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A Matemática é uma ciência dedutiva, todos os fatos são provados. Por exemplo, apesar de
Pitágoras ter vivido em torno do ano 500 AC, o fato anunciado por ele já era conhecido dos
babilônios, cerca de 1500 anos antes. Por que então ele é conhecido como Teorema de Pitágoras?
Porque no tempo dos babilônios, isso era um fato conhecido experimentalmente. Não passava
à cabeça das pessoas a ideia de que algo assim pudesse ser provado. Bem mais tarde, entre
os gregos, a Matemática passou a ter a caracterı́stica que tem hoje de ciência dedutiva. Na
Matemática dos últimos 2000 anos a questão da prova ou demonstração passou a ocupar a
posição central. O objetivo deste capı́tulo é o de estudar alguns dos principais métodos de
prova.
Prova direta
É quando os argumentos são apresentados em forma direta. Os exemplos abaixo servem para
dar uma ideia melhor sobre em que consiste este tipo de demonstração.
Exemplo 1. Teorema. Se x > y, onde x e y são números reais positivos, então x2 > y 2 .
Observação: Mais precisamente, este teorema afirma
Demonstração: Vamos usar uma seguinte propriedade básica dos números reais, que diz que
Como x > y e x > 0, então x2 > xy. Também de x > y e y > 0, segue que xy > y 2 . Portanto
x2 > xy e xy > y 2 . Logo x2 > y 2 .
O sı́mbolo não é obrigatório, mas ajuda a sinalizar onde termina uma demonstração.
Exemplo 2. Começamos lembrando algumas definições.
Dados a, b ∈ Z, com b > 0, podemos fazer a divisão com resto de a por b. Existem e são únicos
q ∈ Z, chamado quociente, e r ∈ Z, chamado resto, tais que a = qb + r e 0 ≤ r < b. Por
exemplo, dados a = 27 e b = 4, então q = 6 e r = 3, 27 = 6 · 4 + 3.
[ ]
Em particular, para b = 2, temos que (∀a ∈ Z)(∃!r ∈ Z) (a = q · 2 + r) ∧ (r = 0 ∨ r = 1) .
Dizemos que a é um número par se r = 0 e que a é um número ı́mpar se r = 1. Portanto, um
inteiro a ∈ Z é par se (∃k ∈ Z)(n = 2k). Um inteiro a ∈ Z é ı́mpar se (∃k ∈ Z)(a = 2k + 1).
Portanto, todo inteiro é par ou ı́mpar, mas não as duas coisas.
Observação. O teorema acima é uma afirmação do tipo (∀x)(P (x) → Q(x). O método de
prova consistiu em considerar um x qualquer no domı́nio da variável, supor P (x) verdadeiro
e mostrar que Q(x) também deve ser verdadeiro. Ou seja, eliminamos a possibilidade V − F
para os valores lógicos. Isto prova que P (x) → Q(x) é verdadeiro. Este é o método de prova
direta.
2
Demonstração: (Por contraposição) Vamos mostrar que (∀n ∈ Z)(3n+2 ı́mpar → n ı́mpar).
A contrapositiva é (∀n ∈ Z)(n par → 3n + 2 par).
Suponhamos que n ∈ Z seja par. Segue que (∃k ∈ Z)(n = 2k). Logo 3n+2 = 6k+2 = 2(3k+1),
isto é, existe r = 3k + 1 ∈ Z tal que 3n + 2 = 2r. Logo 3n + 2 é par.
Exemplo 2 – Teorema. Se o produto de dois inteiros for ı́mpar, então ambos os fatores são
ı́mpares.
Demonstração: (Por contraposição)
( )
Queremos provar que (∀n ∈ Z)(∀m ∈ Z) nm ı́mpar → (n ı́mpar ∧ m ı́mpar) .
A demonstração por contraposição consiste em mostrar que
( )
(∀n ∈ Z)(∀m ∈ Z) (n par ∨ m par) → nm par .
Sejam n, m ∈ Z. Suponhamos que n par ∨ m par. Temos dois casos a considerar.
Caso 1 : n é par.
Neste caso, ∃k ∈ Z tal que n = 2k. Então nm = 2km. Logo nm é par.
Caso 2 : m é par.
Neste caso, ∃k ∈ Z tal que m = 2k. Então nm = 2nk. Logo nm é par.
Logo nos dois casos, nm é par.
