para fazé-Ia Sua esposa (3.6-7). Se essa interpretaciohistéricaesté correta, nto hf gpenas dois personagens ‘entra na hist6ria: Salomdo ea Sutamita. Aiém disso, a narrativa supra serve apens para explicar 0 contexto histérico de um lergo do livro, pois para sua montagern em 3.6-7. No entanto, justamente dat em dante que se desenrolam os principais poemas ‘conjugais, Noda invalida tal interpretayso his6rica, desde que se pertita que o livro pecanesa aberto, a fim de que seja mais do que um ensaio sobre o namoro, porém uma descrigSo do namoro (até 3.6-7) € do easamento, no desentolar poéticn, até 20 final dos Cinticos 2. O rico eo pobre disputando o coruydo de uma mulher Heinrich Ewald (1826) afirmava que s80 tr€s os personagens bisicos en- volvides no CAntico das Canticas: Salomao, @ Sulamita e um pastor de ovelhas. Ewald interpretou “o amado" como um pastor de ovelhas pelo qual a Sulamita era apaixonaca ede quem estavs noiva, antes de ser caplurada levada para © palécio por um dos servos de Selomio, Depois dela ter resistido a todas as tentativas {que 0 Rei fez a fim de conquisté-a, ¢feita livre € retorna ao seu amante, com quem cla aparece na cena final ‘Os que Iéem o tivto desta forma dividem-no numa sequtneia mais ou menos assim: * A jovem relembra 0 seu amado (1.2.3). * Peide que ele logoa leve de volta, pois 0 Rei a introduriu nay sedugoes da corte (1.4) Suas recordagées acerca do amaxio a perturbam (1.7). * Na luta por conquist4-Ia 0 Rei tenta seduzi-la com j6ias (1.11) € perfumes (1.12). Mas ela prefere o cheiro do campo que héino corpo de seu amado (t.13,14). Ela se recorda de uma visita feita pelo seu amado ede um sono que se Seguiu a 150 (2.8- 3.5). Depois disso ela é novamente visitada e louvada por Salomao (3.6-4.7). Imper- {urbével, a jovem relembra.as palavras de seu amado e antecipa seu dia de casamento com ele (4.8-5.1), Nesta expectativa sua mente fica impregnada com as lembrangas {do seu amado. Por isso, ela sonha com ele € 0 descreve (5.2-6.3). Nesse fnterim ela recebe mais uma visita de Salomdo, que tenta conguistar 0 seu amor (6.4-7.9). Ela, n0 centanto, mantendo sua fidelidade ao jovem pastor, resiste is tentativas do Rei (7.10- 8.3). Depois disso Salomto a liberia verificanda ser impossivel conquistar-Ihe coragfo (8.4-14). Pessoalmente sou seduzido a accitar esta interpretagio. Iss0 porque essa maneira de ver as coisas descreve um amor que nao se deixa domesticar, Tal historia seria digna de figurar como um texto sagraco. No enlanto, néo posso aceilar essa interpretagio hist6rica do texto pelas seguintes razdes: 1 Aceité-la implica em negar a autoria de Salomao -pois © Rei no BTeol., 5(16), agosto/1991 a7 desereveria de si mesmo tal fracasso. E a auioria de Salomto € uma afirmagzo antiquissima, antono judatsmo como no cristianismo. Alig, até ue Ewald montasse 2 sua perspectiva (1826), ndo se coahecia oucainierpretagto. Acho temerério nega ‘mais de dois mil anos de histéria por causa de uma bela montagem textual. Ademais, antares se prestatarabém para otras montagens histéricas convenientes. Espago € ‘que ndo faltaem meio hetereidade da poesia. €fécil conduzir um texto pottico em ultas diregces opostas. 2- Acei-latambém signiticariaesquecer intimeros outros aspectes do texo que se embviem perfeitamente bem, purse simplesmente, o amor de Saioméo e da Sulamit No nosso singelo ¢ nao exwustive comentério de Cantares, voce perceberd {que ndo aos preocupames erm fazer uma leitura historica sequenciada do texto. Nem sei se esse foi 0 objetivo do escritor de Cantares quando 0 compés. Minha dnica preocupaga0 foi a de fazer una Jeitura fenomenolégica dos sentimeaos e motivagies implicadas nu poesia, a pantr da pressuposigio iradicional de que se tratava de uma descrigio do sinor de Salomao-e éa Sulamit (Caso voce va fazer uma leitura baseada na critica literiria, seja qual for a sua 6tica interpretativa, este trabalho Ihe ofereceré muitos “panos para as mangas", em relagao ao modo leigo mediante 0 qual ele se apresenta, Todavi, se voct ler 0 livro com a 6tica fenomenol6gica, perecberd que nele thf material que pode ser muito dtil A compreenstio do estado febril do amor que nasce centre um homem e uma