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Comentário de documentos METODOLOGIA

1. AS REGRAS DO JOGO

O objectivo do comentário é dar a descobrir ao leitor os centros de interesse e os pontos originais do ou dos documentos.
Qualquer que seja a disciplina, são sempre as mesmas qualidades que se aguardam de si:
• O essencial da informação deve ser evocada sob a fornia de uma problemática sem que se cometam, evidentemente,
contrasensos.
• Toda e qualquer paráfrase é excluída; o seu desenvolvimento não deverá nunca apresentar-se como uma justaposição dos
elementos extraídos do documento.
• O comentário, no entanto, não é uma dissertação; os conhecimentos que irá evocar no seu trabalho deverão fazer sempre
parte precisamente do (s) documento (s) analisado (s). Esses conhecimentos são sempre precisos, tanto ao nível do vocabulário
empregue, como das informações fornecidas.
• Finalmente, para dar mais impacto à sua comunicação, ordene o seu trabalho em redor das ideias principais, descobertas nesses
documentos. Espera-se de si um trabalho "composto"; os centros de interesse serão, por conseguinte, ordenados consoante um
plano coerente.
O seu trabalho decompõe-se em dois tempos sucessivos: a análise, quer dizer, a observação e a descrição do conteúdo do
documento, seguindo-se o comentário das informações postas em evidência. Estas etapas efectuam-se no rascunho.
Para não haver esquecimentos e para ordenar correctamente o seu trabalho, organize metodicamente o seu rascunho
preparatório. Trace duas colunas: à esquerda, indique todas as informações que lhe são fornecidas (o que o autor quiz dizer ou
representar); à direita, frente aos elementos assinalados, escreva os seus comentários. Só poderá redigir o seu comentário defi-
nitivo, quando este trabalho estiver terminado.

2. A ANALISE

A análise de um documento escrito


Ser-lhe-á necessário percorrer várias vezes o texto para apreciar toda a sua riqueza, tal como uma cidade que deseje descobrir.
1ª Leitura
Contente-se em situar o texto (tipo de documento, autor, data).
Ponha, também, em evidência a ideia geral abordada, ligando-a ao seu contexto.
Se se tratar, por exemplo, de um discurso histórico, deverá saber qual é o seu tema e em que circunstâncias foi pronunciado.
Frequentemente o texto aborda ou coloca um problema, e o autor defende uma tese; é no decorrer desta primeira leitura
que deve pôr em evidência essa problemática.
a
2 Leitura
Esta leitura é mais minuciosa; experimente assinalar todas as informações importantes: ideias, factos, exemplos. Debruce-se
unicamente sobre as palavras ou expressões-chave. De momento, deixe de lado os detalhes, vê-los-á mais tarde, se
necessário. Para reforçar as suas pistas de pesquisa, faça um relatório desses elementos fundamentais.
Numere as linhas do texto de 5 em 5, a fim de facilitar a si e ao corrector a marcação das informações que criou. Pode,
eventualmente, sublinhar no texto as ideias importantes (uma côr por tema), com a condição de as ordenar seguidamente no
rascunho.
As questões colocadas na continuação do texto podem ajudá-lo. De qualquer maneira, interrogue-se sobre o que pretendeu
dizer o autor: o que mostra ele, a que faz alusão, como se comporta (quais são os elementos da sua argumentação)... No
final desta segunda leitura, a problemática do texto deverá estar claramente posta em evidência.
a
3 Leitura
Esta passagem suplementar permite-lhe aprofundar as suas descobertas iniciais, salientá-las. Pode agrupar por afinidades os
primeiros elementos, segundo os critérios pertinentes e lógicos.
O seu plano surge, assim, progressivamente no rascunho. Somente na continuação deste trabalho de análise poderá efectuar o
comentário, reagrupando em redor de temas principais os elementos assinalados.

A análise de um texto literário


A análise de um texto literário tanto diz respeito ao fundo como à forma. Depois de ter posto em evidência, ao longo das
diferentes leituras, os temas principais, interrogue-se sobre quais são os processos utilizados pelo autor para os tornar
sensíveis face ao leitor.
• Os temas podem incidir sobre os elementos do quadro, os personagens, a acção, ou ainda a evolução de um ou outro desses
elementos.
• A análise desses processos incide sobre a composição do texto, a sua tonalidade, o contorno das frases, os efeitos de estilo,
bem como sobre a escolha dos termos e das imagens que evocam (dimensão simbólica). As impressões sentidas ao longo da
primeira leitura podem, deste modo, ser explicadas e validadas.
Acautele-se em clarificar os sub-en-tendidos e a explicitar as conotações dos termos empregues, quer dizer, as significações