Exemplo 3. Como mais um exemplo do método de prova por contraposição, vamos estudar
um teorema que é muito útil para determinar se um número é primo ou composto.
√ √
Teorema. Se n = ab, com a e b inteiros positivos, então a ≤ n ou b ≤ n.
Demonstração:√ Por contraposição,
√ é suficiente mostrar que, para quaisquer a e b inteiros
positivos, (a > n ) ∧ (b > n ) −→ ab = ̸ n.
√ √ √ √
Suponhamos que a e b sejam inteiros com a > n e b > n. Então ab > n · n = n.
Logo ab ̸= n.
3
Prova por absurdo
Se desejarmos provar uma certa proposição p, o método de prova por absurdo consiste em
supor que ¬p seja verdadeira e deduzir daı́ um absurdo. Desse modo concluı́mos que ¬p não
pode ser verdadeira e, portanto, p é verdadeira. Para explicar o método, vamos dar um exemplo.
Começamos lembrando algumas definições. Um número racional é um número que pode ser
3
representado em forma de fração com numerador e denominador inteiros. Por exemplo, é
2
racional. Um dado número racional pode ser representado em forma de fração de mais de uma
maneira. Por exemplo,
3 6 9
= = = ··· .
2 4 6
m
Dizemos que a fração está em forma irredutı́vel se não puder mais ser simplificada, ou seja,
n
se o máximo divisor comum MDC(m, n) for igual a 1.
Uma maneira equivalente é dizer que um número é racional se e somente se sua expansão
decimal for finita ou infinita periódica. Por exemplo,
20371
2.0371 = =⇒ 2.0371 é racional.
10000
Também, se x = 1.5272727 . . . , então 10x = 15.272727 . . . e 1000x = 1527.272727 . . . , de modo
que
1512
1000x − 10x = 1527 − 15 =⇒ 990x = 1512 =⇒ x=
990
1512
e, portanto, x = 1.5272727 . . . = é um número racional.
990
√
Teorema. 2 é irracional.
√
Demonstração: (Por absurdo) Suponhamos que 2 seja racional. Então ∃ m, n ∈ N tais que
√ m
2= e MDC(m, n) = 1
n
(representação em forma de fração irredutı́vel, isto é, uma fração em que já foi simplificado
tudo que podia ser cancelado). Seque que
m2
2=
n2
e, portanto, m2 = 2n2 . Logo m2 é par. Segue que m é par. De fato, se m fosse ı́mpar, então
m2 seria ı́mpar também (vimos que o quadrado de um número ı́mpar é ı́mpar, pois o produto
de ı́mpares é ı́mpar).
Como m é par, temos que ∃k ∈ N tal que m = 2k. Portanto
(2k)2 = 2n2 =⇒ 4k 2 = 2n2 =⇒ 2k 2 = n2 .
Logo n2 é par e, portanto, n é par.
Concluı́mos que m e n são ambos pares, ou seja, 2 é um divisor de m e também de n. Isto
√
é um absurdo, pois MDC(m,
√ n) = 1. O absurdo veio da hipótese que fizemos acima de que 2
fosse racional. Logo 2 é irracional.
4
Exercı́cio 1.
a) Prove que (∀n ∈ N)(3 | n2 −→ 3 | n). Sugestão: contraposição. Por divisão com resto,
∀n ∈ N, ∃q ∈ N0 (quociente) e ∃r ∈ N0 (resto) tais que n = 3q + r e 0 ≤ r ≤ 2. Temos
(r = 0 −→ 3 | n) e [(r = 1 ∨ r = 2) −→ 3 - n]. Então, quando for fazer a contraposição,
da hipótese 3 - n segue que ∃q ∈ N0 tal que n = 3q + 1 ou ∃q ∈ N0 tal que n = 3q + 2.
√ √
b) Prove que 3 é irracional. Sugestão: Siga os mesmos passos da demonstração de que 2
é irracional. Use o item anterior.
√
c) Mostre que 5 é irracional. (Em Matemática, mostrar é sinônimo de provar)
√
d) Mostre que 6 é irracional.
Observação. Uma afirmação qualquer da forma “Para todo x pertencente ao vazio P (x)” é
verdadeira (dizemos que vale por vacuidade), pois para ser falsa teria que ∃x ∈ ∅ tal que ¬P (x).
Exercı́cios 2
1. Prove que a soma de dois números racionais é racional. Que tipo de prova usou?
2. Mostre que a soma de um racional com um irracional é irracional. Que tipo de prova
usou?