mulher, bem come do ideal sublime que nele se encerta. ‘Aopgto ésua. Voce pode portar se diante deste livro como um cirurgiiocom tum bisturi na mao, ansioso por encontrar enfermidades; ou como um garo1o com um sorvele na indo, 4vido por mergulhar no seu Sabor, Ev tenho certeza de que sua(eu) ccompanheita(o) preferira que voce foga a segunda opgao. AFORGA DO AMOR © livro de Cantares nao exalta 0 umor como virtude sublime. Sem divida 0 amor € mais sublime de todas xs virtudes, mas quem quer meditar nee como tal deve ler outros textos, nfo Cantares. Quem sabe @ sinfonia de Paulo em 1 Corfntios 13.4.8: ‘O1amor € paciente, é benign, o amor no arde em citimes, nfo se ufana, no se ensoberbece, no se conduz incovenientemente, ndo procura os seus interesses,ndose exaspera, ndose recente da mal; alse alegra com ainjustica, mas regorija-se com a verdad; tudo softe, tudo cré, tudo espera, tudo suporta, Oaamor jamais acaba; mas, havendo profecias, desaparecer’o; havendo linguas, cessard0, havendo ciéncia, passard (..) Nao estou dizendo que no Canton dos Cfnticos no haja expressao dessa svblimidade, Aocontrio, osublime est presente no live mas nfo € um Sublime que sublima, que se projeta para o imagindrio, para o ut6pico-abstrao. um sublime no 4B BTeo., 5(16) agosto/1991 expo, no sangue, nos Lébies, na pele, na voz, ena amizade do homem e da mother. E um sublime aqui e agora, ma historia cheia de ambiguidodes e contradigoes, E um sublime apaixanado ao inves de fraternal, como € 0 caso de 1 Corfatios 13. E nesse sentido que Cantares nfo exalta © amor como virtude sublime, conquanto 0 exalte como uma espécie de sublime em imanéncia e nfo em wranscendéncia, Em Cantares, a transcendéncia do.amor ¢ ser imanente no corpo, na ulma e na trama da alegria dos hojuges. Por isso, nfo fique esperando encontrar grandes conceituagies de amor no livro, Os amantes de Cantaresnio filosofam nem conceituam oamor. Apenas deixam sedominar por ele, permitem-se inebriar peloseu cheirocentregam-sesem resistencia asua magia. O amor no &definitivo em Cantares, apenas, ds vezes, comparado 2quilo que df gosto. poesia 2 vide: + "€ methor gue o vinho" (1.20) + "Do teu amor nos lembruremios mais do que do vinho, no ésem razo que se amam” (1.40) Ainal, 60 vinbo que alegra o eoragio do homem ¢ 6a mulher” (S1 104.152). E 0 zmor conjugal deve ser um banguete de almas, uma celebragio de alegria pela preval€ncia de dois seres sobre o egoismo, indOmito adversério dagueles que desejum Ntonos ¢esiranh ques linguagem do amor sja comparativa em rlagio-ao vino, pois ¢ também ele 0 vinho) que deve ser oferecido "aos que perecem (..) 20s amargurados de espiit; para que bebem,e se esquogam da suz pobreza, e Je su fadigas ato se lembcem mais” (Pv 31.6) Pois que realdade fez esquecet mais eficazmente o infortnio que o amor? € dante dele que a pobreza e a amargura sto esquecidus pelo curto-eterno espago Go amor. Nocurtespagode amar, octern oSem-fim, se fz presente. Na linguagem 4 Carlos Drummond de Andtade: “0 mundo € grande, ¢ cabe nessa jancla sobre o mar; ‘o mar € grande ¢ cabe na cama e no coTchao de amar; ‘© amor € grande € cabe no breve espago de beijar.” No amor, 0 total invade 0 parcial, 0 eterno invade © temporal, 0 jubilo conquista a tristeza, o prazer vence 0 desconforto ¢ a pobreza, a gratidio faz esquecer 2 facigas. Em Cantares © amor aparece com 0 fmpeto do desmaio, da perda dos sentidos, chega com a veeméncie da fragueza que domina o corpo e a alma, az consigo a forga da rendigho: "Sustentai-me com passas, confortai-me com mags, pois desfalego de amor" (25). Diante do amor, 0 egofsmo fica tomado de ancimia, © orguiho deixa de foferecer resistencia, ¢ 0 corpo dominado pela impoténcia mio consegue esbogar reagio de rejeigdo. Por isso os apaixonados sao fracos. Em Cantares 0 amor no & chamado de grande ou majestoso ou sacrificial, mas de belo. Trata-se de um BTeol., 5(16), agosto/1991 ”o sentiment lindo, fascinante: *Que belo é otev amor, 6 minha ima, noiva minha!” (3.10) Esse amor pode e deve ser belo porque se inspira no amor rasgato, partido, modo, usado e ensangientado daquele que por nds se deu * Mas Deus prova o Seu prdprioamor para conosco, pelo fato de ter Cristo