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para além das provocadas directamente pelas próprias palavras. Face ao termo "bandeira", por exemplo, não se contente em
imaginar simplesmente uma peça de tecido flotuan-do ao vento; essa palavra deve fazer pensar também no povo, erguendo-
se para defender a sua pátria, ou no quadro de Delacroix "A Liberdade conduzindo o povo", em Gravoche sobre as barricadas,
naquilo que sabe do empenho político de certos escritores. A maior parte dos textos literários fazem apelo a esses
elementos conotativos; poderá abordá-los com maior facilidade, e quanto mais rica fôr a sua cultura.
Esteja atento, no entanto, para não se afastar do texto. Os seus propósitos devem fazer continuamente referência ao documento
(colocando toda e qualquer citação entre aspas). Na realidade, a sua análise deve reflectir os seus conhecimentos, mas
igualmente a sua sensibilidade; prefira, por esta razão, as opiniões diferenciadas […], exprimindo-as de maneira segura e elegante.

Para analisar um conjunto de documentos


Sempre que lhe pedem para comentar um conjunto de documentos, não deve em caso algum contentar-se em analisá-los
isoladamente; o que se espera de si, é que os coloque em relação.
Este procedimento seguirá ponto por ponto o que acabou de ser apresentado, mas numa outra escala: de facto, o conjunto do
dossier pode ser considerado como um documento único. São as relações (ideias semelhantes ou opostas) entre cada um dos
elementos do dossier que deverá identificar no seu trabalho.

3. O COMENTÁRIO

Acaba de extrair do documento as informações que ele contém.


Não pode ficar-se por esta etapa: o seu "comentário" ser apenas um apanhado puramente descritivo, um simples inventário,
que terminará simplesmente numa paráfrase do documento.
Resta-lhe formular hipóteses, que explicarão os problemas ou os fenómenos constatados e que valorizarão as suas implicações.
Para isso, deverá colocar os elementos descobertos em relação com os seus conhecimentos. Escreva o seu rascunho cada
informação posta em evidência anteriormente, e coloque à sua frente o seu comentário pessoal.
Se forem colocadas questões precisas no tema, rcleia-as, uma vez que elas orientarão o seu comentário. Para garantir uma
coerência no seu trabalho, respeite as seguintes etapas:
• Classifique, por ordem de importância, as constatações retiradas, nume-rando-as.
• Encontre, a propósito do fenómeno mais importante, todos os conhecimentos adquiridos que o podem explicar. Apoie-se na
definição dos termos técnicos utilizados no documento.
• Verifique essas primeiras hipóteses, confrontando-as com os outros fenómenos assinalados.
• Reproduza esse procedimento para cada um dos fenómenos constatados, até que encontre um conjunto de explicações
coerentes.

4 . ANALISAR E COMENTAR UM DOCUMENTO VISUAL

Os documentos visuais permitem sintetizar a informação. A sua análise e o seu comentário necessitam, por esse motivo, de
algumas adaptações.
Analisar e comentar uma tabela, um gráfico...
Para analisar uma tabela, um gráfico, um esquema ou um mapa, é preciso que saiba, como para um escrito, de que fala esse
documento; extraia, de seguida, as informações essenciais nele contidas.
• Para definir de que fala o documento, leia atentamente o título ou a legenda, a fonte, a data em que as informações foram
colhidas. Relacione esse documento com os textos que eventualmente o acompanham.
• Para extrair as informações essenciais de um documento: ponha em evidência o porte geral do documento (curvas
ascendentes, disimetria de uma pirâmide de idades...); assinale as "roturas" (mudanças de orientação numa curva, por exemplo);
defina as unidades utilizadas e identifique as variáveis (para isso, leia atentamente a legenda interrogando-se, por exemplo, se se
tratam de valores absolutos ou de valores relativos).
Efectue, de seguida, os cálculos necessários à síntese dos dados: cumule os algarismos, calcule as taxas de variação, as
diferenças; converta-os , eventualmente, em percentagens.
Uma vez esses dados em evidência, releia eventualmente o texto que acompanha o documento, de maneira a confirmar o que
descobriu.

A análise de uma fotografia, de um desenho...


Ao contrário dos documentos anteriormente vistos, as imagens fixas (fotografias, pinturas, desenhos, caricaturas, publicidade)
são documentos brutos. Não se encontra nenhum símbolo tal como o tracejado ou o código de cores... Cabe-lhe a si
assinalar e identificar os elementos representados. Apenas o título e eventualmente o(s) texto(s) que acompanham a
imagem o podem ajudar a fazê-lo. Não se esque-çaa de os 1er atentamente.
Como anteriormente, este trabalho de marcação e posteriormente de análise, efectua-se no rascunho.
Para comentar uma imagem, aborde sucessivamente as seguintes etapas, apoiando-se nos conselhos já dados:
• A descrição