3. Mostre com um contraexemplo que é falsa a afirmação “A soma de dois números irracio-
nais é irracional”.
4. Mostre que ∀m, n ∈ Z, se m + n for par, então m e n têm a mesma paridade (isto é, ou
são ambos pares ou são ambos ı́mpares).
5. Prove que pegando 3 meias de uma gaveta que contenha apenas meias azuis e pretas,
conseguiremos um par de meias da mesma cor. Sugestão: Comece justificando que o
problema é equivelnte a provar que
Use contraposição.
5
6. Prove que são equivalentes:
p1 : n é par
p2 : n − 1 é ı́mpar
p3 : n2 é par
Sugestão: Basta mostrar as implicações p2 =⇒ p1 =⇒ p3 =⇒ p2 .
Lembre das definições: n ∈ Z é par se e somente se existe k ∈ Z tal que n = 2k.
n ∈ Z é ı́mpar se e somente se existe k ∈ Z tal que n = 2k + 1.
Caso 2 : n é ı́mpar.
Neste caso ∃k ∈ Z tal que n = 2k+1. Segue que n(n+1) = n(2k+1+1) = n(2k+2) = 2n(k+1).
Logo ∃s = n(k + 1) ∈ Z tal que n(n + 1) = 2s e, portanto, n(n + 1) é par.
Logo, seja qual for o caso n par ou n ı́mpar, a conclusão é a mesma, n(n + 1) é par.
Pelo teorema anterior, k(k + 1) é par. Logo ∃p ∈ Z tal que k(k + 1) = 2p. Portanto n2 = 8p + 1.
Segue que, quando dividimos n2 por 8, o quociente é p e o resto é 1.
6
Neste caso, tomando a desigualdade n ≥ 1 e multiplicando ambos os lados por n (pode pois
n ≥ 0), temos
n ≥ 1 =⇒ n2 ≥ n · 1 = n.
Caso 2 : n = 0.
Neste caso, n2 = 02 = 0 = n ≥ n.
Caso 3 : n ≤ −1.
Neste caso, n2 ≥ 0 ≥ −1 ≥ n.
Logo, em qualquer um dos casos, n2 ≥ n.
7
Seja n ∈ N0 qualquer. Vamos mostrar que existem seis possibilidades para o algarismo final
de n2 , 0, 1, 4, 5, 6 ou 9. Temos os seguintes casos a considerar.
Caso 1. n é da forma n = 10k.
Neste caso, n2 = 100k 2 = 10 × 10k 2 é múltiplo de 10. Logo o algarismo final de n2 é 0.
Caso 2. n é da forma n = 10k ± 1.
Neste caso, n2 = 100k 2 ± 20k + 1 = 10 × (10k 2 ± 2k) + 1 é um múltiplo de 10 mais 1. Logo o
algarismo final de n2 é 1.
Caso 3. n é da forma n = 10k ± 2.
Neste caso, n2 = 100k 2 ± 40k + 4 = 10 × (10k 2 ± 4k) + 4 é um múltiplo de 10 mais 4. Logo o
algarismo final de n2 é 4.
Caso 4. n é da forma n = 10k ± 3.
Neste caso, n2 = 100k 2 ± 60k + 9 = 10 × (10k 2 ± 6k) + 9 é um múltiplo de 10 mais 9. Logo o
algarismo final de n2 é 9.
Caso 5. n é da forma n = 10k ± 4.
Neste caso, n2 = 100k 2 ± 80k + 16 = 100k 2 ± 80k + 10 + 6 = 10 × (10k 2 ± 8k + 1) + 6 é um
múltiplo de 10 mais 6. Logo o algarismo final de n2 é 6.
Caso 6. n é da forma n = 10k + 5.
Neste caso, n2 = 100k 2 + 100k + 25 = 100k 2 + 100k + 20 + 5 = 10 × (10k 2 + 10k + 2) + 5 é um
múltiplo de 10 mais 5. Logo o algarismo final de n2 é 5.
8
A partir daı́ só aparece o número 1.
Dentre os números citados acima, os únicos consecutivos são 8 e 9.