morro por n6s, endo nés ainda pecadores" (Rm 5.8). © amor no Ctitico des CAnticos €readigio assumidae divulgads, € estado de entrega declarado, 6 vertigem das forgas fia da razéo ante oexército avassalador da paixto que sitia 0 coragio, despotizando-o, enfraquecendo-o nas Suas Préprias possibilidades de dizer nfo aquele que 0 domina *Conjuro-v0s, 6 flhas de Jerusalém, se enconirardes 0 meu amido, que ie dieis? Que desfalego de amor" (5.8), "No contexto do "Cantico dos Canticos" o amor tem paler, tem sabor, tem tempero, € apstitoso, inspirador de prazer: Quito Formosa, e quao aprazivel és, 6 amor em delicias” (7.6). Novatanto,nem s6 de cheio, gosto, alegri, prézere vantajosarendigio vive ‘amor. Em Cantares esse amor € também luta, combate, guerra e morte. £ amor que enfrenta a propria possibilicede de morrer. Em Cristo, o amor fi mais forte do que ‘morte, porque tanto por amor eie enfrentou a morte, como também por amor dea ressuscitou (Rm 4.24-25), Mas no nosso livro de aeigées ede extasiamentas entre um homem e sus mulher, como pode o amor se forte como a morte? *0 amor é forte como a morte” (8.6). ‘A equivaencia da Torga do amor em reiagéo & morte, no cotidiano apaixo- nado de Join scres huntanos, marido e mulher. ndoesté nem na sua Tongeviade, nem na sa prevaléncia sobre o fato da morte. std, sim, na determinagaa iremovivel, inufastavel € inexordvel de ambos caminhurem na procara © na promacio da Felicidade. O amor é forte como a morte porque quem morce por amor enfrentou cara Acar morte prevaiecey, Peede na ut conicas morte, nfo quem morre, mas quem foge dele. No entanto, lteralmentefalando, o texto estéaludingo & invencibilidade ordinariada morte. £ uma manwira comparativade dizer: o amor éinvencivel, jamais acaba, E forte eomo a morte porque ela sempre vem de antemao vilorioss. (© amor € fore como a morte quanto a vida € um dar da vida pelo outro, especialmente 6 oviro-eu, 0 cinjuge, minna carne noviro corpo aié a morte. Deve set cm razho desse poder trivnfantc-¢conquistador do amorque em Cantares srcpete um fascinante esti “Conjuro-vos, 6 filhas de Jerusalém, aque no acorceis nem despereis 0 amor, alé que este 0 queira® (4) Quando o amor chega, a sua forga se instaura nos seus conquistados de tal forma que a prépria personalidade, temperamento sao parcialmente alteracs: “Conjuro-vos, 6 filhas de Jerusalém, so BTeok, §(16) agosto/1991 pelas gavelas e cervas do campo, gue no desperteis 0 amor, até que este 0 queira” (2.7; 3.5). ‘Gazelas € cervas so animais conhecidos na poesia oriental por sua timidez erecato. Assim € oamor:é,ele faz com que até 08 imidos se declarem, ¢ os recatados ‘se aventurem para além dos limites de suas esieita fronteiras de expressbes. Se voce tem davida do que estou afirmando, entdo € $6 imaginar, ov melhor, lembrar como ficam a apaixonados: falantes, desinibidos, soltos, livres, Soprados pela brisa da poesia, encantados, ‘Mas 0 esinibilho do silencio e das aches caulelosas, para que nfo se acorde 0 amor de seu sono, deseu inverno nasilma,de Sev leto desasego, visa revelor também esta outea verdade: Tena cuidado pare no provocar aquilo que pode Se tornar irveprimivel ‘Talcautelarefere-se aqueles que ainda néo foram alingios pels forga mortal « paradoxalmente vivificadora do amor. E por isso que € a mulher casada quem diz as ‘amigas solteiras: *Conjuro-vos;6 filha de Jerusalém, pelas azelas e cervas do campo ue nto acordels nem desperteis 0 amor, até que este 0 queira’. ‘Amar é mais que ser feliz; 6 perder 0 direito 8 anto-feicidade em favor 60 ‘outro; € ser feliz na felicidade promovida para o cOnjuge; € realizar-e realizando; € ‘completar-se completando; € beber 0 refluxo do nosso préprio fluxo abengoador; é vida entregue e repartida com 0 ob eto-humano de nossa caminhadsa ‘Mas o esiranho € que esse amor que sed, que se entrega, que conquista ese eixa conquistaré, paradoxalmente, pleno de aulo-estima e dignidade. Seu padriio & clevadissimo. Sua ética de entrega determina que ele nao negocia com coisa alguma. Ele se coloca acima de riqueza, suborno, jogo de interesses: “ainda que alguém desse todos os bens da sua casa pelo amor, seria

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