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Precise o tipo de documento em questão (fotografia, desenho, banda desenhada), identifique o autor ou a fonte, dê um
título à cena representada (sirva-se, para isso, de todos os índices fornecidos pelo contexto: a legenda, a data de realização, a
origem do documento...).
Descreva a cena representada (tipo, lugar, época; os personagens; a acção representada: as relações entre os elementos ou a
sua disposição). Reformule, na sua linguagem, aquilo que vê.
Seja, no entanto, prudente e não avance desde que não esteja absolutamente seguro. Deve continuar sempre objectivo.
• O comentário propriamente dito
Releia atentamente as questões colocadas no tema. Relacione os elementos visuais já assinalados: eles opõem-se,
assemelham-se? Um é a causa ou a consequência do outro?
Tire proveito seguidamente, a propósito dos fenómenos constatados, de todos os seus conhecimentos; retenha os que possam
explicar os fenómenos em questão.
Verifique as suas primeiras hipóteses, confrontando-os com as indicações fornecidas pelo título e os eventuais textos
complementares. Assim, limitará os riscos de contrasenso.
O prosseguimento do trabalho (concepção do plano, redacção) não difere em nada do que já vimos anteriormente.

A análise de uma imagem : a dimensão estética


O comentário de uma fotografia ou de uma pintura implica o domínio de um vocabulário mínimo de análise da imagem; é
também conveniente, para a prova de língua estrangeira, conhecer a sua tradução.
Após ter pormenorizado todos os elementos de identificação da obra, assinale as características da imagem ou do quadro,
insistindo nos processos técnicos utilizados pelo autor: a composição (formato, linhas directrizes, perspectivas, volumes,
planos), o movimento ou o equilíbrio (curvas, eixos, disposição dos centros de interesse, repetições, oposições), a luz e as som-
bras, as cores e a sua harmonia, a matéria e a sua parte mais vincada, o traço e a sua precisão.
Ponha em evidência a dimensão simbólica da obra, as alusões a mitos universais; analise as metáforas (comparações sub-
entendidas).
Relacione a obra com a de outros artistas contemporâneos; por exemplo, de que sistema estético faz parte? Porque motivo esta
obra é representativa da sua época? Tente relacionar com acontecimentos políticos, sociais e económicos da época.

5. A REDACÇÃO DO COMENTÁRIO

É-lhe, agora, possível retomar os diferentes elementos anotados no rascunho (análise e comentários), para elaborar o seu
plano, e isto, num segundo rascunho. Pode encontrar esse plano, lendo atentamente o documento, mas igualmente, as
mensagens que com ele se relacionam. Com efeito, frequentemente as questões colocadas seguem uma progressão, a qual
permite geralmente esboçar um plano adaptado ao tema. É uma ajuda que lhe fornece o autor do tema . Quer siga esse
plano sugerido ou o seu próprio plano, o seu trabalho deve, evidentemente, abranger todas as questões colocadas.
Agrupe, então, as ideias e complete o seu plano que será, quer temático (irá, por exemplo, do tema mais aparente ao tema
mais abstracto ou mais elaborado), quer analítico (colocação em evidência dos fenómenos, das causas e das consequências
imediatas e remotas). Esse plano permitir-lhe-á contornar as questões propostas, evitando as repetições. Não se esqueça que o
seu trabalho é uma demonstração, em que a coerência deve estar aparente para todos.
Uma vez o plano concebido de maneira pormenorizada redija, no rascunho, a introdução e a conclusão.
• A introdução apresenta o documento, eventualmente o seu autor, a origem, a data e o contexto da sua criação. Pense em
formular, de maneira clara e directa a ou as questões colocadas.
Procure, igualmente, anunciar a estrutura do seu trabalho (as grandes rubricas do plano), de maneira clara mas elegante.
• A conclusão contém uma apreciação global, resume o interesse e o alcance do que constatou, depois desenvolve a
questão.
• O desenvolvimento, quanto a ele, será redigido directamente na folha de trabalho. Cuide, em especial, do seu estilo para
melhor se fazer conpreender: frases curtas, palavras de articulação para ligar as frases, estilo objectivo que evita o emprego da
primeira pessoa do singular (ou do plural, fora de moda e pouco natural).
A regra do jogo, como sempre num trabalho escrito, é explicar de uma maneira simples o que constatou, a alguém que não
conhece o documento.

NÃO SE ESQUEÇA
. Observe, sem "a priori", seguidamente procure explicações coerentes.
. Mantenha-se centrado no documento
. Comente, pondo em evidência primeiramente o essencial.
. Um espírito claro exprime-se com clareza.

Excerto do capítulo 42, «Comentário aos documentos», de Michel Coéffé, Guia dos métodos de trabalho, Mem Martins,
Edições, CETOP, 1992. Traduzido do francês por Vítor Romaneiro. Capítulo 42 (pp. 264 -270).

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