Sn = 1 + 3 + 5 + · · · + (2n − 1)
n Sn n Sn
1 1 6 1 + 3 + 5 + · · · + 11 = 36
2 1+3=4 7 1 + 3 + 5 + · · · + 13 = 49
3 1+3+5=9 8 1 + 3 + 5 + · · · + 15 = 64
4 1 + 3 + 5 + 7 = 16 9 1 + 3 + 5 + · · · + 17 = 81
5 1 + 3 + · · · + 9 = 25 10 1 + 3 + 5 + · · · + 19 = 100
Observando a tabela acima, chama a atenção o fato que os resultados obtidos são quadrados
perfeitos: 1 = 12 , 4 = 22 , 9 = 32 , 16 = 42 , . . .
Agora que já temos nossa conjectura, passamos à fase de provar que nossa conjectura é
verdadeira. Para isto usaremos a indução matemática. A demonstração de que uma determi-
nada propriedade é verdadeira para qualquer número natural n, pode ser feita em duas etapas
independentes:
b) Verificar que se a propriedade valer para um certo número natural n, então a propriedade
vale também para o número seguinte n + 1.
Voltemos à proposição
1 + 3 + 5 + · · · + (2n − 1) = n2 .
Note que o menor n para o qual nossa proposição faz sentido é n = 1. Vamos provar por
indução que ela vale para qualquer n ≥ 1. Como explicado acima, a demonstração se dá em
duas etapas, usualmente chamadas de base de indução e passagem de indução, respectivamente.
9
Base de indução: Verificar que vale para n = 1. No caso de n = 1, nossa proposição afirma
que 1 = 12 , que é verdadeira.
7 128 49
2n > n2 =⇒ 2 · 2n > 2n2 =⇒ 2n+1 > n2 + n2 . (∗)
8 256 64
Acontece que, como n ≥ 5, então n2 > 2n + 1. De fato, se
9 512 81 n ≥ 5, multiplicando por n obtemos
10 1024 100 n2 ≥ 5n = 2n + 3n ≥ 2n + 15,
pois n ≥ 5 =⇒ 3n ≥ 15 (basta multiplicar por 3 > 0).
Como 15 > 1, somando 2n obtemos 2n + 15 ≥ 2n + 1. Logo, pela propriedade transitiva da
desigualdade, n2 > 2n + 1.
Somando n2 a ambos os lados da última desigualdade, obtemos n2 + n2 > n2 + 2n + 1 =
(n + 1)2 . Voltando para (∗) e usando a transitividade, obtemos 2n+1 > (n + 1)2 . Segue que se
2n > n2 para um certo n ≥ 5, então 2n+1 > (n + 1)2 , concluindo a passagem de indução. Fica
assim provado que P (n) vale para todo número natural n ≥ 5.
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Obs: A transitividade mencionada no parágrafo
( acima é a propriedade
)
(∀a)(∀b)(∀c) (a > b) ∧ (b > c) → a > c .
( )
Exemplo 3. (∀n ∈ N0 ) 8 | (25n − 1) . Vamos provar essa propriedade por indução.
Base de indução: Vale para n = 0.
De fato, para n = 0, temos 25n − 1 = 250 − 1 = 1 − 1 = 0 e 8 | 0.
Passagem de indução: Suponhamos que para algum n ∈ N0 , 8 | (25n − 1). Vamos mostrar que
então 8 | (25n+1 − 1).
Nossa hipótese de indução de que 8 | (25n − 1) implica que (∃k ∈ Z)(25n − 1 = 8k), ou seja,
25n = 8k + 1. Logo
Segue que (∃c = 25k + 3 ∈ Z)(25n+1 − 1 = 8c), isto é, 8 | (25n+1 − 1).
( )
Logo (∀n ∈ N0 ) 8 | (25n − 1) .
Observação. Os exemplos acima mostram que a indução matemática não é um método para
descobrir fatos em Matemática, e sim uma técnica de demonstrar esses fatos. Nos exemplos
vistos, por outros métodos fomos levados a fazer uma conjectura. A indução matemática nos
possibilitou provar que nossa conjectura era verdadeira. Em outras palavras, se já temos um
forte indı́cio de que uma certa propriedade possa ser verdadeira, podemos então usar a técnica
da indução para tentar prová-la. Pode também acontecer que já saibamos que uma certa
propriedade é verdadeira e já tenhamos até uma demonstração para ela, mas desejamos obter
uma demonstração diferente (por exemplo, para explicar para uma pessoa que ainda não tenha
os pré-requisitos necessários para entender a demonstração já conhecida). Podemos, então,
tentar obter uma demonstração por indução para nossa propriedade.
Finalmente, o método de indução serve para provar propriedades envolvendo números na-
turais, não pode ser usado para provar proposições envolvendo outros tipos de objetos ma-
temáticos. Por exemplo, o método de indução não pode ser aplicado para provar o teorema que
diz que a soma dos ângulos internos de um triângulo é 180 graus.
Divisibilidade
Vamos aplicar os métodos de prova estudados acima ao estudo da noção de divisibilidade de
inteiros, que será muito útil ao longo do semestre.
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– (∀n ∈ Z)( 1 | n), pois ∃c = n tal que 1 · c = n.
– (∀n ∈ Z∗ )( n | n), pois ∃c = 1 tal que n · c = n · 1 = n.
– (∀a ∈ Z)(a ̸= 0 −→ a | 0, pois ∃c = 0 tal que ac = 0.
Temos a | b quando a equação ax = b tem uma solução inteira. Se a = 0, então a equação ax = b
será 0 · x = b e não terá solução, a menos que b seja 0. Por isto não se define divisibilidade
por 0.
Cuidado! Não devemos confundir o sı́mbolo | com o traço de fração.
Notação. Escreveremos a - b para indicar que a não divide b, ou seja,
a - b ⇐⇒ ¬(a | b).
Exemplo. 3 - 14.
De fato, (∀c ∈ N)(3c ̸= 14). Isto pode ser mostrado dividindo em dois casos.
Se c ≤ 4, então 3c ≤ 3 · 4 = 12 < 14 =⇒ 3c ̸= 14.
Se c > 4, então c ≥ 5 =⇒ 3c ≥ 3 · 5 = 15 > 14 =⇒ 3c ̸= 14.
Em qualquer um dos casos, para qualquer c ∈ N, 3c ̸= 14. Logo 3 - 14.
Notação. Z∗ = {a ∈ Z | a ̸= 0}.
( [ ])
4. (∀a ∈ Z)(∀b ∈ Z)(∀c ∈ Z) (a ̸= 0) ∧ a | (b + c) −→ a | b ←→ a | c .
a ̸= 0, a | b, a | c,
e sejam x, y ∈ Z quaisquer.
12
Então existem r, s ∈ Z tais que
ar = b ∧ as = c.
Segue que
arx = bx ∧ asy = cy
e, portanto,
a(rx + sy) = arx + asy = bx + cy.
Então ∃u = rx + sy ∈ Z tal que au = bx + cy.
Logo a | (bx + cy).
(⇐=) Análogo.
(i) a = bq + r
(ii) 0 ≤ r < b.
Este é um dos teoremas mais importantes da Aritmética. A demonstração dele será vista mais
adiante, mas já vamos começar a usá-lo. É a divisão que usamos desde o ensino fundamental.
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d é um divisor comum de a e b se d | a e d | b. Denotamos o conjunto de todos os divisores
comuns de a e b por DIV(a, b). Assim, temos
Note que DIV(a, b) ̸= ∅, já que 1 ∈ DIV(a, b), pois 1 | a e 1 | b. Também DIV(a, b) é um
conjunto limitado superiormente, ∀d ∈ DIV(a, b), d ≤ a e d ≤ b e assim d ≤ min{a, b}.
Logo DIV(a, b) possui um maior elemento o maior de todos os divisores comuns de a e b.
Temos ainda que DIV(0) = N, logo
Agora já podemos definir o máximo divisor comum de dois números naturais.
(ii) MDC(a, 1) = 1
(iii) MDC(a, a) = a
(v) a | b ←→ MDC(a, b) = a.
(ii) DIV(a, 1) = {1}, pois DIV(1) = {1} ⊆ DIV(a), já que 1 | a. Logo MDC(a, 1) = 1.
Demonstração: Basta mostrar que DIV(a, b − na) = DIV(a, b). Vamos mostrar que os dois
conjuntos contêm os mesmos elementos.
14
Seja t ∈ DIV(a, b). Então t | a e t | b. De t | a segue, pelas propriedades da divisibilidade
estudadas acima, que t | na, ∀n ∈ N. Como t | b e t | na, temos que t | (b − na). Assim,
t ∈ DIV(a, b − na).
O Lema de Euclides permite muito mais do que calcular o máximo divisor comum. No
exemplo acima, isolando os restos, temos
16 = 60 − 44
12 = 44 − 2 · 16
4 = 16 − 12
Depois disto, começamos a substituir uma igualdade na outra, começando de baixo para cima
(é importante fazer as substituições uma de cada vez, sem querer ganhar tempo, para não
embolar tudo)
4 = 16 − 12
= 16 − (44 − 2 · 16) = 3 · 16 − 44
= 3 · (60 − 44) − 44 = 3 · 60 − 4 · 44
Logo MDC(60, 44) = 4 = 3 · 60 + (−4) · 44.
Assim, dados a, b ∈ N, empregando o Lema de Euclides, temos um algoritmo que não só nos
permite obter o máximo divisor comum d = MDC(a, b) de a e b como ainda expressá-lo como
uma “combinação linear” d = α · a + β · b, com coeficientes inteiros α e β de sinais opostos.
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Se r1 = 0, já temos o máximo divisor comum, pois neste caso MDC(a, b) = MDC(a, 0) = a.
Se r1 ̸= 0, continuamos o processo de divisão, dividindo a por r1 . Pelo Algoritmo de Euclides
existem e são únicos q2 , r2 ∈ N0 tais que a = r1 q2 + r2 com r2 < r1 . Pelo Lema de Euclides
MDC(a, b) = α · a − β · b ou MDC(a, b) = β · b − α · a.
b = a · q1 + r1 logo r1 = b − a · q1
a = r1 · q2 + r2 logo r2 = a − r1 · q2
r1 = r2 · q3 + r3 logo r3 = r1 − r2 · q3
MDC(a, b) = r3 = r1 − r2 · q3
= r1 − (a − r1 q2 ) · q3
= (1 + q2 q3 )r1 − aq3
= (1 + q2 q3 )(b − aq1 ) − aq3
= (1 + q2 q3 ) · b − (1 + q2 q3 ) · aq1 − aq3
= (1 + q2 q3 ) · b − (q1 + q1 q2 q3 + q3 ) · a.
MDC(a, b) = βb − αa.
16
252 = 2 · 111 + 30 30 = 252 − 2 · 111
111 = 3 · 30 + 21 21 = 111 − 3 · 30
30 = 1 · 21 + 9 9 = 30 − 1 · 21
21 = 2 · 9 + 3 3 = 21 − 2 · 9
Como 3 | 9, temos que 3 = MDC(252, 111). Se quisermos escrever o MDC como combinação
linear de 252 e 111, basta substituir as expressões dos restos umas nas outras, começando de
baixo para cima.
3 = 21 − 2 · 9
= 21 − 2 · (30 − 1 · 21) = 3 · 21 − 2 · 30
= 3 · (111 − 3 · 30) − 2 · 30 = 3 · 111 − 11 · 30
= 3 · 111 − 11 · (252 − 2 · 111).
3 = 25 · 111 − 11 · 252.
Cuidado para não fazer a conta no meio do caminho!! O objetivo é escrever como combinação
linear! Também não devemos ser apressados, tentando acelerar o processo. Por exemplo, se
tivéssemos feito
3 = 21 − 2 · 9
= (111 − 3 · 30) − 2 · (30 − 1 · 21)
( ) ( )
= (252 − 2 · 111) − 3 · (252 − 2 · 111) − 2 · (252 − 2 · 111) − 1 · (252 − 2 · 111) ,
Exemplo. a = 47 e b = 97
97 = 2 · 47 + 3
47 = 15 · 3 + 2
3=1·2+1
Como 1 | 2, temos que 1 = MDC(47, 97). Vamos agora, escrever o MDC como combinação
linear dos dois númeors dados. Temos que
Portanto,
1 = 16 · 97 − 33 · 47.
Observação. Nos dois exemplos, consideramos dois números naturais a < b, encontramos o
seu MDC, e escrevemos
17
e
No primeiro caso escrevemos o MDC como um múltiplo do menor (a) subtraı́do de um múltiplo
do maior (b) e no segundo caso escrevemos o MDC como um múltiplo do maior (b) subtraı́do
de um múltiplo do menor (a). Note que no primeiro caso determinamos o MDC depois de
efetuarmos quatro divisões e no segundo caso depois de três divisões. Isso acontece em geral,
se necessitarmos de um número par de divisões para determinar o MDC, então escreveremos o
MDC como um múltiplo do menor subtraı́do de um múltiplo do maior; se o número de divisões
for ı́mpar, escreveremos como um múltiplo do maior subtraı́do de um múltiplo do menor. O
teorema a seguir mostra que, na verdade, se a, b ∈ N sempre podemos escrever seu MDC das
duas formas.
MDC(a, b) = α · a − β · b e MDC(a, b) = λ · b − µ · a.
Demonstração: Já sabemos que uma das formas acima é válida. Vamos mostrar que isso
implica que a outra forma também é válida. Suponhamos por exemplo, que existam α, β ∈ N
tais que MDC(a, b) = α · a − β · b (o outro caso é similar). Seja ρ = max{α, β}. Então
MDC(a, b) = α · a − β · b
=α·a−β·b+ρ·a·b−ρ·a·b
= (ρ · a · b − β · b) − (ρ · a · b − α · a)
= (ρ · a − β) · b − (ρ · b − α) · a
= λ · b − µ · a,
A partir de agora, podemos sempre supor que existe a combinação linear que nos for mais
conveniente.
Podemos enunciar o mesmo fato da seguinte forma.
αa + βb = MDC(a, b).
Definição. Sejam a, b ∈ N. Dizemos que a e b são primos entre si (ou relativamente primos)
se e somente se MDC(a, b) = 1, ou seja, o único divisor comum de a e b é 1.
Corolário. Dois números naturais a e b são primos entre si se e somente se existem α, β ∈ Z
tais que α · a + β · b = 1.
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Demonstração: (=⇒) Decorre do Teorema de Bézout.
(⇐=) Suponhamos que existam α, β ∈ Z tais que α · a + β · b = 1. Seja d um divisor comum
de a e de b. Então d | (αa + βb). Logo d | 1 e, portanto, d = 1. Logo o único divisor comum
de a e b é d = 1. Segue que MDC(a, b) = 1.
Cuidado! O “somente se” vale apenas quando a e b são primos entre si!!! Não vale para
outro valor de MDC (4 = 1 · 6 − 1 · 2, mas 4 ̸= MDC(6, 2)). Uma igualdade u = γ · a + δ · b
implica apenas que MDC(a, b) | u , mas não implica a igualdade de MDC(a, b) e u. De fato,
D = MDC(a, b), D | a, D | b =⇒ D | (γ · a − δ · b) =⇒ D | u.
d1 d2 | a ⇐⇒ d1 | a ∧ d2 | a.
d2 | d1 d2 ∧ d1 d2 | a =⇒ d2 | a.
Logo d1 | a e d2 | a.
⇐= Suponhamos que d1 | a e d2 | a. Então ∃r, s ∈ N tais que d1 r = a = d2 s.
Claramente d1 | d1 r. Mas d1 r = d2 s. Então d1 | d2 s e MDC(d1 , d2 ) = 1. Logo d1 | s. Então
(∃t ∈ N)( s = d1 t ). Logo a = d2 s = d2 d1 t. Logo d1 d2 | a.
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Critérios de divisibilidade
O sistema de numeração em base 10, ou em outra base qualquer, é um sistema posicional. Por
exemplo, quando escrevemos N = 5297, estamos dizendo que N = 5 · 103 + 2 · 102 + 9 · 10 + 7.
Para um N ∈ N qualquer, consideramos a expansão decimal de N
( )
N = an · 10n + an−1 · 10n−1 + · · · + a1 · 10 + a0 , com (∀i) ai ∈ {0, 1, 2, . . . , 9} .
2 | A.
Mas N = A + a0 . Portanto
2 | N ⇐⇒ 2 | a0 .
Fica assim provado o seguinte critério.
Logo
(a − 1) | (an − 1).
∀n ∈ N, 9 | (10n − 1).
∀n ∈ N, 3 | (10n − 1).
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103 = 1000 = 999 + 1 = 3 · 333 + 1. Portanto A3 = 333.
Se N = an · 10n + an−1 · 10n−1 + · · · + a1 · 10 + a0 for a expansão decimal de N e S =
an + an−1 + · · · + a0 for a soma de seus algarismos, então
onde B = an An +an−1 An−1 +· · ·+a1 A1 e os Ai são os considerados acima, com 10n −1 = 3An .
Então
N = S + 3B.
Daı́ decorre que 3 | N ←→ 3 | S. De fato, supondo que 3 | N , então (∃r ∈ N)(N = 3r).
Segue que S = N − 3B = 3r − 3B = 3(r − B) e, portanto, 3 | S.
Reciprocamente, se 3 | S, então (∃s ∈ N )(S = 3s). Segue que N = S+3B = 3s+3B = 3(s+B).
Logo 3 | N .
Fica assim provado o seguinte critério de divisibilidade por 3.
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